Mauricio Pereira Martins NATAL/RN 2018 Forma da arquitetura que anima a Praia da Pipa: nexos entre configuração espacial, movimento e interfaces edifícios-rua em uma vila costeira no nordeste do Brasil Mauricio Pereira Martins Forma da arquitetura que anima a Praia da Pipa: nexos entre configuração espacial, movimento e interfaces edifícios-rua em uma vila costeira no nordeste do Brasil Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urba- nismo – PPGAU, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, como requi- sito parcial para obtenção do grau de mes- tre. Orientadora: Profª Dra. Edja Trigueiro. UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO Área de Concentração: Projeto, Morfologia e Tecnologia do Ambiente Construído Linha de Pesquisa: Morfologia, Uso e Percepção do Ambiente NATAL/RN 2018 Martins, Mauricio Pereira. Forma da arquitetura que anima a Praia da Pipa: nexos entre configuração espacial, movimento e interfaces edifícios-rua em uma vila costeira no nordeste do Brasil / Mauricio Pereira Martins. - Natal, 2018. 123f.: il. Dissertação (Mestrado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Tecnologia. Departamento de Arquitetura e Urbanismo. Orientadora: Edja Trigueiro. 1. Planejamento urbano - Dissertação. 2. Animação urbana - Dissertação. 3. Acessibilidade - Dissertação. 4. Movimento - Dissertação. 5. Praia da Pipa - Tibau do Sul/RN - Dissertação. 6. Sintaxe do espaço - Dissertação. I. Trigueiro, Edja. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/BSE15 CDU 711.4 Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN Sistema de Bibliotecas - SISBI Catalogação de Publicação na Fonte. UFRN - Biblioteca Setorial Prof. Dr. Marcelo Bezerra de Melo Tinôco - DARQ - -CT Elaborado por Ericka Luana Gomes da Costa Cortez - CRB-15/344 Mauricio Pereira Martins Forma da arquitetura que anima a Praia da Pipa: nexos entre configuração espacial, movimento e interfaces edifícios-rua em uma vila costeira no nordeste do Brasil Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urba- nismo – PPGAU, Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, como requi- sito parcial para obtenção do grau de mes- tre. Orientadora: Profª Dra. Edja Trigueiro. Trabalho aprovado. NATAL/RN, 30 de julho de 2018: Profª Dra. Edja Trigueiro Presidente Profª Dra. Lucy Donegan Examinador Externo à Instituição Prof. Dr. Márcio Valença Examinador Interno NATAL/RN 2018 Este trabalho é dedicado aos que criaram e sustentaram a Pipa que me acolheu. . . ma- triarcas, lavadeiras, cozinheiras, pescadores, estudantes curiosos & educadores, ambientalistas empreendedores, artesãos diferenciados, músicos & animadores culturais, surfistas, amantes. . . e aos que crescem e renovam os cheios e vazios urbanos com vida. A dedicatória se estende a Marcelo Tinôco, parceiro no meu primeiro projeto de pesquisa & extensão em arquitetura concebido para Pipa (2003), respaldou minha vinda para o Rio Grande do Norte (2004), foi meu primeiro anfitrião em Natal. . . cheio de generosidade, nunca me deixou desamparado no vazio. AGRADECIMENTOS Esta pesquisa faz parte de uma bolsa de estudos financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Agradeço imensamente a Edja Trigueiro, por ter semeado a Sintaxe do Espaço no PPGAU, mudando completamente minha vida (e a dos colegas), como prometera. Esta pesquisa faz parte do início de uma animada vida acadêmica que se configura desde o primeiro dia da aula de Edja. Agradeço a Lucy Donegan e a Dulce Bentes pelas preciosas considerações; a Márcio Valença e Lucy Donegan pela disposição em se debruçar no exame do trabalho final. Agradeço a Jorge Gil por desenvolver e aprimorar a luneta dos arquitetos, ensinando-nos a manter as chamas da liberdade acadêmica; agradeço também pela prontidão no suporte ao Space Syntax Toolkit. Agradeço a Norma Lilian Fagundes, pela inspiração, além do suporte local e apoio às visitas de campo. Também agradeço a Cláudio Freitas, pelo apoio às visitas de campo e também por ter resgatado meu carro daquele caminho de areia. Agradeço a Marina Colavini pelo auxílio nos registros fotográficos, a Emanuel Lopes pelo suporte às visitas de campo de madrugada e por me manter atualizado sobre o cotidiano da Avenida Baía dos Golfinhos, aos Hailton Alves Marinho (o pai e o filho) pela revisão dos mapas da beira da Lagoa de Guaraíras, a Kacciani Ferreira pela revisão dos capítulos introdutórios da versão de qualificação, a Dona Lóla & Nildinha pelo suporte durante o período de finalização. Agradeço a Flávia Monaliza Lopes, José Aureliano de Souza, Italo Maia, Andreia Umbelino, Nicholas Martino, Fabrício Lira, Maria Alves, Ugo & Camila Santana por me garantirem interlocução qualificada e não me deixarem sozinho neste mundo da Sintaxe do Espaço. Agradeço a Elisabetta Romano pelo engendramento do conceito de turismo molecular, por antever e batizar alguns padrões arquitetônicos da Pipa (em 2004) e pelo incentivo. Agradeço a Raquel Serrão, por ter me ensinado que a morfologia é paradigmática e a sintaxe, sintagmática. Agradeço a Odair Martins pelos ombros de gigante, que me ajudaram a enxergar mais do alto. Agradeço a Solange & Laura Martins, pela essência da vida. RESUMO Esta dissertação aborda relações entre forma da arquitetura e animação urbana, fundamentada em um estudo de caso da Praia da Pipa, RN, Brasil, um assentamento costeiro consagrado como destino por visitantes nacionais e internacionais. Verificou-se que o arranjo espacial das vias públicas afeta o potencial de movimento e encontro de pessoas com intensidades distintas nas várias localidades do município de Tibau do Sul, no qual se insere o distrito da Pipa; e que trechos da Avenida Baía dos Golfinhos, via localizada na Pipa, mas afastada da praia — sem vista para o mar e estreita — atraem o movimento de pedestres em maior proporção que qualquer outro ponto da malha viária de Tibau do Sul. Propõe-se aqui que, para além dos atributos naturais privilegiados da Pipa e entorno, a estrutura de acessos explica essa afluência. Os parâmetros de acessibilidade no tocante ao potencial de movimento inerente à animação nas ruas aqui explorados têm como base a teoria da Lógica Social do Espaço (HILLIER; HANSON, 1984), que relaciona o arranjo da estrutura espacial com fenômenos sociais, econômicos e ambientais. Foi examinada a dimensão em que a estrutura espacial favorece a animação na rua e se relaciona à permeabilidade da ocupação privada lindeira ao passeio público. Os resultados apontam que na Avenida Baía dos Golfinhos – célebre ponto de animação e encontro de pedestres – os trechos mais concorridos são topologicamente privilegiados e fartos de recintos privados não residenciais que se abrem para a rua, enquanto trechos altamente acessíveis, mas com baixa permeabilidade ao pedestre para recintos que margeiam as vias, apresentam pouco ou nenhum indício de animação. Sugere-se que o movimento pedonal é favorecido pelo modo de ocupação informal do solo, predominante nos povoados do município de Tibau do Sul, que configura uma malha viária segmentada e um parcelamento denso, com construções diretamente permeáveis às vias, enquanto que a ocupação de maior porte — geralmente impermeável à rua — ou os terrenos deixados vazios como estoque de terras, inibem a atividade pedestre. Este modo de ocupação, comum às áreas de expansão, tende a um movimento suportado pelo automóvel, mais pobre em animação de rua, cujas nuances podem ser explicadas pela combinação entre diversos níveis de acessibilidade da malha viária e a permeabilidade das interfaces entre espaços públicos e privados. A construção de um anel viário – também investigada – impactou pouco a estrutura de acessos, embora pareça contribuir para estender a área de movimento preponderantemente veicular. Conclui-se que a forma dos vazios da arquitetura, o espaço, carrega a animação para onde a forma dos cheios da arquitetura, a permeabilidade dos edifícios, a acolhe. Palavras-chave: animação urbana, acessibilidade, movimento, Praia da Pipa (Tibau do Sul-RN), Sintaxe do Espaço ABSTRACT This dissertation addresses relations between architectural form and urban animation, founded on a case study of Praia da Pipa, RN, Brazil, a coastal settlement, which is well-established as a national and international visitor destination. It was seen that the spatial arrangement of public roads affects differently the potential for movement and encounter in the various localities that comprise the municipality of Tibau do Sul, the district of Pipa being one. It was also seen that some sections of Baía dos Golfinhos avenue, a narrow street situated in Pipa but away from the beach and with no view of the sea, attracts pedestrian movement in a greater proportion than any other point on the road grid of Tibau do Sul. It is here proposed that over and above the privileged natural attributes of Pipa and its surroundings, the overall access structure explains that inflow. Accessibility parameters regarding movement potential and human activity on the streets, as explored here, are based on the theory of The Social Logic of Space (HILLIER; HANSON, 1984), which relates the spatial structure to social, economic and environmental phenomena. The extent to which the spatial structure encourages street animation was examined and how it relates to the permeability of private premises alongside the public realm. Results indicate that in the notoriously animated and popular meeting spots of Baía dos Golfinhos Avenue, the busiest areas are the topologically privileged ones, sided by non-residential buildings which open onto the street, whereas highly accessible tracts with poor building-street interfaces, show little or no animation. It is thus suggested that the informal occupation pattern prevalent in most settlements of the Tibau do Sul’s municipality — a segmented road grid coupled to a dense land parcelling filled with buildings directly permeable to the roads — favours pedestrian movement, whereas bulky plot occupation — usually impervious to the roadways — or the grounds left empty as land stock, inhibit pedestrian activity. This kind of occupation, mostly found in expansion areas, tends to a vehicle-dependent movement mode, which is poorer in animation, whose nuances may be explained by the combination of diverse levels of road accessibility and of public-private interface patterns. The construction of a road ring — also investigated — has had little impact on the access structure, while apparently contributing to extend the area of vehicle-dependent circulation. In conclusion, the architectural form of voids, the space, carries animation to where the architectural form of solids, the building interface, welcomes it. Key-words: urban animation, acessibility, movement, Praia da Pipa (Tibau do Sul-RN), Space Syntax LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – O espaço da animação: o problema do efeito do fixo sobre seus influxos . . 19 Figura 2 – Trecho animado na Avenida Baía dos Golfinhos . . . . . . . . . . . . . . . 20 Figura 3 – Região Turística de Pipa (RTP) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 Figura 4 – Pipa na estrutura de acessos de Tibau do Sul em 2013. . . . . . . . . . . . . 26 Figura 5 – A criação das linhas axiais em em espaços encadeados. . . . . . . . . . . . 29 Figura 6 – A representação axial traduzida em grafo. O grafo vertido em mapa axial. . 31 Figura 7 – Profundidade e distribuição dos espaços. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32 Figura 8 – Segmentos derivados da representação axial. . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 Figura 9 – Distância topológica ponderada pelos ângulos . . . . . . . . . . . . . . . . 34 Figura 10 – As pessoas preferem os caminhos mais simples. A figura da direita apresenta um trajeto topologicamente mais curto embora geometricamente mais longo. 36 Figura 11 – Movimento-para. Idas e vindas, de cada espaço para os demais do sistema. 37 Figura 12 – Movimento-através. Sobreposição de caminhos mais curtos tem maior poten- cial de escolha pelas pessoas. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38 Figura 13 – Movimento-através, mapa com o parâmetro Choice. . . . . . . . . . . . . 38 Figura 14 – Choice revelando um esqueleto de acessos (cidade de Chester). . . . . . . . 38 Figura 15 – Centros para diferentes escalas de movimento (região metropolitana do Porto) 40 Figura 16 – Escala de cores correspondendo a dez classes com quebras naturais. . . . . 42 Figura 17 – Acessibilidade-para global. Mapa axial da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Integração axial (INThh raio= n). . . . . . . . . . . . . . . . . 48 Figura 18 – Acessibilidade-para global. Mapa de segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Integração angular em segmentos normalizada (NAIN, raio= n). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49 Figura 19 – Alteração na malha viária em 2010: atalho para Cabeceiras e formação do anel viário da Pipa (detalhe). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 50 Figura 20 – Acessibilidade-para global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Integração axial global. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Figura 21 – Acessibilidade-para global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Integração angular normalizada global. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 51 Figura 22 – Concentração da mais alta acessibilidade-para global. Segmentos da batata espetada da Pipa em 2006 e 2017 incluindo caminhos pedonais. Integração angular normalizada (NAINr=n). Mapa desconectado da malha viária do município. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52 Figura 23 – Acessibilidade-para global na batata espetada da Pipa em 2006 e 2017, in- cluindo caminhos pedonais. Integração angular normalizada (NAIN). Mapa desconectado da malha viária do município. . . . . . . . . . . . . . . . . . 53 Figura 24 – Acessibilidade-através global. Mapa de segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Choice angular em segmentos normalizada NACH raio= n. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54 Figura 25 – Ampliação da Figura 18 acrescentando ocupação edilícia em 2006. Acessibilidade- para global em 2013. Integração angular em segmentos normalizada NAIN, r = n. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55 Figura 26 – Acessibilidade-através global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Choice angular normalizada global NACHr=n . . . . . . . . . . . . 56 Figura 27 – Acessibilidade-através global na Pipa em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACH). Mapa desconectado da malha do município. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57 Figura 28 – Concentração da mais alta acessibilidade-através global. Segmentos da Pipa em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACHr=n). Mapa desconectado da malha viária do município. . . . . . . 58 Figura 29 – Acessibilidade-para local – Mapa Axial, Integração INThh, raio topológico = 3. Malha viária de Tibau do Sul em 2013 . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 Figura 30 – Acessibilidade-para local na malha de Tibau do Sul em 2006 e 2013. INThhr3. 60 Figura 31 – Mapa de Segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Acessibilidade- para local. Integração angular normalizada NAIN, r = 400m. . . . . . . . 61 Figura 32 – Mapa de Segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Acessibilidade- através local. Choice angular normalizada NACH, r = 600m. . . . . . . . 61 Figura 33 – Mapa de ocupação do solo do município de Tibau do Sul . . . . . . . . . . 61 Figura 34 – Acessibilidade local na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Inte- gração angular normalizada local NAINr=400m. . . . . . . . . . . . . . . . 63 Figura 35 – Acessibilidade local na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Choice angular normalizada local (NACHr=600m). . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Figura 36 – Acessibilidade-através local na batata espetada em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACHr=600m). Mapa desconectado da malha viária do município. . . . . . . . . . . . . . . . . . 64 Figura 37 – Acessibilidade-para a 400m, 1200m, 5000m e n. Concentração de segmentos com a mais alta integração angular NAIN na malha de acessos de Tibau do Sul de 2013. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 67 Figura 38 – Acessibilidade-através a 600m, 3200m, 10000m e n. Concentração de seg- mentos com a mais alta choice angular NACH na malha de acessos de Tibau do Sul de 2013. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 68 Figura 39 – Sequência Oeste-Leste dos segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos. Loca- lização de segmentos , incluindo anel viário, 2013. . . . . . . . . . . . . . . 70 Figura 40 – Uso do solo 2008 (polígonos da projeção edilícia) e tamanho de segmentos 2013 (m). Praia da Pipa, recorte na área de ocupação mais densa da batata espetada. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 76 Figura 41 – Vestígios de animação na parte leste da Avenida Baía dos Golfinhos. Diversi- dade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 Figura 42 – Vestígios de animação na parte leste do anel viário e prolongamento da Avenida Baía dos Golfinhos (d). Diversidade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). . . . . . . . . 84 Figura 43 – Vestígios de animação na parte oeste do anel viário e da Avenida Baía dos Golfinhos. Diversidade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). . . . . . . . . . . . . . . . . . 85 Figura 44 – Permanente transitoriedade de pedestres na Avenida Baía dos Golfinhos. Segmento 1. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89 Figura 45 – Um trecho do burburinho noturno ao meio dia. Segmento 5, esquina com a Rua da Gameleira. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 Figura 46 – Fim da tarde e começo da noite no trecho do burburinho noturno. Junção do segmento 4 com 5. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 91 Figura 47 – Madrugada no trecho do burburinho noturno. Junção do segmento 4 com 5. . 92 Figura 48 – Beco para pedestres com pouco ou nenhum vestígio de animação. . . . . . . 93 Figura 49 – Sequência de muros e paredes cegas em beco de pedestre com pouco ou nenhum vestígio de animação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 94 Figura 50 – Parcelamento sem muros, grelha forjada pela relação de conveniência entre uso e movimento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96 Figura 51 – Mapa de Localização do Parque Estadual Mata da Pipa (PEMP) . . . . . . 97 Figura 52 – Para onde vai a animação? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100 Figura 53 – Um sistema de espaços interligados representado em grafo . . . . . . . . . 110 Figura 54 – Profundidade Total e Profundidade Média do vértice v1. . . . . . . . . . . . 113 Figura 55 – Assimetria em relação à distribuição de vértices e arestas no grafo. . . . . . 115 Figura 56 – Distribuição em diamante . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 Figura 57 – Mapa axial da integração INThh baseado no grafo do exemplo de Hanson. . 119 Figura 58 – Integração INThh em dois mapas axiais de arranjos dispostos a esmo de um único grafo de acessos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 119 Figura 59 – Integração angular normalizada NAIN r = 400, 600, 800, 1000, 1200, 1600, 2000, 2400, 3200, 4000, 5000, 6000, 7000, 8000, 10000, 12000, n (metros). 121 Figura 60 – Choice angular normalizada NACH r = 600, 800, 1000, 1200, 1600, 2000, 2400, 3200, 4000, 5000, 6000, 7000, 8000, 10000, 12000, n (metros). . . . 122 Figura 61 – Coeficientes de determinação R2 acerca da correlação entre tamanho de segmentos e acessibilidade global a local . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos no topo da hierarquia de acessos- através de Tibau do Sul e topo relativo da Pipa – Choice angular normalizada NACH em diferentes raios métricos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Tabela 2 – Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos no topo da hierarquia de acessos- para de Tibau do Sul e topo relativo da Pipa – Integração angular normalizada NAIN em diferentes raios métricos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Tabela 3 – Tamanho e quantidade de segmentos na Avenida Baía dos Golfinhos e anel viário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77 Tabela 4 – Acessibilidade-através local (NACHr=600m, 2013), tamanho de segmentos (2013) e diversidade de uso do solo (amostras de 2016) na Avenida Baía dos Golfinhos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 Tabela 5 – Acessibilidade-através local (NACHr=600m, 2013), tamanho de segmentos (2013) e diversidade de uso do solo (amostras de 2016) no anel viário. . . . 80 Tabela 7 – Permeabilidade da interface por segmento selecionado na Avenida Baía dos Golfinhos e anel viário, acessibilidade e tamanho deste segmento. . . . . . . 82 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CAERN Companhia de Águas e Esgotos do Rio Grande do Norte CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior IDEMA Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária MUsA Grupo de Pesquisa em Morfologia e Usos da Arquitetura (MUsA) NEP Núcleo Ecológico da Pipa PEMP Parque Estadual Mapa da Pipa PRODETUR/NE Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste PPGAU Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo RN Rio Grande do Norte RTID Relatório Técnico de Identificação e Delimitação RTP Região Turística de Pipa SST Space Syntax Toolkit UFPB Universidade Federal da Paraíba UFRN Universidade Federal do Rio Grande do Norte LISTA DE SÍMBOLOS INThh Integração axial INThhr=3 Integração axial em raio local topológico de três passos de profundidade NAIN Integração angular em segmentos normalizada INT Integração angular em segmentos, não normalizada CHAxial Choice axial NACH Choice angular em segmentos normalizada CH Choice angular em segmentos, não normalizada r raio topológico (em análise axial) ou métrico (em análise de segmentos) r = n raio global n número de vértices de um grafo, ou seja: número de espaços, número de eixos de movimento ou número de segmentos, em um sistema de espaços acessivelmente interconectados. SUMÁRIO APRESENTAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 INTRODUÇÃO: o fixo e seu influxo . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 1 ABSTRAINDO O ARTEFATO “PRAIA DA PIPA” . . . . . . . . . . . 23 1.1 Pipa como artefato sócio-espacial na malha de acessos de Tibau do Sul . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 1.2 Limites da (con)formação da malha de acessos . . . . . . . . . . . 24 2 O ESPAÇO DA ANIMAÇÃO: DELINEANDO MOVIMENTO E PO- TENCIAL DE ENCONTROS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2.1 Porções do espaço e seus eixos de movimento por intermédio de mapas suportados em grafos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 2.1.1 Propriedades topológicas elementares exprimidas nos mapas . . . . 31 2.1.2 Segmentando eixos de movimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 2.1.3 Suporte computacional para manipular e analisar mapas axiais e de segmentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 2.2 Centros de movimento-para e movimento-através . . . . . . . . . 36 2.2.1 Centralidade pervasiva, raios de abrangência dos centros e escalas de movimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 2.2.2 Síntese dos parâmetros topológicos e padronização dos atributos de acessibilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 40 2.3 Animação e potencial de encontros . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42 3 CONFIGURAÇÃO ESPACIAL E VESTÍGIOS DE ANIMAÇÃO NA PRAIA DA PIPA: MOVIMENTO PROPORCIONADO PELA MALHA DE ACES- SOS, ATIVIDADE FAVORECIDA PELO MOVIMENTO . . . . . . . . 47 3.1 A Praia da Pipa e a centralidade na malha de acessos de Tibau do Sul . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 3.2 Avenida Baía dos Golfinhos no topo da hierarquia de acessos de Tibau do Sul . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 SUMÁRIO 16 3.3 Centro funcional, tamanho do segmento e acessibilidade. . . . . 74 3.4 Vestígios da animação pela qualificação do uso em torno do es- paço acessível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 78 3.5 Permeabilidade rua–recintos, estrutura espacial e potencial de encontros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81 4 INTERPRETAÇÕES DERRADEIRAS DO ARCABOUÇO ESPACIAL E SEU EFEITO NA ANIMAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95 4.1 Considerações sobre uma grelha deformada . . . . . . . . . . . . . 95 4.2 Para onde vai a animação? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100 CONSIDERAÇÕES FINAIS E FUTURAS . . . . . . . . . . . . . . . 103 REFERÊNCIAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 104 A DEFINIÇÕES MATEMÁTICAS DOS PARÂMETROS TOPOLÓGICOS DE ACESSIBILIDADE . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 A.1 O Grafo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 A.1.1 Distância . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 109 A.1.2 Exemplo de aplicação do grafo em um sistema de espaços. . . . . . . 110 A.1.3 Distribuição, assimetria relativa e diamantes . . . . . . . . . . . . . . . 115 A.2 Normalização em análise angular de segmentos . . . . . . . . . . 120 B CONCENTRAÇÃO DE SEGMENTOS COM A MÁXIMA ACESSIBI- LIDADE EM VÁRIOS RAIOS DE ABRANGÊNCIA. . . . . . . . . . . 121 B.1 Concentração de segmentos com a máxima acessibilidade-para em 17 raios de abrangência. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 121 B.2 Concentração de segmentos com a máxima acessibilidade-através em 16 raios de abrangência. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122 C ACESSIBILIDADE-ATRAVÉS RELATIVA A RAIOS MENORES É RA- ZOAVELMENTE CORRESPONDIDA PELO TAMANHO DO SEGMENTO NA AVENIDA BAÍA DOS GOLFINHOS . . . . . . . . . . . . . . . . . 123 17 APRESENTAÇÃO A primeira vez que entrei no vilarejo da Praia da Pipa não foi a turismo, vim designado para dar suporte a um projeto de extensão universitária; tentei aproveitar o percurso desde o aeroporto para identificar vestígios acerca da economia, cultura, organização social, sequioso para ser alfabetizado por quem é do lugar1, mas estava uma madrugada escura e um sereno raro naquela região encurtava o alcance da visão para não muito além das fachadas à beira da estrada. Os primeiros 50km do trajeto não permitiram deduzir que após um oceano de canaviais sob um breu sem horizonte haveria uma economia de sol e mar; os povoados à beira do sinuoso caminho vicinal de Goianinha em diante eram os primeiros sinais de vida. Depois que o farol do carro revelou que estávamos passando por uma mata nativa a estrada passou a subir quase como se estivéssemos indo para uma serra. Depois da última curva apareceu a iluminação amarelada das lâmpadas dos postes da rua principal; o taxista anunciou que chegáramos na Praia da Pipa, embora não desse para ver praia em nenhuma das margens da avenida principal, estreita e sem calçadas, pavimentada com paralelepípedos, repleta de pousadas, restaurantes, vitrines expondo marcas famosas típicas de shopping centers de grandes cidades brasileiras. Eram duas horas da manhã, mas não foi difícil encontrar gente para perguntarmos como chegar no destino. Era 16 de janeiro de 2004, naquela noite fiquei hospedado na casa de uma surfista nativa da Pipa que morava uns 50 passos ladeira acima em uma transversal à rua principal; era uma via de chão batido cavada por erosões de água da chuva ou alguns canos de drenagem das casas; era mais estreita que a principal, predominavam residências, algumas paredes ainda sem reboco; tijolos e montes de areia na beira de puxadinhos em construção denotavam um potencial de transformação eminente, que anos mais tarde se confirmaria. Nas imediações da parte mais intensamente ocupada da avenida principal, a frente dos lotes variava de tamanho, as poucas calçadas eram estreitas e com abruptas mudanças de nível, a distância entre quadras era variada; o resultado plástico do ordenamento poderia ser descrito pelo senso comum como bagunçado, desordenado, irregular, espontâneo ou não planejado, caótico, orgânico, expressões que usualmente capturam as estruturas espaciais que se diferem das malhas ortogonais quadriculadas ou guiadas em traçados reguladores previamente esquadrinhadas por projetistas. Posteriormente, Xavier (2008) confirmaria que ocupação da Pipa 1 ”Se vai a algum lugar ensinar, seja antes alfabetizado por quem é do lugar”, conselho pessoal da educadora baiana Isabel Pereira, da Casa Redonda, Carapicuiba-SP. APRESENTAÇÃO 18 se deu predominantemente pela posse, inicialmente sem limites definidos para lotes ou glebas, o que justificaria o atual traçado de suas vias. Em que pesem as feições de informalidade, os limites da concentração do comércio e as rotas de passeio e lazer noturno eram claramente identificáveis e a rua principal podia ser caracterizada como o centro de um shopping a céu aberto2. Passaram 12 anos, o suficiente para criar coragem de reunir elementos (pretensamente) explicativos de como a estrutura espacial formada e desenvolvida na Pipa se relacionaria ao modo como as atividades econômicas foram estabelecidas em seus espaços. Enquanto morei lá, de 2004 a 2009, acompanhei os trabalhos do Plano Diretor Participativo de Tibau do Sul (2007-2008), que propiciou acesso a plantas detalhadas da cidade e dados oficiais. Posteriormente, participei da organização dos encontros de planejamento da Cadeia Produtiva do Turismo de Tibau do Sul e Pipa (2008-2009), um evento de encaminhamento de demandas e interesses postos à mesa, identificando elos da economia do turismo e fomentando alianças e parcerias entre agentes econômicos locais e órgãos governamentais de planejamento e execução de políticas públicas. Esses anos poderiam ter rendido um trabalho sobre as expectativas nos gabinetes de planejadores sobre perspectivas de uma hipotética expansão da mancha urbana decorrente não só do aumento da população como também de apostas em grandes empreendimentos de construção civil antes da crise imobiliária americana de 2008, todavia isso requeria o aprimoramento de algum método de descrição e compreensão dos efeitos da disposição do espaço, matéria prima do arquiteto. No caso da Pipa havia uma constante observável na rua principal: o encontro e aglome- ração de pessoas permaneciam os mesmos em que pesem alguns estabelecimentos em sua volta terem se transformado em fachada ou tamanho. Em mais de uma década aqueles trechos mais animados continuaram aparentemente no mesmo lugar. É o caso das imediações da esquina da Rua da Gameleira com a principal, a Avenida Baía dos Golfinhos, o burburinho do encontro de pessoas tem persistido há mais de 15 ou 20 anos no mesmo trecho, ainda que em meio a vários bares em volta que mudaram de fachada, decoração, ambientação (e dono). A questão então não é a arquitetura dos cheios, mas a dos vazios, pessoas se encontram na rua — É o espaço e não a boniteza da parede — o espaço é o recurso disputado pelo movimento ou atividades que se beneficiam deste, o espaço é o que carrega o assentamento de uma sociedade, no espaço é cabível gente. Confesso só ter me dado conta disso depois de ter sido apresentado por Edja Trigueiro à Lógica Social do Espaço de Hillier e Hanson (1984), eis o caminho de estudo que resolvi trilhar e que permeia este trabalho. 2 Vem à minha mente a metáfora favela-shopping para fusão de assentamento informal com centro comercial globalizado, expressada pelo colega de projetos Alexandre Abdo em visita à Pipa em 2003. 19 INTRODUÇÃO: O FIXO E SEU INFLUXO Figura 1 – O espaço da animação: o problema do efeito do fixo sobre seus influxos Fonte: acervo pessoal, julho de 2017. O efeito do espaço sobre o influxo de pessoas é o tema discorrido nesta dissertação. O espaço aqui estudado é feito de vazios contíguos sobre um chão por onde as pessoas se deslocam exercendo um conjunto de ações. Animação é uma situação de agregação de ação e movimento de pessoas, atividade intensa de pessoas. Existem espaços animados e outros nem tanto ou com baixa atividade. Existem atividades enraizadas no espaço; pessoas precisam chegar ali para que alguma atividade aconteça. “Pipa” se empresta como designação para um conjunto de locais onde pessoas fixaram atividades. É uma porção do território do município de Tibau do Sul, no Rio Grande do Norte, cuja economia da última década se apoia predominantemente em uma cadeia de atividades relacionadas ao turismo. Pipa surgiu de uma antiga vila de pescadores. O destino turístico foi inicialmente apoiado em acessos criados por veranistas oriundos dos engenhos do município de Goianinha no segundo quarto do século XX, foi estimulado pela procura de surfistas por praias paradisíacas relativamente isoladas no final dos anos 1970 — a eletricidade chegou em 1982, pousadas começaram a se proliferar nos anos 1990 — consolidou-se na primeira década INTRODUÇÃO: o fixo e seu influxo 20 do século XXI3, enlaçando-se nas cadeias produtivas do mercado de turismo internacional. As altas falésias da Pipa restringem o acesso do continente à praia, os caminhos do legado pesqueiro se afunilam por onde a falésia é recuada; ali estão a garagem dos barcos, a praia central, a pedra com a estátua de São Sebastião, barracas de praia, casas de veraneio. Acessos pedonais sangram as dunas e falésias próximas ao Morro da Vicência, para chegar na Praia dos Afogados (Praia do Amor), o ponto mais procurado por surfistas. No alto das falésias repousa a Avenida Baía dos Golfinhos. A despeito de estar afastada de 30m a 100m do mar, essa avenida divide o status de destino turístico com as vistas deslumbrantes das baías e falésias da localidade; é conhecida pela boemia, profusão de restaurantes, variedade de lojas e especialmente pelo intenso trânsito de pedestres (Figura 2). Figura 2 – Trecho animado na Avenida Baía dos Golfinhos Fonte: visita de campo, dezembro de 2017. Este estudo objetiva identificar efeitos do espaço sobre o potencial de movimento de pessoas no que diz respeito à animação nas ruas do destino turístico da Pipa e suas imediações em uma malha de acessos circunscrita ao município de Tibau do Sul. Busca reconhecer padrões de concentração de acessibilidade, relacioná-los com o uso lindeiro às ruas, quanto a aberturas entre a esfera pública e recintos privados não-residenciais; combinar esses componentes a fim de 3 O início do estágio de consolidação foi em 2005, baseando-se no número de turistas ao longo do tempo no Ciclo das Destinações Turísticas (Modelo de Butler): exploração, envolvimento, desenvolvimento, consolidação, estagnação e declínio/rejuvenescimento (XAVIER, 2008). INTRODUÇÃO: o fixo e seu influxo 21 mapear vestígios de animação. Os efeitos da configuração espacial no potencial de encontro de pessoas foram interpre- tados à luz da teoria da Lógica Social do Espaço (HILLIER; HANSON, 1984), que fundamenta a técnica de investigação usada neste estudo. Acesso é definido aqui como a contiguidade entre vazios que permite o deslocamento das pessoas de um pedaço do chão para outro. A variação da continuidade (ou descontinuidade) do espaço é acessibilidade, facilitando ou restringindo o movimento de pessoas. Partindo da premissa de que se a acessibilidade é alta então o potencial de movimento de pessoas é alto (HILLIER; HANSON, 1984; HILLIER, 1996), o escopo espacial da animação neste trabalho se apoia em dois pressupostos, alicerçados nos trabalhos de Hillier (1999) e Jacobs (1961): o potencial de movimento alto acompanhado de maior variedade de usos não residenciais tende a localizar centros com atividade econômica dependente de movimento na malha de acessos. O modo como o parcelamento do solo tem compartilhado seus vazios na conformação da malha de acessos revela uma distinção entre aspectos de movimento do carro e do pedestre. Em áreas de expansão urbana, longos muros ou cercamentos inibem o relacionamento do pedestre com os recintos privados, acanhando as possibilidades de animação mesmo em trechos com alta acessibilidade. Uma animação de modo mais tênue, abrangendo a vizinhança, coincide com núcleos de vilarejos fora da Pipa. A maior recorrência de aberturas permissíveis a pedestres nos recintos indicaria maior chance de haver transeuntes usufruindo o espaço, do contrário indicaria menor atividade econômica que se beneficie do movimento de pedestres, acarretando menor animação. A investigação responde em que medida a configuração espacial corresponde a uma animação concentrada e aparentemente perenizada em trechos específicos, caracterizada pelo encontro de pessoas na rua e intensa atividade econômica atinente ao movimento de pedestres. A relação de custo benefício do movimento proporcionado pela malha de acessos explicou o favorecimento da animação. A combinação da acessibilidade da malha com a permea- bilidade dos recintos vaticina a predisposição espacial à animação. A Avenida Baía dos Golfinhos é agraciada pela acessibilidade, reúne parte dos trechos mais fáceis de serem alcançados e com maiores chances de serem perpassados em relação à malha viária de todo o município de Tibau do Sul; seus trechos mais animados são singularmente fartos de recintos privados que se deixam abrir ao transeunte. Uma obra viária que interveio na malha de acessos, criando um circular no povoado da Pipa, teve pouco impacto na concentração de espaços favoráveis ao movimento; contudo, mitigou a disputa por espaço de deslocamento entre pedestres e automóveis na Avenida INTRODUÇÃO: o fixo e seu influxo 22 Baía dos Golfinhos. ESTE ESTUDO DEVE CONTRIBUIR PARA. . . O estudo contribui para entender a matéria prima do arquiteto, o espaço, reunindo elementos de como a estrutura espacial formada e desenvolvida na cidade se relaciona ao modo como as atividades econômicas foram dispostas. Os achados colaboram para afrouxar armadilhas do senso comum, como as que eventualmente ofuscam a distinção de se é o turismo que atrai pessoas ou se é a qualidade de vida já estabelecida que atrai o turismo. Sobre a qualidade de vida proporcionada pelo espaço, Jane Jacobs escreveu um livro com o título sugestivo de “morte e vida de grandes cidades americanas”. Pipa não é uma grande cidade, todavia este estudo adicionalmente deve contribuir na compreensão da morte e vida de porções cosmopolitas das pequenas cidades, vilas, povoados e bairros. Porventura o planejamento de seus espaços determine a sobrevida da galinha dos ovos de ouro de quem ambiciona ganhar a vida com atividades que dependam da atração de pessoas. Se a praia e as belezas naturais são atratores de gente per se, o arranjo espacial pode ser atrator ou afugentador por deliberação humana. No caso da Pipa, há uma constante observável na rua principal: o encontro e aglomeração de pessoas permanecem os mesmos em que pesem alguns estabelecimentos em sua volta terem o feitio transformado. Em mais de uma década aqueles trechos mais animados continuaram aparentemente no mesmo lugar. É o caso das imediações da esquina da Avenida Baía dos Golfinhos com a Rua da Gameleira, o burburinho do encontro de pessoas tem persistido por décadas nos mesmos trechos, ainda que em meio a vários estabelecimentos comerciais que mudaram de fachada, decoração, ambientação (e dono). A questão então não é tanto a arquitetura dos cheios, mas a dos vazios, pessoas se encontram na rua — é o espaço e não a boniteza da parede!, o espaço é o recurso disputado pelo movimento ou atividades que se beneficiam deste, o espaço é o que carrega o assentamento de uma sociedade, no espaço é cabível gente. O presente estudo é mais um passo no aprimoramento de métodos que auxiliem o reconhecimento de padrões estruturais e conjunturais e, portanto, dos efeitos da disposição do espaço sobre a vida nas cidades. 23 1 ABSTRAINDO O ARTEFATO “PRAIA DA PIPA” 1.1 PIPA COMO ARTEFATO SÓCIO-ESPACIAL NA MALHA DE ACESSOS DE TI- BAU DO SUL Neste estudo, a animação é inferida pelo arcabouço físico do espaço, a rede de vazios interconectados pelo chão que carrega a atividade realizada pelas pessoas. Pipa pode ser abstraída como um artefato sócio-espacial, mediante uma abordagem sistêmica que enfoca a arquitetura do objeto urbano como a estrutura profunda da cidade enquanto objeto material (HILLIER, 1989, p.5). O recorte espacial escolhido englobou a malha viária de Tibau do Sul. Os documentos que subsidiaram o recorte espacial foram um mapa vetorizado a partir de uma ortofotografia aérea em 2006 (IDEMA, 2006) e imagens de satélite capturadas em 2013 (Google Earth, 2013). A malha de acessos restringiu-se ao que as fontes permitiram identificar como vias e passagens, como as ruas, avenidas e estradas do município, contemplando o que pode ser transitado a pé ou com auxílio de veículos terrestres, como carros, ônibus, bicicletas, etc. Como o foco é o vazio acessível, este estudo inclui a continuidade espacial lindeira à via, como largos e platôs de acesso público. Em casos de explorações mais rudimentares sobre caminhos pedonais circunscritos no povoado da Pipa, o recorte incluiu passagens públicas exclusivamente destinadas a pedestres, como becos, escadarias, trilhas consolidadas, a faixa de areia na praia, o leito de praças. A data das fontes possibilitou a comparação diacrônica, entre 2006 e 2013; neste ínterim, a malha viária de Tibau do Sul foi incrementada por um conjunto de estradas e ampliação de ruas, dentre as quais um anel viário, inaugurado em 2010, transpassando o povoado da Pipa. A ortofotografia e sua vetorização foram realizadas pelo Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA, 2006), custeadas pelo Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR/NE) para subsidiar o planejamento de projetos. Embora a ortografia abrangesse todo o Município de Tibau do Sul, sua vetorização compreendeu as áreas contínuas com indícios de povoamento e pequenas propriedades economicamente ativas, dispensadas as extensas áreas de plantio de cana, desabitadas. A área vetorizada registrada nessa fonte coincide em grande parte com os limites urbano e de expansão urbana no Plano Diretor Participativo de Tibau do Sul de 2008. A vetorização é rica em detalhes; os polígonos da projeção das edificações basearam o mapa de uso do solo de partes do município publicado no Plano Capítulo 1. Abstraindo o artefato “Praia da Pipa” 24 Diretor (TIBAU DO SUL, 2008), fonte imprescindível na comparação entre acessibilidade e uso. Como o estudo é balizado pela noção de espaço indissociável de sociedade, a coleta de vestígios de animação nas ruas se apoia em visitas de campo, ampliado o recorte temporal para os anos de 2016 e 2017, encerrando uma década. O Censo de 2010 contabilizou 11.385 pessoas habitando o município de Tibau do Sul, a população estimada para 2018 é de 13.816 pessoas. Em 2016, o salário médio mensal era de 1,4 salários mínimos e a proporção de pessoas ocupadas em relação à população total era de 28,3%. Em 2015, 49% dos R$ 238.223,15 de valor adicionado bruto devia-se à atividade econômica dos serviços (excluindo administração, defesa, educação e saúde públicas e seguridade social) , 14% à agricultura e 11% à indústria (IBGE, 2018). Em 2016, havia 7357 leitos em hotéis e pousadas distribuídos nos 101.822km2 do território do município de Tibau do Sul (SOLIMAR INTERNATIONAL, 2017). A maior parte dos meios de hospedagem se concentrava na Pipa; em visita à Secretaria de Tributação, Silva e Oliveira (2013, p.69) constataram que dos 83 empreendimentos de turismo registrados no município em 2008, 70 situavam-se na Praia da Pipa. O município foi constituído do distrito sede de 31 de dezembro de 1963 até 2007 (IBGE, 2018). Após a elaboração do Plano Diretor Participativo de Tibau do Sul (2007 a 2008), a nova área urbana passou a incluir todos os vilarejos do município. A Praia da Pipa virou distrito em 2010. 1.2 LIMITES DA (CON)FORMAÇÃO DA MALHA DE ACESSOS Pipa foi uma vila de pescadores que se transformou no coração de uma extensão turística do litoral Sul do Rio Grande do Norte, como confirmam estudos que abarcam, dentre outros aspectos, a consolidação da economia turística na região (XAVIER, 2008; BARROS, 2015). Segundo o historiador e veranista Simonetti (2015), já havia registro de atividade pesqueira na Pipa por volta do ano de 1800, período em que o lugar era entreposto para embarcações que transportavam mercadorias entre os portos do Rio Grande do Norte e de Pernambuco. A Pipa na qualidade de ponto de interesse acessível pelo mar era conhecida há mais tempo. O historiador e pipense nativo Marinho (2007) encontrou 35 topônimos para esse local em registros cartográficos produzidos de 1514 (Alturas da Costa do Brasil, de João de Lisboa) a 1654 (mapa de Gerard Walk). Mas os mapas antigos, mesmo os detalhados em maior escala, como os de Marcgraf ilustrados por Frans Post em 1643, mostraram pouca informação sobre a ocupação humana ou Capítulo 1. Abstraindo o artefato “Praia da Pipa” 25 possíveis ligações terrestres para as áreas de plantio de cana, interiorizadas onde atualmente estão os município de Goianinha e Arês. Foram três as razões para o recorte espacial abranger toda a malha viária de Tibau do Sul: não foi possível saber a priori o quanto do acesso ao vilarejo da Praia da Pipa está subordinado ao percurso pelos demais povoados do município até Goianinha; os limites físicos entre cada povoado são imprecisos nas fontes usadas neste estudo; a área de abrangência da atividade turística consolidada na última década referente ao destino turístico Pipa é mais ampla que o vilarejo pesqueiro original, como descrito por Barros (2005) ao nominar o conjunto estendido de localidades como Região Turística de Pipa (RTP) (Figura 3). Figura 3 – Região Turística de Pipa (RTP) Fonte: adaptado de Barros (2005). A Figura 3 localiza a Região Turística da Pipa na orla do Nordeste brasileiro entre Natal ao Norte e João Pessoa e Recife ao Sul, as capitais mais próximas. O autor do mapa não demarcou o polígono de abrangência, mas explicita por meio de simbologia que Pipa encabeça a região que integra desde a sede de Tibau do Sul ao povoado de Barra do Cunhaú, no município de Canguaretama. Três anos depois, Xavier (2008) reaproveitou o mapa de Barros para delimitar o recorte espacial da influência do turismo nas relações de posse e propriedade de terra na Região Turística da Pipa, excluindo a Barra do Cunhaú do estudo e apresentando mais informações sobre Sibaúma e os povoados na beira da Lagoa de Guaraíras. Na época do estudo de Xavier, Capítulo 1. Abstraindo o artefato “Praia da Pipa” 26 ainda não existia a estrada ligando o povoado de Cabeceiras, próximo à Lagoa de Guaraíras, à estrada pavimentada entre Pipa e Sibaúma, nem o anel viário da Pipa, mas seus resultados são esclarecedores quanto a princípios de conformação da malha de acessos de Tibau do Sul. O recorte espacial é ilustrado no mapa da Figura 4. A mancha esboçada pelos detalhes Figura 4 – Pipa na estrutura de acessos de Tibau do Sul em 2013. Pipa Sibaúma Tibau do Sul TIBAU DO SUL Cabeceiras PiauUmari CANGUARETAMA Lag oa de Gu ara íras OCEANO ATLÂNTICO G O IA N IN H A Praia das Cacimbinhas Ponta do Madeiro Praia do Curral Praia das Minas Praia do Amor (afogados) Chapadão AREZ VILA FLOR CANGUARETAMA Bela Vista Manimbú Munim Pernambuquinho —: malha viária 2013, abstraída em seções de linhas. Demais linhas: detalhes da ortofotografia vetorizada de 2006. Rio Catú(canaviais) Base: Ortofotografia 2006 (IDEMA, 2006), Google Earth (2013). da ortofotografia realizada pelo IDEMA (2006), que exclui os canaviais, corresponde aproxima- damente ao que é considerado área urbana pelo Plano Diretor (TIBAU DO SUL, 2008). A malha viária representada nesse mapa corresponde ao ano de 2013 e incorpora a ligação terrestre com todos os povoamentos do município de Tibau do Sul. Tibau significa entre rios ou entre dois rios, na língua tupí, sugerindo a Lagoa de Guaraíras ao Norte e o Rio Catú ao Sul. O acesso imediato para os municípios vizinhos ao Norte e ao Sul (Canguaretama) é intermediado por balsas. O Capítulo 1. Abstraindo o artefato “Praia da Pipa” 27 acesso exclusivamente terrestre ao município de Tibau do Sul é proveniente de Goianinha, pela rodovia estadual RN-003. Os nove povoamentos do município de Tibau do Sul estão distribuídos quase linearmente ao longo da Lagoa de Guaraíras e da orla marítima, na sequência Umari, Piau, Bela Vista, Manimbú, Munim, Cabeceiras, Pernambuquinho, Tibau do Sul1, Pipa e Sibaúma. O transporte público de outros municípios para a Praia da Pipa percorre quase todos os povoados, exceto Sibaúma. Mesmo assim, Sibaúma é estreitamente ligada ao complexo de turismo e lazer da Região Turística de Pipa; é um povoado onde remanescentes de quilombolas testemunham a transformação de suas terras em área de expansão de grandes empreendimentos imobiliários destinados a veraneio ou hospedagem (CAVIGNAC; LINS; MAUX, 2006; CAVIGNAC; LINS; MAUX, 2011). 1 Sede municipal, com o mesmo nome do município. 28 2 O ESPAÇO DA ANIMAÇÃO: DELINEANDO MOVIMENTO E POTENCIAL DE EN- CONTROS O pressuposto deste estudo é de que a arquitetura é o espaço social estruturado (TRIGUEIRO, 2018). Deve ficar claro que a interação espaço–uso aponta condições propícias ao encontro (ou reciprocamente, isolamento). O comércio de portas abertas para a rua se beneficia do movimento de pessoas, mas não necessariamente toda rua movimentada abriga comércio. Uma rua fácil de chegar e na qual passa muita gente pode ser um ponto de encontro, mas multidões também podem se encontrar em locais de difícil acesso, por exemplo, para assistir uma apresentação de um músico famoso; a diferença é que neste caso o artista é o fator que favorece encontros e no primeiro caso é o espaço. Este Capítulo demonstra como o arranjo espacial corresponde à distribuição de vestígios de animação na rua, apresentando a estratégia de demarcação dos espaços e sua representação, e os instrumentos de descrição objetiva da sua distribuição física no plano. Parâmetros que apreendem o potencial de movimento decorrente da distribuição espacial são formulados. O potencial de encontros concernente à animação é explicado como nuance do potencial de movimento confrontado com indícios de permeabilidade entre o passeio público e o conjunto edilício imediato. 2.1 PORÇÕES DO ESPAÇO E SEUS EIXOS DE MOVIMENTO POR INTERMÉDIO DE MAPAS SUPORTADOS EM GRAFOS Existe um único espaço contínuo sobre a superfície terrestre. Marcadores espaciais podem ser arbitrados para delimitar partes articuladas sob regras elementares do que passa a ser um sistema de espaços (HILLIER et al., 1976). Nessa estrutura, cada porção do espaço pode estar subordinada a outra; é o caso de quando somos obrigados a passar em um espaço para chegar a outro além dele, como saguões de um hotel ou cada curva na estrada entre Tibau do Sul e Goianinha. Este estudo é guiado pela abordagem da Teoria da Lógica Social do Espaço, que relaci- ona o arranjo da estrutura espacial com fenômenos sociais, econômicos e ambientais (HILLIER; HANSON, 1984; SPACE SYNTAX LABORATORY, 2016). O arranjo entre as porções do espaço afeta, restringindo ou facilitando, as possibilidades de circulação ou visão dos ocupantes desse sistema espacial cuja estrutura é abstraída em termos de barreiras e permeabilidades. O que impede movimento ou visão é barreira, do contrário é permeabilidade. A classificação desses Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 29 dois objetos elementares da estrutura se ajusta ao intento de cada análise; em alguns casos escadas são acessos, em outros podem ser barreiras, beiras de abismo ou mezaninos restringem o movimento mas nem sempre são barreiras à visão; a parte seca na areia da praia pode ser pista de corrida, permeabilidade, ou barreira ao cadeirante, o mangue é permeado por vários caminhos para habilidosos catadores de caranguejo, mas é também um atoleiro para o desavisado, dentre outros exemplos de permeabilidades que podem ser reconsideradas como barreiras ou não. Um espaço convexo é uma delimitação de espaço cujas barreiras que o delimitam não obstruem qualquer linha de visão de qualquer ponto para qualquer outro ponto. Um conjunto de espaços convexos contíguos conforma um encadeamento de espaços que pode ser percorrido por quem se move. O potencial de movimento no encadeamento de espaços convexos é representado pelas linhas retas mais longas que atravessam a máxima extensão de um espaço (HILLIER; HANSON, 1984, pp. 17,91), chamadas linhas axiais. A linha axial é a simplificação de uma porção do espaço que resume o campo de possibilidades do movimento proporcionado pela geometria do espaço; considera que pessoas (ou veículos) tendem a percorrer a longitude do encadeamento dos espaços. Ilustrando, em um corredor comprido e estreito, é razoável esperar que a direção do movimento resultante se guie pela visão que as pessoas têm das saídas nas extremidades e que seria menos verossímil que as pessoas se direcionassem do centro para as barreiras laterais. A Figura 5 exibe a criação de linhas axiais: partindo de um assentamento (a), a rua e demais acessos públicos são tidos como os vazios permeáveis ao movimento humano e o conjunto edilício em sua volta pode ser considerado como barreira; em b, as porções de espaços (públicos, abertos) encadeados são demarcadas; em c, são designadas as maiores linhas retas que atravessam a máxima extensão das porções de espaço, representadas como linhas axiais interconectadas, formando um mapa axial. Figura 5 – A criação das linhas axiais em em espaços encadeados. a. b. c. Fonte: criação sobre fundo copiado de Al-Sayed et al. (2014, p.12). A representação axial usada neste trabalho para reproduzir o sistema de acessos de Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 30 Tibau do Sul diz respeito ao movimento que alcança ou perpassa espaços abertos públicos. Foram considerados como espaços públicos as ruas e becos, a praça, a passarela de madeira (deck) à beira mar, a areia da praia e as passagens de automóveis e pedestre em terreno particular mas sem restrição de acesso — este último caso ocorreu com algum destaque na base cartográfica de 2006 (IDEMA, 2006), quando havia menos terrenos cercados e alguns caminhos eram abertos e consagrados ou pela insistência de automóveis e pedestres, ou quando era conveniente a algum proprietário que caminhões, máquinas e prestadores de serviços passassem ali. Ou seja, o escopo é do espaço permeável irrestritamente, considerado como coletivo ou público. Optou-se por considerar toda porção de espaço a céu aberto cujo acesso é mediado por cerca, guarita ou pagamento de ingresso como espaço privado. Estacionamentos foram considerados aqui como espaços privados. Existem algumas galerias de loja na condição de beco sem saída a céu aberto, mas foi observado que a maioria apresentava alguma marcação de restrição de acesso para alguns horários — então todas as galerias de loja a céu aberto foram consideradas como espaços privados. A permeabilidade entre espaço público e privado por meio de portas, recuos e reentrâncias nas edificações é nomeada como permeabilidade das interfaces e complementa o estudo em etapa posterior. A representação axial expressa a articulação entre porções de espaço conforme uma rede de eixos de movimento, uma grelha (malha, rede, tecido. . . ) de permeabilidades interconectadas. As relações pertinentes à conexão entre as linhas axiais podem ser descritas com auxílio de um grafo, que é uma abstração matemática na qual os elementos relacionados são vértices (também chamados de nós) e as relações são arestas. Grafos expressam uma estrutura de nexos entre elementos que pode ser chamada de sintaxe (do grego σύνταξις: σύν=syn, “junto”; ταξις=taxis, “arranjo” ou “ordenamento”). O grafo compõe parte de um conjunto de procedimentos e técnicas analíticas quantitativas na Análise da Sintaxe do Espaço; o vértice designa o elemento espaço, cuja demarcação no plano varia conforme o escopo da análise. Na Análise Axial, cada vértice corresponde a uma linha axial. As arestas equivalem à intersecção entre as linhas axiais, ou seja, a conexão que espelha o acesso entre uma porção de espaço encadeado e outra — no grafo, a aresta descreve a adjacência entre dois eixos ou espaços acessíveis entre sí. A conversão da representação linear em grafo é ilustrada na sequência de a a c na Figura 6: a partir da identificação das barreiras e permeabilidades (cheios e vazios) (a) são traçadas as linhas axiais cruzando as maiores extensões de espaço (b); cada eixo passa a ser um vértice no grafo e cada intersecção entre axiais torna-se uma aresta (c). Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 31 Figura 6 – A representação axial traduzida em grafo. O grafo vertido em mapa axial. Base: barreiras e permeabilidades : Linha axial : Linha axial : Vértices e arestas (grafo) Grafo simulando que alguma propriedade topológica foi calculada e identificada (cores, por exemplo) O mapa axial embute os cálculos do grafo na representação linear, cujos valores resultantes são expressos em alguma escala de cores ou espessura das linhas. a. b. Representação axial c. Representação do grafo d. Representação do grafo e. Mapa axial Fonte: Adaptado de Al-Sayed et al. (2014, p.12), conteúdo transubstanciado. Embora represente fielmente as conexões entre os eixos de movimento, é pouco intuitivo entender o espaço da rua como uma “bolinha” ao invés de uma linha na visualização do grafo como se encontra na Figura 6(c). Convenientemente, para facilitar a compreensão por arquitetos e urbanistas, o grafo é embutido em um mapa axial, uma representação que espelha a disposição geométrica oriunda do espaço real junto com as propriedades advindas das relações entre os vértices, chamadas aqui de propriedades topológicas (do grego τόpiος=topos, “lugar” e λόγος=logos “estudo”). As propriedades topológicas são calculadas e identificadas (Figura 6d). A conversão de grafo para mapa axial, se apoiando em escala de cores ou espessura de linhas para exprimir as propriedades topológicas do arranjo espacial (Figura 6e). No mapa axial, os vértices são simbolizados por linhas dispostas no plano, proporcionando uma visualização mais intuitiva do que a “bolinha” na representação do concatenamento de espaços. 2.1.1 Propriedades topológicas elementares exprimidas nos mapas Para analisar o potencial de movimento em um arranjo de espaços interconectados, uma dessas propriedades mais elementares do grafo1 é a distância topológica, que é a quantidade de arestas entre um vértice e outro pelo caminho mais curto, explicado a partir das seguintes definições : Trilha é a sequência intercalada de vértices e arestas de um vértice a outro. Caminho é uma trilha sem repetição de vértices. O caminho mais curto é o caminho entre um vértice e outro com a menor quantidade de 1 Vide Apêndice A, acerca das definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade. Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 32 arestas. Anel é um caminho no qual há, excepcionalmente, uma repetição de vértice: o primeiro e o último são o mesmo [Definições adaptadas e transubstanciadas de Steen (2010, p.37,46,66,140)] Na Análise da Sintaxe do Espaço, profundidade total de um espaço (linha axial, vértice) no arranjo espacial expressa a maior distância alcançada pelo menor caminho a partir do vértice; o número de arestas de um caminho é chamado de passos de profundidade. A média das distâncias de todos os caminhos partindo de um espaço para os demais espaços, é a profundidade média deste espaço no sistema. A noção de profundidade remete à relação de subordinação entre acessos, ou o “poder” de um espaço sobre os demais. A Figura 7 exemplifica dois arranjos de uma mesma quantidade de espaços, um é distribuído de modo enfileirado, o outro é ramificado; em média, os caminhos do espaço assinalado ( ) para os demais espaços demandam mais passos de profundidade no arranjo enfileirado que no ramificado. No exemplo enfileirado, o transeunte alcança o espaço na outra ponta somente se passar por outros espaços ao longo do caminho. No caso ramificado, o transeunte tem acesso direto aos demais espaços — reciprocamente, os demais espaços acessam diretamente a origem de referência; a relação é mais rasa. Figura 7 – Profundidade e distribuição dos espaços. Uma distribuição enfileirada. O acesso se aprofunda à cada passo. Uma distribuição ramificada. O acesso é direto para os demais espaços Fonte: imagem adaptada de Hanson (1998, p.28). A distribuição de caminhos variando a combinação entre ramificações e profundidade amplia ou restringe as possibilidades de acesso entre os espaços. Considerando que o espaço acomoda pessoas e o pressuposto de que não há sociedade desvinculada de um espaço, a distribuição de caminhos profundos ora pode assinalar acessos onde ninguém quer ir, ora onde somente alguns podem ir. A concentração de caminhos pouco profundos, rasos, tem um poder maior de integrar um conjunto de espaços a outros. A incidência de arestas em um vértice é o grau de conectividade do vértice. Um vértice com grau alto, no qual incidem muitas arestas, é uma porção do espaço bem conectada, ampliando as possibilidades de caminhos. Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 33 A gama de caminhos aliada à profundidade de cada caminho descreve a distributivi- dade2. Esta é a propriedade de concentrar ou dispersar acessos, induzir gargalos ao fluxo de pessoas, proliferar percursos, ou ainda oferecer rotas alternativas ao mesmo destino por meio de circuitos circulares (anéis). A apresentação dos resultados nesta dissertação é em formato de mapas, presumindo que a visualização da hierarquia topológica na planta de acessos enseja maior riqueza acerca de relações entre a forma urbana e seus usos. 2.1.2 Segmentando eixos de movimento Uma das maneiras de refinar a representação linear, o mapa de segmentos, consiste em segmentar os eixos de movimento nos pontos onde as linhas axiais se cruzam, como ilustrado na Figura 8. O vértice do grafo passa a ser o segmento, cada cruzamento do que era uma linha axial passa a ser o encontro entre as pontas dos segmentos, as pontas curtas soltas são desprezadas — as pontas longas soltas são interpretadas como acessos terminais (vias sem saída). Uma avenida reta e longa passa a ser representada por sucessivos segmentos. Figura 8 – Segmentos derivados da representação axial. linhas axiais segmentos oriundos das linhas axiais Fonte: criação sobre fundo copiado de Al-Sayed et al. (2014, p.12). Embora a análise apoiada no mapa axial tenha sido útil, há décadas, para indicar a emergência de atividades que se beneficiam do movimento ao longo dos acessos de uma cidade, a linha axial é menos proficiente para captar linhas semi-contínuas no sistema de eixos (AL- SAYED et al., 2014, p. 73). O mapa de segmentos permite ressaltar diferenças de acessibilidade entre trechos da mesma linha axial, útil para análises de parcelas menores que o mapa como um todo. 2 Vide Apêndice A.1.3, página 115, acerca da distribuição e a chamada assimetria relativa. Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 34 Um fator de quebra de continuidade na representação do espaço decorre da sinuosidade de algumas vias ou da disparidade entre curvas e retas, devido à curva ser representada por linhas retas concatenadas. Vias sinuosas são perceptíveis pelo passante como um único espaço; esse efeito psicológico é demonstrado por Hillier e Iida (2005). Medeiros (2004), Medeiros e Amorim (2005) e Medeiros (2015) traduzem tal efeito em termos da relação de continuidade entre eixos ou segmentos. Em estudos empíricos acerca do arranjo espacial de cidades brasileiras, inicialmente motivados no caso de Recife, foi detectado que a representação axial mascarava a continuidade em avenidas curvilíneas. A representação de segmentos por si só não garante a preservação da noção de espaço do passante em movimento ou a apreensão da continuidade em uma sequência de segmentos concatenados em curvas. Em face disso, na Análise Angular de Segmentos (TURNER, 2000; TURNER, 2001), um peso é associado para cada ângulo entre segmentos — dois segmentos em ângulo de 180°(ou 0°) são tidos como se fossem o mesmo espaço, contínuo, então o peso é 0, enquanto dois segmentos em ângulo de 90°tem o peso 1, indicando que a mudança ortogonal na direção rompe a percepção de continuidade no encadeamento de espaços; a distância entre 0 e 1 é ponderada para cada ângulo da mudança de direção. O valor da distância topológica é ajustado conforme os ângulos. A distância topológica ponderada pelos ângulos é ilustrada na Figura 9: partindo do ponto destacado, há dois caminhos com três segmentos, que teriam 3 passos de profundidade cada, se os ângulos fossem desconsiderados; uma mudança de direção a 30° recebe o peso 0, 33 (um terço do ângulo reto), a 45° recebe o peso 0, 5 (metade do ângulo reto), a 60° recebe o peso 0, 67 (dois terços do ângulo reto); considerando a ponderação pelos ângulos, um dos caminhos passa a equivaler a 2 passos de profundidade e o outro, a 1, 8 passos de profundidade. Figura 9 – Distância topológica ponderada pelos ângulos Fonte: adaptado de Srinurak, Mishima e Sukwai (2016, p.2) Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 35 2.1.3 Suporte computacional para manipular e analisar mapas axiais e de segmentos A geração de mapas de segmentos obtida de mapas axiais, incluindo a extração de seus parâmetros topológicos, foi realizada por meio do complemento de análise da sintaxe do espaço Space Syntax Toolkit3 (GIL, 2016; GIL et al., 2015; GIL, 2015), que possibilita que plantas de arranjos espaciais criados ou manipulados no sistema de informação geográfica QGIS (QGIS Development Team, 2016) sejam processadas pelo aplicativo de análise da sintaxe do espaço DepthmapX4 (VAROUDIS, 2016) . Existem maneiras alternativas auxiliadas por aplicativos de computador para a criação de mapas de segmentos que não partem da representação axial. Os últimos anos testemunham o desenvolvimento da criação de mapas de segmentos partindo da linha central das ruas, o segmento de reta usado em plantas digitais para designar vias (KOLOVOU et al., 2017), propondo uma técnica para automatizar e minimizar o esforço na geração do mapa de segmentos com base em vias previamente digitalizadas5. Para o presente estudo, a razão para não criar mapas de segmentos escorados na linha central das ruas é de ordem prática: o mapeamento do município de Tibau do Sul nos repositórios de mapas disponíveis na internet não contempla uma quantidade substancial de ruas da Praia da Pipa. Por outro lado, o esforço de partir da representação axial para gerar mapas de segmentos preserva propriedades espaciais que aludem ao encadeamento de porções de espaço — vazios acessíveis — que acompanham vias e demais espaços abertos públicos, e por isso é adequado ao objetivo de relacionar espaço com potencial de movimento. Os mapas axiais e de segmentos gerados nesta pesquisa propiciaram a representação de dois tipos de movimento: movimento-para (to-movement), e movimento-através (through-movement), como explicados adiante. A invariabilidade dos eixos em ambas as representações axiais, de 2006 e 2013, foi resguardada pela extração de linhas da representação mais recente para a mais antiga. Assim, os eixos de movimento que se mantiveram durante a transformação viária ao longo do tempo 3 Nas versões disponíveis entre setembro de 2016 e junho de 2017 no repositório do código aberto e livre dessa ferramenta em . Os primeiros testes das representações axiais realizados no âmbito desta dissertação auxiliaram na correção da questão #143 (bug) acerca do tratamento das tabelas de mapas de segmentos. As correções foram publicadas no repositório no dia 25 de janeiro de 2017; além disso, em versões posteriores, a largura de alguns campos da tabela foi ampliada, viabilizando o tratamento de uma variação maior dos parâmetros. Versões anteriores são pouco confiáveis quanto à replicabilidade da elaboração dos mapas de segmentos utilizados nesta dissertação. 4 Derivação do Depthmap, criado por Alasdair Turner. No caso do presente estudo, foi usada uma adaptação específica para Space Syntax Toolkit: o DepthmapXnet, mantido por Tasos Varoudis em 5 Como na base pública de mapas OpenStreetMap (OPENSTREETMAP FOUNDATION, 2016). Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 36 permanecem nas duas representações. Este procedimento foi apoiado em estudos anteriores de confrontação diacrônica de mapas axiais publicados pelo grupo de pesquisa Morfologia e Usos da Arquitetura (MUsA), com destaque para as reveladoras comparações entre a estrutura espacial de Natal e Dakar evidenciadas por Trigueiro et al. (2017). 2.2 CENTROS DE MOVIMENTO-PARA E MOVIMENTO-ATRAVÉS Pessoas vão de um lugar para outro, em caminhos com mais ou menos quebras de percurso. Cada uma dessas mudanças de direção nos percursos interfere no acesso entre origem e destino. A distância topológica é atribuída pela quantidade de mudanças de direção no caminho de um ponto a outro. Tomando exemplos do cotidiano, a ideia aqui é expressar o quão fácil é explicar para um viajante perdido como chegar a um lugar pelas vias principais, ao invés de descrever um caminho complicado mesmo que mais curto em distância métrica: “siga em frente e vire no primeiro semáforo à esquerda” traduz uma distância topológica mais curta que “vire à esquerda, depois na segunda à direita, em seguida vire à esquerda, e depois. . . ” até o viajante não conseguir se lembrar. Estudos de sintaxe do espaço demonstram que pessoas preferem o caminho mais simples, topologicamente mais curto, mesmo quando geometricamente mais longo, como ilustra a Figura 10. Figura 10 – As pessoas preferem os caminhos mais simples. A figura da direita apresenta um trajeto topologicamente mais curto embora geometricamente mais longo. Fonte: Stonor e Parham (2011). A Figura 11 apresenta o movimento-para: partindo de cada espaço para todos os demais espaços conseguimos calcular quantas mudanças de direção, passos topológicos, são necessárias para alcançar um espaço. Se poucos passos, a profundidade é rasa, do contrário a distância topológica é profunda; a média da profundidade a partir de cada espaço ressalta o quão assimétrica é a relação entre os espaços do sistema. Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 37 Figura 11 – Movimento-para. Idas e vindas, de cada espaço para os demais do sistema. a. b. Mapa de Integração c. Integração, centralidade topológica (cidade de Chester) Fonte: adaptado de Stonor e Parham (2011). Em termos de profundidade topológica, a acessibilidade ao movimento-para é parâmetro denominado integração (HILLIER; HANSON, 1984, pp.108-109). Os lugares mais acessíveis ao movimento-para são os mais integrados à malha de acessos como um todo. Os valores obtidos com o cálculo dos grafos são organizados em mapas de integração6 (Figura 11-b). Os espaços mais integrados tendem ao vermelho na escala de cores, e os menos integrados ao azul. O valor de integração mais alto equivale ao eixo ou segmento que alcança todos os demais com o menor número de passos topológicos. Os aglomerados destacados em vermelho indicam a concentração de alta acessibilidade-para (Figura 11-c). Enquanto o movimento-para revela a distribuição da facilidade de acesso ou alcance dos destinos, o movimento-através expressa a elegibilidade dentre vários caminhos de um espaço a outro. Quando pessoas espalhadas em todos os espaços caminham de um lugar para outro pela rota topologicamente mais curta, existem alguns trechos de caminhos que são passados mais vezes que outros. Neste caso, os caminhos mais acessíveis ao movimento-através são os com maiores chances de serem escolhidos (Figura 12). O parâmetro desta “escolhabilidade” é denominado Choice (HILLIER et al., 1987, p.237). Nas Figuras 13 e 14, os espaços com parâmetro Choice de valor elevado tendem ao vermelho na escala de cores, e os com menor valor, 6 No cálculo com grafos, o parâmetro é padronizado para facilitar comparações, vide distribuição em diamante no Apêndice A Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 38 ao azul. Em grafos, o parâmetro choice corresponde a betweenness centrality (intermediação) (FREEMAN, 1977), baseado no número de menores caminhos de todos os vértices para quaisquer outros vértices; esse número permite identificar a concentração de eixos mais perpassáveis do sistema. Figura 12 – Movimento-através. Sobreposição de cami- nhos mais curtos tem maior potencial de es- colha pelas pessoas. Fonte: Stonor e Parham (2011). Figura 13 – Movimento-através, mapa com o parâme- tro Choice. Fonte: Stonor e Parham (2011). As linhas vermelhas da Figura 14 destacam o esqueleto de acessos entre os centros e as demais áreas e propiciam a emergência de novos centros em longo prazo. Esse processo de formação e localização de centros é descrito como centralidade por Hillier (1999, p.107), esmiuçando que a configuração da malha viária conforma padrões de movimento que subsequen- temente influenciam as escolhas do uso do solo e o desenvolvimento da área como um atrator na disposição do assentamento como um todo. Figura 14 – Choice revelando um esqueleto de acessos (cidade de Chester). Fonte: Stonor e Parham (2011). Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 39 A formação de estruturas permeáveis contendo arranjos mais eficientes aos desloca- mentos que outros é consoante com a teoria da economia do movimento, na qual a organização espacial dos assentamentos humanos gera um padrão de distribuição do fluxo de pessoas, dos mais movimentados aos mais calmos, que influencia as escolhas de uso do solo (HILLIER, 1996, pp. 125-127). O centro funcional é caracterizado pela concentração de comércio vare- jista e serviços, atividades que se beneficiam do movimento de pedestres nas ruas. Segundo Hillier (1999, p.107), o centro vivo se manifesta onde a concentração de acesso privilegiado ao movimento corresponde ao centro funcional. Griffiths (2017, p.64.4) sugere que as atividades humanas que dependem do movimento de pessoas são premiadas pelo modo como os espaços estão articulados. 2.2.1 Centralidade pervasiva, raios de abrangência dos centros e escalas de movi- mento Um centro em escala local é onde a mais alta acessibilidade se concentra relativa a per- cursos abrangendo as proximidades. Ir até a padaria da esquina perto de casa ilustra um percurso associável à escala local. Se a concentração de espaços é a mais acessível em relação a percursos abrangendo a malha de acessos como um todo, este é um centro em escala global. A padaria do exemplo pode estar em um centro local, mas também pode estar subordinada ao globalmente mais acessível; as relações entre local e global no sistema de acessos são intrincadas. Hillier (2009, p.K01:6) constata que a centralidade se espalha na cidade em um padrão denominado centralidade pervasiva, no qual os centros se ajustam a diferentes abrangências do movimento na malha de acessos. O raio de abrangência da análise de segmentos deve ser condizente com a escala do movimento; em uma determinada cidade, um raio de 400m é capaz de abranger o centro com vocação para sediar a padaria da vizinhança, enquanto um raio de 4km consegue refletir a escala de movimento do automóvel e seu correlato favorecimento a grandes lojas ancoradas em estacionamentos. A escolha dos raios deve levar em conta aspectos culturais que influenciam o padrão de movimento, a proporção de pessoas se movendo a pé ou motorizadas, porque as distâncias médias de deslocamento variam para diferentes culturas. Hillier (2009, p.K01:4) sugere como raios métricos de abrangência típicos os de 250m, 500m, 750m, 1000m, 1250m, 1500m, 2000m, 2500m, 3000m, 4000m, 5000m, 7500m, 10000m, 15000m, 20000m e assim por diante, para uma exploração inicial. Serra e Pinho (2013) selecionaram 15 raios entre 400m e 3000m para identificar padrões policêntricos na região metropolitana do Porto, reconhecendo Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 40 três faixas na escala de concentração do movimento: a escala da vizinhança (400m a 1200m), a escala da cidade (1200m a 8200m) e a escala regional (8200m a 30000m) (Figura 15). Figura 15 – Centros para diferentes escalas de movimento (região metropolitana do Porto) De cima para baixo: escala da vizinhança, escala da cidade e escala regional. Fonte: Serra e Pinho (2013, p.193) Para a malha viária do município de Tibau do Sul, os raios escolhidos em caráter exploratório para este estudo foram os de 400m, 600m, 800m, 1000m, 1200m, 1600m, 2000m, 2400m, 3200m, 4000m, 5000m, 6000m, 7000m, 8000m, 10000m, 12000m e o raio n, onde n simboliza todo o sistema de acessos, o raio global. A extensão de oeste a leste do município é de aproximadamente 13km; a maior diagonal em linha reta que cruza o município tem 14km de comprimento; o caminho mais curto entre Umari, no extremo oeste da malha, e Sibaúma, no extremo sudeste, perfaz 16km de segmentos. Como foram analisados quatro parâmetros para cada raio, duplicados para os anos de 2006 e 2013, 136 mapas foram gerados; os mais representativos foram selecionados levando em conta redundâncias, semelhanças e diferenças que possibilitaram o reconhecimento de padrões de centralidade nas escalas global e local. 2.2.2 Síntese dos parâmetros topológicos e padronização dos atributos de acessibi- lidade Padronização, ou normalização, é o ajuste dado a uma coleção de valores para viabilizar a análise dos resultados; a distribuição dos valores é delimitada segundo algum parâmetro de referência. Frequentemente usamos normalizações em nosso cotidiano sem nos darmos conta. . . alguém é alto ou baixo, grande ou pequeno, gordo ou magro, somente o é em relação a Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 41 uma referência, que pode ser outra pessoa, coisa ou alguma unidade de medida. . . há pessoas que se submetem a cirurgias para ajustarem suas medidas a um modelo. A normalização organiza os limites de comparação do modelo. O modelo não é a realidade, mas pode ser comparado à realidade; a normalização ajusta o modelo para torná-lo comparável, no esforço de tangenciar a realidade. Afirmar se um sistema de espaços é mais ou menos acessível requer um padrão de referência. Ou ainda, o modelo de acessos de Tibau do Sul em 2006 reflete um sistema, em 2013 reflete outro; compará-los demanda uma padronização. Se o sistema é modelado por eixos ou segmentos, os procedimentos de padronização são distintos. Na análise axial, o parâmetro de integração, que remete ao movimento-para , é aqui simbolizado como INThh7; o parâmetro é ajustado com base na comparação do grafo analisado com um grafo de referência na forma de diamante8 (HILLIER; HANSON, 1984, 111-112). O parâmetro choice axial é aqui simbolizado por CHaxial; remete ao movimento-através * * * Na Análise Angular de Segmentos, o sistema topológico idealizado (o grafo) fez concessões à distância geométrica e aos efeitos cognitivos dos ângulos na percepção para melhor capturar nuanças do potencial de movimento de pessoas nas cidades. Aquela padronização do parâmetro de integração axial, referenciada na forma do diamante, não é aplicável ao sistema de segmentos com a distância ponderada pelos ângulos. A normalização em segmentos consiste em modelar a acessibilidade, integração e choice, como parâmetro da relação custo–benefício do movimento no espaço (HILLIER; YANG; TURNER, 2012, p.160). O benefício é o movimento. O custo remete ao menor gasto de energia dispendida por uma pessoa para percorrer um percurso em relação a outros percursos, o menor ângulo entre os segmentos oferece o menor custo. Hillier, Yang e Turner (2012) defendem que o parâmetro angular de segmentos normalizado, especialmente o choice (NACH), é efetivo para a predição de movimento, respondendo à necessidade de detectar estruturas locais sutis concernentes à centralidade pervasiva; a menor mudança de ângulos captura como as pessoas percebem a distância no sistema de espaços, ajustando melhor os parâmetros de acessibilidade à percepção de espaço do transeunte9. 7 HH é acrônimo de Hillier & Hanson. 8 Diamond-shaped graph (HILLIER; HANSON, 1984, p.111-112), vide Apêndice A. 9 O cálculo normalizado de choice angular (NACH) e integração angular (NAIN) é apresentado no Apêndice A.2. Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 42 Neste trabalho, a posição relativa do valor do atributo é mais importante que o valor absoluto deste atributo. Os grupos de valores próximos são ordenados segundo uma escala da hierarquia de acessos, representada por uma escala de dez cores, das quais o vermelho () se refere ao grupo mais acessível e o azul () se refere ao grupo menos acessível, gerando uma escala de acessibilidade [Alta  Baixa]. Os agrupamentos são feitos por um algoritmo do Space Syntax Toolkit que classifica os dados em quebras naturais (método de Jenks, natural breaks); cada cor corresponde a uma classe, cuja largura no gráfico é ajustada de modo a minimizar a variância dentro de cada classe (Figura 16). Figura 16 – Escala de cores correspondendo a dez classes com quebras naturais. Linhas pontilhadas: µ = valor médio, σ = desvio padrão. Fonte: Produzido com QGIS. Histograma de NAINr=n para a malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. 2.3 ANIMAÇÃO E POTENCIAL DE ENCONTROS Encontro é o estado em que duas ou mais pessoas tornam-se co-presentes na mesma porção de espaço; é a convergência de pessoas para uma mesma porção do espaço, quando pelo menos uma está em movimento. O escopo do encontro, neste estudo, é o do movimento natural (HILLIER et al., 1993), que é o movimento decorrente da disposição do sistema de espaços. O movimento natural é não determinístico, diz respeito à chance de ocorrência de movimento proporcionada pelas condições de acessibilidade da configuração espacial. Existem chances variadas de pessoas em movimento se encontrarem em uma mesma porção de espaço no sistema de acessos. O potencial de encontros é a propriedade do arranjo espacial oferecer maiores ou menores chances de encontro em determinada porção de espaço. No caso do movimento natural, o encontro tem algo de fortuito, casual, em parte por não ser induzido por atratores. Entretanto, um aglomerado de pessoas concentrado em um espaço Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 43 na Pipa pode se tornar um atrator. O espaço favorece movimento, movimento favorece encontros, encontros podem atrair mais gente, favorecendo atividades que se beneficiam do movimento e dos encontros. Entendendo animação como a concentração de atividades que se beneficiam do movimento, o potencial de encontros estimula a animação em uma porção de espaço. Animação é atinente ao perambular, os co-presentes que potencialmente veem ou são vistos e eventualmente permeiam, com os olhos ou com os pés, os recintos que se abrem à rua. É menos factível semelhante animação acontecer com pessoas transitando encapsuladas em carros. . . mesmo se, por exemplo, este penetra nos mirantes do Chapadão ou de Cacimbinhas, onde os ocupantes dos veículos costumam estacionar e descer de seus invólucros para fruir da paisagem e estar no local. A animação aqui investigada está no âmbito de atividades do pedestre. Neste trabalho, a animação tem como componentes o potencial de encontros (co- presença) e o trespassar permissível a pedestres nas fronteiras entre espaço público e privado. Este último componente remete à fachada ativa de um edifício, entendida como o lado com aberturas que conectam um recinto de uso não residencial à esfera pública e admitem o acesso irrestrito a transeuntes no horário de funcionamento do estabelecimento. Estabelecimentos com atividades que se beneficiam do movimento deixam-se abrir para a rua, como já discorria Jacobs (1961) ao defender que a qualidade de vida é conquistada ao nível do chão, relacionando a animação nas ruas com a acessibilidade nas construções lindeiras às ruas, a exemplo das fachadas ativas do comércio varejista, que se contrapõem aos muros cegos, arranha-céus e demais claustros que não dialogam com a vida urbana. Décadas após os ensaios de Jacobs, estudos empíricos (NETTO, 2016) confirmam a correspondência entre a abertura nas fachadas e a animação na rua. Em estudos de sintaxe do espaço, é conveniente que os vestígios da acessibilidade entre rua e edifício consigam ser traduzidos em termos dos acessos que comunicam os espaços públicos aos privados, aqui chamada interface. Os domínios do espaço privado são os de quem tem acesso ao recinto e detém a chave da porta ou de quem tem a permissão de passar pelo signo avisando que o acesso é restrito, como uma placa, um cachorro latindo na coleira, um olhar cismado de algum morador ou uma barreira que os esconde do espaço público. Para Hillier e Hanson (1984, p.17), interface é a mediação entre público e privado — a marcação do que é restrito ou universalmente acessível é arbitrada para se adequar à análise. Holanda (2002a), por exemplo, categoriza-as discriminando variáveis como número médio de entradas por espaço convexo, superfície total de espaço aberto, proporção de espaços convexos cegos, dentre outras que capturam a razão entre permeabilidade e barreiras. A interface nos diz sobre o quanto o continuum do espaço permanece ou é interrompido, se há tendência de Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 44 confinamento e esmaecimento do movimento pela inibição de transeuntes, ou do contrário, uma tendência de animação estimulada pelo encontro de transeuntes. Embora as categorias de interface propostas por Holanda tenham inspirado este traba- lho, foram adaptadas para se adequarem a limitações na coleta de dados, considerando que a mensuração da superfície total de espaço aberto é inexequível por meio das plantas de 2006 e 2013. O que há em comum nestas superfícies é que são permeáveis ao movimento oriundo da rua, ao menos nos horários de funcionamento dos estabelecimentos, resumem, sem pormenorizar, portas das fachadas ativas, entradas de galerias a céu aberto, varandas, balcões de venda rente à calçada, mesas de restaurante compartilhando a calçada, dentre outras interfaces. A permeabilidade das interfaces por segmento dá conta do número de acessos diretos entre rua e recinto não privativo, como se este fosse uma conexão intermitente capaz de abocanhar parte do movimento dos passantes quando ativada. Hillier, Yang e Turner (2012, p.191) explicam que o benefício inerente ao parâmetro choice angular em segmentos, a um raio específico, é a possibilidade de uma pessoa permane- cendo em um espaço ser encontrada por outras pessoas que passam através daquele espaço, mas não necessita usar energia para reunir-se aos outros em outros espaços 10. O grifo (nosso) frisa que a definição do encontro é contextualizada pelo potencial de movimento proporcionada pelo espaço, o movimento natural. O potencial de encontros deve ser mais alto se a pessoa permanecendo em um espaço estiver em um centro de fácil acesso e se os transeuntes que a encontram vierem de rotas de fácil percurso. Tal facilidade é aferida em termos de energia demandada, o custo do movimento. Relacionou-se a concentração de alta acessibilidade ao movimento-para e ao movimento- através com centros funcionais para diferentes escalas de movimento, reunindo indícios de acessibilidade das interfaces relacionáveis ao potencial de encontros; o resultado permite estimar o quanto a configuração da malha de acessos de Tibau do Sul afeta o potencial de encontros na Praia da Pipa. A inquietação de verificar se a construção do anel viário alterou substancialmente a estrutura de acessos foi incorporada. 10 “CHr can be thought to measure a kind of benefit, that is, the possibility that a person standing at a space can be encountered by other persons passing through that space, but need not use energy to go to meet the others at other spaces” (HILLIER; YANG; TURNER, 2012, p.191). Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 45 O efeito não determinístico da configuração espacial sobre o movimento (ou, a galinha entrou na igreja porque a porta estava aberta) A análise configuracional não garante que pessoas irão se encontrar ou esquivar em determinada porção de espaço, mas aponta condições físicas para uma encontrabilidade. O es- copo probabilístico do potencial de movimento, ou de encontros, contextualiza-se na arquitetura enquanto campo de possibilidades e restrições, em termos emprestados de Holanda (2013, pp. 113-135). O enunciado vem de uma brincadeira infantil na qual a graça é a ambiguidade na determinação de causa e efeito, como quem diria que a abertura da porta determinasse a decisão da galinha. A organização do espaço provoca em seus ocupantes efeitos que embora não determinísticos podem ser inferidos. “Porta” descreve uma metáfora, seu estado de abertura nos diz sobre a (in)acessibilidade entre as porções de espaço. Decorre disso que as rupturas, descontinuidades, no espaço apresentam uma menor incerteza acerca do movimento, posto que se “porta estiver fechada” a probabilidade da galinha ou alguém entrar é extremamente baixa ou nula. Aliás, a probabilidade não decorre da galinha e sim das condições de acesso dadas pela combinação de elementos que conformam o espaço, é a probabilidade do espaço proporcionar movimento. O movimento proporcionado pelo arranjo espacial, o movimento natural, não é determi- nado, segue princípios, manifesta tendências. Por exemplo, se pessoas em um parque extenso e gramado perambularem em trajetos aleatórios, algumas atravessando o parque, outras procurando local para um piquenique, brincar, meditar, haveria um tendência do gramado se desgastar pelos caminhos mais acessados, ocasionalmente formando trilhas. . . seria precipitado inferir que estas trilhas determinem os trajetos das próximas pessoas pelo campo; é mais plausível aceitar que as trilhas sejam reflexos de uma tendência de movimento. O traçado seria o efeito não determinístico explicável pelo princípio da economia do movimento (página 39), considerando a busca pela eficiência no gasto de energia dos deslocamentos, uma tendência pelo menor caminho. Esse estudo prioriza uma qualidade de encontro não determinado mas que pode ser presumido pela configuração espacial, o encontro casual. Isto soa como um paradoxo para o caso da Pipa se observarmos que a economia do turismo é repleta de exemplos de movimento guiado por atratores como as praias, os mirantes nas falésias e outras belezas naturais; não é raro pessoas serem literalmente guiadas por guias turísticos em passeios e encontros programados, portanto não tão casuais e tampouco pertinentes ao movimento natural. Eis que, quiçá à revelia Capítulo 2. O espaço da animação: delineando movimento e potencial de encontros 46 das agências de turismo e dos planejadores urbanos, o encontro casual entre pessoas se torna também um atrativo turístico, motivando o esboço de um cenário no qual a economia do turismo da Pipa presumidamente se beneficia dos componentes não determinísticos do potencial de movimento oferecido por seus espaços, manifestado pelo burburinho na rua. É como quem brinca: por que as pessoas se encontraram na rua? Porque os espaços estavam acessíveis. . . E por que se encontraram naquele ponto do espaço e não em outro? Provavelmente porque aquele ponto é o mais fácil de chegar. 47 3 CONFIGURAÇÃO ESPACIAL E VESTÍGIOS DE ANIMAÇÃO NA PRAIA DA PIPA: MOVIMENTO PROPORCIONADO PELA MALHA DE ACESSOS, ATIVIDADE FA- VORECIDA PELO MOVIMENTO As belezas naturais são um atrativo ao longo da orla, desde a sede de Tibau do Sul até Sibaúma passando pela Praia das Cacimbinhas, Ponta do Madeiro, Praia do Curral (entre esta e Madeiro fica o Santuário Ecológico da Pipa), Praia do Amor (Praia dos Afogados) e Praia das Minas (berçário de tartarugas marinhas). A despeito do magnetismo das resplandecentes praias e falésias, esta análise mostra que a estrutura espacial do município de Tibau do Sul privilegia consideravelmente o acesso à Pipa. Este capítulo trata da acessibilidade da malha e de seu potencial de geração de movi- mento. Compara pontos de concentração de vias mais acessíveis — formadoras de centralidade, portanto — em diferentes raios de abrangência. A concentração de eixos e segmentos topologi- camente mais acessíveis que incluem a Avenida Baía dos Golfinhos, aponta a presença de um centro em abrangência global, considerando o município de Tibau do Sul, recorte espacial desta dissertação. O capítulo se debruça sobre distribuição da animação na estrutura espacial, incorporando aspectos complementares à acessibilidade, explora o tamanho de segmentos, pormenoriza a diversidade de usos, versa sobre a permeabilidade entre a rua e recintos privados não residenciais. Discute ainda a intervenção na malha viária (2010), que resultou na formação de um anel viário que incluiu em seu circuito a avenida Baia dos Golfinhos. A inserção do anel não parece ter afetado substancialmente a hierarquia de acessos da estrutura, mas apontou sutis alterações, considerados alguns raios de abrangência, indicando que a combinação entre alta acessibilidade, baixa densidade, pouca variedade de uso e escassa permeabilidade entre rua e recintos fechados assinalam uma tendência de favorecimento ao movimento de automóveis. 3.1 A PRAIA DA PIPA E A CENTRALIDADE NA MALHA DE ACESSOS DE TIBAU DO SUL O povoado da Praia da Pipa concentra muitos eixos ou segmentos com alta acessibilidade- para em abrangência global na malha de acessos do município de Tibau do Sul. As evidências são apresentadas no mapa axial (Figura 17) e no mapa de segmentos (Figura 18). Ambos os mapas indicam que, para quem se movimenta na malha de acessos do município, é topologica- Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 48 mente mais fácil chegar nas imediações do povoado da Pipa. A diferença entre os dois mapas é que o segundo considera o custo angular do movimento (como visto no Capítulo 2); assim a baixa ocorrência de intersecções ortogonais na parte norte do povoado da Pipa explica porque o parâmetro em segmentos destaca um encadeamento contínuo ao norte do povoado, enquanto o parâmetro axial, que não relativiza os ângulos do traçado sinuoso, apresenta maior acessibilidade no miolo do aglomerado de eixos. Figura 17 – Acessibilidade-para global. Mapa axial da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Integração axial (INThh raio= n). Pipa Sibaúma Tibau do Sul TIBAU DO SUL Cabeceiras PiauUmari CANGUARETAMA Lag oa de Gu ara íras OCEANO ATLÂNTICO G O IA N IN H A Praia das Cacimbinhas Ponta do Madeiro Praia do Curral Praia das Minas Praia do Amor (afogados) Chapadão INThh: Alta  Baixa AREZ VILA FLOR CANGUARETAMA Bela Vista Manimbú Munim Pernambuquinho Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. O aglomerado de eixos concentrados na Pipa pode ser definido como uma batata espetada1 ((HILLIER, 1999, p. 118)), que consiste em um compacto de linhas conectadas com pontas ramificando-se em busca de expansão. A continuidade da alta acessibilidade entre eixos ou segmentos adjacentes também di- fere nos dois mapas, particularmente na malha de acessos da batata espetada na Pipa. Comparada com a integração axial, o parâmetro em segmentos relativo aos dois níveis mais altos da escala 1 Spiky potato. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 49 Figura 18 – Acessibilidade-para global. Mapa de segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Integração angular em segmentos normalizada (NAIN, raio= n). Pipa Sibaúma Tibau do Sul TIBAU DO SUL Cabeceiras PiauUmari CANGUARETAMA Lag oa de Gu ara íras OCEANO ATLÂNTICO G O IA N IN H A Praia das Cacimbinhas Ponta do Madeiro Praia do Curral Praia das Minas Praia do Amor (afogados) Chapadão AREZ VILA FLOR CANGUARETAMA Bela Vista Manimbú Munim Pernambuquinho NAIN: Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. tem uma conformação mais linear que se estende de oeste a leste, do povoado de Cabeceiras às proximidades do Chapadão. No mapa axial, o grupo de segmentos no nível mais alto de acessibilidade-para distribui-se no miolo da batata espetada de modo mais tortuoso no encadea- mento de eixos de oeste a leste. Levando em conta somente a batata espetada, o encadeamento de segmentos da mais alta acessibilidade corresponde à Avenida Baía dos Golfinhos. O mapa de segmentos é mais fidedigno que o mapa axial no tocante à Avenida Baía dos Golfinhos2 concentrar maior animação em termos de atividades econômicas nas margens das ruas e maior movimento de transeuntes, supondo que essas características decorram em grande parte do movimento natural. Comparando a batata espetada da Pipa antes e depois da construção do anel viário, as diferenças de acessibilidade são sutis ou pouco substanciais. O resultado é reconhecível através do confronto entre as bases de 2006 e 2013 de mapas axiais e de segmento angular. Antes de 2 As nuanças de acessibilidade na Avenida Baía dos Golfinhos serão melhor expostas na seção 3.2. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 50 2010, Pipa era conectada à sede de Tibau do Sul pela rodovia RN-003 (alargada e pavimentada em 1993), ao povoado de Piau por uma estrada não pavimentada e ao povoado de Sibaúma por uma estrada asfaltada em 2005 (a oeste da Pipa) e por uma via costeira (não pavimentada). Em 2010, uma nova estrada partindo do povoado de Cabeceiras inaugurou um atalho para Pipa e Sibaúma. O conjunto de obras foi realizado com recursos do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR/NE) e incluiu o anel viário da Pipa e a pavimentação de um trecho costeiro entre Pipa e Sibaúma. A formação do anel viário da Pipa se deu pela ampliação e pavimentação de aproximadamente 1600m de vias existentes e a adição de uma nova rua de aproximadamente 480m de comprimento ligando-as à Avenida Baía dos Golfinhos, estabelecendo um circuito em anel (Figura 19). Figura 19 – Alteração na malha viária em 2010: atalho para Cabeceiras e formação do anel viário da Pipa (detalhe). Avenida Baia dos Golfinhos Av. B. dos G olfinhos : vias novas. : vias alargadas. : Avenida Baía dos Golfinhos Fonte: Adaptado de Martins e Trigueiro (2017). Base:IDEMA (2006), Google Earth (2013) Nas comparações, a Avenida Baía dos Golfinhos demonstrou ser altamente acessível ao movimento-para em abrangência global em 2006 e em 2013 (Figuras 20 e 21). O contorno circular do anel viário delineado pelas duas mais altas posições na hierarquia de acessos-para é perceptível no mapa axial referente a 2013 (Figura 20); mas antes, em 2006, as vias que viriam a ser posteriormente pavimentadas para fazer o anel viário já apresentavam valores altos, indicando que o anel reforça uma configuração espacial pré-existente. No mapa de segmentos, algumas diferenças de acessibilidade após a construção do anel viário puderam ser percebidas: a rua nova feita para o anel viário surge como um segmento Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 51 Figura 20 – Acessibilidade-para global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Inte- gração axial global. 2006 2013 INThhr=n: Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base:IDEMA (2006), Google Earth (2013) Figura 21 – Acessibilidade-para global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Inte- gração angular normalizada global. 2006 2013 NAINr=n: Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base:IDEMA (2006), Google Earth (2013) na segunda posição mais alta da hierarquia de acessos (); a segunda posição mais alta de acessibilidade-para global alcança as belezas naturais do Chapadão, mais a leste da Avenida Baía dos Golfinhos; a distribuição do topo da hierarquia () permanece quase a mesma, enquanto os segmentos da parte da malha viária circundada pela conformação em anel sobem uma posição na hierarquia, mas ainda não passando da segunda posição. Esta elevação da acessibilidade no interior da conformação circular deve ser vista com cautela, tendo em conta que pelos menos duas ruas deixaram de existir nesse miolo de vias após 2006, obrigando os passantes a se destinarem Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 52 à Avenida Baía dos Golfinhos3 (Figura 22). Em que pesem estas mudanças, a localização da concentração mais acessível-para na malha viária do município permanece a mesma, embora as novas vias tenham esticado o traçado na segunda posição hierárquica. Figura 22 – Concentração da mais alta acessibilidade-para global. Segmentos da batata espe- tada da Pipa em 2006 e 2017 incluindo caminhos pedonais. Integração angular normalizada (NAINr=n). Mapa desconectado da malha viária do município. 2006 ↑↑ → 2017 ↑↑ → : segmentos no grupo da mais alta acessibilidade. : projeção edilícia em 2006 (ocupação) ↑: exemplo de acessos suprimidos no miolo do povoado.→: acesso suprimido ao estacionamento de ônibus. Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006, visitas de campo 2017. Mesmo incluindo no recorte caminhos pedonais em maré baixa, a concentração de segmentos mais acessíveis globalmente não migrou para a praia (Figura 22). A linha da mais alta acessibilidade se encurtou após a construção do anel viário; em 2006, o início situa-se antes do estacionamento de ônibus, mas em 2017, se inicia depois do cemitério. O encurtamento pode ser explicado pela supressão de um acesso de pedestres entre o estacionamento de ônibus e o emaranhado de ruas no miolo da batata espetada em decorrência da construção de um condomínio murado isolando os terrenos do antigo caminho. Contudo, a representação linear obtida nas visitas de campo apresenta um grau de incerteza maior, becos e passagens podem ter passado desapercebidos no momento da coleta, registros podem ter sido perdidos pelos equipamentos amadores utilizados, e seria mais caro e demorado garantir uma padronização compatível com a ortofotografia de 2006 (IDEMA, 2006). 3 Uma rua foi suprimida com a construção de um condomínio, outra pela ampliação de uma residência; cada intervenção deixou pelo menos uma rua sem saída e com acesso somente pela Avenida Baía dos Golfinhos. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 53 Ainda considerando o recorte pedonal, a praia não se apresentou muito integrada global- mente à malha de acessos, seus segmentos estão em níveis medianos da escala de acessibilidade- para (Figura 23). Figura 23 – Acessibilidade-para global na batata espetada da Pipa em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Integração angular normalizada (NAIN). Mapa desconectado da malha viária do município. 2006 2017 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006, visitas de campo 2017. * * * A acessibilidade alta ao movimento-através é encontrada nas estradas que ligam Pipa a Tibau do Sul, Cabeceiras e Piau; não surpreendentemente, ligações de um lugar a outro têm boas chances de serem relativamente mais escolhidas pelo passante. O mapa de segmentos da Figura 24 ressalta a Avenida Baía dos Golfinhos como a via mais privilegiada globalmente, seguida do percurso entre esta e o Rio do Galhardo, que recebe a estrada vinda de Piau. O mapa captura a memória dessa articulação no conjunto de segmentos correspondentes a caminhos interconectadores de povoados distintos, como um esqueleto estruturante do sistema de acessos do município consolidado junto à expansão da atividade de veraneio. Segundo Simonetti (2015, p.53), o primeiro veraneio da Pipa ocorreu em 1926 em casas conseguidas com pescadores. A barragem que separava a Lagoa de Guaraíras e o mar se rompeu em 1924, submergindo o núcleo urbano de Tibau do Sul; os donos de engenho de Goianinha que veraneavam no povoado de Tibau do Sul passaram a veranear na Pipa. Picadas na mata foram abertas entre Piau e Pipa, Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 54 passando pelo Rio do Galhardo. Em alguma data incerta foi criada a estrada entre o Rio do Galhardo e Sibaúma, pavimentada em 2005. Figura 24 – Acessibilidade-através global. Mapa de segmentos da malha de acessos de Tibau do Sul em 2013. Choice angular em segmentos normalizada NACH raio= n. Pipa Sibaúma Tibau do Sul TIBAU DO SUL Cabeceiras PiauUmari CANGUARETAMA Lag oa de Gu ara íras OCEANO ATLÂNTICO G O IA N IN H A Praia das Cacimbinhas Ponta do Madeiro Praia do Curral Praia das Minas Praia do Amor (afogados) Chapadão AREZ VILA FLOR CANGUARETAMA Bela Vista Manimbú Munim Pernambuquinho ← futura e strada para B R101 — (Rio do Galhardo)→ NACH: Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. Na malha de acessos de Tibau do Sul como um todo, a Avenida Baía dos Golfinhos tem segmentos que são simultaneamente mais fáceis de chegar e mais favoráveis de serem atravessados . No mapa de segmentos, a alta acessibilidade-através ressalta uma linha que atravessa a batata espetada da Pipa de oeste para leste. A linha vermelha de oeste a leste é um enfileiramento de segmentos com alta acessi- bilidade, não se concentra ao redor de um ponto como seria a noção comum de um centro em uma malha aglutinada como a batata espetada. Pedaços alongados dessa linha mais acessível coincidem diferentemente com a concentração de comércio varejista, bares ou demais atividades econômicas que se favoreçam do movimento de pessoas, o que descreveria um centro funcional: há trechos da Avenida Baía dos Golfinhos com essa característica, conhecidamente animados, há trechos com menor ocupação e menos comércio. . . e a ocupação é baixa ao longo do restante da Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 55 linha vermelha, a oeste. Nesta ponta, fora da batata espetada da Pipa, as linhas passam por um posto de gasolina, condomínios, hotéis e ao lado do Santuário Ecológico da Pipa, continuam ladeando condomínios, pousadas e estacionamentos até um pouco depois de adentrar na batata espetada, até que os 24 segmentos mais a leste na Avenida Baía dos Golfinhos passam a ser mar- geados por uma profusão de bodegas, mercadinhos, bares, restaurantes, dentre outras atividades e usos. A Figura 25 amplia o mapa de acessibilidade-através global, da Figura 18, e inclui a projeção da ocupação edilícia de 2006, facilitando a visualizando um adensado edificado em torno de grande parte da Avenida Baía dos Golfinhos e próximo à praia central. Figura 25 – Ampliação da Figura 18 acrescentando ocupação edilícia em 2006. Acessibilidade- para global em 2013. Integração angular em segmentos normalizada NAIN, r = n. PIPA Av. Baía dos Golfinhos Acessibilidade: Alta  Baixa : projeção edilícia em 2006 (ocupação) : posto de gasolina com loja de conveniências. Fonte: Google Earth (2013), IDEMA (2006), visita de campo (2016, 2017) Há vida orbitando fora do adensado edilício do povoado da Pipa, por exemplo, nas imediações do Rio do Galhardo, próximo à ponta oeste da linha de segmentos com a mais alta acessibilidade ao movimento-através (Figuras 24 e 25). Nessa parte está um balneário avivado pelo encontro das lavadeiras da Pipa, que continuam a frequentar o lugar mesmo depois da chegada da água encanada (década de 1980), trazendo roupas, bebidas e comida para assar na brasa para uma tarde de bate-papo aguardado a roupa secar. Embora fontes d’água possam ser um atrator que independa do movimento natural, a acessibilidade pode ter alguma contribuição na Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 56 conservação dos encontros de mulheres nativas e seus familiares no balneário. Ocasionalmente se observa na estrada uma caminhonete carregando um turma de lavadeiras e amigas, pela manhã na ida, ao entardecer, na volta. O deslocamento de pessoas com trouxas de roupas por aproximadamente 4 km do balneário até o meio da Avenida Baía dos Golfinhos é facilitado pelo automóvel, entretanto a animação é dentro do balneário e não na rua. A abrangência de atividades ligadas à Pipa transborda a batata espetada, o que deve ser considerado na exploração dos raios de análise do potencial de movimento. A nova ligação entre Cabeceiras e Pipa é um atalho, encurtando caminhos em distância topológica e métrica — reforçando a acessibilidade ao passante. É uma estrada com poucas curvas. A acessibilidade-através padronizada pelo custo angular (NACH) exprimiu satisfatoriamente este efeito de atalho, mantendo alto o nível de acessibilidade no esqueleto de acessos após a implantação da nova estrada. Comparando com a acessibilidade-através global antes do anel viário ser construído (Figura 26 ), uma espécie de epicentro linear global se mantém na Avenida Baía dos Golfinhos. A tendência de “espichamento” de pontas com alta acessibilidade em direção ao sudeste da batata espetada da Pipa de 2013 já era reconhecível em 2006, antes do anel viário ser construído. Os povoados da beira da Lagoa entre Cabeceiras e Piau sobem para o segundo nível mais alto de acessibilidade-através. Figura 26 – Acessibilidade-através global na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Choice angular normalizada global NACHr=n 2006 2013 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 57 Considerando caminhos pedonais na Pipa, a linha de elevada acessibilidade-através global ganha uma ramificação da Avenida Baía dos Golfinhos em direção à praia central, encontrando brechas na barreira entre o topo da falésia e o nível do mar (Figura 27). É uma antiga rota de pescadores, que chega entre a garagem de barcos e o meio da praia central; atualmente acessa restaurantes à beira-mar (outrora casa de pescadores ou veranistas), hotéis, Figura 27 – Acessibilidade-através global na Pipa em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACH). Mapa desconectado da malha do município. 2006 2017 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006, visitas de campo 2017. pousadas e mais casas de veraneio. Após a construção do anel viário, o traçado circular com acessibilidade-através realçada globalmente permanece. No entanto, a mais alta acessibilidade- para se conforma mais claramente como uma linha do que como um círculo; em 2017, esboça uma curva voltando pela rua nova do anel viário e acessos ao sul, mas ainda sem encerrar o circuito circular. Continua mais fácil chegar na Avenida Baía dos Golfinhos que nos segmentos do anel viário. A rua nova deste anel é relativamente fácil de chegar, e o circuito circular com acessos ao sul continuam contendo os segmentos com maiores chances de serem perpassados por quem vai de qualquer segmento a outro. Na versão recortada, a concentração de acessibilidade-através se prolonga mais para sul do que para leste em relação ao mapa com toda a malha viária de Tibau do Sul. Mesmo subtraindo o restante da malha do município, os segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos continuam no centro mais acessível aos movimento-para e movimento-através em abrangência Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 58 global (agora restrito à batata espetada) (Figura 28 ). Figura 28 – Concentração da mais alta acessibilidade-através global. Segmentos da Pipa em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACHr=n). Mapa desconectado da malha viária do município. 2006 2017 : segmentos no grupo da mais alta acessibilidade. : projeção edilícia em 2006 (ocupação) Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006, visitas de campo 2017. Os eixos com maior acessibilidade ao movimento-para local, abrangendo até três mudanças de direção, distribuem-se em três núcleos urbanos do município que fazem parte da Região Turística de Pipa: a sede municipal de Tibau do Sul e Sibaúma no nível mais alto de acessibilidade e a Praia da Pipa no segundo nível mais alto (Figura 29). A sede municipal de Tibau do Sul reuniu os eixos com a acessibilidade mais alta. Neste assentamento, existem eixos que atravessam a cidade interceptando a maioria dos demais eixos, o que deve ter elevado os parâmetros de acessibilidade. Tendo em vista que a malha viária da sede municipal é uma grelha de acessos quase ortogonal, desconsiderar ângulos nas mudanças de direção deve ter contribuído para realçar seus eixos. Os três eixos que mais favorecem o movimento-para local acomodam desde mercados e quitandas, que pressupostamente atendem à escala da vizinhança, até serviços e instalações que respondem a todo o município, como a sede da prefeitura, a câmara dos vereadores, o hospital da cidade e o ginásio de esportes. Contudo, estes últimos usos, institucionais, dependem pouco do movimento natural para atrair pessoas, diferente do comércio varejista. O centro topológico local coincide com um centro funcional também na abrangência da vizinhança até três mudanças de direção. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 59 Figura 29 – Acessibilidade-para local – Mapa Axial, Integração INThh, raio topológico = 3. Malha viária de Tibau do Sul em 2013 . Pipa Sibaúma Tibau do Sul TIBAU DO SUL Cabeceiras PiauUmari CANGUARETAMA Lag oa de Gu ara íras OCEANO ATLÂNTICO G O IA N IN H A Praia das Cacimbinhas Ponta do Madeiro Praia do Curral Praia das Minas Praia do Amor (afogados) Chapadão AREZ VILA FLOR CANGUARETAMA Bela Vista Manimbú Munim Pernambuquinho Detalhe: Pipa Av. Baía dos Golfinhos ab cd efg sem escala Av. B. dos G olfinhos INThhr=3: Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. Dos sete eixos com maior acessibilidade-para até três mudanças de direção na batata espetada da Pipa, quatro estão na Avenida Baía dos Golfinhos. No detalhe do mapa axial (Figura 29, integração local), o par de eixos a leste (cd) coincide exemplarmente com os trechos com comércio e serviços que atendem a escala da vizinhança, como padarias, mercado, cabeleireiros, drogarias, lojas de ração para animais e distribuidores de água mineral. O outro par de eixos (ab), a oeste do anterior, situa-se onde se concentram mais bares e restaurantes, lojas e galerias de lojas, que podem estar associados a uma abrangência mais ampla do movimento. O grupo com os três eixos (efg), mais ao sul em relação aos anteriores (visualmente parecem dois, em razão da continuidade entre eles), estão em trechos do anel viário da Pipa, área de ocupação mais recente que a Avenida Baía dos Golfinhos, aparecendo no miolo do aglomerado de linhas; na esquina desse trio com alta acessibilidade, com aspecto de um V invertido no mapa, além de um ponto de micro-ônibus, há um bloco de lojas construído nos últimos anos mas ainda desocupadas; o andar de cima foi uma academia e agora é um templo religioso; se afastando desta esquina Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 60 no sentido oeste, há uma bodega recém-construída; se afastando a sudeste, muros de casas ou de condomínios; terrenos não edificados predominam prosseguindo mais adiante, geralmente cercados, alguns murados, e poucos sem muros ou cercas. O resultado sugere que o trio de eixos dessa esquina esboça um centro funcional local emergente à espera de intensificação da ocupação ao sul da Avenida Baía dos Golfinhos. O mapa axial da acessibilidade-para local, até três passos de profundidade, revela quase nenhuma mudança entre 2006 e 2013 (Figura 30). Figura 30 – Acessibilidade-para local na malha de Tibau do Sul em 2006 e 2013. INThhr3. 2006 2013 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006. Embora o acesso à Pipa seja o mais favorável ao movimento global na malha de acessos do município de Tibau do Sul como um todo, é pouco plausível que cotidianamente nos demais povoados haja contingente significativo de pessoas que deixem de ir na bodega ou padaria mais próxima de suas casas para, ao invés disso, irem comprar palitos de fósforos ou o pãozinho que acompanha a sopa do dia nas bodegas ou padarias da Pipa. O uso comercial local4 em áreas mais densamente ocupadas correspondeu melhor à acessibilidade-para abrangendo 400m (Figura 31), e acessibilidade-através abrangendo 600m (Figura 32) — analisando segmentos. Para atividades realizadas em um esboço de escala da vizinhança de aproximadamente 400m, a mais alta acessibilidade-para (Figura 31) coincide com o núcleo da maior parte dos povoados afastados da Pipa, marcados como “área urbana” no mapa de ocupação do solo publicado por Silva e Oliveira (2013) (Figura 33). A coincidência do segmento mais acessível-para com o centro funcional do povoado é mais precisa em Umari, Piau, Bela Vista, Manimbú, Munim, 4 Mais detalhes acerca da distribuição de usos no solo são apresentadas nas Seções 3.3 e 3.4. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 61 Cabeceiras e Tibau do Sul. O resultado sugere que o movimento-para neste raio de abrangência não se subordina à malha de acessos da Pipa, e que os centros locais nos povoados à beira da Lagoa podem gozar de relativa autonomia quanto às atividades pertinentes ao alcance do movimento na vizinhança mais próxima. Figura 31 – Acessibilidade-para local. In- tegração angular normalizada NAIN, r = 400m. Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. Figura 32 – Acessibilidade-através local. Choice angular normalizada NACH, r = 600m. Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013. Figura 33 – Mapa de ocupação do solo do muni- cípio de Tibau do Sul Fonte: Silva e Oliveira (2013, p.73) Em Sibaúma é diferente. O segmento no topo da hierarquia de acessos-para até 400m não está na praça do povoado na rua principal, que é ladeada por mercadinhos, lanchonetes Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 62 e serviços... o segmento mais acessível a esse movimento está em um trecho perto de hotéis ou pousadas e casas de veraneio, que também faz parte de um acesso que liga Sibaúma à Pipa pela trilha costeira. O tipo de atividade deste trecho coaduna com a abrangência daquela área designada como Região Turística da Pipa. Os anos entre 2006 e 2008 foram intensa prática de venda de terrenos de nativos no contexto de uma política imobiliária com anseios de que Sibaúma se posicionasse no mercado como uma nova Pipa5. Em 2006, foi elaborado o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação – RTID, no qual aortanto comunidade remanescente quilombola deveria decidir se aderia a um processo de demarcação inalienável de suas terras junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA ou apostariam em se tornar uma espécie de representantes imobiliários individuais para vender em pedaços os terrenos dos antepassados6. Não houve consenso e os limites das terras quilombolas não foram definidos. O mapa de 2013 evidencia que o mercado da segunda residência para veraneio e o da hospedagem de turistas tem o acesso ao movimento-para local mais privilegiado em relação a sua vizinhança que o centro funcional do povoado. A mancha indicada como “Área Urbana” no mapa de ocupação do solo (Figura 33) , que coincide ao menos em parte com o centro funcional em todos os povoados do município, apresenta pelo menos um segmento dentre os dois níveis mais acessíveis-através (Figura 32). Os centros funcionais estão em posição relativamente favorável ao movimento de passantes na vizinhança em percursos de até 600m. Em Pipa e Sibaúma, os segmentos com a maior acessibilidade-para aos 400m estão próximos à saída de cada povoado, afastados da ocupação mais adensada dos núcleos urbanos que embrionaram os vilarejos. No caso da Pipa, o resultado também não parece corresponder a atividades esperadas de um movimento que abranja a vizinhança mais próxima de um morador: não há mercadinhos, nem padaria, as imediações se restringem a condomínios e pousadas. Na Pipa, o nível mais alto de acessibilidade-através aos 600m se distribui de modo esparso. Quase metade dos segmentos mais accessíveis está fora do núcleo mais densamente ocupado, embora ainda na batata espetada; aproximadamente um quarto está em área de expansão da ocupação, 5 “Nova Pipa” também foi o nome de um empreendimento imobiliário em Sibaúma compreendendo um grande terreno que abarca desde as proximidades da foz do Rio Catú até 5km se afastando do mar, numa faixa entre o rio e a estrada asfaltada. Esta e demais iniciativas semelhantes na Região Turística da Pipa foram suspensas pelo retraimento de investimentos especulativos após a crise internacional originada pelo descontrole da bolsa imobiliária em 2008 (DEMAJOROVIC et al., 2010), em que pese o esforço da Secretaria Estadual de Turismo do Rio Grande do Norte em atrair investidores estrangeiros para Tibau do Sul no Salão Imobiliário de Madri no primeiro trimestre do mesmo ano. 6 A definição de uma identidade quilombola em Sibaúma no contexto do processo de (não) demarcação das terras é relatado por Cavignac, Lins e Maux (2006) e Cavignac, Lins e Maux (2011). Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 63 nas quais o uso do solo não está consolidado (Figura 32). Em Sibaúma, os segmentos com a mais alta acessibilidade-através abrangendo 600m estão no segundo nível da hierarquia de acessos do município. Compreendem os segmentos da rua principal, no trecho do mercadinho e lanchonetes da praça, bem como os segmentos que acessam as casas de veraneio e meios de hospedagem na saída do povoado. Em abrangência local (400-600m), o centro funcional de Sibaúma é mais favorecido pelo movimento-através que pelo o movimento-para, ou seja, ao que corresponde a um comércio no meio do caminho mais do que um destino ou permanência. Comparando antes e depois da construção do anel viário, os níveis mais altos de acessibilidade-para abrangendo 400m permanecem semelhantes (Figura 34). No entanto, em 2013, alguns segmentos com nível mediano de acessibilidade aumentam de valor próximo ao miolo da batata espetada, sutilmente, e diminuem nos espetos de acessos ao sul da batata. Figura 34 – Acessibilidade local na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Integração angular normalizada local NAINr=400m. 2006 2013 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006. A concentração da mais alta acessibilidade-através abrangendo 600m muda pouco com a construção do anel viário. Quanto a níveis medianos, uma parte de segmentos a leste da Avenida Baía dos Golfinhos, na entrada do povoado, tem a acessibilidade-através reforçada, do terceiro nível () para o segundo () na hierarquia de acessos (Figura 35).Depreende-se que o centros mais acessíveis em abrangência local permanecem situados no mesmo lugar após a construção do anel viário, embora os níveis intermediários de acessibilidade apresentem leves alterações. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 64 Figura 35 – Acessibilidade local na malha viária de Tibau do Sul em 2006 e 2013. Choice angular normalizada local (NACHr=600m). 2006 2013 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006. Considerando os caminhos pedonais, no recorte da batata espetada, parte dos segmentos mais acessíveis-através abrangendo 600m (Figura 36) conforma um aglomerado juntamente com Figura 36 – Acessibilidade-através local na batata espetada em 2006 e 2017, incluindo caminhos pedonais. Choice angular normalizada (NACHr=600m). Mapa desconectado da malha viária do município. 2006 2017 Alta  Baixa Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006, visitas de campo 2017. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 65 quatro segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos, que estão nas quadras conhecidas pela reunião de pessoas apinhadas à noite, ao som de música de balada, regada com boemia, naquele trecho animado exibido no início do trabalho (Figura 2, p20). Na areia da praia, a rede de segmentos que intercepta a linha de alta acessibilidade ramificada da Avenida Baía dos Golfinhos cai de posição na hierarquia de acessos. No mapa recortado, a localização dos centros de acessibilidade-através em abrangência local no topo da hierarquia () corresponde satisfatoriamente à concentração de segmentos no segundo nível hierárquico () do mapa do município inteiro (Figura 32, p61); é praticável trocar um mapa pelo outro. Este resultado endossa o uso do mapa da malha viária do município todo no esmiuçamento do potencial de movimento da Avenida Baía dos Golfinhos na Seção 3.2. * * * Parte da população de Umari, Piau, Bela Vista, Munim e Manimbu vive da carcinicul- tura; existe um comércio varejista de camarão distribuído ao longo dos povoados e os viveiros costumam estar em posição acessível em relação à moradia da família de seus proprietários, sugerindo que parte dos deslocamentos relacionados à aquicultura tenha abrangência local. Uma outra parte da população da beira da Lagoa trabalha na Região Turística da Pipa. Um estudo realizado por Barros (2015), sobre alterações demográficas da população de Tibau do Sul, constata uma ampliação da migração7 populacional oriunda dos arredores ou de outros estados brasileiros. O movimento de pessoas é descrito como pendular, retratando um fluxo migratório de trabalhadores de municípios vizinhos analisado entre 2000 e 2010, beneficiado pela acessibilidade às margens da Lagoa de Guaraíras, nessas palavras: “[. . . ] pode-se supor que a facilitação da mobilidade na última década permitiu intensificar a pendularidade (mobilidade) para a força de traba- lho oriunda dos municípios vizinhos para trabalhar na destinação, como alternativa à residência no – ou migração para – inflacionado município turístico.”(BARROS, 2015, p.166) Mesmo em face dos trajetos metricamente mais curtos serem os que interligam a estrada de Cabeceiras à Pipa feita em 2010, ou pela antiga estrada de terra que liga Piau ao Rio Galhardo, o transporte público intermunicipal entre Goianinha e Pipa é feito pelo trajeto que passa pelos povoados da beira da Lagoa de Guaraíras. A tarifação é diferenciada por trechos, o trajeto parcial tem um preço menor que o trajeto completo, atendendo a escala global e a de subgrupos de povoados. 7 O estudo se baseia em dados censitários que desconsideram visitantes e turistas, é restrito ao universo do habitante. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 66 Os vestígios de uma variedade de deslocamentos relacionados às atividades de morar, da carcinicultura, do trabalho na Região Turística de Pipa, acrescentando o presumido fluxo de turistas, sugerem que haja nuanças na abrangência do potencial de movimento entre o menor raio da vizinhança e o global, demandando a exploração em outros raios que auxiliem a circunscrição de até onde alcança a escala da vizinhança e inicia a global. Uma confluência de potenciais de movimento em diferentes raios, cuja concentração dos segmentos mais acessíveis ora se espalham e ora se sobrepõem, confirmam que, no contexto da centralidade pervasiva, a Avenida Baía dos Golfinhos tem destaque na escala global, fazendo parte de um único centro alongado, enquanto uma rede de centros em escalas menores articulam os povoados do município. A concentração da maior acessibilidade em diferentes abrangências é resumida para quatro ou cinco raios apresentados separadamente8, a acessibilidade para e através são apresentadas em figuras separadas, respectivamente Figuras 37 e 38. Dois outros padrões de concentração de acessibilidade-para são desvelados, além dos já apresentados para os raios global e o de 400m. O raio de 1200m representa a concentração da maior acessibilidade-para em quatro áreas com baixa ocupação de edifícios, duas nas vias costeiras com atrativos naturais visitados por turistas, uma nas imediações de loteamentos em fase de implantação ou de estoques de terrenos para especulação imobiliária entre o Rio do Galhardo e Sibaúma e uma na estrada entre Piau e o Rio Galhardo nas proximidades de um atalho para Goianinha ainda não construído. Resultados semelhantes nos quais todos os segmentos com a mais alta acessibilidade-para estão onde a ocupação edilícia é baixa foram observadas nos raios entre 1000m e 2400m (Figura 37, representado pelo raio de 1200m). O raio de 5000m realça a concentração de alta acessibilidade-para no povoado de Sibaúma9 e na sede municipal de Tibau do Sul. O pórtico de entrada da sede, que acomoda um posto de informações turísticas com vista para a Lagoa de Guaraíras, está no segmento mais acessível de seu agrupamento na sede municipal. Em Sibaúma, o segmento mais acessível nesse mesmo raio situa-se entre o acesso à balsa e a praça que está no trecho comercial da rua principal do vilarejo. Estes segmentos não coincidem com ruas caracterizadas por atividade comercial varejista, embora distem destas uns poucos segmentos; parecem mais afinados com a destinação turística à semelhança dos padrões observados ao raio de 1200m. Na sede municipal, o encadeamento de segmentos com alta acessibilidade-para se estica para além do centro funcional 8 A escolha dos raios decorreu da identificação de aglomerados de segmentos no topo da hierarquia, cuja espacialização foi registrada no Apêndice B, p.121. 9 São dois grupos de segmentos muito curtos em Sibaúma, muito próximos um do outro (Figura 37). Foram resumidos por um ponto na Figura 37. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 67 Figura 37 – Acessibilidade-para a 400m, 1200m, 5000m e n. Concentração de segmentos com a mais alta integração angular NAIN na malha de acessos de Tibau do Sul de 2013. Base: ocupação 2006, IDEMA (2006); malha de acessos 2013, Google Earth (2013). na direção à balsa que cruza a Lagoa de Guaraíras, no caminho que perpassa um trecho com restaurantes refinados e hotéis; na outra saída, em direção à Pipa, o encadeamento caminha por onde há um ginásio de esportes, um posto de gasolina, um hotel com auditório para convenções no município e uns poucos restaurantes. . . enfim, essa ponta apresenta atividades pouco associadas à abrangência da vizinhança imediata, local. O centro espichado de Tibau do Sul se manifesta entre os raios 4000m e 7000m. Os raios de 3200m e 8000m mantêm as pontas do espichamento, mas excluem as quadras da concentração comercial varejista. Os níveis mais altos de acessibilidade-através (Figura 38) estão nos centros funcionais dos povoados e em áreas de baixa ocupação edilícia. Há quatro padrões de concentração. Um no qual os povoados da beira da Lagoa de Guaraíras se destacam, com sete dos oito agrupamentos no topo da hierarquia referente ao raio de 600m; coincidem com a maior concentração de comércio Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 68 em Umari, Piau, Bela Vista, Munim e Cabeceiras. Outro padrão, ilustrado pelo raio de 3200m, se manifesta no trecho entre o Rio do Galhardo e Sibaúma, onde a alta acessibilidade coincide com áreas de estoque de terras para especulação imobiliária e loteamentos em fase de implantação. Ocorre um padrão onde a baixa ocupação faz parte da paisagem dos destinos turísticos, próximos às vias costeiras do município, exemplificado pelo raio de 10 mil metros. O quarto padrão é o da referida concentração de acessibilidade global (raio n), que inclui todos os segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos10. Figura 38 – Acessibilidade-através a 600m, 3200m, 10000m e n. Concentração de segmentos com a mais alta choice angular NACH na malha de acessos de Tibau do Sul de 2013. Base: ocupação 2006, IDEMA (2006); malha de acessos 2013, Google Earth (2013). Enquanto o raio de 10 mil metros alcança a balada noturna e as praias paradisíacas em um grupo de segmentos, também destaca a alta acessibilidade de Bela Vista, Piau e Manimbú, 10 A acessibilidade na Avenida Baía dos Golfinhos será detalhada na Seção 3.2. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 69 conformando outra linha de segmentos contíguos no topo da hierarquia de acessos (Figura 38). Bela Vista tem recebido significativo número de migrantes trabalhadores do turismo e construção civil da Região Turística de Pipa. O resultado sugere alguma complementaridade entre esses povoados da Beira da Lagoa e um pronunciado epicentro turístico na Avenida Baía dos Golfinhos, correspondente ao favorecimento da estrutura de acessos do município ao movimento-através. 3.2 AVENIDA BAÍA DOS GOLFINHOS NO TOPO DA HIERARQUIA DE ACESSOS DE TIBAU DO SUL Visando avaliar nuanças na diferença de acessibilidade em trechos da Avenida Baía dos Golfinhos, esta seção responde se existem segmentos mais fáceis de chegar que outros na avenida, ou com maiores chances de serem escolhidos pelos passantes, ou ainda, se aquele trecho animado do burburinho continua dentre os mais acessíveis em abrangência menor que a global. Cada um dos 29 segmentos que compõem a Avenida Baía dos Golfinhos recebeu um número de identificação11. Os números foram posicionados de oeste para leste conforme o diagrama na Figura 39. As ruas que a interceptam a avenida foram indicadas, bem como o local do conhecido burburinho. A mesma sequência foi usada nas Tabelas 1 e 2, que comparam os níveis máximos de acessibilidade-através (Tabela 1) e acessibilidade-para (Tabela 2) na Avenida Baía dos Golfinhos. A máxima acessibilidade na batata espetada da Pipa (última coluna) varia para cada raio de abrangência (primeira coluna). Somente foram marcados os segmentos mais acessíveis em relação à batata espetada da Pipa; foram marcados na cor vermelha quando equivalem ao máximo do município de Tibau do Sul. As linhas TopoTS e TopoPipa mostram quantas vezes cada segmento da Avenida Baía dos Golfinhos se equipara ao nível máximo do município e da Pipa, respectivamente, considerados os raios de abrangência. Todos os 29 segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos estão no topo da hierarquia de acessos para movimentos abrangentes acima dos 10 mil metros, até o raio global (Tabela 2). Estes mesmos segmentos são os mais acessíveis-através em raios acima de 8 mil metros (Tabela 1). A quantidade de vezes em que segmentos atingem o nível da mais alta acessibilidade- através tende a crescer de oeste para leste. No topo da hierarquia de todo o município, 53% dos 215 registros situam-se nos 14 segmentos mais a leste, que também reúnem os 66% dos 325 11 Os números de identificação foram gerados automaticamente pelo do programa Space Syntax Toolkit (GIL, 2016) e não estão ordenados. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 70 Figura 39 – Sequência Oeste-Leste dos segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos. Localização de segmentos , incluindo anel viário, 2013. ← oeste] Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos [leste/sudeste→ _ ac es so pa ra R ua do B ar re iro [c em ité rio _ R ua do C ru ze iro _ R ua do s B ei ja -fl or es b b b _ de sc id a pa ra a pr ai a [P ra ça do Pe sc ad or _ ac es so à pr ai a e ao m ira nt e _ R ua D ou ra da 91 8 _ R ua P ra ia do A m or 55 5 11 64 9 76 7 8 6 0 1 2 3 4 5 341 343 339 340 905 327 328 329 330 29 30 31 32 33 321 322 ← 12 A ne lV iá rio _ es ta ci on am en to do s ôn ib us ] R ua do C éu _ R ua do s B em -te -v is _ R ua da G am el ei ra _ R ua da M at a _ 90 6R ua da A lb ac or a _ R ua da s G ra ún as _ R ua da C io ba _ 91 7R ua M ol eq ue _ R ua do s C oq ue iro s _ R ua do s C aj ue iro s _ ← 28 A ne lV iá rio – _ = acesso, rua, que incide na ponta do segmento [ = área adjacente ou próxima ao segmento b= lugar conhecido pela agitação noturna, burburinho Fonte: Produzido com SSToolkit/QGIS. Base: Google Earth 2013, Ortofotografia IDEMA 2006. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 71 Tabela 1 – Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos no topo da hierarquia de acessos-através de Tibau do Sul e topo relativo da Pipa – Choice angular normalizada NACH em diferentes raios métricos. NACH Pi pa M ax ← oeste] Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos [leste/sudeste→ raio 11 64 9 76 7 8 6 0 1 2 3 b4 b5 b341343 339 340 905 327 328 329 330 29 30 31 32 33 321 322 400 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -     -  600 - - - - -  - - - - -      - - -        - - -  800 - - - - - - - - - - -                - - -  1000 - - - - - - - - - - -                    1200 - - - - - - - - - - - -                   1600 - - - - - - - - - - - - -                  2000 - - - - - - - - - - - -                   2400 - - - - - - - - - - - -                   3200 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -           4000 - - - - - - - - - - - -                   5000 - - - - - - - - -                      6000 - - -                            7000 - -                             8000                               10000                               12000                               n                               TopoTS 4 4 5 6 6 6 6 6 6 7 7 7 8 8 8 8 8 8 8 8 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 % 24 24 29 35 35 35 35 35 35 41 41 41 47 47 47 47 47 47 47 47 53 53 53 53 53 53 53 53 53 53 TopoPipa 4 4 5 6 6 7 6 6 6 7 7 10 14 15 15 15 14 14 14 15 16 16 16 16 17 17 15 15 14 17 % 24 24 29 35 35 41 35 35 35 41 41 59 82 88 88 88 82 82 82 88 94 94 94 94 100 100 88 88 82 100 PipaMax = A mais alta acessibilidade no aglomerado de acessos do povoado da Pipa. TopoTS = Segmentos no topo da hierarquia da malha de acessos de Tibau do Sul como um todo (215 registros). (= ). TopoPipa = Segmentos no grupo da mais alta acessibilidade relativa ao povoado da Pipa (325 registros). Alta  Baixa Tabela 2 – Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos no topo da hierarquia de acessos-para de Tibau do Sul e topo relativo da Pipa – Integração angular normalizada NAIN em diferentes raios métricos. NAIN Pi pa M ax ← oeste] Segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos [leste/sudeste→ raio 11 64 9 76 7 8 6 0 1 2 b3 b4 b5 341 343 339 340 905 327 328 329 330 29 30 31 32 33 321 322 400 - -  - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -  600 - - -  - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -  800 - -   - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -  1000 - - -  - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -  1200 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -  1600 - - - - - - - - - - - - - - - - - -   - - - - - - - - -  2000 - -                             2400 - - - - - - - - - - - - - - - - - -   - - - - - - - - -  3200 - - - - - - - - - - - - - - - - - -             4000 - - - - - - - - - - - - -                  5000 - - - - - - -                        6000 - - - - - - -                        7000 - - - - - - - - - - - - -                  8000 - - - - - - - - - - - - - - - -               10000                               12000                               n                               TopoTS 3 3 4 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 3 4 % 18 18 24 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 18 24 TopoPipa 3 3 6 7 4 4 4 6 6 6 6 6 6 8 8 8 9 9 12 12 10 10 10 10 10 10 10 10 10 17 % 18 18 35 41 24 24 24 35 35 35 35 35 35 47 47 47 53 53 71 71 59 59 59 59 59 59 59 59 59 100 PipaMax = A mais alta acessibilidade no aglomerado de acessos do povoado da Pipa. TopoTS = Segmentos no topo da hierarquia da malha de acessos de Tibau do Sul como um todo (87 registros). (= ). TopoPipa = Segmentos no grupo da mais alta acessibilidade relativa ao povoado da Pipa (215 registros). Alta  Baixa Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 72 registros dos segmentos mais acessíveis da batata espetada da Pipa. Percorrendo a tabela de oeste para leste, os dois primeiros segmentos são exibidos quatro vezes, o primeiro patamar eleva a contagem para seis vezes ou mais e se inicia no segmento de número 76. O segundo patamar se inicia no segmento de número 4 e segue até o fim, abarcando movimentos de abrangência global e local, contabilizando entre dez e dezessete vezes o número de exibições. O segmento 76 passa ao lado do estacionamento de ônibus, caracterizado como um atrator de pedestres — ou um difusor, enquanto ponto de partida dos que seguem a pé pela Pipa. Embora atratores prescindam estar no segmento mais acessível para serem procurados pelas pessoas, o terreno que acomoda essa espécie de rodoviária informal da Pipa está próximo à saída do povoado, em uma passagem quase obrigatória para quem entra ou sai do vilarejo, portanto a acessibilidade é favorável a um terminal de ônibus. Os parâmetros refletem que os segmentos do início, a oeste, até o de número 3, trazem as maiores chances de serem escolhidos em percursos alcançando segmentos fora da batata espetada, num raio de abrangência de 6 mil metros ou mais. Continuando o mesmo trecho no sentido leste, a partir das proximidades do cemitério (segmento de número 6), vitrines começam a apresentar-se em conjuntos de lojas enfileiradas ou no shopping center inaugurado em 2016, que também se abre para a avenida. O segmento número 4 é onde começa a agitação noturna, a alta concentração de pessoas reunidas no meio da rua até o início da madrugada segue até o segmento de número 341; depois das 2h da manhã, pequenos grupos passam a se deslocar no sentido da Boate Dos Calangos (segmento 322, o último da tabela), onde entram e ficam até o amanhecer. A maioria dos segmentos entre o ponto do burburinho e a boate é exibida mais de 14 vezes na tabela (82% dos 17 raios), favorável a movimentos em abrangência local e global; portanto é o trecho com a maior chance de ser perpassado por quem vem ou vai de um segmento a outro em percursos restritos às imediações ou vizinhança mais próxima e para qualquer outro segmento da malha de acessos do município. Neste quesito, os segmentos de número 31 e 32 são os mais perpassáveis, em 17 parâmetros de abrangência (100% dos raios). Na ponta mais a leste do segmento 32, situa-se a esquina para a Rua da Praia do Amor, a praia mais frequentada por surfistas e uma das mais famosas da Região Turística de Pipa. Uma praia famosa pode ser entendida como um atrator de pessoas, que dispensa a alta acessibilidade para ser movimentada; no caso da Praia do Amor, os segmentos mais acessíveis-através no meio do caminho até a praia estão na Avenida Baía dos Golfinhos, que reciprocamente independente de atratores para ser potencialmente movimentada, em razão de sua disposição na malha de acessos. A maior parte da mais alta acessibilidade-para da batata espetada (61% dos 215 Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 73 registros) situa-se nos 14 segmentos mais a leste; O segmento 328 apresenta o maior acúmulo de registros (71% dos raios, 12 registros). Na junção do segmento 327 com o 328, incidem um acesso para a praia central e outro para um morro de dunas entre a praia central e a Praia do Amor; o lugar é conhecido como esquina da Construjá, uma antiga loja de material de construção que atualmente deu lugar a um mercadinho. A maior parte da avenida (93% dos segmentos) está no nível mais acessível-para da batata espetada ao raio de 2 mil metros. Este raio permite que as pontas nas franjas mais compridas do povoado alcancem a Avenida Baía dos Golfinhos. É quase o comprimento da avenida (1,9km, até a Boate Dos Calangos), garantindo o alcance de uma ponta a outra. O segmento de número 0, seguinte ao do cemitério, é onde se inicia uma maior presença de vitrines, restaurantes e lanchonetes na direção leste; coincide com o início de um encadeamento de segmentos mais acessíveis-para abrangendo os raios de 5 e 6 mil metros. A distância de 6km é suficiente para percursos partindo da Avenida Baía dos Golfinhos alcançarem as bordas dos povoados de Sibaúma e da sede municipal, pelas vias costeiras, passando pela maior parte dos destinos praianos da Região Turística de Pipa. A diferença entre os trechos mais a oeste e os mais a leste, é que nestes há mais estabelecimentos comerciais que possam ser associados ao movimento abrangendo as imediações e vizinhança próxima, como mercadinhos, bodegas, distribuidores de água mineral, padarias, drogarias, salões de beleza, lojas de produtos para animais de estimação, com maior frequência após o segmento de número 328 na direção leste (esquina da Construjá). Antes desta esquina, voltando em sentido ao burburinho do segmento de número 4, similarmente há mercadinhos e padarias, no entanto também há mais restaurantes, bares, lojas de roupas e artesanatos, galerias de lojas com terminais bancários de autoatendimento, uma casa de câmbio, enfim, atinentes à dinâmica do turismo. É admissível reconhecer três padrões de relação entre a acessibilidade e atividades dos estabelecimentos limítrofes aos segmentos na Avenida Baía dos Golfinhos: do estacionamento de ônibus até o trecho de segmentos do burburinho (chamaremos de Pipa I); deste até a esquina da Construjá (chamaremos de Pipa II); desta à Boate Dos Calangos (então, Pipa III)12. Nas Pipa II e III, a Avenida Baía dos Golfinhos é mais fácil de chegar (globalmente) e mais propensa a ser perpassada, uma vez que seus segmentos simultaneamente colecionam acessibilidade-para e acessibilidade-através relativamente das mais favoráveis da malha de 12 As denominações Pipa I, II e III foram originadas da colaboração de Elisabetta Romano (UFPB), em visita à Pipa. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 74 acessos dentro do povoado. A Pipa III é a Pipa com ênfase no movimento que alcança as idas ou voltas da praia, da balada ou boemia, da pesca ou posto de trabalho do morador local, da casa ou hospedagem. Na Pipa I, o movimento em escala global ou mais abrangente que 6 mil metros prevalece, o que é capaz de explicar a presença de atividades com maior afinidade ao alcance do turismo da Região Turística de Pipa. A Pipa II é da mescla das dinâmicas globais e locais, reúne atividades atinentes ao turismo mais presentes na Pipa I, com mercadinhos e padarias mais presentes na Pipa III. Na Pipa II, há mais de um restaurante self-service com preços populares, que atendem simultaneamente ao movimento de quem vai e volta de suas atividades no povoado da Pipa e ao movimento de quem está de passagem vindo de fora do povoado, como fornecedores que vêm de outras cidades para abastecer Pipa. A Pipa II inclui a praça construída por cima da ladeira que vem da praia, cercada de vendedores de artesanato, está entre bodegas, self-services e padarias de um lado e galerias de loja, restaurantes e bares noturnos do burburinho do outro; a praça disponibiliza vestígios da confluência de movimentos na abrangência do povoado, é frequentada por pescadores em repouso, crianças nativas passeando com os pais, além dos turistas numa pausa de perambulação pelos arredores. Na Pipa II, há um maior acúmulo de segmentos acessíveis-para e através, quase como na Pipa III, entretanto compõe um circuito circular com os acessos à praia central; o segmento 341 se conecta com a ladeira que vem da praia e o segmento 327 se conecta a um passo topológico com a ladeira que desce para a praia13. A praia central foi o embrião do vilarejo pesqueiro original, a Pipa II enlaça novos percursos rumo à expansão urbana14 com antigos caminhos praianos reaproveitados na consolidação15 da economia turística. 3.3 CENTRO FUNCIONAL, TAMANHO DO SEGMENTO E ACESSIBILIDADE. No contexto do engendramento de um conceito de vitalidade das cidades, relacionando efeitos da arquitetura sobre a atividade humana, Jacobs (1961) observa que o tamanho da quadra é um atributo físico que afeta o potencial de movimento. Inúmeros estudos empíricos inspirados 13 “Ladeira que sobe” e “ladeira que desce” é como o prof. Paulo Heider Feijó me explicou como são conhecidas as duas ladeiras; a que sobe é do tempo em que havia mais nativos morando na parte baixa perto da praia, a que desce é mais nova; teria surgido bem depois, aproveitando um desgaste causado pela descida de água das chuvas. 14 Na direção sul e da Pipa III em diante a sudeste. Pipa III pode ser considerada uma expansão do povoado mais antigo, possivelmente no período de início do aquecimento da economia do turismo. 15 Sobre a consolidação do turismo no território da Pipa, vide Xavier (2008). Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 75 no legado de Jacobs16 apontam forte relação entre quadras mais curtas com a concentração de maior diversidade de atividades. As quadras da Pipa apresentam uma geometria irregular, uma mesma quadra pode ser curta em um sentido e comprida em outro. Existem poucos cruzamentos, há mais bifurcações e incidências em “T”, um mesmo trecho de rua pode ter um margem com quadras curtas e outra com quadras maiores. Sistematizar se a quadra é curta ou longa na Pipa se tornou um exercício mais trabalhoso que profícuo, motivando lançar mão do tamanho do segmento como um substituto do tamanho da quadra, tendo em conta que os instrumentos que geram os mapas de segmentos fornecem os comprimentos. A concentração mais diversificada de atividades na Pipa coincide em parte com seg- mentos relativamente curtos além de mais acessíveis, há segmentos curtos pouco acessíveis que não foram encontrados indícios de concentrarem atividades de comércio ou serviços, tampouco diversificação. A classificação de uso foi extraída do Plano Diretor de Tibau do Sul (TIBAU DO SUL, 2008), a saber: comércio; hotéis/pousadas; residências; condomínios; veranistas (casas de veraneio); institucional e serviços. As categorias no Plano Diretor se referem a uso “predomi- nante”, considerando que podem existir mais de um uso na mesma ocupação. Comércio se refere ao varejo em geral e inclui restaurantes, bares, serviços privados como agências de viagem e casa de câmbio, entre outros. Institucional e serviços correspondem a serviços públicos ou sem fim lucrativo, como escola, posto de saúde, posto policial, centros comunitários, dentre outros. Residências correspondem à moradia em geral; entretanto o Plano Diretor oferece outras duas categorias mais específicas que de algum modo poderiam ser consideradas variantes de moradia: veranistas e condomínios. Veranistas se refere à moradia ocasionalmente habitada, usualmente uma segunda residência da família para fins de lazer (FONSECA; LIMA, 2012). Condomínios corresponde a múltiplas moradias compartilhando o mesmo lote — embora ocasionalmente sejam usadas extra-oficialmente como pousadas ou outro meio de hospedagem comercial. Os usos são atribuídos a polígonos da projeção edilícia. Um polígono pode conter mais de uma unidade ou estabelecimento, ou estes podem conter mais de um polígono. A fonte desconsiderou quiosques, barracas de praia e coberturas não permanentes. O tamanho de segmentos e a distribuição de usos do solo são exibidos na Figura 40. A média do tamanho de segmentos na Avenida Baía dos Golfinhos é 64,6m. Três concentrações do 16 Vide compilação produzida por Netto (2016) acerca de estudos empíricos e atualizações metodológicas apoiados no legado de Jacobs. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 76 Figura 40 – Uso do solo 2008 (polígonos da projeção edilícia) e tamanho de segmentos 2013 (m). Praia da Pipa, recorte na área de ocupação mais densa da batata espetada. Elaborado com QGIS (QGIS Development Team, 2016). Base: IDEMA (2006), TIBAU DO SUL (2008), Google Earth (2013). uso comercial são reconhecíveis na Avenida Baía dos Golfinhos (círculos no mapa); coincidem razoavelmente com segmentos menores que a média. Fora da Avenida Baía dos Golfinhos, o mapa não apresenta intensa concentração de comércio, dificultando a visualização da relação entre uso comercial e tamanho do segmento. A média de comprimentos dos segmentos do percurso do anel viário, na parte das vias que contornam por fora do miolo adensado (ocupação), é 104,7m; é maior que a média de tamanhos na Avenida Baía dos Golfinhos. Contudo, a visita de campo de 2016 encontrou indícios de comércio emergindo em segmentos do anel viário mais curtos que a média de seu circuito — os dados de uso do solo de 2008 na Figura 40 são anteriores Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 77 ao período de conclusão do anel viário (2010), mesmo assim é possível identificar três ocupações de comércio perto de onde a malha do anel é mais apertada (segmentos curtos). O tamanho dos segmentos no anel viário denuncia que o caminho é menos interceptado por outras ruas que a Avenida Baía dos Golfinhos. O anel viário é mais comprido que a Avenida Baía dos Golfinhos (9% maior) e contém menos segmentos (31% a menos); consequentemente tem menos segmentos por quilômetro de caminho (Tabela 3). Tabela 3 – Tamanho e quantidade de segmentos na Avenida Baía dos Golfinhos e anel viário Avenida Baia dos Golfi- nhos Anel viário Tamanho do segmento (m) média= 64,6; desvio padrão = 64, 3; máximo= 235; mínimo= 9, 5 média= 104,7; desvio pa- drão = 126, 9; máximo= 478; mínimo= 11, 6 Média do tamanho da qua- dra (m) 102, 0 157, 4 Número de segmentos 29 20 Comprimento total (m) 1930 (1, 9km) 2094 (2, 1km) Segmentos por quilômetro (seg/km) 15, 02 9, 52 Ao longo da Avenida Baía dos Golfinhos ou do anel viário, parte dos segmentos mais curtos que a média resultam da interceptação com outras ruas, ampliando as chances do segmento ser perpassado pelo movimento-através articulado com outros caminhos. Além disso, os raios com menor abrangência capturam mais razoavelmente17 a correspondência entre acessibilidade e tamanho dos segmentos na avenida (Tabela 1, p.71). 17 A acessibilidade-através para raio de 600m ou menores tende a aumentar à cada diminuição no tamanho dos segmentos. O quanto da variação na acessibilidade é correspondida pela variação no tamanho de segmentos é mostrado no Apêndice C. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 78 3.4 VESTÍGIOS DA ANIMAÇÃO PELA QUALIFICAÇÃO DO USO EM TORNO DO ESPAÇO ACESSÍVEL Possivelmente drogarias, restaurantes, mercados, casas de câmbio, dentre outras nuanças da categoria “comércio” usada no Plano Diretor (TIBAU DO SUL, 2008) se beneficiem de modo diferenciado do potencial de movimento proporcionado pela estrutura de acessos. Atividades comerciais18 foram anotadas em campo ao longo dos segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos e anel viário a fim de esboçar a magnitude da diversidade das atividades. Estas são organizadas de oeste para leste nas Tabelas 4 e 5, relacionando cada segmento com seu tamanho e acessibilidade- através abrangendo 600m. O que se enquadra como “comércio” no Plano Diretor é indicado em negrito. As nuanças de atividades endossam o reconhecimento dos três padrões na Avenida Baía dos Golfinhos constatados na Seção 3.2, e confirma que a leste, na Pipa III, há mais atividades associadas ao movimento abrangendo a vizinhança mais próxima, como mercados, padarias e distribuidores de água. A ocorrência de atividades da construção civil, como madeireiras e pré-moldados, na parte leste do anel viário é coerente com as observações que apontam a tendência de expansão da Pipa para sudeste. Contudo, a visualização da relação de atividades com a acessibilidade ou tamanho de segmentos é pouco perceptível no modo em que as Tabelas 4 e 5, considerando que os segmentos longos têm maior capacidade de acomodação de lotes que os muito curtos e que existem áreas com distintas densidades de ocupação, anuviando a proporção de atividades por segmento. A próxima Seção reorganiza esses dados segundo propriedades de acesso entre o segmento e a ocupação em torno do espaço público aberto acessível. 18 Serviço tem duas acepções. Por exemplo, escolas públicas e privadas estão em institucional e serviços no Plano Diretor, junto com posto de saúde, posto policial e ginásio esportivo. Mas borracharia, que é prestação de serviços, está em comércio, junto com chaveiros e demais serviços de manutenção, escritórios de contabilidade, etc. Comércio e prestação de serviços são fundidos na mesma categoria comércio do Plano Diretor. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 79 Tabela 4 – Acessibilidade-através local (NACHr=600m, 2013), tamanho de segmentos (2013) e diversidade de uso do solo (amostras de 2016) na Avenida Baía dos Golfinhos. id Tamanho (m) Diversidade de uso 11 53 espaço privado para apresentações musicais ao ar livre (Open Air), estacionamento privado, lateral doSantuário Ecológico da Pipa (acesso por outro segmento) 64 162 9 177 condomínio, pousada/hotel (2), terreno não edificado (2), lateral do Santuário Ecológico da Pipa (acessopor outro segmento) 76 255 distribuidora de bebidas, restaurante com serviço de recepção, estacionamento de ônibus, restau- rante, edifício com conjunto de lojas e restaurante, escritório de advocacia, pousada, condomínios (2), estacionamento, terreno não edificado, hotel, pousada-condomínio, 7 39 lojas (4), pousada, condomínio, costureira, galeria, beco residencial, lanchonete 8 23 residência de veranista, ateliê de artes, loja de artesanato, conveniência, acesso a residências em pavi-mento superior loja (quiosque na calçada) 6 224 conjunto com 9 lojas, restaurantes (2), imobiliária, pousadas (4), casa de veranista (2), cemitério, lojas (4) , galeria de lojas (2), posto de saúde, escola municipal, cigarreira, poço da CAERN, drogaria, conveniência, lanchonete, residências, serviços (2), 0 87 lanchonetes, lojas de roupa, restaurantes, becos de acesso à residências conjunto de apartamentos de aluguel de temporada, loja de instrumentos musicais artesanais, beco de acessos à lanchonetes e restaurantes, lojas de artesanato, sorveterias (2), atelier de arte 1 50 drogaria, peixaria, mercados (2), alpendre da casa de Antônio Pequeno (importante poeta e pescador falecido em 2017), venda de passeios (2), lojas de roupa (4), imobiliária, portões de acesso para resi- dências em miolo de quadra ou pavimentos superiores, banca de revistas, casa de câmbio, lanchonete, loja de roupa, sorveteria, loja de artesanato 2 26 3 35 4 47 galerias de lojas (4), bares com pista de dança, loja de roupa, porta de acesso a pousada em pavimentosuperior, restaurantes (6), bar, residência (casa de nativos) 5 12 bar, “club” (bar com acesso controlado, restrito), restaurante, loja de roupa, pousada 341 44 pousada (2), galerias de lojas (2), restaurantes (2), loja de bijuteria, 343 15 drogaria, casa de câmbio, mercado, praça 339 28 340 104 905 38 327 29 lanchonete, loja de artesanato, pastelaria, venda de passeios, drogaria 328 113 lojas (7), residências de aluguel (conjunto de “kitnets”), residências, Assembleia de Deus, salão de be- leza, lanchonete (4), conserto de guarda sol, restaurante (6), mercado (3), borracharia, pousadas (2), quitanda, venda de passeios, entrega de pizza, loja de variedades (panelas, ferramentas), brechó em garagem residencial, sorveteria, casa de veraneio, 329 119 mercado, pousadas (2), sorveteria, casa de veraneio, restaurantes (2), lojas (6), beco de acesso residên- cias em miolo de quadra (2), residências, lanchonete, papelaria, drogaria, distribuidora de bebidas, condomínio residencial, dentista, padaria, ateliê de artes, não identificado (5) 330 9 29 30 drogaria, conveniência, oficina mecânica, lanchonete, ateliê de artes, restaurante – prato feito/quenti-nhas (2), conjunto de casas de aluguel (“kitnets”), lanchonete 30 33 conjunto de lojas e serviços (mesmo do segmento 31), salão de beleza, acessos a residências em miolode quadra ou pavimento superior, loja de utilidades 31 42 conjunto de lojas e serviços , distribuidora de bebidas, loja de artesanato , Jesus Cristo é o Senhor 32 27 33 25 321 60 bodega, distribuidor de gás e água, padaria, pousada, loja de produtos para animais de estimação,restaurante (prato feito/quentinha), residência, bar (choperia) 322 26 boate (Dos Calangos), bar, residência, lanchonete Acessibilidade NACHr=600m: Alta  Baixa, máximo na Pipa = . “id”: identificação do segmento. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 80 Tabela 5 – Acessibilidade-através local (NACHr=600m, 2013), tamanho de segmentos (2013) e diversidade de uso do solo (amostras de 2016) no anel viário. id tamanho (m) diversidade de uso 12 309 condomínio (2), terrenos não edificados, hotel-condominio, lateral do espaço para eventos (Open Air,acesso por outro segmento), residência (casa isolada em terreno grande) 65 141 terreno não edificado (4), residências, condomínio, 66 12 67 240 pousada, campo de futebol, ginásio esportivo, restaurante (“prato feito”, “quentinhas”), ensino munici- pal especial (parceira com Projeto Afeto), delegacia civil, centro educacional privado, residências, terre- nos não edificados 68 22 13 115 muro de condomínio de veraneio (acesso por outro segmento), residências 14 52 construção paralisada (possivelmente pousada), residência (casa isolada em terreno murado) 19 245 residências (3), vila de casas de aluguel, terrenos não edificados murados (2), terreno não edificado (3),casa de veranista, pousada-condomínio, construção paralisada (a mesma do segmento 14) 20 30 residência, terreno não edificado (2) 22 190 residências, oficina de motocicletas, bodega, loja de produtos para animais de estimação, terrenosnão edificados 23 16 24 58 muro de pousada (acesso por outro segmento), muro de terreno, 25 21 lanchonete, pousada, madeireira 364 26 residências (2), conjunto de lojas, templo Bola de Neve (pavimento superior) 365 12 366 26 conveniência, residência, não identificado (1) 367 21 517 49 terreno não edificado (3),passagem de pedestre atravessando terreno não edificado (1), imóvel vazio (àvenda, conjunto de casas em um lote murado) 518 30 lateral de escola privada (a mesma do segmento 28, entrada por outro segmento); terreno não edificado(o mesmo do segmento 517) 28 478 lateral murada da Boate Dos Calangos (entrada por outro segmento), terminal das vans, galpão em cons- trução, vila de casas térreas não geminadas (entrada dos fundos), madeireira, muros com uso não iden- tificado – fundo de lote com acesso pela Rua dos Cajueiros (11), torre de antena de provedor de internet, distribuidora de pré-moldados, terrenos não edificados, escritório de contabilidade, residências, pas- sagem de pedestres sobre terreno não edificado (para Rua dos Cajueiros), lateral de escola privada (acesso por outro segmento), Acessibilidade NACHr=600m: Alta  Baixa, máximo na Pipa = . “id”: identificação do segmento. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 81 3.5 PERMEABILIDADE RUA–RECINTOS, ESTRUTURA ESPACIAL E POTENCIAL DE ENCONTROS A fachada ativa é corriqueira em usos comerciais como nas padarias, nos mercados, nas drogarias. A princípio qualquer pessoa pode acessar as áreas destinadas aos clientes, que geralmente se ligam imediatamente à rua, intermediadas ou não por porta, retomando o conceito de interface exposto na Seção 2.3 (p.43). As atividades listadas na seção anterior são agora reagrupadas segundo a proporção de interfaces que se deixam abrir para a rua, o parâmetro da permeabilidade. A permeabilidade da interface em doze segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos e oito segmentos do anel viário foi anotada na Tabela 7, disposta de oeste para leste, acompanhada da acessibilidade-para e acessibilidade-através, globais, e acessibilidade-através alcançando 600m. É classificada em dois grupos por tendência de fechamento (barreira) ou abertura dos recintos no alinhamento da calçada ou rua; as nuanças de cada grupo foram ordenadas do ente mais fechado ao mais permeável. O grupo dos entes que tendem ao fechamento reúne: os mais fechados, como muros e paredes cegas (barreiras fortes); os com possibilidade restrita de entrada, como acesso privativo por meio de porta ou portão com acesso controlado; os fechados por barreiras mais brandas, como cercas, correntes, muretas baixas, portões baixos, signos de restrição ao público. O grupo dos entes que tendem a ser abertos (adentráveis) reúne: fachada ativa com barreira leve, como porta não privativa, porta envidraça conjugada à vitrine, portão baixo); fachada ativa com abertura permissiva ou sem barreira, como porta de rolo aberta, porta aberta, varanda, recinto sem porta; recinto que compartilha espaço aberto público, tal como balcão de atendimento no alinhamento da calçada ou rua, mesas na calçada ou na rua. No ponto do burburinho (Figura 41d), alta acessibilidade, alta permeabilidade da interface e segmentos curtos coincidem. O trecho da Avenida Baía dos Golfinhos conhecido pelo burburinho no meio da rua diz respeito aos segmentos de número 4, 5 e parte do 341. A permeabilidade de interfaces nestes segmentos corresponde a dizer que respectivamente 94%, 80% e 70% dos recintos lindeiros à rua são adentráveis. Esse trio de segmentos está no topo da hierarquia de acessos global e está no grupo de segmentos com a mais alta acessibilidade-através abrangendo 600m relativa à malha de acessos da batata espetada da Pipa . Os segmentos do trio são mais curtos que a média dos tamanhos de segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos19. Os segmentos 4 e 5 ostentam a configuração do alto potencial de encontros de pedestres, são 19 A média é 64, 6m, vide Tabela 3, p.77. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 82 Tabela 7 – Permeabilidade da interface por segmento selecionado na Avenida Baía dos Golfinhos e anel viário, acessibilidade e tamanho deste segmento. Avenida Baía dos Golfinhos | anel viário id 11 9 76 8 6 1 4 5 341 327 328 322 12 65 14 19 20 364 517 28 1 0 3 4 1 0 0 0 0 1 0 0 0 0 0 1 5 1 0 0 10 2 0 4 7 1 4 3 0 1 1 0 8 2 1 1 0 6 1 2 1 10 3 2 3 6 0 1 1 1 0 1 0 2 0 4 5 1 4 1 0 3 3 ♦4 0 0 2 4 2 7 1 3 2 1 11 0 0 0 0 0 0 1 0 0 ♦5 0 0 3 0 0 7 14 1 5 3 19 1 1 0 0 0 0 0 0 3 ♦6 0 0 1 0 0 3 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0  2 10 17 2 5 4 1 1 3 0 10 2 5 6 2 15 3 2 4 23 ♦ 0 0 6 4 2 17 15 4 7 5 30 2 1 0 0 0 0 1 0 3 total = +♦ 2 10 23 6 7 21 16 5 10 5 40 4 6 6 2 15 3 3 4 26 permeabilidade ♦ total (%) 0 0 26 67 29 81 94 80 70 100 75 50 17 0 0 0 0 33 0 12 NAIN                     NACH                     NACH r=600m                     tamanho do seg- mento (m) 53 177 255 23 224 50 47 12 44 29 113 26 309 142 52 245 30 26 49 478 total tamanho (un./m) 0,04 0,06 0,09 0,26 0,03 0,42 0,34 0,42 0,23 0,17 0,35 0,15 0,02 0,04 0,04 0,06 0,10 0,12 0,08 0,05 Figura 43a 43c 43d - 43b 41ac 41d - 41b 41e 41f 41g 43a 43g 43e 43f 43f 42a 42b 42c : tende ao fechado ou barreira. ♦:tende ao aberto ou permeável, adentrável. Id: identificação do segmento. un.: unidades. total = + ♦: total de contatos entre a rua e recinto privado lindeiro à rua. ♦total : permeabilidade da interface do segmento, proporção do que tende ao aberto no alinhamento da rua no trecho do segmento. 1: muro alto, parede cega, barreira forte; 2: acesso privativo por meio de porta ou portão com acesso controlado e restrito ; 3: barreira fraca privativa, como cercas, correntes, muretas baixas, portões baixos, signos de restrição ao público; ♦4: fachada ativa com barreira leve, tal como porta não privativa, porta envidraça conjugada à vitrine, portão baixo,♦5: fachada ativa com abertura permissiva ou sem barreira, tal como porta de rolo aberta, porta aberta, sem porta, varanda; ♦6: recinto compartilha espaço aberto público, tal como balcão de atendimento no alinhamento da calçada ou rua, mesas na calçada ou na rua. NAIN, acessibilidade-para; NACH, acessibilidade-através; Alta  Baixa Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 83 Figura 41 – Vestígios de animação na parte leste da Avenida Baía dos Golfinhos. Diversi- dade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). Avenida Baia dos Golfinhos Avenida Baia dos G olfinhos Ru a do Cé u Ru a d a G am ele ira praia central garagem dos barcos Base: levantamento fotográfico (2016-2017), Google Earth (2013). Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 84 Figura 42 – Vestígios de animação na parte leste do anel viário e prolongamento da Avenida Baía dos Golfinhos (d). Diversidade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). an el v iár io anel viário anel v iário R ua da M at a R ua da M at a Ru a da Al ba co ra Avenida B aía dos G olfihos Base: levantamento fotográfico (2016-2017), Google Earth (2013). Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 85 Figura 43 – Vestígios de animação na parte oeste do anel viário e da Avenida Baía dos Golfinhos. Diversidade de atividades, permeabilidade das interfaces e acessibilidade-através local (NACHr=600m). Avenid a Baia dos Go lfinhos Avenida Baia dos Golfinhos anel viário anel viário Ru a d a G am ele ira Base: levantamento fotográfico (2016-2017), Google Earth (2013). Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 86 segmentos fáceis de chegar globalmente e apresentam altas chances de serem perpassados de qualquer um para qualquer outro segmento do município e em percursos de até 600m de alcance. Movimentos em abrangência global e local se encontram, movimento-para e movimento-através se encontram, e neste ponto de encontro os recintos se abrem ao pedestre. O resultado é coerente com a imagem da multidão aglomerada na rua. O burburinho do referido trio de segmentos só chega até o trecho exibido na Figura 41(b), situado em um pedaço do segmento 341. Embora este segmento apresente uma permeabilidade da interface relativamente alta (70%), a esquina oposta ao segmento 5 concentra os 30% de tendência ao fechamento ocasionado por paredes sem janelas na altura do transeunte em uma pousada encastelada por muralhas cegas e uma fachada esquivando-se do pedestre para acomodar um estacionamento fechado por correntes. Esse embarreiramento da esquina do segmento 341 é congruente com a aglomeração menos densa de pedestres que nos segmentos 4 e 5 do burburinho (Figura 41d, novamente). Em contrapartida, aquela imagem da Figura 41(b) exibe pessoas em deslocamento e em permanência na rua, em pé ou sentadas, conversando ou em espera, indícios da confluência de movimento-através e movimento-para. A fotografia foi realizada na fronteira da multidão, avistando a esquina oposta a esta, é mais ou menos nessa parte que o padrão Pipa II de relação entre atividade e permeabilidade da interface começa20, à esquerda da imagem é a ladeira para a praia central e que passa por baixo da Praça do Pescador; à direita, atrás da edificação encaixotada, esconde-se a Rua da Mata. A mesma imagem contém, ao fundo, o muro que separa a praça da rua, as fachadas do mercadinho e a da casa de câmbio, ilustrando o que foi na Seção 3.2 acerca da mescla de dinâmicas globais e locais do padrão Pipa II de relação entre acessibilidade e atividades no segmento. Como já visto, o padrão Pipa II termina nas imediações do trecho exibido na Figura 41(e) (segmentos 237 e 328). O segmento 327 apresenta a maior permeabilidade da interface dentre os selecionados para a Tabela 7, com 100% dos recintos tendendo a se abrir para a rua, um destes é um balcão de pastelaria no alinhamento da rua. A imagem ilustra o aglomerado de pessoas à espera de um pastel; a rua é o salão de comensais do estabelecimento. Interface semelhante é mostrada na imagem de um balcão de vendas de lanches na imagem da Figura 43(b) (segmento 6), existem bancos e mesas sobre a calçada (desta vez há calçadas) e pessoas em pé durante o processo do pedido. Os segmento 327 e 6 apresentam as mesmas posições na hierarquia de acessos global e local exibidas na Tabela 7, não obstante suas permeabilidades da interface, respectivamente 100% e 29%, e tamanhos, respectivamente 29m e 224m, sejam 20 Vide p. 73 da Seção 3.2 Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 87 discrepantes. Embora as imagens da pastelaria e do balcão de lanches apresentem pessoas paradas, é uma permanência de meio de caminho, não à toa que cadeiras confortáveis e banheiros costumem ser prescindidos nesses lugares de comer em pé ou sair para comer andando, transitoriamente. Em que pesem dois segmentos e a comparação das interfaces da pastelaria e do balcão de lanches serem insuficientes para tecer generalizações, o exemplo contribui para conjecturar que a relação entre as propriedades espaciais proporcionadoras de movimento e as atividades que se beneficiam deste movimento se explicam melhor por sua relação com a configuração da estrutura espacial do que com a permeabilidade das interfaces. Esta pode ser vista como uma consequência da atividade. . . O estabelecimento ao lado da pastelaria na Figura 41(e) não tem gente aglomerada na porta, é uma loja de venda de passeios turísticos com a face aberta para a rua, indicando que a interface permeável não garante o acúmulo de pessoas na sua entrada. Contudo, o que possivelmente motiva a loja e a pastelaria estarem aí é ter gente passando na frente, condizente com a ideia da atividade buscar a acessibilidade mais favorável, em consonância com o conceito de economia do movimento desenvolvido por Hillier e mencionado no Capítulo 2. O conjunto de permeabilidades da interface nos segmentos parece indicar o quanto as atividades são atinentes ao pedestre, ao carro ou se há pouco contato entre a atividade e o movimento de ambos na rua. Na Figura 43(b) um carro aparece saindo, logo depois do balcão de lanches, ali é um terreno pouco edificado que acomoda um estacionamento. Há vários estacionamentos entre o segmento 6 e o 11 na Avenida Baía dos Golfinhos; os terrenos são maiores a oeste, a ocupação é menos densa, parte dos terrenos privados é transformada em estacionamentos. Também nessas imediações, terrenos grande acomodam condomínios, pousadas e hotéis de maior porte, uma parte encerrada por altos muros. Se incluirmos o anel viário, a quantidade de terrenos pouco edificados cercados com muros ou cercas se amplia. Em ambos os casos o contato do espaço privado com o passeio público é diminuído, convertendo a rua numa calha de passagem de veículos e pessoas, como ilustram as Figuras 43(c) (segmento 9), 42(b) (segmento 517), 42(c) (segmento 28), 43(g) (segmento 65) e 43(a) (segmentos 11 e 12). Esses segmentos apresentam baixa permeabilidade (Tabela 7) e apresentam um entorno com poucas atividades associadas ao pedestres e menor quantidade destes em relação a carros nas imagens. Nesses casos, quando a acessibilidade global é alta, é perceptível maior presença de carros nas imagens. Assim, as longas linha de encadeamentos de alta acessibilidade mencionadas nos capítulos anteriores favorecem o movimento na avenida ou anel viário, mas a permeabilidade da interface indica se esse movimento é mais atinente ao carro ou ao pedestre. Desse modo, a Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 88 acessibilidade indica o potencial de movimento, e a permeabilidade da interface o qualifica em termos de sua associação ao pedestre ou automóvel. Sendo assim, no caso da Pipa, a Avenida Baia dos Golfinhos da primeira esquina após o estacionamento de ônibus (segmento 8) até a ponta leste (Boate Dos Calangos, segmento 322) é caracterizada pelo movimento e atividades associados ao pedestre, enquanto a ponta oeste e boa parte do anel viário é caracterizada pelo movimento do automóvel. * * * Esta parte ilustra a consonância da animação em alguns trechos da Avenida Baía dos Golfinhos com traços locais de movimento-através e traços globais convergentes de através e para. Se por um lado o caráter polissêmico de fotografias amplia o risco de uma gama de aspectos não espaciais saltarem aos olhos, ofuscando a análise, por outro, contribuem para dar noção de como os parâmetros configuracionais do espaço e da permeabilidade das interfaces apresentados nos capítulos e seções anteriores se manifestam na realidade da animação da Pipa, cujos aspectos evidentemente não se esgotam em um único estudo. Da revisão do perambular de pessoas no meio da rua nas imagens das Figuras 41(a,c) e 41(b,e,f), temos um corredor a céu aberto de lojas e restaurantes. É o segmento 1, com alta acessibilidade global (Tabela 7); movimento-para e movimento-através se encontram, o vai e vem permanente móvel, o fácil de chegar compartilha espaço com a alta chance de ser perpassado. Eis onde o movimento potencializa encontros e estes se tornam indicadores de animação na rua. Mais imagens do perambular de pessoas no segmento 1 são exibidas na Figura 44. Notemos que há mais gente andando que sentada ou parada em pé; mas numa avaliação subjetiva, mesmo os que estão andando parecem fruir o lugar. . . as imagens são estáticas e não são capazes de revelar que esse perambular tende a um vai e vem, como nos circuitos de um shopping center ou de algumas pracinhas de interior, a diferença é que, ao invés de andarem em círculos, pendulam ao longo do conjunto de trechos pertinentes ao padrão Pipa I (Seção 3.2, p.73), aquele com maior afinidade ao turismo e relativo ao movimento em abrangência mais ampla na Região Turística da Pipa. Deve ser esclarecido que embora o auge da agitação ocorra no fim da noite, o trecho é demandado por movimento a qualquer hora, variando em intensidade e presença de veículos, e que o vai e vem pendular de gente é melhor observável a partir do meio da tarde; de manhã, há mais atividade em mercados, padarias, peixarias, quitandas, fornecedores abastecendo o comércio, pessoas chegando ou saindo do povoado. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 89 Figura 44 – Permanente transitoriedade de pedestres na Avenida Baía dos Golfinhos. Segmento 1. 19 ja n. 20 17 19 h2 2 19 ja n. 20 17 ,2 2h 18 . 19 ja n. 20 17 ,2 2h 13 . Fonte: visita de campo, 2017. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 90 O ponto alto de aglomeração noturna de gente está nos referidos segmentos 4 e 5 do burburinho (Figura 41(d)). Alguns grupos de pessoas estão ancorados na frente dos bares conversando, bebendo ou dançando na rua, enquanto pedestres vindos das duas pontas da avenida e da rua da Gameleira atravessam a multidão buscado uma dessas três saídas. De dia a animação é de outra natureza, a imagem da Figura 45 exibe a junção dos segmentos 4 e 5 ao meio dia, horário precedido por maior fluxo de veículos de fornecedores e que antecede ao entardecer mais demandado por turistas. Durante o dia, costumam estar fechados os bares com pista de dança e demais estabelecimentos da boemia. A presença das pessoas é menos intensa que no horário de pico do burburinho, a imagem exibe micro-ônibus, carros e um buggy, compartilhando espaço com um carrinho de mão movido por um vendedor de camarão, transeuntes atravessando o espaço e pessoas em espera ou paradas, algumas ancoradas na porta de algum estabelecimento. Figura 45 – Um trecho do burburinho noturno ao meio dia. Segmento 5, esquina com a Rua da Gameleira. 20 ja n. 20 17 ,1 2h 26 . Fonte: visita de campo, 2017. As imagens seguintes mostram os momentos imediatamente antes e depois do horário de pico do burburinho, ilustrando a variação na confluência de trânsito e permanência que qualificam a animação desse trecho. Na junção do segmento 4 com o 5, é fim da tarde e começo da noite; na esquerda da imagem da Figura 46, lojas estão funcionando, e na esquina da direita, o bar com pista de dança ainda está fechado; no centro da imagem, um carro vem pela Rua da Gameleira. Se camelô corresponde a uma atividade sensível ao movimento de pedestres, o Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 91 isopor com bebidas no carrinho de mão já está marcando o lugar antes que não sobre espaço no chão ao anoitecer. Os dois homens na esquina, com cardápio na mão, buscam comensais para os restaurantes, é hora da janta, os recintos de comer não podem simplesmente deixar o pedestre atravessar a avenida desapercebido em razão do movimento-através. Figura 46 – Fim da tarde e começo da noite no trecho do burburinho noturno. Junção do segmento 4 com 5. 19 ja n. 20 17 ,1 8h 32 . Fonte: visita de campo, 2017. Na primeira imagem da Figura 47, é madrugada, a loja do lado esquerdo está fechada e o bar com pista de dança está aberto; a câmera foi girada para a direita para mostrar o ponto do burburinho (desta vez a Rua da Gameleira está escondida atrás do homem com camisa azul ao lado de uma caixa de isopor). A segunda imagem da Figura 47 mostra, na margem oposta da avenida, outro vendedor de bebidas na frente de uma loja fechada neste horário, sugerindo que as brechas de chão lindeiras à rua permanecem disputadas pelo comércio dependente do movimento na rua; o que mudou foi o perfil do negócio. O aglomerado de pessoas mais ao fundo e à direita está próximo a um pátio coberto e aberto para a rua (sem portas ou portões, nada de barreiras intermitentes) com mesas compartilhadas por um bar com pista de dança e um quiosque que serve lanches e refeições, coadunando com a ideia de que a permeabilidade da interface favorece a animação. Cabe acrescentar que a legislação municipal adaptou-se ao ritmo da avenida, nos trechos equivalente ao segmento 6 em diante, entre o estacionamento de ônibus e a Boate Dos Calangos (segmento 322), o abastecimento dos estabelecimentos deve ser realizando antes das 10h da Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 92 manhã, o tráfego de veículos automotores é proibido após as 19h e o estacionamento na rua é proibido exceto para carga e descarga. Esta extensão passou a ser mão única depois da construção do anel viário, amenizando a pressão do automóvel na disputa pelos espaços da rua. Em que pese o efeito da legislação sobre o movimento fugir do escopo deste estudo, esse alerta intenta evitar a interpretação equivocada de que o menor número de carros nas imagens noturnas se daria exclusivamente por propriedades espaciais. Por outro lado, subentender que as dinâmicas no espaço cederiam à lei convém grande dose de cautela, considerando que ocasionalmente carros perfuram a multidão, trafegam na contramão em horário proibido, ou estacionam irregularmente. Figura 47 – Madrugada no trecho do burburinho noturno. Junção do segmento 4 com 5. 25 se t. 20 16 ,1 h5 0. 25 se t. 20 16 ,1 h5 0. Fonte: visita de campo, 2016. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 93 Embora a atividade pedestre seja inerente à animação, mesmo passagens exclusivamente destinadas a pedestres podem apresentar baixo ou nenhum vestígio de animação quando a combinação de acessibilidade com permeabilidade da interface são desfavoráveis ao movimento de pessoas. A imagem da Figura 48 exibe um beco que liga a Avenida Baía dos Golfinhos à Rua da Gameleira. Inexistem evidências de animação ou burburinho em seus segmentos. O muro Figura 48 – Beco para pedestres com pouco ou nenhum vestígio de animação. 1º ja n. 20 17 ,8 h0 7. Fonte: visita de campo, 2017. com as concertinas afiadas à direita é de um hotel, a maioria dos muros e paredes cegas da margem oposta do beco pertence a pousadas de pequeno porte. Os segmentos do beco apresentam acessibilidade global e local baixas; o hóspede sai das pousadas destrancando portas que dão diretamente no beco, voltando a ficar trancadas no restante do tempo. As imagens da Figura 49 ilustram a sequência de muros e paredes cegas vez ou outra com uma porta fechada, tornando evidente que a permeabilidade para os recintos desse beco é baixa. Capítulo 3. Configuração espacial e vestígios de animação na Praia da Pipa: movimento proporcionado pela malha de acessos, atividade favorecida pelo movimento 94 Figura 49 – Sequência de muros e paredes cegas em beco de pedestre com pouco ou nenhum vestígio de animação. 1º ja n. 20 17 ,8 h0 5 a 8h 11 . Fonte: visita de campo, 2017. 95 4 INTERPRETAÇÕES DERRADEIRAS DO ARCABOUÇO ESPACIAL E SEU EFEITO NA ANIMAÇÃO A estrutura de acessos concentra na Avenida Baía dos Golfinhos os trechos de via mais fáceis de chegar e com maiores chances de serem perpassados, correspondendo ao efeito da centralidade. A complementaridade entre a conformação da malha de acessos e a economia do movimento aponta que a relação entre custo e benefício do movimento nessa configuração espacial é disputada por recintos diretamente acessados por pedestres, aqueles com fachada ativa, e por uma ocupação privada com pouca relação pedonal com o passeio público, como condomínios de veraneio, alguns hotéis e terrenos estocados para especulação imobiliária. A animação na rua é associada ao perambular do pedestre e tende a acompanhar a abertura das interfaces lindeiras aos segmentos com alta acessibilidade. Uma aparente dualidade entre a animação e uma lógica de movimento do carro se esboça, se fez mais perceptível em áreas de expansão da Pipa que se propagam para além do trecho mais densamente ocupado da Avenida Baía dos Golfinhos, em áreas que orbitam a Região Turística de Pipa, ao redor da batata espetada. Xavier (2008) verificou as influências da atividade turística no sistema de posse e propriedade das terras na Região Turística da Pipa, elucidando que, com exceção da sede municipal, os demais povoados se caracterizam pela posse, com o parcelamento do solo informalmente definido. Possivelmente a origem dos assentamentos por meio da posse contribuiu para que a grelha de acessos tenha se deformado convenientemente ao movimento do pedestre nos povoados da Lagoa de Guaraíras, Sibaúma e Pipa, como explicado adiante. 4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE UMA GRELHA DEFORMADA Hillier (1996, p. 105) emprega o termo grelha deformada para expressar que o espaço contínuo acessível a pedestres e veículos é articulado por porções de espaço não alinhadas e com larguras variadas. A ideia da grelha deformada se opõe à da grelha ortogonal, cuja articulação se dá por meio de espaços alinhados e de largura uniforme, a qual costuma ser originada de um acordo prévio que estabelece o traçado regular sobre o parcelamento de uma gleba. A grelha deformada da Pipa foi obtida diretamente pela ocupação das terras entre a praia e a mata, de modo que inexistia inicialmente a divisão de lotes e cada via teria nascido com parâmetros baseados em necessidades inerentes às atividades econômicas dos ocupantes do assentamento. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 96 A imagem de um caso de parcelamento do solo sem muros entre as casas em uma esquina da rodovia RN-003 (Figura 50) se contrapõe ao lote murado. A casa mais próxima da rodovia amplia sua varanda para acomodar um restaurante, aproveitando o movimento proporcionado pela estrada, cujo trecho está incluído no grupo de segmentos com a mais alta acessibilidade global do município. Figura 50 – Parcelamento sem muros, grelha forjada pela relação de conveniência entre uso e movimento. Fonte: visita de campo, maio de 2017. Possivelmente alguns trechos já principiaram potencialmente animados na Pipa, enla- çando atividades econômicas vitais no cotidiano pesqueiro com vazios bastante perpassados, assentando ao longo do tempo um miolo adensado e ativo na malha urbana. * * * Uma área de mata atlântica preservada se fortaleceu como referência do limite legal de expansão urbana ao Sul do povoado da Pipa. Em junho de 2017, o IDEMA iniciou o cercamento do Parque Estadual Mata da Pipa (PEMP), totalizando 11,3km de perímetro de uma parcela territorial da Área de Proteção Ambiental Bonfim-Guaraíras (GONDIM, 2017) ao Sul da batata espetada da Pipa. A Figura 51 exibe a localização do PEMP em Tibau do Sul. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 97 Figura 51 – Mapa de Localização do Parque Estadual Mata da Pipa (PEMP) Fonte: (INSTITUTO UNIEMP, 2014, p.18) Em tempos antigos, o povoado e a mata eram ligados, dentre outros acessos, pela Rua da Mata1, que ainda guia o caminho que chega até a Praça do Pescador, desembocando próxima à ladeira de subida da praia. Desde o decreto de criação do PEMP em 20062, as áreas nas bordas da mata original recorrentemente tiveram a posse ou propriedade reivindicada em cartório ou judicialmente, processo que acelerou o cercamento de terrenos reclamados como privados, 1 A Rua da Mata consta identificada nas Figuras 42 p.84 e 39 p.70 (sequência que intercepta a Avenida Baía dos Golfinhos e o anel viário). 2 Decreto Estadual nº 19.341 de 12 de Setembro de 2006. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 98 isolando a mata3, conforme denunciado pelo Núcleo Ecológico da Pipa (NEP), na ocasião dos encontros participativos de 2007 para a elaboração do Plano Diretor do município. Os próximos passos da instalação do parque preveem a construção de uma sede com estacionamento e uma ciclovia ligando ao povoado. O texto divulgado na imprensa ilustra o anseio por conectar o potencial atrator turístico aos acessos da Região Turística da Pipa: “Erguida às margens da RN–003, entre Pipa e Sibaúma, a ideia gestada a partir dos técnicos do IDEMA é construir uma sede com estacionamento, onde os usuários do Parque possam estacionar, caminhar pelas trilhas da reserva e, querendo, deslocar-se até Pipa por uma ciclovia prevista no projeto. Ainda na área da sede, por meio de licitação, haverá lojinhas de artesanato com a função de criar uma identidade com a área de preservação” (PARQUE, 2018) A implantação do PEMP reflete contradições da ocupação e uso em face à acessibilidade e destas em relação ao potencial de animação. Enquanto o atrator turístico é capaz de exercer uma pressão de movimento sobre a malha independentemente da acessibilidade, o isolamento é uma estratégia de preservação da mata nativa, alvo de invasões de terreno, desmatamento e caça (FONSECA, 2017, p.103, Tabela 8, Quadro de Entraves e Conflitos). O cinturão de posses e propriedades que circunda o parque tem o valor agregado pela proximidade com o atrator, ao mesmo tempo em que suas cercas e muros inibem a animação ao longo do passeio público. Esse parcelamento de terrenos extensos e cercados aos arredores do PEMP ilustra feições isolamento de funções e atividades na cidade e o desfavorecimento do burburinho nos percursos. Aquele excerto de jornal instiga caricaturar uma personagem que sai de seu claustro no hotel para ser transportado em um involucro mecanizado, o carro, até ser transformado em usuário do parque assim que desembarca no estacionamento. Durante seu trajeto ponto a ponto, haveria pouco a fazer na rua murada, a personagem se refugiaria nas lojinhas de artesanato do parque, longe do hotel. O caso do arranjo espacial de longos segmentos pobres de interfaces desvela o clichê da dualidade carro versus pedestre, não é o carro forçar um trajeto de clausura, mas uma arquitetura que providenciou pouca opção de acesso e permeabilidade no percurso. Talvez paradoxalmente, nos tempos em que carros não circulavam no vilarejo, possi- velmente a mata e os terrenos em volta não eram cercados, enriquecendo a malha de acessos pedonais. Segundo o que ouvi dos antigos, quanto morei na Pipa, a mata seria um bem coletivo essencial para o fornecimento de insumos para pesca, como varas e material para balsas, vital para a economia pesqueira. Conta-se que a mata não se transformou em canavial graças a uma guerra 3 Por não ter sido entrecortada por vias da malha de acesso das fontes cartográficas, a mata acabou não aparecendo na representação linear dos eixos de movimento e segmentos. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 99 de foice4 entre pescadores e canavieiros, em uma época na qual a economia do açúcar estava muito ativa em Goianinha, município que incluía Pipa até 1963. Sob esse espírito comunitário, é presumível que a mata abrigasse caminhos informais de uso público que se apagaram ao longo do tempo, permanecendo alguns espetos de acessos ao povoado, e simultaneamente se constituísse como uma barreira, separando o vilarejo dos canaviais em expansão. Uma interpretação menos romântica é que a manutenção comunitária dessa barreira teria sido favorecida pelo relevo, o que teria sobrado da mata pelo lado do povoado seria o que atualmente se situa nas áreas mais íngremes. De qualquer modo, as vocações para barreira natural e atrator de utilidade pública coexistem no PEMP. Depreende-se que durante mais alguns anos a grelha de acessos da Pipa se expanda e encontre maneiras de contornar o parque e alcançar o estoque de terras ao Sul. A pavimentação da rodovia RN-003, Pipa–Sibaúma, em 2005, e a construção da ligação desta com a estrada Pipa–Cabeceiras, realizada concomitante ao anel viário, fazem parte dos novos desígnios da grelha em busca de acesso às terras do sul da Pipa. Estudos futuros devem incluir o estiramento da Rua das Pedrinhas, uma rua que se estica pelo sudeste da Pipa, procurando contornar a mata e acessar Sibaúma. Na imagem de satélite de 2013, a Rua das Pedrinhas acaba onde atualmente é área de grilagem e conflitos fundiários recentes, mas nas visitas de campo de 2016 e 2017, marcas de quadriciclos no chão e depoimentos de alguns moradores de Sibaúma indicam que a rota já chega por lá, embora seja de difícil transposição devido ao leito arenoso. As visitas de campo encontraram indícios de atalhos privados que encurtariam o acesso entre a Rua das Pedrinhas e o Chapadão, cruzando terrenos privados de grande porte, indicando que a malha de acessos públicos talvez se expanda de modo mais acanhado nessa direção, separando a costa leste da expansão sul da rua das Pedrinhas, tornando esta topologicamente mais distante do mar e demais destinos turísticos costeiros. Talvez isto explique os indícios de maior recorrência de moradia permanente ao longo da Rua das Pedrinhas à medida em que se afasta do núcleo do vilarejo. Os novos acessos e nova ocupação não são claramente visualizáveis pelas imagens de satélite (Google Earth, 2013). No entanto, por ora os dados existentes acerca da grelha de acessos da Pipa são robustos o suficiente para predizer as tendências de disputa do espaço segundo o custo do movimento proporcionado pela acessibilidade, e arriscar conjecturas satisfatórias sobre o potencial de animação que acompanha tal tendência. 4 Embora “guerra de foice” seja uma expressão popular, aqui o sentido é literal. Houve uma batalha com o instrumento deixando feridos como testemunhas, segundo o finado poeta e pescador Antônio Pequeno nos causos contados em seu alpendre na avenida principal. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 100 4.2 PARA ONDE VAI A ANIMAÇÃO? Figura 52 – Para onde vai a animação? Fonte: Google Street View, dezembro de 2011. O espaço premiou Pipa com maior potencial de movimento. Para além dos trechos animados da Avenida Baía dos Golfinhos inexiste outro local do município de Tibau do Sul com semelhante condição privilegiada caracterizada por alta acessibilidade acompanhada de alta permeabilidade entre espaço público e privado. É pouco plausível que surjam nos próximos anos pontos de burburinho tão intensos quando o manifestado atualmente, enquanto esta configuração for mantida. O vaticínio de se haverá animação nas ruas da Pipa para além da Avenida Baía dos Golfinhos é realizável pela síntese dos resultados encontrados neste trabalho em dois componentes, um estrutural, da articulação das porções de espaço acessível, e um conjuntural, identificado pela tendência de abertura das interfaces. Onde a acessibilidade é baixa (componetente estrutural) e a tendência de abertura das interfaces também é baixa (componente conjuntural), há indícios das chances da animação acontecer diminuírem. É o caso das pontas sem saída nas franjas da batata espetada da Pipa ou de alguns becos de pedestres que serpenteiam nas fronteiras de condomínios e pousadas no miolo da Pipa. Essa combinação remete ao conceito de espaço des-urbano: O espaço des-urbano resulta de uma configuração local do espaço po- bremente estruturada como consequência de que muito dos principais elementos da economia do movimento se perderam. A intenção é trans- mitir o inverso de qualidades espaciais comumente atribuídas às cidades, a saber: a ruptura na relação entre edifícios e espaços públicos; a fratura na relação entre escalas de movimento; a ruptura da interface entre ha- bitante e visitante5 (HILLIER, 1996, pp.131-134) e (SPACE SYNTAX LABORATORY; SPACE SYNTAX LIMITED, 2016, verbete dis-urban space). 5 Inhabitant and stranger. Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 101 Outra combinação que remete ao espaço des-urbano é a da permeabilidade da interface baixa mesmo quando a acessibilidade é alta, que é o caso de lugares acessivelmente privilegiados, mas onde muros se erguem para isolar os domínios de alguns hotéis, pousadas e resorts e empreendimentos de veraneio, ou onde cercas se erguem para demarcar estoques de terras que disputam o potencial de movimento para valorização futura. Neste caso, o espaço des-urbano é contingencial. O quadro pode ser revertido, muros podem ser rasgados, um parcelamento do solo mais permeável ao pedestre pode ser incentivado; novos negócios podem ativar fachadas, uma vez que a acessibilidade já favorece a vinda ou a passagem de pessoas. Onde a acessibilidade é alta globalmente, atividades relacionadas ao automóvel con- seguem se manter mesmo distantes das áreas densamente ocupadas dos povoados. É o caso do posto de gasolina com loja de conveniência na rodovia RN–003 entre Pipa e Sibaúma. Contudo, a capacidade de atividades associadas ao automóvel propiciarem animação ou pontos de burburi- nhos não foi verificada neste estudo — o contrário sim, os trechos animados da Avenida Baía dos Golfinhos também são disputados por automóveis, que compartilham os mesmos espaços do pedestre na rua. A boa notícia é que o anel viário alivia a pressão do fluxo de automóveis sobre a Avenida Baía dos Golfinhos e a animação é capaz de manifestar-se com menos risco de ser atropelada. A acessibilidade ao passante da vizinhança combinada com emergência de comércio com portas abertas para a rua sugere o estiramento do centro funcional da Avenida Baía dos Golfinhos para além da Boate Dos Calangos, em direção ao sul6 em rumo a casas de veraneio e áreas de expansão residencial de moradores permanentes. Seguindo da Boate Dos Calangos a leste, no sentido do Chapadão, há mais ocupações muradas pertencentes a extensos condomínios de veraneio, onde a permeabilidade das interfaces é baixa. Agora, um caso no qual a animação, de modo latente, é proporcionada pelo espaço, mas é contingenciada por uma permeabilidade débil. Um trecho do anel viário, compartilhado um pedaço da Rua da Mata numa curva, está situado onde a acessibilidade ao passante da vizinhança é alta7. Extensas muralhas de condomínios estancam a permeabilidade nas proximidades, mas há indícios de emergência de comércio em algumas margens das vias que resvalam por lotes menores. Um conjunto de lojas foi construído em uma das partes mais acessíveis da curva, entretanto o acesso da rua aos estabelecimentos é dificultado pela diferença de nível, por uma mureta e um estacionamento na calçada, o que possivelmente explique boa parte das lojas estarem 6 Figura 42(d), p.84. 7 Para quem estiver curioso com os detalhes ou disposto a rever os resultados, essa curva foi ilustrada na Figura 42(a), p.84; o trecho reúne os segmentos 24, 25 e 364 Capítulo 4. Interpretações derradeiras do arcabouço espacial e seu efeito na animação 102 desocupadas na ocasião das visitas de campo (2016 e 2017). Este é um caso no qual a estrutura espacial favorece o movimento, mas a permeabilidade, tal como se encontra, subaproveita o deslocamento de pedestres, inibindo a animação. Dificilmente os burburinhos nos pequenos povoados da beira da Lagoa de Guaraíras teriam a mesma dimensão das multidões fechando a rua na Pipa. Mas existe atividade em escala local nesses vilarejos, manifestada para além do polo globalmente animado da Pipa. Nos seis vilarejos, a permeabilidade da interface é caracterizada por casas sem cerca nem muros; alpendres e recuos lindeiros ao passeio público testemunham gente proseando na frente do recinto privado; crianças brincam sob a sombra de árvores em áreas compartilhadas entre vizinhos; jardins se emendam com a calçada. A permeabilidade é diferente daquela da fachada ativa; trata-se da área comum ao redor das casas, sem barreiras em relação à rua. A fronteira entre público e privado é tênue. A animação nesse contexto merece ser melhor estudada em trabalhos futuros, entretanto não é arriscado afirmar que há vida entrelaçando a ocupação residencial nesses povoados. Esse achado não contradiz que o comércio seria o indicador de animação dos centros vivos descritos por Hillier, mas reforça o entendimento de que a permeabilidade ao pedestre se relaciona ao vigor da movimentação de pessoas no espaço exterior — as portas abertas do varejo ou a ausência de cercas nos quintais possivelmente têm mais força que o rótulo do uso. Embriões de centro funcional emergem nos trechos da estrada onde a acessibilidade local é alta; algumas daquelas bucólicas residências, com flores no jardim e rede armada na varanda, têm dado lugar a mercadinhos, lojas, bares, pontos de venda de camarão. Parte desse comércio mantém a continuidade dos vazios acessíveis entre as edificações, herdada da ocupação residencial esparsa. A permeabilidade parece ter vindo antes, no processo de formação da malha de acessos. Acessibilidade e permeabilidade seriam cúmplices na transformação dos usos — a animação acompanhando uma mudança no perfil da interface, quintais abertos virando fachadas ativas. 103 CONSIDERAÇÕES FINAIS E FUTURAS O principal momento deste trabalho foi a constatação de que a animação é carre- gada pela articulação dos vazios da arquitetura para onde a forma dos cheios da arquitetura, a permeabilidade dos edifícios, a acolhe. Em que pesem os vazios acessíveis da malha viária de uma cidade se modificarem mais lentamente que a posição de pessoas no espaço, a predição do potencial de movimento de pessoas nas ruas da Pipa pela observação da estrutura quase fixa de cheios e vazios se demonstrou viável e robusta. Contudo, no início do estudo, a motivação foi atiçada pela modificação na malha viária; foi esperado que a construção do anel viário abalasse uma estrutura de acessos assentada por muitos anos, ameaçando a animação existente. Tal suposição não se confirmou, embora a "não mudança"estrutural tenha instigado o aprofundamento nos parâmetros de análise do espaço, esboçando frentes de investigação a serem aprofundadas. O desdobramento em pesquisas futuras é ambicionado pelo rastreio de clichés na arquitetura. O termo cliché foi empregado por Vaughan, Dhanani e Griffiths (2013) para revelar as circunstâncias do centro vivo ancorado na via principal, no intuito de postular que há vida fora dos centros comerciais. Nesse sentido, os achados na Região Turística da Pipa são inspiradores. Os casos de alta acessibilidade local fora das áreas adensadas dos povoados podem contribuir na compreensão de atividades (ou ausência delas) em bordas de assentamentos disputadas para fins de especulação imobiliária. Atividades em áreas coletivas remanescentes de vilarejos rurais, como crianças brincando nos quintais sem muros e gente conversando na calçada, podem ser revisadas quanto à pertinência no escopo da animação urbana; ou se uma urbanidade caracterizada pela co- presença e variedade de usos somente se manifestaria em áreas densamente ocupadas. Ou ainda, o quão relevante podem ser as dimensões densidade e esparso no entendimento da articulação entre vazios e cheios e da geração de movimento natural, prosseguindo a exploração de índices de compacidade ((HOLANDA, 2002b)) e demais variáveis morfológicas que levam em conta a densidade. 104 REFERÊNCIAS AL-SAYED, K. et al. Space syntax methodology. A teaching textbook for the MSc Spatial Design: Architecture & Cities. 4th. ed. London, 2014. Citado 6 vezes nas páginas 29, 31, 33, 109, 111 e 120. BARROS, N. C. C. d. 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A nomenclatura e equações da aplicação dos grafos na Análise da Sintaxe do Espaço foram predominantemente extraídas e adaptadas de Hanson (1998), Hillier e Hanson (1984) e Al-Sayed et al. (2014). A.1 O GRAFO Parafraseando e adaptando Steen (2010, p.18, definição 2.1), um grafo G consiste na coleção de vértices V e numa coleção de arestas A, para qual escrevemos G = (V, A). Cada aresta a ∈ A liga dois vértices , que são os chamados de pontos terminais da aresta. Se a liga u, v ∈ V, dizemos a = 〈u, v〉. Nesse caso, é dito que os vértices u e v são adjacentes. É dito que a aresta a é incidente com os vértices u e v. A.1.1 Distância Distância é a quantidade de arestas entre um vértice e outro pelo caminho mais curto. Caminho mais curto é o caminho entre um vértice e outro com a menor quantidade de arestas. Caminho é uma trilha sem repetição de vértices. Trilha é a sequência intercalada de vértice e arestas de um vértice a outro (STEEN, 2010). * * * Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 110 A.1.2 Exemplo de aplicação do grafo em um sistema de espaços. Do exemplo sugerido por Hanson (1998, p.28), um arranjo contendo 10 espaços (vérti- ces) interligados (por 9 arestas) é representado na Figura 53. Figura 53 – Um sistema de espaços interligados representado em grafo 8 7 6 10 9 5 4 3 2 1 Fonte: adaptado da Figura 1.10 de Hanson (1998, p.28) O grafo G = (V, A) da Figura 53 é constituído da coleção de vértices V e arestas A: V = {v1, v2, v3, v4, v5, v6, v7, v8, v9, v10} A = {a1,2, a2,3, a3,4, a5,6, a6,7, a7,8, a7,9, a9,10}. A incidência de cada aresta sobre duplas de vértices é: a1,2 = 〈v1, v2〉, a2,3 = 〈v2, v3〉, a3,4 = 〈v3, v4〉, a4,5 = 〈v4, v5〉, a5,6 = 〈v5, v6〉, a7,8 = 〈v7, v8〉, a7,9 = 〈v7, v9〉 e a9,10 = 〈v9, v10〉. O número de vértices é n, no caso n = 10. A distância entre um vértice e outro é o caminho mais curto entre eles, anotada como d(vi, vj), tal que i e j variam de 1 a n. A Análise da Sintaxe do Espaço não contempla espaços ligando diretamente a si mesmo, decorrendo que o conceito de profundidade apresentado na Seção 2.1.1 não se aplica partindo de um vértice para ele mesmo; ou seja, quando i = j a distância é d = 0. O grafo utilizado é o do tipo não direcionado, isto é, para o cálculo da distância não importa a direção, ou seja d(vi, vj) = d(vj, vi). O valor da distância d(vi, vj) equivale ao número de arestas na sequência do caminho mais curto entre vi e vj. Por exemplo, a distância d(v8, v9) = 2, pois há somente 2 arestas na Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 111 sequência v8–a8,7–v7–a7,9–v9 , que é o caminho mais curto entre v8 e v9. A distância de cada vértice para todos os demais vértices é representada pela matriz D1: D =  d11 d12 · · · d1n d21 d22 · · · d2n ... ... . . . ... dn1 dn2 · · · dnn  n×n , onde di,j = d(vi, vj) e i, j 6 n . No caso do exemplo, a matriz de distâncias corresponde a: D =  0 1 2 3 4 5 6 7 7 8 1 0 1 2 3 4 5 6 6 7 2 1 0 1 2 3 4 5 5 6 3 2 1 0 1 2 3 4 4 5 4 3 2 1 0 1 2 3 3 4 5 4 3 2 1 0 1 2 2 3 6 5 4 3 2 1 0 1 1 2 7 6 5 4 3 2 1 0 2 3 7 6 5 4 3 2 1 2 0 1 8 7 6 5 4 3 2 3 1 0  10×10 A soma de todas as profundidades partindo de uma dada origem é contada como Profundidade Total TD (Total Depth) (AL-SAYED et al., 2014, p.113), tal como expressa a equação A.1. TDi = n−1 ∑ j=1 dij, i 6= j (A.1) Aplicando a equação A.1 ao exemplo, a Profundidade Total a partir do vértice v1 (TD1) é a soma das 9 distâncias entre v1 e os demais vetores, que estão registradas na primeira linha da matriz D, a Profundidade Total TD2 a partir do vértice v2 é a soma das distâncias entre v2 e os demais vetores, que estão na segunda linha da matriz D, e assim por diante para os demais vértices. Então, TD1 = 1+ 2+ 3+ 4+ 5+ 6+ 7+ 7+ 8 = 43 e prosseguindo a contagem 1 D de distância ou, aproveitando a nomenclatura da Sintaxe do Espaço, D de profundidade (depth). Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 112 para os demais vértices, obtemos: TD =  1+ 2+ 3+ 4+ 5+ 6+ 7+ 7+ 8 1+ 1+ 2+ 3+ 4+ 5+ 6+ 6+ 7 2+ 1+ 1+ 2+ 3+ 4+ 5+ 5+ 6 3+ 2+ 1+ 1+ 2+ 3+ 4+ 4+ 5 4+ 3+ 2+ 1+ 1+ 2+ 3+ 3+ 4 5+ 4+ 3+ 2+ 1+ 1+ 2+ 2+ 3 6+ 5+ 4+ 3+ 2+ 1+ 1+ 1+ 2 7+ 6+ 5+ 4+ 3+ 2+ 1+ 2+ 3 7+ 6+ 5+ 4+ 3+ 2+ 1+ 2+ 1 8+ 7+ 6+ 5+ 4+ 3+ 2+ 3+ 1  =  43 35 29 25 23 23 25 33 31 39  A Profundidade Média MD (Mean Depth) de um sistema de espaços acessivelmente interconectados corresponde à média das distâncias de um vértice para os demais, tal como resume a equação A.2: MDi = TDi n− 1 (A.2) Lembrando que a distância para o próprio vértice é desconsiderada. Assim sendo, o número de elementos que compõem a média deve excluir o vértice de origem, o que resulta em n− 1 elementos, onde n é o número total de vértice do sistema. Voltando ao exemplo, obtemos: MD = TD n− 1 =  43 35 29 25 23 23 25 33 31 39  ÷ (10− 1) =  43÷ 9 35÷ 9 29÷ 9 25÷ 9 23÷ 9 23÷ 9 25÷ 9 33÷ 9 31÷ 9 39÷ 9  ∴ MD =  4, 78 3, 89 3, 22 2, 78 2, 56 2, 56 2, 78 3, 67 3, 44 4, 33  Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 113 A Profundidade Total TD1 e a Profundidade Média MD1, ambas partindo do vértice v1, são exibidas graficamente (Figura 54). A cada passo, um nível sobe, totalizando oito níveis acima da origem assinalada com uma cruz; MD = 4, 78 está entre sinalizado o 4º e 5º nível. Figura 54 – Profundidade Total e Profundidade Média do vértice v1. Fonte: Hanson (1998, p.28) Esse formato de diagrama com níveis a cada passo de uma origem (raiz) é chamado de justificado. Ao invés de matrizes, Hanson (1998, p.28) demonstra a contagem de TD1 com o uso do grafo justificado, somando o valor de cada nível multiplicado pela quantidade de vértices no respectivo nível. Assim, também é confirmando o resultado TD1 = 43, abaixo do traço de total visto na Figura 54. Nessa técnica, um grafo justificado é feito para cada vértice para a contagem da TD. O grafo de sistemas que representam acessos em cidades podem conter centenas ou milhares de vértices, o que demandariam igualmente centenas ou milhares de grafos justificados, que embora possibilitem uma compreensão mais intuitiva da estrutura espacial, podem ter uma viabilização trabalhosa em sistemas com muitos vértices. Contudo, a sequência de multiplicações empilhadas naquela Figura 54 são transferíveis para a modalidade de matrizes, bastando multiplicar a matriz de distâncias Dn×n por uma matriz de 1 coluna e n linhas com valor 1 em todas as entradas (Equação A.3), resultando em uma matriz TDn×1, cuja as entradas são todos os TDi Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 114 correspondentes aos vértices vi, com i variando de 1 a n. TDn×1 =  d11 d12 · · · d1n d21 d22 · · · d2n ... ... . . . ... dn1 dn2 · · · dnn  n×n ×  1 1 ... 1  n×1 (A.3) Embora menos intuitivas que os grafos justificados, matrizes são adequadas à imple- mentação da técnica usando recursos computacionais, como no caso desta pesquisa, na qual os cálculos das propriedades topológicas da sintaxe do espaço foram realizadas por programas de computador. Notem que TD e MD são expressas como matrizes de uma única coluna na página 112, essas colunas dizem respeito às que constam nas tabelas visualizáveis pelo sistema de informação geográfica QGIS ou pelo aplicativo de análise da sintaxe do espaço DepthmapX e que podem ser exportadas para planilhas eletrônicas. Em suma, aqui a técnica de contagem TD e MD converte grafos em tabelas. Nesta pesquisa, TD e MD não ficam explícitos nos mapas axiais e de segmentos resultantes e tampouco seus valores são diretamente evidenciados nas análises, mas suas respectivas colunas nas tabelas auxiliam o cálculo pelo programa de computador dos parâmetros de integração e choice definidas na Seção 2.2, estas sim exibidas em mapas para expressar resultados pertinentes à relação entre estrutura espacial e potencial de movimento. * * * Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 115 A.1.3 Distribuição, assimetria relativa e diamantes A distribuição dos acessos afeta a subordinação entre espaços na estrutura. No exemplo proposto por Hanson (Figura 54), todos os vértices estão direta ou indiretamente conectados entre si, é o chamado grafo conectado. Alguns vértices se ligam diretamente a outro, e outros vértices somente se conectam intermediados por outros vértices ao longo do caminho. Observemos a Figura 55. Em bifurcações e demais ramificações, a distância do vértice assinalado ( ) para os demais é a mesma, um passo de profundidade. Por outro lado, o enfileira- mento de vértices intercalados por arestas faz com que a distância da origem se diferencia de um vértice para outro. Para o caso enfileirado, o vértice assinalado tem uma relação assimétrica com os demais vértices. Figura 55 – Assimetria em relação à distribuição de vértices e arestas no grafo. Fonte: Hanson (1998, p.28) A Assimetria Relativa RA é obtida pela equação (HILLIER; HANSON, 1984, p108): RA = 2(MD− 1) n− 2 (A.4) No caso do vértice ramificado, RA = 0; no caso do vértice na ponta de uma fileira, RA = 1; como é demonstrado: ramificado:  n = 6 MD = TD n− 1 = 1+ 1+ 1+ 1+ 1 5 = 1 RA = 2(MD − 1) n− 2 = 2(1− 1) 6− 2 = 0 ∴ RA = 0 enfileirado:  n = 6 MD = TD n− 1 = 1+ 2+ 3+ 4+ 5 5 = 3 RA = 2(MD − 1) n− 2 = 2(3− 1) 6− 2 = 1 ∴ RA = 1 Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 116 Quanto mais o valor da RA se aproxima de 1, mais segregado está em relação ao sistema; quanto mais próximo de 0, mais integrado. Continuando no grafo exibido na Figura 53, com os dez vértices numerados, o procedi- mento de cálculo de RA1 (vértice v1) é: RA1  n = 10 TD1 = 43 MD1 = 4, 78 RA1 = 2(MD1 − 1) n− 2 = 2(4, 78− 1) 10− 2 = 7, 56 8 ∴ RA1 = 0, 944 Replicando a equação para os 10 vértices, resultam os valores de RA: RA =  0, 9444 0, 7222 0, 5556 0, 4444 0, 3889 0, 3889 0, 4444 0, 6667 0, 6111 0, 8333  Contudo, a comparação entre a assimetria relativa de sistemas com número de vér- tices muito diferente não é aplicável. Teklenburg, Timmermans e Wagenberg (1993, p.350) demonstram que a assimetria relativa aumenta com o incremento no número de vértices. Com- plementarmente, Krüger e Vieira (2012, p.198) esclarecem que a profundidade média decai em termos proporcionais ao incremento no número de vértices nos mapas axiais. Decorre disso a necessidade de padronizar um parâmetro de integração que seja independente do número de vértices. A maneira usual de padronização de mapas axiais toma um grafo justificado distribuído como um diamante como referência de comparação, conforme orientam Hillier e Hanson (1984), e detalham Krüger (1989), Teklenburg, Timmermans e Wagenberg (1993), Krüger e Vieira (2012) (Figura 56). Teklenburg, Timmermans e Wagenberg (1993, p.350) descrevem que o grafo em forma de diamante tem n vértices ao nível do meio, 12n vértices a um nível acima e abaixo do nível Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 117 Figura 56 – Distribuição em diamante Nível nº vértices Profundidade Fonte: Krüger e Vieira (2012, p.298) do meio, 14n vértices nos níveis acima e abaixo do nível de 1 2n, 1 8n vértices nos níveis acima e abaixo do nível de 14n, e assim por diante até o vértice mais profundo. A disposição do grafo na forma diamante se aproxima da distribuição normal2. Por meio de um cálculo que incorpora o desvio padrão da distribuição do diamante é obtido o valor-d (KRÜGER; VIEIRA, 2012, p.200) (KRÜGER, 1989, p.20): valor-dn = 2 ( n ( log2 (n+2 3 )− 1)+ 1) (n− 1)(n− 2) (A.5) A padronização da RA com base no valor-d é a Assimetria Relativa Real RRA (Real Relative Asymmetry) : RRA = RA valor-d (A.6) Aplicando ao vértice v1 do mesmo grafo, RRA1 é obtido: n = 10, RA1 = 0, 944 valor-d = 2(10(log2( 10+2 3 )−1)+1) (10−1)(10−2) = 0, 306 RRA1 = RA1 valor-d = 0,9440,306 = 3, 0864 2 A distribuição normal ou distribuição gaussiana é aplicada em generalizações acerca de erros, fenômenos naturais e sociais. [Imagem: adaptada de Cmglee (2012)] Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 118 Quanto maior o valor de RRA do vértice, menos integrado está em relação aos demais vértices do sistema. Como o foco é a integração, (HILLIER; HANSON, 1984) invertem a escala, criando o parâmetro de integração INThh: INThh = 1 RRA (A.7) Quanto maior a INThh do vértice, maior sua integração ao sistema de acessos. RRA para todos os vértices é calculada e, subsequentemente, INThh é obtida : RRA = RA valor-d = RA 0, 306 =  0, 9444 0, 7222 0, 5556 0, 4444 0, 3889 0, 3889 0, 4444 0, 6667 0, 6111 0, 8333  ÷ 0, 306 =  3, 0864 2, 3602 1, 8155 1, 4524 1, 2709 1, 2709 1, 4524 2, 1786 1, 9971 2, 7233  , INThh = 1 RRA =  0, 3240 0, 4237 0, 5508 0, 6885 0, 7869 0, 7869 0, 6885 0, 4590 0, 5007 0, 3672  A posição de INThh na hierarquia de acessos é classificada, segundo uma escala de cores, tal como na Seção 2.2.2: INThh =  0, 3240 0, 4237 0, 5508 0, 6885 0, 7869 0, 7869 0, 6885 0, 4590 0, 5007 0, 3672  =             (A.8) Escala de acessibilidade: alta  baixa A Figura 57 exibe um exemplo de mapa axial com o parâmetro de integração INThh classificado por cores, que teve como base um fragmento de arranjo espacial contemplando vias na Praia da Pipa, com 10 vértices distribuídos segundo o exemplo de Hanson. Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 119 Figura 57 – Mapa axial da integração INThh baseado no grafo do exemplo de Hanson. Números: identificação dos vértices v1 ao v10. Escala de acessibilidade: alta  baixa A escolha de um mapa disposto predominantemente de modo linear com uma bifurcação próxima à ponta eventualmente pode induzir à falsa interpretação de que a aparência dos grafos e do arranjo de vias necessariamente se assemelhariam. Ledo engano óptico, a Figura 58 expõe dois arranjos axiais que correspondem exatamente ao mesmo grafo de 10 vértices e 9 arestas do exemplo de Hanson. Este mesmo grafo subjaz os dois mapas axiais da Figura 58, portanto apresenta os mesmos parâmetros de integração INThh do mapa exibido na Figura 57; as profundidades totais, médias e assimetrias são idênticas, embora os mapas difiram em disposição geométrica. Figura 58 – Integração INThh em dois mapas axiais de arranjos dispostos a esmo de um único grafo de acessos. Números: identificação dos vértices v1 ao v10. Escala de acessibilidade: alta  baixa Eis a beleza do mapa axial, a estrutura imanente dos vazios acessíveis desprende-se da forma aparente percebida pelo senso comum. Apêndice A. Definições matemáticas dos parâmetros topológicos de acessibilidade 120 A.2 NORMALIZAÇÃO EM ANÁLISE ANGULAR DE SEGMENTOS Segundo Hillier, Yang e Turner (2012, p.160), a normalização de choice angular em segmentos é: NACH = log(CH + 1) log(TD+ 3) (A.9) A equação A.9 pode ser assim traduzida: CH: contabilize os segmentos com mais chances de serem passados em percursos de menor caminho, considerando distâncias angulares; sendo que distância angular é a distância topológica ponderada pelo ângulo entre segmentos; TD: (Total Depth, profundidade total) é o custo do movimento em passos ponderados pelos ângulos. CH TD : priorize o benefício do movimento proporcionado por CH em razão do custo angular TD. Logarítmos e constantes: redistribua os valores, minimizando a variação e evitando resultados sem sentido — o logaritmo é necessário devido aos valores de CH variarem exponencial- mente; a distribuição de valores muito díspares dificulta a análise. A soma com a constante 1 foi para evitar o “logaritmo de zero”, o que não faria sentido. Quando o segmento é maior que a profundidade total, o Depthmap atribui o valor -1 para TD; como o logaritmo de (−1+ 2) também faz pouco sentido, a constante 3 é somada ao TD. A normalização da integração angular em segmentos foi baseada em estudos empíricos que encontraram uma correlação alta com o número de nós do sistema elevado por 1, 2. Maiores detalhes podem ser vistos no manual de metodologia de Sintaxe do Espaço (AL-SAYED et al., 2014) e no artigo de Hillier, Yang e Turner (2012) acerca da normalização pelo menor ângulo.O parâmetro de integração angular em segmentos normalizado (NAIN) é dado pela equação A.10, onde NC (Node Count) é a contagem de nós (vértices) do sistema e TD é a profundidade total, considerando ângulos. NAIN = NC1,2 TD (A.10) A integração é inversamente proporcional a TD; quanto menor for o custo do mo- vimento para alcançar as demais porções de espaço, maior será a integração. O ajuste pela contagem de nós NC1,2 redistribui os valores de modo a melhor se correlacionarem com valores aferidos empiricamente. 121 B CONCENTRAÇÃO DE SEGMENTOS COM A MÁXIMA ACESSIBILIDADE EM VÁRIOS RAIOS DE ABRANGÊNCIA. B.1 CONCENTRAÇÃO DE SEGMENTOS COM A MÁXIMA ACESSIBILIDADE-PARA EM 17 RAIOS DE ABRANGÊNCIA. Figura 59 – Integração angular normalizada NAIN r = 400, 600, 800, 1000, 1200, 1600, 2000, 2400, 3200, 4000, 5000, 6000, 7000, 8000, 10000, 12000, n (metros). Os segmentos da Pipa, na região da “batata espetada” de acessos, aparecem com a mais alta acessibilidade-para a partir do raio de 10000m ao global (n), exceto por uma pequena contração ao raio de 400m. Na sede municipal, os segmentos com alta acessibilidade predominam nas abrangâncias de 3200m a 7000m. Na estrada entre Pipa e Sibaúma os segmentos com a mais alta acessibilidade corresponde a abrangências entre 800m e 6000m. Apêndice B. Concentração de segmentos com a máxima acessibilidade em vários raios de abrangência.122 B.2 CONCENTRAÇÃO DE SEGMENTOS COM A MÁXIMA ACESSIBILIDADE-ATRAVÉS EM 16 RAIOS DE ABRANGÊNCIA. Figura 60 – Choice angular normalizada NACH r = 600, 800, 1000, 1200, 1600, 2000, 2400, 3200, 4000, 5000, 6000, 7000, 8000, 10000, 12000, n (metros). Os segmentos da Pipa, na região da “batata espetada” de acessos, aparecem com a mais alta acessibilidade-através a partir do raio de 3200m ao global (n). Há segmentos com alta acessibilidade nos povoados da beira da Lagoa de Guaraíras de 600m até 10000m. A acessibilidade no raio de 10000m contempla tanto Pipa como três povoados da beira da Lagoa: Piau, Bela Vista e Munim. 123 C ACESSIBILIDADE-ATRAVÉS RELATIVA A RAIOS MENORES É RAZOAVEL- MENTE CORRESPONDIDA PELO TAMANHO DO SEGMENTO NA AVENIDA BAÍA DOS GOLFINHOS Para os segmentos da Avenida Baía dos Golfinhos, a variação na acessibilidade-através ao raio de 600m ou menores é mais razoavelmente correspondida pelo tamanho do segmento que aos raios maiores. Essa correspondência é descrita pelo coeficiente de determinação R2, exibido para a acessibilidade em cada raio do global ao local na Figura 61. Figura 61 – Coeficientes de determinação R2 acerca da correlação entre tamanho de segmentos e acessibilidade global a local coeficiente de determinação (R2) raio n 12000 10000 8000 7000 6000 5000 4000 3200 2400 2000 1600 1200 1000 800 600 400 200 R2( tamanho,NACH) 0,01 0,01 0,02 0,05 0,06 0,06 0,08 0,11 0,13 0,15 0,16 0,13 0,17 0,18 0,19 0,54 0,68 0,62 R2( tamanho,NAIN) 0,00 0,01 0,01 0,05 0,05 0,09 0,09 0,08 0,06 0,03 0,03 0,01 0,00 0,00 0,05 0,04 0,02 0,06 coeficiente de correlação de Pearson (R) raio n 12000 10000 8000 7000 6000 5000 4000 3200 2400 2000 1600 1200 1000 800 600 400 200 R(tamanho,NACH) -0,10 -0,11 -0,14 -0,22 -0,25 -0,25 -0,29 -0,33 -0,36 -0,38 -0,39 -0,36 -0,41 -0,43 -0,44 -0,73 -0,83 -0,79 R(tamanho,NAIN) -0,05 -0,09 -0,12 -0,23 -0,23 -0,30 -0,31 -0,28 -0,25 -0,17 -0,16 -0,12 -0,05 0,06 0,23 0,19 0,12 -0,25 54% da variação na acessibilidade-através para raio de 600m é correspondida pela variação no tamanho do segmento (R2 = 0, 54). Neste caso o coeficiente de correlação R é negativo (−0, 73), descrevendo que há uma tendência da acessibilidade-através a 600m aumentar à medida em que o tamanho de segmentos diminui. A variação na acessibilidade-para é pouco correspondida pelo tamanho de segmentos em todos os raios de abrangência (R2 < 9%). Embora a acessibilidade-através a 400m e 200m sejam mais correspondidas pela variação do tamanho do segmentos, estes raios foram descartados na análise da malha de acessos na “batata espetada” da Pipa, por não permitirem identificar alguma relação com a distribuição de usos e animação observada nas visitas de campo ou nas fontes.