QUALIDADE DO PRÉ-NATAL EM RELAÇÃO ÀS SOROLOGIAS SÍFILIS, HIV E HEPATITE B EM GESTANTES DE UNIDADE DE SAÚDE EM NATAL/RN* RESUMO INTRODUÇÃO: A assistência pré-natal dos testes sorológicos com data de realização (APN) é um dos pilares do cuidado à saúde e do retorno dos exames. Os procedimentos materno-infantil. Para atingir seus propósitos, de análise envolveram estatísticas descritivas e é necessário que a assistência oferecida cum- bivariadas utilizando o programa Primer, ver- pra requisitos mínimos. OBJETIVO: Descre- são 3.0. Para a qualidade do pré-natal foi utili- ver a vigilância de sífilis, HIV e hepatite B em zado índice de Kessner modificado por Takeda. Unidade de Saúde da Família de Natal/RN. RESULTADOS: 77,21% possuíam registro da METODOLOGIA: Foram utilizados prontu- solicitação de VDRL na 1ª consulta e 25,31% no ários e cartões das gestantes que eram cobertas 3º trimestre. 12,66% e 14,28% não realizaram o pela Estratégia Saúde da Família entre 2009 e primeiro e o segundo VDRL, respectivamente. julho de 2010. Utilizou-se um protocolo para co- A sorologia para HIV foi solicitada em 53,16% leta de dados em prontuário, obtendo-se desde das gestantes na primeira consulta e em 7,59% a identificação da paciente até os resultados no último trimestre. 13,92% não realizaram *A ntônio Medeiros Júnior (soriedemjunior@gmail.com); Amanda Samara Davi de Lima (amandasmed@gmail.com); Ana Marina Dutra Ferreira da Silva (anamarinadutra@gmail.com); Maria Elizabeth Molick de Lima (molick@supercabo.com.br); Lidenice Ferreira Lima Lopes (ceveli@uol.com.br) 10 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 o primeiro e 3,79%, a segunda solorogia. En- sistema de saúde até as dificuldades enfrentadas contramos 25,31% de solicitações de HbsAg, por mulheres grávidas para romper as limitações 16,45% não o realizaram. As gestantes levaram da rede. Assim, sorologias básicas recomendadas até 112 dias para realizar as sorologias e até 154 pelo Ministério da Saúde não são realizados de para retornarem com o resultado. Quanto à qua- forma satisfatória nessa Unidade de Saúde de lidade, 46,80% de pré-natal foram classificados Natal, e, quando realizadas, o retorno com os como adequados. CONCLUSÕES: Encontra- resultados muitas vezes leva mais tempo do que mos um percentual relevante de sorologias não o esperado. Embora não possamos garantir a realizadas e ainda maior percentual de registros validade externa deste estudo, esta parece ser a sem informação, com destaque para o sub-regis- realidade de outros locais em todo o país. tro de prontuários médicos de mulheres grávidas e cartões de gravidez. O longo tempo na reali- Palavras-chave: Cuidado pré-natal. zação e retorno com resultados das sorologias Atenção primária à saúde. tem razão multifatorial, que vai desde a falta de Doenças sexualmente transmissíveis. estrutura e processos de trabalho deficientes no INTRODUÇÃO A assistência pré-natal (APN) é um dos pi- também que a primeira consulta seja até 17 lares do cuidado à saúde materno-infantil, cuja semanas de gestação. Além da realização do relevância para a redução da morbimortalidade número de consultas recomendado, dentro dessa população já se encontra estabelecida1. da precocidade preconizada, é necessário que Para atingir seus propósitos, é necessário que a elas sejam de boa qualidade, aspecto que tem assistência oferecida cumpra requisitos mínimos. sido negligenciado1,7. A definição do que seja Tradicionalmente, o número de consultas assistência pré-natal de qualidade encontra e a época de início do acompanhamento pré- dificuldades dentro da natureza diversifica- -natal têm sido os indicadores mais comumente da da própria APN, constituída de um amplo empregados na avaliação da APN (tanto pelo espectro de ações a serem oferecidas em mo- Programa de Humanização do Pré-natal e do mentos oportunos, ao longo da gestação. Entre Nascimento – PHPN – quanto pelo Adequacy of as consultas, o rastreamento de infecções ver- Prenatal Care Utilization – APNCU). Entre os in- ticalmente transmissíveis, tais como HIV, sífi- dicadores empregados para o estudo da adequa- lis e hepatite B, é uma das intervenções com ção do cuidado pré-natal, evidenciam-se dois possibilidade de maior impacto sobre a saúde grupos distintos: os de utilização ou quantitativos perinatal, porquanto à identificação da doença e os de conteúdo ou de processo ou qualitativos. pode-se seguir o tratamento eficaz, visando a A maioria das investigações se concentra no uso cura materna ou a prevenção da infecção fetal. dos indicadores quantitativos2. As medidas com- O PHPN preconiza alguns exames labora- binadas mais frequentemente escolhidas são o toriais e sorologias que devem ser solicitados de Índice de Kessner3,4 adaptado por Takeda5 e o acordo com o período gestacional7. No entanto, APNCU Index ou Índice de Kotelchuck6. a solicitação em tempo gestacional adequado O Ministério da Saúde (MS) preconiza no não garante um retorno em tempo hábil desses mínimo seis consultas pré-natais, sendo a pri- exames laboratoriais para que, a depender dos meira no primeiro trimestre, outras duas no resultados, a equipe médica da unidade de saúde segundo trimestre e as três últimas no terceiro possa intervir com a finalidade de que não haja trimestre de gestação. Além disso, recomenda acometimento fetal. Desse modo, a precocidade Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 11 da avaliação sorológica, essencial para o sucesso limitantes para o alcance da cobertura de 100% da triagem durante o pré-natal, parece ser um das gestantes com os exames VDRL e anti- desafio a ser enfrentado. Como demonstrado -HIV9. Vários autores têm defendido que o uso em alguns estudos, apesar da alta cobertura do de testes com resultado imediato, realizados na pré-natal no Brasil, muitas gestantes deixam de própria unidade de saúde, permitiria interven- se submeter ao teste anti-HIV, seja por dificul- ções mais oportunas10,11. Diante disso, avaliar a dade de acesso e/ou pela qualidade da aten- adequada solicitação dos exames laboratoriais é ção8. Outros estudos vão além e apontam que tão importante quanto avaliar a época gestacio- problemas estruturais nos serviços de apoio ao nal do retorno dessa gestante com os resultados diagnóstico, com tempos demasiado longos para desses exames, sendo um item importante a ser retorno dos resultados, parecem ser os principais validado na qualidade da APN. OBJETIVO GERAL Diante da importância do tema, o objetivo ge- quanto à vigilância de sífilis, HIV e hepatite B, ral deste trabalho foi descrever a assistência pré- estimando a cobertura desses testes sorológicos -natal na Unidade de Saúde da Família (USF) de e identificando o período gestacional da solicita- Nazaré, situada no Distrito Oeste – Natal/RN, ção e do retorno dos resultados dos exames. METODOLOGIA O presente trabalho foi realizado na USF Para a coleta de dados, inicialmente foi re- de Nazaré, pertencente ao Distrito de Saúde – alizado um levantamento dos prontuários no Oeste, no município de Natal/RN, abrangen- Setor de Arquivo da Unidade e, posteriormen- do toda a área coberta pela Estratégia Saúde te, realizada a busca ativa do cartão da gestante da Família (ESF). O bairro tem aproximada- a partir do endereço registrado e oferecido o mente 16.000 habitantes, sendo a população convite para participar do estudo por meio da adstrita organizada em três áreas, cada uma aplicação do Termo de Consentimento Livre e com aproximadamente cinco microáreas, tota- Esclarecido (TCLE). lizando 2.304 famílias. Foram incluídas as gestantes inseridas no O delineamento do estudo foi observacio- SIS Pré-natal, que eram cobertas pela ESF e nal individuado transversal analisando-se os cujo primeiro atendimento tivesse sido realiza- prontuários das pacientes8. A amostra foi esti- do entre o ano de 2009 e julho de 2010, sendo mada considerando a média anual de pré-natal excluídas as gestantes com mudança de ende- realizado na USF, sendo esperado um total de reço no início do pré-natal e aquelas que sofre- cerca de 130 gestantes pertencentes à área co- ram abortos no início da gestação. berta pela ESF. O projeto foi desenvolvido por O instrumento de coleta de dados utilizado estudantes do curso de medicina integrantes foi uma ficha criada pelos integrantes do projeto do Programa de Educação Tutorial pela Saúde contendo dados sobre a identificação da pacien- (PET-Saúde da Família Natal/RN), seu tutor e te, tais como seu nome, área e microárea; a data preceptores, professor da Universidade Federal da última menstruação; a data provável do parto; do Rio Grande do Norte (UFRN) e profissio- antecedentes de DST; o número de consultas pré- nais de saúde da Unidade referida, respectiva- -natal realizadas, dessas, quantas foram realizadas mente, com recursos próprios para subsidiar os pelo médico e quantas pela enfermagem; o resul- gastos advindos com a pesquisa. tado dos testes sorológicos com preenchimento 12 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 da data de realização e do retorno da gestante no trimestre em que o cuidado pré-natal se com os resultados e, para as sorologias positivas, a inicia e no número de consultas, ajustado convocação do parceiro ao tratamento e se houve para a idade gestacional, sendo definido por a sua presença. Essas informações foram coleta- três categorias de utilização: pré-natal ade- das no prontuário e cartão da gestante. quado, intermediário e inadequado2. Sendo, Os dados foram armazenados em planilha nesse estudo, considerado adequado quando do Excel 2010. As análises estatísticas foram houve seis ou mais consultas e início do pré- realizadas no programa Primer, versão 3.0. A -natal antes de vinte semanas; inadequado análise envolveu procedimentos de estatísti- quando o início do pré-natal se deu após 28 ca descritiva e análises bivariadas. Para aná- semanas ou menos de três consultas; e inter- lise da qualidade do pré-natal, foi utilizado mediário nas demais situações. o índice de Kessner modificado por Takeda O projeto de pesquisa foi aprovado pelo (1993), que consta de um algoritmo baseado Comitê de Ética da UFRN protocolo 514/2010. RESULTADOS No levantamento feito nos registros do SIS em torno de 3,92 foram consultas médicas e Pré-natal, havia cadastro de 142 gestantes. No 4,24 da enfermagem. 68,35% das gestantes entanto, foram encontrados 85 prontuários e atingiram o número mínimo de consultas. cartões das gestantes. As perdas decorreram Em relação às sorologias, 77,21% possu- por mudanças de endereços das gestantes com íam registro da solicitação do VDRL na 1ª prontuários não encontrados nem no arquivo consulta, conforme o recomendado. Já o se- morto da Unidade (54), um registro de não grá- gundo teste do VDRL, preconizado para ser vida e dois abortos no início da gestação. solicitado próximo à 30ª semana, só foi solici- A idade média das gestantes foi de 24,75 tado em 25,31% das pacientes de acordo com anos (DP = 7,42) variando de 14 a 44 anos. E o recomendado. Havia registro da sorologia 17,72% se encontravam em gestação de risco para HIV em 60,75% pacientes, dentre esses de acordo com a idade (< 15 anos e > 35 anos). 53,16% foram solicitadas na primeira consulta; A idade gestacional média da primeira con- registros sobre a 2ª sorologia para HIV foram sulta foi de cerca de 3 meses (98,31 dias), sendo encontrados em 7,59%. Houve 25,31% de so- que 59,49% iniciaram o pré-natal de acordo licitação de HbsAg de acordo com o recomen- com o preconizado, 37,97% não iniciaram an- dado – próximo à trigésima semana. tes dos 5 meses de gestação e não havia infor- Dos registros encontrados, 12,66% e 14,28% mação sobre a idade gestacional de início em não realizaram o primeiro e o segundo VDRL, 2,53% das gestantes. respectivamente. Em relação ao HIV, 13,92% Apenas 1,37% das gestantes tinham re- não realizaram o primeiro exame e 3,79%, o gistrado histórico de Doenças Sexualmente segundo. 16,45% não realizaram o HbsAg. Transmissíveis (DST) no prontuário e 7,59% Dentre os motivos registrados encontravam-se não tinham qualquer informação registrada desinteresse por parte da gestante, transferência nesse item. para outra unidade e abortamento. Em relação ao número de consultas, a mé- As porcentagens de solicitações de sorolo- dia foi de 8,09, sendo o mínimo encontrado de gias realizadas de acordo com o recomendado 1 consulta e o máximo de 18 consultas. Dessas, estão explicitadas na Tabela 1. Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 13 Tabela 1 – Porcentagem de pacientes a que foram solicitadas as sorologias recomendadas. SIM (%) NÃO (%) SEM INFORMAÇÃO (%) VDRL 1ª CONSULTA 77,21 2,53 20,25 VDRL PRÓXIMO À 30ª SEMANA 25,31 7,59 67,10 HIV 1ª CONSULTA 53,16 7,59 39,24 HIV PRÓXIMO À 30ª SEMANA 7,59 5,06 87,35 HbsAg PRÓXIMO À 30ª SEMANA 25,31 53,16 24,28 Fonte: Pesquisa realizada no pré-natal de gestantes acompanhadas em USF do Município de Natal/RN, 2010. Foram computados também os tempos entre a solicitação das sorologias e a reali- zação das mesmas pelas pacientes (T1) e entre a realização dos exames e o retorno à unidade de saúde (T2). Esses tempos estão descritos na Tabela 2. Tabela 2 – Tempos em dias entre a solicitação das sorologias e sua realização (T1) e entre a realização dos exames e o retorno à consulta (T2). T1 T2 VDRL 1 31,82 (± 40,67) 22 (± 20,11) VDRL 2 13,30 (± 16,04) 21,79 (± 24,88) HIV 1 16,61 (± 19,77) 26,64 (± 19,99) HIV 2 5 (± 2,82) 48,14 (± 51,04) HbsAg 21,64 (± 27,63) 26,70 (± 14,82) Fonte: Pesquisa realizada no pré-natal de gestantes acompanhadas em USF do Município de Natal/RN, 2010. Por fim, avaliamos a qualidade do pré-natal de acordo com o índice de Kessner modifica- do por Takeda, e encontramos que 46,80% dos pacientes tiveram seu pré-natal classificado como adequado, 35,40% foram classificados como intermediário, 12,70% como não ade- quado e não havia informação suficiente em 5,10% dos prontuários e cartões das gestantes. DISCUSSÃO No presente estudo, constatamos que a qua- anos7. O Ministério da Saúde, por meio do Ma- lidade do processo de assistência pré-natal, de nual Técnico do Pré-Natal e Puerpério, define a acordo com as variáveis analisadas, foi adequa- gravidez de alto risco a que se inicia antes dos 15 da em menos de 50% dos atendimentos. anos de idade ou após os 35 anos. No nosso estu- A média de idade da gestante foi igual ao do, 17,72% das mulheres estão nessa categoria. estudo realizado em São Paulo13 e superior à O ingresso precoce no pré-natal das ges- média nacional em 2010, que foi de 15,90 anos, tantes natalenses foi superior ao das gestan- mas inferior ao constatado em estudo realiza- tes paulistas13, com média de 20,7 semanas, do em município do Sul do país, que foi de 25 e mineiras14, com 17,4 semanas, mas inferior 14 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 ao das gestantes do município do Rio Grande ainda maior de prontuários sem informação, (RS)15, com 13 semanas. A captação preco- evidenciando o sub-registro dos prontuários e ce de gestantes para início do pré-natal é de dos cartões das gestantes. A falta do registro ade- extrema importância para sua qualidade, por quado das informações é um entrave para o cor- isso o serviço avaliado foi satisfatório em quase reto planejamento e organização dos serviços de 60% dos atendimentos, iniciando o acompa- saúde. Em muitos prontuários encontrávamos nhamento em até 17 semanas. Índice superior apenas os resultados das sorologias, mas não o ao encontrado em Caxias do Sul (34,7%)16 e dia de solicitação, o que dificultou a análise da inferior ao registrado em outros estudos: São qualidade do atendimento. O mesmo problema Paulo (69%)17, São Luiz do Maranhão (63%)18 foi encontrado em tese realizada em Manaus, a e Criciúma/SC (83,1%)15. qual teve como resultado que menos da meta- No registro de antecedentes de DST, apenas de dos prontuários continha o registro da soli- 1,37% teve algum agravo. Um percentual pe- citação das sorologias, e em várias situações a queno que não se sabe se representa a realidade descrição de solicitação não especificava quais ou se é um retrato de subdiagnósticos. Não se exames foram solicitados nem existia um padrão encontrou na literatura estudos com tal análise. seguido por todas as unidades20. De acordo com dados do Ministério da O sub-registro no contexto da atenção pré- Saúde, no Brasil, vem ocorrendo um aumento -natal já foi descrito em outros estudos presen- no número de consultas de pré-natal por mu- tes na literatura nas mais variadas regiões do lher que realiza o parto no Sistema Único de Brasil. Um estudo realizado em 2010 em um Saúde, partindo de 1,2 consulta por parto em município do estado de São Paulo22, encontrou 1995 para 5,45 consultas por parto em 2005. como principais problemas para a realização da No local do estudo, houve número considerável pesquisa o sub-registro e a má conservação dos de consultas por gestante, sendo superior a ou- prontuários. O mesmo problema foi encontrado tros locais do país: São Bernadinho/SC (6,08)19, neste estudo, com vários prontuários incomple- São Luís/MA (6,6)20, São Paulo/SP (8,0)21 e tos, sem anotações de todas as consultas, falta Santa Maria/RS (6,8)7. O número mínimo de dados pessoais e sobre a gestação da pacien- de consultas foi alcançado em 57,1% dos pré- te, o que se constitui em uma falha legal por do- -natais realizados, um percentual superior à cumentação médica inadequada. Em algumas média nacional em 2010, de acordo com da- situações a falta de informações relativas às so- dos do IBGE. Sendo o estado com pior índice rologias se deve ao não retorno da gestante para o Maranhão (24%) e o melhor o Paraná (77%). a próxima consulta, além de carência do regis- Diante do exposto, nota-se que não há gran- tro da busca ativa dessa gestante, e dificuldades des disparidades nos números apresentados até no trabalho em equipe para esclarecimento do aqui quando se compara nossos resultados com motivo pelo qual ela não compareceu. outros estados e a média nacional. No entanto, Estudo realizado em Salvador, utilizando ao se analisar outros itens que compõem o pré- também análise de prontuário, constatou iní- -natal, a realidade que se mostrou foi um alto cio tardio do acompanhamento, falha no for- percentual de sub-registro, principalmente no necimento de registro escrito do pré-natal, alta relativo aos exames laboratoriais indicados pelo antes do parto e condutas em desacordo com MS para o acompanhamento da APN. as recomendações do Ministério da Saúde23. Em relação às sorologias solicitadas, encon- Neste estudo, procuramos contabilizar tramos um percentual relevante de sorologias também quantos dias em média as gestantes não realizadas conforme recomenda o Manual levaram para realizar os exames depois da soli- Técnico do Ministério da Saúde e um percentual citação e quantos dias após a realização retor- Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 15 naram para mostrar os resultados. O mínimo de oferecer tratamento à paciente e de impedir de dias obtido para a realização das sorologias a transmissão vertical dessas doenças, as quais foi de 1 dia e o máximo de 112 dias, indicando podem ser muito deletérias ao feto, e seu trata- que algumas pacientes tiveram dificuldade de mento, mais oneroso ao Estado. acesso ao laboratório, o qual não se encontra Em nosso estudo utilizamos o índice de mais na Unidade de Saúde, só possuindo aces- Kessner modificado por Takeda. Essa classifica- so ao Laboratório Central da Cidade, que se ção é importante para estabelecimento de metas encontra distante do território da Unidade ou e planejamento de ações por parte dos gestores, mesmo não tiveram condições para realizá-los. pois permite uma visão geral da qualidade da Para o retorno, o mínimo de dias foi de 1 dia e o assistência às gestantes de acordo com parâme- máximo de 154 dias, o que pode ser um indício tros objetivos definidos como metas pelo Minis- de dificuldade de acesso à Unidade, da demo- tério da Saúde. Já se mostrou também que tal ra do laboratório para a realização dos testes índice pode ser preditor de baixo peso ao nas- ou mesmo dificuldades da gestante de retornar cer24, podendo ser utilizado como ferramenta com os resultados. Também observamos que para planejamento de ações que beneficiem os as médias de tempo variaram de acordo com recém-nascidos. a sorologia (Tabela 2), indicando que algumas Obtivemos que 46,8% das gestantes puderam sorologias estão mais disponíveis que outras. O ter seu pré-natal classificado como adequado, o fato de o VDRL obter as menores médias para que é inferior aos 59% encontrados em Santa o retorno pode ser explicado pela facilidade de Maria no Rio Grande do Sul no ano de 20127, se obter o seu reagente em comparação com as porém superior ao encontrado em Juiz de Fora, outras duas sorologias. o qual atingiu 27,6%21 de adequação no primei- Os exames realizados próximo à 30ª sema- ro semestre de 2002, e São Paulo, que conse- na de gestação também foram realizados de guiu valores de 38,4%, entre os anos de 2000 e forma mais rápida, o que pode refletir uma 200114. A porcentagem de pré-natais inadequa- maior preocupação por parte das gestantes em dos foi semelhante à de Juiz de Fora (12,70% e realizar essas sorologias e conseguir os resulta- 11,9%, respectivamente), porém muito superior dos, tendo em vista a proximidade do parto. ao encontrado em Santa Maria, que foi de 3% Durante o período desse estudo, o HbsAg não apenas. Conclui-se que, apesar de não possuir- estava sendo realizado por alguns meses, re- mos os piores índices nacionais, estamos ainda duzindo o número de gestantes que fizeram longe de oferecer uma assistência adequada para esse teste, o que pode ter causado um viés na a maioria das gestantes em nível de pré-natal. média obtida. Não encontramos nenhum ou- O fato de a população do estudo ser restrita tro estudo na literatura que descreva o tempo a um bairro da cidade não permite extrapolar entre a solicitação e a realização e entre a rea- os dados para outras populações, garantindo lização e o retorno dessas sorologias no âmbi- somente a validade interna. No entanto, apesar to da atenção básica de saúde, mas podemos dessa limitação, o estudo sugere que os resul- constatar que existe uma dificuldade multifato- tados possam ser semelhantes aos de gestantes rial, a qual abrange desde a falta de estrutura de outros bairros do município que possuam e processos de trabalho deficientes do sistema características próximas às estudadas, além de saúde do município às dificuldades enfren- de fornecer informações acerca do serviço em tadas pelas gestantes para romper as limitações questão. Entre as limitações que os dados se- da rede. É importante frisar que quanto mais cundários costumam impor, salientamos, tam- cedo a gestante tiver em mãos o resultado des- bém, o que se refere à dificuldade em estimar a sas sorologias, maiores serão as oportunidades frequência de sub-registro. 16 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 CONCLUSÕES Nossos achados corroboram que existe Para concluir, pode-se sugerir que para a necessidade de investir no acompanha- melhor adequação das ações de controle da mento pré-natal adequado como garantia transmissão vertical da sífilis, do HIV e da he- de detecção precoce de problemas e trata- patite B, esforços devem ser direcionados para mentos necessários, de modo a impactar fortalecer as estruturas laboratoriais ou buscar nos indicadores de qualidade do pré-natal e alternativas de testagem sorológica, tais como de mortalidade infantil, principalmente no os testes rápidos, visando disponibilizar opor- componente neonatal. tunamente o resultado dos exames. QUALITY OF PRENATAL IN SEROLOGY RELATION SYPHILIS, HIV AND HEPATITIS B IN PREGNANT WOMEN OF HEALTH UNIT IN NATAL/RN ABSTRACT INTRODUCTION: Prenatal care (NPC) second. There was 25.31% request HBsAg, is one of the pillars of care for maternal 16.45% were not screened. The women and child health. To achieve its purpose, it took up to 112 days to perform serology and is necessary that the care provided meets up to 154 to return with the result. 46.80% minimum requirements. OBJECTIVE: To of prenatal were classified as appropriate. describe the surveillance of syphilis, HIV CONCLUSIONS: In serology requested and hepatitis B in a Family Health Unit we find a significant percentage of serology of Natal, capital of Rio Grande do Norte. unrealized and even higher percentage of METHODOLOGY: We used patient records records without information, highlighting the and “pregnancy cards” who were covered by underreporting of medical records of pregnant the Family Health Strategy in 2009 until July women and pregnancy cards. The long time in 2010. The instrument used was a protocol for the making and return with serology results data collection from the identification of the has a multifactorial difficult, which ranges patient until the results of serological tests with from the lack of structure and deficient work date of completion and return of the exams. processes in health system to the difficulties The analysis procedures involved descriptive faced by pregnant women to break through the statistics and bivariate analyzes using the limitations of the network. Thus, basic serology program Primer, version 3.0. For the quality of recommended by the Ministry of Health are prenatal care was used Kessner index modified not performed satisfactorily in the Health by Takeda. RESULTS: Regarding to VDRL, Unit of Natal, and, when done, return with we found 77.21% records of request in the the results often takes longer than expected. 1st consultation, and 25.31% of the records Although we can not ensure the external in the last trimester, 12.66% and 14.28% validity of this study, this seems to be the reality did not perform the first and second VDRL, of other locations around the country. respectively. HIV serology was performed in 53.16% at the first visit; we obteined 7.59% Keywords: Prenatal Care. records request in the last quarter, 13.92% Primary Health Care. did not attend the first test and 3.79%, the Sexually Transmitted Diseases. Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 17 RESUMEN INTRODUCCIÓN: La atención prenatal no fueron seleccionados. Las mujeres tomaron (APN) es uno de los pilares de la atención a la hasta 112 días para realizar la serología y hasta salud materna e infantil. Para lograr su objetivo, 154 para regresar con el resultado. 46.80% es necesario que la atención recibida cumple como la calidad de la atención prenatal se con los requerimientos mínimos. OBJETIVO: clasificaron según el caso. CONCLUSIONES: Describir la vigilancia de la sífilis, el VIH y Se encontró un porcentaje significativo de la hepatitis B en la Unidad de Natal/RN. la serología no realizada e incluso mayor METODOLOGÍA: Las tarjetas y registros de porcentaje de registros sin información, mujeres embarazadas que fueron cubiertos por especialmente la subdeclaración de las la Estrategia de Salud de la Familia en 2009 historias clínicas de las mujeres embarazadas hasta julio de 2010 un protocolo se utilizó y las tarjetas de embarazo. El largo tiempo para recopilar datos en los registros médicos, en la fabricación y el retorno con el estado la obtención de la identificación del paciente serológico es razón multifactorial, que van hasta que se utilizaron los resultados pruebas desde la falta de infraestructura y los procesos serológicas con fecha de finalización y el de trabajo deficientes en el sistema de salud retorno de los exámenes. Los procedimientos de a las dificultades que enfrentan las mujeres análisis que participan estadística descriptiva y embarazadas para romper las limitaciones análisis bivariado utilizando el software Primer, de la red. Por lo tanto, la serología básico versión 3.0. Por la calidad de la atención recomendado por el Ministerio de Salud no prenatal se utilizó el índice Kessner modificado se llevan a cabo de manera satisfactoria en por Takeda. RESULTADOS: 77.21% tenían esta Unidad de Salud en Navidad, y cuando un registro de la solicitud en la primera se hace, regresar a los resultados a menudo consulta VDRL, y 25.31% en el 3er trimestre. toma más tiempo de lo esperado. Si bien no 12,66% y 14,28% no hacen que la primera y podemos garantizar la validez externa de este segunda VDRL, respectivamente. Se pidió a estudio, esto parece ser la realidad de otros la prueba del VIH en 53.16% de las mujeres lugares del país. embarazadas en la primera visita y 7,59% en el último trimestre. 13.92% no hizo el primero Palabras clave: Cuidado Prenatal. y 3,79%, la segunda solorogia. Encontramos Atención Primaria de Salud. 25,31% de las solicitudes de HBsAg, 16.45% Enfermedades de Transmisión Sexual. 18 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 REFERÊNCIAS ALMEIDA, S. D. M.; BARROS, M. B. A. Eqüidade e atenção à saúde da gestante em Campinas (SP), Brasil. Rev Panam Salud Publica, v. 17, n. 1, p. 15-25, jan. 2005. ALMEIDA FILHO, N.; ROUQUAYROL, M. Z. Introdução à Epidemiologia. 4. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006. p. 168-205. ALMEIDA-SILVA, F. F. Syphilis and HIV in pregnancy: an investigation of the prenatal care at SUS in the city of Rio de Janeiro, 2007/2008. Dissertation (Masters in Epidemiology in Public Health) – National School of Public Health, Rio de Janeiro, 2010. ANVERSA, E. T. R. et al. Qualidade do processo da assistência pré-natal: unidades básicas de saúde e unidades de Estratégia Saúde da Família em município no Sul do Brasil. Cad. Saúde Pública, v. 28, n. 4, p. 789-800, abr. 2012. ASSAD, F. M.; RECH, C. R. A. Avaliação da Atenção Pré-Natal na Unidade Básica de Saúde de São Bernardino – SC. Rev. Saúde Públ. Santa Cat., v. 3, n. 2, jul./dez. 2010. COIMBRA, L. C. et al. Fatores associados à inadequação do uso da assistência pré-natal. Rev Saúde Pública, v. 37, n. 4, p. 56-62, ago. 2003. COUTINHO, T. et al. Adequação do processo de assistência pré-natal entre as usuárias do Sistema Único de Saúde em Juiz de Fora (MG). Rev Bras Ginecol Obstet., v. 25, n. 10, p. 717-724, nov. 2003. DOMINGUES, R. M. S. M.; HARTZ, Z. M. A.; LEAL, M. C. Avaliação das ações de controle da sífilis e do HIV na assistência pré-natal da rede pública do município do Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant. [periódicos na Internet], v. 12, n. 3, p. 269-280, set. 2012. Disponível em: . Acesso em: 24 jun. 2013. FIGUEIREDO, E. M. et al. The challenge of the reference and counter-reference system in the prenatal assistance to pregnant women with infectious diseases. An Acad Bras Cienc, v. 81, n. 3, jul. 2009. FONSECA, C. R. B. et al. Risk factors for low birth weight in Botucatu city, SP state, Brazil: a study conducted in the public health system from 2004 to 2008. BMC Res Notes, v. 5, n. 60, jan. 2012. Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 19 GONÇALVES, C. V.; CESAR, J. A.; MENDOZA-SASSI, RA. Qualidade e equidade na as- sistência à gestante: um estudo de base populacional no Sul do Brasil. Cad. Saúde Pública [periódicos na Internet], v. 25, n. 11, p. 2507-2516, nov. 2009. Disponível em: ; . Acesso em: 15 jan. 2013. KESSNER, D. M. Infant Death: an Analysis Of Maternal Risk And Health Care. Institute of Medicine: National Academy of Sciences; 1973. KOFFMAN, M. D.; BONADIO, I. C. Avaliação da atenção pré-natal em uma instituição filan- trópica da Cidade de São Paulo. Rev Saúde Matern Infant., v. 5, n. 1, S23-32, dez. 2005. KOTELCHUCK, M. An evaluation of the Kessner Adequacy of Prenatal Care Index and a proposed Adequacy of Prenatal Care Utilization Index. Am J Public Health, v. 84, n. 9, p. 1414-1420, sep. 1994. LIMA, B. G. C. Abordagem da sífilis como indicador de qualidade da assistência pré-natal em Salvador. Rev. baiana saúde pública, v. 28, n. 1, p. 9-18, jan./jun. 2004. MISUTA, N. M. et al. Sorologia anti-HIV e aconselhamento pré-teste em gestantes na região noroeste do Paraná, Brasil. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant. [periódicos na Internet], v. 8, n. 2, p. 197-205, mar. 2008. Disponível em: . Acesso em: 24 jun. 2013. MONTEIRO, C. A.; FRANÇA, J. I.; CONDE, W. L. Evolução da assistência materno- infantil na cidade de São Paulo (1984-1996). Rev. Saúde Pública [periódicos na Internet], v. 34, n. 6, p. 19-25, dez. 2000. Disponível em: ; . Acesso em: 10 jan. 2013. QUICK, J. D.; GREENLICK, M. R.; ROGHMANN, K. J. Prenatal care and pregnancy outcome in a HMO and general population: a multivariate cohort analysis. Am J Public Health, v. 71, n. 4, p. 381-390, apr. 1981. RIBEIRO FILHO, B. Avaliação de qualidade da atenção pré-natal em quatro uni- dades do Programa de Saúde da Família do município de Manuas – AM. 2004. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) – Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2004. SCHRAG, S. J. et al. Prenatal screening for infectious diseases and opportunities for prevention. Obstet Gynecol, v. 102, n. 4, oct. 2003. 20 Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 SILVEIRA, D. S.; SANTOS, I. S. Adequação do pré-natal e peso ao nascer: uma revisão sis- temática. Cad. Saúde Pública [periódicos na Internet], v. 20, n. 5, p. 1160-1168, out. 2004. Disponível em: . Acesso em: 13 jan. 2013. TAKEDA, S. M. P. Avaliação de Unidade de Atenção Primária: Modificação dos Indi- cadores de Saúde e Qualidade da Atenção. Pelotas. Dissertação (Mestrado em epidemiologia) – Universidade Federal de Pelotas, Pelotas, 1993. TREVISAN, M. R. et al. Perfil da Assistência Pré-Natal entre Usuárias do Sistema Úni- co de Saúde em Caxias do Sul. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. [periódicos na Inter- net], v. 24, n. 5, p. 293-299, jun. 2002. Disponível em: . Acesso em: 15 jan. 2013. WARNER, L. et al. Missed opportunities for congenital syphilis prevention in an urban southern hospital. Sex Transm Dis., v. 28, n. 2, p. 92-98, feb. 2001. Revista Eletrônica Extensão & Sociedade - PROEX/UFRN - Volume 5 - No 2 21