MARIANA FIALHO BONATES IDEOLOGIA DA CASA PRÓPRIA... SEM CASA PRÓPRIA O Programa de Arrendamento Residencial na cidade de João Pessoa-PB Dissertação apresentada ao Programa de Pós- graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo. Orientadora: Profa. Dra. Angela Lúcia de Araújo Ferreira Natal-RN Agosto-2007 MARIANA FIALHO BONATES IDEOLOGIA DA CASA PRÓPRIA... SEM CASA PRÓPRIA O Programa de Arrendamento Residencial na cidade de João Pessoa-PB Banca Examinadora: Profa. Dra. Angela Lúcia de Araújo Ferreira Orientadora – PPGAU-UFRN Prof. Dr. Nabil Georges Bonduki Examinador externo – FAU-USP Prof. Dr. Marcelo Tinoco Examinador interno – PPGAU-UFRN Prof. Dra. Maria do Livramento Clementino Examinadora interna – PGCS-UFRN Natal-RN Agosto-2007 Aos meus pais, por terem me ensinado o valor do conhecimento. À minha irmã, por me mostrar a importância da tranqüilidade. AGRADEÇO, à professora Dra. Angela Lúcia de Araújo Ferreira, pela orientação, ao CNPq, pela bolsa de estudos por quase dois anos, a Gustavo Pires de Oliveira, a Marcus Vinícius Queiroz e a Luana Cruz, por terem me ajudado com parte da pesquisa de campo, aos construtores, à gerente da administradora dos imóveis do PAR e aos técnicos da CAIXA, pelas informações e entrevistas concedidas, ao secretário de Habitação da Prefeitura Municipal de João Pessoa e aos técnicos de todas as instituições pesquisadas, pelas valiosas informações e entrevistas concedidas, a todos os arrendatários, por terem me cedido um pouco do seu tempo para responder aos questionários, ao professor Dr. Flávio Henrique, pela orientação estatística, à professora Edileuza Gonçalves de Araújo, pela correção gramatical, a Janilson Torres, pela programação visual das capas, a Márcio Moraes Valença, pela paciência, pelo apoio, e pela contribuição acadêmica por meio das nossas discussões sobre a temática, enfim, a todos que direta ou indiretamente contribuíram para a elaboração deste trabalho. RESUMO A política habitacional brasileira caracteriza-se pela disseminação da ideologia da casa própria. Em 1999, foi criada uma forma diferente de acesso à moradia no país, através do Programa de Arrendamento Residencial (PAR), que é um arrendamento mercantil, ou leasing; no entanto, o novo programa continuou difundindo a ideologia da casa própria, já que, no final do contrato, é dada ao arrendatário a opção de compra. Este trabalho visa a compreender o papel do PAR no cenário das políticas habitacionais, no período pós-BNH, por intermédio de um estudo de caso na cidade de João Pessoa-PB. A partir da delimitação da área, foi possível também estudar o programa em relação à dinâmica do crescimento urbano. Além disso, a análise do PAR foi dividida em duas vertentes analíticas: a primeira trata dos aspectos operacionais do programa; a outra é voltada para os aspectos locacionais e arquitetônicos das habitações. Os aspectos operacionais se referem à forma de funcionamento, considerando-se os elementos do PAR que o diferenciam dos demais programas de habitação do país. Os aspectos locacionais e arquitetônicos se referem, respectivamente, à localização dos conjuntos no espaço urbano e aos aspectos tipológicos e construtivos das moradias financiadas. Assim, torna-se possível traçar o panorama da produção de conjuntos habitacionais e as características da produção promovida pelo PAR, observando-se suas especificidades e seus impactos na cidade. Palavras-chave: Programa de Arrendamento Residencial; Forma de Acesso à Moradia, Características Locacionais e Arquitetônicas. ABSTRACT Brazilian Housing policy has always promoted homeownership. In 1999, a new form of housing promotion was set up in the country with the PAR (Programa de Arrendamento Residencial, or residential rental programme). This is a sort of leasing, in which a right to buy is granted at the end of contract. Again, with this, the final objective is homeownership. This dissertation aims at further understanding the role of PAR in the wake of the country’s housing policies of the post-BNH period, analysing the case of João Pessoa, capital city of Paraíba state. By focusing in the city, it has been possible to analyse also the impact of the programme in the dynamics of the city’s urban development. Accordingly, the analysis of PAR seeks to understand the programme’s operational aspects as well as its location, urban and architectural aspects. The operational aspects refer to how the programme is operated, considering the differences to the other housing programmes in the country. The urban and architectural aspects refer to location, typology and construction characteristics of housing estates produced under the scheme. This study gives a general view of the country’s recent housing policy and programmes and the specific characteristics of PAR, observing also its impacts in the city development. Keywords: Housing Policy; Home Ownership; Rental Housing; Architectural and Urban Features. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 – Distribuição percentual dos domicílios particulares permanentes urbanos por condição de ocupação entre 1940 e 1990 50 FIGURA 2 – Anúncio do Jornal do Brasil sobre o aluguel do BNH (20-06-72) 54 FIGURA 3 – Anúncio do Jornal Última Hora sobre o aluguel do BNH (06-10- 83 54 FIGURA 4 – Conjunto habitacional do PSH José Alexandre Filho em Poço José de Moura, na Paraíba 73 FIGURA 5 – Programa Carta de Crédito em Caçapava, São Paulo 74 FIGURA 6 – Placa fixada em um condomínio fechado, financiado pelo Carta de Crédito Associativo, na cidade de João Pessoa 82 FIGURA 7 – Cartilhas distribuídas pela CAIXA para explicar à população de uma forma mais simples o funcionamento do programa 92 FIGURA 8 – Placa fixada no edifício do Residencial Ribeira I e Ribeira II na cidade do Natal-RN 94 FIGURA 9 – Esquema de relações entre os agentes envolvidos no processo do PAR 105 FIGURA 10 – Quantidade de recursos alocados para o PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) 121 FIGURA 11 – Quantidade de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) 121 FIGURA 12 – Implantação do conjunto Laçador 129 FIGURA 13 – Relação entre público e privado no conjunto Laçador 129 FIGURA 14 – Conjunto José Bonifácio 131 FIGURA 15 – Conjunto Valo Velho II 131 FIGURA 16 – Conjunto Barro Branco II 132 FIGURA 17 – Conjunto Santa Etelvina II A 132 FIGURA 18 – Implantação do conjunto Residencial Galápagos 133 FIGURA 19 – Vista externa dos blocos habitacionais do conjunto Galápagos 134 FIGURA 20 – Planta baixa das unidades habitacionais do conjunto Galápagos 134 FIGURA 21 – Conjunto Costa Dourada 135 FIGURA 22 – Conjunto Residencial José Bernardes 135 FIGURA 23 – Conjunto formado por unidades geminadas em Maceió 135 FIGURA 24 – Entrada do Residencial Izabel Urquiza 136 FIGURA 25 – Entrada do conjunto Residencial Barbosa Lima Sobrinho 136 FIGURA 26 – Blocos pintados de diferentes cores no Residencial Izabel Urquiza 137 LISTA DE FIGURAS (continuação) FIGURA 27 – Delimitação dos bairros da cidade de Natal 138 FIGURA 28 – Entorno do Residencial Ribeira I 139 FIGURA 29 – Entorno do Residencial Ribeira II 139 FIGURA 30 – Residencial Ribeira I 140 FIGURA 31 – Residencial Ribeira II 140 FIGURA 32 – Antigo “Hotel São Paulo”, hoje mais um conjunto do PAR chamado “Edifício São Paulo” 142 FIGURA 33 – Antigo “Hotel Central” e possível edifício a ser financiado pelo PAR 142 FIGURA 34 – Produção habitacional entre 1935 e 1963 em João Pessoa 148 FIGURA 35 – Vista da fachada frontal (norte) do “18 andares” 148 FIGURA 36 – Planta baixa do pavimento tipo que abriga o setor residencial do edifício “18 andares” 149 FIGURA 37 – Produção habitacional entre 1967 e 1986 em João Pessoa 152 FIGURA 38 – Parte do conjunto Brisa Mar ainda sem pavimentação nos dias atuais 152 FIGURA 39 – Tipo habitacional do conjunto Brisa Mar nos dias atuais, com as características da arquitetura original ainda bastante preservadas 153 FIGURA 40 – Vista frontal do tipo PB.23 – geminada e duplex – do conjunto Mangabeira I, nos dias atuais, com as características da arquitetura original ainda bastante preservadas 153 FIGURA 41 – Produção habitacional entre 1987 e 1989 em João Pessoa 155 FIGURA 42 – PAIH – Edificações do conjunto Mangabeira VII, localizado em Mangabeira (região sudeste) 162 FIGURA 43 – Planta baixa do pavimento tipo dos edifícios do conjunto Mangabeira VII (área privativa=51,38m²) 162 FIGURA 44 – PEP – Conjunto Água Azul, localizado no bairro de Água Fria (região sudeste) 165 FIGURA 45 – Planta baixa do pavimento tipo do conjunto Água Azul (apartamento com área privativa igual a 46,65m²) 165 FIGURA 46 – Produção habitacional entre 1990 e 1992 em João Pessoa 166 FIGURA 47 – PEP – Conjunto IV Centenário, localizado no bairro Cidade Universitária (região sudeste) 166 FIGURA 48 – Vista dos edifícios do conjunto Mangabeira Portal do Seixas, em Mangabeira (região sudeste) 172 FIGURA 49 – Vista dos edifícios do conjunto Celso Mariz, localizado em Mangabeira (região sudeste) 172 LISTA DE FIGURAS (continuação) FIGURA 50 – Planta baixa esquemática das habitações do Portal do Seixas 172 FIGURA 51 – Projeto Mariz II, em Mangabeira (região sudeste) 173 FIGURA 52 – Planta baixa das casas produzidas pela FAC 173 FIGURA 53 – Fachada das casas produzidas pela FAC 173 FIGURA 54 – Planta baixa esquemática das habitações financiadas pelo PHS 174 FIGURA 55 – Fachada das habitações financiadas pelo PHS 174 FIGURA 56 – Residencial Fraternidade, no bairro Funcionários IV (região sul) 175 FIGURA 57 – Residencial Cidadania, no bairro de Valentina (região sudeste) 175 FIGURA 58 – Reformas promovidas em 2006 ou 2007 no Condomínio Amizade 175 FIGURA 59 – Walter Forte B – vista externa – no bairro do Geisel (região sudeste) 178 FIGURA 60 – Walter Forte B – vista interna 178 FIGURA 61 – Produção habitacional entre 1995 e 1998 em João Pessoa 179 FIGURA 62 – Conjunto “É pra morar”, no Distrito Mecânico (região sudoeste) 182 FIGURA 63 – Planta baixa do “É pra morar” 182 FIGURA 64 – PAR – Residencial Estado de São Paulo, localizado no bairro Pedro Gondim (região leste) 185 FIGURA 65 – PAR – Residencial Maria Apolônia, localizado no bairro José Américo (região sudeste) 185 FIGURA 66 – Solar Tambauzinho, localizado no bairro de Tambauzinho (região leste) 186 FIGURA 67 – Produção habitacional entre 1999 e 2002 em João Pessoa 187 FIGURA 68 – Planta baixa do Loteamento Parque Sul I, no bairro Grotão (região sul) 190 FIGURA 69 – Casa do Loteamento Parque Sul I, no bairro Grotão (região sul) 190 FIGURA 70 – PAR – Residencial Sérgio Queiroz, no bairro Valentina (região sudeste) 192 FIGURA 71 – PAR – Residencial Araçá, no bairro Geisel (região sudeste) 192 FIGURA 72 Produção habitacional entre 2003 e 2006 em João Pessoa 193 FIGURA 73 – Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR, no Brasil e na Paraíba, entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) 202 FIGURA 74 – Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e dezembro de 2006 nas cidades da Paraíba (o ano é o de assinatura do contrato) 204 LISTA DE FIGURAS (continuação) FIGURA 75 – Quantidade de recursos alocados entre 1999 e dezembro de 2006 nas cidades da Paraíba (o ano é o de assinatura do contrato) 204 FIGURA 76 – Produção habitacional entre 1999 e 2006 do PAR em João Pessoa. 212 FIGURA 77 – Residencial Litoral Sul, no bairro Jardim São Paulo (Bancários) (região sudeste) 216 FIGURA 78 – Planta baixa do Residencial Litoral Sul 216 FIGURA 79 – Residencial Via Norte II, localizado no Alto do Céu (norte/nordeste) 216 FIGURA 80 – Planta baixa do Residencial Via Norte II 216 FIGURA 81 – Residencial Cristo Redentor I, localizado no bairro do Cristo (região sul) 217 FIGURA 82 – Residencial Victoria, localizado no bairro do Cristo (região sul) 217 FIGURA 83 – Residencial Raquel de Queiroz, localizado no bairro Cidade Universitária (região sudeste) 217 FIGURA 84 – Planta baixa do Residencial Cristo Redentor I igual à planta do Residencial Victória e Raquel de Queiroz 217 FIGURA 85 – Residencial Jardim Tropical localizado no bairro José Américo (sudeste), com varanda 220 FIGURA 86 – Planta baixa do Residencial Jardim Tropical 220 FIGURA 87 – Residencial Jardins do Sul localizado no bairro Água Fria (sudeste), sem varanda 220 FIGURA 88 – Planta baixa do Residencial Jardins do Sul 220 FIGURA 89 – Residencial Maria Apolônia, localizado no bairro José Américo (região sudeste) e organizado na forma de condomínio fechado 222 FIGURA 90 – Residencial Sérgio Queiroz, localizado em Valentina (região sudeste) e organizado na forma de loteamento 222 FIGURA 91 – Residencial Araçá, localizado no Geisel (região sudeste), na forma de condomínio fechado 222 FIGURA 92 – Residencial Emídio Sarmento, localizado no Geisel (região sudeste), unidades do tipo duplex, na forma de condomínio fechado 222 FIGURA 93 – Praçinha e playground no Residencial Maria Apolônia 223 FIGURA 94 – Quadra e salão de festas do Residencial Maria Apolônia 223 FIGURA 95 – Planta baixa do Residencial Araçá 223 FIGURA 96 – Planta baixa do Residencial Sérgio Queiroz 223 FIGURA 97 – Conjunto de casas da Rua João Suassuna 228 LISTA DE FIGURAS (continuação) FIGURA 98 – Casarão 27 da Rua João Suassuna 228 FIGURA 99 – Casarão 13 da Rua João Suassuna 228 FIGURA 100 – Edifício Dom João, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “RD Incorporações” 230 FIGURA 101 – Edifício Porto Gurupi, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “Conserpa” 230 FIGURA 102 – Residencial de elevado padrão, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “Ômega Construtora” 230 FIGURA 103 – Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços prestados pela administradora 238 FIGURA 104 – Percentual do nível de escolaridade dos arrendatários 239 FIGURA 105 – Percentual do tipo de ocupação dos arrendatários 240 FIGURA 106 – Percentual da composição familiar dos arrendatários 241 FIGURA 107 – Percentual do tipo de ocupação domiciliar anterior dos arrendatários 243 FIGURA 108 – Percentual do número de arrendatários que buscaram outras formas de financiamento da casa própria 243 FIGURA 109 – Percentual de arrendatários que consideram vantajosa a facilidade de desistir do imóvel a qualquer momento 245 FIGURA 110 – Percentual de arrendatários que consideram vantajosa a mobilidade residencial 245 FIGURA 111 – Percentual da expectativa dos arrendatários em relação ao programa ao final dos 15 anos de contrato 246 FIGURA 112 – Percentual de arrendatários que participam das reuniões de condomínio 247 FIGURA 113 – Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços de transporte público 248 FIGURA 114 – Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços gerais 249 FIGURA 115 – Percentual de arrendatários que utilizam os equipamentos coletivos 251 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 – Síntese das principais características tipológicas, construtivas e locacionais identificadas na produção habitacional dos IAPs e do BNH 60 QUADRO 2 – Programas do governo de Fernando Collor de Mello e suas respectivas fontes de recursos 66 QUADRO 3 – Programas do governo de Itamar Franco e suas respectivas fontes de recursos 68 QUADRO 4 – Programas do governo de Fernando Henrique Cardoso e suas respectivas fontes de recursos 71 QUADRO 5 – Programas do governo de Lula e suas respectivas fontes de recursos 77 QUADRO 6 – Dados comparativos entre os programas habitacionais Carta de Crédito Individual, Carta de Crédito Associativo e o PAR 81 QUADRO 7 – Principais transformações legislativas do PAR ao longo do seu desenvolvimento 89 QUADRO 8 – Diferenças do leasing para o financiamento convencional e a locação 91 QUADRO 9 – Características dos dois grupos do Programa de Arrendamento Residencial 111 QUADRO 10 – “Manual de especificações mínimas” para as habitações do PAR, por região, considerando-se as características, o programa de necessidades e a área útil privativa 118 QUADRO 11 – “Manual de especificações mínimas” para as habitações do PAR, por região, considerando-se apenas os equipamentos comunitários 119 QUADRO 12 – Síntese dos principais programas federais, estaduais e municipais atuantes a partir da década de 1990 160 QUADRO 13 – Síntese das empresas construtoras envolvidas com o PAR e a respectiva construção (1999-2005) 229 QUADRO 14 – Síntese das principais características tipológicas, construtivas e locacionais identificadas na produção habitacional dos IAPs, do BNH, do programa PAIH e do PAR 263 LISTA DE TABELAS TABELA 1 – Investimentos em habitação, distribuídos por programas (em milhões), entre 2003 e julho 2005 80 TABELA 2 – Simulações da possibilidade de saldo residual, após o fim do contrato de 15 anos 97 TABELA 3 – Valor máximo de aquisição das unidades do PAR por estado brasileiro 115 TABELA 4 – Quantidade de recursos alocados para o PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) 121 TABELA 5 – Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) 121 TABELA 6 – Perfil do número de unidades habitacionais financiados pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) 122 TABELA 7 – Produção das unidades habitacionais do PAR por região entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) 124 TABELA 8 – Distribuição percentual da produção habitacional do PAR nas cidades brasileiras entre 1999 e 2003 124 TABELA 9 – Valor das unidades habitacionais do PAR por região entre 1999 e 2003 (o ano é de assinatura do contrato) 126 TABELA 10 – Dimensão dos conjuntos do PAR por região entre 1999 e 2003 (o ano é de assinatura do contrato) 127 TABELA 11 – Resumo do número de unidades nos conjuntos habitacionais produzidas em João Pessoa entre 1937 e 1986 150 TABELA 12 – Resumo do número de unidades nos conjuntos habitacionais produzidas em João Pessoa entre 1937 e 1989 156 TABELA 13 – Crescimento das favelas e de seus domicílios no município de João Pessoa 157 TABELA 14 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1990 e 1992 161 TABELA 15 – Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1990 e 1992 para os agentes privados 163 TABELA 16 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1990 e 1992 164 TABELA 17 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1993 e 1994 167 TABELA 18 – Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1995 e 1998 168 TABELA 19 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1995 e 1998 171 LISTA DE TABELAS (continuação) TABELA 20 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1995 e 1998 176 TABELA 21 – Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1999 e 2002 180 TABELA 22 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1999 e 2002 181 TABELA 23 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1999 e 2002 183 TABELA 24 – Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 2003 e dezembro de 2006 188 TABELA 25 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 2003 e meados de 2006 190 TABELA 26 – Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 2003 e dezembro de 2006 191 TABELA 27 – Volume específico de recursos alocados pelo governo federal (em milhões), através da CAIXA, em João Pessoa entre 1990 e 2006 195 TABELA 28 – Resumo do perfil da produção de moradias efetuada pelos agentes públicos e privados em João Pessoa entre 1990 e 2006 196 TABELA 29 – Quantidade de recursos alocados para produção habitacional, em milhões, na Paraíba entre 1999 e 2006 203 TABELA 30 – Relação da quantidade de unidades e conjuntos em João Pessoa e Campina Grande 204 TABELA 31 – Valor médio das unidades dos conjuntos habitacionais financiados pela PAR (1999-2005) 205 TABELA 32 – Taxas financeiras dos conjuntos financiados pelo PAR em João Pessoa (1999-2005) 209 TABELA 33 – Características gerais dos conjuntos habitacionais financiados pela PAR em João Pessoa (1999-2005) 211 TABELA 34 – Características arquitetônicas dos conjuntos habitacionais financiados pelo PAR (1999-2005) 214 TABELA 35 – Remuneração da empresa administradora pernambucana obtida com a administração dos condomínios do PAR em João Pessoa 235 TABELA 36 – Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços prestados pela administradora 238 TABELA 37 – Resultado do nível de escolaridade dos arrendatários 239 TABELA 38 – Resultado do tipo de ocupação dos arrendatários 240 TABELA 39 – Resultado da composição familiar dos arrendatários 241 LISTA DE TABELAS (continuação) TABELA 40 – Resultado do tipo de ocupação domiciliar anterior dos arrendatários 243 TABELA 41 – Resultado do número de arrendatários que buscaram outras formas de financiamento da casa própria 243 TABELA 42 – Resultado do número de arrendatários que consideram vantajosa a facilidade de desistência do imóvel a qualquer momento 245 TABELA 43 – Resultado do número de arrendatários que consideram vantajosa a mobilidade residencial 245 TABELA 44 – Resultado da expectativa dos arrendatários em relação ao programa ao final dos 15 anos de contrato 246 TABELA 45 – Resultado do número de arrendatários que participam das reuniões de condomínio 247 TABELA 46 – Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação ao serviço de transporte público 248 TABELA 47 – Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços gerais 249 TABELA 48 – Resumo do nível de satisfação dos arrendatários com os aspectos construtivos e tipológicos 250 TABELA 49 – Resultado do número de arrendatários que utilizam os equipamentos coletivos 251 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BC – Banco Central BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento BNH – Banco Nacional de Habitação CEF – Caixa Econômica Federal CAIXA – Caixa Econômica Federal CEHAP – Companhia de Habitação Popular COHABs – Companhias de Habitação COHEP – Cooperativa Habitacional do Estado da Paraíba CONSO – Carteiras de Operações de Natureza Social COOPHAB – Programa Cooperativas FAC – Fundação de Ação Comunitária FAR – Fundo de Arrendamento Residencial FAS – Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social FCP – Fundação da Casa Popular FDS – Fundo de Desenvolvimento Social FGTS – Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FICAM – Programa de Financiamento da Construção, Conclusão, Ampliação ou Melhoria de Habitação de Interesse Social FINSOCIAL – Fundo de Investimento Social FHC – Fernando Henrique Cardoso FMI – Fundo Monetário Internacional FNHIS – Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social FUNDASE – Fundo Especial para o Desenvolvimento do Programa Habitacional do IPASE GIDUR – Gerência de Filial de Desenvolvimento Urbano GILIE – Gerência de Filial de Alienar Bens Móveis e Imóveis hab/ha – Habitantes por hectare IAPs – Institutos de Aposentadoria e Pensões IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDEME – Instituto de Desenvolvimento Municipal e Estadual da Paraíba INOCOOPs – Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais IPASE – Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS (continuação) IPEP – Instituto de Previdência do Estado da Paraíba MAS – Ministério da Ação Social OGU – Orçamento Geral da União ONGs – Organizações não-governamentais PBQP-H – Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade Habitacional PAIH – Plano de Ação Imediata para a Habitação PAR – Programa de Arrendamento Residencial PEP – Programa Empresário Popular PMJP – Prefeitura Municipal de João Pessoa PMN Prefeitura Municipal do Natal PNH – Política Nacional de Habitação PNHIS – Plano Nacional de Habitação de Interesse Social PHS – Programa Habitacional Solidário PROTECH – Programa de Difusão Tecnológica para Construção de Habitação de Baixo Custo PROHAP – Programa de Habitação Popular PSH – Programa de Subsídio à Habitação RM – Região Metropolitana SBPE – Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo SEAC – Secretaria Especial de Ação Comunitária SEDU – Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano SEHAB – Secretaria da Habitação e Desenvolvimento Urbano do Município de São Paulo SEPURB – Secretaria de Política Urbana SFH – Sistema Financeiro da Habitação SNHIS – Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social sm – Salário mínimo TR – Taxa de Referência uh – Unidade habitacional SUMÁRIO RESUMO.............................................................................................................. 06 ABSTRACT.......................................................................................................... 07 LISTA DE FIGURAS............................................................................................ 08 LISTA DE QUADROS.......................................................................................... 13 LISTA DE TABELAS........................................................................................... 14 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS.............................................................. 17 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 19 PARTE I: O PAR NA POLÍTICA HABITACIONAL BRASILEIRA 1 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA HABITAÇÃO............................................................ 25 1.1 Noções preliminares acerca da mercadoria moradia........................................... 27 1.2 Os agentes participantes da produção habitacional............................................. 32 1.3 As formas de atuação do Estado......................................................................... 37 1.4 O papel do Estado na produção habitacional....................................................... 40 2 PANORAMA GERAL DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS BRASILEIRAS ENTRE 1937 E 2006............................................................................................ 47 2.1 Política de aluguel e da casa própria na política habitacional brasileira.............. 49 2.2 Características da produção das políticas habitacionais entre as décadas de 1930 e 1980.......................................................................................................... 55 2.3 A política habitacional a partir de 1987................................................................ 61 3 PROGRAMA DE ARRENDAMENTO RESIDENCIAL – PAR............................... 84 3.1 Compreendendo o PAR....................................................................................... 86 3.2 Implementação do PAR no panorama nacional................................................... 120 PARTE II: O PAR E A PRODUÇÃO HABITACIONAL EM JOÃO PESSOA-PB 4 A PRODUÇÃO DE MORADIAS NA CIDADE DE JOÃO PESSOA ENTRE 1935 E 2006, SOB A ÓTICA DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS................................ 145 4.1 A produção de moradias na cidade de João Pessoa sob a ótica das políticas habitacionais: dos IAPs ao BNH........................................................................... 147 4.2 A produção de moradias na cidade de João Pessoa sob a ótica das políticas habitacionais pós-BNH até 1989.......................................................................... 153 4.3 A produção de moradias na cidade de João Pessoa sob a ótica das políticas habitacionais a partir de 1990.............................................................................. 156 5 O PAR EM JOÃO PESSOA................................................................................. 199 5.1 Características quantitativas da produção do PAR na Paraíba........................... 201 5.2 Características operacionais do PAR em João Pessoa....................................... 206 5.3 Características qualitativas da produção do PAR em João Pessoa.................... 209 5.4 Agentes participantes do PAR em João Pessoa.................................................. 226 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................. 253 REFERÊNCIAS.................................................................................................... 266 ANEXOS.............................................................................................................. 273 Introdução _____________________________________________________________________ 20 O Estado brasileiro, até 1986, buscou diferentes equacionamentos para os problemas da moradia por meio de políticas habitacionais promovidas por três instituições principais, a saber: os Institutos de Aposentadoria e Pensões (IAPs), a Fundação da Casa Popular (FCP) e o Banco Nacional de Habitação (BNH). A natureza da atuação de cada uma dessas instituições estatais se diferenciou no tocante à forma de acesso à moradia promovida, assim como às características tipológicas, construtivas e de implantação dos respectivos conjuntos financiados no espaço urbano. No entanto, a crise econômica deflagrada nos primeiros anos da década de 1980 influenciou a política de habitação então vigente, implementada pelo BNH. O efeito dessa crise se concretizou, na política habitacional, na forma de vários problemas – baixa liquidez do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), alto nível de inadimplência, movimentos de mutuários organizados nacionalmente, etc. –, os quais, em conjunto, resultaram no fechamento do banco, em 19861. Diante de tal fato, a questão habitacional no Brasil passou a ser gerida por outro banco, a Caixa Econômica Federal (CAIXA), que tinha essa atividade como uma função secundária na sua estrutura de funcionamento. Como conseqüência, inicialmente, a política de habitação sofreu transformações estruturais que comprometeram sua eficiência. A respeito disso, Gordilho-Souza (2002, p.132) afirma que se assistiu, nesse primeiro momento, à “ausência de uma política de habitação clara e sistemática do Governo Federal”, fato que gerou o agravamento das necessidades de moradia e, por conseguinte, o crescimento do número de favelas, invasões a prédios públicos, etc. A ausência de uma política de habitação clara e sistemática repercutiu também na instabilidade das propostas voltadas para o enfrentamento dos problemas da moradia no país. A cada novo mandato presidencial, surgiam novas políticas, na mesma medida em que se criavam e se extinguiam programas habitacionais, todos, por sinal, voltados para o atendimento ao sonho da casa própria. Entre 1993 e 1998, os programas foram predominantemente voltados para a melhoria das condições de habitabilidade ou para a concessão de crédito direto aos cidadãos, enquanto a produção de conjuntos para a população de baixa renda ficou relativamente arrefecida. Apenas em 1999, surge o Programa de Arrendamento Residencial (PAR), como uma forma de reativar a produção de conjuntos e, segundo Valença (2001), reduzir o nível 1 Para maiores informações a respeito desses problemas, ver Valença (1992; 1999) e Azevedo (2001). Introdução _____________________________________________________________________ 21 de inadimplência na política – problema recorrente desde o período do BNH –, através de instrumentos legais previstos. Ademais, o programa se destaca por apresentar uma forma diferente de acesso à moradia, por meio de uma operação financeira chamada arrendamento mercantil, ou leasing, em que o imóvel é de propriedade fiduciária da CAIXA, e o arrendatário paga uma taxa de arrendamento mensal por um período de 15 anos, conforme entendimento geral, para poder tornar-se proprietário desse imóvel. Por se tratar de uma forma diferente de acesso à moradia, as características da produção do PAR sugerem duas vertentes de questionamentos: uma relacionada com os aspectos operacionais e outra com os aspectos tipológicos, da forma de construção e da localização dos conjuntos financiados. Essas vertentes dizem respeito a questões como estas: em que medida essa forma de acesso – o arrendamento residencial – incorpora novos elementos para enfrentar o problema habitacional? e qual a implicação do PAR para a implantação dos conjuntos no tecido urbano e para as características tipológicas das unidades habitacionais? Ao longo da política habitacional brasileira, foram utilizadas formas distintas de acesso à moradia: desde a política de aluguel até a política da casa própria. Porém, esta última foi usualmente disseminada entre as instituições competentes. As configurações locacionais, tipológicas e construtivas presenciadas na produção estatal também se modificaram no decorrer dos anos. Os IAPs, por exemplo, construíram novas habitações com características da arquitetura modernista, e seus conjuntos foram implantados tanto nas áreas centrais quanto nas franjas da malha urbana (ou em áreas suburbanas), ao passo que o BNH, em geral, produziu conjuntos de baixo padrão arquitetônico e construtivo, implantados seguindo o modelo periférico de expansão, conforme os estudiosos do assunto. Partiu-se, aqui, do pressuposto de que o PAR consiste em uma forma diferente de acesso à moradia – diferenciada em relação à política da casa própria e em relação à política de aluguel, aglutinando elementos de ambas. O formato operacional do programa requereu que a CAIXA assumisse novas responsabilidades, passando a exercer novo papel administrativo na organização e na coordenação de uma série de ações e de agentes. Isso resultou na produção de unidades habitacionais de melhor padrão, com características de inserção urbana e tipologia diferentes daquelas constituintes da produção realizada pelas políticas implementadas anteriormente, pelos IAPs e pelo BNH. Um exemplo do aspecto tipológico diz respeito à peculiaridade do PAR, que atua em duas frentes de ação: construindo novas moradias e reformando e revitalizando edifícios localizados nas áreas centrais para adaptá-los ao uso residencial, o que, por si só, já se constitui em uma diferença na forma de produção do programa. Introdução _____________________________________________________________________ 22 Esta dissertação tem, assim, como principal objetivo, compreender o papel do PAR no cenário das políticas habitacionais, no período pós-BNH, por intermédio de um estudo de caso na cidade de João Pessoa-PB. O cumprimento desse objetivo se desenvolve de maneira integrada com outros objetivos, ditos específicos, quais sejam: compreender o contexto das políticas e programas habitacionais no qual o PAR foi criado; analisar as características operacionais, que englobam a forma de financiamento, os agentes participantes, entre outras, identificando as especificidades do programa; identificar a forma tipológica e de implantação dos conjuntos do PAR; compreender o desenvolvimento da produção de moradias em João Pessoa, inserindo o programa nessa perspectiva. Observa-se que, embora apresente se como um programa inovador e diferente, o PAR é pouco discutido e explorado no meio acadêmico. Diferentemente, o período do BNH suscitou muitos estudos sobre a questão habitacional. Entretanto, após o fechamento do citado banco e, em especial, após a virada da década de 1990, a freqüência desses estudos diminuiu, de modo que há um hiato na literatura acadêmica sobre essa questão. Da mesma forma, a escassez de trabalhos que abordam a produção estatal de moradias no período pós-BNH na capital paraibana motivou a escolha da cidade de João Pessoa como área de estudo. Foi realizado, assim, uma pesquisa acerca do desenvolvimento urbano da capital paraibana entre 1987 e 2006, tendo como foco a produção estatal de conjuntos habitacionais para a população de menor poder aquisitivo, elaborando-se um quadro sistematizado dessa produção, que possibilitou uma análise comparativa com a produção do PAR na cidade. Além da escassez de material sobre o assunto, outra dificuldade enfrentada neste trabalho refere-se à escolha metodológica. Como diria Pierre Muller (1990, p.88, tradução livre), “não existe um quadro metodológico ‘standard’ de análise de políticas públicas”2. Ainda segundo esse autor, há três vertentes de enfoques para o estudo das políticas públicas, cada qual utilizando instrumentos conceituais e metodológicos diferentes. Desses três enfoques, utilizou-se aqui aquele que procura “determinar em que a política pública estudada modificou o tecido social, no qual ela procurou intervir, e em que medida os efeitos estão de acordo com as expectativas dos decisores”3 (MULLER, 1990, p.89, tradução livre). É claro que a adoção desse enfoque foi realizada de modo muito cuidadoso e guardadas as devidas proporções, pois esta dissertação objetiva compreender um programa habitacional, e não o conjunto das políticas públicas. 2 “Il n’existe pás de cadre méthodologique ‘standard’ de l’analyse des politique publiques”. 3 “Il ságit alors de déterminer em quoi la politique publique étudiée a modifié lê tissu social qu’elle cherchait à affecter et dans quelle mesure ces effets sont conformes aux attentes des décideurs”. Introdução _____________________________________________________________________ 23 Tendo em vista a problemática acima exposta, tentou-se resolver essa questão empregando procedimentos e diferentes técnicas de pesquisa, quais sejam: a pesquisa bibliográfica, a pesquisa documental e a pesquisa de campo. De forma bem sucinta, a pesquisa bibliográfica forneceu o embasamento necessário para a compreensão do processo de produção habitacional do ponto de vista teórico e histórico, tanto no nível nacional quanto no municipal. A pesquisa documental foi realizada basicamente nos órgãos públicos envolvidos com a produção do parque habitacional na Paraíba e, especialmente, na capital paraibana após 1987. As principais instituições pesquisadas são os agentes assinalados a seguir: a Companhia de Habitação Popular (CEHAP), o Instituto de Previdência do Estado da Paraíba (IPEP), a Fundação de Ação Comunitária (FAC), a Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP) e a Caixa Econômica Federal, todos localizados em João Pessoa. Deve-se ressaltar também a pesquisa em fontes estatísticas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) para dar suporte ao estudo acerca da forma de acesso à moradia no país ao longo do século XX. Essa pesquisa documental contribuiu para a caracterização quantitativa e qualitativa dos conjuntos produzidos, através das fontes documentais coletadas nas instituições referidas. Esses dados incluem os tipos de programas habitacionais utilizados, o número de habitações construídas, a localização e os projetos arquitetônicos desenvolvidos pelos agentes. A pesquisa documental também abrangeu a coleta dos dados referentes à produção do PAR no Brasil, dos documentos jurídicos e da legislação que rege o PAR, realizada nas instituições (CAIXA, PMJP e administradora do programa), mas também em sites institucionais (do Senado, do Ministério das Cidades e da CAIXA). Em paralelo, a pesquisa de campo teve como principal finalidade averiguar como o programa vinha se desenvolvendo na prática, observando-se as dificuldades enfrentadas e as opiniões dos agentes participantes. Foi fundamentada na realização de oito entrevistas semi-estruturadas com representantes da prefeitura, da CAIXA, da administradora dos imóveis e de alguns construtores que participam do processo produtivo do PAR. Além disso, foram realizadas 195 entrevistas por questionário com os arrendatários. Também faz parte da pesquisa de campo o levantamento fotográfico da produção (observando-se as características tipológicas e de inserção urbana), a observação sistemática do cotidiano dos arrendatários e a observação do espaço urbano onde estão situados os conjuntos do PAR, a fim de se verificar a dinâmica no interior e no exterior deles. Muitos dados da pesquisa documental e de campo, especialmente os que fazem parte do levantamento realizado na CAIXA, as entrevistas e os questionários, foram tratados estatisticamente através dos softwares Excel e SPSS Win, configurando-se um estudo “quantitativo-descritivo”. De posse Introdução _____________________________________________________________________ 24 desses dados, este trabalho é, então, produto de uma pesquisa quantitativa, porém sem deixar de ser qualitativa. Para apresentar os resultados da pesquisa, a dissertação foi dividida em duas partes, respectivamente: “O PAR na política habitacional brasileira” e “O PAR e a produção habitacional em João Pessoa-PB”. A primeira parte é composta por três capítulos, os quais, em conjunto, oferecem um panorama conceitual e contextual do problema da habitação no Brasil Nesse sentido, o primeiro capítulo aborda os conceitos relativos à produção da mercadoria moradia; o segundo busca contextualizar, em nível nacional, o desenvolvimento da produção de moradias via políticas públicas de habitação; e o terceiro se dedica ao PAR, inserindo-o no contexto da política habitacional. É importante salientar que não é nosso objetivo esgotar toda a temática acerca dos conceitos e contextos em torno da questão da habitação e da ideologia, apenas aprofundar o estudo do PAR. A segunda parte compreende os dois últimos capítulos, sendo baseada em dados quantitativos obtidos nas fontes documentais e na pesquisa de campo, os quais se referem à produção de moradias na cidade de João Pessoa. Assim, o quarto capítulo contextualiza a produção estatal de moradias via políticas públicas, na capital paraibana, inserindo a produção do PAR nesse cenário; e o quinto consta de um estudo de caso sobre o desenvolvimento prático do PAR em João Pessoa. Por fim, com essa estruturação, foi possível identificar a evolução da produção de conjuntos habitacionais no Brasil e, particularmente, em João Pessoa, contribuindo para a compreensão global do funcionamento do Programa de Arrendamento Residencial e, em paralelo, para a compreensão da questão da moradia no país, nos dias de hoje. Por fim, discussões teóricas apontam que a habitação é uma necessidade básica do ser humano e também uma mercadoria inserida na lógica capitalista de produção. Os processos de produção e de consumo dessa mercadoria, todavia, apresentam uma série de particularidades que a diferenciam das demais mercadorias. Algumas dessas particularidades são: a inevitável relação com o espaço urbano e a complexidade da produção habitacional. Esta última exige uma grande quantidade de insumos, como também de agentes, e demanda um prolongado tempo de produção. Essas particularidades influenciam diretamente no alto preço da mercadoria moradia, o que impossibilita que grande parcela da população tenha acesso a esse bem, sendo, portanto, necessária a intervenção estatal no processo de produção habitacional. De forma mais aprofundada, as características da mercadoria moradia e a forma de atuação do Estado são abordadas a seguir, no Capítulo 1. Capítulo I ______________________________________________________________________ 26 A dissertação inicia com este capítulo, o qual aborda questões teóricas que permeiam o estudo da habitação e das políticas habitacionais. Mais especificamente, trata das características da mercadoria moradia e de sua produção, além dos agentes que participam do processo produtivo, destacando o papel do Estado – responsável pelas políticas habitacionais, cuja trajetória será descrita ao longo do trabalho, como forma de contextualizar a inserção do Programa de Arrendamento Residencial no cenário das políticas de habitação no Brasil. Foram também consideradas aqui políticas habitacionais de duas naturezas – a política da casa própria e a política de aluguel –, para, nos capítulos seguintes, compreender-se a natureza do PAR. Este primeiro capítulo baseia-se, portanto, numa pesquisa bibliográfica, visando à melhor compreensão das características do processo de produção estatal de conjuntos habitacionais, tendo como pano de fundo a política habitacional brasileira e como foco o PAR, além do desenvolvimento urbano de João Pessoa, os quais serão analisados nos capítulos posteriores. Capítulo I ______________________________________________________________________ 27 1.1 NOÇÕES PRELIMINARES ACERCA DA MERCADORIA MORADIA A habitação exerce um papel essencial tanto para o indivíduo quanto para a sociedade em geral, pois é o local propício para a reprodução social do indivíduo, para a convivência familiar, além de ser um espaço privilegiado para o consumo de mercadorias, ou seja, a moradia é fundamental à vivência e à convivência humana, conforme argumenta Valença (2003). Por a habitação constituir-se em uma necessidade básica na qual se desenvolvem as atividades condicionadas à cultura de seus usuários, por ser um espaço íntimo do indivíduo, Jorge (2005) diz que “uma casa não é uma tenda”, isto é, apenas um abrigo, como entende Lemos (1996). Para o último autor, além de palco permanente do cotidiano de seus usuários, a habitação é, sobretudo, um invólucro seletivo e corretivo das manifestações climáticas, oferecendo abrigo e as mais variadas possibilidades de proteção e segurança. A importância da habitação como abrigo e como palco permanente das atividades do indivíduo, além das razões subjetivas que a circundam (local da intimidade, da segurança, etc.), fizeram dela um direito universal do homem, em 1948, garantido no Art. 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos: Toda pessoa tem o direito de um padrão de vida capaz de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, o direito à segurança, em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle. O direito à moradia4, um direito humano básico, também foi reafirmado na Declaração de Vancouver, fruto da 1ª. Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos – HABITAT I –, realizada em 1976, quando foi indicada a responsabilidade dos governos por ações visando a assegurar esse direito (LORENZETTI, 2001, p.5). Em 1996, em Istambul (Turquia), foi realizada a 2ª. Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos – HABITAT II –, que discutiu questões relativas à habitabilidade e incorporou o direito à moradia na Agenda Habitat. Em nível nacional, no ano de 2000, o direito à moradia passou a ser reconhecido como um direito social, pela Constituição, através da Emenda Constitucional n. 26/00: “são direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a 4 O direito à moradia com condições mínimas de habitabilidade, como infra-estrutura, dimensões adequadas, etc. Capítulo I ______________________________________________________________________ 28 previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados na forma desta Constituição”. No entanto, mais do que uma necessidade básica, conforme foi mencionado, a habitação é uma mercadoria inserida na lógica capitalista de produção. Assim como acontece com as demais mercadorias, na produção da habitação a acumulação do capital se concretiza através do sistema de aluguel ou venda: “o capital investido na casa persegue, como qualquer outro capital, o lucro. O capitalista só se interessará em construir casas se ele puder recuperar e ampliar seu capital através delas” (BLAY, 1985 p.15). Por outro lado, a habitação também pode ser produzida para fins não-capitalistas, isto é, através de “todas as formas de autoconstrução de moradia, que têm como traço comum o fato de não ser a acumulação de capital o que orienta a produção, mas a produção de valores de uso” (RIBEIRO, 1997, p.123). Em todo caso, independentemente da forma de produção (se capitalista ou não-capitalista), quando um operário possui somente uma casa, o fato de esta ser habitada por ele próprio impede que ela se converta em capital, conforme explica Engels (1974, p.44-45): La casita del trabajador no se convierte em capital más que si es alquilada a um tercero, com lo cual el trabajador se apropria de uma parte del trabajo de este tercero, em concepto de alquileres. Pero al habitarla él mismo impide, precisamente, que la casa se convierta em capital, de la misma manera que la levita que le compro al sastre deja de ser capital em el mismo momento em que me la pongo. É importante ressaltar que toda moradia, seja ela produzida de forma capitalista ou não-capitalista, tem a prerrogativa de se converter em mercadoria e, por conseguinte, em capital, a partir do momento em que deixa de ser valor de uso e se torna valor de troca. Considerando apenas a produção capitalista da mercadoria moradia, esta é entendida por Blay (1985, p.20), “dentro da teoria das ‘necessidades sociais’, em um sistema econômico regido livremente pela procura e oferta”. Isso significa que há um problema de difícil solução na produção habitacional: embora haja oferta da mercadoria habitação, grande parcela da sociedade não dispõe de meios para adquiri-la, uma vez que essa mercadoria apresenta um elevado valor agregado e, portanto a população de renda mais baixa não constitui “demanda solvável”, por não ter o necessário poder de compra para adquirir ou alugar uma habitação com mínimas condições de habitabilidade. Diante disso, é considerável o contingente da população mundial que não possui um lugar para morar ou que mora em condições de extrema precariedade, de modo que, nesses casos, a moradia se transformou em um problema social (dificuldade de acesso) e urbanístico (inadequabilidade habitacional). Além do elevado valor agregado da mercadoria moradia, o fato de uma porção da população estar à margem do mercado de produção de moradias é conseqüência da desigual distribuição da renda, fruto do sistema capitalista de produção: Capítulo I ______________________________________________________________________ 29 Se existe ‘déficit habitacional’ é porque grande parte da população urbana brasileira está excluída do mercado da produção de moradias. São duas as razões: de um lado, uma distribuição profundamente desigual da renda gerada na economia e, de outro lado, as condições que regem a produção capitalista de moradias no Brasil, que impõem um elevado preço ao direito de habitar na cidade (RIBEIRO & PECHMAN, 1983, p.9). O elevado preço da habitação é fruto das condições particulares que regem a produção capitalista ou não-capitalista, mas também das condições particulares que regem o consumo da mercadoria moradia. Essas especificidades do processo de produção e consumo transformam a habitação em uma mercadoria especial, com características próprias, que serão descritas a seguir. Iniciando pelas características da produção da habitação, Ribeiro (1997, p.80) cita algumas: Por um lado, a moradia é uma mercadoria imóvel e durável, já que a produção/circulação/consumo realizam-se num mesmo espaço e que sua vida econômica e útil tende a estender-se durante um longo período de tempo. Por outro lado, trata-se de um bem não homogêneo, ou pelo menos cuja uniformização e padronização são problemáticas. Das características acima citadas, a relação da mercadoria moradia com o espaço pode ser considerada uma das mais importantes, uma vez que a existência de um terreno é uma pré-condição para a produção da habitação. Essa relação de dependência da habitação com o solo, na cidade, gera obstáculos para o desenvolvimento do processo produtivo habitacional, assinalado por Ribeiro (1997) como “problema fundiário”. O “problema fundiário” se fundamenta basicamente no fato de o solo urbano ser parcelado. Como conseqüência, a produção será necessariamente descontínua no espaço, ao longo de um tempo demasiadamente longo, tornando-se extremamente difícil a aplicação permanente de capitais na construção como também a adoção de métodos industriais (RIBEIRO, 1997). Outro “problema fundiário” é a exigência de novas áreas5 para a produção da habitação, que requer fixidez geográfica. Entretanto, o solo urbano não é passível de reprodução, sendo preciso constantemente a busca por novos espaços. Esses problemas, portanto, limitam a produção habitacional em grande escala, pois dificultam o processo de industrialização e o barateamento da construção. É importante salientar, ainda, que a produção da habitação necessita não apenas de terra para sua implantação, mas principalmente de solo que seja infra- estruturado. A infra-estrutura (incluindo também a existência de equipamentos e serviços coletivos e acessibilidade), juntamente com os fatores naturais do sítio e, principalmente, os elementos locacionais (objetos imobiliários, por exemplo), são variáveis que influenciam o preço do solo e o processo produtivo. Essas variáveis locacionais constituem alguns dos 5 Vale salientar, ainda, que a produção da moradia significa a implantação de um novo objeto imobiliário na cidade, o qual pode ocasionar uma série de impactos sociais, ambientais, etc. Capítulo I ______________________________________________________________________ 30 motivos que provocam a divisão social no espaço, fruto, ainda, da agregação de rendas (diferenciais e de monopólio) que regulam os preços dos terrenos. A divisão social do espaço, por sua vez, resulta na segregação espacial entre ricos e pobres. Influencia a tipologia e o padrão construtivo das habitações e é influenciada por eles, resultando na heterogeneidade da produção habitacional e contribuindo para o custo final da mercadoria moradia. Na prática, geralmente a habitação social se localiza em uma área não valorizada pelo mercado imobiliário, tem pequenas dimensões e utiliza materiais simples, contrariamente às características da habitação voltada para os grupos de renda mais alta. Em função dessa diversidade, aliada à dificuldade da produção em larga escala (na maior parte das vezes), a habitação é uma mercadoria que permite uma grande variedade de designs arquitetônicos, o que pode também influenciar o preço final dessa mercadoria. Verifica-se, portanto, que o espaço urbano é determinante para a produção de moradias. Isso explica, em parte, o motivo pelo qual a habitação social no país foi predominantemente implantada nas áreas periféricas da cidade, como será discutido em capítulo posterior. As periferias geralmente eram áreas onde o parcelamento do solo proporcionava amplas faixas de terras sem infra-estrutura, justificando o seu baixo custo. Com essas características, tornava-se possível a produção em larga escala, com métodos de industrialização, visando ao barateamento da construção para atender à população de renda mais baixa. Além da relação com o espaço urbano, o processo de produção da mercadoria habitação é complexo, pois se desenvolve em um extenso período de tempo e engloba um grande número de materiais de construção e de agentes envolvidos, requerendo desde trabalhadores especializados até aqueles menos qualificados. Já as particularidades do processo de consumo referem-se especialmente ao tempo de uso. A habitação difere quanto ao tempo de consumo, pois, enquanto a maioria das demais mercadorias apresenta um tempo útil menor, o uso da moradia geralmente é prolongado. Também dado o seu alto valor agregado, ela muda de proprietário com pouca freqüência. Valença (2003 p.167) afirma que “o consumo da habitação é indivisível, ou seja, não se pode consumir um pedacinho do terraço hoje, da sala amanhã, etc.”. Esse consumo da moradia, por sua vez, é realizado de maneiras diferentes para cada classe social, conforme é explicado por Lemos (1996 p.10): [...] na casa pobre, a quantidade de superposições dentro de um mesmo ambiente é incrível e basta imaginarmos a moradia simples e tão comum de um cômodo só. Tudo é feito por todos num mesmo cenário promíscuo. Na casa rica, é o contrário. Nela, há uma dependência para cada atividade. Capítulo I ______________________________________________________________________ 31 Mesmo diante de todas essas particularidades do processo de produção e consumo da mercadoria moradia (destacando-se as dificuldades inerentes a esses processos), a habitação cumpre um papel fundamental no contexto econômico. Segundo Corrêa (1989), a produção habitacional amortece as crises cíclicas da economia através do investimento de capital e da criação de numerosos empregos, motivo pelo qual essa produção tem o apoio do Estado capitalista, que, por sua vez, está fortemente repleto, através de seus componentes, de interesses imobiliários, assim como os incorporadores imobiliários. Todas as características acima citadas referem-se às habitações em geral, produzidas de forma capitalista ou não-capitalista, independentemente. De forma mais específica, a produção de moradias pode ser classificada em três tipos distintos: x Produção estatal de moradias – Para efeito deste trabalho, como produção estatal de moradias é considerada apenas a produção capitalista impulsionada pelas políticas de habitação, construindo conjuntos habitacionais financiados para a população com menores rendimentos, que pode ser classificada como classe de renda baixa ou média baixa. Contudo, vale salientar que as políticas habitacionais também beneficiaram a população de classe de renda média a alta, concedendo crédito imobiliário (geralmente com uso de recursos da caderneta de poupança). Essa última vertente, porém, não é abordada nesta dissertação. x Produção privada formal – É a produção capitalista representada pelo mercado imobiliário formal, composto pelas empresas privadas da construção civil ou pelos incorporadores imobiliários privados, para a construção, em geral, de edifícios multifamiliares destinados à população enquadrada como classe de renda média a alta. Muitas dessas habitações, porém, foram financiadas pelo poder público, via financiamento, logo também se enquadram na política habitacional brasileira. A produção privada formal pode ser considerada uma produção excludente, pois só se insere nesse mercado quem tem condições econômicas para pagar por sua moradia, ou seja, uma população qualificada como, no mínimo, classe de renda média. Então, a parcela da população que não tem poder de compra necessariamente teria de se enquadrar na produção estatal. No entanto, embora seja uma responsabilidade do Estado prover habitação, especialmente para a população de renda baixa, segundo Bonduki (2002, p.128), o poder público é incapaz de formular e implementar uma política habitacional consistente e induz, como conseqüência, a formação, expansão e consolidação de soluções informais de produção de moradia. Assim, como a moradia é uma necessidade fundamental para todo e qualquer ser humano e existe ainda uma parcela da sociedade que não foi contemplada com a produção governamental nem tampouco se insere no mercado imobiliário (população Capítulo I ______________________________________________________________________ 32 mais carente financeiramente), surge uma outra forma de produção da habitação: a produção informal. x Produção informal (e/ou irregular) – Pode ser capitalista ou não-capitalista, sendo uma produção à margem do mercado imobiliário formal, a qual produz habitações informais, geralmente representadas pelas favelas, cortiços, vilas rentistas, autoconstrução em loteamentos irregulares, etc.: […] grande parte da ocupação do espaço, nas grandes cidades, realizou-se informalmente, ou seja, à revelia dos sistemas formais de produção da moradia e das normas urbanísticas, conformando espaços de ocupação aleatória, densos, deficientes de infra-estrutura, portanto em condições de habitabilidade precária (GORDILHO-SOUZA, 2000, p.51). A produção informal compreende, ainda, as habitações que apresentam problemas de ordem jurídica (da propriedade da terra), entre as quais se inserem também habitações da população de maior poder aquisitivo, embora em menor proporção. Entre a população mais pobre, os problemas de informalidade de ordem jurídica se caracterizam, em geral, pela construção de moradias localizadas em áreas invadidas, seja em áreas privadas ou públicas, como margens de rios, manguezais, etc. Conforme Gordilho-Souza (2000, p.51), “nas grandes cidades brasileiras, a informalidade e a ilegalidade da ocupação têm sido uma das marcas no processo de urbanização contemporânea, ampliando-se particularmente na última década, quando há um retorno intensivo de ocupações do tipo favela”. Nada obstante o interesse em melhor compreender esses tipos de produção habitacional, delimitou-se como área de estudo deste trabalho apenas a produção estatal dos conjuntos habitacionais, geralmente financiados para a população de menor renda – aqui considerada como habitação social – e o seu mais abrangente leque de opções de acesso à moradia, ou seja, abordando tanto a produção estatal da casa própria como a produção estatal para aluguel e, ainda, a produção para arrendamento, promovida pelo governo federal. Em seguida, serão discutidos os principais agentes participantes da produção imobiliária. 1.2 OS AGENTES PARTICIPANTES DA PRODUÇÃO HABITACIONAL Os principais agentes atuantes no processo produtivo habitacional brasileiro são, de acordo com Azevedo (1982), os incorporadores ou promotores imobiliários, os proprietários urbanos, os escritórios de planejamento e projetos, as empresas da construção civil, as agências financeiras, as corretoras de imóveis e, por fim, os compradores. Além desses, há o Estado, que se envolve na questão da habitação sobretudo por meio das Capítulo I ______________________________________________________________________ 33 políticas habitacionais, em princípio criando condições que facilitem o acesso à moradia àquela parcela da sociedade excluída do mercado imobiliário por não ter capacidade de pagamento. Cada um desses atores imobiliários está vinculado a um tipo de capital: capital de incorporação, do construtor, de empréstimo ou capital imobiliário, segundo a classificação adotada por Ribeiro (1997). De um modo geral, é importante mencionar que, desses agentes, a figura do promotor imobiliário, juntamente com o crédito a longo prazo com regulamentação estatal, consistiram em um importante passo para a dinamização da produção capitalista da habitação em larga escala no território brasileiro (AZEVEDO, 1982). Por esse motivo, serão particularmente abordados nesta seção. O promotor imobiliário, também conhecido como incorporador, surgiu no momento histórico em que a moradia passou a ser produzida como uma mercadoria, inserida no sistema capitalista de produção. Para que isso ocorresse, foi necessária a separação entre a propriedade fundiária (proprietários urbanos) e o capital imobiliário, antes concentrados única e exclusivamente na figura do rentista, que, simultaneamente, era o proprietário do terreno e o produtor. Outra condição essencial para o surgimento do sistema de incorporação no Brasil foi, no início do século XX, o desenvolvimento do crédito bancário, seja pelas agências financeiras, seja pelos institutos de previdência, por exemplo. Ribeiro (1997, p.97), ao definir teoricamente o incorporador, afirmou ser este “um agente suporte do capital comercial necessário à produção e circulação da moradia, com a particularidade de dirigir o processo de produção”. Sua ação pode ser orientada por um duplo objetivo: “a apropriação do lucro e sobrelucro de comercialização – técnicas para aumentar a velocidade de realização do negócio ou o preço de venda do imóvel – e o sobrelucro da localização – técnicas de valorização fundiária” (RIBEIRO, 1997, p.99). Por outro lado, do ponto de vista empírico, Ribeiro (1997, p.93-94) identificou onze atividades atribuídas ao agente incorporador, quais sejam: a) concepção e estruturação do empreendimento (aspectos técnicos, legais, físicos, econômicos, financeiros, operacionais, etc.); b) análise da situação do mercado; c) escolha do terreno e sua valorização para compra; d) mobilização do capital necessário à operação: obtenção do financiamento para o consumo final, obtenção do financiamento para construção; e) contratação dos projetos de arquitetura e engenharia e suas respectivas aprovações; f) contratação da urbanização (caso seja necessário); g) promoção e venda das unidades habitacionais; h) contratação dos promotores; i) fiscalização da execução dos serviços; j) entrega das unidades, responsabilidades finais pelo empreendimento e individualização das propriedades, concomitantemente com a efetivação do financiamento ao adquirente, através de hipotecas, cauções de contratos de venda e quitações de crédito; k) provimento (em combinação com os agentes financeiros) da administração jurídica dos contratos garantidores dos empréstimos até sua liquidação. Capítulo I ______________________________________________________________________ 34 Baseando-se nessas atividades, Azevedo (1982, p.73) resumiu a atividade de incorporação da seguinte forma: Em termos bastante simplificados o que faz o incorporador é o seguinte: adquire de um proprietário urbano um terreno; em seguida imagina uma determinada utilização habitacional para o mesmo e procura um escritório de planejamento e projetos a fim de transformar suas idéias em projetos executivos. O passo seguinte será conseguir, quando necessário, junto às Agências Financeiras e aos futuros compradores, recursos complementares que, agregados ao seu próprio capital, permitirão a contratação de uma empresa construtora encarregada de executar a obra. Uma vez terminada a construção, uma corretora de imóveis é incumbida da comercialização. Por fim as residências são vendidas aos compradores imobiliários, que para efetuarem a compra utilizam, além de uma pequena parcela de recursos próprios, empréstimos a longo prazo fornecidos por Agências Financeiras especializadas. Em suma, o incorporador pode exercer parcial ou totalmente as atividades acima listadas, de modo que ele seja o responsável por organizar e articular uma série de atividades, bem como um grande número de agentes envolvidos no processo produtivo, visando à obtenção de lucros e sobrelucros no desenvolvimento do processo. Ainda sob uma ótica empírica, Ribeiro (1997, p.93) identifica os incorporadores como sendo: investidores imobiliários; os incorporadores definidos na Lei no. 4.592/64; as cooperativas habitacionais; as instituições de previdência e assistência social, como as do Banco do Brasil, Clubes Militares, de funcionários públicos e outras; as fundações; as CEHABs6; as sociedades de economia mista. Além desses, Corrêa (1989) identifica também como promotores imobiliários os grandes bancos e o Estado. Na prática, muitos desses agentes acima listados exercem algumas atividades de incorporação, especialmente do ponto de vista administrativo, não sendo necessariamente agentes incorporadores. Os agentes discriminados podem atuar em três submercados distintos, classificados por Ribeiro (1997) como o “submercado das cooperativas e companhias estaduais de habitação”, o “submercado normal” e o “submercado monopolista”. Cada submercado, por seu turno, apresenta públicos-alvos distintos (classe de renda média baixa, média e renda média alta, respectivamente) e atua espacialmente de forma desigual, intensificando a segregação socioespacial através da segregação residencial. Com base nos agentes listados por Ribeiro (1997) como sendo incorporadores empíricos, a seguir serão identificados alguns desses agentes que se envolveram (ou estão envolvidos) na produção de moradias via políticas públicas de habitação, ao longo do século XX, na cidade de João Pessoa-PB. Esses agentes foram aqui denominados agentes 6 Companhias estaduais de habitação Capítulo I ______________________________________________________________________ 35 públicos participantes da promoção imobiliária. Vale salientar que, assim como os incorporadores, esses agentes também organizam e articulam uma série de atividades próprias e de outros agentes. Iniciando pelos Institutos de Aposentadoria e Pensões, estes foram os primeiros órgãos estatais a tratar da questão habitacional via construção de moradias para uma determinada parcela da população. Esses institutos, criados na década de 1930, tiveram importância fundamental na provisão do crédito imobiliário7. No entanto, como não eram órgãos específicos para tratar do problema habitacional – eram órgãos responsáveis pela previdência social –, em 1946 foi criada a Fundação da Casa Popular, com a finalidade de tratar exclusivamente da questão da moradia no país. A atuação desses dois agentes nacionais – IAPs e FCP – não foi suficientemente eficaz no enfrentamento da questão, motivo pelo qual eles foram extintos em 1964, com a criação do Banco Nacional de Habitação. Não obstante, uma das categorias dos institutos, o Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado (IPASE)8, assegurou suas atividades na área até 1977, quando finalmente foi fechado. O BNH atuou basicamente por meio das Companhias de Habitação (COHABs) e dos Institutos de Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOPs), ambos financiados com recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), na construção de conjuntos habitacionais para a população de baixa e média rendas9. Além desses órgãos, os estados brasileiros contavam com outros agentes públicos envolvidos com a produção do parque habitacional de seus respectivos territórios, como os institutos de 7 Embora tenham sido criados desde o início da década de 1930, apenas em 1937 os IAPs incorporaram a função habitacional ao quadro de atividades desenvolvidas; antes tinham a atribuição exclusiva da previdência social (aposentadorias e pensões) e da assistência médica. 8 O IPASE, órgão voltado à previdência, foi criado em 1938, com a função de gerir os recursos oriundos das contribuições dos servidores e da União, destinados ao custeio de diversos benefícios, como pensão, aposentadorias, etc. Além do seu objetivo primordial de realizar o seguro social do funcionário público civil da União (principalmente conceder pensão vitalícia, pensão temporária e pecúlio), o IPASE podia realizar as mais diversas operações que fossem julgadas convenientes para alcançar maior rentabilidade na gestão dos recursos, como operações de seguros privados, capitalização, financiamentos para aquisição de moradias, empréstimos e outras formas de assistência econômica (informações disponíveis em: . Acesso em: 21-12-05). Em outras palavras, assim como os IAPs, o IPASE se envolvia em outras atividades, a fim de arrecadar mais recursos e manter atualizados seus ativos. Com o advento da política do BNH, em 1965 o IPASE se adaptou ao Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e, em 1967, foi criado o Fundo Especial para o Desenvolvimento do Programa Habitacional do IPASE (FUNDASE) (FINEP, 1985). No entanto, em 1977, o instituto foi extinto e incorporado ao Regime Geral de Previdência Social (informações disponíveis em . Acesso em: 21-12-05). Devido ao extenso intervalo compreendido entre sua criação e sua extinção, o IPASE produziu habitações, contemporaneamente à produção dos IAPs e FCP e do BNH. 9 O BNH também foi responsável por conceder financiamentos para a população de classe de renda média e média alta, através de recursos oriundos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE), ou seja, da caderneta de poupança. O INOCOOP também utilizou esse fundo. Capítulo I ______________________________________________________________________ 36 previdência estaduais e algumas fundações. No estado da Paraíba, por exemplo, destaca- se o Montepio, que posteriormente se transformou no Instituto de Previdência do Estado da Paraíba (IPEP). O Montepio dos Funcionários Públicos da Paraíba foi criado em 1913, com a função de promover a previdência social para os funcionários estaduais. Em 1942, esse órgão sofreu alterações e foi instituído, em seu lugar, o Montepio do Estado da Paraíba (MEP), que foi mantido inalterado até 1970, quando o então governador da Paraíba, João Agripino, novamente modificou sua estrutura, transformando-o no IPEP, como atualmente é conhecido10. Finalmente, no ano de 2003, o IPEP foi extinto e sua carteira de habitação transferida para a Companhia de Habitação Popular (CEHAP)11. Já a CEHAP é a companhia de habitação estadual da Paraíba, autorizada em 1965 através da Lei estadual n. 3328 (FINEP, 1985). Durante a vigência do BNH, a CEHAP atuou com bastante vigor, financiando um grande volume de habitações, através das Carteiras de Operações de Natureza Social (CONSO), principalmente. Atualmente, embora em menor proporção, ela continua participando da produção do parque habitacional paraibano. Assim como o IPEP e a CEHAP, a Fundação de Ação Comunitária (FAC) é um órgão específico do estado da Paraíba. Apesar de ter sido criada em 1987, durante o governo estadual de Tarcísio Burity, essa instituição sucedeu à Fundação Social do Trabalho (FUNSAT), criada em 1983. No entanto, sua produção só adquiriu importância a partir da segunda metade da década de 1990, quando passou a ser orientada por um programa habitacional. Além dos agentes acima mencionados, há, ainda, a participação de bancos na produção habitacional, como é o caso da Caixa Econômica Federal (CEF ou, como é também chamada, CAIXA). Ela atua essencialmente como agência financeira, mas também vem atuando de outra forma na produção, por meio do Programa de Arrendamento Residencial, como será abordado mais tarde. Enfim, é importante ressaltar que todos esses agentes públicos supracitados são responsáveis por organizar e coordenar, parcial ou totalmente, muitas das atividades próprias do sistema de incorporação: escolha do terreno, concepção e estruturação do empreendimento, fiscalização e execução dos serviços, promoção da construção, venda das unidades e, principalmente, gestão do capital de circulação, mobilizando financiamentos tanto para o setor da construção quanto para a população. Por terem como público-alvo 10 Informações disponíveis em: . Acesso em: 15-12-05. 11 Informações disponíveis em: . Acesso em: 15-12-05. Capítulo I ______________________________________________________________________ 37 preferencial uma população de renda mais baixa, esses agentes públicos produzem habitações de baixo custo, para fazer frente à capacidade de pagamento dessa parte da sociedade. Portanto, de modo geral, eles não objetivam a apropriação do lucro de localização, tida como uma das principais metas da ação dos incorporadores (às vezes, esses agentes públicos não objetivam nem mesmo o lucro de comercialização). Em razão desse fato, nesta dissertação não foram considerados os IAPs, a FCP, o Montepio, o IPEP, a CEHAP, a FAC e o INOCOOP como incorporadores, uma vez que não possuem a principal característica da incorporação – a busca pelo lucro –, apesar de estarem enquadrados no submercado das cooperativas e companhias estaduais de habitação e se aproximarem das atividades de agentes imobiliários. Aqueles agentes foram tratados como meros organizadores de atividades de produção habitacional e coordenadores de outros agentes participantes dessa produção, motivo pelo qual foram aqui denominados apenas agentes públicos. 1.3 AS FORMAS DE ATUAÇÃO DO ESTADO Além dos agentes acima listados, destaca-se, ainda, o papel do Estado na produção habitacional. Todavia, antes de se buscar compreender esse papel, faz-se necessário compreender as diferentes formas de atuação do poder público, as quais influenciam diretamente as características da produção. De forma bastante simplista, podem-se considerar, mundialmente, dois modelos principais de intervenção do Estado: o keynesiano, de Bem-Estar-Social (welfare state) e o neoliberal, de formato globalizado, com a ideologia de Estado Mínimo. O primeiro atuou entre os primeiros anos do século XX até aproximadamente o final da década de 1970, quando se deflagrou a crise do fordismo e, aos poucos, foi sendo criado um novo modo de regulação, baseado na globalização, o que propiciou o cenário ideal para a atuação do Estado neoliberal até os dias atuais. Todavia, essas duas formas de intervenção do Estado se manifestaram com especificidades, no caso brasileiro, como se verá adiante. Aqui se discute a real implantação de um Estado de Bem-Estar-Social. Segundo Lipietz (1988) o que ocorreu foi um modelo de fordismo periférico, em que o welfare state se estruturou de forma parcial e fragmentada. Esse modelo, nacionalmente denominado Estado desenvolvimentista12, designa a intervenção do poder público – entre a década de 12 Bonduki (1997) utiliza o termo “central-desenvolvimentista” para caracterizar a forma de atuação do Estado brasileiro vigente até o início da década de 1990. Abrucio e Couto (1996), por sua vez, utilizam “nacional-desenvolvimentista”, para se referirem a essa mesma forma de intervenção Capítulo I ______________________________________________________________________ 38 1930 e o final da década de 1980 –, cuja característica principal era alavancar o processo de desenvolvimento econômico, tendo em vista o desenvolvimento industrial, através da criação de empresas estatais pelo poder público, portanto intervindo fortemente na economia do país. Além disso, de acordo com Bonduki (1997), esse modelo se caracterizava pelo autoritarismo e a centralização da gestão. Contou também com forte intervenção na sociedade, seguindo muitas características de um Estado keynesiano, como as políticas implementadas durante o governo Vargas, voltadas aos trabalhadores urbanos formais, procurando atender suas necessidades quanto a habitação, assistência médica, previdência social e regulamentação de leis trabalhistas. Partindo dessa premissa, para Farah (1985, p.76), a partir da década de 1930 (até 1964, aproximadamente), o poder público procurou construir a imagem de um Estado benfeitor (responsável pelo bem-estar de todos os cidadãos), embora, na realidade, não se tratasse de um welfare state. Na área habitacional, essa forma de intervenção estatal foi marcada por uma política pública de habitação centralizada – ou seja, uma política federal que difundia um tipo de intervenção universal para a população de renda mais baixa –, a qual se expandiu para todas as cidades do país, independentemente das especificidades regionais. Essa política apresentou longa duração, podendo ser dividida em dois momentos históricos distintos: quando foi esboçada, entre 1937 e 1964, com a atuação dos IAPs e da FCP, e quando se consolidou, entre 1964 e 1986, com a atuação do BNH. A atuação de cada um desses agentes perpassou várias gestões governamentais sem ser extinta (havia a prática de ações contínuas), o que indica a soberania da política habitacional, que, hierarquicamente, estava em um patamar superior às vontades políticas e aos governos. Pelos motivos explicitados, pode-se dizer que a política habitacional dessa conjuntura era ainda uma política de Estado. A produção de moradias promovida pelo Estado desenvolvimentista tinha como um dos objetivos a estruturação do setor da construção civil, a fim de dinamizar a economia. Além disso, promoveu-se a ideologia da casa própria como forma de controle social. Também foi estimulado por esse modelo o processo de expansão das cidades brasileiras, por meio da predominante implantação dos conjuntos habitacionais nas áreas periféricas. A crise do modelo de intervenção do Estado desenvolvimentista se configurou em seguida à crise do sistema fordista, que resultou numa crise econômica generalizada. Nesse contexto, o Brasil foi induzido a aderir a uma série de determinações internacionais governamental, apesar de considerarem sua vigência até o início da década de 1980. Neste trabalho, contudo, achou-se prudente utilizar apenas a palavra “desenvolvimentista” (referindo-se ao termo empregado pelos dois autores) e adotando-se como intervalo de tempo as décadas de 1930 até o final dos anos 1980, uma vez que a década de 1990 já é aqui considerada como inserida no contexto do desenvolvimento neoliberal. Capítulo I ______________________________________________________________________ 39 por organismos internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial, o que levou a uma profunda reestruturação econômica, através de abertura do mercado, parcerias público-privado, privatizações, desregulação e liberalização do Estado13. Portanto, o país passou a adotar os paradigmas da política neoliberal, constituindo uma forma de intervenção própria de um Estado neoliberal. Na área habitacional, a implementação dos ditames neoliberais significou a extinção do BNH, em 1986, e uma transformação estrutural da política de habitação, que passou de uma política de Estado para uma política de governo, isto é, a cada novo mandato presidencial ela sofreu uma série de alterações, tornando-se extremamente instável. Outro fato que contribuiu para a descontinuidade das políticas habitacionais foi a descentralização das ações do poder público, agora pulverizadas nas três esferas de governo – federal, estadual e municipal –, garantindo aos estados e, principalmente, aos municípios mais autonomia, principalmente na criação de programas desenvolvidos com recursos próprios. A descentralização não significa uma omissão do governo federal frente às ações sociais, mesmo porque, devido à pressão social, elas acabam sendo incorporadas à nova dinâmica do governo assumida pelas esferas subnacionais (ABRUCIO e COUTO, 1996). Embora o neoliberalismo defenda a redução das responsabilidades sociais do Estado, isso não ocorreu exatamente no caso brasileiro, especialmente em se tratando do PAR, como será explicado no Capítulo III. Quanto à questão territorial, diferentemente do modelo anterior, no modelo de intervenção do Estado neoliberal muitos conjuntos habitacionais (como os do PAR) estão implantados de forma fragmentada no tecido urbano, mesmo porque as cidades se expandiram de tal forma que se criou um espaço cheio de vazios urbanos. As linhas de crédito no formato individual (amplamente estimuladas) também contribuíram para a implantação fragmentada na cidade. Verifica-se, então, que a política de habitação sofreu uma série de transformações e passou por um processo de reestruturação para se adequar ao novo formato político e econômico, agora regido pelo neoliberalismo. Não obstante, uma característica prevalece entre a política habitacional do Estado desenvolvimentista e a do Estado neoliberal: continua-se enfrentando o problema da moradia, mas também, de modo indireto, o poder público, via política de habitação, permanece visando ao desenvolvimento 13 As políticas ligadas à desregulamentação e à liberalização permitem que o mercado passe a atuar livremente, quebrando a soberania do país, pois as ordens passam a ser ditadas a partir de acordos internacionais e/ou a partir de deliberações de organismos internacionais (FMI, Banco Mundial, etc.) (OLIVEIRA, 2002). Capítulo I ______________________________________________________________________ 40 econômico e aos interesses capitalistas – a produção habitacional é uma forma de combater as crises cíclicas da economia, colaborando para a manutenção do sistema. A intervenção do Estado brasileiro no equacionamento das necessidades de moradia da população tem sido, com isso, ineficiente: agravam-se as condições sociais com o aumento das desigualdades sociais e da pobreza, em particular, a urbana. Todo esse panorama ilustra as diferentes formas de atuação do Estado – em especial do caso brasileiro – e sua relação com as políticas habitacionais. Resta compreender o papel do Estado nas políticas públicas de habitação. 1.4 O PAPEL DO ESTADO NA PRODUÇÃO HABITACIONAL Como foi dito no início deste capítulo, o direito à moradia é assegurado por legislação internacional e nacional, motivo pelo qual o Estado brasileiro, independentemente da sua forma de intervenção, tem a responsabilidade de prover habitação para todos. Se o atendimento ao direito à moradia é uma responsabilidade do Estado, este tem que estimular mecanismos para garantir à população o acesso a esse benefício. A forma mais comumente adotada pelo poder público para enfrentar as necessidades de moradia foi e continua sendo através das políticas públicas de habitação. Segundo Jean Claude Thoenig (apud MULLER, 1990, p.23, tradução livre), “uma política pública se apresenta sob a forma de um programa de ação próprio a uma ou a várias autoridades públicas ou governamentais”14. Ela é constituída por cinco elementos identificados por Thoenig (apud MULLER, 1990, p.29) e aqui resumidos: x um conjunto de medidas concretas; x um quadro de decisões ou formas de alocação de recursos “cuja natureza é mais ou menos autoritária” x “um quadro geral de ação”, que permite distinguir uma política pública de medidas isoladas; x um público formado de indivíduos, grupos ou organizações cuja situação é afetada pela política; x um quadro de alvos ou objetivos a atingir. 14 “Une politique publique se présente sous la forme d’un programme d’action propre à une ou plusieurs autorités publiques ou gouvernementales”. Capítulo I ______________________________________________________________________ 41 Pode-se dizer que “existe uma política pública porque existe ‘um problema a se resolver’”15 (MULLER, 1990, p.35, tradução livre). Em outras palavras, existe um grupo de pessoas que enfrenta um certo tipo de problema, e o poder público vai tentar resolvê-lo através de um conjunto de ações, alocando recursos para esse fim. No caso da política habitacional, especificamente da brasileira, existem as necessidades habitacionais ou os problemas da moradia a serem resolvidos, os quais podem ser de caráter qualitativo ou quantitativo. O primeiro tipo corresponde aos problemas fundiários, de qualidade de vida dos moradores e de habitabilidade das moradias, como a infra-estrutura, enquanto o segundo se refere à questão de compensar a falta de moradia (déficit habitacional) por meio da construção e composição de um estoque habitacional. Em consonância com os conceitos franceses sobre políticas públicas, a política habitacional pode ser entendida como uma “ação pública contínua e ampla para o enfrentamento dos problemas de moradia”, conforme Gordilho-Souza (2000, p.59). De acordo com Valença (2003, p.170), “sem a mediação ou intervenção do Estado, a maioria dos indivíduos não pode se tornar ‘consumidora’ de habitação, processo que se dá através do mercado de compra e venda de imóveis residenciais e de aluguéis”. É nesse sentido que entra o Estado no enfrentamento do problema habitacional, por meio da política de habitação, podendo atuar em dois planos de ação: “intervenção na demanda com a criação de uma demanda solvável, e intervenção na oferta, com a construção direta das moradias e a adoção de medidas para facilitar as realizações imobiliárias e diminuir seu preço” (CASTELLS, 2000, p.237). A ação na demanda corresponde à criação de mecanismos legais e institucionais que facilitem o acesso à moradia. Esses mecanismos podem ser tanto legislação de controle de aluguel (como as leis de inquilinato) como “a concessão de facilidades de crédito para a compra de moradias sociais ou os empréstimos com juros relativamente baixos para pessoas sujeitas a fórmulas do tipo poupança-moradia” (CASTELLS, 2000, p.238). O crédito habitacional dinamiza o mercado, contribuindo essencialmente para o ciclo do processo produtivo da habitação: primeiro, serve para o incorporador ou construtor produzir a habitação; segundo, serve para o comprador imobiliário adquiri-la. A importância do financiamento, por sua vez, está no fato de que a habitação possui um elevado valor agregado, conforme já foi discutido e, para amortizar esse preço, a maior parte dos assalariados necessita de vários anos para efetivar a compra do imóvel, que só se torna 15 “[…] il y a une politique publique parce qu’il y a ‘un problème à résoudre’”. Capítulo I ______________________________________________________________________ 42 possível via crédito habitacional. Ou seja, esse crédito gera lucros para o capital financeiro, através da amortização do capital emprestado a uma taxa de juros, cobrados ao longo dos anos correspondentes ao contrato de crédito. No entanto, como o valor agregado da mercadoria moradia é bastante alto, uma grande parcela da população não tem capacidade de pagamento, mesmo com o auxílio do crédito imobiliário: “a importância da contribuição inicial e dos juros a serem reembolsados exclui uma massa importante da população, com rendas baixas, enquanto os membros das camadas sociais superiores gozam das facilidades de crédito para efetuar investimentos especulativos comprando apartamentos ‘com finalidade social’” (CASTELLS, 2000, p.238). Se uma grande parcela da população não pode ter acesso à moradia, mesmo com o apoio do Estado voltado à demanda, é necessário que o Estado também atue no lado da oferta, para resolver o problema. Em outras palavras, para suprimir essa lacuna, o Estado deve promover a construção de novas moradias, destinadas principalmente à construção de habitação social – aquela moradia voltada à população que não tem como se inserir no mercado imobiliário e que, no Brasil, hoje é constituída por famílias com renda mensal inferior a três salários mínimos (faixa de renda atualmente contemplada com programas habitacionais subsidiados). Geralmente, uma parcela dessas habitações construídas pelo poder público pode ser subsidiada, se não totalmente, pelo menos parcialmente16. Essa forma de ação do Estado na provisão habitacional, contudo, gera problemas, pois, segundo Azevedo (1982, p.113), “se subsidia em demasia, compromete drasticamente a produção de casas; se busca um mínimo de eficácia – através do retorno de parte do capital aplicado – exclui uma considerável parcela da população dos programas tradicionais de habitação popular”. No caso brasileiro, essa última alternativa foi (e continua sendo) a forma mais adotada, pois compromete menos o erário público e beneficia mais os interesses capitalistas, motivo pelo qual a política habitacional brasileira não tem sido eficiente no equacionamento do déficit habitacional, transformando-se em uma política elitista. Em suma, a política habitacional visa à produção de moradias, concede subsídios ou crédito habitacional para os de renda baixa, mas também oferece financiamentos para a população de maior renda, os quais, no caso brasileiro, geralmente são conseguidos através dos recursos das cadernetas de poupança (Sistema Brasileiro de 16 De forma geral, o subsídio habitacional não foi bem aceito no Brasil, cujo modelo de política foi “assentado sobre um sistema especializado no crédito habitacional” (ARRETCHE, 1990, p.23). Porém, alguns programas mais recentes já são contemplados parcialmente com subsídios e contrapartidas, como será discutido adiante. Capítulo I ______________________________________________________________________ 43 Poupança e Empréstimo – SPBE). Tais ações podem ser orientadas tanto para a promoção de uma política da casa própria quanto para uma política de aluguel subsidiada. Estas, por sua vez, atendem interesses políticos e econômicos diversificados, como se verá adiante. 1.4.1 A POLÍTICA DA CASA PRÓPRIA E A POLÍTICA DE ALUGUEL Ao longo deste capítulo, vem se afirmando que a produção habitacional exerce um papel de destaque no modo de produção capitalista, pois promove a acumulação de capital através da produção da mercadoria moradia, contribuindo para o desenvolvimento econômico (CORRÊA, 1989). A casa própria, em particular, traz consigo uma série de implicações sociopolíticas e econômicas as quais estão intrinsecamente relacionadas com os interesses capitalistas. As implicações econômicas dizem respeito à importância da produção habitacional na dinamização do ramo da construção civil e de materiais de construção, conseqüentemente na dinamização da economia. Além da construção civil, a casa própria é também vantajosa financeiramente, pois impulsiona o ramo do crédito imobiliário voltado, especificamente, aos compradores dos imóveis, o que favorece as agências financeiras. As implicações sociais e políticas, todavia, são explicadas por Harvey (apud GOTTDIENER, 1993, p.137), quando se refere à propriedade da casa, […] como um meio pelo qual as reivindicações do trabalhador foram divididas em preocupações relativas ao trabalho e preocupações referentes à qualidade de vida, em que esta recebe a maior ênfase da parte do Estado (socialização do capital). Finalmente, o fato de uma porção importante da classe trabalhadora possuir uma propriedade quebra ainda mais a consciência de classe e faz com que o grupo de proprietários da classe trabalhadora se alie aos capitalistas e contra aqueles que vivem de aluguel. Analisando-se as palavras de Harvey, percebe-se que, do ponto de vista das implicações políticas, a produção da casa própria visa à manutenção do status quo. Através da casa própria, procura-se estabelecer representações sociais, disseminando-se nos trabalhadores os valores próprios da classe dominante: Se para os mais ricos a casa própria pode ser importante por aspectos simbólicos e subjetivos, como satisfação própria, garantia de estabilidade e criação de um ambiente doméstico compatível com o gosto, status social e cultural da família, para os pobres, além desses elementos, a opção pela casa própria torna-se o refúgio seguro contra as incertezas que o mercado de trabalho e as condições de vida urbana reservam ao trabalhador que envelhece (BONDUKI, 2002, p.310). Assim, a propriedade privada insere na mentalidade do proprietário a sensação de segurança, pois, caso ele seja demitido, ainda assim terá onde morar. Além da segurança, a casa própria reproduz os valores burgueses, como a questão do status: um proletário que adquire a sua casa própria passa a acreditar que está progredindo no Capítulo I ______________________________________________________________________ 44 emprego e ascendendo socialmente. A propriedade privada utilizada como instrumento visando à preservação do patrimônio da classe dominante é também um valor burguês reproduzido, pois incute no trabalhador a importância de também ser proprietário da casa própria. Assim, como escreve Harvey (1982, p.13), […], a vulgarização da casa própria, individualizada, é vista como vantajosa para a classe capitalista porque ela estimula a fidelidade de pelo menos uma parte da classe operária ao princípio da propriedade privada, além de promover a ética de um ‘individualismo possessivo’ bem como a fragmentação dessa classe em ‘classes de habitação’ constituídas de inquilinos e proprietários. Isso dá à classe capitalista uma bem-vinda alavanca ideológica a ser usada contra a propriedade pública e exigências de nacionalização, porque é fácil dar a estas a aparência de que elas pretendem tirar dos trabalhadores as suas casas próprias. Outra representação social gerada pela política da casa própria destina-se, especificamente, para aquele trabalhador que obteve a sua propriedade a partir de subsídios estatais. Esse trabalhador, por sua vez, acredita que o governo é eficiente, e se alia ao Estado, mantendo a ordem social. É por isso que, para Azevedo (1982, p.100), a maioria dos programas habitacionais brasileiros “teria uma importância mais simbólica – mostrar a preocupação do governo com os pobres – do que propriamente uma busca de maior eficiência na construção de casas populares”. Todas essas abstrações sociais levam a uma submissão do trabalhador ao princípio da casa própria, todavia há, ainda, mais um fato relacionado à ideologia da casa própria e que contribui para a manutenção da ordem social, como o financiamento habitacional: “um trabalhador hipotecado até o pescoço é, na maioria dos casos, um bastião da estabilidade social e os esquemas para promover a casa própria para a classe trabalhadora há muito tempo que reconheceram este fato básico” (HARVEY, 1982, p.13). Ou seja, a promoção da casa própria está intrinsecamente relacionada com o crédito habitacional, como já foi dito, e o financiamento da propriedade privada manipula, de certa forma, o trabalhador, que fica receoso de perder sua moradia, além das complicações que o descumprimento das prestações do financiamento gera: perda da casa, nome comprometido em cadastros de cobrança, etc. Vale salientar também que o financiamento geralmente se desenvolve por muitos anos e, portanto, obriga o trabalhador a morar naquela habitação também por longos períodos, impedindo uma mobilidade residencial. De forma geral, o crédito habitacional aprisiona o trabalhador a uma condição socioeconômica por muito tempo, ao passo que, para as agências financeiras, é um mecanismo de gerar lucros por meio dos juros (muitas vezes, exorbitantes) também por muito tempo. Enfim, diante de todas essas vantagens econômicas e políticas proporcionadas pela casa própria à classe capitalista, esta criou a “ideologia da casa própria”, que, segundo Peruzzo (1984), é o meio pelo qual as classes capitalistas procuram conservar o status quo, Capítulo I ______________________________________________________________________ 45 além de ser utilizado para barganha junto às camadas populares urbanas. A propriedade privada é, na verdade o bastião dos interesses capitalistas, em primeiro plano, motivo pelo qual a política da casa própria foi mais difundida no Brasil, no mundo afora e, até mesmo, na Inglaterra, que sempre possuiu uma política de aluguel social consistente. Por outro lado, a partir de uma visão social, a casa própria também é vantajosa para o trabalhador (não apenas para os capitalistas), pois proporciona “certa” segurança, além da possibilidade de se tornar um investimento futuro: a casa própria pode, a qualquer momento, mudar o seu valor de uso para efetivar-se como valor de troca e, com isso, o proprietário pode vender e/ou alugar sua mercadoria moradia, a fim de “gerar” uma renda. Em suma, a difusão da propriedade privada gera menos vantagens aos trabalhadores do que à classe capitalista (produtores imobiliários e agências financeiras), uma vez que os últimos se apropriam não apenas dos aspectos econômicos, mas também dos aspectos políticos (manutenção do status quo, principalmente). Já para os trabalhadores-proprietários, a política da casa própria proporciona, como aspecto positivo, o atendimento de uma das reivindicações da força de trabalho (a moradia), a segurança de ter sua própria moradia e a possibilidade de vendê-la ou alugá-la, obtendo uma renda. A outra forma de acesso à moradia via políticas públicas de habitação é através da política de aluguel, que foi uma solução adotada com freqüência nos países europeus, especialmente em países como a Grã-Bretanha e a Suécia, gerando resultados satisfatórios quanto ao equacionamento do problema habitacional. O exemplo da política habitacional inglesa […] demonstra-nos que o sistema de aluguel subsidiado é uma alternativa viável dentro do próprio capitalismo, já que tem sido capaz de promover oferta de unidades residenciais de acordo com suas carências […], e de permitir acesso a elas em função das unidades numéricas e locacionais de cada família […]. Traz também a vantagem de permitir ao trabalhador uma mobilidade residencial além de dar ao governo um importante instrumento de planejamento urbano […] e econômico […] (GUGLIELMI, 1985, p.80, grifo acrescido). No Brasil, todavia, a política de aluguel teve menor repercussão que a da casa própria. Não obstante, o aluguel é a forma de acesso à moradia muito comum por parte da população de renda baixa, que não tem condições financeiras para se enquadrar em um financiamento habitacional, seja pela falta de capital, seja pelas exigências burocráticas17 das próprias agências financeiras, que excluem mais ainda essa população. Para Bolaffi (1986), defensor da produção habitacional em escala, a política de aluguel traz mais desvantagens (do ponto de vista ideológico, social e operacional) do que vantagens: 17 Os pretendentes a mutuários não podem ter problemas financeiros, como dívidas, etc. Capítulo I ______________________________________________________________________ 46 Em primeiro lugar, […], ao alugar as casas estaremos negando uma aspiração legítima da população até porque ela sabe que a longo prazo a amortização é mais conveniente do que o aluguel. Em segundo lugar o aluguel implicará numa profunda alteração da relação do morador com o seu imóvel. Em se tratando de casa alugada, os moradores não terão para com ela a mesma atitude de conservação, melhoria e até ampliação que hoje caracteriza os mutuários das casas adquiridas. Finalmente, temos de reconhecer, o Estado brasileiro é por demais burocratizado, cartorial e incompetente para administrar aluguéis eficientemente (BOLAFFI, 1986, p.30). Bolaffi (1986) cita, ainda, outra desvantagem de ordem econômica para a adoção de uma política de aluguel. Para ele, o sistema de aluguel pode ser tão oneroso quanto o sistema da casa própria para os usuários, pois “o montante de recursos necessários para a edificação de casas não será modificado pela forma de comercialização – venda ou aluguel – dos imóveis edificados. De qualquer forma, esses investimentos terão de ser amortizados, seja na forma de aluguel seja naquela de venda” (BOLAFFI, 1986, p.30). Em outras palavras, para a classe capitalista (basicamente os produtores imobiliários), a política de aluguel traz como aspecto positivo a acumulação de capital, seja através da produção da moradia alugada, seja através do próprio aluguel. Já para a classe trabalhadora, ela oferece o acesso à moradia e a mobilidade residencial, não podendo deixar-se de falar dos casos de aluguel subsidiado, que facilita mais ainda o acesso habitacional. Apesar disso, verifica-se que, tanto do ponto de vista do trabalhador quanto da classe capitalista, a casa própria ainda proporciona mais benefícios que a produção da casa alugada. No entanto, embora demonstre certa insatisfação pela política de aluguel, Bolaffi (1981) acredita que o mito da casa própria também não é adequado ao caso brasileiro. É interessante ressaltar que, em menor escala, e mais especificamente no caso brasileiro, além da política da casa própria e da política de aluguel, numa interseção das duas, recentemente surgiu mais uma forma de acesso à moradia, o leasing habitacional, efetivado através do Programa de Arrendamento Residencial. Não se pode deixar de comentar que o leasing residencial é uma alternativa que já vinha sendo adotada pelos bancos. No entanto, na política de habitação do governo federal, o PAR consiste num dos poucos exemplos de leasing, motivo pelo qual se diferencia no contexto das políticas públicas habitacionais, sendo adotado nesta dissertação18. Com o aporte teórico levantado neste capítulo, o próximo trata do desenvolvimento da política habitacional brasileira no país, como forma de contextualizar o cenário que propiciou a criação do PAR. 18 Não se considerou o leasing residencial promovido por fora da política habitacional. Capítulo II _____________________________________________________________________ 48 Neste capítulo descreve-se o contexto em que as políticas habitacionais se desenvolveram no país e enumeram-se as principais características quantitativas19 e qualitativas de tais políticas. Em outras palavras, trata-se aqui, sob uma perspectiva histórica, da evolução da produção de moradias em nível nacional, impulsionada pelas políticas públicas de habitação vigentes entre as décadas de 1930 e 2000. Essa descrição é imprescindível, uma vez que, para se compreender o cenário contemporâneo e, sobretudo, as políticas habitacionais (entre as quais se insere atualmente o Programa de Arrendamento Residencial), é necessário resgatar o passado, tratando da evolução da produção de habitações até os dias de hoje. Essa descrição possibilitou constatar que a casa própria foi a principal forma de acesso à moradia promovida pelas políticas públicas brasileiras no período considerado, no entanto, entre os programas criados após o fechamento do BNH, um se destacou devido à diferença quanto à forma de acesso à moradia – o leasing habitacional do PAR. Para a elaboração deste capítulo, a revisão bibliográfica foi complementada à consultas a dados secundários nas fontes estatísticas do IBGE. Os dados coletados foram importantes para se verificar a evolução da condição de ocupação dos domicílios brasileiros ao longo do desenvolvimento das políticas habitacionais brasileiras e a influência da política da casa própria nessa evolução. Com o panorama apresentado neste capítulo foi possível verificar, portanto, como se insere a discussão sobre o PAR no contexto das políticas de habitação no Brasil. 19 As características qualitativas dizem respeito aos aspectos tipológicos, aos aspectos construtivos e à forma de implantação dos conjuntos no espaço urbano. Capítulo II _____________________________________________________________________ 49 2.1 POLÍTICA DE ALUGUEL E DA CASA PRÓPRIA NA POLÍTICA HABITACIONAL BRASILEIRA A produção estatal de moradias no Brasil, até 1986, foi resultado, em grande parte, da ação dos agentes públicos, orientados por políticas habitacionais que foram desenvolvidas principalmente por três instituições federais, a saber: os Institutos de Aposentadoria e Pensões (1937-1964); a Fundação da Casa Popular (1946-1964); e o Banco Nacional de Habitação (1964-1986). O conjunto de ações desses órgãos constitui o modelo desenvolvimentista de intervenção do Estado, conforme já foi citado no primeiro capítulo. No entanto, depois do fechamento do BNH, de 1986 até 2006, não houve uma política habitacional clara e sistemática, mas apenas programas habitacionais do governo federal, elaborados ao longo de vários mandatos presidenciais e operacionalizados pela Caixa Econômica Federal. Não obstante, de forma geral, entre essas políticas e programas habitacionais, havia uma característica comum: a difusão de uma política calcada especialmente na propriedade privada, contribuindo, em parte, no modo predominante de acesso à moradia nos centros urbanos do país. Com base no levantamento dos dados censitários do IBGE, expresso na Figura 1, percebeu-se a evolução da condição de ocupação dos domicílios ao longo do desenvolvimento das políticas habitacionais20. Essa evolução constituiu-se num processo paradoxal, pois, enquanto o número de casas alugadas decresce ao longo dos anos, o número de casas próprias aumenta, o que parece ser uma das conseqüências da forte presença do incentivo da casa própria desenvolvido pelas políticas habitacionais brasileiras. É bem verdade que a difusão da casa própria foi também muito estimulada pela disseminação da autoconstrução nas favelas e loteamentos irregulares. Para compreender essa transformação de uma forma de acesso à moradia baseada sobretudo na casa alugada para uma forma de acesso baseada na casa própria, descreve-se a seguir, sob uma perspectiva histórica, a evolução das políticas de habitação, 20 Levantamento realizado a partir dos dados encontrados no endereço eletrônico do instituto: http://www.ibge.gov.br, acessado no dia 21-03-06. Capítulo II _____________________________________________________________________ 50 privilegiando o tipo de acesso à moradia promovido por cada uma delas durante sua intervenção. 40 49 11 46,2 47 6,8 50,5 42,6 6,9 59,92 30,62 9,46 60,18 30,77 9,04 66,89 22,08 11,04 0 10 20 30 40 50 60 70 40 50 60 70 80 90 Próprio Alugado Demais Figura 1: Distribuição percentual dos domicílios particulares permanentes urbanos por condição de ocupação entre 1940 e 1990 Fonte: Dados coletados no Instituto Brasileiro de Estatística, Departamento de Censos21 Nota: A denominação “Demais” refere-se aos domicílios cedidos e outro tipo. Nota: Elaboração da autora Como já comentado no capítulo anterior, a primeira ação efetiva do poder público na produção de moradias ocorreu a partir da década de 1930, quando surgiram os IAPs, primeiras instituições públicas a tratar da questão da habitação nos centros urbanos, embora de forma restrita, pois atendiam somente às necessidades dos seus associados, que se dividiam em categorias profissionais específicas – marítimos (IAPM); bancários (IAPB); comerciários (IAPC); industriários (IAPI); condutores de veículos e empregados de empreses de petróleo (IAPETEC) e estivadores (IAPE), entre outros. Esses institutos surgiram durante o Governo Vargas, num contexto em que o Estado passava a imagem de benfeitor e buscava ampliar as suas bases de legitimidade, em particular no meio urbano, através da criação de políticas voltadas ao atendimento das principais necessidades dos trabalhadores, como a casa própria, os serviços de assistência médica, a previdência social e as condições gerais de trabalho. Tendo isso em vista, foi nesse período que se passou a disseminar mais fortemente a ideologia da propriedade privada da casa, apesar de os institutos também terem desenvolvido uma política de aluguel: Assim, à primeira vista, surpreende o fato de os IAPs terem optado por alugar, e não vender, os conjuntos edificados para seus associados. Introduzida pelas instruções normativas do IAPI, a locação das moradias em 21 http://www.ibge.gov.br/ (21-03-06). décadas (1940 – 1990) di st rib ui çã o pe rc en tu al ( % ) Capítulo II _____________________________________________________________________ 51 conjuntos (Plano A) acabou sendo adotada por todos os institutos: “a grande maioria dos conjuntos construídos a partir do final da década de 30 foram destinados ao aluguel de trabalhadores vinculados aos IAPs” (BONDUKI, 2002, p.106). O Plano A não se destinava apenas à locação, mas também à venda de unidades habitacionais em conjuntos adquiridos ou construídos pelos institutos. Por se tratar da construção de conjuntos, esse plano adquiriu maior destaque frente aos demais (financiamentos de unidades isoladas, com ações pontuais, por exemplo), uma vez que a produção de conjuntos marcava e transformava, de certa forma, a paisagem urbana. Segundo Bonduki (2002, p.107), em algumas cidades brasileiras foram construídos grandes conjuntos residenciais, que “simbolizavam e expressavam de forma concreta, em grandiosas construções, a ação governamental”, refletindo a preocupação do Estado em promover a imagem de benfeitor. Ainda segundo esse mesmo autor, a produção do Plano A apresentou seu melhor desempenho produtivo entre 1946 e 1950, período que foi marcado por outros fatos igualmente importantes para a questão habitacional, como a criação da FCP, em 1946. Essa fundação continuou disseminando uma política da casa própria, embora também apresentasse atribuições relacionadas com a locação de unidades habitacionais, que teve pouca ou nenhuma repercussão22: […], a FCP adotou a construção de casas de locação como alternativa de acesso à moradia, mas, de maneira geral, seus programas privilegiavam a casa própria, sobretudo em conjuntos habitacionais. Possibilitando o acesso à propriedade, aspiração cada vez mais forte entre os trabalhadores, a FCP foi, desde o início, utilizada com objetivos políticos (BONDUKI, 2002, p.124). Começa, então, a ser difundida uma ideologia da casa própria, que levou os brasileiros a alimentarem o sonho de adquirir a propriedade da casa. Outros fatores que contribuíram para a crescente importância da casa própria na sociedade foram a promulgação da Lei do Inquilinato, de 1942, e a grave crise habitacional que se instaurou no período da Segunda Guerra e nos anos seguintes. Esses fatos provocaram a diminuição das unidades para locação. Como conseqüência, ainda na década de 1940, a produção informal (e/ou irregular) de moradias cresceu, sendo impulsionada pela autoconstrução da casa própria, tipo de produção que viria a contribuir para o processo de periferização e favelização das cidades. 22 Não foram encontradas referências a unidades habitacionais financiadas pela FCP destinadas a locação, favorecendo-se a disseminação da política da casa própria. Capítulo II _____________________________________________________________________ 52 Em suma, diante desses acontecimentos, associados às vantagens que a propriedade privada oferece quanto à segurança e à estabilidade residencial, a casa própria assumiu um significado crescente na sociedade, marcando profundamente a estrutura de acesso à moradia no país, transformação que foi desencadeada na década de 1940 e se refletiu nos anos seguintes. Do ponto de vista quantitativo, entre 1940 e 1950, o número de domicílios próprios cresceu 6,20%, enquanto o número de domicílios alugados diminuiu 2,00% (Figura 1). Essa dinâmica – aumento de casas próprias em oposição à diminuição de casas alugadas – levou ao quase equilíbrio quantitativo entre as duas formas de acesso à moradia no ano de 1950 (as casas alugadas correspondiam a 47% e as casas próprias a 46,2% do total). A década de 1950 se tornou, portanto, emblemática, pois consistiu em um período de transição entre os dois tipos de acesso à habitação – de domicílios predominantemente alugados a domicílios próprios. Em razão dessa inversão na forma de acesso à moradia, houve naturalmente uma inversão de valores em que a casa própria assumiu uma maior importância no imaginário da sociedade. Por esse motivo, Blay (1978, p.81) afirma: Creio que é neste período que se inicia com clareza a grande inversão que marca até hoje a mentalidade do trabalhador urbano brasileiro: o importante é ter uma casa própria, ela garante a fixação na cidade. Conseguir um emprego é difícil, instável, precário. A casa, porém, é a proteção para os momentos de desemprego, é a certeza de ter um teto enquanto se busca um novo trabalho. É importante lembrar que, ainda na década de 1950, foi concluída a construção do conjunto Residencial Pedregulho (produzido pelo Departamento de Habitação Popular do Rio de Janeiro), cujas unidades habitacionais seriam alugadas aos funcionários da então Prefeitura do Distrito Federal. Essa proposta foi defendida pela diretora do citado departamento, a engenheira Carmen Portinho, mesmo em um cenário que privilegiava a construção de casas próprias (BONDUKI, 1999). Finalmente, em 1960, a transformação se efetivou, pois o número de domicílios próprios foi superior ao dos domicílios alugados, representados por 50,5% e 42,6%, respectivamente (Figura 1). O Banco Nacional de Habitação, que entrou em vigor a partir de 1964, continuou disseminando a política da casa própria e contribuiu para sedimentar ainda mais a ideologia da propriedade privada, por meio de uma expressiva produção, que marcou a história da política habitacional no Brasil, devido à grande quantidade de moradias produzidas para comercialização. Com o advento do BNH, a questão da moradia, que estava sob a responsabilidade dos IAPs e da FCP, passou a ser comandada unicamente pelo banco, que Capítulo II _____________________________________________________________________ 53 detinha o controle do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) – formado por recursos provenientes do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE), a partir de 1966-1967. Criados durante o regime militar, num período de fortes tensões sociais, é consensual, entre os autores que abordam o tema, que o principal objetivo do BNH não consistiu na produção de habitações propriamente dita: visavam-se objetivos econômicos, como dinamizar a economia do país, por meio da geração de renda e empregos, além da capitalização de empresas nacionais, bem como objetivos políticos, como o controle da ordem social e a legitimação do poder do Estado, em que entra o papel da ideologia da casa própria, conforme constatado nos discursos políticos da época: A solução do problema da casa própria tem esta particular atração de criar o estímulo de poupança que, de outra forma, não existiria, e contribui muito mais para a estabilidade social do que o imóvel de aluguel. O proprietário da casa própria pensa duas vezes antes de se meter em arruaças ou depredar propriedades alheias e torna-se um aliado da ordem (CAMPOS apud AZEVEDO & ANDRADE, 1982, p.59). Portanto, visando alcançar os objetivos políticos e econômicos, a produção do BNH se caracterizou pela construção em larga escala de novas moradias, financiadas a longo prazo, e pelo estabelecimento da ideologia da propriedade privada. A construção em larga escala foi também uma herança do urbanismo modernista, empregado na produção dos IAPs, e que visava à racionalização e à industrialização da produção. Em suma, a década de 1960, assim como as seguintes, assistiram ao rápido incremento de casas próprias, enquanto o número de habitações alugadas foi paulatinamente decrescendo (Figura 1). Entretanto, até mesmo a forte política da casa própria empreendida pelo BNH apresentou problemas de comercialização de algumas unidades habitacionais, de modo que o banco introduziu uma nova forma de acesso à moradia, propondo também um regime de locação em 1972 e em 1983, embora, em ambos os casos, tenha havido pouca repercussão. A locação era por tempo limitado (até 30 meses) e, no contrato, constavam o valor e a forma de pagamento, para que, no final do prazo, o locatário ingressasse no regime da casa própria (FINEP, 1985), sistema que tinha alguma semelhança ao implantado posteriormente, no final da década de 1990, com o Programa de Arrendamento Residencial. Então, pode-se dizer que essa possibilidade do BNH consistiu numa primeira tentativa de uma política de arrendamento residencial no país, prenunciando o PAR (Figuras 2 e 3). Capítulo II _____________________________________________________________________ 54 Figura 2: Anúncio do Jornal do Brasil sobre o aluguel do BNH (20-06-72) Fonte: FINEP (1985, p.96) Figura 3: Anúncio do Jornal Última Hora sobre o aluguel do BNH (06-10-83) Fonte: FINEP (1985, p.97) Na primeira metade da década de 1970, registrou-se um grande crescimento econômico, ao passo que o final do decênio foi marcado por uma crise financeira generalizada no país, cujas conseqüências refletiram na década seguinte, causando a “falência” da política habitacional do BNH, pois o seu desempenho dependia do quadro econômico do país23. Diante do panorama de crise, em 1986 o BNH foi extinto e as suas atividades transferidas para um outro banco, a CAIXA, que passou a gerenciar o SFH e parte da estrutura do banco extinto, responsabilizando-se, portanto, pelos financiamentos habitacionais. Nesse momento de transição das atividades de um órgão para outro, a política de habitação passou por um processo de reestruturações, para se adequar à nova ordem mundial da política de formato neoliberal. A atuação do poder público passou a seguir a tendência mundial do neoliberalismo, que refletiu, no Brasil, na ausência de uma política habitacional federal mais sistematizada, promovendo-se uma série de programas de habitação desarticulados entre si, operacionalizados pela CAIXA. Mesmo nesse novo cenário, a política da casa própria prevaleceu, tornando a propriedade privada uma das maiores aspirações da população brasileira. Enfim, observando-se as políticas de habitação implementadas, verifica-se que a produção habitacional estatal no Brasil iniciou-se com uma política de aluguel e uma política da casa própria, ambas promovidas simultaneamente pelos IAPs. Posteriormente, passou a haver apenas uma política, essencialmente da casa própria, promovida pela FCP e pelo BNH. Além das diferenças de acesso, as diferentes políticas de habitação (dos IAPs, da 23 O BNH operava com recursos do FGTS e do SBPE. Com a crise econômica, muitas pessoas sacaram seus fundos e poupanças, comprometendo o sistema. Além disso, a crise afetou o valor das prestações, gerando uma série de problemas com os mutuários e o aumento da inadimplência. Capítulo II _____________________________________________________________________ 55 FCP e do BNH) nos centros urbanos geraram, por sua vez, diversificados padrões habitacionais, que, de forma específica, marcaram as paisagens urbanas ao longo de mais de meio século de desenvolvimento das política de habitação. Vale salientar que essa pluralidade de soluções arquitetônicas, tipológicas, construtivas e de implantação dos conjuntos no espaço urbano foi, em grande parte, fruto do público-alvo de cada política. As ações dos IAPs destinavam-se a categorias profissionais específicas com carteira assinada, algumas, inclusive, pertencentes à classe de renda média alta, como a categoria dos bancários. Esse foi um dos motivos que levou as habitações a apresentarem uma qualidade superior à das demais produções da FCP e do BNH. Já o BNH (via FGTS), atendeu à população de menor renda. Em suma, essa pluralidade de soluções será discutida, no item seguinte, em função da política de cada sistema – IAPs, FCP e BNH. 2.2 CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS ENTRE AS DÉCADAS DE 1930 E 1980 Como foi mencionado acima, o padrão tipológico e construtivo das habitações e o modelo de implantação dos conjuntos no espaço urbano promovidos por cada uma das instituições manifestaram-se de formas diferentes, seja em função do público-alvo, do momento histórico em que atuaram ou até mesmo da forma de acesso à moradia – casa própria ou casa alugada. Assim, em razão do momento histórico em que o IAP foi criado – o apogeu do movimento moderno no país –, sua produção habitacional se caracterizou por conjuntos fortemente influenciados pelos preceitos modernistas, tanto do ponto de vista urbanístico quanto do ponto de vista da tipologia, da arquitetura e da construção. Urbanisticamente falando, diante da estrutura das cidades na época, os conjuntos dos IAPs eram implantados em bairros contíguos aos centros urbanos. Haifa Sabbag (1985, p.46), porém, afirma que “quase todos os conjuntos habitacionais dos IAPs estão bem situados na cidade, contando com equipamentos comunitários”. O IAPC e o IAPB, por exemplo, foram aqueles que mais se preocuparam com a localização de seus empreendimentos, implantando muitos de seus conjuntos em áreas centrais (BONDUKI, 2002, p.161). Mas também implantaram conjuntos em bairros suburbanos – nas franjas da malha urbana. Alem disso, os conjuntos dos IAPs incluíram muita área verde, fato constatado, principalmente, nos conjuntos localizados nas grandes cidades brasileiras. Um outro aspecto digno de nota é que, no modelo adotado pelos IAPs, “modificava-se a noção de público e privado, rompendo-se as fronteiras que os separavam e Capítulo II _____________________________________________________________________ 56 criando-se a noção de que não se habita apenas a casa e sim um conjunto de equipamentos e serviços coletivos” (BONDUKI, 2002, p.148-149). Dessa forma, havia uma preocupação em inter-relacionar o urbanismo com a arquitetura das habitações construídas. Muitas dessas habitações estavam inseridas em blocos de edifícios residenciais (sobretudo as edificações verticais dos IAPBs), os quais passaram a interferir na paisagem urbana. Segundo Bonduki (2002), esses mesmos edifícios multifamiliares acabaram sendo instrumentos de propagação da arquitetura modernista; não obstante, a solução da casa unifamiliar térrea, situada em loteamento convencional, parece ter tido melhor aceitação entre os beneficiados. De forma geral, a arquitetura das habitações produzidas pelos institutos era considerada de excelente qualidade estética, e, em grande medida, adotou os preceitos da arquitetura modernista, como o pilotis, o terraço-jardim, a planta livre, a fachada livre e as janelas na horizontal. Também se adotou a preocupação com outros elementos formais, como a volumetria e a estética, bem como a valorização dos elementos locais, destacando- se o cobogó. Aliado às qualidades estéticas, a produção dos IAPs incentivou, ainda, o barateamento das construções, através da racionalização, industrialização e verticalização (blocos multifamiliares), a fim de construir habitações de qualidade, porém em grande escala, para, com isso, beneficiar um maior contingente de pessoas, portanto visando a um objetivo social. Ademais, a produção dos IAPs seguiu algumas diretrizes, que foram formuladas por Rubens Porto, arquiteto responsável pela normatização, fiscalização e aprovação dos procedimentos dos institutos. As diretrizes adotadas são as seguintes (BONDUKI, 2002, p.150-153): A edificação de conjuntos habitacionais isolados do traçado urbano existente […]; A construção de blocos […]; A limitação da altura dos blocos (não deverão ultrapassar quatro pavimentos) […]; O uso de pilotis […]; A adoção de apartamentos duplex […]; Os processos de construção racionalizados e a edificação de conjuntos autônomos […]; A articulação dos conjuntos habitacionais com planos urbanísticos […]; A entrega da casa mobiliada de forma racionalizada. Ainda conforme Bonduki (2002), a tipologia das habitações seguia um padrão que procurava evitar os corredores coletivos nos pavimentos, sendo comumente adotada a solução da circulação vertical servindo dois apartamentos por andar e repetindo-se sistematicamente ao longo dos blocos por duas, três ou quatro vezes, dependendo do comprimento deste. É importante mencionar, ainda, que a qualidade arquitetônica dos conjuntos dos IAPs foi resultado da combinação de três variáveis: público-alvo, contexto histórico e forma de financiamento. Primeiramente, os conjuntos se destinavam basicamente a uma Capítulo II _____________________________________________________________________ 57 população que tinha renda e que era mais exigente, como consumidora, quanto à qualidade das habitações. A segunda variável foi, indubitavelmente, o contexto histórico e a predominância dos princípios modernistas no urbanismo e na arquitetura dos conjuntos. Por último, a forma de financiamento também foi uma importante variável: a política de locação do Plano A, principal forma de acesso às moradias nos conjuntos habitacionais, “representou uma vitória dos que se opunham à casa própria e influenciou positivamente nos projetos dos conjuntos e a qualidade da sua execução” (BONDUKI, 2002, p.140). No caso da FCP, verifica-se que a produção foi orientada basicamente para a construção de unidades unifamiliares com as seguintes características: Independentemente da modalidade da construção, direta ou por empreitada, os projetos arquitetônicos foram sempre desenvolvidos pela Fundação da Casa Popular. As unidades em cada conjunto eram normalmente homogêneas, considerando-se popular a residência de até 70m², quando se tratasse de projeto de um piso, e de um máximo de 60m², com dois pisos. Geralmente eram de três quartos, pois se visava a uma clientela de família numerosa24 (AZEVEDO & ANDRADE, 1982, p.26-27). Além disso, Bonduki (2002, p.162), afirma que “a FCP buscou – ao menos no terreno das intenções – soluções mais apropriadas às diferentes realidades regionais, rompendo com a centralização de projeto que caracterizava os IAPs”. Infelizmente, no âmbito da literatura acadêmica, pouco se conhece acerca das características da produção dessa fundação sob o aspecto tipológico, o aspecto construtivo e da forma de implantação dos seus conjuntos no espaço urbano, o que dificulta uma descrição mais aprofundada neste trabalho. Não obstante, pode-se afirmar que, no caso da política da FCP, a maior preocupação passou a ser com os valores sociais da casa própria e, por conseguinte, com o fortalecimento da ideologia da propriedade privada. Quanto ao BNH, muitos estudos foram realizados sobre a sua atuação, os quais deixam claro que a produção habitacional desse período se caracterizou por grandes transformações tanto na tipologia e no padrão construtivo das habitações construídas quanto na forma de implantação dos conjuntos no espaço urbano. Do ponto de vista da forma de implantação, os conjuntos habitacionais (aqui entendidos como os conjuntos financiados pelo FGTS e, em especial, aqueles das COHABs) foram geralmente instalados nas periferias, onde se encontravam extensas áreas que permitiam a construção em escala e o custo do solo era mais baixo, uma vez que se transformava terra rural em terra urbana. O processo de periferização também se desenvolveu em função do crescimento e adensamento das cidades e do processo de especulação imobiliária daquele momento 24 “Diferentemente da(s) COHAB(s), a Fundação da Casa Popular dispunha de grande variedade de tipos de casas e projetos, quase sempre em função das condições locais” (AZEVEDO & ANDRADE, 1982, p.26-27). Capítulo II _____________________________________________________________________ 58 histórico, os quais impunham forte pressão no sentido de se deslocarem os grandes conjuntos para as franjas da malha urbana. Assim, a produção do BNH, em paralelo com a autoconstrução da casa própria, contribuiu diretamente para o processo de expansão periférica das cidades brasileiras, consolidando esse modelo de implantação. Para Bolaffi (1992, p.58), essa crescente expansão, […] aumenta as distâncias, encarece os investimentos para a implantação de serviços públicos, eleva os custos de operação e de manutenção e reduz o aproveitamento per capita dos equipamentos existentes. Enquanto porções do solo urbano parcial ou totalmente atendidas permanecem ociosas, contingentes cada vez maiores da população se instalam em áreas não servidas. E enquanto a periferia surge e se amplia, a baixa utilização dos serviços instalados condena o poder público à incapacidade permanente de resolver um problema que, paradoxalmente, o crescimento econômico e demográfico somente contribuíram para agravar (BOLAFFI, 1992, p.58). Todavia, essa localização periférica dos conjuntos do BNH não era o único problema urbano encontrado nesses conjuntos, conforme reconhece Pedreira (1985, p.66): Implantados, em geral, fora do perímetro urbano, alguns deles possuem alta concentração: contam com mais de 20 mil unidades, além de exibirem péssima qualidade das obras. Sem qualquer conforto ambiental e paisagístico, esses conjuntos são concebidos apenas como dormitório, praticamente sem equipamentos de lazer, saúde e educação, serviços de telefone ou transportes coletivos. Devido à grande dimensão dos conjuntos do BNH, aliada ao processo de expansão periférica, essa política gerou uma transformação na estrutura e na paisagem urbana da maioria das cidades brasileiras, com a construção de conjuntos habitacionais preferencialmente formados por casas, muitos dos quais, de tão grandes, posteriormente se transformaram em bairros. No que tange aos aspectos tipológico e construtivo das habitações financiadas pelo BNH, estes também apresentaram problemas. A busca pelo barateamento das construções, obtida com a redução da área construída das unidades (tornando-as muito pequenas) e com a qualidade dos materiais utilizados, comprometeu a habitabilidade mínima das habitações, resultando na rápida deterioração dos conjuntos (FINEP, 1985; PERUZZO, 1984). Assim, diferentemente do que ocorreu com as construções dos IAPs, o barateamento não teve um aspecto positivo, pois apenas visava à redução do custo das habitações para se comercializarem produtos compatíveis com o poder aquisitivo da população. Verifica-se, ainda, uma redução na qualidade estética das habitações, motivo pelo qual Bonduki (2002, p.135) afirma que a arquitetura habitacional do BNH sofreu um processo de “racionalismo formal desprovido de conteúdo, consubstanciado em projetos e Capítulo II _____________________________________________________________________ 59 obras de péssima qualidade, monótonos, repetitivos, desvinculados do contexto urbano e do meio físico e, principalmente, desarticulados de um projeto social”. Em suma, nessa conjuntura, a preocupação principal foi o barateamento das construções, para produzir-se em grande escala, relegando a qualidade das habitações e a habitabilidade para segundo plano, o que provocou uma série de problemas para os moradores e também para as próprias prefeituras, responsáveis pela implantação da infra- estrutura. Os governos municipais muitas vezes alegavam falta de recursos e, com isso, os conjuntos permaneciam sem infra-estrutura durante anos. Além disso, constata-se que, de forma geral, as políticas habitacionais brasileiras, especialmente da FCP e do BNH, disseminaram predominantemente o modelo da casa unifamiliar, situada em loteamento convencional. Em função disso, criou-se o mito e a cultura de morar em casas e, conseqüentemente, produziram-se cidades extremamente horizontais, com um modelo de expansão periférica25. Hoje, por exemplo, segundo o IBGE (2005), no Brasil, 87,7% dos domicílios são casas, ao passo que apenas 11,7% são apartamentos e 0,6% são comôdos (Na região Nordeste, esse índice de domicílios unifamiliares é ainda mais elevado). Pode-se, portanto, afirmar, de forma resumida, que houve uma diminuição na área média privativa, na qualidade construtiva e na qualidade de implantação das habitações construídas dos IAPs para o BNH, em função de um barateamento da construção. De maneira global, pode-se inferir que houve uma gradual inversão de valores e conceitos, que influíram nos resultados finais, ao longo do desenvolvimento da política habitacional brasileira: com os institutos foi instituído o barateamento das construções, com o objetivo de possibilitar ao maior número de pessoas o acesso à moradia, enquanto, com a política do BNH, o barateamento permaneceu, todavia, sem se preocupar com a habitabilidade das moradias. Outra questão que pode ter influenciado nessa diminuição qualitativa refere-se ao fato de que muitas das habitações dos IAPs eram alugadas e, por conseguinte, eram de propriedade do Estado, havendo, então, uma maior preocupação com os aspectos da qualidade tipológica, da qualidade construtiva e com a forma de implantação das habitações construídas. Sendo assim, a questão da representação social do poder governamental parece ter sido um ponto relevante, influenciando positivamente a qualidade das habitações dos institutos. 25 Todavia, é importante ressaltar que o SBPE financiou a construção de inúmeros edifícios, favorecendo a verticalização nas grandes cidades brasileiras. Capítulo II _____________________________________________________________________ 60 Por fim, com o objetivo de melhor visualizarem-se as características da produção habitacional dos IAPs e do BNH, estas foram resumidas no Quadro 1: QUADRO 1 Síntese das principais características tipológicas, construtivas e locacionais identificadas na produção habitacional dos IAPs e do BNH26 Programas e políticas habitacionais no Brasil Características da produção IAPs BNH (FGTS) Período de atuação 1937-1964 1964-1986 período getulista Contexto histórico apogeu do Movimento Moderno no Brasil regime militar Tipo de política política da casa própria e política de locação política da casa própria Implantação modelo suburbano de implantação, embora alguns conjuntos tenham sido implantados em bairros contíguos ao centro urbano. Outros, todavia, apresentam localizações privilegiadas, inclusive, nos centros urbanos. modelo periférico de implantação Formação dos conjuntos presença de equipamentos comunitários e muitas áreas verdes ausência de equipamentos comunitários e até mesmo de infra- estrutura nos conjuntos Transformações na estrutura urbana sim, embora pequena. Ocupação dos vazios localizados nas franjas da malha urbana sim (expansão da malha urbana) Transformações na paisagem urbana sim (construção de conjuntos residenciais verticais) sim (construção de conjuntos horizontais de grande porte) Urbanismo x arquitetura inter-relacionados “desvinculados do contexto urbano e do meio físico e, principalmente, desarticulados de um projeto social” Tipologia habitacional multifamiliar, como símbolo propagador da arquitetura modernista; e unifamiliar multifamiliar e unifamiliar, este último sendo mais freqüente no Nordeste brasileiro. Características arquitetônicas adoção dos preceitos modernistas, que garantiram excelente qualidade estética. “racionalismo formal desprovido de conteúdo”, cujos projetos monótonos, repetitivos apresentavam péssima qualidade arquitetônica. através da racionalização, industrialização e verticalização. através da racionalização e industrialização, mas também da redução da qualidade da construção Barateamento da construção tinha um objetivo social, por trás do barateamento: proporcionar moradia de boa qualidade para maior número de pessoas visava ao barateamento das construções para fazer frente à capacidade de pagamento do público-alvo Fonte: BONDUKI (2002); AZEVEDO & ANDRADE (1982); BOLAFFI (1992); FINEP (1985); PEDREIRA (1985); e PERUZZO (1984) Nota: Elaboração da autora com base na fonte acima mencionada 26 Optou-se em não colocar as características da produção habitacional da FCP em razão do desconhecimento de grande parte das características desse agente, além da sua produção ter sido pouco significativa numericamente. Capítulo II _____________________________________________________________________ 61 Vale ressaltar que tais características também foram emblemáticas na produção habitacional na cidade de João Pessoa-PB, promovida pelos agentes públicos vinculados à política habitacional do modelo desenvolvimentista – IAPs, IPASE, FCP, Montepio ou IPEP, CEHAP e INOCOOP. 2.3 A POLÍTICA HABITACIONAL A PARTIR DE 1987 Para se entender o cenário da política habitacional após o Banco Nacional de Habitação, faz-se necessário entender o desenrolar dos acontecimentos que levaram ao fechamento do banco em 1986. O fechamento do BNH resultou de um longo processo de transformação de paradigmas na economia mundial e nacional, iniciado no final da década de 1970, quando se deu o esgotamento do sistema fordista de produção. A transformação do modo de produção fordista para uma nova forma de acumulação de capital (acumulação flexível), impulsionada pela política neoliberal, afetou diretamente a economia do país, gerando crises financeiras durante as décadas de 1980 e 1990, que foram denominadas de “décadas perdidas” (VALENÇA, 1998). Essa transformação do modo de regulação, contudo, não influenciou apenas a economia, mas também a produção habitacional. A crise econômica atingiu o SFH, cujo formato operacional dependia do desempenho da economia, e, por conseguinte, influenciou negativamente o modo de funcionamento do BNH. De acordo com Valença (2001), o primeiro momento do processo de extinção do citado banco se deu ainda durante o governo Figueiredo (1979-1984), motivo pelo qual esse período foi caracterizado pelo autor como de dissolução27 da política habitacional; ou seja, início da desestruturação de uma era, a era do BNH. Nos anos seguintes, os problemas da política se acentuaram e, em 1985, quando Sarney assumiu o cargo de presidente (sinalizando o fim de 21 anos de regime militar), a crise no sistema se concretizou, com o “baixo desempenho social, alto nível de inadimplência, baixa liquidez do Sistema, movimentos de mutuários organizados nacionalmente e grande expectativa de que as novas autoridades poderiam resolver a crise do Sistema sem a penalização dos mutuários” (AZEVEDO, 2001, p.11). Todas essas dificuldades que perpassavam o setor habitacional culminaram, em 1986, na extinção do BNH, que, como diz Valença (2001), provocou o caos na política. Além 27 Valença (2001) resumiu o desenvolvimento da política habitacional nos últimos anos em quatro palavras: dissolução, caos, apatia e confusão. Capítulo II _____________________________________________________________________ 62 do caos, o período de 1986 a 1989 foi um período de transição na política de habitação. Nessa transição, a carteira habitacional e as principais atribuições do BNH foram transferidas para outro banco, a CAIXA. Essa instituição tem natureza financeira e efetiva transações econômicas, razão pela qual todas as atividades não-financeiras são, para ela, de caráter secundário. Dessa forma, a questão habitacional não consistia numa atividade-fim, mas numa atividade setorial da CAIXA, que tinha (e tem) o objetivo de gerir os recursos que o governo federal aloca para os programas de habitação. Em função disso, mas também pelas características intrínsecas da agência, como a busca pelo equilíbrio financeiro e retorno do capital aplicado, os programas alternativos voltados para os setores de menor renda (que exigem elevado grau de subsídios e envolvimento institucional) foram dificultados (AZEVEDO, 2000). Hoje, a CAIXA busca novos instrumentos para inserir a população de renda baixa nos seus programas sem se descuidar dos seus princípios de equilíbrio financeiro, como se verá adiante. Ademais, as atribuições do governo na área habitacional, antes praticamente concentradas no BNH, foram pulverizadas entre várias outras instituições federais, além da CAIXA, como o Banco Central, o ministério urbano do momento28 e a Secretaria Especial de Ação Comunitária (SEAC)29 (SANTOS, 1999). Os governos estaduais e municipais também passaram a interagir na produção habitacional estatal, participando, sobretudo, dos programas alternativos e também criando novos e diferentes programas de habitação, o que já indicava uma influência da política neoliberal de descentralização das ações estatais. Em virtude do perfil de funcionamento da CAIXA e das transformações na estrutura organizacional da política habitacional brasileira, no momento subseqüente à extinção do BNH o governo federal tinha prioridades, e a questão habitacional não era uma delas. Assim, esse período – prolongando-se até o início do governo de Fernando Collor de Mello – foi marcado pela apatia na produção habitacional, ou seja, por um arrefecimento do número de financiamentos habitacionais, o que provocou o agravamento dos problemas de moradia da população brasileira – aumento do déficit habitacional, crescimento das favelas, etc. 28 Em um período de apenas quatro anos, o Ministério do Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (MDU), criado em 1985, transformou-se em Ministério da Habitação, Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente (MHU), em Ministério da Habitação e Bem-Estar Social (MBES) e, finalmente, foi extinto em 1989, quando a questão urbana voltou a ser atribuição do Ministério do Interior (ao qual o BNH era formalmente ligado) (SANTOS, 1999). 29 A Secretaria Especial de Ação Comunitária (SEAC), responsável pelos programas alternativos do período, também sofreu uma série de alterações ao longo da gestão de Sarney. Capítulo II _____________________________________________________________________ 63 Se, por um lado, a gestão foi incapaz de formular uma política habitacional clara e sistemática e de modificar o SFH, por outro lado o governo estimulou o desenvolvimento de programas alternativos em relação ao SFH, os quais passaram a prenunciar, pela primeira vez na trajetória da política habitacional brasileira, desempenho quantitativo superior ao do sistema convencional (apesar da dificuldade da CAIXA em dinamizar tais programas alternativos) (AZEVEDO, 2000). Entre esses programas alternativos, merece especial destaque o Programa Nacional de Mutirões Habitacionais, cujo formato institucional previa o estabelecimento de um convênio entre a SEAC, a instituição conveniada – que poderia ser a prefeitura ou um órgão do governo estadual – e a Secretaria Comunitária Habitacional, formada pelos participantes de cada projeto (AZEVEDO, 2000). O programa, financiado com recursos orçamentários a fundo perdido, destinava-se às famílias de renda inferior a três salários mínimos e oferecia unidades habitacionais em condições mais favoráveis do que aquelas construídas pelas COHABs. No entanto, esse programa não obteve o esperado êxito, pois, da meta inicial de construção de cerca de 600.000 unidades habitacionais, estima-se que apenas 20.000 foram concluídas. Para Azevedo (2000), os principais motivos pelos quais grande parte das unidades financiadas não foi construída foram: má utilização dos recursos, baixo financiamento unitário e inflação galopante, que provocou o aumento exorbitante dos preços dos materiais de construção e serviços. Apesar do bom desempenho inicial, que gerou impacto na política habitacional daquele período, o programa não teve longa vida útil, face às dificuldades encontradas, terminando juntamente com o mandato do citado presidente, em 1989. A gestão de Sarney também foi marcada pela diminuição da atuação das COHABs, que tiveram seus financiamentos bastante restringidos pelo governo central, a fim de contribuir para a diminuição do endividamento de estados e municípios com a União (SANTOS, 1999). Outro aspecto responsável por essa diminuição foi a atuação da CAIXA, que, para se adaptar à nova estrutura da política habitacional e, concomitantemente, à estrutura da política neoliberal, terminou, na prática, não só por transferir à iniciativa privada os créditos para a habitação popular, como também por diminuir a capacidade dos estados e municípios de disciplinar a questão habitacional (AZEVEDO, 2000). Tais medidas geraram inúmeras conseqüências negativas: […] a transformação das COHABs de agentes promotores em simples órgãos assessores, e a obrigatoriedade dos mutuários finais de assumirem os custos totais dos terrenos e da urbanização, acarretaram inúmeras conseqüências negativas no final dos anos 80, dos quais pode se citar: 1) a paulatina diminuição de poder por parte das Companhias Habitacionais; 2) a elevação do nível de renda da clientela dos programas tradicionais, que passou a atingir fundamentalmente famílias com rendimentos mensais Capítulo II _____________________________________________________________________ 64 acima de cinco salários mínimos; 3) a desaceleração dos programas alternativos (AZEVEDO, 2000, p.13). Em suma, o governo Sarney não foi capaz de formular uma política substitutiva à política do BNH, evidenciando-se uma ausência de objetivos políticos relacionados à questão habitacional no país. * * * A ausência de uma política habitacional clara e sistemática continuou mesmo com a virada da década. Os anos 1990 foram marcados pelo estabelecimento da política neoliberal, que contribuiu para regularizar paulatinamente a conjuntura econômica do país. Desse modo, com o fortalecimento da nova política, o Brasil vai se inserindo no movimento internacional mais amplo de privatizações, de redução das responsabilidades econômicas do poder público (comparando-se com o modelo desenvolvimentista). Ratificando essa afirmação, Ângela Gordilho-Souza (2000, p.57-58) afirma que, desde a extinção do BNH “tem sido notório o retraimento do papel do Estado na produção de habitação, particularmente nas políticas federais para a produção de interesse social”. A política neoliberal também se fez presente na inter-relação do país com os organismos mundiais – FMI e Banco Mundial. Assim, dado o alto endividamento externo do início da década de 1980, o Brasil submeteu-se aos organismos mundiais de regulação da economia. Ricardo Antunes (2004, p.131) afirma: No Brasil, se o neoliberalismo começou com a eleição de Collor, em 1989, foi entretanto no Governo FHC, entre 1994 e 2002, que ele de fato deslanchou. Como em quase toda a América Latina, o desemprego, a precarização do trabalho e a exclusão social proliferaram. E no Brasil de FHC não foi diferente. Com o crescente índice de desemprego, houve igualmente um crescente empobrecimento da população brasileira, que se aglutinava cada vez mais em favelas, o que provocou uma sensível piora nas condições e na qualidade de vida. Por esse motivo, para Ermínia Maricato (1996), a imagem desse momento histórico está associada a violência, a poluição, a criança desamparada, tráfego caótico, entre outros inúmeros males. O problema da falta de habitação também se avolumou nos últimos anos da década de 1980, em conseqüência do processo migratório, aliado à redução no número de financiamentos habitacionais ocorrida no governo Sarney, que provocou o desaquecimento da produção de moradias. Capítulo II _____________________________________________________________________ 65 Finalizando, pode-se dizer que as “décadas perdidas” de 1980 e 1990 assistiram à transformação da estrutura de funcionamento da política de habitação: de uma política de Estado (o modelo desenvolvimentista) para uma política de governo, ou seja, uma política mais descentralizada e mais instável, suscetível a alterações a cada novo mandato presidencial: um plano de habitação durante o governo Collor, outro no governo Itamar e outro ainda no governo de Fernando Henrique Cardoso. A seguir, serão abordadas, separadamente, as atuações de cada governo federal e sua intervenção no setor habitacional, tendo em vista essa nova estrutura de funcionamento. 2.3.1 GOVERNO COLLOR (1990-1992) Em 1990, Fernando Collor de Mello assumiu a presidência da República, e os problemas habitacionais se agravaram: foi o momento da confusão implantada na política habitacional brasileira, gerada pelo bloqueio das cadernetas de poupança (por 18 meses), que ocasionou graves problemas para o SFH (VALENÇA, 2001). Segundo Valença (2001), foi também durante a gestão de Collor que se intensificou a abertura do mercado e a parceria do governo com a iniciativa privada, em parte devido ao avanço da globalização de formato neoliberal. A base neoliberal das políticas econômicas internas era influenciada pelos órgãos financiadores internacionais – FMI e Banco Mundial –, os quais recomendavam o fortalecimento das instituições financeiras e do mercado imobiliário, estimulando parcerias entre estes, além de cortes nas despesas públicas, processos de privatização e desregulamentação. Por esse motivo, a política habitacional desse governo esteve alicerçada em financiamentos voltados para os agentes privados. A atuação da CAIXA não poderia ser diferente. Como esclarece Gordilho-Souza (2000, p.58), essa agência financeira, […] esteve voltada predominantemente, para empréstimos diretos a empresas de construção, sem intermediação da administração pública para implantação de infra-estrutura. Isso elevou os custos dos projetos, estreitando o consumo para faixas de renda baixa. Os demais programas para faixas de renda menores foram pouco efetivos e voltados para um atendimento clientelista. Os programas habitacionais dessa gestão passaram a ser controlados pela Secretaria Nacional de Habitação, pertencente ao novo ministério, o Ministério da Ação Social (MAS). Sob a responsabilidade do MAS estavam quatro programas, todos financiados pelo FGTS, implantados e operados pela CAIXA, os quais estão expostos no Quadro 2: Capítulo II _____________________________________________________________________ 66 QUADRO 2 Programas do governo de Fernando Collor de Mello e suas respectivas fontes de recursos Programas Fontes de recursos Plano de Ação Imediata para a Habitação (PAIH); Programa Cooperativas; Programa Empresário Popular (PEP) PROHAP público PROHAP privado PRODURB Programa de Habitação Popular PROAREAS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) Fonte: VALENÇA (1999) Nota: Elaboração da autora Gordilho-Souza (2000), tratando das principais linhas de financiamento, diz que o PROHAP foi elaborado para substituir as COHABs, que passavam por dificuldade de restrições de crédito, de maneira que o setor privado assumia empréstimos junto à CAIXA; o PEP correspondia a uma linha de financiamento destinada às empresas privadas de menor porte; e o PAIH consistia em um programa de construção de conjuntos habitacionais com unidades menores, tipo embrião, com perspectivas de atender a um maior contingente populacional. Todos esses programas seguiram o modelo de distribuição que privilegiava a região Sudeste, além de não terem respeitado a distribuição estabelecida pelo Conselho Curador do FGTS, conforme afirmou Azevedo (2000). Assim como muitas políticas implementadas anteriormente, a maioria dos programas dessa gestão baseou-se na busca por uma maior eficácia no sistema financeiro e, portanto, automaticamente excluiu a parcela da população que não tinha capacidade de pagamento, ou seja, aquela de menor poder aquisitivo. Dessa forma, os programas que obtiveram maior êxito foram exatamente aqueles que ofereciam maior lucratividade para o sistema: Estes programas eram realmente os mais lucrativos: PAIH porque o risco envolvido era pequeno; PEP porque o preço final poderia ser livremente estabelecido pelo mercado; e o Programa Cooperativas, como o PEP, porque era destinado a uma clientela de maior poder aquisitivo (famílias cuja renda mensal era superior a 12 salários mínimos, ou, em fato, mais). […]. Todos os programas eram dominados pelos promotores privados (VALENÇA, 1999, p.1765, tradução livre)30. Ainda de acordo com Valença (2001), em virtude desse modelo de financiamento, adotado com participação massiva da iniciativa privada como promotora do sistema, as unidades habitacionais tornaram-se muito custosas, o que gerou uma 30 It is worth noting, once again, that these programmes were actually the most lucrative: PAIH because little risk was involved; PEP because the final price could be freely establishes in the market; and the cooperative programme, like PEP, because it was targeted at a better-off clientèle (families earning up to 12 times the legal minimum wage, or, in fact, more). […]. All three programmes were dominated by private promoters. Capítulo II _____________________________________________________________________ 67 incompatibilidade entre os programas e a clientela-alvo. Já as habitações produzidas nesse período seguiram dando continuidade ao modelo implementado pelo então extinto BNH, conforme afirmação de Bonduki (1997, p.63): Essa lógica atingiu o clímax no governo Collor, marcado pela corrupção, quando se financiou e produziu dezenas de conjuntos habitacionais de péssima qualidade e localização, construídos por empreiteiras suspeitas, onde quem podia pagar o financiamento não queria lá morar, e os que se dispunham a habitá-los não tinham renda. Grande parte dessas unidades ficou desabitada ou inacabada, verdadeiro símbolo da decadência do tradicional Sistema Financeiro de Habitação, principal instrumento do central-desenvolvimentismo. Dentre as unidades desabitadas ou inacabadas, mais de 50 mil não haviam sido comercializadas e outras tantas não tiveram sua construção concluída. Quando comercializadas, parte das moradias foi vendida por valor abaixo do estabelecido inicialmente, gerando grandes prejuízos para o governo federal (SANTOS, 1999). É importante ressaltar que o volume de recursos destinados aos financiamentos dos programas acima listados gerou um grande número de operações, entre 1990 e 1991, de maneira que o SFH não suportou essa demanda e, por conseguinte, comprometeu o orçamento dos anos seguintes. Após dezembro de 1991, esse fato impediu a aprovação de novos projetos no âmbito do MAS, sendo financiados pela CAIXA, e prejudicou a produção habitacional da gestão governamental seguinte, que, inclusive, extinguiu esses programas e criou novos. Diante desse panorama desfavorável – problemas de comercialização das unidades, inadimplência e suspensão de novos contratos –, agravou-se a crise da moradia no país. A população de renda baixa continuou enfrentando seus problemas habitacionais via produção informal (e/ou irregular), ao passo que, para as classes de renda média e média-baixa, o mercado imobiliário criou uma nova alternativa: a cooperativa habitacional autofinanciável. Segundo Morais (2004), essa alternativa, surgida no início da década de 1990, constituiu em uma forma de produção habitacional com a função de viabilizar o acesso à casa própria àqueles que podem arcar concomitantemente com o aluguel e a prestação do imóvel. Enfim, as crises econômicas (e também de moradia) vivenciadas nessa gestão, aliadas à crise de legitimidade, causaram uma insatisfação global da população, resultando no impeachment do então presidente Collor e o início do governo de Itamar Franco, seu vice-presidente. Capítulo II _____________________________________________________________________ 68 2.3.2 GOVERNO ITAMAR FRANCO (1993-1994) O governo de Itamar Franco foi marcado por uma série de transformações no cenário econômico, as quais refletiram diretamente no setor habitacional. Dentre essas transformações, destaca-se a implantação do Plano de Estabilização Econômica, ou simplesmente Plano Real31, que, finalmente, controlou a inflação, contribuindo para o fortalecimento da economia. Além disso, essa gestão se destacou promovendo uma série de modificações no SFH e na CAIXA. A reforma desta foi, posteriormente, essencial à retomada das operações na área habitacional (VALENÇA, 2001). Os programas também foram adaptados: passaram a ser geridos por um novo ministério, o Ministério do Bem-Estar Social, e sofreram algumas modificações estruturais: […] foram redesenhados e passaram a exigir a participação de conselhos com participação comunitária dos governos locais e uma contrapartida financeira desses últimos aos investimentos da União. Tais mudanças aumentaram significativamente o controle social e a transparência da gestão dos programas em questão, e constituíram ponto de inflexão importante na condução das políticas públicas na área de habitação popular (SANTOS, 1999, p.21). A produção habitacional desse período até o primeiro mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso se caracterizou pela apatia, segundo Valença (2001). A produção foi inexpressiva quantitativamente, uma vez que se priorizou a conclusão das obras contratadas mas paralisadas durante o governo anterior. A conclusão das habitações inacabadas (geralmente destinadas a uma população de melhor padrão econômico) se fez através das linhas de financiamento tradicionais, como o FGTS, recursos do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) e verbas orçamentárias, conforme afirmou Azevedo (2000). Já a intervenção governamental para as classes de renda mais baixa se desenvolveu por meio de dois novos programas, que operavam com recursos do Orçamento Geral da União (OGU): o Habitar-Brasil e o Morar-Município (Quadro 3). QUADRO 3 Programas do governo de Itamar Franco e suas respectivas fontes de recursos Programas Fontes de recursos “Conclusão de habitações Collor”32 FGTS, FDS e verbas orçamentárias Habitar-Brasil Orçamento Geral da União (OGU)e recursos do BID Morar-Município Orçamento Geral da União (OGU) Fonte: AZEVEDO (2000) Nota: Elaboração da autora 31 Criado em 1994 pelo então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso (FHC). 32 A “Conclusão de habitações Collor” foi uma ação visando à finalização dos empreendimentos iniciados durante do governo Collor. O real nome dessa ação, todavia, não foi encontrado. Capítulo II _____________________________________________________________________ 69 Esses dois novos programas, embora tenham características semelhantes às de antigos programas do BNH, como o Promorar e o João de Barro, marcam uma forma diferente de o Estado intervir na questão da habitação. Ao invés de enfrentar exclusivamente a escassez de moradias, busca-se solucionar problemas de habitabilidade das unidades já construídas, através de ações integradas de construção de novas habitações, urbanização de favelas, produção de lotes urbanizados e melhorias habitacionais, obedecendo-se a um regime de trabalho de “ajuda-mútua” ou “auto-ajuda”, em parceria com os governos estaduais e municipais. Face ao grande número de habitações inadequadas no país, essa forma de atuação passa a se fortalecer no decorrer dos anos, visando à melhoria da qualidade de vida da população. Em outras palavras, trata- se de programas de cunho mais social, alimentados com recursos da OGU; muito embora o Habitar-Brasil também tivesse a possibilidade de canalização de recursos externos, oriundos do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). De modo geral, o Habitar-Brasil e o Morar-Município possuíam também muitas características comuns: eram capitaneados, na época, pelo Ministério do Bem-Estar Social e tinham a participação dos governos estaduais e municipais, através de uma contrapartida claramente definida – seja financeira (com 10% a 20% do investimento federal), seja colaborando com os custos de urbanização dos terrenos, de legalização, elaboração do projeto técnico, assistência técnica, pavimentação de ruas, eletrificação, etc. (AZEVEDO, 2000). Por outro lado, a principal diferença estava na área de abrangência dos municípios. Enquanto o Habitar-Brasil se voltava para os de mais de 50 mil habitantes, o Morar- Município era destinado àqueles de menor porte (AZEVEDO, 2000). É importante mencionar o fato de que o surgimento desses programas marcou a trajetória da política habitacional brasileira pós-BNH, pois inseriu nesse cenário o problema qualitativo da moradia, além de eles se diferenciarem da maioria dos outros programas, tradicionalmente alimentados com recursos do FGTS, que exigiam o retorno do capital investido (devido à fonte de recursos) e, por isso, dificultavam o atendimento à parcela da sociedade de menores rendas, que não tinha como pagar pela sua moradia no sistema de crédito convencional. Com o Habitar-Brasil e o Morar-Município, alimentados com recursos da OGU, vislumbrou-se a possibilidade de se atender à população de mais baixa renda, com a intermediação dos governos estaduais e municipais, sistema semelhante àquele promovido pela SEAC (Sarney), mas que fora extinto em 1989. É interessante observar, por fim, que os referidos programas, notadamente o Habitar-Brasil e o Morar-Município, ou foram mantidos ou serviram de base para a formulação de novos programas na gestão posterior, corroborando a mudança no perfil da política. Em outras palavras, o Habitar-Brasil foi mantido (provavelmente devido aos Capítulo II _____________________________________________________________________ 70 contratos com o BID), sofrendo aperfeiçoamentos e modificações, e o Morar-Município serviu de base para a formulação de outro programa. 2.3.3 GOVERNO FERNANDO HENRIQUE CARDOSO (1995-1998-2002) Dando continuidade à política neoliberal, o governo de Fernando Henrique Cardoso foi marcado pelo desenvolvimento de reformas constitucionais (reforma do sistema de seguridade social, reforma tributária, entre outras) e pelas privatizações, o que colaborava para a manutenção da política de estabilização econômico-financeira (VALENÇA, 1998). A preocupação com a esfera econômica suplementou a preocupação com as necessidades de moradia da população brasileira, e a apatia continuou no primeiro ano da gestão do presidente Fernando Henrique Cardoso, pois o governo estimulou, a princípio, apenas o Programa de Conclusão de Empreendimentos Habitacionais. Esse programa visava a recuperar investimentos já realizados com recursos do FGTS, ou seja, tinha o objetivo principal de viabilizar a comercialização daqueles conjuntos de habitação cuja construção se iniciou ainda durante o governo Collor (AZEVEDO, 2000). Posteriormente, foram efetuadas modificações na estrutura da política de habitação, motivadas pela formulação do Plano Nacional de Habitação. Uma das primeiras mudanças realizadas por esse governo na área habitacional foi a extinção do Ministério do Bem-Estar Social e, em substituição, o surgimento da Secretaria de Política Urbana (SEPURB) no âmbito do Ministério do Planejamento e Orçamento. A SEPURB foi criada com a finalidade de articular as políticas públicas, mas também elaborar a política habitacional para o país33. Assim sendo, em 1996, após formulado pela citada secretaria para orientar as ações governamentais relacionadas à moradia, o documento “Política Nacional de Habitação” (PNH) foi apresentado na Conferência de Istambul – HABITAT II34. Além das mudanças estruturais, as ações habitacionais também apresentaram novidades no sentido de criação de novos programas e de aperfeiçoamento de outros. Verifica-se uma mudança positiva no perfil da política habitacional pós-BNH, como a adoção de várias frentes de ação para combater as necessidades habitacionais, a utilização de mais fontes de recursos, visando a atingir objetivos diferenciados. E, principalmente, verifica-se a continuidade de alguns programas de uma gestão para outra, contribuindo para o 33 É importante mencionar que posteriormente a questão habitacional passou para a responsabilidade da Secretaria de Desenvolvimento Urbano (SEDU). 34 O Brasil participou da 2ª. Conferência das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos em Istambul, realizada no período de 04 a 14 de junho de 1996. Tal evento favoreceu a divulgação das práticas bem-sucedidas no espaço urbano brasileiro, especialmente na habitação, que voltou a ter a devida importância nas discussões acadêmicas. Capítulo II _____________________________________________________________________ 71 fortalecimento de uma política de habitação mais estável. Gordilho-Souza (2000, p.339) assim resume a questão habitacional na segunda metade da década de 1990: Em meados desta década, registra-se uma ampliação efetiva de investimentos em habitação através da CAIXA, que passa a atuar em várias frentes, com agentes promotores públicos e privados, bem como com programas dirigidos diretamente ao mutuário final, sem intermediações. Objetivam, além da produção de novas unidades de habitação e implantação de novos conjuntos, a melhoria das condições de habitabilidade de áreas precárias ocupadas e já consolidadas, a recuperação e a construção de unidades isoladas, bem como o financiamento para compra de imóveis usados e para a implantação de pequenos estabelecimentos de comércio local, nesse caso visando à geração de renda nos conjuntos implantados. Seguindo esse panorama, os principais programas voltados para a área habitacional podem ser divididos em três grupos a depender da fonte de recursos utilizada, como pode ser observado no Quadro 4. QUADRO 4 Programas do governo de Fernando Henrique Cardoso e suas respectivas fontes de recursos Programas Fontes de recursos Habitar-Brasil Orçamento Geral da União (OGU)e recursos do BID Programa de Subsídio à Habitação (PSH) Morar Melhor Orçamento Geral da União (OGU) Programa de Conclusão de Empreendimentos Habitacionais Pró-Moradia Carta de Crédito Individual e Associativo; Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) Programa de Arrendamento Residencial (PAR) Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade Habitacional (PBQP-H). - Fonte: AZEVEDO (2000); SANTOS (1999); VALENÇA (2001); levantamento realizado na CAIXA (2003); site do Senado (2006) Nota: Elaboração da autora O primeiro grupo compreende basicamente três programas, que tinham a finalidade de “atuar no financiamento (a fundo perdido ou subsidiado) a estados e municípios para a reurbanização de áreas habitacionais degradadas com melhoria das habitações existentes/construção de novas habitações e instalação/ampliação da infra- estrutura dessas áreas, ocupadas principalmente pelas camadas populacionais de renda inferior a três salários-mínimos mensais” (SANTOS, 1999, p.22). Nesse primeiro grupo, destacam-se o Pró-Moradia, o Habitar-Brasil e o Morar Melhor. Mas se pode dizer que o Programa de Subsídio à Habitação (PSH), criado depois da PNH, também se insere nesse grupo. O Pró-Moradia e o Habitar-Brasil contribuíram para a melhoria das condições de habitabilidade daquelas habitações que ocupam áreas urbanas degradadas e onde reside a Capítulo II _____________________________________________________________________ 72 população cuja renda familiar mensal é de até três salários mínimos. Em outras palavras, são programas que atuam mais na redução do déficit habitacional qualitativo do que na do quantitativo, embora também produzam novas unidades em conjuntos. No tocante aos recursos disponibilizados, ambos são desenvolvidos com “recursos próprios” (de fundos públicos) e contrapartidas estaduais e municipais. A diferença reside no fato de que o Pró-Moradia opera com recursos alocados pelo FGTS, enquanto o Habitar-Brasil opera com recursos do OGU, além da possibilidade de canalização de recursos externos, oriundos do BID. Em função dessa diferença, como os financiamentos concedidos com recursos provenientes do FGTS têm necessariamente de ser ressarcidos, a fim de se evitar o seu esgotamento, isso faz com que as exigências financeiras para a aprovação dos financiamentos para o Pró-Moradia sejam muito mais rígidas do que para o Habitar-Brasil, dado que os recursos deste último são concedidos a fundo perdido (SANTOS, 1999). Uma outra diferença é o fato de os programas atenderem a cidades com características distintas: o Habitar-Brasil atende basicamente aos municípios de maior porte, enquanto o Pró-Moradia se estende a todo o território, incluindo pequenas cidades brasileiras. O Morar Melhor tem um sistema de funcionamento parecido com o Habitar- Brasil: opera com recursos da OGU; destina-se aos estados, municípios e ao Distrito Federal, que entram com contrapartidas para produção de novas moradias, ou para melhoria das condições de habitabilidade de unidades habitacionais, ou, ainda, para urbanização de áreas; e é voltado para famílias com rendimento mensal de até três salários mínimos, que vivam em localidades urbanas e rurais. O quarto e último programa inserido no primeiro grupo é o PSH, criado no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (em 2001) e também voltado para a população com renda familiar mensal inferior a três salários mínimos. Ele atua mais no déficit quantitativo, através da construção de novas unidades habitacionais e é operado com recursos provenientes do OGU, juntamente com as contrapartidas estaduais e municipais, ou seja, um sistema de financiamento semelhante ao do Habitar-Brasil. Embora o programa atenda a todo o território nacional, as habitações geralmente são construídas em cidades de menor porte (médio e pequeno), em cuja periferia ainda seja possível encontrar extensas áreas de terra com preços mais baixos, uma vez que o custo máximo permitido para cada unidade varia atualmente entre R$ 20.000,00 e R$ 30.000,0035. É importante mencionar que os subsídios podem variar entre R$ 2.000,00 e R$ 9.000,00. 35 Quando iniciou, o valor máximo de avaliação das unidades habitacionais era bem mais baixo, em torno de R$ 10.000,00 reais. Capítulo II _____________________________________________________________________ 73 Por atender a uma população de baixa renda, as habitações construídas dentro desse grupo são também de baixo custo e, por isso, são, em geral, construídas com arquitetura simples e materiais convencionais. Em outras palavras, produzem-se unidades unifamiliares de pequenas dimensões e com telhado aparente (de telha canal) em forma de duas águas, como ilustra a Figura 4. Financiado pelo PSH, o contrato para a construção desse conjunto foi assinado em 2003, contemplando a produção de 55 unidades. Cada unidade é formada por varanda, sala, jantar/cozinha, banheiro e um quatro, inseridos em uma área igual a aproximadamente 36m². Além disso, cada unidade foi financiada pelo valor de R$ 6.215,91 reais. Figura 4: Conjunto habitacional do PSH José Alexandre Filho em Poço José de Moura, na Paraíba Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2003) O segundo grupo da PNH concede crédito direto aos cidadãos, por meio de financiamentos de longo prazo para a construção/melhoria de habitações para a população (pessoa física) de renda mensal variando entre dois (sendo mais comum três) e quatorze salários mínimos. Enquadrados nesse grupo, destacam-se como principais programas: o Carta de Crédito, na modalidade Individual ou Associativo, e o Programa de Arrendamento Residencial (este, criado no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso). O Programa Carta de Crédito (antigo PRÓ-CREDI) consiste em um financiamento para pessoas físicas (forma individual) ou para pessoas físicas associadas em grupos (forma associativa), visando à aquisição da casa própria. Os grupos da forma associativa podem ser formados por condomínios, sindicatos, cooperativas, associações, companhias de habitação e até mesmo empresas do ramo da construção civil. Trata-se de um programa voltado para uma população classificada como classe de renda média (em 2005, a faixa de renda atendida variava entre R$ 1.500,00 e R$ 4.900,00, segundo o Ministério das Cidades, 2005b)36, portanto, prioriza a capacidade de pagamento segundo parâmetros de uma linha de crédito bancário convencional. Tendo o público-alvo em vista, 36 Considerando-se que o salário mínimo em 2005 era de R$ 350,00, a faixa de renda varia entre 4,29 e 14sm. No passado, o programa financiava famílias com renda oscilando entre 3 e 12sm, segundo Gordilho-Souza (2000, p.61). Capítulo II _____________________________________________________________________ 74 as habitações financiadas geralmente apresentam um melhor padrão construtivo (Figura 5). É importante salientar que os recursos do Carta de Crédito são provenientes, sobretudo, do FGTS, das cadernetas de poupança (SBPE), podendo também ser de recursos da própria CAIXA. Figura 5: Programa Carta de Crédito em Caçapava, São Paulo Fonte: GALLI (2004) Para este trabalho, o programa Carta de Crédito Associativo adquire uma maior importância que a forma Individual, pois a primeira forma de financiamento produz habitações em conjunto, criando-se pequenos condomínios fechados nas cidades. Para Gordilho-Souza (2000, p.61), as principais vantagens desse tipo de financiamento é oferecer para os grupos de condomínios “a possibilidade da autogestão, sem a intermediação de incorporadoras e com liberdade para escolha do tipo e características do projeto”. O PAR, criado em 1999, é, por sua vez, uma forma de produção habitacional destinada à população de renda baixa (até oito salários mínimos37) para arrendamento residencial de unidades habitacionais, com opção de compra no final do prazo contratado de 180 meses (15 anos). Destina-se às localidades onde o problema habitacional se manifesta mais intensamente, isto é, os centros urbanos (capitais, regiões metropolitanas e cidades com população urbana superior a 100 mil habitantes, segundo o Censo Demográfico 2000, Contagem da População 1996 – Fonte IBGE). O fato é que o PAR surge como uma forma de estimular a produção de conjuntos habitacionais para renda baixa no país, a qual estava arrefecida desde a produção dos conjuntos promovida durante o governo Collor. Mesmo o Carta de Crédito Associativo, embora produza conjuntos, não se destina especificamente 37 O programa começou com uma faixa salarial que variava entre três e oito salários mínimos, da qual, dentre os que recebiam acima de seis salários, atendia apenas a profissionais da área da segurança pública. Depois, o PAR passou a não considerar mais a faixa mínima, podendo contemplar famílias de até dois salários mínimos. Capítulo II _____________________________________________________________________ 75 para esse fim. Em função do exposto, o PAR merece especial atenção, constituindo-se num estudo de caso neste trabalho. Ademais, o PAR se destaca no contexto das políticas de habitação no período pós-BNH por ser o único programa que vem promovendo uma forma diferente de acesso à moradia, ou seja, o arrendamento residencial. Todos os outros programas aqui apresentados, seja do governo Collor, do governo Itamar ou do governo FHC, promoviam o sonho da casa própria, seguindo a ideologia que já havia sido fortemente implementada durante as políticas do Estado desenvolvimentista. Não obstante, o PAR também promove a ideologia da casa própria, conforme será explicitado adiante, no Capítulo III. No tocante aos recursos, para o funcionamento do PAR foi criado um novo fundo, constituído especialmente para o programa, chamado de Fundo de Arrendamento Residencial (FAR), que é composto por recursos provenientes de vários outros fundos – FAS38, FINSOCIAL39, FDS40, PROTECH41 – e também do FGTS. Nesse sentido, o PAR se diferencia dos outros programas de habitação do período pós-BNH, financiados tradicionalmente com recursos apenas do FGTS ou do OGU. O terceiro e último dos grupos do Plano Nacional de Habitação se refere às políticas facilitadoras da atuação do mercado, as quais atuam no desenvolvimento institucional e na modernização da legislação que incide sobre o setor habitacional (SANTOS, 1999). Atuam, ainda, na promoção e incentivo à qualidade da construção de habitação para os segmentos mais necessitados (paradoxalmente à construção de moradias para a classe de renda alta, em que a qualidade é um pré-requisito indispensável para a comercialização da mercadoria habitação). Dentre os programas que pertencem a esse grupo, destacam-se: o Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade Habitacional (PBQP-H); o Sistema Financeiro Imobiliário; e o Programa de Alteração na Legislação sobre o Uso do Solo e sobre Questões Ambientais. Enfim, depois da Política Nacional de Habitação e dos programas habitacionais a ela vinculados, a produção habitacional no país volta a se fortalecer (depois do arrefecimento de programas ocorrido durante o governo Itamar) e também se verifica uma maior “pluralidade de ações envolvendo a estratégia de experimentação de vários tipos de programas de financiamento, priorizando-se, sobretudo, o ingresso do cidadão individualmente ou em grupos cooperativos sem intermediações de outros agentes, objetivando menores custos de produção e maior amplitude” (GORDILHO-SOUZA, 2000, 38 Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social. 39 Fundo de Investimento Social. 40 Fundo de Desenvolvimento Social. 41 Programa de Difusão Tecnológica para Construção de Habitação de Baixo Custo. Capítulo II _____________________________________________________________________ 76 p.60). Em outras palavras, no governo Fernando Henrique Cardoso, os programas do segundo grupo, em especial o PAR e o Carta de Crédito Associativo, foram aqueles que mais propiciaram à população o sonho da casa própria. Além disso, salienta-se que, dos programas da Política Nacional de Habitação, conforme o Relatório Nacional Brasileiro para a Conferência Istambul +5 (apud LORENZETTI, 2001), entre 1995 e 2000 o Carta de Crédito Individual foi o programa que apresentou a maior participação no investimento total no setor habitacional, com 60,48%, seguido pelo Carta de Crédito Associativo, com 19,06%. Em suma, o Carta de Crédito é o programa que assume maior importância no contexto da política, embora não contemple a população que sente mais dificuldades para obter um financiamento e uma casa onde morar. 2.3.4 GOVERNO LULA (2003-2006) Em 2003, Luiz Inácio Lula da Silva assume a presidência da República, em meio a um cenário de muitas especulações sobre como seria a sua gestão42. Acreditava-se, na época, que, por se tratar de um político de “esquerda”, ele não daria continuidade à política econômica do país e, por conseguinte, isso influenciaria a questão habitacional. No entanto o que aconteceu foi exatamente o contrário: o governo Lula deu continuidade à política econômica implementada no governo anterior, mantendo a economia do país estável. Assim, como diria Antunes (2004, p.155), Em vez de iniciarmos uma nova era, de desmontagem do neoliberalismo, atolamos e chafurdamos na continuidade do nefasto projeto de desertificação social e política do país, iniciado por Collor, desenvolvido por FHC e agora mantido pelo governo do PT. Além de manter a política econômica, o governo prosseguiu com os principais programas habitacionais da gestão de Fernando Henrique Cardoso, alguns dos quais, porém, foram revisados e aperfeiçoados; ao passo que outros programas foram criados, como o Crédito Solidário. Nesse governo também se criou uma nova Política Nacional de Habitação contendo os seguintes objetivos: i) universalizar o acesso à moradia digna; ii) promover a urbanização, regularização e inserção urbana de assentamentos precários; iii) fortalecer o papel do Estado na gestão da política e na regulação dos agentes privados, dentro de um novo modelo com desconcentração de funções e articulação de ações, para possibilitar a participação de amplos segmentos da sociedade na sua implantação; iv) tornar a questão habitacional uma prioridade nacional; v) democratizar o acesso à terra urbanizada e ao mercado secundário de imóveis; vi) ampliar a produtividade e melhorar a 42 Em 2006, foi reeleito para mais quatro anos de governo (2007-2010). Capítulo II _____________________________________________________________________ 77 qualidade na produção habitacional; e vii) incentivar a geração de empregos e renda (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2005b, p.6). Os objetivos são, portanto, bem amplos, havendo uma preocupação com o acesso à moradia, com a questão urbana, mas também com a qualidade da produção habitacional e com a economia do país. O último objetivo da Política Nacional de Habitação, inclusive, remete a uma das preocupações que também fez parte da política do BNH, que era promover a geração de emprego para dinamizar a economia do Brasil. Uma mudança promovida pelo governo de Lula foi quanto ao Ministério responsável pela questão habitacional e pelas políticas urbana, fundiária e de saneamento. Nessa gestão, a habitação passou a ser comandada pela Secretaria Nacional de Habitação – pertencente ao recém-criado Ministério das Cidades –, a qual é responsável pelas ações voltadas ao problema da moradia. Portanto, é no âmbito desse ministério que se encontram os onze programas habitacionais do governo, divididos em grupos, de acordo com os recursos alocados, como pode ser observado no Quadro 5. Além dos programas listados nesse quadro, há, ainda, os programas homólogos porém com recursos provenientes da Caixa Econômica Federal, como a linha de crédito do Carta de Crédito (nas formas Individual e Associativa) que pode ser alimentada tanto pelo FGTS quanto pela própria CAIXA, ou ainda, pelo SBPE. QUADRO 5 Programas do governo de Lula e suas respectivas fontes de recursos 43 Programas Fontes de recursos Apoio à Melhoria das Condições de Habitabilidade de Assentamentos Precários (antigo Morar Melhor) Apoio ao Poder Público para Construção Habitacional destinada às famílias de baixa renda (antigo Morar Melhor) Orçamento Geral da União (OGU) Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH) Orçamento Geral da União (OGU), mas também com a possibilidade de recursos do FGTS Habitar-Brasil/BID Orçamento Geral da União (OGU)e recursos do BID Carta de Crédito Individual Carta de Crédito Associativo Programa de Apoio à Produção de habitações Pró-Moradia Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) Programa de Arrendamento Residencial (PAR) Fundo de Arrendamento Residencial (FAR) Programa Crédito Solidário Fundo de Desenvolvimento Social (FDS) Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H) - Fonte: MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005b) Nota: Elaboração da autora 43 Mais recentemente, no final do primeiro mandato do presidente Lula, foi criado mais um programa, Operações Coletivas, da Resolução n.460. Capítulo II _____________________________________________________________________ 78 No Quadro 5, observa-se que a maioria dos programas habitacionais provém da gestão anterior, caracterizando-se um processo de continuidade dos programas, apesar das revisões e reformas realizadas para melhor adequação à nova conjuntura do país. Assim sendo, com o passar dos anos, os programas vão se aperfeiçoando e se consolidando no cenário da política de habitação. Apesar disso, foram criados novos programas, além da criação, em 2005, do Sistema e do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (SNHIS e FNHIS, respectivamente), os quais estarão relacionados com um Plano Nacional de Habitação de Interesse Social (PNHIS). Esses instrumentos vêm com o objetivo de prover moradias para a população que não possui poder aquisitivo suficiente que os permita adquirir sem subsídios um imóvel em condições mínimas de habitabilidade. Têm, ainda, como meta aumentar a quantidade de investimentos nas faixas de renda situadas em até cinco salários mínimos, demonstrando uma preocupação com uma política de caráter mais social – o que vem sendo conseguida, em destaque, com os novos programas Crédito Solidário e Resolução n.460. O Crédito Solidário é um financiamento que se destina ao atendimento das necessidades habitacionais de famílias organizadas em grupos, assim como o Carta de Crédito Associativo; no entanto o público-alvo e as características de funcionamento são diferentes. O Crédito Solidário se destina a uma população de menor poder aquisitivo que a do Associativo, isto é, atende preferencialmente àquelas famílias que apresentam renda bruta mensal variando entre um e três salários mínimos. São também admitidas famílias que apresentam até cinco salários mínimos, porém em menor proporção. Já os recursos com que o Crédito Solidário opera são provenientes do FDS. Outro programa foi o chamado Operações Coletivas ou Resolução n.460 para operar junto ao Carta de Crédito, através da concessão de subsídios pelo FGTS para a população de renda mais baixa (aproximadamente até 5 salários mínimos). Funciona como um financiamento direto às pessoas físicas, representadas por sindicatos, cooperativas, associações, condomínios, pessoas jurídicas voltadas à produção habitacional, companhias de habitação ou órgãos assemelhados, Estados, Municípios, Distrito Federal ou órgãos da sua administração direta ou indireta, com a interveniência de uma empresa do ramo da construção civil. É importante lembrar que os programas estão divididos de acordo com os recursos alocados, que determinam a faixa de renda a que se destinam. Os programas desenvolvidos com recursos da OGU, por exemplo, são aqueles reservados basicamente às famílias cuja renda mensal é, em geral, inferior a três salários mínimos, isto é, à parcela da população que não tem como resolver seus problemas habitacionais e, por isso, necessita de subsídios do Estado. Já os programas alimentados pelo FGTS, estão Capítulo II _____________________________________________________________________ 79 predominantemente voltados ao atendimento das necessidades habitacionais da população de maiores rendimentos: acima de três salários mínimos. Há as exceções: o Pró-Moradia, a Resolução n.460 e, em alguns casos, o PSH, desenvolvidos com recursos do FGTS, se destinam à população que recebe até três salários mínimos. De acordo com a política neoliberal, a parcela da população que recebe mais de três salários mínimos não necessita da ajuda do Estado, pois o próprio mercado imobiliário se encarrega de resolver suas necessidades habitacionais, por isso os programas do FGTS são basicamente programas de crédito imobiliário que não concede grandes facilidades. O FAR e o FDS, por sua vez, alimentam programas que atendem a população com renda familiar mensal variando entre um e seis salários mínimos (oito em casos excepcionais), portanto situada em uma faixa que nem é de total responsabilidade do Estado nem consegue resolver seus problemas apenas no âmbito do mercado imobiliário. Em suma, percebe-se que, mesmo em um cenário de política neoliberal, a maioria dos programas é destinada à população de menores rendas, o que teoricamente demonstra a preocupação e o comprometimento do Estado com as questões sociais. Assim o poder público estaria desempenhando seu papel neoliberal de tentar resolver o problema de moradia dos mais pobres. No entanto, na prática, apesar do desempenho acima mencionado como, por exemplo, na criação do SNHIS e da criação de novos programas voltados para a renda mais baixa, a gestão de Lula permaneceu beneficiando aqueles financiamentos mais elitistas, pois são eles que garantem o maior retorno dos investimentos aplicados. O maior montante dos recursos alocados pelo governo foi destinado primeiramente para os programas alimentados pelo FGTS, sobretudo para o Carta de Crédito, que compreende o público-alvo de maior poder aquisitivo da política, comparando-se com os demais financiamentos. Em seguida, o governo beneficiou o FAR, cujo público-alvo é classificado como classe de renda média baixa e, por fim, os programas alimentados pela OGU, os quais se destinam à população de renda mais baixa. Em suma, a camada social que mais necessita da intervenção estatal para solucionar os seus problemas de moradia foi a menos beneficiada financeiramente, mesmo em um governo que tanto proclama a “preocupação” com as questões sociais (Tabela 1). Diante do exposto, pode-se afirmar que a política habitacional atual segue a mesma característica das políticas antecedentes de beneficiar a população de maiores rendas, em detrimento dos mais pobres. Capítulo II _____________________________________________________________________ 80 TABELA 1 Investimentos em habitação, distribuídos por programas (em milhões), entre 2003 e julho 2005 OGU FGTS FAR FDS Apoio à melhoria Apoio ao poder Habitar- Brasil PSH Carta de Crédito Individual Carta de Crédito Associativo Apoio à Produção Pró- Moradia PAR Crédito Solidário 349.9 761.2 1014.4 7400 - 334 2280.5 - 2125.5 7734 2280. - Fonte: MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora Voltando-se a Tabela 1, percebe-se que o Carta de Crédito é o carro-chefe da política habitacional de Lula, seguido pelo PAR, de maneira que ambos são prioridades da gestão. Como essas linhas de crédito foram as mais beneficiadas pelo governo Lula, esta pesquisa realiza uma análise comparativa entre os três programas que relativamente têm mais características em comum, em especial, por se tratar de formas de financiamentos direto para a população, sem a intermediação do poder público. Os três programas são: o Carta de Crédito Individual – FGTS; o Carta de Crédito Associativo – FGTS; e o PAR – FAR. Tomou-se por base algumas de suas características operacionais financeiras, a fim de se avaliarem as vantagens que cada um apresenta (Quadro 6). A partir da análise comparativa entre os programas, percebe-se que o PAR oferece maiores facilidades, como: o financiamento de 100% do valor do imóvel, as baixas taxas de arrendamento e de juros, por um menor tempo de contrato (180 meses), além de outras que não foram listadas na tabela, como a ausência de entrada e de intercaladas ao longo do processo de crédito, como será visto mais adiante. O valor dos imóveis também é inferior ao dos de outros tipos de financiamento, possibilitando o acesso à moradia da população de menores rendimentos. Os demais programas, todavia, apresentam taxas de juros exorbitantes e dificultam o financiamento, pois muitos não financiam a totalidade do valor do imóvel. Portanto, entre as variadas formas de crédito habitacional, o PAR é que oferece mais facilidades para a população de renda mais baixa ter acesso à moradia e realizar o sonho da casa própria. Ademais, o PAR apresenta outras particularidades, como: ser um dos poucos programas de construção de conjuntos habitacionais para a classe de renda média baixa (há outros que se destinam à renda baixa), uma diferente forma de acesso à moradia, o leasing habitacional, e uma nova fonte de recursos – o FAR. Capítulo II _____________________________________________________________________ 81 QUADRO 6 Dados comparativos entre os programas habitacionais Carta de Crédito Individual, Carta de Crédito Associativo e o PAR Programas Carta de Crédito Características dos programas Carta de Crédito Individual-FGTS Carta de Crédito Associativo – FGTS PAR Prazos de amortização no máximo até 360 meses no máximo até 360 meses entre 180 meses (mínimo exigido) e 216 meses Quanto financia? não financia 100% do imóvel não financia 100% do imóvel financiamento de 100% do valor do imóvel Juros juros mínimo de 6% ao ano + TR44 juros mínimo de 6% ao ano + TR a taxa de arrendamento será reajustada com base no índice de atualização do FGTS (TR) Limite de financiamento até R$ 80.000,00 para habitação popular e 100.000,00 para habitação/operações especiais até R$ 80.000,00 para habitação popular e 100.000,00 para habitação/operações especiais R$ 28.000,00 a 40.0000,00 Vantagens econômicas descontos nos financiamentos concedidos com recursos do FGTS para pessoas físicas com rendimento familiar mensal de até R$ 1.500,00 descontos nos financiamentos concedidos com recursos do FGTS para pessoas físicas com rendimento familiar mensal de até R$ 1.500,00 baixo valor da taxa de arrendamento (0,5 a 0,7% do valor de referência do imóvel) Fonte: Dados obtidos no site do MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a); normativo da CAIXA-PAR (2006); e contrato do PAR (2006) Nota: Elaboração da autora * * * Faz-se necessário, ainda, discutir o papel da CAIXA nesse novo cenário de política de habitação descrito nas páginas anteriores. Com o fechamento do BNH e a transferência de suas atividades e responsabilidades para a CAIXA, esta teve de se readequar para receber a nova estrutura e a nova incumbência. Feito isso, essa agência financeira passou a atuar na área habitacional, apesar de essa ser uma atividade secundária dentro do banco, conforme já mencionado anteriormente. Não obstante, para Fortuna (apud SILVA, 2002), esse banco se caracteriza como uma “instituição de cunho eminentemente social”, concedendo empréstimos e financiamentos a programas e projetos nas áreas de assistência social, saúde, educação, 44 Taxa de Referência (TR) é uma atualização monetária que corresponde à taxa de inflação do período, que tem por objetivo manter o poder aquisitivo do FGTS e das Cadernetas de Poupança (http://www.fgtsfacil.org.br/fgts/oquee.asp (13-05-07). Capítulo II _____________________________________________________________________ 82 trabalho, transportes urbanos e esporte, além da área habitacional. A própria CAIXA propaga sua função social, conforme pode ser observado na Figura 6. Mensagem da Placa: “A Caixa Econômica Federal financiou esta obra com recursos do FGTS, patrimônio do trabalhador, cumprindo a sua função social de contribuir para o bem-estar da comunidade”. A mensagem, todavia, não condiz com a realidade, uma vez que o condomínio, onde a placa foi fixada, foi financiado pelo programa Carta de Crédito Associativo, em que os mutuários pagam prestações mensais, acrescidas de juros. Portanto, não se constata uma operação social, mas essencialmente uma operação financeira. Figura 6: Placa fixada em um condomínio fechado financiado pelo Carta de Crédito Associativo na cidade de João Pessoa Fonte: Acervo da autora (2006) Adotando-se uma linha de pensamento diferente da de Fortuna, acredita-se, neste trabalho, que a CAIXA não apresenta essa “função social”. Na área habitacional, por exemplo, sua função se restringe apenas a auxiliar a política de habitação, concedendo empréstimos cuja fonte de recursos são fundos públicos. Como banco, ela impõe juros aos financiamentos, apesar de reduzi-los quando se aplicam à habitação social, e só concede empréstimos para aqueles que comprovam capacidade de pagamento, isto é, o retorno do capital aplicado, seja de pessoas físicas seja até mesmo dos governos de estado e município. Em função disso, uma grande parcela da população e das prefeituras é excluída dos financiamentos. Para a população de renda mais baixa excluída dos financiamentos, a CAIXA concede financiamentos aos governos do estado e às prefeituras, que, por sua vez, produzem habitações sociais e repassam o financiamento para a população. No entanto, os responsáveis pelo empréstimo no banco, no caso dos fundos públicos, são os governos, que terminam arcando, muitas vezes, com a inadimplência por parte dos mutuários. Portanto, a função social, na política habitacional, fica a cargo dos governos estaduais e municipais, que produzem habitação social com recursos alocados pelo governo federal, ao passo que a CAIXA apenas repassa os recursos de uma esfera governamental para outra e lucra com as taxas de juros. A CAIXA, todavia, não atua apenas dessa forma. Após o fechamento do BNH, ela passou a atuar com seis linhas de ação principais: Capítulo II _____________________________________________________________________ 83 x gestão dos financiamentos destinados aos governos estaduais e municipais, por meio de programas como o Habitar-Brasil, o Morar-Município, o Pró-Moradia e o PSH; x gestão dos financiamentos destinados às Companhias de Habitação, por meio de programas como o PAIH, PROHAP público, o Carta de Crédito Associativo, o Habitar- Brasil, etc.; x concessão de financiamentos às cooperativas habitacionais, por meio de programas como COOPHAB e Carta de Crédito Associativo; x concessão de financiamentos às empresas da construção civil, por meio de programas como PAIH, PEP, PROHAP privado, Carta de Crédito Associativo, PAR, etc. x participação mais ativa na produção, por meio do PAR, como será mais detalhada adiante; e x gestão dos financiamentos direto aos cidadãos (como ocorre com o Carta de Crédito e o PAR). A partir das novas atribuições da CAIXA, percebe-se uma maior gama de possibilidades de frentes de ação contra o problema da falta de moradias, com financiamentos destinados a diferenciados agentes – poder público, construtoras, cooperativas, companhias de habitação ou moradores. * * * De posse da compreensão da forma de atuação da CAIXA e do desenvolvimento das políticas habitacionais brasileiras, desde os IAPs, passando pelo BNH até o período pós-BNH, foi possível situar o Programa de Arrendamento Residencial no contexto das políticas de habitação, constatando-se que se trata de uma diferente forma de acesso à moradia no Brasil – o leasing habitacional – que merece ser melhor explorado na literatura acadêmica. Dessa forma, o Capítulo III se concentra única e exclusivamente nessa forma de promoção habitacional, diferenciada no contexto das políticas de habitação. Capítulo III ____________________________________________________________________ 85 Este capítulo tem como principal objetivo a realização de uma pesquisa exploratória em torno do objeto PAR. Nele, se discutem as características operacionais desse programa, bem como as características locacionais, tipológicas e construtivas da sua produção, a fim de, compreendendo-se sua natureza, avaliarem-se suas particularidades e avaliar-se também se ele realmente constitui uma alternativa viável no cenário das políticas públicas brasileiras. Para isso, foram realizadas, de forma integrada, duas técnicas de pesquisa: a pesquisa documental e a pesquisa bibliográfica. A primeira diz respeito à análise dos dados primários, coletados a partir das informações contidas na legislação que rege o programa e dos documentos disponibilizados pela CAIXA (normativos, editais, tabelas quantitativas, projetos arquitetônicos, sites, etc.) e pela empresa administradora dos conjuntos do PAR na cidade de João Pessoa (contratos, tabelas quantitativas, etc.). Esses dados possibilitaram a compreensão das principais características do programa e, com base neles, descreve-se, em sua complexidade, a ideologia do PAR e a forma de atuação dos diversos agentes envolvidos (CAIXA, governos estaduais e municipais, empresas construtoras, administradoras e arrendatários), como também se descrevem as características operacionais do programa, tipológicas, construtivas e de implantação, no espaço urbano, das habitações financiadas, relacionando- se os dados apresentados às informações contidas nos capítulos anteriores. Os dados numéricos disponibilizados pela CAIXA também possibilitaram traçar- se um perfil quantitativo do programa, ou seja, eles se constituem num panorama do desenvolvimento do PAR no país. Analisa-se a quantidade de recursos alocados, a quantidade de unidades produzidas, a produção em cada região do território brasileiro, entre outros dados. Para complementar a coleta desses dados que compõem a pesquisa documental, buscou-se, ainda, obter informações, por meio de entrevistas informais, com alguns agentes participantes do processo de produção do PAR. A pesquisa bibliográfica, que consistiu em um levantamento dos projetos do PAR, teve a finalidade de ilustrar as particularidades dessa produção e como ela vem se manifestando qualitativamente – características tipológicas e de implantação no espaço urbano – nas diferentes regiões brasileiras. Partiu-se de variadas fontes, como revistas de arquitetura, artigos publicados em congressos e publicações do governo, de modo que só foi possível considerar três regiões – Sul, Sudeste e Nordeste45. Em suma, neste capítulo, traçam-se as particularidades e as características gerais da forma de atuação do PAR. 45 As regiões Norte e Centro-Oeste não foram discriminadas, pois não foi encontrado material bibliográfico a respeito da produção do PAR nessas regiões, exceto na internet, que não fornecia dados suficientes para uma melhor análise. Capítulo III ____________________________________________________________________ 86 3.1 COMPREENDENDO O PAR Relembrando o capítulo anterior, depois do fechamento do BNH, muitos programas habitacionais foram extintos e outros tantos foram criados, tanto na esfera federal quanto nas esferas estadual e municipal. Surgiram programas de formatos diversificados, ou seja, diferentes alternativas de acesso à moradia: alguns programas tiveram por base o sistema de mutirão; outros, em particular os municipais, tiveram por base a locação (geralmente de caráter provisório, enquanto se buscavam alternativas para problemas emergenciais). Foram também criados os sistemas de condomínios fechados, financiados para pessoas organizadas em grupos (por exemplo, o Programa Habitacional Solidário, no nível estadual, do qual se tratará no próximo capítulo) e, mais recentemente, o leasing habitacional. Apesar de consistirem em diferentes alternativas, quase sempre esses programas seguiram uma linha tradicional e conservadora, pois continuaram disseminando a ideologia da casa própria. Nesse mesmo sentido, o leasing habitacional é um programa de iniciativa do governo federal, chamado de Programa de Arrendamento Residencial, que produz conjuntos habitacionais de melhor padrão construtivo para a classe de renda média baixa46, cujas unidades são arrendadas por um período de 15 anos. Portanto, constitui-se em uma diferente alternativa de acesso à moradia – o arrendamento residencial –, mas, conforme foi citado acima, utiliza uma ideologia da casa própria como meta final, além da particularidade do emprego do termo “aluguel” na divulgação do financiamento, como será observado posteriormente. Basicamente, as diretrizes do programa são (PORTARIA n. 231, 2004): a) fomento de oferta de unidades habitacionais e à melhoria das condições do estoque de imóveis existentes […], especialmente destinadas a reduzir os domicílios existentes com coabitação familiar e com ônus excessivo de aluguel; b) promoção da melhoria da qualidade de vida das famílias beneficiadas; c) intervenção habitacional em áreas objeto de planos diretores no âmbito estadual ou municipal, garantindo sustentabilidade social, econômica e ambiental aos projetos de maneira integrada a outras intervenções ou programas da União e demais esferas de governo; d) criação de novos postos de trabalho diretos e indiretos, especialmente por meio da cadeia produtiva da construção civil; 46 Em 2006, o PAR atendia um público cuja renda familiar mensal não ultrapassava R$ 2.800,00 reais. Como o salário mínimo era de R$ 350,00 reais, o público-alvo do PAR são famílias que recebem até oito salários mínimos, portanto, podendo-se considerar como classe de renda média baixa. (normativo da CAIXA–PAR, 2006). Capítulo III ____________________________________________________________________ 87 e) aproveitamento de imóveis públicos ociosos em áreas de interesse habitacional; e f) atendimento aos idosos ou portadores de deficiências físicas, previamente identificadas, pela adoção de projetos ou soluções técnicas que eliminem barreiras arquitetônicas ou urbanísticas, bem como pela execução de equipamentos comunitários voltados ao atendimento desse segmento da população. Antes de se iniciar uma discussão mais aprofundada sobre o PAR, faz-se necessário traçar um breve perfil histórico desse programa, com base na legislação a ele referente, uma vez que a pesquisa documental é o fio condutor deste capítulo47. Assim sendo, o PAR foi criado pela Medida Provisória n. 1.823, de 29 de abril de 1999, no âmbito da Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano (SEDU) da Presidência da República. Essa medida provisória foi reeditada 24 vezes entre 1999 e 2001, antes de ser transformada em lei – Lei Ordinária n. 10.188, de 12 de fevereiro de 2001. Entre a primeira Medida Provisória e a primeira Lei Ordinária, todavia, pouca coisa mudou: acrescentou-se um parágrafo ao artigo 3º, enquanto outros artigos sofreram pequenas correções, com o acréscimo de algumas palavras. Com a mudança da gestão governamental, a partir de 2003, com o governo Lula, o Programa de Arrendamento Residencial, assim como outros programas habitacionais, sofreu algumas alterações para se adequar ao mais recente cenário político do país (Quadro 7). Surgiu, então, nova legislação para o PAR, constituída por um conjunto de leis, decretos e portarias, além dos já existentes normativos da CAIXA, que sofreram revisões. Esses normativos visam à regulamentação das características e das normas de execução do financiamento, definindo, por exemplo, a implantação dos conjuntos no espaço urbano, as características tipológicas e construtivas das habitações, dentre outras. Com as alterações, no primeiro mandato do presidente Lula, em 2004, o recém- criado Ministério das Cidades tornou-se o agente gestor e assumiu as funções da Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano. A CAIXA, que acumulava a função de agente gestor, passou a se constituir, em 2004, o agente executor e o agente gestor, respectivamente, para fins de executar o programa e gerir o Fundo de Arrendamento Residencial. Ainda em 2004, as principais mudanças foram: a possibilidade da substituição do valor da taxa de arrendamento48 por, no máximo, 80% da média do valor de locação cobrado no mercado, na localidade em que o empreendimento é implantado; a legalização 47 Utilizou-se aqui a legislação referente ao PAR indicada no site da CAIXA e do Ministério das Cidades. No entanto, há ainda as resoluções do Conselho Curador do FGTS e os documentos expedidos pela CAIXA, chamados de normativos. Os normativos pesquisados foram os mais recentes, do ano de 2006. 48 O valor da taxa de arrendamento pode ser 0,7% ou 0,5% do custo da unidade habitacional. Capítulo III ____________________________________________________________________ 88 da participação de associações com fins habitacionais, como as COHABs (além das construtoras, na construção dos conjuntos), a legalização da opção da mobilidade residencial, ou seja, a possibilidade de o arrendatário mudar de uma unidade do PAR para outra sem perder o financiamento nem o que já tenha pago; a ampliação do atendimento à população de renda mais baixa e a possibilidade de antecipação da opção de compra. A ampliação do atendimento à população de menores rendas se desenvolveu, inicialmente, possibilitando a redução da taxa de arrendamento de 0,7% para 0,5% do valor de aquisição das unidades, contanto que estas apresentassem a especificação técnica mínima49 e fossem destinadas ao atendimento da população cuja renda familiar mensal fosse inferior a quatro salários mínimos (entre 2 e 4 sm)50. Depois, em prol da ampliação no atendimento à população de menores rendas, em 2005, em termos legais, o programa deveria reservar 50% dos recursos alocados, especificamente, ao atendimento daquele mesmo público-alvo: a população de até quatro salários mínimos. Uma outra mudança foi a possibilidade de antecipação da opção de compra, que, embora instituída legalmente, ainda não foi operacionalizada, devido às dificuldades de se implantar, além de ser pouco conhecida, inclusive entre alguns técnicos da CAIXA, conforme se verificou nas entrevistas. No âmbito das mudanças introduzidas no programa pelo governo Lula, é importante mencionar também a regionalização dos valores das unidades. As várias regiões brasileiras diferem quanto à renda, custo de produção e preço dos terrenos, portanto merecem tratamentos diferentes. Sendo assim, o Ministério das Cidades definiu, em 2005, as especificações mínimas e os valores máximos para as unidades habitacionais em função da sua localização no país. Essa preocupação vai de encontro ao modelo implantado pelo Estado desenvolvimentista, que, como já foi visto no Capítulo I, “difundia um tipo de intervenção universal para a população de mais baixa renda”. Por fim, com base nessas legislações e nos normativos do PAR, trata-se, a seguir, de compreender todas as vertentes do programa, desde a forma de funcionamento até as características tipológicas, construtivas e de localização dos conjuntos financiados no espaço urbano. 49 As especificações técnicas mínimas correspondem a um conjunto de recomendações a respeito de materiais de construção mais baratos para a produção de unidades habitacionais com menor custo, porém sem deixar de proporcionar o mínimo de habitabilidade. Segundo o normativo da CAIXA (2006, p.9), a especificação mínima regionalizada “é uma redução padronizada da especificação normal do Programa, contemplando peculiaridades regionais, visando à redução do custo da produção”. 50 Geralmente a taxa de arrendamento corresponde a 0,7% do valor de aquisição da habitação, atendendo famílias de até oito salários mínimos (entre 3 e 8 sm). Capítulo III ____________________________________________________________________ 89 QUADRO 7 Principais transformações legislativas do PAR ao longo do seu desenvolvimento Governo Legislação Mês/Ano Mudanças (as de vermelho são as mais relevantes) Medida PV n. 1.823 04/1999 Criou o programa acrescentou o 6º. Parágrafo no inciso II do Art. 3º., que trata de imóveis tombados pelo poder público e a possibilidade da CAIXA adquirir os direitos de posse para o PAR FHC Lei n. 10.188 02/2001 introduziu pequenas alterações na redação da legislação alterou a Lei n. 10.188 aumentou o limite de crédito pelo FGTS Decreto n. 4.918 12/2003 aumentou o valor de aquisição de imóveis para atendimento aos objetivos do PAR reajustou o crédito pelo FGTS. Os recursos do FGTS passaram a ser estabelecidas pelo Conselho Curador aumentou o limite de aquisição de imóveis para atendimento aos objetivos do PAR Portaria interminister. n. 109 05/2004 estabeleceu a remuneração da CAIXA alterou especialmente a Lei n. 10.188 determinou que a CAIXA passasse de agente gestor para executor; a gestão do programa é de responsabilidade do Ministério das Cidades. No entanto, a gestão do fundo permanece sob a responsabilidade da CAIXA estabeleceu as atribuições do Ministério das Cidades estabeleceu quem determina a remuneração da CAIXA acrescentou o 8º parágrafo no Artigo 2º da lei n. 10.188, em que regulamentou que o FAR será gerido pela CAIXA. determinou o limite dos recursos do FGTS sendo disciplinado pelo Conselho Curador e o limite sendo fixado pelo poder Executivo. determinou o valor de aquisição dos imóveis também sendo fixado pelo poder Executivo autorizou a CAIXA a receber outros recursos, além daqueles já pré- definidos na primeira lei. revogou o Art. 7º da Lei n. 10.188. Lei n. 10.859 04/2004 introduziu algumas revisões na redação fixou as diretrizes do PAR ampliou o atendimento ao público-alvo reduzindo a taxa de arrendamento de 0,7% (PAR 1) para 0,5% do valor de aquisição (PAR 2) para os projetos com especificação técnica mínima legalizou a opção de mobilidade residencial nas habitações do PAR, guardada novo recálculo das taxas, embora já existisse no normativo da CAIXA essa possibilidade fixou a taxa de arrendamento como sendo no máximo 80% do valor de locação da localidade, ao invés do valor da taxa de arrendamento ser 0,7% ou 0,5% possibilitou a participação de associações com fins habitacionais na produção do PAR, como as COHABs Portaria n. 231 05/2004 criou a antecipação da opção de compra, mediante pagamento do valor residual alterou especialmente a Portaria n. 231 criou mecanismos para facilitar o atendimento à população de mais baixa renda, prevendo que 50% dos recursos alocados destinar-se- ão àquela população, cuja renda familiar mensal fosse de até quatro salários mínimos. instituiu a regionalização dos valores das unidades. O valor máximo das habitações dependerá da região estabeleceu de que maneira a avaliação das habitações será realizada Lula Portaria n. 142 03/2005 identificou quais elementos compõem o custo do investimento Fonte: Legislações do PAR Nota: Elaboração da autora Capítulo III ____________________________________________________________________ 90 3.1.1 IDEOLOGIA DA CASA PRÓPRIA OU DE ALUGUEL? De acordo com a Medida Provisória n. 1.823 (1999), o PAR foi criado com o seguinte objetivo: “para atendimento exclusivo da necessidade de moradia da população de baixa renda, sob a forma de arrendamento residencial com opção de compra”. O artigo 6º dessa Medida considerava o arrendamento residencial “a operação realizada no âmbito do Programa […], que tenha por objeto o arrendamento com opção de compra de bens imóveis adquiridos para esse fim específico”. Na legislação atual, o objetivo principal ainda persiste, sendo o PAR um tipo de financiamento habitacional que visa a: Atender, sob a forma de arrendamento residencial, à necessidade de moradia da população de baixa renda, concentrada nas capitais e regiões metropolitanas definidas para o Programa e, nos municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes, com opção de compra ao final do prazo contratado, por meio da aquisição de unidades habitacionais a serem construídas, em construção, concluídas ou em reforma e recuperação de empreendimentos (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.7). Porém, de forma mais específica, o termo “arrendamento residencial” é definido pelo normativo da CAIXA-PAR (2006, p.9) como uma “operação habitacional com opção de compra futura, mediante pagamento de taxas mensais, destinadas exclusivamente a pessoas físicas para fins residenciais”. Esse “arrendamento residencial” corresponde, na prática, ao que se chama de arrendamento mercantil, a cuja legislação o PAR está vinculado, desde a primeira Medida Provisória. De acordo com Carlos Samanez (1990), o arrendamento mercantil, ou simplesmente leasing51, foi introduzido no Brasil na década de 1960, porém regulamentado por lei apenas em 1974 (Lei n. 6.099, de 12-09-74). A palavra “arrendamento”, todavia, vem sendo empregada há muito tempo e durante longo período esteve associada à zona rural, significando exclusivamente o “ato de alugar uma terra”. O IBGE, por exemplo, na década de 1970, definia o arrendamento como “o aluguel da terra por uma quantia fixa, que deve ser paga em dinheiro ou em quota-parte da produção ou, simultaneamente, em dinheiro e produto” (IBGE, apud GROSSMANN, 1981, p.12). Não obstante, hoje o entendimento geral do termo “arrendamento mercantil”, ou “leasing”, é o mesmo definido por Samanez como (1990, p.13-14): […] um acordo cujo fim é a concessão do uso de bens de capital, ou de qualquer outro componente do ativo fixo de uma empresa, através de contrato de arrendamento, por um prazo determinado, findo o qual poderá o arrendatário optar entre a devolução do bem objeto de contrato, a renovação do arrendamento ou a sua aquisição pelo valor residual estabelecido no contrato (grifo acrescido). 51 A palavra leasing deriva do verbo inglês (to lease) e significa “locar” ou “alugar”. Capítulo III ____________________________________________________________________ 91 A concessão do uso do bem pelo arrendatário é permitida mediante pagamento de prestações periódicas, ou aluguéis, para o arrendador, cujo bem arrendado permanece sob a sua propriedade. Essas prestações serão consideradas, no final do contrato (como uma amortização), caso o arrendatário opte por comprar o bem. Além das amortizações, há, ainda, o valor residual, para a integralização do valor do objeto arrendado. O leasing, portanto, se diferencia tanto do financiamento convencional quanto da simples locação, como pode ser observado no Quadro 8, formulado a partir das observações de Samanez: QUADRO 8 Diferenças do leasing para o financiamento convencional e a locação Formas de uso Características do leasing que se diferenciam do financiamento convencional e da locação Financiamento convencional “durante o período de arrendamento a propriedade do bem é da arrendante, enquanto a posse é da arrendatária”. Já no financiamento convencional a propriedade do imóvel é do mutuário. “a operação proporciona vantagens fiscais à arrendatária, uma vez que esta pode deduzir como despesa a totalidade das contraprestações, nestas incluídas principal e juros”. Locação “não ser a contraprestação de arrendamento mero aluguel, mas incluir a amortização do bem”. “serem os bens adquiridos pelo arrendador para atender especificamente à intenção do arrendatário”. “permitir ao arrendador recuperar num único contrato o valor investido”. Fonte: SAMANEZ (1990, p.17) As características do leasing acima listadas são incorporadas no PAR, motivo pelo qual ele é assim considerado por Sérgio de Azevedo (2000) e Márcio Valença (2001): O Programa de Arrendamento Residencial (PAR) é na verdade um leasing (de 15 anos), forma jurídica que garante, em caso de inadimplência, que o imóvel seja retomado mais agilmente e sem grandes despesas para o erário público (VALENÇA, 2001, p.40). Leasing ou arrendamento, o fato é que o programa dissemina tanto a noção de uma ideologia da casa própria quanto uma ideologia de locação, já que o termo “arrendamento” foi associado ao termo “aluguel” durante um bom tempo. A retórica do aluguel é utilizada apenas quando a CAIXA difunde a idéia de que a prestação equivale a um aluguel, cujo valor é abaixo do valor de mercado, conforme as citações abaixo, retiradas de cartilhas explicativas distribuídas pela própria agência financeira aos interessados no programa (Figura 7)52: O PAR é um programa de arrendamento residencial. Trata-se de um plano no qual você paga taxas mensais de arrendamento, como se fosse um 52 As cartilhas foram coletadas nas agências da CAIXA em 2003. Capítulo III ____________________________________________________________________ 92 aluguel e no fim do contrato, que é de 15 anos, se torna proprietário do imóvel (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, grifo acrescido). É um contrato, onde o imóvel é cedido ao arrendatário, por tempo determinado (15 anos) com mensalidades de 30% a 50% abaixo do valor de mercado (CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, grifo acrescido). Figura 7: Cartilhas distribuídas pela CAIXA para explicar à população de uma forma mais simples o funcionamento do programa Fonte: Cartilha explicativa do programa, (s.d). Uma das características do aluguel é a possibilidade de oferecer uma maior mobilidade residencial, como foi citado no Capítulo I. Essa possibilidade foi incorporada legalmente ao PAR, em 2004, tornando-o mais flexível53. O arrendatário pode mudar de um imóvel do PAR para outro, apenas recalculando-se as taxas, mas considerando-se o que ele já havia pago até então. É evidente que essa não é uma alternativa fácil de conseguir, sendo necessária a disponibilidade de outros imóveis vazios, a expressa concordância da CAIXA, a adimplência do arrendatário, além de avaliar-se também o estado de conservação do imóvel pelo usuário, e, sobretudo, que as justificativas sejam coesas, o que garante que as famílias não mudem de imóvel por qualquer motivo (briga com vizinhos, construção de novos empreendimentos, por exemplo). A CAIXA alega que as principais razões para se conceder a continuidade do arrendamento residencial em outro imóvel são a transferência do arrendatário para outra cidade ou problemas de saúde que requerem a mudança (exemplo: a impossibilidade de subir escadas, em virtude de algum problema de saúde ou acidente). Em suma, a mobilidade residencial, uma das prerrogativas da política de aluguel, configura também no PAR uma vantagem para o arrendatário. 53 A Portaria n. 231 (04-2004), dentre outras determinações, legalizou a opção de mobilidade residencial nas habitações do PAR. Não obstante, essa possibilidade da mobilidade já era contemplada contratualmente e em normativos da CAIXA-PAR (2002). Capítulo III ____________________________________________________________________ 93 Outra característica do PAR que assegura a flexibilidade do programa é a facilidade de desistência do imóvel a qualquer momento. Como o arrendatário não é o proprietário, para desistir do imóvel basta ele comunicar sua saída, com no mínimo um mês de antecedência, e estar em dia com suas obrigações contratuais, não precisando passar por todo o processo burocrático de vender a “chave”. As obrigações contratuais são: o imóvel estar conservado e em perfeitas condições de habitabilidade, salvo desgaste natural, e a adimplência de todas as taxas de arrendamento, de condomínio, IPTU, energia elétrica, água e limpeza urbana (algumas das obrigações necessárias para ser favorecido com a mobilidade residencial). Como não se passa pelo processo de vender a “chave”, em caso de desistência, o arrendatário não é ressarcido, pois o valor pago como arrendamento é considerado uma “taxa de ocupação”, ou seja, um aluguel. Desse modo, o procedimento de desistência do PAR é, inclusive, mais simplificado que o próprio sistema de aluguel, uma vez que o inquilino está preso a um contrato e, caso queira desistir antes do tempo contratado, geralmente é obrigado a pagar multas por rescisão contratual. Essas duas características – mobilidade residencial e facilidade de desistência – asseguram uma maior flexibilidade ao PAR para com os arrendatários, comparando-se com o financiamento convencional. Entretanto, essas facilidades não fazem do PAR um programa de aluguel. Elas são apenas elementos criados para diminuir a burocracia inerente a esse tipo de transação e, principalmente, para diminuir os índices de inadimplência, já que o arrendatário não é o proprietário do imóvel. Ratificando esse raciocínio, em 2000, um ano após a criação do programa, Azevedo (2000, p.22) afirmava: […], o objetivo real do Programa de Arrendamento Residencial, PAR, recentemente aprovado, é muito mais uma forma de enfrentar a inadimplência, através da rápida retomada dos imóveis, do que uma opção de aluguel a “baixo custo”. A outra ideologia disseminada pelo PAR é a da casa própria, pois se propaga aos interessados a possibilidade de eles se tornarem proprietários no final do prazo contratado de 180 meses (15 anos)54. Conforme foi discutido no primeiro capítulo, a difusão da política da casa própria traz consigo valores sociais, como status social e segurança econômica, os quais podem ser assimilados pelos arrendatários do PAR. Apesar de eles não serem proprietários, têm uma “sensação de segurança” afirmada por um contrato de 54 Com relação ao tempo de financiamento, alguns programas habitacionais apresentam tempo de contrato muito maiores que o PAR, como o Carta de Crédito (FGTS) que oferece até 360 meses (30 anos). Usualmente, o financiamento é de 240 meses (20 anos), como foi com muitos contratos da época do BNH. É bem verdade que o maior tempo de financiamento também está vinculado ao valor do imóvel. Por exemplo: os imóveis do Carta de Crédito são mais caros, portanto, são passíveis de ter maior tempo de contrato. Capítulo III ____________________________________________________________________ 94 arrendamento de validade de 15 anos, o qual será mantido se os arrendatários pagarem as taxas obrigatórias em dia e obedecerem às cláusulas contratuais. No entanto, contrariamente ao que ocorre num programa da casa própria, durante a vigência do contrato o PAR nega aos arrendatários a possibilidade de serem proprietários da sua própria casa, pois os imóveis são de propriedade fiduciária da CAIXA (que é considerada a arrendadora), enquanto não forem quitados. Por esse motivo, não é permitido aos arrendatários modificarem o projeto, salvo prévia anuência da arrendadora. Mesmo assim, quando o arrendatário realiza qualquer benfeitoria, ele, sozinho, arca com as despesas e, caso desista do contrato, não receberá de volta o dinheiro investido. Além disso, por se tratar de propriedade da CAIXA, são realizadas vistorias periódicas nos imóveis (pela empresa administradora), a fim de verificar seu estado de conservação e manutenção. Como pode ser observado na Figura 8, efetivamente a CAIXA divulga ser a proprietária e não permite que os arrendatários aluguem o imóvel ou transfiram seu uso para terceiros, sob a penalidade de rescisão contratual. Para manter essa exigência do contrato, as vistorias averiguam também se os arrendatários estão morando no imóvel, submetendo- os a vigilância constante, procedimento que contribui para o fortalecimento da idéia de que o imóvel é da CAIXA. Os arrendatários, todavia, apesar de saberem que não são os proprietários do bem, nutrem o desejo de um dia virem a ser, como foi observado em entrevista feita com alguns deles, cujos resultados estão expostos no Capítulo V. O fato dos arrendatários não constituírem os proprietários nega uma outra prerrogativa da casa própria, a possibilidade que ele teria de transformar o valor de uso da sua casa em valor de troca e, assim, gerar um investimento sobre ela. Figura 8: Placa fixada no edifício do Residencial Ribeira I e Ribeira II na cidade do Natal-RN Fonte: Acervo da autora (2006) Capítulo III ____________________________________________________________________ 95 A expectativa de ser proprietário do imóvel enfrenta um problema por parte dos arrendatários, que é a incerteza do que acontecerá no final dos 15 anos – se realmente terão a opção de se tornarem proprietários, motivo pelo qual se fez referência acima a uma “sensação de segurança” de ter uma moradia, e não a uma segurança efetiva, pois o imóvel não é dos moradores. Findo o contrato, o arrendatário pode optar pela compra do imóvel, pela devolução sem ressarcimento ou, ainda, pela renovação do contrato de arrendamento. Caso opte pela compra da habitação, ele enfrentará uma de três possibilidades, as quais, de acordo com a entrevista realizada na GILIE-CAIXA55, e o contrato de arrendamento (2006), são: x Valor atual do imóvel56 = Saldo pago pelos arrendatários ao longo do contrato: caso seja essa a situação, o arrendatário poderá optar por ser proprietário da unidade habitacional, bastando pagar a escritura (conforme o contrato). x Valor atual do imóvel < Saldo: nesse caso, os arrendatários pagaram, ao longo do tempo, mais do que o valor atualizado do imóvel e, por isso, também podem optar por serem proprietários, porém não recebem de volta o valor adicional que pagaram, o qual é direcionado para o FAR; x Valor atual do imóvel > Saldo que os arrendatários já pagaram = Saldo Residual: após os 15 anos, os arrendatários ainda têm o saldo residual, que deverá ser pago em parcelas mensais, caso eles optem pela compra da unidade. O valor das parcelas será, no mínimo, o valor da última taxa de arrendamento, a ser pago em até três anos (de acordo com o contrato). O valor residual é, de acordo com o normativo da CAIXA-PAR (2006, p.34), “a diferença entre o valor de arrendamento do imóvel atualizado e o somatório dos valores das taxas de arrendamento devidamente reajustadas”. A existência desse suposto valor residual está, inclusive, assegurada em termos contratuais no parágrafo 2º da cláusula 16ª (contrato do PAR, 2006, grifo acrescido): “Para o exercício da opção de compra do bem, será exigido dos ARRENDATÁRIOS, após vencido o prazo de arrendamento com o integral cumprimento das obrigações ora assumidas, o pagamento do valor residual devido, se houver, devidamente atualizado”. O parágrafo 3º dessa cláusula 16ª afirma: O valor residual de que trata esta cláusula, será pago em parcela única pelos ARRENDATÁRIOS, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, e equivalerá à diferença entre o valor atualizado, na forma deste contrato, do bem arrendado e o somatório das taxas de arrendamento atualizadas 55 Entrevista na CAIXA da Paraíba, na secção GILIE (Gerência de Filial de Alienar Bens Móveis e Imóveis), no dia 30 de maio de 2006. Entrevistou-se simultaneamente um analista do PAR (Cláudio) e o Gerente da GILIE-CAIXA, Clóvis Silva Madruga Júnior (modelo da entrevista em Anexo A). 56 O valor atual do imóvel é o seu valor corrigido (reajustado) no final dos 15 anos de contrato. Capítulo III ____________________________________________________________________ 96 contratualmente efetivamente pagas durante a vigência do contrato, que nestas condições e a partir da formalização da opção de compra, passará a compor o preço de aquisição do bem. A existência ou não de um valor residual, no final do contrato de arrendamento, é assunto de incerteza entre os arrendatários e até mesmo entre os técnicos da CAIXA. Buscando uma resposta para essa questão, foram feitas várias simulações considerando-se as informações contidas no contrato. Para essas simulações, faz-se necessário inicialmente compreender os parâmetros utilizados para reajustar o valor do imóvel (valorização do imóvel) e aqueles utilizados para reajustar o valor da taxa de arrendamento. Dessa forma, de acordo com o contrato (2006), o reajuste do valor do imóvel, ou seja, o valor atual do imóvel, é calculado anualmente, mediante a aplicação de 80% do índice de atualização aplicado às contas vinculadas do FGTS (isto é, a Taxa de Referência – TR), acumulado nos últimos 12 meses, ou o índice que vier a substituí-lo (contrato da CAIXA, 2006, p.1). De modo semelhante, a taxa de arrendamento é reajustada anualmente mediante a aplicação do índice de atualização aplicado às contas vinculadas do FGTS (TR) acumulado nos últimos 12 meses ou o índice que vier a substituí-lo (contrato da CAIXA, 2006, p.1). Verifica- se, portanto, que os reajustes oscilam em função do cenário econômico nacional, com destaque para o controle da inflação (através da atualização monetária da TR), a depender também do cenário internacional. Para efeito das simulações supracitadas, é importante mencionar que, de 1999 a 2006, a TR variou entre 1,8184% (mínimo) e 5,7295% (máximo) ao ano; a média desse mesmo período foi de 3,03%, índice considerado como parâmetro nesse estudo. Além disso, utilizou-se como exemplo o valor do imóvel do Residencial Vista Bela (R$ 22.500,00 reais), localizado na cidade de João Pessoa, por ter sido construído após a criação do PAR 2 (0,5%), podendo voltar-se também para o PAR 1 (0,7%)57. Por fim, elaboraram-se quatro estudos com cenários econômicos hipotéticos diferentes, quais sejam: x Cenário 1: O valor da TR (3,03%) é fixa ao longo dos 15 anos de contrato; x Cenário 2: O valor da TR (3,03%) decresce uniformemente (0,1% ao ano), ao longo do tempo contratual; x Cenário 3: O valor da TR (3,03%) cresce uniformemente (0,1% ao ano), ao longo do tempo contratual; 57 O PAR 1 e o PAR 2 são dois grupos que contam com taxa de arrendamento e público beneficiado diferenciados para cada caso. O PAR 2, por exemplo, corresponde à taxa de arrendamento sendo igual a 0,5% do valor de aquisição do imóvel e volta-se para a população de até 4 sm. Já o PAR 1 tem a taxa de arrendamento sendo igual a 0,7% do valor de aquisição do imóvel e volta-se para população de maior renda (entre 3 e 8sm). Essa divisão será melhor explicada no item Os agentes participantes deste capítulo. Capítulo III ____________________________________________________________________ 97 x Cenário 4: O valor da TR (3,03%) cresce uniformemente (0,3% ao ano), ao longo do tempo contratual. Diante desses cenários, tem-se os resultados apresentados na Tabela 2 TABELA 2 Simulações da possibilidade de saldo residual, após o fim do contrato de 15 anos58 Considerando-se a taxa de arrendamento igual a 0,7% (PAR 1) do valor do imóvel Considerando-se a taxa de arrendamento igual a 0,5% (PAR 2) do valor do imóvel Condições ou cenários econômicos para a taxa de arrendamento Valor atual do imóvel (final dos 15 anos) Somatório das taxas de arrendamento pelo tempo contratado Saldo Residual Somatório das taxas de arrendamento pelo tempo contratado Saldo Residual Cenário 1 31.463,48 35.229,35 +3.765,87 25.163,82 -6.299,66 Cenário 2 28.777,34 34.096,24 +5.318,90 24.354,46 -4.422,88 Cenário 3 34.373,51 36.422,75 +2.049,24 26.016,25 -8.357,26 Cenário 4 40.932,37 39.004,00 -1.928,37 27.860,00 -13.072,37 Nota: Elaboração da autora Considerando-se as várias possibilidades identificadas na tabela acima, verifica- se que, para o PAR 2, sempre há um saldo residual a pagar, que pode ser maior ou menor, a depender do cenário econômico, representado pela TR. Para o PAR 1 há cenários com e sem saldo residual. Os três primeiros cenários do PAR 1 sugerem que o arrendatário tenha pago mais do que o valor atual do imóvel; no entanto essa diferença não será restituída, sendo considerada como uma taxa paga pela ocupação do imóvel e sendo direcionada para o FAR. Outro fato importante a se destacar em relação ao PAR 1 é que, no Cenário 4, quanto maior for o crescimento da TR (acima de 0,3%) ao longo dos anos, maior será o saldo residual. Sintetizando, os arrendatários do PAR 2 correm um risco maior (quase certeza) de se surpreenderem com um resíduo no final do prazo contratado do que os arrendatários do PAR 1. Assim, a população de renda mais baixa (até quatro salários mínimos), que mais sofre com a falta de financiamento, pois necessita de subsídios, vai ser a mais prejudicada no Programa de Arrendamento Residencial, a não ser que, por meio de uma intervenção política, esse saldo residual seja convertido em um grande subsídio, o que apontaria a vertente realmente social no programa. Além da reduzida capacidade de pagamento da população do PAR 2, a situação pode complicar quando se relembra que, em 2005, o governo de Lula, através da Portaria n. 58 Nos estudos hipotéticos não se considerou o percentual retirado da taxa de arrendamento referente às despesas com a administradora. Capítulo III ____________________________________________________________________ 98 142, reservou 50% dos recursos alocados pelo programa para a população de até quatro salários mínimos, a qual fatalmente pagará 0,5% do valor de aquisição das unidades e, como já foi mencionado, sofrerá com o saldo residual. Diante do exposto, pode-se dizer que, no final do prazo contratado, se o cenário se projetar de acordo com o maior percentual das simulações (existência de um resíduo), o programa vai enfrentar uma série de dificuldades, destacando-se, em especial, a inadimplência. Os arrendatários, por seu turno, ficarão insatisfeitos e decepcionados face à desilusão de ainda terem de pagar um valor que muitos nem cogitavam existir, não correspondendo ao sonho da casa própria, alimentado ao longo de 15 anos de contrato. Prevendo a ocorrência de tais problemas e visando a evitá-los, o programa vem se reestruturando: formulando legislações em que se insere a possibilidade de se transformar, após cinco anos, o arrendamento em financiamento. No entanto, César Ramos59 justificou essa transformação com base na questão da baixa liquidez do sistema, de modo que essa seria uma forma de recuperar essa liquidez. Não obstante, é importante mencionar o fato de que a Portaria n. 231, de 04 de junho de 2004, prevê a antecipação da opção de compra mediante pagamento do valor residual, conforme o texto abaixo: 7.2 O arrendatário poderá antecipar o exercício da opção de compra mediante pagamento do valor residual do imóvel 7.2.1 A CEF deverá providenciar estudos econômicos e financeiros, em prazo máximo de cento e vinte dias, visando definir, entre outros aspectos, as fontes de recursos que poderão ser utilizadas pelo arrendatário, o valor residual do imóvel, bem como o prazo contratual decorrido para que o arrendatário possa exercer a prerrogativa estabelecida no subitem 7.2 deste Anexo. Contudo, essa opção ainda não foi operacionalizada e é pouco conhecida entre os participantes. Possivelmente, a antecipação não foi utilizada ainda em razão da dificuldade de se estipular o valor atualizado do imóvel, pois este depende da TR, que, por sua vez, é uma variável difícil de estabelecer, pois está vinculada à conjuntura econômica. Essas constatações nos levam a crer que o PAR, como uma política da casa própria, transforma os arrendatários em um “bastião da estabilidade social”, enquanto estiverem pagando as taxas de arrendamento, o que pode perdurar por 15 anos ou até mais, a depender do saldo residual e das interferências políticas, conforme ilustrado acima. Isso significa que atende aos interesses capitalistas. Por outro lado, os interesses dos trabalhadores não são totalmente atendidos com o PAR. Como foi comentado no Capítulo I, 59 Entrevista semi-estruturada realizada com César Ramos, gerente de Projetos do Ministério das Cidades, no I Seminário Internacional das Cooperativas Habitacionais, realizado no Hotel Blue Tree Park, em Natal-RN, entre os dias 28-02-07 e 01-03-07. A entrevista ocorreu no segundo dia do evento. Capítulo III ____________________________________________________________________ 99 uma política da casa própria responde à reivindicação de uma moradia, por parte dos trabalhadores, proporciona a estes a segurança de ter essa moradia e a possibilidade de investir nela. No caso do PAR, os arrendatários adquirem a cessão de uso da moradia, têm uma “sensação de segurança” – como a propriedade da casa não é deles, fica apenas uma “sensação” –; e nenhuma possibilidade de transformar a moradia em um investimento, pelo menos enquanto não concretizarem a opção de compra. Ou seja, o programa tem uma ideologia da casa própria, mas que atende preferencialmente aos interesses do agente financeiro, dotando-o de elementos que garantem a ele a eficácia e o melhor desempenho, em contraposição aos anseios da população de ter uma propriedade. Em resumo, o PAR é uma forma diferente de financiamento da casa própria, em que o morador não é o proprietário, como acontece com os financiamentos convencionais, embora haja a possibilidade de a propriedade privada efetivar-se no fim do tempo contratual estabelecido. Essa contradição – ideologia da casa própria, sem a casa ser própria – é o que diferencia esse programa dos demais, no contexto da política habitacional, por isso, foi destacado no título desta dissertação. O termo “diferente” é empregado pelos seguintes motivos: o PAR apresenta algumas práticas e ideologias que compõem a política da propriedade privada, somadas às poucas vantagens da política de aluguel. Essas vantagens são a mobilidade residencial e a facilidade de desistência, sendo ambas pouco utilizadas no programa. Diante disso, muitos, como a própria CAIXA, acreditam e divulgam que o PAR tem um formato inovador de financiamento habitacional. Essa opinião é também compartilhada por Nirce Medvedovski (2005), que estuda o PAR na cidade de Pelotas-RS. Segundo ela: O Programa de Arrendamento Residencial (PAR) é inovador no país, no sentido de oferecer a opção de compra do imóvel arrendado após um contrato de 15 anos. Essa nova proposta de financiamento de imóvel é vista como uma nova alternativa por grande parte dos brasileiros que sonha com uma casa própria (MEDVEDOVSKI, 2005, p.1). É importante salientar que essa forma de financiamento é comum nos países europeus, especialmente na França. O sistema de opção de compra ao final do prazo contratado foi uma solução também adotada na Inglaterra, quando o país passou pelo processo de intensificação da política neoliberal: os inquilinos das casas alugadas pelo governo obtiveram o Rigth to Buy, ou seja, a opção de compra do imóvel, depois de muitos anos morando de aluguel nessas casas (VALENÇA, 2001). No Brasil, o leasing habitacional também já havia sido experimentado pelo BNH, como forma de incentivar a comercialização das suas unidades, em 1972 e 1983, conforme foi identificado no segundo capítulo. Apesar de se ter constatado o leasing habitacional em uma outra conjuntura no país, aquela do BNH teve pouca repercussão. Portanto, “inovador” e “diferente” são palavras Capítulo III ____________________________________________________________________ 100 apropriadas para caracterizar o PAR, contudo, adotou-se preferencialmente o termo “diferente” ao longo deste trabalho. Diante de tal explanação, conclui-se que o PAR consiste em uma forma distinta de acesso (arrendamento) à moradia no país, que está habituado com uma política que propaga a importância da propriedade da casa. Ademais, essa outra forma de acesso apresenta particularidades que influenciam a forma de produção das habitações, como será discutido posteriormente. Do ponto de vista das operações financeiras, o PAR tem outras tantas peculiaridades, que podem ser vistas como vantagens, pois o diferenciam dos financiamentos convencionais. Assim, a partir da legislação vigente sobre o programa, especialmente o normativo da CAIXA-PAR (2006), e das entrevistas com os agentes envolvidos, foram assinalados os seguintes aspectos operacionais positivos do programa, do ponto de vista do usuário: x financiamento de 100% do valor do imóvel; x financiamento sem entrada; x baixa taxa de arrendamento: 0,7% ou 0,5% do valor de aquisição das unidades habitacionais (o menor valor se refere àquelas habitações construídas com as especificações mínimas e destinadas para população com renda familiar mensal de até quatro salários mínimos); x sem taxa de juros, apenas a correção da taxa de arrendamento igual ao índice de atualização aplicado aos depósitos do FGTS no período de 12 meses, ou seja, apenas a Taxa de Referência – TR. x baixo reajuste do valor do bem arrendado: “será reajustado anualmente, na data de aniversário do contrato, mediante a aplicação de 80% (oitenta por cento) do índice de atualização aplicado às contas vinculadas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, acumulado nos últimos 12 (doze) meses ou o índice que vier a substituí-lo” (contrato do PAR, 2006). x valor das unidades com o padrão estabelecido pelo programa inferior ao valor do que normalmente teriam no mercado imobiliário. Atualmente o valor máximo das habitações é de R$ 40.000,00 em alguns estados, como o Rio de Janeiro e São Paulo. x facilidade de desistência e mobilidade residencial (já comentadas). Além dessas vantagens financeiras, hão de se considerar também as vantagens tipológicas, construtivas e de localização dos conjuntos na malha urbana, as quais proporcionam uma certa qualidade de vida aos moradores. Essas duas vantagens serão debatidas mais adiante. Capítulo III ____________________________________________________________________ 101 As características acima listadas significam que o PAR concede facilidades de crédito para a população comprar sua moradia, tendo, portanto, sua ação voltada para a demanda, como diria Castells (2000). Mas, o programa também atua na oferta, promovendo a construção de novas moradias. Em outras palavras, com o Programa de Arrendamento Residencial, a CAIXA financia inicialmente a construção das moradias que, depois de concluídas, passam a ser sua propriedade, então novamente a CAIXA financia o imóvel junto ao usuário. Dessa forma, o capital que circula no processo de produção do PAR consiste sempre no capital de empréstimo da agência financeira, não entrando o capital de incorporação, nem o capital do construtor (apenas como capital de giro, inicialmente) e nem o capital imobiliário. Até este momento, procurou-se descrever o programa, seguindo-se o ponto de vista do arrendatário. Constatou-se que não há dúvidas de que o PAR oferece algumas vantagens para os trabalhadores de renda média baixa, haja vista as vantagens econômicas descritas, apesar dos interesses subjetivos (referentes à ideologia da casa própria) serem parcialmente atendidos. Resta, agora, compreender quais fatores levaram à criação do PAR, em meio a um cenário de política neoliberal. É curioso, na conjuntura do neoliberalismo, o surgimento de um programa desse formato que exige maiores responsabilidades do poder público federal, uma vez que este (na figura da CAIXA) se torna proprietário das habitações e concede mais benefícios financeiros aos arrendatários. Como foi anteriormente mencionado, essa nova conjuntura estimula o menor envolvimento do Estado nas questões sociais, de modo que o governo federal vem participando da produção habitacional predominantemente através da alocação de recursos públicos, relegando o envolvimento direto da produção para os níveis estadual e municipal. Partindo dessa afirmativa, há uma aparente contradição no surgimento do Programa de Arrendamento Residencial, que é um programa que concede benefícios (facilidades de financiamento, como a baixa taxa de juros, de arrendamento, etc.) às famílias com renda variando entre dois e oito salários mínimos, isto é, ultrapassando o limite de até três salários mínimos – faixa em que o Estado concede mais subsídios habitacionais, por ser a da população mais carente financeiramente. A contradição com a conjuntura também é verificada na forma de intervenção do governo federal, que passa a atuar de forma direta na produção habitacional, e não apenas alocando recursos. A política neoliberal também exige uma maior eficiência do sistema econômico, o que está intrinsecamente relacionado com o desenvolvimento das políticas de habitação. Como a política habitacional é um instrumento que influencia diretamente o desempenho da economia, problemas de ordem financeira no Sistema Financeiro da Habitação refletem na Capítulo III ____________________________________________________________________ 102 economia do país. Isso significa que o Estado se vê diante de um impasse: por um lado, ele é o responsável por promover programas para atender aos problemas de moradia da população de renda mais baixa (abaixo de três salários mínimos); por outro, é responsável por manter a economia estável. No entanto, para se promoverem programas voltados para a mais baixa renda, é necessário o subsídio do Estado, o qual, se for volumoso, pode comprometer a eficácia do sistema, conforme citado por Azevedo no primeiro capítulo. Por isso, geralmente se opta por financiar programas para a população que tem capacidade de pagamento, para que haja o retorno do capital investido e tanto a economia quanto o erário público não sejam prejudicados. O PAR, assim como o Carta de Crédito, se insere nesta última opção. De qualquer forma, uma das maiores dificuldades que a política de habitação enfrenta é a inadimplência, que, dependendo do volume, gera problemas para o sistema financeiro. O desmantelamento do BNH, por exemplo, foi fruto de uma crise econômica generalizada, agravada, em boa parte, pelo alto nível de inadimplência, baixa liquidez do sistema e movimentos de mutuários organizados nacionalmente, durante o governo Sarney. A partir dessa premissa, o PAR surgiu como uma forma de financiamento que procura minimizar o problema da inadimplência, opinião defendida por Valença (2001) e por Azevedo (2000), no início deste item. Como o arrendatário não é o proprietário da habitação, fica mais fácil para a CAIXA reaver o imóvel, caso ele atrase duas parcelas de qualquer uma das taxas de sua responsabilidade (taxa de arrendamento ou taxa condominial), pois o atraso de 60 dias no pagamento fica definido como quebra contratual. Salienta-se que o prazo máximo de inadimplência estipulado pelo programa vai de encontro à própria Lei do Inquilinato, que permite até 90 dias de atraso. Essa questão da inadimplência sempre foi muito bem documentada na legislação do PAR, desde a Medida Provisória n. 1.822 (1999), no Art. 9º: Na hipótese de inadimplemento no arrendamento, findo o prazo de notificação ou interpelação, sem pagamento dos encargos em atraso, fica configurado o esbulho possessório que autoriza o arrendador a propor a competente ação de reintegração de posse. Contudo, essa retomada do imóvel devido à inadimplência não vem sendo uma tarefa fácil de se administrar, conforme se notará mais adiante, no Capítulo V, para o caso específico da cidade de João Pessoa. Porém, quando se constata a quebra contratual, envolvendo o uso indevido do imóvel pelo arrendatário, cujo maior exemplo é o aluguel da habitação arrendada, a reintegração de posse se desenvolve mais agilmente, contando, Capítulo III ____________________________________________________________________ 103 inclusive, com a ajuda de um oficial de justiça para efetuar o despejo do arrendatário, segundo informações obtidas com a administradora do PAR em João Pessoa60. Apesar de todas as dificuldades inerentes ao processo, pode-se afirmar que, no PAR, o controle da inadimplência é efetivamente maior e mais eficiente, fato que contribui para evitar grandes prejuízos ao erário público. Pode-se dizer, ainda, que essa eficiência no controle da inadimplência é fruto não apenas das condições contratuais (prazo de 60 dias, por exemplo), mas também da cobrança periódica realizada por empresas privadas do ramo da administração de imóveis contratadas pela CAIXA para gerir as taxas de condomínio e as de arrendamento. Ao mesmo tempo que consegue diminuir os níveis de inadimplência, o PAR (e o Estado indiretamente, por meio da CAIXA) consegue promover boas condições de habitação para a população de menor renda (dois salários mínimos) e até de maior renda (oito salários mínimos). Confrontando-se, por fim, as diferenças entre o PAR e os financiamentos convencionais, como o tipo de acesso – arrendamento –, a facilidade de retomada do imóvel, a facilidade de desistência e a mobilidade residencial, evidencia-se que, de fato, esse financiamento surgiu com o objetivo de garantir soluções mais eficazes para os problemas enfrentados tanto pela agência financeira (problemas de ordem administrativa) quanto pelos usuários (problemas de ordem burocrática). Trata-se, da inserção de elementos que vieram com o objetivo de otimizar o sistema de crédito especialmente do ponto de vista administrativo (para a CAIXA), evitando-se realmente a inadimplência e garantindo-se o retorno do capital investido. Em suma, no Programa de Arrendamento Residencial, há um maior envolvimento do poder público na questão habitacional, com a finalidade, inclusive, de manter o sistema financeiro a salvo de possíveis deslizes, causados pela inadimplência. Além disso, o comprometimento do Estado com a população também é maior, pois os imóveis são de propriedade do poder público, representado pela CAIXA, que mantém, por um longo período (no mínimo 15 anos), uma relação com os arrendatários (que são como inquilinos), mesmo que essa relação seja indireta, devido à interface da administradora, que, por sua vez, se envolve diretamente com os problemas dos conjuntos. Uma outra característica do PAR é a parceria entre o poder público e as empresas capitalistas, exemplo típico da nova estrutura difundida pela política neoliberal. 60 Entrevista realizada, no dia 21-07-06, com a gerente administrativa da administradora responsável pelos imóveis do PAR em João Pessoa e por alguns imóveis do PAR em Recife, Inaluce Simone B. Marinho (modelo da entrevista em Anexo D). Capítulo III ____________________________________________________________________ 104 Essa participação da iniciativa privada onera o custo da mercadoria moradia, pois as empresas visam ao lucro, embora contribuam estimulando a economia do país. Enfim, como forma diferente de acesso à moradia, o PAR gera também diferentes formas de participação dos agentes envolvidos na produção e diferentes características tipológicas, construtivas e de implantação das habitações no espaço urbano, como será visto nas páginas seguintes. 3.1.2 OS AGENTES PARTICIPANTES Conforme foi discutido no item anterior, no PAR há uma forte associação entre a iniciativa privada e a iniciativa pública. A esfera privada é composta basicamente pelas empresas da construção civil e empresas de administração de imóveis, além de outros agentes, como os que realizam o serviço social, enquanto a esfera pública engloba os governos federal, estadual e municipal. Além desses agentes, participam também do PAR os arrendatários. Esses agentes podem estar enquadrados em duas etapas do processo produtivo: a etapa de produção da mercadoria moradia (que é a construção propriamente dita) e a etapa do consumo. As empresas da construção civil pertencem à etapa de produção; as empresas de administração, o responsável pelo trabalho técnico social e os arrendatários pertencem à etapa de consumo; e os governos estadual e municipal, assim como a CAIXA, através da Gerência de Filial de Desenvolvimento Urbano (GIDUR) e da Gerência de Filial de Alienar Bens Móveis e Imóveis (GILIE), podem atuar simultaneamente tanto na etapa de produção quanto na de consumo. O governo federal é representado por três instituições: a Caixa Econômica Federal, o Ministério das Cidades e o Ministério da Fazenda. O primeiro é o atual agente executor do programa e gestor do fundo; o segundo é o atual agente gestor do programa (no governo de FHC, essa função cabia à CAIXA); já o Ministério da Fazenda é um agente auxiliar para, conjuntamente com o Ministério das Cidades, estabelecer a remuneração da CAIXA por executar o PAR. De acordo com a Portaria n. 231 (2004), ao Ministério das Cidades são atribuídas três funções: “estabelecer diretrizes e fixar regras e condições para implementação do programa; fixar, em conjunto com o Ministério da Fazenda, a remuneração da CEF; e acompanhar e avaliar o desempenho do programa”. Além dessas, é atribuição do Ministério das Cidades receber os recursos e alocá-los entre os estados brasileiros (normativo da CAIXA-PAR, 2006). De modo geral, em uma “escala de importância”, esse órgão se localiza no topo da escala, pois é o responsável por gerir o PAR Capítulo III ____________________________________________________________________ 105 e, em função disso, é capaz de mudar elementos estruturais do funcionamento do programa (como, por exemplo, mudar o público-alvo, a origem dos recursos, entre outros). Com o objetivo de facilitar a compreensão dessa “escala de importância”, elaborou-se a Figura 9, que indica as ligações efetuadas entre os vários agentes envolvidos no sistema de funcionamento do PAR. Verifica-se, portanto, a atuação auxiliar do Ministério da Fazenda. Seguindo a escala hierárquica ilustrada na Figura 9, vindo logo depois do Ministério das Cidades, a CAIXA assume o posto de segundo órgão mais importante do sistema de funcionamento do PAR (todavia, isso é discutível, pois, na prática, a CAIXA tem uma atuação mais importante que o Ministério das Cidades). Ela é uma instituição bancária, portanto, responsável por realizar operações financeiras, em que prima pelo seu equilíbrio financeiro e o retorno do capital aplicado. Não obstante, ela também desenvolve atividades secundárias, das quais se destaca a sua função na política habitacional. Nesse âmbito, em linhas gerais, a CAIXA pode atuar em seis linhas de ações, descritas no Capítulo II, das quais uma se refere a sua função no PAR. Trata-se de uma participação mais ativa na produção, diferenciando-se das formas convencionais de financiamento. A CAIXA se envolve mais tanto no processo de produção (através da GIDUR) quanto no de consumo da mercadoria moradia (através da GILIE), além de conceder financiamentos tanto para o construtor (oferta) quanto para o morador (demanda), embora em momentos distintos. Essa forma de atuação diferenciada será melhor explicada nos parágrafos subseqüentes. Figura 9: Esquema de relações entre os agentes envolvidos no processo do PAR Nota: Elaboração da autora Capítulo III ____________________________________________________________________ 106 De acordo com a legislação do programa, no PAR a CAIXA opera duas funções essenciais: é o agente gestor do FAR e o agente executor do programa. Na qualidade de agente executor, é de sua responsabilidade: a) Alocar os recursos e gerir o FAR, […]; b) Definir, […], os critérios a serem observados na aquisição e no arrendamento dos imóveis destinados ao programa; c) Analisar a viabilidade técnica, jurídica e econômico-financeira dos projetos, bem como acompanhar a execução das respectivas obras e serviços, responsabilizando-se pela sua conclusão; d) Contratar a execução de obras e serviços considerados aprovadas nos aspectos técnico-jurídico e econômico-financeiro, […]; e) Adquirir as unidades para fins residenciais; f) Assegurar que os resultados das aplicações sejam revertidos para o FAR e que as operações de aquisição de imóveis sujeitar-se-ão aos critérios técnicos definidos para o Programa; g) Representar o arrendador, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente; h) Promover, em nome do arrendador, o registro dos imóveis adquiridos; e i) Expedir e publicar no Diário Oficial da União, os atos normativos necessários a operacionalização do programa (PORTARIA n. 231, 2004). Observando-se as funções acima listadas, verifica-se que, no PAR, a CAIXA não é mera agência financeira, com as atribuições de: alocar os recursos e mobilizar o capital necessário à operação e à obtenção do financiamento para construção, mobilizar o financiamento para os arrendatários e definir as características operacionais financeiras, tais como taxa de arrendamento, taxa de juros, etc., com o objetivo de manter a estabilidade financeira do FAR. Ela também se envolve no campo da produção das habitações, através da GIDUR, com as seguintes atividades: analisar a viabilidade dos projetos, fiscalizar a execução da construção, contratar as obras e serviços, analisar a situação do mercado onde o empreendimento será implantado; e estabelecer as características construtivas e tipológicas, como programa de necessidades mínimo, área privativa mínima, especificações, etc. Com essas medidas, a CAIXA garante uma “certa” qualidade construtiva para as habitações produzidas, visando à diminuição das possibilidades de não-ocupação das unidades. Em síntese, baseada no seu principal pressuposto, que é o “retorno do capital aplicado”, a CAIXA se cerca de muitos cuidados no momento da construção, para não financiar um empreendimento que seja de “risco” e que traga dificuldade no retorno do investimento (mais um instrumento, da mesma forma que o retorno do imóvel, evitando a inadimplência). Ainda no campo das atividades desempenhadas pela CAIXA, porém na esfera do consumo, por meio da GILIE ela atua: adquirindo e entregando as unidades aos arrendatários, representando o arrendador, promovendo o registro de imóveis, mas também Capítulo III ____________________________________________________________________ 107 divulgando o financiamento. Ademais, também é responsável pela seleção dos candidatos inscritos no programa (geralmente inscritos nas prefeituras, governos de estado ou administradoras dos imóveis do PAR nas respectivas cidades). Essa seleção passa por um longo processo de avaliação, em que a CAIXA avalia a capacidade de pagamento dos candidatos e realiza uma “pesquisa cadastral” deles para se certificar de que não estão endividados e, com tudo isso, evitar possíveis casos de inadimplência. Esse procedimento restringe ainda mais o acesso de parcela da população ao financiamento. Todas essas atividades desempenhadas pela CAIXA estão direta ou indiretamente vinculadas aos outros envolvidos no funcionamento do PAR, de maneira que ela pode ser caracterizada como o agente que coordena uma série de etapas do processo de produção e consumo, além de concatenar a ação de vários agentes ao longo do processo. A relação com esses diversos agentes, por sua vez, apresenta níveis de intensidade diferentes: com as empresas construtoras e as administradoras, a relação é direta e permanente; com os arrendatários, a relação é indireta, devido à intermediação da administradora; já com as prefeituras e governo do estado a relação é eventual, mas geralmente direta. Sintetizando, a CAIXA assume muitas atividades citadas empiricamente por Ribeiro (1997) como sendo atividades desempenhas por um agente incorporador, as quais foram descritas no primeiro capítulo; no entanto isso não a torna necessariamente um incorporador no sentido definido teoricamente. Do ponto de vista administrativo, a CAIXA organiza e coordena uma série de atividades e de outros agentes. Por outro lado, algumas características definidas como da incorporação não foram encontradas entre as funções dessa agência financeira. Por exemplo: a CAIXA, no PAR, não se envolve diretamente com os proprietários urbanos, salvo quando os construtores são os proprietários, nem com os escritórios de planejamento (e, é claro, nem com a agência financeira, que é ela própria). O incorporador escolhe um terreno que visa à valorização no mercado imobiliário, de maneira que ele obterá um lucro com a comercialização das unidades e, principalmente, um lucro com a valorização da localização do empreendimento. Diferentemente, a CAIXA não se envolve diretamente com a escolha do terreno (apenas aprova), que fica sob a responsabilidade da empresa de construção civil ou das prefeituras e governos do estado, em casos eventuais. O contato com o proprietário urbano se restringe ao construtor, ao passo que a CAIXA atua como agência financeira, apenas disponibilizando o pagamento do lote, depois de efetuar as avaliações de viabilidade necessárias para a aprovação do empreendimento. O preço do lote é embutido no custo total do empreendimento, mas sua possível valorização, após concluídas as obras, não é, o que consiste em uma grande diferença da perspectiva do agente incorporador. Capítulo III ____________________________________________________________________ 108 Outro diferencial: o lucro da agência bancária não advém da produção das unidades nem tampouco da valorização da localização; ela exerce suas atividades à margem do lucro obtido com a produção, sendo remunerada pela gestão do FAR e pela execução do PAR. A remuneração, por sua vez, é fixada pelo Ministério das Cidades em conjunto com o Ministério da Fazenda. Fora a correção pela TR, não há juros cobrados pela CAIXA. Sendo assim, a CAIXA não se beneficia das práticas que caracterizam teoricamente um incorporador imobiliário qualquer: a transformação do solo urbano em mercadoria e a conseqüente busca por um sobrelucro da localização (com a valorização). No entanto, ela exerce muitas funções que são atribuídas especialmente aos incorporadores. Face ao exposto, pode-se afirmar que, no âmbito dos programas habitacionais do governo federal, a CAIXA, como executora do PAR, atua de forma diferente de como atua em outros programas. Vale ressaltar também que a CAIXA é proprietária dos imóveis por, no mínimo, 15 anos. Esse fato, juntamente com o maior envolvimento dela na produção, tem implicações na forma tipológica e na qualidade construtiva das habitações financiadas pelo PAR, como será discutido adiante. Na esfera governamental destaca-se, ainda, a participação dos governos estaduais e municipais, tanto na etapa de produção quanto na de consumo. Conforme a Portaria n. 231 (2004), as principais funções desses governos no processo produtivo são: x criar ações e mecanismos para facilitar e acelerar a tramitação dos projetos, bem como reduzir o custo final das habitações, por meio de isenção de algumas taxas e impostos; e x indicar e informar à CAIXA as zonas de intervenção prioritárias para implantação dos projetos. Caso seja necessário, as prefeituras deverão, ainda, responsabilizar-se pela implantação da infra-estrutura. Segundo o normativo da CAIXA-PAR (2006), os estados e as prefeituras podem também doar terrenos para a construção dos conjuntos, alocar recursos para o desenvolvimento do programa e gerar a demanda, isto é, apresentar as famílias a serem beneficiadas, mas que passarão pelo processo seletivo realizado pela CAIXA. Por isso, na Figura 9, são apontadas possíveis ligações entre os arrendatários e as esferas estadual e municipal. É importante mencionar uma das determinações da Portaria n. 231 (2004), que autorizou a atuação das Companhias de Habitação Popular na produção de imóveis do PAR; ou seja, o governo estadual ou o municipal poderão participar de forma mais efetiva, construindo habitações pelo programa. De forma geral, o contato desses governos com a Capítulo III ____________________________________________________________________ 109 CAIXA se desenvolve com pouca intensidade, mesmo as prefeituras que participam mais do funcionamento do PAR, no âmbito da concessão de benefícios fiscais e na aprovação dos projetos, sendo que as empresas da construção civil são as responsáveis em obter a aprovação destes órgãos. Finda a descrição acerca das atividades desempenhadas pela iniciativa pública, isto é, das responsabilidades dos governos federal, estadual e municipal, passa-se para a compreensão da outra esfera que participa do processo de produção e consumo do PAR, a esfera privada. A participação da iniciativa privada na questão habitacional se destacou durante o governo Collor (característica impulsionada pela política neoliberal, que incentivava essa parceria), por meio de financiamentos ao produtor, e não ao usuário final. Diferentemente, no PAR, o financiamento é para as empresas construtoras produzirem os empreendimentos, mas também, dentro do mesmo processo, há o financiamento para os usuários finais, ou seja, os arrendatários (atuação na oferta e na demanda). Como já foi mencionado, na linha de crédito objeto de estudo desta dissertação a iniciativa privada é composta pelas empresas da construção civil, na etapa de produção habitacional, e pelas empresas de administração de imóveis, que atuam no processo de consumo (Figura 9). De acordo com a Portaria n. 231 (2004), compete às empresas do setor da construção civil: a) apresentar à CEF projetos de produção, reforma ou recuperação de empreendimentos observada a identificação das regiões e zonas de intervenção prioritárias e da demanda para arrendamento, [...]. b) executar os projetos aprovados pela CEF. De acordo com essa portaria, o agente construtor é, portanto, responsável por indicar e adquirir um terreno para a construção das unidades habitacionais, contratar os projetos de arquitetura e engenharia e encaminhá-los aos órgãos fiscalizadores (do poder público, em geral), para obter as respectivas aprovações (inclusive a aprovação da CAIXA). Ele também apresenta o orçamento e o cronograma de execução das moradias à CAIXA, para, enfim, executar a obra planejada. Para desempenhar essas atividades, as empresas construtoras precisam lidar com, no mínimo, outros três agentes, além da CAIXA, quais sejam: os proprietários urbanos, os escritórios de planejamento e projeto, e o poder público. Em suma, o papel desempenhado pelas empresas construtoras está restrito apenas à etapa de construção dos empreendimentos, de modo que elas elaboram uma proposta – projeto, orçamento, etc. – e tentam vendê-la à CAIXA para que esta a financie pelo PAR. Não, há, portanto, processo licitatório. Capítulo III ____________________________________________________________________ 110 O outro agente da esfera privada, mas que atua na etapa do consumo, é a administradora de imóveis, contratada após processo licitatório. Embora não haja nenhuma menção a esse agente nas leis do PAR, apenas no normativo da CAIXA-PAR (2006), as administradoras de imóveis são responsáveis por três funções básicas. Elas “são contratadas para administrar os contratos de arrendamento e administração dos imóveis e condomínios do PAR, se for o caso” (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.10). Em outras palavras, a administradora atua como síndica dos conjuntos, funcionando como intermediadora entre os arrendatários e a CAIXA, pelo menos até 2/3 das unidades do condomínio permanecer sob a propriedade do FAR e, conseqüentemente, da CAIXA (após os 15 anos). Além disso, também é função dessa empresa atuar na seleção de candidatos, de acordo com a gerente da administradora responsável pela gestão dos conjuntos do PAR em João Pessoa, Inaluce Simone B. Marinho61. Acredita-se que a administração dos imóveis não é realizada pela CAIXA por três fatores principais. Primeiramente, por que ela não tem estrutura para assumir essa incumbência nem tampouco conhecimento nessa área de atuação – a CAIXA é uma agência financeira de imóveis, não uma administradora. Segundo, para evitar problemas com direitos trabalhistas, situação recorrente nas atividades condominiais, esse problema fica restrito ao âmbito da administradora. Além disso, há o fator ideológico: a CAIXA não se envolve diretamente com os problemas condominiais e não faz as cobranças das taxas de arrendamento e condomínio, evitando possíveis desgastes e insatisfação, que poderiam provocar mais inadimplência. Dessa forma, ela apenas mantém sua imagem de agência financiadora. Aproveitando a ocasião, é importante relembrar Bolaffi (1986, p.30) quando diz: “o Estado brasileiro é por demais burocratizado, cartorial e incompetente para administrar aluguéis eficientemente”. Se ele está certo, esse é mais um motivo para a CAIXA ter recorrido a uma empresa privada para tratar da administração dos imóveis. Pode-se dizer que esse problema tem sido uma das razões que dificultam o desenvolvimento de uma política de locação social no país. Ainda na etapa do consumo habitacional, destacam-se os arrendatários, que constituem o público-alvo do programa. Inicialmente, os candidatos a arrendatário eram todos aqueles cuja renda familiar mensal estivesse enquadrada entre três e seis salários mínimos, podendo chegar até oito salários mínimos, no caso específico de profissionais da área da segurança pública, como policiais civis e militares. No governo do presidente Lula, houve uma mudança, deixando-se de considerar a faixa de renda mínima, de modo que o 61 Entrevista realizada no dia 21-07-06 (modelo da entrevista em Anexo D). Capítulo III ____________________________________________________________________ 111 programa passa a contemplar, inclusive, pessoas cuja renda familiar mensal seja, no mínimo, de dois salários mínimos. Com essa reformulação, definiram-se dois grupos – PAR 1 e PAR 2 – com faixas de renda e benefícios diferentes, conforme é demonstrado no Quadro 9. QUADRO 9 Características dos dois grupos do Programa de Arrendamento Residencial Elemento comparativo PAR 1 PAR 2 Faixa de renda entre três e oito salários mínimos até quatro salários mínimos Valor inicial da taxa de arrendamento 0,7% do valor de aquisição da unidade 0,5% do valor de aquisição da unidade, nos casos de projetos com especificação técnica mínima Fonte: Entrevista na CAIXA da Paraíba, na secção GILIE, no dia 30 de maio de 2006. Entrevistou-se, simultaneamente, um analista do PAR (Cláudio) e o Gerente da GILIE-CAIXA, Clóvis Silva Madruga Júnior (modelo da entrevista em Anexo A) Nota: Elaboração da autora Além da faixa salarial, os arrendatários só podem comprometer até 30% da sua renda com a moradia e também não podem ser proprietários de imóvel ou detentores de outro tipo de financiamento. Essa medida contribui para reduzir as especulações com os imóveis, seja para fins de locação, seja para fins de venda, como ocorre com muitas unidades habitacionais que estão fechadas, aguardando uma valorização, apesar do déficit existente no país. Assim, as unidades do PAR têm fins exclusivamente residenciais. Quanto às obrigações, os arrendatários têm que pagar a taxa de arrendamento, as taxas mensais de condomínio (se houver) e as despesas incidentes sobre o imóvel (IPTU – se não tiver isenção, por parte do poder público local –, energia elétrica, água, etc.). Também têm o prazo máximo de 90 dias para ocupar a habitação, a contar da data de assinatura de contrato, e são responsáveis por “manter o imóvel em perfeitas condições de habitabilidade e conservação”, sob pena de rescisão contratual, caso não cumpram essa obrigação (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.31). Outra questão importante a respeito do público-alvo do PAR, além da subdivisão em dois grupos, é que o programa geralmente procura atender às necessidades de moradia daquela população que sofre com o problema de adensamento ou do ônus excessivo com aluguel, seguindo as diretrizes do programa, estipuladas na Portaria n. 231 (2004). Portanto, o PAR foi criado especialmente para aquelas pessoas que já estão acostumadas com o sistema de aluguel, impedindo um maior impacto, ou até mesmo resistência, por parte da sociedade, a essa forma diferente de acesso à moradia. Capítulo III ____________________________________________________________________ 112 Por fim, salienta-se que, dentro do processo de consumo, há a presença do “agente executor do trabalho técnico social”, que é uma pessoa jurídica para a realização de atividades sociais (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.9). De acordo com o normativo da CAIXA-PAR (2006, p.63), o “trabalho técnico social” tem o objetivo de: Criar mecanismos capazes de viabilizar a integração e participação dos arrendatários e demais atores envolvidos, gerando o compromisso com a conservação e a manutenção dos imóveis, a correta ocupação do espaço coletivo e o estímulo à adimplência e fixação dos arrendatários nos imóveis. Em outras palavras, esse agente, “previamente credenciado pela CAIXA”, tem a função de realizar, em cada conjunto, separadamente, atividades entre os arrendatários, para promover a integração entre eles (entre vizinhos), além de realizar programas educativos (de regras condominiais, por exemplo) e explicativos acerca do programa, enfatizando, sobretudo, questões como adimplência (que é um ponto de pressão psicológica sobre os arrendatários) e também a questão da conservação e manutenção dos imóveis da CAIXA. Pode-se dizer que a contratação desse agente consiste em mais um instrumento do programa para diminuir a inadimplência. É importante lembrar que essa estratégia de “educar” a população residente nos imóveis do PAR também foi uma estratégia utilizada na Fundação da Casa Popular (ver Azevedo & Andrade, 1982). Face ao exposto, constata-se que vários agentes participam do PAR, seja do processo de produção, seja do processo de consumo. Estes, em conjunto, formam uma teia de relações bastante complexa, porém eficiente, assegurando o funcionamento do programa. 3.1.3 OS RECURSOS Sendo um programa inserido em uma política de habitação, o PAR apresenta elementos que constituem uma política, como a alocação de recursos, “cuja natureza é mais ou menos autoritária”, conforme Thoenig (apud MULLER, 1990, p.29), citado no primeiro capítulo. Isso significa que a escolha da fonte de recursos é feita de uma forma mais ou menos aleatória. No caso do PAR, a fonte de recursos do programa é o Fundo de Arrendamento Residencial, que é composto por recursos onerosos e não-onerosos62. Segundo o Ministério das Cidades (2005b), o primeiro tipo é proveniente de empréstimo junto ao FGTS, motivo pelo qual a distribuição das habitações entre as regiões brasileiras 62 Os recursos onerosos são do tipo que precisa do retorno do capital investido, enquanto os não- onerosos são aqueles recursos a fundo perdido. Capítulo III ____________________________________________________________________ 113 segue as recomendações do Conselho Curador do FGTS. Já os recursos não-onerosos são provenientes de quatro fundos distintos, quais sejam: x FAS – Fundo de Apoio ao Desenvolvimento Social; x FINSOCIAL – Fundo de Investimento Social; x FDS – Fundo de Desenvolvimento Social; x PROTECH – Programa de Difusão Tecnológica para Construção de Habitação de Baixo Custo. Portanto, a escolha dos fundos que constituem o FAR se dá de forma mais ou menos aleatória, sim, uma vez que se utiliza o FAS, o FINSOCIAL, o FDS e o PROTECH, ao invés de recursos do OGU, por exemplo. Ressalte-se que os fundos que alimentam o FAR também são utilizados para outras ações sociais: o FDS, por exemplo, alimenta outros programas habitacionais, como o Crédito Solidário. Nesse contexto, é importante relembrar a Tabela 1, do Capítulo II, que indica a importância do FAR no conjunto da política habitacional da gestão Lula: o volume de recursos alocados para o PAR só perde para o montante de recursos destinados para o programa Carta de Crédito. No entanto, o FAR enfrenta problemas de liquidez, pois o arrendamento é uma operação onerosa: 40% do fundo é de subsídios para resolver questões como a inadimplência (10%) e a manutenção dos empreendimentos (20% a 30%63), segundo César Ramos64. Talvez por esse motivo, o Ministério das Cidades vem desenvolvendo o projeto de antecipação65, isto é, os arrendatários teriam o direito de compra do imóvel após cinco anos de arrendamento e antes dos 15 anos do contrato. Com isso, a condição de arrendamento seria elevada para a de financiamento, visando à necessidade de angariar mais recursos para o fundo. No entanto, como foi visto inicialmente, a antecipação já havia sido instituída pela Portaria n. 231, de 04 de junho de 2004. 63 Apesar de a legislação destinar apenas 15% do fundo para a manutenção: “Para fins de cobertura dos custos com a manutenção e conservação dos imóveis e de responsabilidade do FAR, a CEF fica autorizada a efetuar o provisionamento mensal no balancete do FAR, de valor correspondente a 15% do valor de arrecadação prevista da taxa de arrendamento mensal” (PORTARIA n. 231, 20004). 64 Entrevista semi-estruturada realizada com César Ramos, gerente de Projetos do Ministério das Cidades, no I Seminário Internacional das Cooperativas Habitacionais, realizado no Hotel Blue Tree Park, em Natal-RN, entre os dias 28-02-07 e 01-03-07. A entrevista ocorreu no segundo dia do evento. 65 O Ministério está legalizando o processo, motivo pelo qual nenhum arrendatário foi beneficiado com essa antecipação até o momento. César Ramos disse acreditar que esse projeto estaria finalizado no final de abril de 2007. Capítulo III ____________________________________________________________________ 114 Se essa opção for realmente efetivada e bastante utilizada, César Ramos acredita que isso será o fim do programa, pois muitos optarão pela compra do imóvel, transformando o arrendamento em mero financiamento convencional, assim como são todos os outros programas habitacionais do governo federal. Dessa forma, a política habitacional brasileira perderá seu programa mais peculiar, o de arrendamento, restando como diferença apenas a fonte de recursos, o FAR, em vez do FGTS ou da OGU, estes últimos mais tradicionais. 3.1.4 CARACTERÍSTICAS DE LOCALIZAÇÃO DOS CONJUNTOS NO ESPAÇO URBANO, OU CARACTERÍSTICAS LOCACIONAIS Do ponto de vista locacional, o PAR apresenta muitas determinações para a implantação dos seus conjuntos no nível regional e no municipal, as quais serão explicadas a seguir, com base no normativo da CAIXA-PAR (2006). No nível regional, o programa está voltado ao atendimento das capitais estaduais e suas regiões metropolitanas bem como dos centros urbanos de grande porte – municípios com população urbana de mais de 100 mil habitantes, de acordo com o Censo Demográfico 2000, Contagem da População 1996, IBGE (normativo da CAIXA-PAR, 2006). Assim, o programa busca equacionar o problema habitacional, que se apresenta de forma concentrada nas cidades de médio e grande porte, estratégia também adotada pelas políticas habitacionais dos IAPs, da FCP e do BNH. Quanto ao valor das unidades habitacionais dos empreendimentos, inicialmente, quando o programa foi lançado, o valor máximo para aquisição dos imóveis do PAR era igual em todo o país. A partir de 2005, devido às diferenças relativas ao custo de vida nas diversas regiões do país, foi instituída (legalmente, pela Portaria n. 142, 2005) a regionalização dos valores das habitações, embora, em 2002, já se constatava no normativo da CAIXA-PAR uma diferenciação entre algumas regiões66. Conforme se verifica na Tabela 3, o valor máximo de aquisição das unidades varia em função do tipo de especificação dos materiais de construção – especificação padrão ou especificação mínima – e da localização no território brasileiro. Os valores variam entre R$ 28.000,00 e R$ 40.000,00; e, especificamente, para requalificação de áreas centrais ou recuperação de sítios históricos, o 66 Em 2002, havia, grosso modo, no normativo da CAIXA (2002, p.7), uma diferenciação no valor das unidades: o valor máximo deveria ser de R$ 22.400,00; nos municípios que integram as regiões metropolitanas dos estados do Rio de Janeiro e São Paulo o valor poderia atingir até R$28.000,00; e R$ 35.000,00 para unidades enquadradas em programas de revitalização de áreas históricas. O valor médio recomendado era de R$ 15.000,00 reais. Capítulo III ____________________________________________________________________ 115 valor pode chegar até R$ 40.000,00 para os estados de São Paulo e Rio de Janeiro, e R$38.000,00 para os demais estados, conforme o normativo da CAIXA-PAR (2006). TABELA 3 Valor máximo de aquisição das unidades do PAR por estado brasileiro Valor Máximo de aquisição da unidade (R$) UF Localidade Especificação padrão Especificação mínima capital estadual e respectivas regiões metropolitanas; municípios de Jundiaí e São José dos Campos; região metropolitana da baixada santista; região metropolitana de Campinas 40.000,00 34.000,00 SP municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes 34.000,00 31.000,00 capital estadual e respectiva região metropolitana 40.000,00 34.000,00 RJ municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes 34.000,00 31.000,00 capital estadual e respectiva região metropolitana 34.000,00 29.000,00 MG municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes 33.000,00 28.000,00 capitais estaduais e respectivas regiões metropolitanas 32.000,00 29.000,00 BA e PE municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes 30.000,00 28.000,00 RS e PR 34.000,00 30.000,00 SC, AC, AM, RO e RR 33.000,00 30.000,00 AP, PA, TO, ES, GO, MT e MS 32.000,00 28.000,00 AL, CE, SE, PB, PI, RN e MA capitais estaduais e respectivas regiões metropolitanas municípios com população urbana superior a 100 mil habitantes 30.000,00 28.000,00 DF regiões administrativas abrangidas 34.000,00 30.000,00 Fonte: Normativo da CAIXA-PAR (2006, p.19) Por outro lado, no nível municipal, a implantação dos conjuntos deve obedecer aos seguintes requisitos, ainda de acordo com o normativo da CAIXA-PAR (2006, p.18): Inserção na malha urbana; Existência prévia de infra-estrutura básica que permita as ligações domiciliares de abastecimento de água, esgotamento sanitário, energia elétrica, vias de acesso e transportes públicos, em padrão equivalente a bairros formais predominantes no município, ocupados com população que tenha renda compatível a do público-alvo do empreendimento em análise; Especificação técnica mínima, regionalizada. Assim, verifica-se a importância de o conjunto estar inserido em uma malha urbana infra-estruturada. Essa questão pode ser analisada sob duas óticas: uma em relação ao modelo de expansão periférica difundido pelas políticas de habitação implementadas Capítulo III ____________________________________________________________________ 116 pelo Estado desenvolvimentista e, mais especificamente, pela política do BNH; e a outra em relação à redução da disponibilidade de faixas de terra urbana amplas, que existiam em maior quantidade anteriormente. Acredita-se que aquele modelo de implantação (expansão periférica) foi, no caso do PAR, revisado, observando-se que gerava muitos problemas urbanos, como grandes deslocamentos populacionais, deficiência nos chamados prolongamentos da moradia – infra-estrutura e serviços –, vazios urbanos, entre outros tantos (ver BOLAFFI, 1992). Para a correção desses problemas, os governos locais necessitavam de volumosos recursos financeiros, de maneira que aquele tipo de implantação promovida especialmente pelo BNH onerava muito os cofres públicos. A outra ótica é que, atualmente, a cidade não dispõe mais de extensas glebas urbanas para a construção de grandes conjuntos habitacionais, como havia anteriormente, com a política do BNH, nem o custo da terra urbana hoje permite tal tipo de investimento. Grandes terrenos justapostos e de baixo custo só são possíveis em áreas periféricas e, muitas vezes, fora da malha urbana, o que não é permitido pelo programa. O conjunto dessas duas óticas é influenciado também pelo estado atual do espaço urbano, dado que a malha urbana das cidades já está praticamente consolidada, restando alguns vazios a serem preenchidos. Ademais, percebe-se a preocupação com a viabilidade do empreendimento, que não pode ser implantado em áreas próximas a empreendimentos problemáticos nem tampouco próxima a outros empreendimentos da CAIXA, para evitar concorrência com estes. Em relação a isso, o normativo da CAIXA-PAR (2006, p.13) afirma: Na área de influência do projeto, não pode existir empreendimento considerado problema, com dificuldade de comercialização, inconcluso, paralisado, que não disponha de infra-estrutura mínima de habitabilidade, destinado ao mesmo público-alvo e financiado independente da origem de recursos e do Agente Financeiro. Não é permitida a construção em área que gere concorrência prejudicial a empreendimentos financiados pela CAIXA, concluídos ou em construção, e destinados ao mesmo público alvo. O programa também recomenda a construção de empreendimentos contendo 160 unidades habitacionais, embora seja permitida a construção de conjuntos de até 500 unidades. Sintetizando-se, pode-se dizer que o PAR apresenta uma série de preocupações com a implantação dos seus imóveis, assim como o agente incorporador, que também tem uma preocupação com a localização dos seus empreendimentos, pois ela é uma das suas fontes principais de lucro. Essa preocupação do PAR se concretiza nas exigências Capítulo III ____________________________________________________________________ 117 locacionais, que, muitas vezes, inviabilizam a produção do programa, uma vez que os terrenos bem localizados e infra-estruturados são mais caros e, por conseguinte, oneram o custo da moradia, que se relaciona diretamente com o espaço urbano. O PAR tem, ainda, a preocupação locacional de estimular a recuperação de áreas de risco e de preservação ambiental, a revitalização urbana e a recuperação de sítios históricos, estes através da reforma de antigas estruturas para uso residencial. No entanto, o desenvolvimento dessa vertente vem encontrando muitos problemas, como será discutido posteriormente. 3.1.5 CARACTERÍSTICAS TIPOLÓGICAS E CONSTRUTIVAS Além dos requisitos relacionados com os aspectos locacionais, o PAR também apresenta exigências quanto a algumas características tipológicas e à qualidade construtiva das habitações produzidas. De acordo com as determinações do normativo da CAIXA-PAR (2006, p.21), A tipologia mínima apresentada para as unidades é de 02 quartos, sala, cozinha e banheiro, com exceção das unidades de projetos de recuperação de empreendimentos, inclusive aqueles integrados a programas de requalificação urbana e recuperação de sítios históricos. […] A área útil mínima das unidades é de 37m², exceto nos projetos de recuperação de empreendimentos, inclusive os integrados a programas de requalificação urbana, cuja análise é elaborada individualmente, e nos projetos com especificação técnica mínima regionalizada. A CAIXA, juntamente com o Ministério das Cidades, desenvolveu um “Manual de especificações mínimas”, que consiste em um conjunto de especificações de construção para as habitações, a fim de manter um mínimo de qualidade quanto ao material construtivo empregado na construção dos conjuntos do PAR. Como já foi comentado, o Brasil apresenta diferenças culturais e econômicas de uma região para outra e o “Manual de especificações mínimas” – uma espécie de proposta de regionalização – vem com o objetivo de respeitar essas particularidades, por meio de diferentes tipos de especificações mínimas e diferentes valores máximos das habitações, que variam de acordo com a região. Esse modelo que vem sendo implementado pelo PAR vai de encontro ao modelo apregoado pelo BNH, que universalizava a produção, mantendo as mesmas características para todo o país. Mesmo com a regionalização, as variações de uma região para outra são ínfimas. Observando-se o Quadro 10, das especificações mínimas, verifica-se que não há diferenças marcantes nas características das habitações do PAR, apenas pequenas diferenças na altura dos edifícios, na área útil privativa e nas paredes das casas geminadas. Capítulo III ____________________________________________________________________ 118 De modo geral, nas especificações mínimas, os edifícios são compostos por quatro ou cinco pavimentos, cujos apartamentos possuem uma área privativa mínima variando entre 33,00 e 37,00m². Já as casas são de um pavimento, podendo ser isoladas no lote ou geminadas. A área mínima para essas casas oscila entre 33,00m² e 35,00m², de acordo com a localização no país (Quadro 10). QUADRO 10 “Manual de especificações mínimas” para as habitações do PAR, por região, considerando-se as características, o programa de necessidades e a área útil privativa Elemento comparativo Região Padrão apartamentos (especificações) Padrão casas (especificações) Norte edifícios de até 4 pavimentos casa de 1 pavimento, isolada ou geminada, mas com parede dupla Nordeste edifícios de até 4 pavimentos. Poderá ser avaliado o 5º. pavimento de acordo com a aceitação do mercado casa de 1 pavimento, isolada ou geminada Centro- Oeste edificação de 4 pavimentos sem elevador casa de 1 pavimento, isolada ou geminada, mas com parede dupla Sudeste edificação de até 5 pavimentos sem elevador. Poderá vir a ter mais de 5 pavimentos desde que o terreno tenha inclinação superior a 20%, de maneira que propicie acesso intermediário e cuja distância até o último andar não ultrapasse 4 pavimentos casa de 1 pavimento, isolada ou geminada Características Sul igual ao Sudeste casa de 1 pavimento, isolada ou geminada. Se geminadas, parede de divisória em alvenaria 14cm ou adotar tecnologia alternativa com mesmo desempenho Norte sala, 2 quartos, cozinha, área de serviço e banheiro, verificada a aceitação da demanda sala, 2 quartos, cozinha, circulação e banheiro Nordeste sala, 2 quartos, cozinha, área de serviço e banheiro sala, 2 quartos, cozinha, circulação e banheiro Centro- Oeste sala, 2 quartos, cozinha, área de serviço e banheiro sala, 2 quartos, cozinha, circulação e banheiro Sudeste sala, 2 quartos, cozinha, área de serviço e banheiro sala, 2 quartos, cozinha, circulação e banheiro Programa de necessidades Sul sala, 1 quarto, cozinha, área de serviço e banheiro, obedecendo o perfil efetivo da demanda Sala, 1 quarto (área compatível para 2), cozinha e banheiro Norte 37,00 ou 35,00m² com área de serviço externa 35,00m² Nordeste 35,00m² 35,00m² Centro- Oeste 35,00m² (não computadas área de serviço e varanda) 35,00m² (não computadas área de serviço e varanda) Sudeste 34,00m² 33,00m² (não computadas área de serviço e varanda) Área útil privativa Sul 33,00m² 33,00m² Fonte: CAIXA (Disponível em: . Acesso em: 04-04-06). Nota: Elaboração da autora Capítulo III ____________________________________________________________________ 119 Vale salientar que os edifícios mais altos são construídos no Sudeste e no Sul, as regiões onde é prevista, na proposta de regionalização, a construção das menores unidades habitacionais do país. Em outras palavras, essas são as duas regiões onde se deve adensar ao máximo o terreno, devido provavelmente ao alto custo da terra urbana nessas localidades, superior ao das demais regiões. Em função das características locacionais já mencionadas, sobretudo devido ao custo da terra urbana já infra-estruturada a produção habitacional do PAR se manifesta predominantemente na construção de conjuntos verticalizados, como será ilustrado a posteriori. Porém, quando se opta por construir conjuntos com unidades horizontais, o programa expressa preferência pela construção de loteamentos, ao invés de condomínios fechados; ou seja, reproduz-se a solução da casa unifamiliar inserida em loteamentos convencionais (que vem sendo produzida desde os IAPs). É importante citar o fato de que o programa incentivava, ainda, a diversidade tipológica, constatada em antigos normativos da CAIXA-PAR (2002). No que se refere à parte externa das edificações, em especial quanto aos edifícios, nas especificações mínimas por região não é exigido revestimento cerâmico das fachadas, apenas o selador sobre o reboco, com aplicação de tinta acrílica. Portanto, além de todas as preocupações com a tipologia habitacional, há também uma preocupação com a qualidade construtiva, por meio da indicação nas especificações do tipo de material construtivo a ser empregado. Uma outra recomendação para a produção do PAR é a presença de equipamentos comunitários e de lazer. A presença desse tipo de equipamento contribuía, inclusive, na aprovação dos projetos no âmbito da CAIXA. No entanto, no “Manual de especificação técnica mínima”, nem todas as regiões são contempladas com esses equipamentos; apenas o Centro-Oeste e o Sul do país, nos conjuntos formados por blocos de apartamentos (Quadro 11). Isso não significa que, nas demais regiões, os conjuntos não tenham equipamentos comunitários e de lazer. QUADRO 11 “Manual de especificações mínimas” para as habitações do PAR, por região, considerando-se apenas os equipamentos comunitários Padrão Apartamentos (especificações) Elemento comparativo Centro-Oeste Sul Equipamentos comunitários equipamento comunitário constituído por uma área coberta com 60,00m² com unidade sanitária. A área coberta deverá crescer 0,5m² por unidade, a partir de 90 moradias equipamento comunitário com no mínimo 30,00m², 0,5m² por unidade, com unidade sanitária, composta por duas bacias e pia externa, para condomínios acima de 30 unidades e área média menor que 50m² Fonte: CAIXA (Disponível em: . Acesso em: 04-04-06) Nota: Elaboração da autora Capítulo III ____________________________________________________________________ 120 Uma outra vertente de atuação do PAR é a requalificação (ou reabilitação) de áreas centrais ou históricas, em que se objetiva a recuperação ou a reforma de imóveis ociosos para, com isso, tentar-se reduzir o estoque de habitações desocupadas. Essa é mais uma diferença do PAR em relação aos outros programas habitacionais, que se voltam apenas para a construção de novas unidades, enquanto os problemas dos domicílios desocupados se agravam, incluindo o processo de depreciação de vários imóveis que estão sem cumprir sua função social de servir de moradia. Em resposta à ineficiência da política de habitação e à desocupação de tantos edifícios, surgem movimentos sociais, como o Movimento dos Sem Teto, que reclama o direito à moradia e passa a ocupar muitos desses prédios, gerando problemas judiciais. Assim, o PAR se constitui em mais uma alternativa para essa problemática urbana: é uma forma diferente de financiamento, apresentando várias frentes de ação: por um lado, a construção de novas unidades unifamiliares ou multifamiliares, em condomínios fechados ou loteamento; e, por outro lado, a recuperação ou reforma de antigos edifícios – apesar de essa última vertente estar encontrando dificuldades para ser implementada. 3.2 IMPLEMENTAÇÃO DO PAR NO PANORAMA NACIONAL No mesmo ano da publicação da primeira Medida Provisória referente ao PAR, em 1999, iniciou-se a produção de habitações pelo programa. No entanto, naquele ano, a produção só se fez presente em duas regiões brasileiras – Sudeste e Nordeste. A expansão para as demais regiões aconteceu somente em 2000, quando o PAR passou a atuar em todo o território nacional. Entre 1999 e meados de 2005, o PAR investiu na ordem de aproximadamente R$ 4.187.000.000,00 para financiar o expressivo número de 177.150 unidades habitacionais, distribuídas em 1.223 empreendimentos. Toda essa produção foi amplamente divulgada pelo governo federal, em placas nas obras dos empreendimentos. A quantidade de recursos alocados variou ao longo dos anos, conforme ilustra a Tabela 4 e a Figura 10. O ano de 2003, quando Lula assumiu a presidência, foi o que apresentou maior soma de recursos distribuídos, o que se reflete no fato de ser esse também o ano de maior produção, em relação ao número de conjuntos e de unidades habitacionais financiadas. A produção do número de conjuntos e de unidades habitacionais do PAR também variou muito ao longo desses sete anos (1999-2005), seguindo, em certa medida, o mesmo perfil da quantidade de recursos alocados, como pode ser observado nas Figuras 10 e 11 (ver também a Tabela 5). Em ambos os casos – no perfil da quantidade de unidades e Capítulo III ____________________________________________________________________ 121 no perfil dos recursos alocados –, embora variável, não se verificou uma predominância ascendente nem descendente da produção. TABELA 4 Quantidade de recursos alocados para o PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) Governo Ano Valor do investimento 1999 131.731.543,57 2000 608.718.108,04 2001 426.349.064,66 FHC 2002 729.538.679,03 2003 1.113.903.023,06 2004 869.800.000,00Lula Até julho 2005 307.400.000,00 TOTAL (abs) - 4.187.440.418,36 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora TABELA 5 Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) Governo Ano Conjuntos Unidades 1999 65 6.958 2000 251 31.005 2001 165 20.315 FHC 2002 200 30.261 2003 293 43.827 2004 188 33.556Lula Até julho 2005 61 11.228 TOTAL 1.223 177.150 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora 0 200000000 400000000 600000000 800000000 1000000000 1200000000 99 0 1 2 3 4 5 PAR 0 10000 20000 30000 40000 50000 99 0 1 2 3 4 5 PAR Figura 10: Quantidade de recursos alocados para o PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora Figura 11: Quantidade de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora anos (1999 – 2006) re cu rs os (R $) anos (1999 – 2006) un id ad es . h ab ita ci on ai s Capítulo III ____________________________________________________________________ 122 A questão a se destacar em relação a esse perfil de desenvolvimento do PAR refere-se à continuidade do programa da gestão Fernando Henrique Cardoso para a gestão Lula. Para melhor se avaliar essa importância, faz-se mister recapitular que, nos primeiros anos da década de 1990, assistiu-se a uma descontinuidade nos programas habitacionais: com freqüência, surgiam e desapareciam programas, simultaneamente ao início e ao fim de mandatos presidenciais. A partir do governo FHC, todavia, esse quadro começou a mudar: foi quando se prosseguiu com o programa Habitar-Brasil, iniciado durante o governo de Itamar Franco (provavelmente devido ao contrato com o BID). Com a eleição de Lula, um candidato de “esquerda”, muitos acreditavam que o novo presidente não daria continuidade à política econômica do governo anterior e, por conseguinte, isso teria reflexos na questão habitacional. Contudo, a política prosseguiu, tanto quanto os programas de habitação implementados por FHC, incluindo o PAR, que, segundo o Ministério das Cidades (2005c), deveria ter sido extinto em dezembro de 2003, mas não foi. Contraditoriamente, 2003 foi o ano de maior produção na trajetória do PAR, com 293 conjuntos e 43.827 unidades financiadas, no valor igual de R$ 1.113.903.023,06, como mostrado nas tabelas anteriores. Embora 2003 tenha sido o ano de melhor produção quantitativa do programa, de modo global, o desempenho das regiões variou muito no decorrer dos anos, conforme é ilustrado na Tabela 6. Para a região Nordeste, por exemplo, o ano 2000 foi aquele de maior desenvolvimento do PAR (12.280 unidades – uh), ao passo que o maior número de financiamentos nas regiões Sudeste e Sul se manifestou no ano de 2003 (20.562 uh e 7.093 uh, respectivamente). Já no Centro-Oeste, 2004 foi o ano em que mais foram financiadas unidades habitacionais (4.247 uh) e, no Norte, embora a produção seja ínfima à luz da produção das demais regiões, o ano de melhor desempenho foi 2002 (1.656 uh). TABELA 6 Perfil do número de unidades habitacionais financiados pelo PAR entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) Regiões Governo Ano Sudeste Nordeste Sul Centro-Oeste Norte TOTAL 1999 3.104 3.854 0 0 0 6.958 2000 11.307 12.280 3.387 3.147 884 31.005 2001 11.280 5.151 2.398 864 622 20.315 FHC 2002 16.739 6.297 3.892 1.677 1.656 30.261 2003 20.562 12.049 7.093 3.547 576 43.827 2004 13.177 10.274 5.068 4.247 790 33.556Lula Julho 2005 4.284 3.786 2.146 436 576 11.228 TOTAL (abs.) - 80.453 53.691 23.984 13.918 5.104 177.150 TOTAL (%) - 45,41 30,31 13,54 7,86 2,88 100,00 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora Capítulo III ____________________________________________________________________ 123 Outro aspecto importante a assinalar a respeito do PAR é a desigualdade da sua produção, não apenas no tempo, mas, principalmente, no tocante à distribuição das famílias beneficiadas, entre as regiões brasileiras. Percebe-se que a região Sudeste detém, no decorrer de quase todos os anos, a supremacia na produção de moradias, seguida pelo Nordeste, o Sul e o Centro-Oeste; no último degrau da produção está a região Norte (Tabela 6). Sendo assim, a distribuição da produção se manifesta em maior número percentual em uma única região, a Sudeste, que detém mais de 45% do total de unidades habitacionais financiadas (Tabela 7). Salienta-se que essa distribuição da produção do PAR no espaço é fruto também da distribuição estabelecida pelo Conselho Curador do FGTS67. É bem verdade que os problemas habitacionais, ou o déficit habitacional básico68, estão também desigualmente distribuídos no território brasileiro estando mais concentrados nas regiões metropolitanas e nos centros urbanos de maior população, o que foi comprovado por estudo realizado pela Fundação João Pinheiro (2005). Por essa razão, o PAR tem nessas cidades de maior porte sua área de influência. O estudo indica, ainda, que o índice de déficit habitacional básico urbano no Sudeste e no Nordeste praticamente se equivale, cada qual representando 35% do total do déficit do país69, o que também explica o motivo pelo qual são as duas regiões mais contempladas pelo PAR, mas não na quantidade de investimento entre elas. Apesar de o Sudeste deter a maior porcentagem da produção, independentemente de qual seja o governo dos presidentes da República, verificou-se, no governo Lula, uma redução na quantidade de novas habitações financiadas nas regiões Sudeste, Norte e Nordeste, em relação ao governo de FHC. Por outro lado, as regiões Centro-Oeste e Sul tiveram a produção aumentada no novo mandato presidencial (Tabela 7). Dessa maneira, com o advento do governo petista, além das transformações na própria estrutura do PAR, conforme já mencionado, houve uma redistribuição espacial da produção de moradias, a qual favoreceu a produção no Centro-Sul do país. 67 O Conselho Curador do FGTS orienta a quantidade de recursos que deve ser alocada por região. 68 “O déficit habitacional básico refere-se ao somatório dos totais referentes à coabitação familiar, aos domicílios improvisados e aos domicílios rústicos”. (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2005, p.15). “Esses dois últimos apresentam características de habitação precária. […]. De modo geral, a habitação precária é característica das áreas rurais, principalmente nas regiões Norte e Nordeste, enquanto a coabitação familiar é problema nos grandes aglomerados urbanos” (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2005, p.44). 69 Considerando-se que o déficit habitacional básico urbano no Brasil é igual a 4.140.088 domicílios, na região Nordeste é de 1.475.523 e na região Sudeste de 1.481.089, o percentual das duas regiões é de aproximadamente 35% para cada uma. Capítulo III ____________________________________________________________________ 124 TABELA 7 Produção das unidades habitacionais do PAR por região entre 1999 e julho de 2005 (o ano é de assinatura do contrato) Região 1999-2002 (absoluto) 1999-2002 (%) 2003-2005 (absoluto) 2003-2005 (%) Total (absoluto) Total (%) Sudeste 42.430 47,93 38.023 42,91 80.453 45,41 Nordeste 27.582 31,15 26.109 29,46 53.691 30,31 Sul 9.677 10,93 14.307 16,15 23.984 13,54 Centro- Oeste 5.688 6,42 8.230 9,29 13.918 7,86 Norte 3.162 3,57 1.942 2,19 5.104 2,88 Total 88.539 100,00 88.611 100,00 177.150 100,00 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2005a) Nota: Elaboração da autora Além da diferente distribuição quantitativa da produção entre as regiões, outra diferença encontrada é quanto à atuação do programa em cada estado; ou seja, quais são as cidades preferencialmente atendidas nos estados brasileiros? De acordo com levantamento feito na CAIXA (2005), entre 1999 e 2003 nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do país, o PAR se desenvolveu mais intensamente nas capitais. Nesse mesmo período, no Sudeste e no Sul o programa atuou mais nas demais cidades (aqui entendidas como as não-capitais) (Tabela 8). TABELA 8 Distribuição percentual da produção habitacional do PAR nas cidades brasileiras entre 1999 e 2003 Regiões Cidades Norte (%) Nordeste (%) Centro-Oeste (%) Sudeste (%) Sul (%) Capitais 89,30 79,58 82,65 21,77 16,83 Demais cidades 10,70 20,42 17,35 78,23 83,17 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005) Nota: Elaboração da autora Uma das razões para explicar tal fato é a abrangência dos municípios enquadrados pelo programa. Dos 306 municípios abrangidos pelo PAR no Brasil, foi nos quadrantes Sul e Sudeste que o programa listou um maior número de municípios – 72,22% dos municípios listados (221) estão nessas duas regiões (Sudeste=49,02% e Sul=23,20%) –, o que favoreceu uma maior produção nas demais cidades do que nas capitais dos estados do Sul e do Sudeste. No Nordeste, apenas 17,65% municípios (54) foram listados no programa, enquanto no Centro-Oeste e no Norte do país foram abrangidos, respectivamente, 6,21% (19 municípios) e 3,92% (12). Enfim, dada a reduzida abrangência nessas três regiões, a produção do PAR se desenvolveu mais nas capitais dos estados, onde o problema habitacional possivelmente é mais grave. Capítulo III ____________________________________________________________________ 125 Um ponto, porém, deve ser esclarecido: por que o programa abrangeu mais os municípios do Sudeste e do Sul? Essas duas regiões contam com regiões metropolitanas formadas por uma maior quantidade de cidades; o Sudeste, em particular, apresenta um maior número de cidades de maior porte. Já as regiões Nordeste, Centro-Oeste e Sul ainda possuem regiões metropolitanas formadas por poucos municípios, além de contarem com poucas cidades de grande porte, onde o programa atua como área de influência. Mais importante, todavia, foi o alto valor da terra urbana nas capitais dos estados do Sudeste e do Sul que também contribuiu para que o PAR se desenvolvesse mais nas demais cidades dessas duas regiões. O custo da mercadoria moradia está intrinsecamente vinculado à qualidade do espaço urbano e, mais especificamente, ao custo da terra urbana, que pode influenciar a tipologia, o design, etc. das habitações. Como as habitações do PAR têm um custo máximo pré-estabelecido e requisitos construtivos mínimos que devem ser seguidos, o alto custo da terra urbana nas capitais dos estados do Sudeste e do Sul dificulta (ou inviabiliza) a produção do programa. No campo empírico, por exemplo, na capital paulista, o PAR teve dificuldades para se desenvolver, motivo pelo qual foi necessária a intervenção da COHAB, indicando e selecionando terrenos ainda livres em seus conjuntos, para se dinamizar a produção. A incompatibilidade entre o preço do lote urbanizado e o valor máximo por unidade levou, segundo a Prefeitura de São Paulo (2004b, p.33), a: […] ajustes dos preços aos valores máximos por unidade habitacional e por m² de área construída em um período (principalmente, até início de 2003), com consideráveis variações dos custos da construção, que motivaram duas elevações do limite de valor por moradia estabelecido para o programa (de R$ 25mil para R$ 28mil e depois para 32,2mil). Portanto, o preço das unidades habitacionais foi, juntamente com o elevado custo da terra urbana, outro aspecto que dificultou a produção do programa na região Sudeste. Como já dito, no início, o preço das moradias era unificado para todo o país, o que causou problemas para viabilizar a produção em algumas cidades, onde o custo de vida e o custo da terra urbana eram mais elevados, sendo necessária a revisão desses valores. Isso demonstra a dificuldade de compatibilizar alguns pressupostos do programa: estabelecimento de custo máximo x localização em lotes urbanizados. Diante desse problema, o próprio programa recomenda, como possível solução, o aproveitamento de terrenos públicos que podem ser doados pelos governos estaduais ou municipais70. A partir do levantamento realizado na CAIXA (2005), constatou-se que, entre 1999 e 2003, a média de valor das unidades habitacionais oscilava entre R$ 18.000,00 e R$ 70 Foi o que aconteceu na cidade de São Paulo: devido ao elevado custo da terra, para viabilizar o programa foi necessária a intervenção das COHABs doando terrenos. Capítulo III ____________________________________________________________________ 126 25.999,00. Assim, elaborou-se a Tabela 9, em que se considerou esse intervalo como sendo o parâmetro de referência. Estabelecida essa classificação, constatou-se que as habitações mais baratas financiadas pelo PAR, com valor abaixo de R$ 18.000,00, estavam predominantemente localizadas na região Nordeste, ao passo que as mais caras, com valor acima de R$ 25.999,00, estavam predominantemente implantadas na região Sudeste. Já o Norte e o Centro-Oeste foram as únicas regiões em que a média de valor das unidades habitacionais se enquadrava apenas no intervalo de referência. Esse dado vem a corroborar o que todos já sabem: o preço dos terrenos no Nordeste é mais baixo, o que favorece a produção do PAR, facilitando o acesso à população de mais baixa renda. TABELA 9 Valor das unidades habitacionais do PAR por região entre 1999 e 2003 (o ano é de assinatura do contrato) Região Valor da unidade (R$) Sudeste Nordeste Sul Centro-Oeste Norte TOTAL Menor que 18.000 4 43 1 0 0 48 Entre 18.000 e 25.999 292 265 132 76 24 789 Maior que 26.000 132 2 3 0 0 137 TOTAL (abs.) 428 310 136 76 24 974 TOTAL (%) 43,95 31,83 13,96 7,80 2,46 100,00 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005) Nota: Elaboração da autora Não se pode deixar de comentar o fato de que, por se tratar de terrenos infra- estruturados, estes, adotados pelo PAR, geralmente apresentam um custo mais elevado, que é repassado para os arrendatários. A solução adotada pelo PAR de implantar seus conjuntos na malha urbana existente, em áreas já dotadas de infra-estrutura, demanda, indiretamente, o aproveitamento dos vazios urbanos fragmentados pelas cidades. Com isso, atribui-se uma função social aos lotes ociosos, promovendo-se, ao mesmo tempo, qualidade de vida para os arrendatários, via moradia infra-estruturada e acessível. A exigência de terrenos infra-estruturados não beneficia apenas os arrendatários, mas também beneficia os governos municipais, que, de forma geral, não precisam preocupar-se (a priori) com o provimento de infra-estrutura nas áreas em que os conjuntos do programa são implantados. É importante salientar que o aproveitamento dos vazios urbanos também favorece o mercado imobiliário, pois aquece a venda (e a especulação) de lotes urbanizados em vários pontos da cidade. No que tange à dimensão dos empreendimentos, estes são classificados, neste trabalho, em dois tipos: de pequeno porte (até 160 unidades) e de grande porte (acima de 161 unidades). Utilizou-se como critério para a classificação a recomendação do PAR de Capítulo III ____________________________________________________________________ 127 que a quantidade de unidades por conjuntos não ultrapassasse 160 moradias, embora seja permitida a construção de conjuntos de até 500 unidades. Além disso, em relação aos conjuntos do BNH, os conjuntos do PAR geralmente são bem menores. Era comum o BNH produzir conjuntos com inúmeras unidades habitacionais, como o conjunto Mangabeira I, localizado em João Pessoa-PB, produzido pela CEHAP, o qual é composto por 3.238 casas. A reduzida dimensão dos conjuntos é um pressuposto que está em consonância com outro pressuposto do PAR – a implantação dos empreendimentos em lotes urbanizados, ocupando os vazios urbanos, que geralmente apresentam menores proporções, daí o menor porte dos conjuntos. De fato, a produção seguiu os pressupostos do programa, pois entre 1999 e 2003, 75,66% (737 uh) dos empreendimentos eram de pequeno porte, possivelmente implantados em vazios urbanos. Dos empreendimentos de pequeno porte, merece especial atenção os conjuntos que são compostos exatamente por 160 unidades, que representam 22,65% do universo dos conjuntos de pequeno porte (Tabela 10). Os menores conjuntos financiados pelo PAR no período supracitado eram compostos por apenas cinco habitações e foram produzidos na cidade do Rio de Janeiro em 2003. Esses conjuntos de ínfimas dimensões são: o Condomínio João Homem Ladeira, o Condomínio Laurinda e o Condomínio Livramento. Já os empreendimentos de grande porte representam 24,33% (237 uh) do total de conjuntos financiados pelo PAR entre 1999 e 2003. Esses conjuntos, por sua vez, estão, na maioria das vezes, – 62,02% (147 uh) – implantados na região Sudeste, onde também foi financiado o maior empreendimento do PAR, o Residencial Vargem das Flores, localizado na cidade de Betim, em Minas Gerais, composto por 500 unidades habitacionais. TABELA 10 Dimensão dos conjuntos do PAR por região entre 1999 e 2003 (o ano é de assinatura do contrato) Região Unidades habitacionais Sudeste Nordeste Sul Centro-Oeste Norte TOTAL (abs) TOTAL (%) Menor que 160 uh 281 267 111 61 17 737 75,66 Maior que 161 uh até 500 uh 147 43 25 15 7 237 24,33 TOTAL (abs.) 428 310 136 76 24 974 100,00 TOTAL (%) 43,95 31,83 13,96 7,8 2,46 100,00 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005) Nota: Elaboração da autora É importante salientar, ainda, que os conjuntos produzidos são predominantemente formados por blocos de edifícios, pois através do adensamento dos terrenos seria possível produzir nos vazios urbanizados que, em geral, apresentam um preço mais alto, como já comentado. Capítulo III ____________________________________________________________________ 128 Em suma, a produção habitacional do PAR se diferencia bastante da produção empreendida pela política do BNH. Isso teoricamente significa que o modelo periférico de implantação das habitações promovido anteriormente vem sendo substituído pelo modelo apregoado pelo PAR, que consiste na construção de conjuntos de pequeno porte (compostos por até 160 unidades), com o objetivo de estimular a implantação em vazios urbanos, criados ao longo da expansão das cidades. Por fim, com a finalidade de ilustrar com exemplos concretos essa produção do PAR, apresentando a forma tipológica e a forma de implantação dos seus conjuntos, foram selecionados alguns empreendimentos financiados por esse programa e distribuídos no território nacional, os quais subsidiarão a análise da produção do programa na capital paraibana, no Capítulo V. 3.2.1 CARACTERÍSTICAS LOCACIONAIS E TIPOLÓGICAS DA PRODUÇÃO DO PAR NO TERRITÓRIO NACIONAL Em virtude das exigências do PAR, sua produção apresenta características tipológicas e locacionais que se repetem com bastante freqüência entre os conjuntos, como será verificado a seguir, apesar da proposta de regionalização contida no “Manual de especificações mínimas”, que incentivava uma pequena diversificação na produção. 3.2.1.1 Região Sul Como já foi demonstrado na Tabela 6, entre 2000 e julho de 2005, na região Sul do país a CAIXA financiou 186 empreendimentos, que totalizaram 23.984 unidades, ou seja, 13,54% do total de habitações financiadas pelo PAR no âmbito nacional. No Rio Grande do Sul, por seu turno, a produção se manifestou na construção de 69 conjuntos, com 10.856 habitações, distribuídas em cidades como Porto Alegre, Pelotas, Canoas, Novo Hamburgo, São Leopoldo, Charqueadas, Gravataí, Taquara, Viamão, etc. Mais especificamente na região Sul, será considerado o conjunto Laçador, localizado no município de Pelotas. Em 2002, foi assinado o contrato de financiamento do empreendimento, que é um dos conjuntos mais significativos da produção do PAR na cidade, motivo pelo qual se tornou objeto de estudo de Medvedovski (2005). Segundo essa autora, o conjunto Laçador está implantado em uma zona de expansão da cidade (modelo periférico de implantação) e é composto por 120 unidades, distribuídas em três blocos interligados. Nesse empreendimento, foram adotadas algumas soluções tipológicas que já Capítulo III ____________________________________________________________________ 129 haviam sido introduzidas nos conjuntos dos Institutos de Aposentadoria e Pensões, quais sejam: a construção de blocos lineares e limitados na altura até o quarto pavimento e a inter-relação entre a arquitetura e o urbanismo. Essa inter-relação, característica do modernismo, surgiu com o objetivo de modificar “a noção de público e privado, rompendo-se as fronteiras que os separavam e criando-se a noção de que não se habita apenas a casa e sim um conjunto de equipamentos e serviços coletivos”, conforme escreveu Bonduki (2002, p.148-149). No conjunto Laçador, a inter-relaçao entre arquitetura e urbanismo foi promovida através da implantação dos edifícios. Estes foram implantados ao longo da testada do lote (respeitando-se o recuo, que foi ajardinado), o que resultou em um conjunto de blocos dispostos em formato “L”, seguindo, na mesma medida, o formato do próprio lote. Devido a essa forma de inserção no terreno, os blocos, sem recortes, exercem o papel de delimitadores entre os espaços público e privado no conjunto, entretanto a inexistência de um outro elemento físico que proporcione tal separação entre os espaços causou a insatisfação dos arrendatários, de acordo com Medvedovski (2005). Os moradores, sobretudo aqueles que moram no pavimento térreo, alegam que a falta de um elemento delimitador, seja um muro, seja uma cerca, aumenta a insegurança e tira a privacidade dos seus apartamentos (Figuras 12 e 13). Ademais, o conjunto é composto por uma área comunitária, com quadra poliesportiva, portanto reproduzindo o conceito afirmado por Bonduki (2002), de que “não se habita apenas a casa”, mas também uma série de equipamentos coletivos. Figura 12: Implantação do conjunto Laçador Fonte: MEDVEDOVSKI (2005) Figura 13: Relação entre público e privado no conjunto Laçador Fonte: MEDVEDOVSKI (2005) Outro aspecto a ser ressaltado é a preocupação que houve com a plasticidade arquitetônica, evidenciada nas circulações verticais pintadas de vermelho e na própria volumetria do conjunto de edifícios. Essa volumetria é bastante simples – blocos pintados, sem recortes volumétricos e com cobertura duas águas –, havendo de diferencial uma Capítulo III ____________________________________________________________________ 130 dinâmica, que é proporcionada pelo desalinhamento entre os blocos, que ameniza a monotonia da paisagem do conjunto. De forma geral, constatou-se nesse conjunto, uma preocupação com a forma tipológica e com a inserção do edifício na cidade, o que o diferencia do modelo de produção do BNH, o qual, devido a sua escala e sua inserção periférica, não tinha tais preocupações. 3.2.1.2 Região Sudeste De todas as regiões brasileiras, o Sudeste é onde a produção habitacional do PAR mais se desenvolveu, abrangendo 45,41% (80.453 uh) do total de unidades financiadas no país entre 1999 e julho de 2005. Dos estados pertencentes a essa região, São Paulo é o que deteve o maior número de novas unidades construídas, ou seja, 56,34% (45.330 uh) do universo da região. Comparando-se, ainda, com a produção nacional, sozinho o estado de São Paulo produziu 24,12% (295) de todos os empreendimentos e 25,56% (45.330 uh) de todas as unidades financiadas pelo PAR no país. Conforme citado anteriormente, na cidade de São Paulo a produção do PAR enfrentou dificuldades devido ao elevado custo da terra urbana, motivo pelo qual foi necessária a intervenção da COHAB, selecionando e indicando terrenos. Além disso, a COHAB atuou de outras formas para viabilizar a produção, quais sejam: […]; promoveu licitação para a escolha das construtoras; elaborou e analisou projetos e acompanhou seus licenciamentos; propôs e obteve a aprovação para adequações à realidade da cidade de São Paulo de normas e critérios estabelecidos para o PAR, como por exemplo, a aceitação de edifícios com elevadores, anuência para maior número de unidades em um determinado perímetro da cidade, adequação dos valores limite do programa aos preços de terra e construção verificados na cidade, entre outros; executou obras de infra-estrutura em áreas nas quais havia essa necessidade (Itaquera IV e Valo Velho II); assumiu o trabalho social; promoveu a regularização fundiária e fiscal dos terrenos que foram alienados ao FAR, encaminhando para isso, inclusive, a aprovação de Projeto de Lei de Isenção e Remissão de Débitos de IPTU; sobretudo, efetuou a gestão do programa, com o acompanhamento e coordenação das atividades sob responsabilidade dos vários agentes envolvidos (projetistas, construtoras, etc.) (PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2004b, p.33). A produção habitacional do PAR em São Paulo foi marcada também pela viabilização de projetos de reforma de prédios abandonados no centro da cidade, em parceria com a Secretaria da Habitação e Desenvolvimento Urbano do Município de São Paulo (SEHAB) e movimentos sociais, como será explanado no final deste capítulo. Diante dos fatos apresentados, pode-se dizer que o processo de produção do PAR na capital paulista se diferencia da produção efetivada em muitos outros municípios, Capítulo III ____________________________________________________________________ 131 pois apresenta particularidades, entre as quais se enfatiza a intensa atuação da COHAB, que assumiu muitas responsabilidades no programa, inclusive atividades administrativas (organização e coordenação de ações e agentes); no caso, restando à CAIXA o papel de agência financeira. Isso mostra a flexibilidade da CAIXA nesse programa, podendo atuar de forma mais ou menos intensa, dependendo da necessidade do local. Outra particularidade encontrada na capital paulista foi a maior diversidade tipológica da produção do programa, observada a partir do Relatório de Gestão 2001-2004 da Prefeitura de São Paulo (2004b), com base no qual foi possível listar algumas tipologias empregadas na cidade. O tipo comumente adotado é a da edificação com a altura limitada até cinco pavimentos, como o conjunto José Bonifácio e o conjunto Valo Velho II, mostrados nas Figuras 14 e 15, respectivamente. Como o custo da terra urbana nessa região é mais elevado, pode-se dizer que há uma forte pressão no sentido de promover um maior adensamento, e, por conseguinte, reduzir o custo unitário da unidade habitacional (que, ainda assim, apresenta uma média maior que nas demais regiões). Por isso, na região Sudeste, assim como na Sul, são permitidos edifícios com mais de quatro pavimentos, diferentemente do modelo de edifícios de quatro pavimentos, recorrente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Observando-se, ainda, as Figuras 14 e 15, percebe-se que, além do mesmo número de pavimentos, outro aspecto em comum aos dois conjuntos é a cobertura dos edifícios, para a qual se optou pelo telhado aparente. Figura 14: Conjunto José Bonifácio Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO (2004b) Figura 15: Conjunto Valo Velho II Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO (2004b) Especificamente, o Valo Velho II é um conjunto de grande porte e um dos poucos que é composto por 500 moradias, estas distribuídas em dez blocos de apartamentos. Cada bloco, por sua vez, contém 50 unidades habitacionais, de maneira que Capítulo III ____________________________________________________________________ 132 cada pavimento possui dez moradias. A variedade cromática empregada nos prédios é também motivo de destaque desse conjunto. Já o conjunto José Bonifácio é composto por 140 unidades habitacionais, distribuídas em quinze blocos. A organização espacial adotada para os edifícios desse conjunto foi do tipo quatro habitações para cada um dos cinco pavimentos (PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2004b). Seguindo a mesma solução de planta, o conjunto Barro Branco II também conta com apenas quatro habitações em cada um dos cinco pavimentos, somando, no total, 200 unidades no conjunto. Este é composto por 10 blocos de apartamentos, em forma de paralelepípedos – sem recortes e com platibanda – em que se fez uso de grafismos na fachada, na tentativa de compensar a volumetria simples (Figura 16). É importante mencionar, ainda, o fato de que, apesar de a maioria dos edifícios ser limitada na altura até o quinto pavimento, também se verificou a construção de prédios com dez pavimentos, como o conjunto Santa Etelvina II, cuja obra foi concluída em 2005 (Figura 17). Esse conjunto é composto por 280 unidades, distribuídas em sete blocos de apartamentos. No mesmo sentido que outros conjuntos do PAR supracitados, a solução de planta adotada para o prédio do Santa Etelvina foi aquela em que se agrupam em um único pavimento quatro unidades (PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO, 2004b). Figura 16: Conjunto Barro Branco II Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO (2004b) Figura 17: Conjunto Santa Etelvina II A Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO (2004b) Enfim, constata-se que, na capital paulista, a produção se caracterizou pela diversidade tipológica encontrada nos conjuntos construídos: algumas edificações são mais altas, outras mais baixas; algumas têm platibanda, outras têm telhado aparente; e muitas adotam a solução de planta de quatro unidades por pavimentos. Não obstante as diferenças encontradas (sejam elas de qualquer natureza), a produção do PAR apresentou em comum o grafismo nas fachadas e a variedade cromática nos edifícios. Capítulo III ____________________________________________________________________ 133 3.2.1.3 Região Nordeste Alagoas/Maceió Dentre os empreendimentos construídos ou ainda em construção, a Região Nordeste detém, em unidades, mais de 30% (53.691 uh) da produção nacional entre 1999 e julho de 2005. Nessa região, o estado de Alagoas apresentou uma significativa produção no período, representada pela construção de 8.567 moradias, distribuídas em 46 empreendimentos, que estão na maioria dos casos concentrados na capital alagoana (apenas três conjuntos – 296 uh – localizavam-se em Arapiraca). Dessa produção alagoana, merece especial atenção o conjunto Galápagos, cujo contrato de financiamento da construção foi assinado em 2002 e foi destacado na revista de arquitetura Projeto Design71. O conjunto de 128 habitações se localiza na cidade de Maceió e foi implantado no lote de forma que os seus dez blocos de apartamentos, os quais são interligados pelas circulações verticais, formaram três pátios internos, onde está inserido o espaço comunitário, composto por coretos e playgrounds. Assim, com esse arranjo espacial, aqui se verificou uma forte separação entre o público e o privado, promovida por duas barreiras espaciais: primeiro a do estacionamento, seguida pelos próprios blocos. Estes funcionam como delimitadores entre o espaço de lazer e o espaço dos automóveis, que circunda o terreno (Figura 18). Legenda: 1. estacionamento; 2. acesso ao pátio interno; 3. escadas; 4. jardim / playground; 5. coreto; 6. edifício Figura 18: Implantação do conjunto Residencial Galápagos Fonte: N.C. (2003) Os edifícios são blocos retangulares sem recortes volumétricos, pintados externamente e limitados na altura até o quarto pavimento, assim como a maior parte dos conjuntos financiados pelo programa. Embora os blocos apresentem uma solução formal 71 Ver N. C. Jogo de cores cria ilusão de volumetria e acentua expressão arquitetônica. Projeto design, São Paulo, n° 281, p.44-47, jul. 2003. Capítulo III ____________________________________________________________________ 134 simples – um paralelepípedo –, a pintura do conjunto Galápagos, com desenhos geométricos, buscou uma intenção plástica, promovendo uma ilusão visual de volumetria nos blocos (Figura 19). Outro aspecto diferenciador nesse conjunto diz respeito aos métodos construtivos empregados, como a estrutura independente de concreto pré-moldado e a estrutura metálica nas circulações. Esses dois elementos, em conjunto, favoreceram uma maior rapidez na execução da obra, demonstrando a preocupação com a racionalização e o barateamento da construção, características que advém do movimento moderno, utilizadas tanto nos conjuntos dos IAPs quanto nos conjuntos do BNH, e agora reproduzidas no PAR (Figura 19). Já a solução de planta adotada no empreendimento seguiu o programa de necessidades mínimo do PAR, composto por sala, cozinha, dois quartos e banheiro, totalizando uma área privativa de 42m² (Figura 20). Devido à dimensão das unidades, alguns cômodos são pequenos, como a cozinha, onde praticamente inexiste espaço para a área de serviço. Enfim, o que se pode perceber nesse conjunto é uma maior preocupação com o aspecto plástico dos edifícios, representado pelos grafismos e estruturas metálicas. Figura 19: Vista externa dos blocos habitacionais do conjunto Galápagos Fonte: N.C. (2003) Figura 20: Planta baixa das unidades habitacionais do conjunto Galápagos Fonte: N.C. (2003) O Condomínio Costa Dourada é outro conjunto do PAR em Maceió. O contrato de financiamento para a sua construção data de 2000, e ele é composto por 112 unidades habitacionais, distribuídas em blocos de quatro pavimentos (levantamento realizado na CAIXA, 2005). Esses blocos, com platibanda, são multicromáticos, conforme ilustra a Figura 21. Outros aspectos interessantes desse condomínio, mas também encontrados em outros Capítulo III ____________________________________________________________________ 135 conjuntos do PAR em Maceió, são a intenção volumétrica e as esquadrias, que apresentam bandeira inferior, com a finalidade de proporcionar mais iluminação aos ambientes. Já o conjunto Residencial José Bernardo, de 2003 (ano referente à assinatura do contrato de financiamento da construção), é composto por 192 habitações e contém blocos com uma certa intenção volumétrica. Ademais, diferentemente dos exemplares acima citados, é coroado com telhado aparente (Figura 22). Verifica-se, portanto, que tanto o Costa Dourada quanto o José Bernardo contam com uma pequena variação na volumetria, fugindo do paralelepípedo sem recortes, como é o caso do Residencial Galápagos. Figura 21: Conjunto Costa Dourada Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 22: Conjunto Residencial José Bernardes Fonte: Acervo da autora (2006) Também foram financiados, em Maceió, conjuntos formados por unidades geminadas, como pode ser observado na Figura 23. Assim sendo, constata-se, na capital alagoana, uma pluralidade tipológica na produção do PAR. Figura 23: Conjunto formado por unidades geminadas em Maceió Fonte: Acervo da autora (2006) Capítulo III ____________________________________________________________________ 136 Pernambuco/Recife Em Pernambuco, a produção do PAR também foi significativa, embora quantitativamente inferior à do estado de Alagoas. Foram financiadas, entre 1999 e julho de 2005, 4.404 novas moradias, divididas em 32 conjuntos habitacionais, que se localizam em diversas cidades pernambucanas, especialmente as que compõem a região metropolitana do Recife, como o próprio Recife, Olinda e Jaboatão dos Guararapes. Em Recife, foram considerados, para o presente estudo, dois conjuntos – o Residencial Izabel Urquiza e o conjunto Residencial Barbosa Lima Sobrinho –, ambos administrados pela mesma empresa que administra os empreendimentos do PAR na Paraíba. Através do endereço eletrônico daquela empresa, foi possível identificar algumas características dos dois exemplares72 (Figuras 24 e 25). Figura 24: Entrada do Residencial Izabel Urquiza Fonte: Site da Administradora (2006) Figura 25: Entrada do conjunto Residencial Barbosa Lima Sobrinho Fonte: Site da Administradora (2006) Conforme o levantamento feito na CAIXA (2005), ambos os conjuntos tiveram seu contrato de financiamento referente à construção iniciado no ano de 2001. O Residencial Izabel Urquiza é composto por 72 unidades, e o Conjunto Residencial Barbosa Lima Sobrinho composto por 48 habitações. De um modo geral, os dois conjuntos apresentam características tipológicas em comum: os blocos de apartamentos apresentam altura limitada, contando com quatro pavimentos, e as unidades possuem basicamente o mesmo programa de necessidades, ou seja, sala, dois quartos, banheiro, cozinha e área de serviço, distribuídas em uma área igual a 42m². Por outro lado, a principal diferença é a organização dos apartamentos em cada bloco. Enquanto o Izabel Urquiza adotou a solução 72 http://www.mgimobiliaria.com.br/extranet/busca.php?intTipo=15&strLocal=&intArea=&intArea2=&intVa lor=&intValor2=&action=searchImovel&Submit.x=6&Submit.y=9 (23/07/06) http://www.mgimobiliaria.com.br/extranet/arquivos.php?intId=344 (23/07/06) Capítulo III ____________________________________________________________________ 137 de planta composta por quatro unidades por pavimento, o Residencial Barbosa Lima Sobrinho foi projetado contendo seis moradias em cada pavimento, resultando em blocos volumetricamente distintos. As diferenças na volumetria se referem também ao coroamento dos edifícios, pois um conjunto adotou um bloco sem recortes e com uma platibanda na cobertura, ao passo que o outro foi projetado com uma certa volumetria e telhado aparente. Embora não tenha havido a intenção de explorar a volumetria (esta é, muitas vezes, fruto da planta baixa dos apartamentos, resultando em blocos simples em forma de paralelepípedos), nesses conjuntos, pode-se notar uma preocupação plástica, pela utilização de grafismos nas fachadas. O Izabel Urquiza é um bom exemplo disso. O arquiteto utilizou distintas cores nas fachadas, a fim de proporcionar certa “volumetria” ao paralelepípedo. Além disso, para evitar a repetição cromática e, conseqüentemente, a monotonia visual, usou diferentes cores em cada edifício, como pode ser observado na Figura 26. Figura 26: Blocos pintados de diferentes cores no Residencial Izabel Urquiza Fonte: Site da Administradora (2006) Enfim, os poucos exemplos aqui demonstrados vêm a somar, no conjunto de empreendimentos do PAR, corroborando a tendência para a produção de blocos de apartamentos de quatro pavimentos, muitas vezes pintados com grafismos nas fachadas. Rio Grande do Norte/Natal No Rio Grande do Norte, a produção habitacional do PAR deu-se em proporção menor que dos estados de Alagoas e Pernambuco, porém não menos importante. A partir do levantamento feito na CAIXA (2005), constatou-se que o programa começou a atuar nesse estado apenas no ano de 2000, que se revelou o ano mais produtivo. Até julho de 2005, o PAR financiou 1.404 novas moradias, distribuídas em 11 empreendimentos, dos Capítulo III ____________________________________________________________________ 138 quais 10 se concentravam na capital potiguar. Em 2006, mais três conjuntos foram financiados, sendo um em Parnamirim e dois em São Gonçalo do Amarante. Considerando-se apenas os conjuntos construídos em Natal até o ano de 2004, estes estavam pulverizados em todas as zonas da cidade – Norte, Sul, Leste e Oeste –, ocupando lotes ou vazios urbanos deixados pela expansão urbana, extensiva e descontínua. A maioria desses conjuntos, todavia, foi implantada em zonas de expansão mais recentes da cidade, ou seja, nas áreas que foram impulsionadas, sobretudo, sob a influência da política do BNH, como as zonas Norte e Oeste (Figura 27). Na região Leste, onde estão os bairros mais antigos da cidade, foram encontrados dois empreendimentos do PAR, o Residencial Ribeira I (2000) e o Ribeira II (2001), ambos implantados nas Rocas, bairro composto por uma população residencial de mais baixa renda. Os conjuntos estão localizados em uma área degradada do bairro, motivo pelo qual o preço do lote é mais baixo (terreno desvalorizado no mercado imobiliário), possibilitando a construção de habitações do PAR e, ao mesmo tempo, incentivando e promovendo o uso residencial em uma área próxima ao centro urbano, o que é um dos objetivos do programa. Figura 27: Delimitação dos bairros da cidade de Natal Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DO NATAL (2006) Nota: Elaboração da autora As Figuras 28 e 29 ilustram a inserção dos conjuntos Ribeira I e Ribeira II no espaço urbano, de maneira que se vêem os elementos que, do ponto de vista do mercado imobiliário, desvalorizam e degradam a área, como a subestação de energia e as favelas que circundam os conjuntos. Como se localizam em área central e já consolidada, onde não há possibilidade de encontrar extensos terrenos (como nas periferias e zonas de recente expansão), os lotes são de pequenas dimensões e, por conseguinte, os conjuntos de porte reduzido. Zona leste Zona sul Zona oeste Zona norte Capítulo III ____________________________________________________________________ 139 Figura 28: Entorno do Residencial Ribeira I Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 29: Entorno do Residencial Ribeira II Fonte: Acervo da autora (2006) Em relação à dimensão do terreno, é interessante destacar a influência que ela exerce na forma como as unidades são implantadas e construídas. O Residencial Ribeira I adotou a solução de construir um conjunto em terrenos diferentes (separados, inclusive, por uma avenida de acesso). Dessa maneira, um lote do conjunto é composto por três blocos e, no outro lote, ficou inserido mais um bloco, totalizando quatro edifícios no empreendimento. Além disso, o tamanho do terreno, aliado ao seu custo, impõe uma forte pressão para a verticalização das unidades, não apenas nas Rocas, mas nas demais zonas da cidade, tendo em vista que a maioria dos empreendimentos do PAR é formada por edifícios (dos 10 conjuntos considerados em Natal, sete são do tipo multifamiliar). O Residencial Ribeira I e o Residencial Ribeira II foram construídos pela mesma empresa construtora, que, visando ao barateamento do custo do empreendimento, utilizou o mesmo projeto arquitetônico, mudando apenas as cores utilizadas nas fachadas. Os edifícios têm a forma de paralelepípedos, marcados por janelas de pequenas dimensões e por um grafismo na fachada, que tenta compensar a volumetria simples do bloco. As características desses conjuntos são encontradas com bastante freqüência nos outros conjuntos do PAR espalhados pela cidade. Vale salientar, ainda, que alguns edifícios do PAR não apresentam revestimento externo – são somente pintados –, o que objetiva a redução do custo da construção (Figuras 30 e 31). De forma geral, os edifícios dos conjuntos do PAR em Natal se caracterizam por possuírem altura limitada entre três e quatro pavimentos: o Residencial Ribeira II, por exemplo, é composto por três blocos com quatro pavimentos e um bloco com três pavimentos. Verificaram-se também duas soluções de organização espacial dos edifícios até 2004: as plantas compostas por quatro habitações por pavimento (quatro conjuntos) e outra solução, formada por oito unidades a cada pavimento (três conjuntos) (levantamento realizado na CAIXA, 2005). Subestação de energia Favela Capítulo III ____________________________________________________________________ 140 Os apartamentos seguem o programa de necessidades mínimo exigido pelo PAR em uma área média privativa igual a aproximadamente 44,81m². Igualmente, as unidades unifamiliares seguem o mesmo programa de necessidades, no entanto estão inseridas em uma área privativa ligeiramente maior, uma média equivalente a 48,53m². Figura 30: Residencial Ribeira I Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 31: Residencial Ribeira II Fonte: Acervo da autora (2006) Em suma, a produção habitacional do PAR em Natal se caracterizou pela implantação de conjuntos de pequeno porte (o menor empreendimento contém 64 unidades, e o maior 160 moradias), compostos por edifícios e predominantemente localizados na recente zona de expansão desenvolvida, sobretudo, pela política do BNH. 3.2.1.4 Projetos de recuperação de sítios históricos A atuação do PAR na reabilitação de áreas históricas ou centrais vem se desenvolvendo lentamente. Segundo César Ramos73, no Brasil essa vertente contemplou poucas cidades e só se desenvolveu mediante a formação de parceiras, uma vez que o custo da requalificação é ainda alto frente ao valor máximo estipulado para as unidades do PAR (máximo R$ 40.000,00). Na capital baiana, por exemplo, a atuação do PAR só foi possível com o auxílio do Programa Monumenta74, do Ministério da Cultura, de modo que o primeiro programa financiou a parte interna da edificação e o segundo financiou a parte externa, de acordo com César Ramos. 73 Entrevista semi-estruturada realizada com César Ramos, gerente de Projetos do Ministério das Cidades, no I Seminário Internacional das Cooperativas Habitacionais, realizado no Hotel Blue Tree Park, em Natal-RN, entre os dias 28-02-07 e 01-03-07. A entrevista ocorreu no segundo dia do evento. 74 Programa do Ministério da Cultura que revitaliza edificações localizadas nos sítios históricos. Capítulo III ____________________________________________________________________ 141 Em Porto Alegre, o Residencial Umbú, localizado na área central da capital gaúcha, foi reformado para uso habitacional de 123 famílias. Os apartamentos apresentam tipos diferentes, variando entre o kitchenette e um ou dois dormitórios. Como conseqüência, a área média das habitações também varia de 34,56m² a 54,06m². Porém foi na capital paulista que os projetos de revitalização das áreas centrais por meio do PAR se desenvolveram mais enfaticamente. Conforme já foi dito, para viabilizar a produção de moradias pelo programa no centro, fez-se necessário o estabelecimento de algumas parceiras com a SEHAB, além da colaboração dos movimentos sociais: Para conseguir atender à população de mais baixa renda, a SEHAB negociou com o governo federal recursos específicos para subsídios ao PAR, além de ter proposto diversos incentivos fiscais ao programa. Vale notar que, em alguns casos, a SEHAB subsidia parcial ou totalmente o custo de compra do imóvel, para que o custo final da reabilitação seja mais acessível à população de baixa renda. Além disso, para adequar o PAR à realidade específica da área central de São Paulo, a SEHAB elaborou, em colaboração com os movimentos sociais do centro, um conjunto de propostas para melhorar seu desempenho quanto às exigências de qualidade, de custos e de prazos (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2004a, p.31). Assim, segundo a Prefeitura de São Paulo (2004a), até 2004 foram reformadas 464 unidades em cinco edifícios – Rizkallah Jorge (167 uh); Fernão Sales (54 uh); Celso Garcia (84 uh), Maria Paula (75 uh) e Brigadeiro Tobias (84 uh) – e outras tantas unidades (aproximadamente 1.000) vêm sendo executadas ou negociadas pelo PAR. Recentemente, mais um empreendimento dessa natureza foi concluído. O antigo Hotel São Paulo, com 21 pavimentos, foi completamente reformado e abrigará 152 novas famílias ligadas ao Movimento do Fórum dos Cortiços (MORADIA POPULAR NO LUGAR DE HOTEL). As unidades habitacionais desse edifício, assim como o Residencial Umbú (RS), apresentam tipos diferentes, com apartamentos do tipo kitchenette, outros com um e até dois quartos (Figura 32). Em outras cidades do Brasil, a tentativa de reutilização de antigos edifícios vem encontrando sérias dificuldades que impedem a concretização do financiamento. Na capital do Rio Grande do Norte, a Prefeitura Municipal do Natal comprou um edifício no centro histórico – o antigo “Hotel Central” – e desenvolveu um projeto com 8 apartamentos (alguns com um quatro, outros com dois quartos) para serem financiados pelo PAR (Figura 33). Com essa mesma finalidade, a prefeitura também desenvolveu um projeto de reuso habitacional para uma outra edificação no centro histórico – o edifício Valparaíso – prevendo seis unidades habitacionais, com um ou dois quartos. No entanto, a primeira dificuldade encontrada foi a contratação da empresa construtora, pois não há interesse nesse tipo de Capítulo III ____________________________________________________________________ 142 projeto, por se tratar de uma reforma que demanda um investimento de risco, em parte devido a não possibilidade de suplementação de recursos pela CAIXA. Em seguida, a própria CAIXA apresentou uma série de restrições à aprovação do projeto arquitetônico para conceder tal financiamento. Enfim, até junho de 2007, ambos os projetos já tinham construtoras interessadas e estavam na agência financeira, em fase de avaliação. Figura 32: Antigo “Hotel São Paulo”, hoje mais um conjunto do PAR chamado “Edifício São Paulo” Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO (2004c) Figura 33: Antigo “Hotel Central” e possível edifício a ser financiado pelo PAR Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DO NATAL (2007) * * * A descrição das características tipológicas e de implantação dos conjuntos financiados pelo PAR, nas páginas anteriores, sugere alguns pontos encontrados com maior freqüência, os quais são destacados a seguir: x produção com características bastante homogêneas, apesar do incentivo à diversidade tipológica e da pequena diversificação por região. Nessa diversificação destaca-se a quantidade de pavimentos: no Norte e Centro-Oeste só são permitidos até quatro pavimentos, enquanto no Sul e no Sudeste até cinco. Já no Nordeste é possível a construção de edifícios de quatro assim como de cinco pavimentos, porém a segunda opção dificilmente vem se operando; x proposta de regionalização, que vai de encontro ao modelo apregoado pelo Estado desenvolvimentista, em que a produção era universal para todo o país; x conjuntos de pequeno porte (até 160 unidades) implantados de forma bastante fragmentada no espaço urbano. No estágio atual em que as cidades se encontram, com a malha urbana já consolidada, a localização dos conjuntos do PAR, fragmentados nessa Capítulo III ____________________________________________________________________ 143 malha, não geram grandes transformações na estrutura nem tampouco na paisagem urbana; x certo grau de inter-relação entre os aspectos tipológicos e locacionais, como a implantação de alguns equipamentos comunitários, conforme também se verifica no item 3.1.5 – Características tipológicas e construtivas; x empreendimentos formados por edifícios multifamiliares de quatro pavimentos sem elevadores (mas também edifícios com cinco pavimentos no Sul e no Sudeste), de modo geral (apesar do incentivo à diversidade do tipológica). A verticalização objetiva a redução do custo médio dos lotes urbanizados e, por conseguinte, da habitação, produzindo-se em quantidade, para fazer frente ao preço máximo estipulado pelo programa. Em outras palavras, procura-se baratear o custo do empreendimento adensando-se ao máximo o terreno, para a produção de uma maior quantidade de moradias, inseridas no programa de necessidades mínimo exigido, o que resulta em unidades de pequenas dimensões75; x edifícios de volumetria simples, muitos dos quais em forma de paralelepípedos e, para disfarçar esse tipo, uso freqüente de grafismo nas fachadas; x conjuntos construídos com uma maior qualidade construtiva, apesar de se utilizarem algumas técnicas para o barateamento da construção, como o mesmo projeto arquitetônico para mais de um conjunto, a própria tipologia difundida de blocos de edifícios com quatro pavimentos sem elevadores e com volumetria simples, a suplementação de pilotis por unidades no térreo, etc. Pode-se dizer, em síntese, que o Programa de Arrendamento Residencial se preocupa com as questões locacionais, tipológicas e construtivas de sua produção. Ele busca uma forma de produção diversificada, apresentando várias possibilidades de implantação e tipos de habitação, no que a qualidade da construção prevalece. Acredita-se, por fim, que essa maior preocupação se deve primordialmente ao fato de os imóveis permaneceram sob a propriedade fiduciária da CAIXA por, no mínimo, 15 anos, o que consiste na principal diferença do programa. Outras particularidades encontradas foram a facilidade de retomada do imóvel e a contratação de uma empresa privada para gerir os contratos de arrendamento e as taxas de condomínio. O papel da administradora vem como um elemento adicional para tornar o programa mais eficiente administrativamente (do ponto de vista da CAIXA), evitando-se altos níveis de inadimplência. Por fim, as questões acima 75 Essa característica da construção de blocos limitados na altura remonta às indicações elaboradas por Rubens Porto para a proposta de produção dos conjuntos dos IAP, o que demonstra certa “continuidade” desse princípio de racionalização da construção adotado inicialmente pelos institutos. Capítulo III ____________________________________________________________________ 144 expostas resumem a produção do PAR nacionalmente, embora no tocante aos aspectos tipológicos e locacionais seja possível verificar especificidades de uma localidade para outra e de um conjunto para outro. Assim, em busca dessas especificidades, comparou-se a produção do PAR na cidade de João Pessoa com a produção desse programa na capital pernambucana e na capital potiguar. Verificou-se, portanto, que a quantidade de conjuntos e de unidades habitacionais na capital paraibana foi ligeiramente superior à das outras duas até 2003. Assim sendo, em João Pessoa foram financiados 13 conjuntos perfazendo 1.201 unidades, ao passo que em Recife foram financiados 12 conjuntos contendo 1.128 unidades e em Natal 9 conjuntos contendo 1.056 moradias. No entanto, se forem consideradas as regiões metropolitanas (RM), nesse mesmo período, a RM de Recife apresentou uma produção superior à das demais RMs, uma vez que o PAR não apresentou nenhum financiamento nem na região metropolitana de João Pessoa nem na de Natal. Tal fato é explicado principalmente pela seguinte razão: o custo da terra urbana em João Pessoa é inferior ao da terra urbana em Recife e em Natal, onde o mercado imobiliário é bem mais desenvolvido. Esse panorama indica, por fim, que o custo do solo é fundamental para a produção do PAR, motivo pelo qual cidades como João Pessoa, cujo solo ainda não é tão inflacionado, é um bom cenário para o desenvolvimento do programa. Diante desse fato, os próximos capítulos adotam a cidade de João Pessoa como área de estudo desta pesquisa, visando ao estudo de caso do Programa de Arrendamento Residencial no contexto da produção habitacional de uma cidade brasileira. Por fim, em função da escassez de trabalhos acadêmicos sobre esta temática, todas as informações coletadas no presente capítulo são fundamentais para se compreender o programa, especialmente como forma de traçar suas principais características, as quais fornecem elementos essenciais para a análise do PAR mais adiante. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 146 De caráter mais empírico, este capítulo, assim como o próximo, adota como universo de estudo a cidade de João Pessoa, que contém uma população residente de aproximadamente 600.000 habitantes e 151.000 domicílios, conforme dados do Censo 2000. Mais especificamente, mostra como, na prática, se desenvolveram as políticas habitacionais brasileiras, entre 1935 até 2006, descrevendo as características quantitativas e qualitativas dessa produção na capital paraibana, com um enfoque mais exploratório e descritivo. Assim, torna-se possível inserir a produção do PAR no contexto atualizado dessa produção de moradias. O desenvolvimento das políticas habitacionais em João Pessoa até 1964 foi analisado e sistematizado, principalmente, por Lavieri & Lavieri (1999), no artigo A questão urbana na Paraíba, e Cavalcanti (1999), no livro A política habitacional do BNH no Brasil pós-64 e seus reflexos na expansão urbana de João Pessoa. O período pós-BNH, todavia, é pouco estudado, motivo pelo qual há uma escassez de trabalhos que abordam a produção habitacional, via políticas públicas, na cidade, nesse momento histórico. Apesar desse aparente desinteresse, é sabido que a cidade foi contemplada com um significativo volume de unidades produzidas, através de programas do governo federal, dentre os quais se destaca o Programa de Arrendamento Residencial. Fazia-se, portanto, necessária uma pesquisa que revelasse a situação atual da política habitacional na capital paraibana, sistematizando o panorama mais atual. Para a elaboração deste capítulo foram utilizados dados secundários, mas, sobretudo, dados primários. Os dados secundários, coletados na revisão bibliográfica, foram a base para o delineamento do perfil de desenvolvimento da produção do parque habitacional da cidade até 1986, sendo o período posterior traçado a partir dos dados primários, coletados nas pesquisas documental e de campo. A pesquisa documental compreendeu a coleta de dados quantitativos e qualitativos da produção, como a coleta de informações sobre os programas e o levantamento de projetos arquitetônicos no acervo das principais instituições que lidam com a construção de moradias na cidade, quais sejam: a Companhia de Habitação Popular (CEHAP), o Instituto de Previdência do Estado da Paraíba (IPEP), a Fundação de Ação Comunitária (FAC), a Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP) e a Caixa Econômica Federal (CAIXA). Ressalta-se que foram muitas as dificuldades enfrentadas para a sistematização desses dados, em função das informações, por vezes incompletas dos órgãos. Já a pesquisa de campo constou da realização de levantamentos fotográficos, observação in loco e entrevistas semi-estruturadas com representantes dos órgãos competentes. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 147 4.1 A PRODUÇÃO DE MORADIAS NA CIDADE DE JOÃO PESSOA SOB A ÓTICA DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS: DOS IAPS AO BNH Este item da dissertação aborda a atuação das políticas implementadas pelo Estado desenvolvimentista na cidade de João Pessoa, ou seja, aborda, em especial, a produção promovida pelos IAPs (incluindo o IPASE), pela FCP e pelo BNH, na figura de seus principais agentes. Além desses, agentes estaduais como o Montepio do Estado da Paraíba, que se transformou posteriormente no IPEP (ambos com a função voltada à previdência), também participaram do incremento do parque habitacional nesse momento histórico. Inicialmente, entre 1935 e 1963, a atuação conjunta dos IAPs, IPASE, FCP e Montepio resultou na produção de 899 novas moradias, divididas em 15 empreendimentos, considerados de pequeno porte, pois se caracterizavam pela construção de poucas unidades habitacionais. Em outras palavras, a produção de habitações nesse recorte temporal apresenta ações ainda muito tímidas, em relação ao que se conheceu depois, com as ações do BNH (Tabela 11). Devido as suas pequenas dimensões e à restrita abrangência dos agentes públicos quanto à população beneficiada (poucos foram contemplados e geralmente correspondiam a algumas categorias profissionais), os conjuntos foram inseridos em bairros adjacentes ao centro urbano da capital, “não se caracterizando na cidade, neste período, um processo de periferização”, segundo Lavieri & Lavieri (1987, p.25) (Figura 34). Os principais bairros contemplados com essa produção foram: Centro, Tambiá, Torre, Jaguaribe e Expedicionários. Assim sendo, a produção de pequenos conjuntos, aliada à inserção destes em bairros contíguos ao centro, não provocou, no período em questão, grandes transformações estruturais nem tampouco na paisagem de João Pessoa – como viria a ocorrer no período subseqüente (do BNH) –, diferentemente do que ocorria em muitas outras cidades, onde a produção dos IAPs e da FCP foi mais intensa (rever Quadro 1). No entanto, um dos conjuntos financiados nesse período, o Condomínio Presidente João Pessoa, contribuiu para a mudança da paisagem e até de alguns paradigmas do modo de habitar e do modo de construir. Esse condomínio, que é vulgarmente chamando de “18 andares” – uma alusão ao número de pavimentos – foi Capítulo IV ____________________________________________________________________ 148 construído aproximadamente entre 1957 e 1962, sendo financiado pelo IAPB, e seus apartamentos foram todos vendidos, segundo Chaves (2006). Ele representou um marco na paisagem do centro da cidade, sendo a primeira habitação multifamiliar vertical, com características arquitetônicas fundamentalmente modernistas (Figura 35). Os elementos modernistas empregados foram o pilotis, o terraço- jardim, a planta livre, a fachada livre, a solução formal adotada e a valorização dos elementos locais, como o cobogó. A organização espacial (dois apartamentos para cada circulação vertical) é outra característica relevante dessa edificação, que possui dois tipos de apartamentos. O primeiro tipo, situado nas extremidades do bloco do edifício, possui quatro quartos e área de 122,11m², aproximadamente. O segundo – os apartamentos estão implantados no centro do bloco do edifício – possui três quartos e área de 94,27m² (Figura 36). LEGENDA: IAPs FCP Montepio Outros Figura 34: Produção habitacional entre 1935 e 1963 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, e seu objetivo é indicar os bairros contemplados. Os bairros acima assinalados apresentavam pequenas nucleações, que viriam a contribuir no futuro povoamento dos bairros. Muitos, inclusive, não eram bairros consolidados Figura 35: Vista da fachada frontal (norte) do “18 andares” Fonte: Acervo da autora (2005) João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 149 Figura 36: Planta baixa do pavimento tipo que abriga o setor residencial do edifício “18 andares” Fonte: CHAVES (2006) O conjunto citado também introduziu novas formas de morar, como o uso misto (serviços, uso institucional e uso residencial) e a adoção de uma edificação vertical para moradia, os quais contribuíram para a mudança de paradigmas nesse sentido. No modo de construir, a mudança de paradigmas se deu com os processos de racionalização da construção. Em suma, trata-se de um digno exemplar da arquitetura modernista residencial na cidade, reproduzindo, conforme foi identificado no segundo capítulo, muitos elementos utilizados na produção dos IAPs em outras partes do Brasil, como a localização própria dos IAPBs – geralmente no centro – e a construção de edifícios verticais, a planta baixa do pavimento tipo parecida com outras habitações construídas pelos institutos no país, etc. Antes e até mesmo depois do “18 andares”, a produção habitacional via políticas públicas caracterizou-se basicamente pela produção de unidades unifamiliares isoladas no lote, com características que são recorrentes na produção de habitação social, como, por exemplo, o padrão construtivo simples. A arquitetura modernista, amplamente difundida em João Pessoa entre as décadas de 1930 e 1970, aproximadamente, era mais empregada em edifícios institucionais e em residências para a população de maior poder aquisitivo. Por isso o “18 andares” se constituiu num marco da produção estatal de habitação na cidade até os dias atuais. A partir da política do BNH, a produção estatal de moradias transformou-se, sob o aspecto quantitativo, qualitativo e na atuação dos agentes. Alguns dos antigos agentes que participavam da produção até 1963, como o Instituto de Previdência e Assistência aos Servidores do Estado (IPASE), único IAP que resistiu no Brasil, e o Instituto de Previdência do Estado da Paraíba (IPEP), antigo Montepio, continuaram atuando na política do BNH. Outros agentes, todavia, surgiram com a criação do citado banco, como a Companhia de Habitação Popular (CEHAP) e o Instituto de Orientação às Cooperativas Habitacionais (INOCOOP). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 150 A atuação desses agentes, por sua vez, manifestou-se de formas distintas, dos pontos de vista numérico e da forma de implantar os conjuntos no espaço urbano. Observando-se a Tabela 11, verifica-se que, ao longo dos 22 anos de desenvolvimento do BNH, foram produzidas na cidade em torno de 29.668 novas unidades, distribuídas em 42 conjuntos, o que constitui a maior produção de moradias na história da política habitacional de João Pessoa76. A produção desse período histórico foi predominantemente ascendente, e a CEHAP foi o agente que mais se destacou, basicamente por meio da linha de crédito chamada CONSO77. TABELA 11 Resumo do número de unidades nos conjuntos habitacionais produzidas em João Pessoa entre 1937 e 1986 Recorte temporal TOTAL Agentes Até 1963 1967-69 1970-74 1975-79 1980-84 1985-86 IAPs / FCP 385 / 230 - - - - - 615 IPASE 50 628 - 50 - - 728 IPEP / IPASE - 413 - - - - 413 Outros 107 - - - - - 107 Montepio / IPEP 127 662 - 466 2.226 4.401 7.882 CEHAP - 630 1.973 3.176 6.113 5.260 17.152 INOCOOPs - - 293 901 2.476 - 3.670 TOTAL 899 2.333 2.266 4.593 10.815 9.661 30.567 TOTAL 899 29.668 30.567 Fonte: TADEI e DUAYER apud LAVIERI & LAVIERI (1999); levantamento realizado na CEHAP (2006); e no IPEP (2006) Nota: Elaboração da autora De fato, conforme mostra a Tabela 11, do ponto de vista quantitativo, a produção habitacional do BNH transformou o perfil de produção na cidade, apresentando-se muito diferentemente do que era no período anterior. A diferença também se estende para o lado qualitativo da produção. Os conjuntos financiados pelo BNH eram, de modo global, considerados de grande porte, contendo centenas de unidades. Essa dimensão foi um dos motivos que resultaram no modelo periférico de expansão, usualmente em bairros distantes, onde havia grandes glebas urbanas a baixo custo para a produção em larga escala – um 76 Segundo Lavieri & Lavieri (1999), foram também financiadas 6.847 unidades habitacionais isoladas pelo SFH, entre 1966 e 1983, provavelmente pelo SBPE. 77 CONSO significa “Carteira de Operações de Natureza Social”. Outro programa da CEHAP é o FICAM – Programa de Financiamento da Construção, Conclusão, Ampliação ou Melhoria de Habitação de Interesse Social – criado em 1977 no âmbito do PLANHAP (FINEP, 1985). Esse programa consiste em um crédito isolado que financia habitações em terrenos individuais, em especial. Em resumo, CONSO, FICAM, Terrenos Isolados e Emergência são os programas do governo do estado que operam com recursos federais: os três primeiros operam basicamente por meio do FGTS, e o Emergência opera com recursos a fundo perdido. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 151 dos objetivos da política do BNH. Então, face ao grande número de novas habitações construídas com esse novo modelo de implantação instaurado, a cidade passou por significativas transformações na estrutura e na paisagem urbana78. A estrutura urbana de João Pessoa sofreu uma acentuada expansão dos seus limites, sobretudo na direção sudeste, onde estava a maioria dos bairros contemplados com a implantação daqueles conjuntos. De 15km² em 1960, a cidade cresceu para 106km² em 1980 (PDTU/PMJP apud CAVALCANTI, 1999). Esse crescimento ocorreu através de uma ocupação descontínua, criando um tecido urbano também descontínuo e em forma de “colcha de retalhos” e gerando distâncias e obstáculos a uma ocupação urbana racional (SILVEIRA, 1997)79. Além disso, o modelo periférico de expansão desencadeou um processo de seletividade e estratificação social, criado pelos próprios agentes, segundo as especificidades do próprio SFH. O INOCOOP e o IPASE implantaram seus conjuntos em bairros de melhor padrão (na zona leste, por exemplo), atendendo a uma classe de maior renda, comparando-se com os demais; o IPEP pulverizou seus conjuntos em várias áreas da cidade, embora nos últimos anos tenha adotado predominantemente as localizações a sudeste. Já a CEHAP, que atendeu a uma clientela de menor poder aquisitivo, inseriu a maioria dos seus empreendimentos no eixo sudeste – como foi o maior produtor do período em estudo, também foi o maior indutor da expansão da cidade nessa direção. É importante mencionar que a atuação predominante da CEHAP na região sudeste foi fruto do estoque de terras que o governo do estado tinha naquela localidade (Figura 37). Ademais, conforme Jovanka Cavalcanti (1999), verificou-se freqüentemente a ausência de infra-estrutura nos conjuntos habitacionais financiados pelo BNH, como falta de pavimentação e de saneamento básico e precários serviços de abastecimento de água e de transportes urbanos coletivos (Figura 38). Esse fato resultou do sistema de funcionamento da política, o qual encarregava todas as instituições (CEHAP, IPASE, IPEP e INOCOOP) apenas da construção das casas e deixava sob a responsabilidade dos órgãos municipais e estaduais a elaboração e execução dos equipamentos comunitários e da infra-estrutura. 78 É bem verdade que outros processos contribuíram, paralelamente, para essa transformação na estrutura urbana, como a instalação do distrito industrial, do campus universitário, e a construção do anel viário, com as BRs. Todas essas obras também se localizavam em áreas periféricas nas direções sul e sudeste, integrando o modelo periférico de expansão. 79 A produção de conjuntos habitacionais na periferia expandiu intensamente a cidade de João Pessoa e, conseqüentemente, gerou uma urbanização com baixa densidade – 26,0609hab/ha, segundo o IDEME (2001). A baixa densidade, entretanto, é também provocada pelas características do sítio geográfico da cidade, como a presença do vale do rio Jaguaribe e da mata do Buraquinho. Confrontando-se com a densidade da cidade, o Plano Diretor do Município (1992) prevê densidades brutas para cada zona adensável variando entre 120 e 150 hab/ha. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 152 Corriqueiramente, o estado e a prefeitura alegavam falta de recursos, e os conjuntos ficavam completamente abandonados durante anos, gerando insatisfação nos moradores, conforme foi constatado por Cavalcanti (1999). LEGENDA: IPASE CEHAP IPEP INOCOOP Figura 37: Produção habitacional entre 1967 e 1986 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado. Figura 38: Parte do conjunto Brisa Mar ainda sem pavimentação nos dias atuais Fonte: Acervo da autora (2005) Do ponto de vista tipológico, a produção do BNH se caracterizou pela construção em larga escala de unidades unifamiliares (seja a casa isolada, sejam as geminadas), que contribuiu para a expansão horizontal da cidade80. Verificou-se também uma variedade no programa de necessidades no que tange à quantidade de dormitórios (havendo unidades com um, dois e até três quartos) bem como na área média privativa de cada tipo habitacional (variando entre 20 e 60m²). Portanto, não houve uma predominância marcante 80 Segundo dados do Censo 2005, na Paraíba 92,3% dos domicílios são casas, ao passo que 6,3% são apartamentos e 1,4% são cômodos. Essa predominância da casa é também reflexo da política do BNH, que privilegiou a construção desse tipo de habitação. Não se pode esquecer da disseminação da autoconstrução de casas nas favelas e loteamentos irregulares. João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 153 no tipo de moradia, de modo que essa produção ofereceu à cidade uma certa heterogeneidade no espaço construído (Figuras 39 e 40). Figura 39: Tipo habitacional do conjunto Brisa Mar nos dias atuais, com as características da arquitetura original ainda bastante preservadas Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 40: Vista frontal do tipo PB.23 – geminada e duplex – do conjunto Mangabeira I, nos dias atuais, com as características da arquitetura original ainda bastante preservadas Fonte: Acervo da autora (2006) A questão ideológica também se fez presente na produção habitacional do BNH, fato que se observa na denominação dos conjuntos construídos na capital paraibana. Ao longo das décadas de 1960 e 1970, a maioria dos conjuntos produzidos pela CEHAP recebeu o nome de governantes locais ou nacionais do regime militar – conjunto Castelo Branco, Ernesto Geisel, Costa e Silva, por exemplo –, a fim de se mostrar à população a atuação dos governos na questão habitacional. Só na década de 1980 e, principalmente, na de 1990, é que muitos dos novos conjuntos passaram a ser denominados com outros nomes que não eram de políticos influentes. Esses fatos ilustram os objetivos que a política do BNH procurava alcançar: promover a ordem social, ofertando casa própria, e a legitimação do poder do Estado, por meio da construção de conjuntos de casas, inclusive divulgando os nomes dos políticos. 4.2 A PRODUÇÃO DE MORADIAS NA CIDADE DE JOÃO PESSOA SOB A ÓTICA DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS PÓS-BNH ATÉ 1989 Conforme já foi mencionado no Capítulo II, com o fechamento do BNH o país se viu sem uma política habitacional e passou por um período de transição que perdurou até 1989. Nesse intervalo de tempo, houve, por conseguinte, uma acentuada queda na Capítulo IV ____________________________________________________________________ 154 produção estatal de moradias, em nível nacional. Na cidade de João Pessoa não foi diferente. Segundo informações obtidas de técnicos das instituições envolvidas com a questão de habitação na cidade, nesse período foram construídas 1.454 novas moradias, distribuídas em dois conjuntos do IPEP (Valentina II e Funcionários III), e 92 unidades no conjunto Radialistas, da CEHAP, totalizando 1.546 novas habitações. De fato, esse período correspondeu à menor produção habitacional realizada pelos agentes públicos, em quase 20 anos (desde o primeiro intervalo da produção do BNH – 1967-1969 –, não havia uma produção tão baixa), na capital paraibana (Tabela 12). É importante mencionar que a ínfima produção da CEHAP deveu-se, em especial, às restrições impostas às COHABs, durante o governo de Sarney, para se adequarem às novas condições financeiras do país, as quais afetaram a capacidade de produção do agente público estadual. Nesse período ocorreu também uma transformação na essência do INOCOOP: de instituição de caráter eminentemente público, ele passou para a iniciativa privada, em 1986, motivo pelo qual não se fará referência a ele nas páginas seguintes, que enfocam a produção estatal de moradias. No tocante às características locacionais e tipológicas dessa produção promovida pelos agentes públicos, pode-se afirmar que foram as mesmas do modelo apregoado pelo BNH, ou seja, prosseguiu-se com o modelo periférico de expansão, predominantemente na direção sudeste e, de modo mais específico, nos bairros de Valentina e Funcionários III. Apesar de a produção aqui comentada ter sido reduzida em relação à do período anterior, ela não se resumiu apenas àquelas 1.546 unidades do IPEP e da CEHAP. Como, a partir de 1986, as atribuições do BNH passaram para a responsabilidade da CAIXA, fez-se um levantamento dos financiamentos oferecidos por esta em relação à produção de conjuntos habitacionais. Com isso, constatou-se que a CAIXA financiou, em 1989, 791 novas habitações, distribuídas em cinco empreendimentos, a maioria dos quais foi financiada com recursos da poupança (SBPE), via Programa Plano Empresário, voltado para a iniciativa privada e sem a intermediação de agentes públicos. Apenas um empreendimento (dos cinco) foi financiado com recursos do FGTS (PROHAP privado): trata- se do Funcionários IV, no bairro de mesmo nome, que conta com 573 unidades, o que representa mais de 72,44% do total de moradias financiadas pela CAIXA nesse período. Ressalte-se, ainda, que a produção do conjunto Funcionários IV foi coordenada pela Capítulo IV ____________________________________________________________________ 155 CEHAP, apesar de o financiamento ter-se destinado a um agente privado (Tabela 12 e Figura 41)81. Diferentemente da produção promovida pelos agentes públicos nesse mesmo recorte temporal, os empreendimentos financiados pela CAIXA, com recursos da poupança (CAIXA/POUPANÇA), caracterizaram-se pela produção de prédios de diferentes padrões construtivos e localizados em diferentes áreas da cidade (Tambaú e Bancários), com status sociais distintos, uma vez que também se destinavam a um público de maior poder aquisitivo (geralmente classe de renda média) (Figura 41). LEGENDA: CEHAP IPEP CAIXA/POUP. CAIXA/FGTS Figura 41: Produção habitacional entre 1987 e 1989 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado. Nota: Não foi identificado o conjunto Radialistas, produzido pela CEHAP 81 Com base em entrevistas realizadas com os administradores dos conjuntos habitacionais Parque dos Ipês I (432 uh) e Parque dos Ipês II (120 uh), verificou-se que ambos também datam desse período (1986-1990) e foram financiados pela CAIXA, porém não constam no levantamento realizado nesta (2006). João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 156 Por fim, concluindo a descrição da produção efetuada entre as décadas de 1930 e 1980, do Estado desenvolvimentista, a Tabela 12 permite visualizar-se a produção de três momentos históricos distintos (Pré-BNH, BNH e Pós-BNH), sendo o período da política habitacional do BNH definitivamente o de maior produção. TABELA 12 Resumo do número de unidades nos conjuntos habitacionais produzidas em João Pessoa entre 1937 e 1989 Pré-BNH IAPs, FCP BNH Pós-BNHAgentes Até 1963 1967/69 1970/74 1975/79 1980/84 1985/86 1987/89 TOTAL IAPs / FCP 385 / 230 – – – – – – 615 IPASE 50 628 – 50 – – – 728 IPEP / IPASE – 413 – – – – – 413 Outros 107 – – – – – – 107 Montepi o / IPEP 127 662 - 466 2.226 4.401 1.454 9.336 CEHAP – 630 1.973 3.176 6.113 5.260 92 17.244 INOCOO Ps – – 293 901 2.476 – – 3.670 CEF- POUP – – – – – – 218 218 CEF- FGTS – – – – – – 573 573 TOTAL 899 2.333 2.266 4.593 10.815 9.661 2.337 32.904 TOTAL 899 29.668 2.337 32.904 Fonte: TADEI e DUAYER apud LAVIERI & LAVIERI (1999); levantamento realizado na CEHAP (2006); e no IPEP (2006) Nota: Elaboração da autora 4.3 A PRODUÇÃO DE MORADIAS NA CIDADE DE JOÃO PESSOA SOB A ÓTICA DAS POLÍTICAS HABITACIONAIS A PARTIR DE 1990 Antes de se iniciar a descrição da produção habitacional verificada em João Pessoa a partir da década de 1990, é importante mencionar alguns dados referentes à problemática habitacional nessa cidade depois do fechamento do BNH. O problema da falta de habitação no Brasil se avolumou depois da extinção do BNH, dentre outros motivos devido ao arrefecimento da produção de novas moradias, especialmente no período de transição – 1986 a 1989. Nesse sentido, o déficit habitacional na capital paraibana também cresceu, chegando a atingir, nos dias atuais, um número da ordem de 23 mil unidades, segundo informações na própria prefeitura (2006). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 157 Há, ainda, os problemas que permeiam os domicílios inadequados – problemas fundiários e de falta de habitabilidade – os quais, em conjunto com o déficit, representam as necessidades encontradas nas favelas e em outros tipos de habitação precária. Nos últimos anos, em João Pessoa, as favelas vêm se expandindo e várias novas favelas vêm surgindo. Em apenas cinco anos, entre 1992 e 1997, 14 favelas nasceram, o que representou um incremento de 14,89%; e 7.464 novas moradias foram construídas nas favelas, ou seja, um crescimento de 44,17% do total de domicílios já existentes (Tabela 13). TABELA 13 Crescimento das favelas e de seus domicílios no município de João Pessoa Favelas (absoluto) Domicílios nas favelas (absoluto) Crescimento das favelas e seus domicílios (%) 1992 1997 1992 1997 Favelas1992-97 Domicílios 1992-97 94 108 16.899 24.363 14,89% 44,17% FONTE: FAC (1998) Com esse quadro de crescimento dos domicílios precários e das favelas, em 1996 mais de 20% da população do município de João Pessoa viviam nas favelas, segundo dados da Fundação de Ação Comunitária (FAC, 1998). Numa tentativa de enfrentar essa necessidade de moradias, vários agentes públicos e privados participaram do incremento do parque habitacional, a partir de 1990, na capital paraibana. Com o objetivo de melhor sistematizar os dados, adotou-se aqui metodologicamente uma separação: são chamados de agentes públicos as instituições do governo estadual ou municipal que receberam a concessão de financiamentos da CAIXA ou financiaram diretamente (como o IPEP) a produção de moradias para a população de renda mais baixa. Essas instituições são: no nível municipal, a Prefeitura Municipal de João Pessoa (PMJP); no nível estadual, a CEHAP, a FAC e o IPEP. Já os agentes privados são aqueles que receberam a concessão de financiamentos da CAIXA para a construção de moradias, seja pelo programa Carta de Crédito Associativo, seja pelo PAR, etc.82. Nesse caso são as cooperativas, como a Cooperativa Habitacional do Estado da Paraíba (COHEP), e as empresas do ramo da construção civil. De modo geral, como já foi dito, a maioria desses agentes recorreu aos recursos do governo federal repassados pela CAIXA, por meio de linhas de financiamento, para promoverem a produção habitacional. A CAIXA passou a atuar, na atual conjuntura, em várias frentes de ação, principalmente, através da concessão de financiamentos para a 82 Apesar de aqui só ser estudada essas duas linhas de crédito. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 158 construção de moradias pelos agentes públicos e pelos agentes privados, bem como concedendo crédito direto aos cidadãos, ou seja, intervindo tanto na oferta quanto na demanda. Com essa nova estrutura de funcionamento, verificou-se também uma maior inter-relação entre as três esferas do poder, além da inter-relação com a iniciativa privada, como será exposto a seguir. No nível municipal, a PMJP desenvolveu ações orientadas predominantemente pelo programa municipal É pra morar, que operava, sobretudo, com recursos da OGU (por meio do programa Habitar-Brasil, por exemplo) para a construção de alguns conjuntos habitacionais destinados às populações mais carentes da sociedade83. A partir do segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso e, especialmente, no mandato de Lula, esse programa foi substituído pelos principais programas do governo federal, como o Carta de Crédito Associativo, o Habitar-Brasil, o Morar Melhor, o Crédito Solidário, o PSH, dentre outros. No nível estadual, a CEHAP sobreviveu à crise que se abateu sobre o sistema das companhias de habitação durante o governo Sarney e permaneceu intervindo na produção habitacional, operando principalmente com recursos do FGTS e da OGU, em consonância com vários programas habitacionais do governo federal, como PAIH, PROHAP, Habitar-Brasil, Carta de Crédito Associativo, Pró-Moradia, PSH, etc. Outro agente público estadual foi a FAC que surgiu com o objetivo de atender os problemas habitacionais da população mais carente do estado, através da recuperação, reforma ou construção de novas habitações para as populações que viviam em situações de risco, em especial em favelas84. As ações dessa instituição se desenvolveram basicamente por meio do programa SOS Moradia, criado entre 1996 e 1997 e que operava com 90% de recursos do governo federal (OGU) e uma contrapartida de 10% do governo do estado. Dos agentes estatais, todavia, o IPEP foi o único que atuou de uma forma descentralizada, isto é, sem recursos dos cofres públicos, mas com recursos próprios dos mutuários, por meio do Programa Habitacional Solidário (PHS). Em outras palavras, atuou 83 Na pesquisa, só foi possível resgatar a produção desenvolvida a partir de 1998 (gestão de Cícero Lucena) até 2006 (gestão de Ricardo Coutinho), pois a prefeitura não soube informar onde estavam os dados da produção anterior. Mas, salienta-se que a prefeitura já atuava na produção de moradias anteriormente, embora sua intervenção não fosse muito valorizada, por se constituir de ações isoladas e pouco expressivas quantitativamente. Por exemplo, segundo a Finep (1985), em 1973, a Prefeitura Municipal de João Pessoa contribuiu para a produção do parque habitacional da cidade, embora de forma irrisória, com a construção de apenas 15 unidades. 84 Vale ressaltar que, no mesmo sentido da PMJP, só há registro da produção da FAC desenvolvida pelo SOS Moradia, pois a produção anterior a esse programa não foi registrada, por se constituir em ações isoladas, não inseridas em um programa habitacional, segundo informações coletadas no Departamento de Engenharia da Fundação, em dezembro de 2006. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 159 com uma ação isolada e sem a intervenção do governo federal. O PHS foi criado aproximadamente em 1995, durante a gestão do governador Antônio Mariz. Tratava-se de um programa extremamente restritivo, pois funcionava com a formação de grupos dos servidores do estado, com no mínimo, 36 pessoas. Após formados os grupos, eram descontadas do contra-cheque dos mutuários parcelas de até 30% do salário, em consignações mensais, para a formação de um fundo condominial (como um condomínio fechado ou um consórcio), que custeava a construção das unidades habitacionais, entregues por sorteio85. Essa forma de financiamento buscava, portanto, reduzir a utilização de recursos públicos para a construção de moradias, além de reduzir o nível de inadimplência, uma vez que os funcionários públicos têm rendimentos assegurados, logo garantindo-se uma maior eficiência na produção de moradias para a população de renda mais baixa. Os agentes privados, por sua vez, atuaram com recursos do governo federal, por meio dos seguintes programas: PAIH, PEP, PROHAP privado, Programa Cooperativas, Carta de Crédito Associativo e, mais recentemente, o PAR86. Em suma, apesar da política neoliberal implementada a partir da década de 1990, a qual impunha forte pressão no sentido de se reduzirem as responsabilidades do poder público nas questões sociais, o governo federal continuou intervindo ativamente na questão habitacional. Essa intervenção se desenvolveu alocando-se recursos dos cofres públicos federais (FGTS, OGU, FAR, entre outros fundos) – os quais são operacionalizados pela CAIXA, que os controla e os repassa, por meio de diferentes programas de habitação –, para os agentes públicos e os privados. No entanto, uma dessas linhas de financiamento, o PAR, exige da CAIXA mais do que apenas o repasse dos recursos alocados; há um maior envolvimento tanto na etapa de produção quanto na de consumo, conforme já foi explicitado no capítulo anterior. Por fim, o Quadro 12 resume todos os programas de habitação dos âmbitos federal, estadual e municipal, e os agentes a eles vinculados, os quais atuaram na capital paraibana a partir da década de 1990. Cada agente desenvolveu-se desigualmente no tempo e no espaço, de maneira que, individualmente, cada um imprimiu na sua produção características próprias, embora com alguns pontos semelhantes, em função dos programas habitacionais em comum, conforme será exposto a seguir. 85 Informações obtidas, em 2005, com funcionários do IPEP e no panfleto do programa PHS, coletado na própria instituição. 86 Também atuaram por meio do programa Carta de Crédito Individual, que não foi abordado neste trabalho. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 160 QUADRO 12 Síntese dos principais programas federais, estaduais e municipais atuantes a partir da década de 1990 Ano Governo Agentes Programas habitacionais do governo federal operacionalizados pela CAIXA Programas habitacionais dos governos estadual e municipal, com recursos federais ou próprios CEHAP PAIH CONSO e recursos próprios PAIH PEP PROHAP privado 1990-1992 Collor agentes privados Programa Cooperativas - 1993-1994 ItamarFranco CEHAP - FICAM Créd Mac PROHAP público (FGTS) Habitar-Brasil CEHAP Carta de Crédito Associativo - FAC - SOS Moradia IPEP - PHS Habitar-Brasil Morar Melhor PMJP Carta de Crédito Associativo É pra morar Carta de Crédito Associativo 1995-1998 1999-2002 Fernando Henrique Cardoso agentes privados PAR - Pró-Moradia CEHAP PSH - Programa Crédito Solidário Imóvel na planta (FGTS) PMJP PSH - Carta de Crédito Associativo 2003-2006 Luiz Inácio Lula da Silva agentes privados PAR - Nota: Elaboração da autora 4.3.1 A ATUAÇÃO PREDOMINANTE DOS AGENTES PRIVADOS: CARACTERÍSTICAS DO INTERVALO DE 1990 A 1992 Apesar da confusão instaurada na política de habitação durante o governo Collor (1990-92) (VALENÇA, 2001), a produção de moradias, na cidade de João Pessoa, foi bastante significativa, contando-se 6.027 novas unidades habitacionais, das quais 41,96% (2.529 uh) foram construídas pelo setor público e 58,04% (3.498 uh) pela iniciativa privada. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 161 Esse fato comprova que o governo Collor realmente se caracterizou pela concessão de financiamentos voltados para a iniciativa privada, marcando um novo momento na trajetória da política de habitação, sem deixar de seguir os ditames da política neoliberal. Pelo setor público, a produção foi viabilizada pela CEHAP, que voltou a participar do incremento do parque habitacional pessoense, depois das restrições financeiras impostas durante o governo Sarney às COHABs. Essas restrições afetaram diretamente o desenvolvimento da companhia no intervalo compreendido entre 1986 e 1989 e mudaram para sempre a forma de sua atuação na produção de moradias. Em termos numéricos, a CEHAP financiou 2.529 novas unidades, por meio de diferentes linhas de financiamento assim como diferentes fontes de recurso, incluindo o emprego de recursos próprios para a construção de 37 moradias (Tabela 14). TABELA 14 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1990 e 1992 Agente / Programa Nome Ano de início e conclusão das obras Bairro Unidades CEHAP / CONSO Mangabeira VII Mar. 1990-jan. 1993 Mangabeira 1.962 (1.200 apto em 75 blocos; 761 casas) CEHAP / PAIH Mangabeira VI (etapa I) Jan. 1992-out. 1992 Mangabeira 530 CEHAP / recursos próprios - 1992 - 37 Total - - - 2.529 Fonte: Levantamento realizado na CEHAP (2006) Nota: Elaboração da autora A maioria das habitações financiadas pela CEHAP foi implantada seguindo o modelo periférico de expansão na direção sudeste, no bairro de Mangabeira, onde o governo do estado continuava sendo proprietário de terras. No entanto, o terreno não foi doado aos usuários, objetivando-se uma ação social, mas seu custo foi embutido no valor do financiamento87. No que tange às características tipológicas da produção efetivada pela CEHAP, é importante mencionar que os primeiros anos da década de 1990 marcaram a história da companhia com a produção prioritária de blocos de apartamentos, como o conjunto Mangabeira VII. Esse conjunto, todavia, não era composto apenas por edifícios, mas 87 Segundo entrevista semi-estruturada com Tarcísio Morais Leite, responsável pela Divisão de Material e Patrimônio, realizada no dia 07-12-06 (modelo de entrevista em Anexo F). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 162 também por unidades unifamiliares, embora o tipo predominante tenha sido as edificações multifamiliares (61,16% do total de unidades). Os edifícios, por seu turno, adotaram a solução de organização espacial formada por quatro unidades habitacionais em cada pavimento, resultando em uma lâmina que se aproxima da forma quadrada. Ademais, essas edificações são limitadas à altura de quatro pavimentos, mas sem pilotis, pois o térreo foi ocupado por apartamentos, com a finalidade de proporcionar a redução do custo médio da unidade privativa com o maior número de apartamentos por empreendimento – ou seja, adensando o terreno para fracionar seu preço e fracionar o custo da construção entre os mutuários. Já as habitações são compostas por sala, varanda, dois quartos, banheiro, cozinha e área de serviço, em uma área privativa de 51,38m² (Figuras 42 e 43). Figura 42: PAIH – Edificações do conjunto Mangabeira VII, localizado em Mangabeira (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 43: Planta baixa do pavimento tipo dos edifícios do conjunto Mangabeira VII (área privativa=51,38m²) Fonte: CARVALHO (1997) Devido ao seu grande porte e ao fato de implantar edifícios em um bairro predominantemente horizontal, ou seja, composto basicamente por casas, o conjunto Mangabeira VII causou uma transformação na estrutura e na paisagem urbana dessa área da cidade. Já os agentes privados (empresas construtoras ou cooperativas) participaram da produção de habitação social ou econômica sendo financiados pela CAIXA, através dos programas PAIH, PEP, Programa Cooperativas (COOPHAB) e PROHAP, principalmente com recursos oriundos do FGTS. De forma mais concreta, mais de 65% dos recursos alocados nesse período foram oriundos do fundo dos trabalhadores para a construção de 3.246 novas unidades. Houve, ainda, financiamentos com recursos da poupança (SBPE), por meio do Programa Plano Empresário, cuja produção não foi aprofundada neste trabalho, uma vez que se trata de outro perfil de programa, voltado para um público de maior poder Capítulo IV ____________________________________________________________________ 163 aquisitivo, diferentemente da população atendida pela produção da habitação social ou econômica (Tabela 15). TABELA 15 Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1990 e 1992 para os agentes privados Fonte de recursos88 Entidade Investimento (R$) Investimento (%) Unidades Unidades (%) FGTS Construtoras 65.328.122,34 65,23 3.246 71,17 Poupança (SPBE) Construtoras 27.740.288,21 27,70 1.063 23,31 CAIXA Construtoras 7.086.922,83 7,08 252 5,53 Total - 100.155.333,38 100 4.049 100 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Nota: Elaboração da autora A quantidade de novas habitações construídas pelos agentes privados e financiadas por pelos programas alimentados pelo FGTS e pela CAIXA variou quantitativa e qualitativamente. O PEP, que era uma linha de financiamento destinada às empresas de menor porte, e no qual o preço da habitação poderia ser estabelecido pelo mercado, foi a linha de crédito que mais financiou em João Pessoa durante o governo Collor (1.935 novas unidades habitacionais, o que correspondeu a 32,10% do universo total – 6.027 uh). Em seguida, o PAIH financiou 635 moradias (10,54%), a COOPHAB financiou 512 (8,50%), e o PROHAP privado 416 (6,90%) (Tabela 16). Do ponto de vista da distribuição no espaço urbano, cada agente e cada programa de habitação apresentou áreas de maior ou menor atuação: as Cooperativas, o PROHAP e o PAIH, por exemplo, atuaram em diversos bairros, todavia predominantemente localizados na região sudeste. Já o PEP foi aquele que apresentou uma maior variedade na localização dos seus empreendimentos, implantando-os em bairros localizados em várias regiões (sul, sudeste, leste e nordeste) e com características sociais distintas (Figura 46). Percebe-se que os conjuntos foram geralmente implantados em terrenos remanescentes urbanizados, diferentemente do modelo de implantação adotado pela CEHAP, a qual privilegiou a expansão periférica. Em função dessa implantação em terrenos remanescentes, a maioria dos conjuntos produzidos pelos agentes privados é de pequeno porte (abaixo de 160 uh), não gerando transformações estruturais na malha urbana. Tal como essa produção dos agentes privados, a do PAR também se caracterizou pelos conjuntos de pequeno porte e implantados em terrenos remanescentes, como se verá adiante. 88 Essas foram as fontes de recursos mais utilizadas para a produção de habitações em conjuntos nesse período. Outros fundos podem ter atuado, no entanto, no levantamento realizado na CAIXA (2006) só foram constatadas esses três tipos. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 164 TABELA 16: Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1990 e 1992 Agente / Programa Nome Ano de início e conclusão Bairro Unidades Geisel I 1991 Geisel 160PROHAP privado89 Geisel II 1991 Geisel 256 Subtotal PROHAP privado 416 APLP I 1990 Cid. Universitária 84 APLP II 1990 JD. São Paulo 36 APLP III 1990 JD. São Paulo 24 P. Res. Vale das Palmeiras I 1990 Cristo 288 Cooperativa dos Bancários (Coophabancários)/ COOPHAB Parque dos Diamantes 1990 Mandacaru 80 Subtotal COOPHAB 512 Sonho Meu 1991 Valentina 491 Res. Bom Jesus II 1991 Rangel 40PAIH Conj. Hab. Tiradentes 1991 Alto do Mateus 104 Subtotal PAIH 635 Res. Rosa do Prado/Ed. Flor de Maio 1991 Cid. Universitária 56 Ed. Estrela Dalva II 1991 Cid. Universitária 16 Ed. Lívia Carvalho 1991 Cid. Universitária 20 Cond. Atlantys 1991 Cid. Universitária 48 Res. Caroline II 1991 Cid. Universitária 32 Ed. Vênus 1991 Cid. Universitária 16 Ed. Veneza 1991 Bancários 48 Ed. Itumbiara 1991 Bancários 24 Res. Água Azul 1991 Água Fria 384 Ed. Araguari 1991 JD. São Paulo 28 C.H. J. Américo III 1991 José Américo 224 Ed. Della Santa II 1991 João Paulo II 16 Ed. Itaipava 1991 Cristo 30 Res. Verde Vale 1991 Geisel 304 Res. Karina I 1991 Valentina 272 Vale do Jaguaribe III 1991 Jaguaribe 33 Ed. Mídia 1991 Jaguaribe 32 Ed. Expedicionários IV 1991 Expedicionários 32 Ed. Acre 1991 Bairro dos Estados 20 Ed. Soraya 1991 Bairro dos Ipês 24 Cond. Santa Maria 1991 Bessa 8 PEP (recursos do FGTS) Ed. Girassol I 1991 - 16 Res. IV Centenário 1991 Bancários 192PEP (recursos da CAIXA) Ed. Lucy III 1991 Bessa 60 Subtotal PEP 1.935 Total 3.498 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Nota: Elaboração da autora. A localização dos empreendimentos foi fornecida pela Secretaria de Tributação do Município (2006) 89 É importante mencionar que os empreendimentos Geisel I e Geisel II foram encontrados em um dos bancos de dados da CEHAP como obras executadas por esta Na realidade, segundo informações na CEHAP (com Tarcísio Leite, responsável pela Divisão de Material e Patrimônio, 07- 12-06), este empreendimento foi financiado pela CAIXA, mas a CEHAP projetou e fiscalizou a obra. De qualquer forma, nesta pesquisa optou-se em colocá-los separadamente, obedecendo ao banco de dados da CAIXA (2006). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 165 Apesar de algumas diferenças na forma de implantação e na dimensão entre os conjuntos financiados pelos agentes públicos e os financiados por agentes privados, há características tipológicas comuns aos dois. Analisando-se alguns conjuntos financiados por agentes distintos, observou-se que muitos edifícios compartilham a mesma volumetria, com a altura limitada a quatro pavimentos, e a mesma solução de planta, formada por quatro unidades a cada pavimento, além da implantação dos empreendimentos na região sudeste da capital paraibana (Figuras 44 e 45). Figura 44: PEP – conjunto Água Azul, localizado no bairro de Água Fria (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2003) Figura 45: Planta baixa do pavimento tipo do conjunto Água Azul (apartamento com área privativa igual a 46,65m²) Fonte: Acervo da autora (2003) É importante lembrar também que a produção habitacional desse período se apresentou de uma forma diferente do modelo difundido nacionalmente, caracterizado pela construção de pequenas habitações de péssima qualidade e localizadas em periferias longínquas, conforme foi descrito por Bonduki (1997), citado no Capítulo II. De modo global, na capital paraibana, a produção habitacional – seja dos agentes públicos, seja dos agentes privados –, nesse momento, caracterizou-se pela construção predominante do tipo multifamiliar, com apartamentos de dimensões razoáveis, embora tenham sido também financiados muitos conjuntos de unidades unifamiliares, como o Sonho Meu, parcela do Mangabeira VII, etc. Os edifícios financiados foram relativamente bem construídos (alguns, porém, não revestidos) e grande parte foram implantados nas áreas da expansão urbana recente, geradas principalmente pelo BNH. Do total das 6.027 unidades produzidas, a maioria se localiza na zona sudeste da cidade, em bairros como Mangabeira (2.492 uh=41,34% das unidades financiadas), Valentina (763 uh=12,66%), Geisel (720 uh=11,95%), Cristo (318 uh=5,28%), Cidade Universitária (272 uh=4,51%), Bancários (264 uh=4,38%), entre outros (Figura 46). Portanto, a expansão urbana de João Pessoa continuou a desenvolver-se na direção sudeste, como tinha sido iniciado no período do Capítulo IV ____________________________________________________________________ 166 BNH. Ressalte-se, por fim, que essas áreas já estavam bem dotadas de serviços e infra- estrutura, além de garantida a acessibilidade. Figura 46: Produção habitacional entre 1990 e 1992 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado. LEGENDA: CEHAP PAIH e PROHAP PEP COOPHAB Figura 47: PEP – conjunto IV Centenário, localizado no bairro Cidade Universitária (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) 4.3.2 A CRISE NA PRODUÇÃO HABITACIONAL ENTRE 1993 E 1994 Como já foi comentado, o grande número de operações realizadas na área habitacional entre 1990 e 1991 comprometeu o orçamento para novos financiamentos em habitação durante o governo de Itamar Franco. Por esse motivo, em João Pessoa, como mostra a Tabela 17, houve um grave arrefecimento na produção de moradias, marcando nesse período um momento de crise, ou de apatia, conforme denominado por Valença (2001). A CEHAP, uma das importantes promotoras da produção habitacional na cidade, restringiu-se à produção de apenas 40 unidades, por meio do programa FICAM, que funciona como uma linha de crédito para financiamentos isolados e que opera com recursos João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 167 do FGTS90. Embora numa produção bastante reduzida, essas habitações continuaram sendo implantadas na zona sudeste, mais especificamente em Mangabeira. TABELA 17 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1993 e 1994 Agente / Programa Nome Ano de início e conclusão das obras Bairro Unidades CEHAP / FICAM Mangabeira FICAM 94 Mangabeira 40 Total - - - 40 Fonte: Levantamento realizado na CEHAP (2006) Nota: Elaboração da autora O levantamento junto à CAIXA também não apontou novas habitações financiadas, o que pode significar que nenhum novo financiamento foi realizado nesse período, devido à reestruturação na CAIXA e na política habitacional91. Mais importante é que as transformações promovidas com o governo de Itamar Franco subsidiaram o desenvolvimento da produção habitacional no período seguinte. Nesse quadro de transformações, destaca-se a criação de programas operacionalizados com recursos da OGU, além do FGTS. O Habitar-Brasil foi um desses programas do OGU (com apoio do BID) que perdurou durante os governos seguintes. 4.3.3 SURGIMENTO DE NOVOS PROGRAMAS DE HABITAÇÃO: CARACTERÍSTICAS DO INTERVALO DE 1995 A 1998 Com o governo de Fernando Henrique Cardoso, surgem novos programas capitaneados pelo Plano Nacional de Habitação – criado nessa gestão –, como o Pró- Moradia, o Programa Carta de Crédito, etc. Além dos programas do governo federal, foram criados, ainda, programas independentes e restritos a uma esfera governamental, como é o caso do PHS, do governo do estado, através do IPEP. O PHS atuou com mais autonomia e de forma descentralizada no incremento do parque habitacional da cidade. Em termos numéricos, nesse período, foi financiada em João Pessoa a produção de 10.462 novas moradias por agentes pertencentes tanto ao setor público – CEHAP, FAC, IPEP e a PMJP – quanto à iniciativa privada. Cada um desses agentes apresentou 90 Segundo entrevista semi-estruturada com Tarcísio Morais Leite, responsável pela Divisão de Material e Patrimônio, realizada no dia 07-12-06 (modelo de entrevista em Anexo F). 91 Outra possibilidade é o quantitativo da produção desse período estar contido em outro sistema de controle da agência. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 168 particularidades, o que estabeleceu diferentes formas de atuação e uma produção diferenciada, sob os aspectos quantitativo e qualitativo. Contrariamente ao que ocorreu no governo Collor, a produção promovida pelo setor público prevaleceu sobre o privado, na ordem de 92,07% (9.632 uh). Como já foi mencionado anteriormente, o papel da CAIXA nesse novo cenário foi ampliado, passando ela a atuar em várias frentes de ação na área habitacional. No intervalo compreendido entre 1995 e 1998, essa agência financeira concedeu financiamentos com recursos da OGU ao governo estadual e ao municipal, e com recursos do FGTS à CEHAP, às empresas da construção civil e às cooperativas habitacionais, além de ter financiado diretamente pessoas físicas pelo programa Carta de Crédito Individual, cuja produção não é abordada nesta dissertação. De acordo com o banco de dados da CAIXA (2006), ela repassou recursos do FGTS para a CEHAP na ordem de R$ 8.206.933,98 reais. Já para o poder público (estado e município), por meio do programa Habitar-Brasil e dos recursos da OGU, a CAIXA repassou dos cofres públicos R$ 6.602.153,42. Há de se considerar, ainda, os R$ 10.534.080,84 concedidos para o programa Carta de Crédito Associativo com o objetivo de financiar 830 novas unidades, produzidas pelas construtoras e pelas cooperativas. Em suma, nesse período, a CAIXA disponibilizou mais de R$ 25.000.000,00 para a produção de moradias, dos quais 53,63% destinaram-se apenas ao programa Carta de Crédito Associativo. Destaca-se também a utilização de recursos do OGU representando 26,05% do total de recursos alocados, adquirindo importância no contexto da produção de moradias nesse período, principalmente se se analisa à luz do governo Collor e do segundo mandato de FHC (Tabela 18). TABELA 18 Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1995 e 1998 Recursos92 e programas Entidade Investimento (R$) Investimento (%) construtoras, cooperativas 10.534.080,84 41,57 FGTS, SBPE, CAIXA (Carta de Crédito Associativo) CEHAP 3.056.882,97 12,06 53,63 PMJP 3.745.659,23 14,78 OGU Estado-PB; 2.856.494,19 11,27 26,05 FGTS (PROHAP público, Créd-mac) CEHAP 5.150.051,01 20,32 Total - 25.343.168,24 100 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora 92 Essas foram as fontes de recursos mais utilizadas para a produção de habitações em conjuntos nesse período. Outros fundos podem ter atuado, no entanto, no levantamento realizado na CAIXA (2006) só foram constatadas esses três tipos. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 169 Do ponto de vista da quantidade de habitações construídas, segundo levantamento de dados realizado nos órgãos competentes, o setor público (governo do estado mais a prefeitura) produziu 9.632 novas moradias, merecendo especial atenção a produção promovida pelo IPEP, o qual criou o PHS e financiou independentemente (com recursos dos próprios mutuários) 5.093 novas unidades. Com isso, esse agente público superou a produção da CEHAP, que sempre se sobressaiu na história da produção de moradias na capital paraibana (Tabela 19). Vale salientar que o IPEP voltou, nesse período, a atuar de forma triunfal na produção de habitações, após a paralisação de suas atividades durante a primeira metade dos anos 1990. Grande parcela das unidades financiadas pelo instituto (95,68%=4.873 uh) foi implantada em Mangabeira, contribuindo para a transformação da paisagem e da estrutura de parte do bairro, devido à expansão urbana promovida, bem como para a consolidação da área para a habitação social. Depois do IPEP, a CEHAP foi a instituição que apresentou melhor produção, com o financiamento de 1.776 moradias, das quais 1.436 unidades pertencentes a conjuntos habitacionais localizados em Mangabeira foram financiados com os mais diversos programas do governo federal, quais sejam: Carta de Crédito Associativo (FGTS), PROHAP público (FGTS) e Habitar-Brasil (OGU). Percebe-se, portanto, que, após a drástica redução da produção habitacional da CEHAP ocorrida no governo Itamar Franco, a companhia voltou a crescer no primeiro mandato de FHC (Tabela 19). Além dos conjuntos habitacionais acima citados, a CEHAP construiu 340 habitações com financiamentos isolados para pessoas físicas, por meio do programa Créd Mac Casa, cujos recursos, oriundos do FGTS, foram repassados pela CAIXA. A FAC, outro agente do governo do estado, também participou da produção habitacional do primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, mas através do programa SOS Moradia, que, embora de âmbito estadual, estava intrinsecamente relacionado com o governo federal, uma vez que operava basicamente com recursos da OGU (90%). O resultado desse programa foi a construção e a melhoria habitacional de 1.143 unidades, todas localizadas em áreas de extrema precariedade, geralmente caracterizadas como favelas. As áreas que foram objeto de intervenção da FAC, nesse período, estavam pulverizadas em diversas zonas da cidade, especialmente nas zonas central, sudeste e sudoeste, contemplando, portanto, diferentes bairros, como Valentina, Ilha do Bispo, Expedicionários, Alto do Mateus, Castelo Branco, etc. (Tabela 19). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 170 No âmbito do governo municipal, nesse período, a prefeitura passou a intervir com mais intensidade na produção habitacional da capital paraibana, através do programa É pra morar, que funcionava com recursos da OGU (possivelmente através do Habitar-Brasil). Esse programa procurou enfrentar o problema habitacional na cidade de João Pessoa atuando em várias frentes, com ações voltadas para a construção de novas moradias, outras para melhorias habitacionais, para a urbanização de favelas, etc., embora, neste trabalho, só tenha sido considerada a construção de novas unidades93. Nesse aspecto, foi financiada a construção de 1.620 novas unidades, conforme está ilustrado na Tabela 19. As unidades construídas estão localizadas nas áreas mais pobres da cidade, sendo mais comumente adotada a região sudeste, como Funcionários IV e Valentina. Diante do exposto, podem ser delineadas algumas características em comum na produção efetuada pelos agentes públicos acima listados, como a inter-relação destes com os programas do governo federal (com exceção do IPEP), e a preferência por implantar os conjuntos na região sudeste da cidade, dando continuidade ao modelo de implantação do BNH. A localização de grande parte dos conjuntos no bairro de Mangabeira, especialmente, é explicada pelo fato de o governo do estado ser proprietário de extensas glebas nessa área, o que favoreceu ali a implantação das habitações produzidas pela CEHAP e pelo IPEP. Isso não significa, todavia, que as terras foram doadas; seu custo foi repassado aos mutuários, embutido no financiamento, segundo informações obtidas de um técnico da própria CEHAP94. Já a inter-relação dos agentes públicos com os programas do governo federal é verificada através da alocação de recursos da OGU e do FGTS, os quais são repassados para o estado e para o município como uma concessão de crédito. As tentativas de autonomia, embora raras, são bastante significativas, como no caso do IPEP, cuja produção independente do governo federal correspondeu a 54,81% (5.093 unidades) do total da produção efetuada pelos agentes públicos estaduais e municipal. A Tabela 19 resume a produção habitacional global efetuada pelos agentes públicos (estado e município) no primeiro mandato do governo de Fernando Henrique Cardoso. 93 De acordo com levantamento realizado por um grupo de estudantes (apud CAVALCANTI, 1999b) para uma disciplina do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Paraíba, o É pra morar beneficiou 1.063 famílias com melhorias habitacionais. Também foram realizadas melhorias em várias comunidades, através de recursos oriundos do programa Habitar-Brasil. 94 Segundo entrevista semi-estruturada com Tarcísio Morais Leite, responsável pela Divisão de Material e Patrimônio, realizada no dia 07-12-06 (modelo de entrevista em Anexo F). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 171 TABELA 19: Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1995 e 1998 Agente / Programa Nome Ano de início e conclusão das obras Bairro Unidades CEHAP / Créd Mac - 1996 - 340 CEHAP / PROHAP público (FGTS) Mangabeira Celso Mariz 1996 Mangabeira 272 (aptos) Projeto Mariz I 1996 Mangabeira 130 Projeto Mariz II Ago. 1997 Mangabeira 220CEHAP / Habitar Brasil Projeto Mariz III Set. 1998 Mangabeira 590 CEHAP / Carta de Crédito Associativo Mangabeira Portal do Seixas I 1997- 199895 Mangabeira 224 (aptos) Subtotal CEHAP - - - 1.776 - 1995 São Rafael (Castelo Branco) 50 - 1996 Jardim Mangabeira, Riachinho, Baixo Roger, Santa Bárbara (Valentina), Ilha do Bispo, B. de Palha (Expedicionários), Alto do Mateus e São Rafael (Castelo Branco). 282 - 1997 Jardim Mangabeira, Riachinho, Baixo Roger, Diversos e São Rafael (Castelo Branco). 708 FAC / S.O.S. Moradia - 1998 Ilha do Bispo/Diversos/Pe. Hildon (Torre) 103 Subtotal FAC 1.143 Cond. José Mariz 1995-1998 José Américo 220 Cond. Raio de Sol 1996-1999 Mangabeira 616 Cond. Manaim 1996-2000 Mangabeira 679 Cond. Parque das Violetas 1996-2000 Mangabeira 553 Cond. Cidade Verde 1996-2001 Mangabeira 2.977 IPEP / PSH Cond. dos Delegados 1997-2001 Mangabeira 48 Subtotal IPEP - - - 5.093 Cond. Esperança 1998 Padre Zé 224 (aptos) Índio Piragibe 1998 Ilha do Bispo 32 (aptos) Fraternidade 1998 Funcionários IV 40 (aptos) Liberdade 1998 Valentina 80 (aptos) Independência 1998 Valentina 288 (aptos) Cidadania 1998 Valentina 112 (aptos) Amizade 1998 Valentina 240 (aptos) Prefeitura Municipal de João Pessoa / recursos da OGU / Programa Municipal “É pra Morar” Da Paz 1998 Jardim Veneza 152 (aptos) PMJP/OGU - - - 452 Subtotal PMJP 1.620 Total 9.632 Fonte: Levantamento realizado na CEHAP (2006); no IPEP (2005); na FAC (2006); PMJP (2006); e na CAIXA (2006) Nota: Elaboração da autora 95 Dados obtidos com a CAIXA (2005). O empreendimento foi financiado em 5 etapas pelo Programa Carta de Crédito Associativo da CAIXA, instituição que também comercializou as unidades. Em função dessa divisão do empreendimento, as datas indicadas na Tabela referem-se àquelas da assinatura do contrato. A última etapa, todavia, só foi assinada em 1999, como será verificado adiante. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 172 Do ponto de vista da tipologia das habitações construídas, a produção de cada agente apresentou características próprias, marcando a paisagem urbana de forma diversificada. A CEHAP apresentou diferentes padrões arquitetônicos, variando de acordo com a forma de financiamento. O Carta de Crédito Associativo, assim como ocorreu antes com o PROHAP público, tem como público-alvo a classe de renda média ou média-baixa, portanto produziu habitações maiores (57,60m²) e de melhor padrão construtivo. Cada um desses programas financiou um conjunto, tendo ambos as mesmas características, uma vez que foram construídos a partir do mesmo projeto de arquitetura, evidenciando-se, assim, um processo de barateamento da construção (Figuras 48 e 49). A solução adotada pelos edifícios seguiu muitas características do modelo construído no conjunto Mangabeira VII, na primeira metade dos anos 1990, quais sejam: a organização espacial da edificação com quatro unidades por andar e altura limitada a quatro pavimentos, as unidades habitacionais com o mesmo programa de necessidades e estas com a mesma disposição dos cômodos. A diferença entre ambos os tipos está nos recortes que foram feitos na volumetria do projeto Portal do Seixas e Celso Mariz (Figura 50). Figura 48: Vista dos edifícios do conjunto Mangabeira Portal do Seixas, em Mangabeira (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 49: Vista dos edifícios do conjunto Celso Mariz, localizado em Mangabeira (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 50: Planta baixa esquemática das habitações do Portal do Seixas Fonte: GALVÃO (2001) rua não pavimentada Capítulo IV ____________________________________________________________________ 173 Embora em menor escala, a CEHAP financiou também unidades unifamiliares isoladas, para famílias com renda inferior a três salários mínimos, por meio do programa Habitar-Brasil. As casas do Projeto Mariz são do tipo “embrião”, compostas por terraço, sala, quarto, banheiro, cozinha e área de serviço, totalizando uma área de aproximadamente 32m² (Figura 51). Com relação ao conjunto, este não teve suas ruas pavimentadas, reproduzindo-se, assim, o modelo de produção do BNH. Outra característica da política do BNH na cidade foi o nome dado a esse conjunto, que corresponde ao de um político, Antônio Mariz, antigo governador da Paraíba. Figura 51: Projeto Mariz II, em Mangabeira (região sudeste) Fonte: Acervo de COSTA (2004) Diferentemente da CEHAP, cuja produção apresentou uma variação tipológica, a FAC apresentou uma produção uniforme, com todas as unidades sendo do tipo unifamiliar. As casas são compostas por sala, cozinha, dois quartos, banheiro e área de serviço, enquadradas em uma área de 30,07m². O sistema construtivo é simples, por isso a fácil execução da obra, que é realizada pelo sistema de “autoconstrução assistido” pela família beneficiada, mas com assistência técnica garantida pela FAC (Figuras 52 e 53). Figura 52: Planta baixa das casas produzidas pela FAC Fonte: Levantamento realizado na FAC (1997) Figura 53: Fachada das casas produzidas pela FAC Fonte: Levantamento realizado na FAC (1997) rua não pavimentada Capítulo IV ____________________________________________________________________ 174 O IPEP também apresentou uma produção uniforme, caracterizada pela adoção de um sistema construtivo simples para as unidades unifamiliares do tipo “embrião”. As unidades são compostas por um terraço, sala, um quarto, banheiro e cozinha, com área construída de aproximadamente 29,08m² (Figuras 54 e 55). Esse programa de necessidades foi empregado em toda a produção do IPEP, exceto no Condomínio dos Delegados, que tinha na sua composição dois quartos. Figura 54: Planta baixa esquemática das habitações financiadas pelo PHS Fonte: Levantamento realizado no IPEP (2005) Figura 55: Fachada das habitações financiadas pelo PHS Fonte: Levantamento realizado no IPEP (2005) De forma geral, as unidades unifamiliares da CEHAP, da FAC e do IPEP apresentaram a mesma forma tipológica, ou seja, a casa isolada no terreno, com telhado em duas águas e cumeeira perpendicular à rua, enfim um modelo característico da arquitetura popular. Já no âmbito municipal, durante a gestão do prefeito Cícero Lucena, foram produzidos edifícios de dois pavimentos, construídos com péssima qualidade construtiva, sem mencionar o fato de que ainda estão por serem finalizadas as obras – rebocar, pintar, etc. –, o que compromete a qualidade de vida da população ali residente. Esta é formada por uma população cujos rendimentos oscilam entre um e dois salários mínimos. As unidades desses edifícios, por sua vez, são compostas por sala, quarto, banheiro e cozinha, totalizando uma área de aproximadamente 22,90m² (Figuras 56 e 57). Vale salientar, ainda, que esses conjuntos são vulgarmente conhecidos como Torres de Babel, uma alusão ao avançado estado de degradação e à confusão e desorganização do ambiente geradas pelos moradores96. 96 A Torre de Babel faz parte de uma passagem bíblica, em que uma edificação foi construída visando a atingir o céu e, portanto, ficar mais próxima de Deus. Isso provocou a fúria divina e, como forma de castigar as pessoas pela construção do edifício, Deus lançou um “feitiço” através do qual as pessoas passaram a falar línguas diferentes, gerando uma grande confusão, que impediu a finalização das obras da torre. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 175 É importante salientar que em 2006 ou 2007, na gestão do prefeito predecessor, Ricardo Coutinho, a PMJP recuperou um desses conjuntos – o Condomínio Amizade –, com recursos próprios do município, provenientes da Outorga Onerosa, com a finalidade de promover melhores padrões de habitabilidade nos conjuntos (Figura 58). Figura 56: Residencial Fraternidade, no bairro Funcionários IV (região sul) Fonte: Levantamento realizado na PMJP (2006) Figura 57: Residencial Cidadania, no bairro de Valentina (região sudeste) Fonte: Levantamento realizado na PMJP (2006) Figura 58: Reformas promovidas em 2006 ou 2007 no Condomínio Amizade Fonte: Levantamento realizado no site da PMJP (2007) Conclui-se, portanto, que a produção habitacional efetuada pelos agentes públicos estadual e municipal, caracterizou-se pela construção predominante de unidades unifamiliares (80,88%=7.176 uh), localizadas na região sudeste, contribuindo para a expansão horizontal da cidade nessa direção, semelhante ao modelo de produção do BNH. Quanto à produção habitacional efetuada pela iniciativa privada, com a atuação das empresas construtoras e cooperativas, a quantidade de unidades produzidas por esses agentes foi bem aquém da produzida pelos agentes públicos. De fato, produziram-se apenas 830 unidades, compreendendo casas e apartamentos, financiados pelo programa Carta de Crédito Associativo, entre 1997 e 1998 (Tabela 20). Essa produção está localizada em várias áreas da cidade, caracterizando-se como uma produção com certa diversidade locacional, apesar de a região sudeste ter sido a que recebeu o maior número de intervenções do programa Carta de Crédito Associativo: 30,33% (252 uh) do total de habitações foram construídas no Geisel, seguido pela Cidade Universitária, com 22,41% (186 uh); o João Paulo II, com 19,64% (163 uh); e Bancários, com 17,11% (142 uh). Vale salientar que outras tantas unidades foram implantadas nas Capítulo IV ____________________________________________________________________ 176 regiões central e leste. Essa pluralidade na localização das habitações é possível devido à variação da faixa de renda do público-alvo do programa, o que permitiu uma maior diversidade de bairros contemplados: desde os de menor status social até aqueles onde reside a classe de renda média (Tabela 20). TABELA 20 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1995 e 1998 Instituição / Programa Nome do condomínio97 Ano do contrato Entidade Organizadora e construtora Bairro Unidades Antônio de Pádua (Rodoviários II) 1997 Construtora (Cogran) Geisel 26 Belmiro Siqueira (Rodoviários I) 1997 Construtora (Cogran) Geisel 26 D. Joana da Palma 1997 Construtora (Cogran) Geisel 25 Jardim Tambiá II – Lot. IV Centenário 1997 Construtora (Cogran) Tambiá 23 (apto) Mar del Plata 1997 Construtora (Akrópolis) Pedro Gondim 10 Mart (II, III, V, VI, VII e IX) 1997 Construtora (Mart) Cidade Universitária 186 (aptos) Rohrback 1997 Pessoa física Bairro dos Estados 2 Antônio Ferraz (Lote A, B e C) 1997 COHEP (CRE Eng.) João Paulo II 69 Lídia Loureiro (E/F/G) 1997 COHEP (CRE Eng.) João Paulo II 71 (casas) / 23 Village do Geisel I 1997 COHEP (CRE Eng.) Geisel 39 Walter Forte (B/C) 1997-1998 COHEP (CRE Eng.) Geisel 70 (casas) Paulo Miranda (Lotes 03, 05 e 08) 1998 COHEP (CRE Eng.) Bancários 32 (aptos) / 110 (casas) Francisco F. Filho (Etapas II, III e IV) 1998 Construtora (Cogran) Geisel 66 (casas) Jardim Tambiá III – Lot. IV Centenário 1998 Construtora (Cogran) Tambiá 32 (aptos) Caixa Econômica Federal / Carta de Crédito Associativo Jardins do Cristo 1998 Construtora (Coesa) Cristo 20 (aptos) Total 830 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005) Nota: Elaboração da autora. A localização dos empreendimentos foi fornecida pela Secretaria de Tributação do Município (2006) 97 As etapas foram agrupadas em condomínios, embora na verdade, cada etapa (B e C ou Etapas I, II) equivale a um financiamento distinto. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 177 De forma sucinta, na cidade de João Pessoa a produção do Carta de Crédito Associativo se manifestou predominantemente com a construção de condomínios de pequenas dimensões, implantados preferencialmente nos terrenos remanescentes da expansão urbana do período anterior (em especial, a expansão do modelo periférico promovida pelo BNH). Esses condomínios foram inseridos na malha urbana já consolidada com uma distribuição bastante fragmentada, de modo que não provocaram grandes transformações no espaço urbano. Inclusive, esse modelo de implantação do Carta de Crédito Associativo veio a ser adotado posteriormente na produção do PAR. Faz-se necessário relembrar que esse programa é uma linha de crédito para grupos de pessoas reunidas (podendo estas ser representadas por cooperativas ou construtoras) financiando a construção de condomínios habitacionais ou, até mesmo, financiando apenas um percentual de unidades pertencentes a um edifício. Sendo assim, como o programa funciona na base de grupos de pessoas associadas, geralmente os condomínios são construídos em várias etapas, na medida em que se vão formando mais grupos. Devido a essa particularidade, pode haver, no interior de cada condomínio, tipos e soluções de plantas diferentes: o Paulo Miranda, por exemplo, é um condomínio composto por casas e apartamentos; já o Francisco F. Filho compreende apenas casas, porém com diversas soluções de planta. Há, portanto, uma variedade tipológica, que é facilitada principalmente pelo poder aquisitivo do público-alvo do programa, mais elevado que o da população beneficiada pelos agentes públicos. Os tipos variam entre loteamentos formados por unidades unifamiliares, condomínios de blocos de edifícios, os chamados condomínios fechados, etc. Enfim, essa variedade vem ratificar a afirmação de Gordilho-Souza (2000, p.61) de que uma das vantagens do Carta de Crédito é oferecer ao cidadão uma linha de crédito que possibilite a “liberdade para escolha do tipo e características do projeto”. Dentre os tipos acima listados, destaca-se a do “condomínio fechado”. Trata-se de um conjunto formado, em geral, por unidades dispostas ao longo de uma rua central privativa, guarnecida por uma portaria. Devido às suas características morfológicas, pode-se afirmar que, esse tipo de condomínio fechado é uma remodelagem moderna de um tipo habitacional comum do início do século XX, a das vilas operárias e rentistas. No entanto há diferenças, entre as quais a principal é a largura da rua central, projetada para a circulação de veículos automotores (maior que a das antigas vilas) (Figuras 59 e 60). Capítulo IV ____________________________________________________________________ 178 Figura 59: Walter Forte B – vista externa – no bairro do Geisel (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 60: Walter Forte B – vista interna Fonte: Acervo da autora (2006) Em razão da variação da renda e tipológica, há igualmente uma variação no tamanho das unidades. Estas apresentam uma área média privativa oscilando entre 41,95m² e 82,00m², de modo que o tipo multifamiliar geralmente é maior que a unifamiliar. É importante mencionar, ainda, que, depois do Programa Cooperativas (COOPHAB), de Collor, o Carta de Crédito Associativo foi um dos programas que voltou a impulsionar a produção das cooperativas habitacionais. Em João Pessoa, a COHEP destacou-se como entidade organizadora, assegurando sua participação com 49,88% (414 unidades) do total de novas habitações financiadas pelo programa Carta de Crédito Associativo. Portanto a produção habitacional desse período totalizou a construção de 10.462 novas moradias, das quais 92,07% (9.632 unidades) foram produzidas pelos agentes públicos (estado e município)98 e apenas 7,93% (830 uh) o foram pelos agentes privados, contrariamente ao que ocorreu no governo Collor. Diante dos fatos, esse período correspondeu à maior produção de moradias verificada na década de 1990, curiosamente durante o governo de FHC, que seguiu as bases da política neoliberal. No entanto, quase 50% da produção desse período não foi financiada pelo governo federal, mas por ações autônomas do IPEP. Por fim, uma característica perpassou a produção das esferas pública e privada: a preferência por implantar a maioria dos conjuntos na região sudeste, conforme ilustra a Figura 61. 98 Há, ainda, as melhorias habitacionais realizadas pela prefeitura, por exemplo, e que não foram contabilizadas. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 179 LEGENDA: CEHAP FAC IPEP PMJP Carta de Crédito Associativo Figura 61: Produção habitacional entre 1995 e 1998 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado. Obs.: Ver Figura 59 4.3.4 INÍCIO DO PAR EM JOÃO PESSOA: PROGRAMA DE MAIOR DESTAQUE NO PERÍODO COMPREENDIDO ENTRE 1999 E 2002 O segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso prosseguiu desenvolvendo os programas habitacionais do primeiro mandato, mas também foram criados novos programas, como o PSH e o PAR. Este último teve papel fundamental na produção habitacional desse período, representando 34,83% (1.201 uh) do universo das 3.448 novas moradias. Segundo levantamento feito na CAIXA (2006), para a construção de unidades habitacionais o governo federal repassou para a Prefeitura Municipal de João Pessoa R$ 2.132.953,65 de recursos da OGU – vinculados aos programas Morar Melhor e Habitar- Brasil –, correspondendo ao fundo do SFH que menos operou entre 1999 e 2002. Foram disponibilizados, ainda, para a prefeitura R$ 746.680,00 pelo programa Carta de Crédito Associativo. Esse programa disponibilizou também recursos para a CEHAP, na ordem de R$ 514.916,00, e para as construtoras e as cooperativas, R$ 8.950.910,22. No entanto, o João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 180 recém-criado FAR, foi a fonte de recursos que mais disponibilizou capital, correspondendo a mais de 67,00% (R$ 25.356.600,24) do total de investimentos concedidos pela CAIXA nesse período. Como conseqüência, só com a utilização desse fundo foram produzidas 1.201 unidades habitacionais nos primeiros anos de funcionamento do PAR (Tabela 21). TABELA 21 Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 1999 e 2002 Recursos99 Entidade Investimento R$ Investimento (%) FAR (PAR) Construtoras 25.356.600,24 67,26 Construtoras, Cooperativas 8.950.910,22 23,74 PMJP 746.680,00 1,98 FGTS, SBPE, CAIXA (Carta de Crédito Associativo) CEHAP, 514.916,00 1,36 27,08 OGU PMJP 2.132.953,65 5,66 Total - 37.702.060,11 100 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora De modo geral, ocorreu, nesse segundo mandato de FHC, um arrefecimento da produção habitacional efetuada pelos agentes públicos – estado e município –, o que significou uma redução de mais de 80%, comparando-se com o período anterior, como será visto adiante. De forma mais específica, os dados da CEHAP apontam uma produção de apenas 312 novas moradias, representando uma diminuição de 78,27% da quantidade de unidades produzidas, em relação ao primeiro mandato de FHC. Contudo, a principal característica qualitativa da produção da CEHAP permaneceu, ou seja, o bairro de Mangabeira continuou sendo o alvo preferencial para a implantação dos conjuntos. Igualmente, o IPEP, a FAC e a PMJP apresentaram um índice de produção inferior ao apresentado no período anterior, de acordo com o banco de dados fornecidos por cada uma dessas instituições. O IPEP iniciou o financiamento de um conjunto de 700 unidades, o Condomínio Padre Juarez, concluindo apenas 221 habitações; a FAC produziu 289; e a PMJP produziu 479 unidades, prioritariamente em ações de urbanização de áreas ocupadas e com recursos da OGU (Tabela 22). No tocante à distribuição no espaço urbano, os agentes públicos preservaram sua área de influência mais comumente adotada no período anterior, produzindo-se conjuntos localizados na região sudeste da cidade. Isso significa que a CEHAP e o IPEP 99 Essas foram as fontes de recursos mais utilizadas para a produção de habitações em conjuntos nesse período. Outros fundos podem ter atuado, no entanto, no levantamento realizado na CAIXA (2006) só foram constatadas esses três tipos. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 181 continuaram localizando suas moradias no bairro de Mangabeira. A FAC permaneceu construindo casas em várias áreas da cidade, apesar de a região sudeste ter sido adotada em maior escala por ela, pois implantou muitas habitações nos bairros José Américo e Mangabeira. A prefeitura, por seu turno, atuou com ações de urbanização, além de ter implantado um conjunto formado por edifícios, financiado pelo Carta de Crédito Associativo, no bairro das Trincheiras, situado nas proximidades do centro histórico da cidade. TABELA 22 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 1999 e 2002 Instituição / Programa Nome Ano Bairro Unidades CEHAP / Carta de Crédito Associativo Portal do Seixas II. Módulo I 1999 Mangabeira 32 (aptos) Mangabeira casas da FAC 2001 (de inauguração) Mangabeira 12 Mangabeira Polícia Militar 2002 (de inauguração) Mangabeira 150CEHAP Mangabeira sem teto 2003 (de inauguração) Mangabeira 118 Subtotal CEHAP - - - 312 - 1999 Pe. Hildon (Torre)/José Américo/ 170 - 2000 Diversos/José Américo 39 - 2001 Diversos/Mangabeira 14 FAC / SOS Moradia - 2002 Diversos/José Américo/Mangabeira 66 Subtotal FAC - - - 289 IPEP / PHS Cond. Pe. Juarez 2002-2008 Valentina e Mangabeira 700 (221 já estão concluídas) Subtotal IPEP - - - 700 PMJP / Carta de Crédito Associativo É pra morar 1999 Distrito Mecânico (Trincheiras) 80 (aptos) PMJP / Morar Melhor-Ação Urb-áreas ocupadas - 1999;2000 - 399 Subtotal PMJP - - - 479 Total - - - 1.780 Fonte: Levantamento realizado na CEHAP (2005); no IPEP (2005); na FAC (2006); na PMJP (2006); e na CAIXA (2006) Nota: Elaboração da autora A produção tipológica desses agentes também não apresentou grandes mudanças em relação ao modelo que já vinha sendo apregoado. A FAC e o IPEP reproduziram o tipo utilizado no período anterior, ou seja, o mesmo padrão habitacional adotado pelos programas SOS Moradia e PHS, respectivamente. Não obstante, o Capítulo IV ____________________________________________________________________ 182 Condomínio Padre Juarez, do IPEP, apresenta uma particularidade que o diferencia um pouco do modelo adotado anteriormente: ele é composto por casas de dois quartos, tal como o Condomínio dos Delegados, do IPEP, produzido no primeiro mandato de FHC. Já o conjunto Portal do Seixas II, da CEHAP, também seguiu as mesmas características locacionais e o mesmo projeto arquitetônico do conjunto Portal do Seixas I, iniciado em 1997, pelo mesmo agente. Além do Portal do Seixas II, outro conjunto multifamiliar vertical foi o Residencial É pra Morar, da PMJP, destinado aos funcionários públicos municipais classificados como de renda mais baixa. Esse condomínio localiza-se nas Trincheiras, é formado por cinco blocos de apartamentos, projetados seguindo o modelo mais comum da organização espacial de edifício – quatro unidades habitacionais por pavimento, em um total de quatro pavimentos. Cada apartamento tem uma área média privativa igual a 40,30m², como pode ser observado nas Figuras 62 e 63. Figura 62: conjunto “É pra morar”, no Distrito Mecânico (região sudoeste) Fonte: Acervo da autora (2004) Figura 63: Planta baixa do “É pra morar” Fonte: Levantamento realizado na PMJP (2004) Enfim, se a produção habitacional efetuada pelo poder público (estado e município) sofreu um processo de arrefecimento, o mesmo não aconteceu com a totalidade da produção efetuada pelos agentes privados, via programas Carta de Crédito Associativo e PAR. Vale salientar que, isoladamente, o Carta de Crédito Associativo sofreu um declínio na sua produção, em comparação ao período anterior, pois apenas na esfera privada esse programa financiou 467 moradias, o que representou um decréscimo de 363 moradias (43,73%). Por outro lado, o PAR apresentou uma boa produção, financiando, conforme foi dito anteriormente, 1.201 novas habitações, o que compensou a menor produção do Carta de Crédito Associativo, além de ter superado numericamente a produção dos demais agentes (Tabela 23). entrada não pavimentada Capítulo IV ____________________________________________________________________ 183 De modo resumido, a produção privada se caracterizou basicamente pela construção de edifícios bem localizados e distribuídos no espaço urbano, contemplando uma série de bairros, com características sociais diferenciadas. TABELA 23 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 1999 e 2002 Instituição / Programa Nome Ano do contrato Entidade Organizadora e construtora Bairro Unidades Res. Via Norte II 2000 Construtora Alto do Céu 128 Res. Jardim Tropical 2000 Construtora José Américo 32 Res. Jardins 2000 Construtora Alto do Mateus 160 Res. Jardins do Sul 2000 Construtora Água Fria 144 Res. Litoral do Sul 2000 Construtora Jardim São Paulo 128 Res. Cristo I 2001 Construtora Cristo 64 Res. Victória 2001 Construtora Cristo 62 Res. Raquel de Queiroz 2001 Construtora Cid. Universitária 64 Res. Estado de São Paulo 2001 Construtora Pedro Gondim 72 Res. Estado do Acre 2001 Construtora Pedro Gondim 72 Res. Tropical Tambiá 2001 Construtora Tambiá 40 Res. Maria Apolônia 2002 Construtora José Américo 118 Caixa Econômica Federal / PAR Res. Major Emídio Sarmento 2002 Construtora Geisel 117 Subtotal CAIXA (PAR) - - - - 1.201 Francisco F. Filho (Etapa I, V, VI e VII) 1999; 2000 Construtora e COHEP (Cogran); Geisel 124(casas) Jardins do Cristo (Etapa II) 1999 Construtora (Coesa) Cristo 10 (casas) Paulo Miranda (Lote 02, 04, 06 e 07) 1999 COHEP (CRE Eng.) Bancários 128 (aptos) Paulo Miranda (Lote 01, 09 e 10) 2000 COHEP (CRE Eng.) Bancários 96 (aptos) Casena 2000 COHEP (Grupo 4) Pedro Gondim 5 (aptos) Eunice Medeiros 2000 COHEP (Cogran) Bairro dos Estados 11 (aptos) Jardim Tambiá IV – Lot. IV Centenário 2000 COHEP (Cogran) Tambiá 15 (aptos) Quinta Avenida (PRODECAR) 2000 Construtora (Radical) Miramar 8 (aptos) Solar Tambauzinho 2000;2001 Construtora (Proenge) Tambauzinho 38 (aptos) Caixa Econômica Federal / Carta de Crédito Associativo Jardim das Samambaias 2001 COHEP (Coesa) Cid. Universitária 32 (aptos) Subtotal (Associativo) 467 Total 1.668 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora. A localização dos empreendimentos foi fornecida pela Secretaria de Tributação do Município (2006) Capítulo IV ____________________________________________________________________ 184 Essa forma de atuação foi, em grande parte, fruto das normas do PAR, que demonstrou ser possível uma maior preocupação com a localização e as questões tipológicas da produção. Seus conjuntos, por exemplo, foram implantados em diversas áreas da cidade, inclusive em bairros como Pedro Gondim e Tambiá, este localizado nas adjacências do centro histórico da capital. Não obstante, a área de intervenção predominante foram as regiões sul e sudeste, com a implantação de 60,70% de unidades (729 uh) em conjuntos localizados nos bairros José Américo, Água Fria, Jardim São Paulo, Cidade Universitária, Geisel e Cristo, perpetuando (desde o BNH) a preferência de implantação de habitação social (e econômica) nessa zona da cidade. É interessante observar, ainda, que esse programa tratou de desenvolver a construção de conjuntos de pequeno porte (comparados com os conjuntos construídos durante a vigência do BNH), a maioria dos quais localizados em lotes remanescentes da recente expansão da cidade. O aproveitamento desses vazios urbanos proporcionou aos arrendatários a oportunidade de escolher outros bairros da capital paraibana para habitar, no que o PAR difere dos demais agentes – públicos e privados –, que não geraram essa diversidade locacional. No entanto, as qualidades locacionais não param por aí, pois, além de bem localizados na malha urbana, os conjuntos têm de estar situados em áreas dotadas de infra-estrutura básica, fruto das exigências do programa e da CAIXA para a aprovação da proposta de financiamento de construção dos empreendimentos. Assim sendo, a implantação dos conjuntos do PAR pode ser considerada como uma ruptura com o modelo de implantação desenvolvido pela política do BNH, cujos conjuntos se localizavam basicamente na região sudeste, estando grande parte fora do tecido urbano e em localidades sem infra-estrutura. Como o PAR, o programa Carta de Crédito Associativo também garantiu variedade locacional aos seus empreendimentos, devido principalmente à maior variação da faixa de renda do público-alvo, conforme já foi explicitado. Vários bairros foram contemplados, especialmente aqueles de classe de renda média, como Tambauzinho, Bairro dos Estados, Pedro Gondim e Miramar (região leste), com a construção de edifícios contendo poucas unidades. Apesar disso, a região sudeste continuou sendo preferencialmente adotada, com 83,52% das unidades financiadas (390 uh) pelo programa. A qualidade da produção do PAR também se fez presente nos aspectos construtivo e tipológico, sobretudo em função das exigências da gerência local da CAIXA, tal como a utilização de materiais certificados pelo PBQP-H, com a finalidade de garantir uma maior qualidade construtiva. Ademais, os edifícios do PAR na cidade foram todos revestidos externamente, elevando-se a qualidade do empreendimento, apesar de o programa não Capítulo IV ____________________________________________________________________ 185 exigir essa condição, que é, portanto, uma particularidade da produção do PAR em João Pessoa. As unidades construídas apresentam uma área média privativa igual a 53,88 m², contendo o programa de necessidades básico do PAR, ou seja, sala, dois quartos, banheiro, cozinha e área de serviço. Apesar disso, pequenas variações foram encontradas entre as unidades: alguns projetos apresentam, ainda, uma varanda, ao passo que outros apresentam uma suíte na sua composição. Quanto às tipologias, foram construídas tanto unidades unifamiliares quanto multifamiliares (Figuras 64 e 65). O edifício, todavia, foi o tipo mais adotado (84,61% do total de empreendimentos, ou seja, 11 conjuntos do tipo vertical), em razão das exigências do programa para que o terreno fosse infra-estruturado e bem localizado na malha urbana, características que oneram o custo do lote, sendo necessário adensá-lo, por meio da verticalização das edificações, para dividir o custo da terra urbana por um número maior de unidades. Figura 64: PAR – Residencial Estado de São Paulo, localizado no bairro Pedro Gondim (região leste) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 65: PAR – Residencial Maria Apolônia, localizado no bairro José Américo (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) Mantendo características semelhantes ao PAR, o Carta de Crédito Associativo apresenta uma produção baseada na construção de unidades multifamiliares: nove conjuntos (90% do total dos empreendimentos) são formados por blocos de apartamentos e um é composto por casas – o conjunto Francisco F. Filho. Entretanto, apesar de ter prevalecido o tipo multifamiliar, constata-se certa variedade na arquitetura das edificações, com edifícios de maior ou menor padrão construtivo. A área privativa das unidades habitacionais também oscila entre 47,30m² e 115,75m², aproximadamente. Um exemplar da produção do programa Carta de Crédito Associativo é o edifício Solar Tambauzinho, que foi destinado a uma população de classe de renda média e, por Capítulo IV ____________________________________________________________________ 186 isso, está bem localizado na cidade, no bairro Tambauzinho (de bom status social), além de apresentar uma boa qualidade construtiva. Esse edifício é composto por 72 apartamentos, contudo apenas 38 unidades foram financiadas pelo programa. O pavimento-tipo é formado por quatro apartamentos, cada um com uma área média privativa igual a aproximadamente 70,00m², na qual estão distribuídos sala, varanda, cozinha, área de serviço, banheiro, dois quartos e uma suíte (Figura 66). Figura 66: Solar Tambauzinho, localizado no bairro de Tambauzinho (região leste) Fonte: Acervo da autora (2005) Ainda no que se refere ao Carta de Crédito Associativo, é importante lembrar a contribuição prestada pela COHEP, que, nessa conjuntura, participou do incremento do parque habitacional promovendo a produção de 319 unidades, ou seja, 68,31% do total de unidades financiadas pelo programa. Após traçar um panorama da forma de atuação e das características de produção dos vários agentes entre 1999 e 2002, chega-se a várias conclusões. Primeiro, nesse período ocorreu um arrefecimento na produção global, comparando-se com o período anterior, sendo produzidas 3.448 novas moradias tanto pelos agentes públicos quanto pelos privados. É importante salientar que essa redução na quantidade de habitações financiadas foi comum também para todo o estado da Paraíba no mesmo período. Apesar do arrefecimento, a produção efetuada pelos agentes privados, mesmo sendo inferior à que foi efetuada pelos agentes públicos, cresceu significativamente, chegando a representar quase metade da produção global (48,38%=1.668 moradias). Ademais, deve-se enfatizar o papel do PAR na produção do segundo mandato de FHC, pois ela impulsionou quantitativamente a construção do estoque de unidades habitacionais financiadas e contribuiu para a qualidade dessas habitações. Outro aspecto observado foi a produção de unidades multifamiliares, que se destacou, em detrimento da produção das unidades unifamiliares, quebrando o paradigma Solar Tambauzinho Capítulo IV ____________________________________________________________________ 187 de produção de casas, o qual sempre foi mais comumente adotado. Por outro lado, a área de implantação permaneceu sendo a região sudeste, assim como fora nos períodos anteriores. Por fim, pode-se afirmar que a produção global desse período não induziu grandes transformações na paisagem nem na estrutura urbana, por terem sido construídos conjuntos verticais e de pequenas dimensões, os quais foram localizados de forma pulverizada no tecido urbano, contemplando várias áreas simultaneamente (Figura 67). LEGENDA: CEHAP FAC IPEP PMJP Carta de Crédito Associativo PAR Figura 67: Produção habitacional entre 1999 e 2002 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado Obs.: Ver Figura 64 4.3.5 DIFERENTES PERSPECTIVAS DA PRODUÇÃO DO PAR ENTRE 2003 E MEADOS DE 2006 Com a gestão do presidente Lula, houve um acréscimo do volume de recursos alocados, em relação ao segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, mesmo não se considerando o término dessa gestão, que ocorreu em dezembro de 2006. De acordo com o levantamento realizado na CAIXA (2006), até setembro de 2006 o FGTS foi o fundo que repassou o maior percentual de recursos alocados, correspondendo a mais de 80% da João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 188 totalidade. Destaca-se, em seguida, o FAR e, depois, o FDS, o qual alimentou o recém- criado Crédito Solidário. Apesar de ter sido o segundo colocado entre os fundos que mais alocaram recursos, o FAR sofreu uma expressiva diminuição de investimentos, o que refletiu na diminuição da quantidade de unidades financiadas nesse período. O OGU, por sua vez, continuou reduzindo a quantidade de recursos alocados, representando apenas 1,31% do total de capital do governo federal repassado pela CAIXA, como pode ser visualizado na Tabela 24: TABELA 24 Recursos do governo federal disponibilizados pela CAIXA para a produção de moradias entre 2003 e dezembro de 2006 Recursos100 Entidade Investimento R$ Investimento (%) FGTS Governo do Estado, PMJP 38.549.170,75 48,18 FGTS (Pró-moradia) CEHAP 22.525.904,15 28,16 FGTS (PSH) Governo do Estado 1.744.360,00 2,18 FGTS (Carta de Crédito Associativo) Construtoras, Cooperativas 1.480.500,00 1,85 80,37 FAR (PAR) Construtoras 9.953.032,47 12,44 FDS (Crédito Solidário) ALAM 101 CMP/PB102 4.705.007,70 5,88 OGU (PSH) PMJP 1.048.125,00 1,31 Total - 80.006.100,07 100 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora No mesmo sentido em que se deu o aumento da quantidade de recursos, a quantidade global de unidades produzidas também aumentou, com 4.123 novas moradias produzidas, sobretudo pelo setor público. Por outro lado, na iniciativa privada, houve uma redução na ordem de 71,52% em relação ao governo anterior, de FHC. A produção habitacional efetuada pelos agentes públicos (estado e município) foi responsável por 88,48% do total produzido (3.648 uh) e ficou concentrada em duas instituições, a saber: a CEHAP e a PMJP. O IPEP não atuou, pois foi extinto em 2003 e sua carteira de habitação transferida para a CEHAP, conforme já foi mencionado no Capítulo I; e a FAC não apresentou nenhuma nova ação pelo programa SOS Moradia. No entanto, a fundação informou que o governo do estado (governador Cássio Cunha Lima) vem 100 Essas foram as fontes de recursos mais utilizadas para a produção de habitações em conjuntos nesse período. Outros fundos podem ter atuado, no entanto, no levantamento realizado na CAIXA (2006), só foram constatadas esses três tipos. 101 Associação de Apoio a Luta pela Moradia. Essa entidade está associada à PMJP na construção de novas moradias. 102 Central de Movimentos Populares. Essa entidade também está associada à PMJP na construção de novas moradias. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 189 desenvolvendo um novo programa, chamado de Cheque Moradia, que ainda está em fase de elaboração e teste103. O levantamento de dados nas instituições vinculadas à produção habitacional na capital paraibana indicou que a CEHAP foi o agente que mais produziu até meados de 2006: 1.510 unidades, financiadas pelo PSH e pelo Pró-Moradia. É interessante mencionar o fato de que a CEHAP utilizou o PSH, mas, de acordo com o levantamento fornecido pela CAIXA (2006), os recursos foram oriundos do FGTS, apesar de o programa operar com recursos da OGU. Vale salientar, ainda, que, nesse período, a CEHAP voltou a construir conjuntos habitacionais de grande porte, com mais de 1.000 unidades, de forma similar à dos conjuntos produzidos na vigência do BNH e nos primeiros anos da década de 1990. Pode- se inferir que a gradativa redução da dimensão dos conjuntos que ocorreu ao longo desses últimos anos da década de 1990 é fruto principalmente da diminuição do estoque de terras urbanas amplas e baratas para a produção de habitação social (Tabela 25). Já a PMJP participou da produção habitacional entre 2003 e meados de 2006 promovendo a construção de 1.336 novas unidades, financiadas com recursos diversos – OGU, FDS e FGTS. Além disso, em alguns casos, ela vem atuando em parceira com a Associação de Apoio à Luta pela Moradia (ALAM) e a Central de Movimentos Populares (CMP-PB). Em termos numéricos, a produção da prefeitura divide-se dessa forma: o programa Crédito Solidário (FDS) vem financiando 300 unidades, o programa Carta de Crédito – Resolução 460104 (FGTS) vem financiando 959 unidades e o Programa de Habitação de Interesse Social (OGU) financiando 77 novas moradias (Tabela 25)105. Considerando-se a produção efetuada pelos agentes públicos, constata-se que, assim como a produção efetuada por esses agentes no período anterior, pouco mudou em relação às características locacionais e tipológicas da produção desenvolvida pelo BNH: prosseguiu-se com uma produção horizontal, concentrada basicamente na região sudeste da cidade – Valentina e Grotão, no caso do governo Lula. No entanto, nesse momento histórico, essa produção horizontal vem gerando transformação na estrutura dos bairros 103 Entrevista semi-estruturada realizada no Departamento de Engenharia, em novembro de 2006. 104 Programa vinculado ao Carta de Crédito Associativo, com as mesmas características, mas para atendimento das necessidades habitacionais de famílias de menor poder aquisitivo, com renda mensal de até R$ 1.500,00 reais. O Carta de Crédito Associativo atende à população com renda superior a R$ 1.500,00. 105 É importante salientar que, entre o segundo semestre de 2006 e 2007, além do Loteamento Parque Sul, a prefeitura tem mais cinco conjuntos em obras (2.879 uh, aproximadamente) e vários outros em processo de licitação. Dessas ações, destacam-se as obras de reforma no Condomínio Amizade, já descrita. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 190 contemplados com a expansão destes através da construção de conjuntos de grandes dimensões. TABELA 25 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes públicos entre 2003 e meados de 2006 Instituição / Programa Nome Ano (de contrato) Bairro Unidades CEHAP / Pró- Moradia - 2004 - 802 CEHAP / PSH e Pró-Moradia Loteamento Colinas do Sul 2004-2006 Valentina 1.510 casas (1.310 pelo PSH e 200 pelo Pró- moradia) Subtotal CEHAP - - - 2.312 PMJP / PSH Loteamento Parque Sul 2006 Grotão 77 PMJP / Crédito Solidário Loteamento Parque Sul 2006 Grotão 300 PMJP / Imóvel na planta Loteamento Parque Sul 2006 Grotão 959 Subtotal PMJP - - - 1.336 Total - - - 3.648 Fonte: Levantamento realizado na CEHAP (2005), na CAIXA (2005) e na PMJP (ações até 25-04-06). Nota: Elaboração da autora As casas construídas pela CEHAP, durante a gestão de Lula, são compostas por sala, dois quartos, cozinha, banheiro e serviço, em uma área média de 34,00m². Já as habitações do Loteamento Parque Sul, da PMJP, foram projetadas apresentando o mesmo programa de necessidades das habitações da CEHAP, porém enquadradas em uma área privativa maior, igual a 37,22m². Esse projeto da prefeitura prevê também a ampliação da unidade, que poderá vir a ter três e até quatro quartos, totalizando uma área privativa de 44,70m² e 51,93m², respectivamente (Figura 68 e 69). Figura 68: Planta baixa do Loteamento Parque Sul I, no bairro Grotão (região sul) Fonte: Levantamento realizado na PMJP (2006) Figura 69: Casa do Loteamento Parque Sul I, no bairro Grotão (região sul) Fonte: Levantamento realizado na PMJP (2007) Capítulo IV ____________________________________________________________________ 191 Quanto à esfera privada, esta produziu apenas 475 novas moradias, financiadas conjuntamente pelo PAR e pelo Carta de Crédito Associativo. Conforme já dito acima, a produção dos agentes privados foi caracterizada por um forte arrefecimento, principalmente considerando-se que o Carta de Crédito Associativo produziu apenas 63 casas em um conjunto localizado no Geisel. Assim como a produção efetuada pelos agentes públicos, a dos agentes privados se caracterizou pela implantação dos seus conjuntos única e exclusivamente na região sudeste. Essa produção não gerou grandes transformações estruturais urbanas, devido à reduzida dimensão dos empreendimentos. A predominante implantação nessa área pode ser explicada, em parte, mediante a mudança no perfil socioeconômico da população atendida pelo PAR, por exemplo, nesse novo momento histórico. Trata-se de uma população de menores rendas (de até quatro salários mínimos, segundo o levantamento feito na CAIXA, 2006), o que levou os produtores a procurarem terrenos onde o custo do solo fosse mais baixo, para viabilizar a produção, em função da capacidade de pagamento da nova população beneficiada. Deve-se ressaltar que o crescente aumento do custo do solo urbano na cidade acabou deslocando essa produção para as franjas da malha urbana, em bairros onde o preço do solo era mais baixo, o que possibilitava a produção de casas. Sendo assim, diferentemente do que ocorreu no período anterior, o PAR e o Carta de Crédito Associativo deixaram de apresentar na sua produção a diversidade locacional, característica que lhes era peculiar (Tabela 26). TABELA 26 Conjuntos habitacionais financiados pelos agentes privados entre 2003 e dezembro de 2006 Instituição / Programa Nome Ano (de contrato) Entidade Organizadora e construtora Bairro Unidades Residencial Vista Bela – Módulo II 2004 Construtora Geisel 91 Residencial Sérgio Queiroz 2005 Construtora Valentina 149 Residencial Araçá 2005 Construtora Geisel 48 Caixa Econômica Federal / PAR Residencial Valentina 2006 Construtora Valentina 124 Subtotal CAIXA (PAR) 412 Caixa Econômica Federal / Carta de Crédito Associativo Residencial Vista Bela 2003 COHEP (CRE Eng.) Geisel 63 (casas) - - - 63 Total 475 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005; 2006) Nota: Elaboração da autora Capítulo IV ____________________________________________________________________ 192 No que tange à arquitetura das habitações financiadas pelo PAR, nessa nova gestão a produção foi marcada pela construção de unidades unifamiliares na região sudeste. Embora unifamiliar, a produção do PAR apresentou uma qualidade construtiva superior à da produção dos demais agentes, em virtude das exigências impostas tanto pelo programa quanto pela própria CAIXA (Figura 70). Da mesma forma, o Carta de Crédito Associativo também financiou um conjunto formado pelo tipo unidade unifamiliar. Além das casas, o PAR financiou a construção de um outro tipo no Residencial Araçá: empreendimento composto por edifícios formados por quatro unidades, as quais estão distribuídas em dois pavimentos (Figura 71). Os blocos de apartamentos estão dispostos ao longo de uma rua central privativa, perpendicular ao logradouro público, lembrando a configuração do condomínio fechado do Walter Forte (rever Figuras 59 e 60), financiado pelo programa Carta de Crédito Associativo. Diga-se de passagem que, tanto o Walter Forte quanto o Residencial Araçá se localizam na mesma rua. Figura 70: PAR – Residencial Sérgio Queiroz, no bairro Valentina (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 71: PAR – Residencial Araçá, no bairro Geisel (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2006) Apesar da mudança tipológica, o programa de necessidades das habitações financiadas pelo PAR não se alterou. Porém a área média privativa sofreu uma redução, sendo agora igual a aproximadamente 36,00m². De forma resumida, pode-se afirmar que, entre 2003 e 2006, foram construídas, no total, 4.123 novas moradias – 88,48% (3.648 uh) do total produzidos pela esfera pública e apenas 11,52% (475 uh) pela esfera privada. Essa produção global se caracterizou pela uniformidade, do ponto de vista tipológico e locacional, pois 98,55% (3.273 uh) das unidades eram casas isoladas no lote e 100% da produção se localizou na zona sudeste da cidade. Em outras palavras, a produção habitacional desse período assumiu a característica Capítulo IV ____________________________________________________________________ 193 principal de produção desenvolvida durante a política do BNH na capital paraibana, ou seja, a expansão horizontal da cidade ao longo do eixo sudeste (Figura 72). Por fim, é importante destacar que a produção habitacional desse período assumiu diferentes perspectivas, pois se voltou principalmente para a população de renda mais baixa, contemplada pelos programas Pró-Moradia, PSH e, até mesmo, pelo PAR, fato que indica uma gestão mais preocupada com as questões sociais. Apesar disso, contraditoriamente, houve uma diminuição na quantidade de recursos alocados pelo OGU e um maior atendimento à população de renda mais baixa com recursos do FGTS. LEGENDA: CEHAP PMJP Carta de Crédito Associativo PAR Figura 72: Produção habitacional entre 2003 e 2006 em João Pessoa Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado Obs.: Ver Figura 70 João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo IV ____________________________________________________________________ 194 * * * A descrição quantitativa do incremento do parque habitacional em João Pessoa, sob uma perspectiva histórica, de 1990 até 2006, indica uma produção fragmentada das ações do setor público e da iniciativa privada, financiadas predominantemente por recursos do governo federal, através dos vários programas de habitação. Cada um desses dois setores apresenta especificidades na forma de implantação e no tipo de habitações produzidas. Antes, porém, é importante refletir um pouco acerca da importância da capital paraibana no contexto dos recursos alocados pelo governo federal para o estado da Paraíba. Por se tratar da maior cidade do estado, além da importância política e econômica, grande parte dos recursos alocados pela CAIXA para a produção de moradias volta-se para João Pessoa. No entanto, a quantidade de recursos alocados variou de intensidade, conforme foi visto em relação a cada mandato presidencial. Durante o governo Collor e no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, a capital foi beneficiada com mais de 60% dos recursos alocados para todo o estado. Já durante o primeiro mandato de FHC e o de Lula, o percentual de recursos destinados à cidade foi de aproximadamente 30% da totalidade. Observa-se também que a maior quantidade de recursos alocados para João Pessoa tem uma relação direta com a maior atuação dos agentes privados na cidade. Para a produção de habitação social ou econômica, os agentes privados geralmente são financiados por duas fontes principais de recursos: o FGTS e o FAR. Além desses dois fundos, o financiamento habitacional em João Pessoa também operou com recursos provenientes da poupança (SBPE), recursos próprios da CAIXA e, ainda, recursos sociais do OGU e do FDS. De certa forma, entre essas fontes de recursos, há uma divisão de financiamento entre os agentes também. Por exemplo: os recursos da poupança, da CAIXA e do FAR se destinam basicamente à iniciativa privada; os recursos do OGU e do FDS se destinam exclusivamente aos agentes públicos. O FGTS, por seu turno, pode financiar os dois setores e tem sido o fundo de maior volume de recursos alocados ao longo dos governos, exceto durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, quando o FAR se destacou alocando mais recursos, como pode ser visualizado na Tabela 27. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 195 TABELA 27 Volume específico de recursos alocados pelo governo federal (em milhões), através da CAIXA, em João Pessoa entre 1990 e 2006106 Fonte de recursos 90-92 90-92 (%) 95-98 95-98 (%) 99-02 99-02 (%) 2003-06 2003-06 (%) POUP 27,740 26,91 - - - - - - CAIXA (próprios) 7,086 6,87 - - - - - - FGTS 68,268 66,22 18,741 73,95 10,212 27,09 64,299 80,37 FAR - - - - 25,356 67,25 9,953 12,44 OGU - - 6,602 26,05 2,132 5,66 1,048 1,31 FDS - - - - - - 4,705 5,88 Total 103,095 100,00 25,343 100,00 37,702 100,00 80,006 100,00 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Nota: Elaboração da autora Nessa tabela é possível observar o desenvolvimento do FAR que, nos seus primeiros anos de criação, entre 1999 e 2002, investiu uma grande soma de recursos (67,26% do total de recursos alocados na cidade, naquele período). No entanto, no governo seguinte, de Lula, entre 2003 e 2006, esse mesmo fundo investiu bem menos, apenas 12,44% do total. Excetuando-se o FGTS, que opera com grande volume de recursos, os 25 milhões destinados ao PAR entre 1999 e 2002 foram bastante expressivos, pois o fundo movimentou mais capital que o total alocado pelo governo federal para toda a cidade durante o período anterior, de 1995 a 1998. Pode-se dizer, então, que o fundo do PAR se destacou no contexto dos fundos que financiam a produção habitacional durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso. Além disso, o programa também se destacou na quantidade de novas habitações financiadas durante 1999 e 2002, superando numericamente a produção dos demais agentes. De modo geral, mesmo sendo um programa recente no cenário da política habitacional, o PAR produziu, na totalidade (6,69%), mais unidades que o Carta de Crédito Associativo (5,64%) ou a FAC (5,94%), ao longo dos anos. Entretanto, em relação à produção de unidades efetuada pela CEHAP, pelo IPEP ou pela PMJP, a produção do PAR ainda está aquém, mesmo porque aquelas instituições vêm produzindo há mais tempo (Tabela 28). 106 Esse levantamento, todavia, não apresentava dados referentes aos anos de 1993, 1994 e 1995. Esse período, porventura, foi aquele em que a CAIXA sofreu uma série de transformações na sua estrutura e na política habitacional. Capítulo IV ____________________________________________________________________ 196 TABELA 28 Resumo do perfil da produção de moradias efetuada pelos agentes públicos e privados em João Pessoa entre 1990 e 2006 Agentes 1990- 1992 1993- 1994 1995- 1998 1999- 2002 2003- 2006 Total Total (%) CEHAP 2.529 40 1.776 312 2.312 6.969 28,93 IPEP 0 0 5.093 700 0 5.793 24,04 PMJP 0 0 1.620 479 1.336 3.435 14,25 P úb lic o FAC 0 0 1.143 289 0 1.432 5,94 Privados (Collor) 3.498 0 0 0 0 3.498 14,51 PAR 0 0 0 1.201 412 1.613 6,69 P riv ad o Carta de Crédito Associativo 0 0 830 467 63 1.360 5,64 TOTAL 6.027 40 10.462 3.448 4.123 24.100 100,00 Nota: Elaboração da autora Apesar da relevância sob os aspectos quantitativos, a maior importância do programa no contexto da produção habitacional em João Pessoa se deu, especialmente, nas questões qualitativas, isto é, na forma de implantação e no sistema construtivo adotado nas moradias, o que gerou conjuntos habitacionais de melhor padrão na cidade, a partir da década de 1990, à luz da produção efetuada pelos demais agentes aqui estudados. De acordo com o que foi descrito nas páginas anteriores, a produção habitacional na capital paraibana, depois de 1990, efetuada pelos agentes públicos (estado e município), desenvolveu-se, em grande medida, seguindo o modelo periférico de expansão iniciado com o BNH, o qual se manifesta na implantação da maioria dos conjuntos na direção sudeste e, mais especificamente, no bairro de Mangabeira. Isso porque o governo do estado era proprietário de terras nessa área, facilitando a produção da CEHAP e do IPEP. Diferentemente, a produção dos agentes privados e, em particular, os conjuntos do PAR, localizam-se de forma pulverizada no espaço urbano, contemplando diferentes bairros da cidade, inclusive aqueles de maior status social. A localização dessa produção privada, entretanto, modificou-se no decorrer dos anos: inicialmente, nos dois primeiros anos da década de 1990, a produção privada contemplava um maior número de bairros e destinava-se a uma população de maior poder aquisitivo; depois, o público-alvo se modificou (para renda mais baixa) e, por conseguinte, as habitações foram se concentrando em algumas áreas, notadamente aquelas localizadas no quadrante sudeste. O PAR sofreu esse mesmo processo, pois, entre 1999 e 2001, sua produção estava pulverizada em várias áreas da cidade e, a partir de 2002, passou a localizar-se apenas na região sudeste. A inicial localização pulverizada dos empreendimentos do PAR no espaço urbano desenvolveu-se em terrenos urbanizados da cidade, com conjuntos de Capítulo IV ____________________________________________________________________ 197 pequenas dimensões, o que gerou poucas transformações ou nenhuma – tanto no tecido urbano como também na paisagem, diferentemente de alguns conjuntos financiados pelos agentes públicos, que, de tão grandes, modificaram parte da estrutura da cidade e transformaram a paisagem. É interessante verificar que mesmo sendo uma habitação destinada para população de menor renda, inicialmente ela não foi segregada à áreas essencialmente de renda mais baixa, mas se distribuiu em vários bairros da cidade. Nesse programa, a heterogeneidade da produção e das classes não se aplicou ao espaço urbano, a princípio. Na produção dos agentes privados, é relevante também a maior diversidade tipológica, ora construindo-se casas, ora edifícios. Nesse sentido, o PAR apresentou certa diversidade, produzindo dois tipos nos seus conjuntos: um padrão vertical e um padrão horizontal, como se verá no capítulo seguinte. No entanto, inicialmente o programa construiu apenas o padrão vertical (tipo multifamiliar), composto por edifícios com até quatro pavimentos, assim como fez a CEHAP. O programa de necessidades básico das unidades do PAR também foi encontrado com bastante freqüência na produção dos agentes públicos de João Pessoa. A partir de 2002, da mesma forma que se verifica o deslocamento da produção do PAR para a região sudeste, observa-se concomitantemente uma mudança tipológica, isto é, da exclusiva construção de edifícios para a construção de casas (do padrão vertical para o padrão horizontal). A qualidade construtiva da produção dos agentes privados também foi superior à de alguns conjuntos produzidos pelos agentes públicos, notadamente quando se trata das fachadas dos edifícios, pois os do PAR são todos revestidos no exterior com material cerâmico, embora o programa não exiga tal procedimento, como verificado no Capítulo III. É importante lembrar que essa diferenciação nos aspectos qualitativos da produção promovida pelos agentes privados está relacionada ao público-alvo dos programas, que, geralmente, tem um poder aquisitivo superior ao da população atendida pelos agentes públicos. Ressaltam-se também as exigências da CAIXA para com a qualidade de construção das habitações financiadas pelo PAR. Diante do exposto, percebe-se que a produção do PAR se modificou do segundo mandato de FHC para o primeiro mandato de Lula. Essa mudança não foi apenas quantitativa, como já foi comentada quanto à diminuição dos recursos alocados no FAR e à conseqüente diminuição da quantidade de novas unidades financiadas. Houve também uma mudança qualitativa: a produção vertical com diversidade locacional que ocorreu nos primeiros anos se transformou numa produção horizontal mais uniforme, localizada na Capítulo IV ____________________________________________________________________ 198 região sudeste e destinada para uma população de renda mais baixa. No entanto, vale salientar que essas mudanças começaram a ocorrer em 2002, ainda durante o governo de FHC. Pode-se dizer que a mudança qualitativa se deveu, em parte, às alterações legislativas no programa, impulsionadas pelo governo Lula, em que se procurou destinar uma parcela dos recursos do FAR para o atendimento de uma população cuja faixa salarial era mais baixa que a usual. Além disso, o aumento do preço do solo urbano também contribuiu para essas modificações. Esses dois motivos levaram à procura de terrenos mais baratos, que, em geral, estão localizados nos bairros da região sudeste da cidade, como Geisel, Valentina e Mangabeira, produzindo a nova especialização dos conjuntos do PAR. Resumindo, pode-se dizer que a produção do PAR se destacou pela sua qualidade locacional – rompendo, inclusive, com o modelo do BNH, de expansão periférica, em um primeiro momento, sendo os conjuntos implantados em diferentes áreas da cidade – e devido ao padrão construtivo que a CAIXA tentou imprimir na sua produção. Em outras palavras, o PAR transformou paradigmas que há muito tempo vinham sendo adotados na produção habitacional na cidade e que, de certa forma, continuam sendo utilizados, pelo menos no setor público, que permaneceu com a construção de unidades unifamiliares, na maioria dos casos implantados no quadrante sudeste. Essas habitações isoladas no lote foram construídas com materiais simples, reduzidas dimensões e no modelo de duas águas, com a cumeeira perpendicular à rua. Não se pode esquecer de mencionar outra especificidade da produção do PAR: a forma de acesso à moradia, uma vez que ele é o único programa que garante o acesso através de um arrendamento, diferentemente de todos os demais programas aqui apresentados, os quais são de formato convencional, de compra e de venda do imóvel (as habitações aqui estudadas ou eram vendidas aos usuários ou doadas, como as habitações produzidas pela PMJP, mas nunca alugadas ou arrendadas). Por fim, compreendido a inserção do PAR no contexto da produção habitacional na cidade de João Pessoa, a partir da década de 1990, o capítulo seguinte aprofunda o estudo das características operacionais, locacionais, tipológicas e construtivas da produção do Programa de Arrendamento Residencial na capital paraibana. Capítulo V ____________________________________________________________________ 200 Para se compreender o processo de produção habitacional do Programa de Arrendamento Residencial em sua complexidade, adotou-se a cidade de João Pessoa como área de estudo. Através de entrevistas e da aplicação de questionários, o aspecto prático do programa foi analisado, principalmente, sob o ponto de vista dos agentes participantes. Este capítulo compreende, assim, a pesquisa acerca do desenvolvimento do PAR na capital paraibana, efetuada com a coleta de dados primários documentais e de campo. A pesquisa documental foi realizada analisando-se as informações contidas na legislação que rege o programa, além dos documentos disponibilizados pela CAIXA (normativos, editais, quantitativos, projetos arquitetônicos, sites, etc.) e pela administradora do PAR na cidade em estudo (contratos, quantitativos, etc.). Esses documentos ofereceram um panorama da produção do PAR, permitindo a descrição do perfil quantitativo e qualitativo do programa, uma vez ilustra a quantidade de unidades e de recursos alocados, como também as características operacionais, tipológicas e de implantação dos conjuntos no espaço urbano pessoense. A pesquisa de campo abrangeu várias etapas, como levantamento fotográfico dos conjuntos do PAR, observações in loco do entorno dos empreendimentos do programa (observando-se meios de locomoção, infra-estrutura e presença de serviços e equipamentos coletivos), mas foi fundamentalmente baseada na realização de entrevistas semi- estruturadas e na aplicação de questionários com uma parte fechada e outra aberta. As entrevistas foram feitas, entre os dias 25 de abril e 21 de julho de 2006 com o secretário de Habitação do município, o qual representou a Prefeitura Municipal de João Pessoa, um representante da GILIE (Gerência de Filial de Alienar Bens Móveis e Imóveis), da CAIXA, cinco proprietários ou diretores das empresas da construção civil participantes do processo produtivo do PAR, e a gerente administrativa da administradora dos imóveis do programa. Os questionários foram aplicados, entre os dias 24 de maio e 29 de julho de 2006 a uma amostragem de 195 moradores, distribuídos em 10 conjuntos do PAR107 – o que corresponde a 19,80% do universo pesquisado (985 unidades efetivamente ocupadas no período da pesquisa). Na análise dos dados coletados com os questionários, foram utilizados dois programas de estatística, o Microsoft Excel e o SPSS Win 13.0, que auxiliaram no tratamento desses dados. Com as entrevistas e os questionários, foi possível identificar as distintas visões dos agentes envolvidos no processo produtivo, com a finalidade de se compreender, na prática, as conseqüências dessa forma diferente de produção para os diversos envolvidos. 107 Os dez conjuntos foram os Residenciais Jardim Tropical, Maria Apolônia, Litoral Sul, Via Norte II, Vista Bela, Jardins do Sul, Jardins, Tropical Tambiá, Estado do Acre e Estado de São Paulo. Capítulo V ____________________________________________________________________ 201 5.1 CARACTERÍSTICAS QUANTITATIVAS DA PRODUÇÃO DO PAR NA PARAÍBA Apesar de o início do Programa de Arrendamento Residencial ter ocorrido em 1999, na Paraíba o programa só foi utilizado a partir do ano 2000 – no dia 11 de novembro desse ano foi assinado o primeiro contrato, para a construção do Condomínio Residencial Via Norte II, localizado em João Pessoa. Dessa data até o final de dezembro de 2006, foram financiadas no estado 2.243 novas moradias, em 21 empreendimentos, que representaram uma movimentação de R$ 50.367.489,69, oriundos do Fundo de Arrendamento Residencial. Entre 1999 e meados de 2005 o percentual de recursos do FAR para a Paraíba foi apenas 0,94% do total de recursos alocados por esse mesmo fundo para todo o país. O percentual da produção do programa no estado, porém, foi um pouco maior que a quantidade de recursos alocados, representando 1,27% e 1,72%, respectivamente, do total de novas unidades e de conjuntos financiados no Brasil. Comparando-se a quantidade de novas unidades financiadas anualmente, o perfil quantitativo de produção de moradias pelo sistema PAR na Paraíba não seguiu o perfil do PAR no nível nacional. Explicando: até 2002, a produção no estado acompanhou a tendência nacional; entretanto, em 2003, ano em que o programa alcançou o maior nível de produção em todo o país, não se financiou nenhuma nova unidade na Paraíba, especialmente em função do elevado nível de exigência da regional da CAIXA quanto à construção das unidades, como será comentado mais a frente. Depois disso, paulatinamente a quantidade de unidades voltou a crescer no estado até 2005, ao passo que, no Brasil, o programa apresentou um perfil descendente. Pode-se afirmar que esse perfil de desenvolvimento do PAR na Paraíba está atrelado aos agentes participantes, ou seja, a uma série de problemas de incompatibilidade que a CAIXA e os construtores enfrentaram inicialmente (ver mais detalhes acerca dos agentes participantes mais adiante), o que só foi sendo retificado posteriormente (Figura 73). Em suma, do ponto de vista da quantidade de unidades produzidas e de recursos alocados, o desenvolvimento do PAR na Paraíba foi bem aquém do desenvolvimento nacional. Por outro lado, como foi demonstrado no capítulo anterior, a produção desse programa, no contexto estadual, foi de grande importância sob o aspecto locacional e tipológico, diante da produção de alguns conjuntos habitacionais para a população de mais baixa renda, financiada através de outras fontes de recursos, como o OGU, o FDS e, em alguns casos, até o FGTS. Capítulo V ____________________________________________________________________ 202 6958 0 592 374 395 0 91 587 204 11228 43827 33556 31005 30261 20315 0 5000 10000 15000 20000 25000 30000 35000 40000 45000 50000 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 PAR-BR PAR-PB Figura 73: Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR, no Brasil e na Paraíba, entre 1999 e julho de 2005 (o ano é o de assinatura do contrato) Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2006) Nota: Elaboração da autora Numa análise comparativa entre a produção financiada pelo PAR e a que foi financiada com a utilização de outros fundos, percebe-se que, no âmbito estadual, o FGTS, como é usual, deteve o maior percentual do total de recursos alocados entre 2000 e 2006 – 74,68% –, seguido pelo FAR – 15,69% – (Tabela 29). Vale salientar, todavia, que, mesmo sendo um pequeno percentual em relação ao do FGTS, o volume de recursos movimentado pelo FAR é bastante significativo, pois se trata de um fundo recém-criado, que vem operando recentemente no cenário paraibano e no Brasil. Ainda no tocante aos recursos alocados em 2000, 2001 e 2002, ou seja, em especial durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, mas também em 2005, o FAR alocou mais recursos para financiar conjuntos habitacionais para renda mais baixa que o próprio FGTS. Por outro lado, em 2003, 2004 e 2006, isto é, na maior parte do governo Lula, o FAR movimentou poucos recursos (Tabela 29). É interessante observar isso, pois, considerando-se todos os fundos de investimento – FGTS, OGU, FAR e FDS –, o governo de FHC investiu menos que o governo de Lula, diferentemente do PAR, que se desenvolveu mais durante o segundo mandato do governo tucano (FHC). anos (1999 – 2006) un id ad es h ab ita ci on ai s Capítulo V ____________________________________________________________________ 203 Tabela 29 Quantidade de recursos alocados para produção habitacional, em milhões, na Paraíba entre 1999 e 2006 Ano Recursos108 FGTS FAR OGU FDS TOTAL (abs.) (%) (abs.) (%) (abs.) (%) (abs.) (%) (abs.) 1999 5.535 33,97 0 0 10.757 66,03 0 0 16.292 2000 5.222 23,80 11.646 53,09 5.071 23,11 0 0 21.940 2001 617 5,34 8.493 73,43 2.456 21,23 0 0 11.567 2002 615 5,98 8.393 81,52 1.286 12,50 0 0 10.295 2003 2.851 68,68 0 0,00 1.300 31,32 0 0 4.151 2004 201.288 98,99 2.047 1,01 0 0,00 0 0 203.335 2005 919 5,05 14.563 79,92 1.467 8,05 1.271 6,98 18.221 2006 22.700 64,43 5.222 14,83 2.599 7,38 4.705 13,36 35.227 TOTAL 239.750 74,68 50.367 15,69 24.938 7,77 5.976 1,86 321.032 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora Se o PAR teve uma significativa quantidade de recursos alocados entre 1999 e 2006, a contribuição para o incremento do parque habitacional do estado da Paraíba não foi tão significativa quanto o investimento realizado. Segundo o levantamento feito na CAIXA (2006), o FAR financiou nesse período 2.243 novas habitações, enquanto o FGTS financiou mais de 21.000 unidades, em conjuntos habitacionais e o OGU, mesmo tendo alocado uma menor quantidade de recursos, financiou mais de 10.000 unidades. Apesar disso, o PAR tem sua importância no estado em razão das características qualitativas que imprimiu na sua produção habitacional. A quantidade de recursos e de novas unidades financiadas pelo PAR entre 2000 e 2006 não se desenvolveu na mesma proporção entre as cidades paraibanas. A produção foi desigualmente distribuída entre João Pessoa e Campina Grande109. A primeira deteve o maior percentual da produção de unidades por quase todo o período e, por conseguinte, o maior percentual de recursos alocados: foram financiadas 1.613 novas moradias (71,91% do total de unidades do PAR financiadas na Paraíba), distribuídas em 17 conjuntos (80,95%), que totalizaram R$ 35.309.632,71 reais (70,10%). Em Campina Grande, a produção se manifestou com 630 unidades (28,09% do total de unidades do PAR financiadas na Paraíba) em apenas quatro conjuntos (19,05%), num investimento total de R$ 15.057.856,98 reais (29,90%). As Figuras 74 e 75 ilustram o perfil do desenvolvimento nas duas cidades, 108 Principais recursos utilizados para a construção de conjuntos habitacionais destinados à população de menores rendas. Não foram considerados os recursos do SBPE nem os recursos próprios da CAIXA, pois se destinam a um outro público alvo Também não se considerou os recursos do FGTS para financiamento isolado, que alimentam o Carta de Crédito Individual, por exemplo. 109 Campina Grande é a segunda maior cidade do estado. Localiza-se no interior – no Piemonte da Borborema – e se destaca por sua importância no setor industrial. Capítulo V ____________________________________________________________________ 204 indicando que a produção em Campina Grande foi superior à de João Pessoa apenas em 2005 (Tabela 30). Entre ambas as cidades, a dimensão dos conjuntos e a tipologia habitacional predominante foram diferentes. De modo geral, os conjuntos de Campina Grande apresentam maior quantidade de unidades habitacionais que os localizados em João Pessoa; inclusive o único conjunto de grande porte do estado, com mais de 160 unidades, está localizado nessa cidade do interior paraibano (Residencial Dinamérica, 230 unidades) (Tabela 30). Quanto à tipologia, em João Pessoa houve uma maior diversidade de padrões tipológicos – unidades unifamiliares, multifamilares, ou geminadas –, ao passo que, em Campina Grande, há uma grande predominância do padrão unifamiliar. 0 100 200 300 400 500 600 700 99 0 1 2 3 4 5 6 João Pessoa Campina Grande 0 2000000 4000000 6000000 8000000 10000000 12000000 14000000 99 0 1 2 3 4 5 6 João Pessoa Campina Grande Figura 74: Número de unidades habitacionais financiadas pelo PAR entre 1999 e dezembro de 2006 nas cidades da Paraíba (o ano é o de assinatura do contrato) Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2006) Nota: Elaboração da autora Figura 75: Quantidade de recursos alocados entre 1999 e dezembro de 2006 nas cidades da Paraíba (o ano é o de assinatura do contrato) Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006); MINISTÉRIO DAS CIDADES (2006) Nota: Elaboração da autora Tabela 30 Relação da quantidade de unidades e conjuntos em João Pessoa e Campina Grande Unidades Conjuntos Média UH/conjunto Ano João Pessoa Campina Grande João Pessoa Campina Grande João Pessoa Campina Grande 2000 592 0 5 0 118,4 0 2001 374 0 6 0 62,33 0 2002 235 160 2 1 117,5 160 2003 0 0 0 0 0 0 2004 91 0 1 0 91 2005 197 390 2 2 98,5 195 2006 124 80 1 1 124 80 TOTAL 1.613 630 17 4 - - TOTAL-PB 2.243 21 - - Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora anos (1999 – 2006) re cu rs os (R $) un id ad es h ab ita ci on ai s anos (1999 – 2006) Capítulo V ____________________________________________________________________ 205 Como o PAR se desenvolveu em maior proporção em João Pessoa, a produção nessa cidade foi listada na Tabela 31, por intermédio da qual se verifica que o programa apresentou melhor desempenho entre 2000 e 2001, financiando 11 conjuntos e 966 unidades, o que corresponde, apenas nesse período, a 43,07% do total de unidades financiadas no estado. Verifica-se, ainda, o gradual aumento do valor das unidades financiadas pelo programa: de aproximadamente R$ 19.000,00, em 2000 e 2001, para até R$ 28.000,00, em 2005. Esse aumento do preço das habitações do PAR se justifica pelo gradual aumento do custo do solo urbano da cidade, o que também foi um dos fatores que provocou o deslocamento dos conjuntos para o quadrante sudeste da cidade, onde os terrenos são mais baratos. Tabela 31 Valor médio das unidades dos conjuntos habitacionais financiados pela PAR (1999-2005) Conjuntos Ano (do contrato): Valor das unidades (R$)110 Res. Via Norte II 01-11-2000 19.998,40 Res. Jardim Tropical 13-11-2000 19.429,50 Res. Jardins 22-12-2000 19.249,30 Res. Jardins do Sul 27-12-2000 20.203,66 Res. Litoral Sul 29-12-2000 19.341,34 Res. Cristo Redentor I111 01-02-2001 2004 (novo contrato) 19.259,35 24.921,55 (novo contrato) Res. Victória112 28-03-2001 2004 (novo contrato) 19.000,00 24.741,50 (novo contrato) Res. Raquel de Queiroz113 25-04-2001 2004 (novo contrato) 19.104,32 25.736,62 (novo contrato) Res. Estado do Acre 26-04-2001 19.923,15 Res. Estado de São Paulo 26-04-2001 20.683,15 Res. Tropical Tambiá 30-04-2001 19.852,85 Res. Maria Apolônia 26-02-2002 21.997,92 Res. Major Emídio Sarmento 16-09-2002 22.397,75 Res. Vista Bela Módulo II 22-10-2004 22.500,00 Res. Sérgio Queiroz 30-06-2005 23.987,50 Res. Araçá 05-10-2005 28.000,00 Res. Valentina 27-09-2006 24.091,89 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora 110 Considerou-se o valor total do investimento dividido pelo número de unidades habitacionais em cada conjunto. 111 Obra ainda em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. 112 Obra ainda em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. 113 Obra ainda em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. Capítulo V ____________________________________________________________________ 206 Tendo em vista a importância de João Pessoa no desenvolvimento do PAR na Paraíba, a seguir, serão discutidas as características operacionais, tipológicas, construtivas e locacionais do programa na capital paraibana bem como os agentes envolvidos no processo de produção114. 5.2 CARACTERÍSTICAS OPERACIONAIS DO PAR EM JOÃO PESSOA Neste item, serão abordados os três elementos fundamentais do PAR – que o diferenciam das formas convencionais de provisão habitacional –, observando-se o desempenho de cada um no contexto da cidade de João Pessoa. Esses mecanismos, já listados no Capítulo III, são: a mobilidade residencial, a facilidade de desistência do programa e a facilidade de retomada do imóvel115. A mobilidade residencial é uma das vantagens do programa para os arrendatários, a qual possibilita a mudança de um imóvel do PAR para outro imóvel do programa. Entretanto, devido às dificuldades impostas pela CAIXA e pelo próprio PAR para evitar a mobilidade desnecessária, em João Pessoa apenas quatro famílias foram beneficiadas com essa possibilidade, ou seja, 0,41% dos arrendatários das 985 unidades habitadas até meados de 2006. A mudança de imóvel por parte dessas famílias ocorreu devido a motivos profissionais ou de saúde. Por exemplo: três arrendatários mudaram porque foram trabalhar em outro estado, e uma arrendatária mudou de um imóvel do PAR para outro (do Residencial Jardins para o Residencial Estado de São Paulo), pois o primeiro empreendimento se localizava vizinho a uma favela, onde havia muita fumaça, e um dos integrantes da família tinha sérias crises asmáticas provocadas pela fuligem. Cada caso, todavia, foi certificado e analisado rigorosamente pela CAIXA para que tal benefício fosse concedido. Outra vantagem do programa é a facilidade de desistência do imóvel. Em João Pessoa, constataram-se 25 desistências (2,54% do total das 985 unidades habitadas), por razões diversas, como mudança de arrendatários para outra cidade ou, ainda, o fato de a família não se acostumar com a localidade do empreendimento, sendo esse caso mais comum nos Residenciais Jardins e Via Norte II, ambos localizados em bairros mais pobres. 114 Sob um ponto de vista mais amplo, a produção do PAR em João Pessoa também se destaca da produção do PAR em Recife e em Natal, pelo menos até 2003, como foi apresentado no final do Capítulo III. 115 Todas as informações contidas neste item do trabalho foram obtidas da empresa administradora dos imóveis do PAR na capital paraibana, em entrevista realizada com a gerente administrativa, Inaluce Simone Marinho, no dia 21 de julho de 2006. Capítulo V ____________________________________________________________________ 207 Pelo que se verificou, as vantagens que o programa oferece aos arrendatários, como a flexibilidade proporcionada com a mudança e a desistência do imóvel, é pouco utilizada por eles, porque estes têm uma certa inclinação para continuarem no programa, visando à propriedade da casa, isto é, devido ao sonho da casa própria. O terceiro elemento do PAR, a facilidade de retomada do imóvel, está diretamente relacionada com a inadimplência, que é outra questão essencial no programa. Conforme foi mencionado anteriormente, o PAR, com sua ideologia da casa própria, sem a casa ser própria, surgiu como uma forma de diminuir a inadimplência que assolava vários outros programas habitacionais. Para conseguir isso, o programa utiliza o seguinte procedimento: como a casa não é de propriedade dos arrendatários (eles têm apenas a cessão de uso), a CAIXA permanece como proprietária fiduciária dos imóveis, facilitando a retomada. Esse instrumento gera uma maior insegurança nos arrendatários, que vêem a possibilidade de perder sua moradia e por isso evitam a inadimplência. Em João Pessoa, por exemplo, a inadimplência na taxa de arrendamento varia entre 2,00 e 3,50% ao mês, porém a CAIXA estipula que a inadimplência máxima não pode ultrapassar 5,00%, sendo esse dado, inclusive, condicionante para contratação de novos projetos (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.13). Já a inadimplência na taxa condominial é mais elevada, oscilando entre 10% e 30% ao mês, o que reflete a insatisfação dos arrendatários com o sistema condominial, como será observado posteriormente. Considerando-se que a média de inadimplência dos contratos de habitação com recursos do FGTS, na Paraíba, ao longo dos primeiros anos da década de 1990, foi superior a 14,99%116, o índice de inadimplência da taxa de arrendamento é muito pequeno, o que reflete a eficácia do programa na cidade de João Pessoa. Dos índices acima listados, apenas onze contratos (1,12% das 985 unidades habitadas até meados de 2006) estão efetivamente irregulares, ou seja, ultrapassaram 60 dias de atraso no pagamento da taxa de arrendamento e/ou condomínio, de maneira que foram submetidos a processo judicial, em que a CAIXA vem pedindo a reintegração de posse do imóvel e execução da dívida. Esse procedimento judicial não é tarefa simples e requer tempo; há, inclusive, arrendatários com mais de 25 parcelas de atraso esperando para serem julgados, mas ainda morando no imóvel. Assim sendo, a retomada do imóvel por inadimplência não é tão fácil quanto se imagina. 116 Entre 1980 e 1984, a taxa de inadimplência do SFH evoluiu na seguinte proporção: 26,1%; 27,8%; 33,5%; 46,4% e 54,6% (SANTOS, 1999, p.15). Na primeira metade da década de 1990, o índice de inadimplência dos contratos com recursos do FGTS foi menor que o constatado na primeira metade da década de 1980, variando, entre 1990 e 1994, na seguinte medida 13,8%; 5,2%; 23,3%; 30,7% e 29,9% (VALENÇA, 1995, p.449). Segundo Valença (1995), considerando-se esse mesmo período, no caso do estado da Paraíba o índice de inadimplência foi 0%; 4,7%; 22,8%; 27,3% e 20,15%, respectivamente para 1990, 1991, 1992, 1993 e 1994. Capítulo V ____________________________________________________________________ 208 Quando ocorre a quebra contratual com relação ao uso indevido do imóvel pelo arrendatário – alugando a habitação arrendada, por exemplo –, a reintegração de posse se desenvolve mais agilmente, contando com a ajuda de um oficial de justiça para efetuar o despejo do arrendatário. Por esse motivo dois contratos (0,20% dos 985) foram rescindidos na cidade de João Pessoa, coincidentemente no mesmo conjunto habitacional, o Residencial Litoral Sul. Enfim, as particularidades do PAR, como a mobilidade residencial e a facilidade de desistência, não são tão usadas pelos arrendatários. Por outro lado, a retomada do imóvel é um instrumento de difícil execução por parte da CAIXA, embora essa possibilidade seja claramente discriminada no contrato. Em linhas gerais, a grande diferença operacional desse tipo de financiamento em relação às linhas convencionais é, realmente, a diminuição do nível de inadimplência, o que fortalece ainda mais o programa. É importante ressaltar, ainda, outra diferença: o baixo valor da taxa de arrendamento – na maior parte das vezes, inferior à taxa de aluguel praticada nos imóveis localizados no entorno dos imóveis do PAR. Isso ocorre porque o preço da habitação do programa é subsidiado, ou seja, é inferior ao do mercado, pois corresponde ao valor de construção, o que contribui parcialmente para o baixo custo da taxa de arrendamento, diferentemente dos financiamentos em que as habitações são avaliadas tendo como referência o valor do mercado. A fixação do arrendamento em 0,7% ou 0,5% do valor de aquisição do imóvel também contribui para a baixa taxa de arrendamento. Observando-se a Tabela 32, constata-se que o arrendamento oscilou entre R$ 150,00 e R$ 170,00 reais aproximadamente, o que pode ser considerado um valor baixo frente aos aluguéis praticados no mercado. De modo geral, as taxas de aluguel para imóveis com as mesmas características dos imóveis do PAR estavam na faixa de R$ 300,00, segundo consulta à seção “Classificados” do domingo no jornal “Correio da Paraíba”, entre os meses de maio e setembro de 2006117. Mesmo se considerando o somatório da taxa de arrendamento com a taxa de condomínio, o total é ainda inferior ao valor geralmente praticado no mercado imobiliário. Relacionando-se a taxa de arrendamento e a taxa condominial dos imóveis do PAR, percebe-se também uma discrepância no incremento entre essas duas taxas: enquanto o arrendamento sofreu pequenos acréscimos nos conjuntos (entre 2,52% e 12,80%), pois foi reajustado apenas com base na TR anual, as taxas do condomínio 117 Foram consultadas casas e apartamentos para alugar nos bairros em que o PAR tem imóveis, ou em bairros adjacentes. Os principais bairros encontrados nos jornais para a realização da consulta foram Bancários, Cidade Universitária, Geisel e Bairro dos Estados. Capítulo V ____________________________________________________________________ 209 aumentaram sensivelmente, chegando até a 50%, como no caso do Residencial Jardim Tropical (Tabela 32). Como será posteriormente comentado, esse incremento na taxa de condomínio despertou nos arrendatários muita insatisfação com a empresa designada para administrar os imóveis do programa. Não obstante, salienta-se que o Residencial Maria Apolônia foi o único conjunto em que a taxa de condomínio sofreu uma redução de mais de 60,00%. Constata-se que o Residencial Vista Bela é o único conjunto que não tem taxa condominial, pois foi concebido na forma de loteamento. Tabela 32 Taxas financeiras dos conjuntos financiados pelo PAR em João Pessoa (1999-2005) Taxas Taxa de arrendamento118 Taxa de condomínio Conjuntos Período de ocupação Início Atual(jul-06) Acrés. % Início Atual (jul-06) Acrés. % Res. Jardim Tropical 2002–2006 143,72 162,12 12,80 50,00 75,00 50 Res. Tropical Tambiá 2002–2006 146,72 161,08 9,79 61,00 80,00 31,15 Res. Litoral Sul 2002–2006 143,30 157,27 9,75 68,00 80,00 17,65 Res. Estado do Acre 2003–2006 152,98 167,01 9,17 68,00 88,00 29,41 Res. Jardins do Sul 2003–2006 149,68 156,50 4,56 65,00 81,00 24,61 Res. Via Norte II 2003–2006 148,08 155,17 4,79 70,00 85,00 21,42 Res. Estado de São Paulo 2003–2006 147,35 161,20 9,40 68,00 80,00 17,65 Res. Maria Apolônia 2003–2006 162,97 171,30 5,11 56,00 22,00 -60,71 Res. Jardins 2004–2006 147,95 151,68 2,52 65,00 74,00 13,85 Res. Vista Bela Módulo II 2005-2006 120,52 120,52 0,00 0,00 0,00 0,00 Média - 146,33 156,38 6,87 63,44 73,88 16,46 Fonte: Levantamento na administradora (entrevista realizada com a gerente administrativa, no dia 21- 07-06) Nota: Elaboração da autora 5.3 CARACTERÍSTICAS QUALITATIVAS DA PRODUÇÃO DO PAR EM JOÃO PESSOA As características qualitativas referem-se aos aspectos locacionais, tipológicos e construtivos que permeiam os conjuntos financiados pelo PAR localizados na cidade de João Pessoa. No tocante aos aspectos locacionais, foram tratadas, sobretudo, questões acerca da implantação no espaço urbano e da dimensão dos conjuntos. Quanto aos aspectos relativos à tipologia, foram abordadas questões como programa de necessidades, área privativa das unidades habitacionais, entre outras. 118 Incluindo o valor do seguro. Capítulo V ____________________________________________________________________ 210 A produção habitacional do PAR em João Pessoa seguiu muitas características da produção do programa verificadas no território nacional e discutidas no Capítulo III, como a construção de conjuntos de pequena dimensão (com menos de 160 uh), predominantemente compostos por edifícios de quatro pavimentos, volumetria simples e uso de grafismo nas fachadas. Os conjuntos são localizados de forma fragmentada na cidade, ocupando vazios urbanos, sem provocar transformações na estrutura nem na paisagem urbana, como será visto a seguir. 5.3.1 CARACTERÍSTICAS LOCACIONAIS DO PAR EM JOÃO PESSOA Com o desenvolvimento do programa, ocorreram alterações na forma locacional e tipológica dos conjuntos financiados pelo PAR, impulsionadas, em parte, pelas alterações legislativas ocorridas durante o governo Lula. As mudanças legislativas, especialmente as da Portaria n. 231 (2004) e da Portaria n. 142 (2005), possibilitaram uma mudança no perfil do público-alvo e, dessa forma, muitos financiamentos foram destinados ao PAR 2, facilitando o ingresso da população com renda de até quatro salários mínimos. Apesar disso, antes mesmo dessas mudanças, a partir de 2002 houve um deslocamento da produção para apenas uma região da cidade – a sudeste –, em bairros, como Valentina e Geisel, onde havia glebas maiores de terras (parcelamento maior de lotes) e o preço do solo era mais baixo no mercado de terras. Conforme já foi dito no Capítulo IV, durante o segundo mandato do governo de Fernando Henrique Cardoso o PAR produziu um maior número de conjuntos e de unidades habitacionais, em comparação com a produção da gestão de Lula. Ainda em relação à produção do PAR durante o governo de FHC, esta se caracterizou pela implantação prioritária de conjuntos compostos por edifícios, em diversos bairros na cidade, abrangendo diferentes áreas – zona central, sudeste, sudoeste, leste e norte. Apesar disso, as regiões sudeste e sul foram aquelas em que o programa atuou predominantemente, com 60,70% (729) das unidades implantadas (Tabela 33 e Figura 76). Comparando-se com a produção efetuada pela CEHAP e pelo IPEP entre 1999 e 2002, o PAR, assim como o programa Carta de Crédito Associativo, foram os programas que apresentaram maior diversidade locacional. Em função disso, esses dois programas se destacam na produção de habitações para o perfil que atende a população de baixa renda, pois oferecem a possibilidade de escolha entre vários bairros da cidade. Além da diversidade locacional, observando-se o entorno dos conjuntos financiados entre 1999 e 2002, pode-se perceber que eles foram predominantemente Capítulo V ____________________________________________________________________ 211 implantados perto de vias asfaltadas, com fluxo contínuo de transporte público. Também se observou a presença quase constante de pequenas mercearias localizadas nas redondezas. A partir de 2002, as principais mudanças de caráter quantitativo e qualitativo da produção do PAR foram: redução da quantidade de novas moradias financiadas e uma produção formada basicamente por unidades unifamiliares, que passou a se concentrar apenas na zona sudeste, da mesma maneira que os demais agentes de produção habitacional – públicos e privados (Tabela 33 e Figura 76). A relação com a tipologia se deve ao fato de que os novos terrenos escolhidos para a produção apresentavam maiores dimensões e um preço mais baixo, não necessitando do adensamento do lote. Tabela 33 Características gerais dos conjuntos habitacionais financiados pelo PAR em João Pessoa (1999-2005) Nome Ano (do contrato) Bairros Região Unidades Res. Via Norte II 01-11-2000 Alto do Céu Norte/Nordeste 128 Res. Jardim Tropical 13-11-2000 José Américo Sudeste 32 Res. Jardins 22-12-2000 Alto do Mateus Sudoeste 160 Res. Jardins do Sul 27-12-2000 Água Fria Sudeste 144 Res. Litoral Sul 29-12-2000 Jardim São Paulo Sudeste 128 Res. Cristo Redentor I119 01-02-2001 / 2004 (novo contrato) Cristo Sul 64 Res. Victória120 28-03-2001 / 2004 (novo contrato) Cristo Sul 62 Res. Raquel de Queiroz121 25-04-2001 / 2004 (novo contrato) Cidade Universitária Sudeste 64 Res. Estado do Acre 26-04-2001 Pedro Gondim Leste 72 Res. Estado de São Paulo 26-04-2001 Pedro Gondim Leste 72 Res. Tropical Tambiá 30-04-2001 Tambiá Central 40 Res. Maria Apolônia 26-02-2002 José Américo Sudeste 118 Res. Major Emídio Sarmento 16-09-2002 Geisel Sudeste 117 Res. Vista Bela Módulo II 22-10-2004 Geisel Sudeste 91 Res. Sérgio Queiroz 30-06-2005 Valentina Sudeste 149 Res. Araçá 05-10-2005 Geisel Sudeste 48 Res. Valentina 27-09-2006 Valentina Sudeste 124 TOTAL 1.613 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora 119 Obra ainda em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. 120 Obra ainda em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. 121 Obra em fase de execução por uma segunda empresa construtora devido a problemas com a primeira empresa, como será explicado depois. Capítulo V ____________________________________________________________________ 212 LEGENDA: PAR (1999-2002) PAR (2003-2006) Figura 76: Produção habitacional entre 1999 e 2006 do PAR em João Pessoa. Fonte: Base cartográfica da Prefeitura Municipal de João Pessoa (2006) Nota: É importante salientar que essa localização é apenas esquemática, cujo objetivo é indicar primeiramente o bairro contemplado De modo global, as características locacionais do PAR em João Pessoa podem ser resumidas nos seguintes pontos: x implantação na malha urbana e em locais dotados de infra-estrutura básica, alguns serviços e acesso a transporte público. Isso termina causando a adoção de vazios urbanos situados em áreas de expansão recente e gerando uma produção pulverizada na cidade; x o aproveitamento dos vazios urbanos, promove, por conseguinte, a construção de conjuntos de pequeno porte (abaixo de 160uh), uma vez que a dimensão dos lotes remanescentes é geralmente reduzida; x diversificação locacional, possibilitando aos arrendatários várias opções de bairros. No entanto, no governo Lula, tem havido uma tendência à uniformização da produção na região sudeste, especialmente nos bairros do Geisel e de Valentina; Muitas dessas características são frutos das exigências locacionais do programa, listadas no Capítulo III, portanto são facilmente encontradas na produção do PAR em outras cidades brasileiras. João Pessoa: divisão dos bairros da cidade Centro histórico da cidade de João Pessoa Capítulo V ____________________________________________________________________ 213 Buscando-se melhor compreender a escolha locacional, foram realizadas entrevistas com alguns construtores que participaram da produção do PAR122. Constatou-se, assim, que alguns deles eram proprietários dos terrenos, enquanto outros compraram lotes apenas para produzir habitações pelo programa. Os terrenos comprados, por sua vez, foram escolhidos por razões diversas, como a condição topográfica, mas, principalmente, o preço. Quando foram perguntados sobre a relação percentual entre o valor do terreno e o do investimento do PAR, as respostas dos construtores oscilaram muito: entre 5% e até 20% do investimento total. Deve ser ressaltado também que, de acordo com as entrevistas realizadas, a maioria dos terrenos era vazio urbano, comprovando-se a pretensão indireta do programa de preenchimento destes. 5.3.2 CARACTERÍSTICAS TIPOLÓGICAS E CONSTRUTIVAS DO PAR EM JOÃO PESSOA Do ponto de vista das características tipológicas, a produção do PAR em João Pessoa pode ser dividida em dois modelos, aqui denominados de padrão vertical (edifícios de quatro pavimentos) e padrão horizontal (unidades unifamiliares e unidades geminadas de até dois pavimentos) (Tabela 34). Analisando-se esses modelos, verifica-se, conforme a Tabela 34, que eles foram construídos em espaços e tempos distintos. Houve, portanto, ao longo dos anos, mudança de tipologias na produção do PAR, isto é, de edifícios multifamiliares, construídos entre 2000 e 2001, para unidades predominantemente unifamiliares, construídas a partir de 2002. É importante salientar que uma das razões que motivaram a substituição de um tipo por outro foi a mudança do perfil do público alvo, resultado das já citadas medidas jurídicas implementadas em 2004 (apesar de a transformação ter-se iniciado em 2002). Com isso, para atendimento das necessidades de moradia da população que recebe até quatro salários mínimos (PAR 2), a produção do PAR se deslocou para a região sudeste, onde havia glebas maiores de terra a baixo custo, o que possibilitou a construção de conjuntos no padrão horizontal. Esses conjuntos são os Residenciais: Vista Bela, Araçá, Sérgio Queiroz e Valentina123. 122 As entrevistas com os construtores estão detalhadas no item “Empresas construtoras”, da parte referente aos “Agentes participantes do PAR em João Pessoa”, no final deste capítulo. 123 Informações obtidas em entrevista na CAIXA da Paraíba, na seção GILIE (Gerência de Filial de Alienar Bens Móveis e Imóveis), no dia 30 de maio de 2006. Entrevistou-se simultaneamente um analista do PAR (Cláudio) e o gerente da GILIE-CAIXA, Clóvis Silva Madruga Júnior. Como a Capítulo V ____________________________________________________________________ 214 Essa mudança de tipologias com o desenvolvimento do programa, pode ter sido motivada também pelos muitos problemas condominiais ocorridos na gestão dos imóveis, entre a empresa administradora e os arrendatários. Tabela 34 Características arquitetônicas dos conjuntos habitacionais financiados pelo PAR (1999-2005) Padrão Conjunto Ano (de contrato) Unidades Distrib. das uh. em blocos n. de uh. por pav. Tipologia m² da uh. Via Norte II 2000 128 8 4 Edifício 56,45 Jardim Tropical 2000 32 2 4 Edifício 53,10 Jardins 2000 160 10 4 Edifício 56,23 Jardins do Sul 2000 144 9 4 Edifício 56,28 Litoral Sul 2000 128 8 4 Edifício 53,03 Cristo Redentor I 2001 64 4 4 Edifício 51,00 Victória 2001 62 3 4 Edifício 51,00 Raquel de Queiroz 2001 64 4 4 Edifício 51,00 Estado do Acre 2001 72 3 6 Edifício 49,68 Estado de São Paulo 2001 72 3 6 Edifício 49,68 Ve rti ca l Tropical Tambiá 2001 40 2 5 Edifício 54,30 Maria Apolônia 2002 118 - 1 Unifamiliartérrea 60,01 Major Emídio Sarmento 2002 117 - 1 Unifamiliar com 2 pav. 58,73 Vista Bela Módulo II 2004 91 - 1 Unifamiliar térrea 35,10 Sérgio Queiroz 2005 149 - 1 Unifamiliartérrea 35,11 Araçá 2005 48 12 2 Geminada com 2 pav. 37,89 H or iz on ta l Valentina 2006 124 - 1 Unifamiliartérrea 35,10 Total 1.613 Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2005, 2006) Nota: Elaboração da autora Padrão vertical A transformação da produção do PAR não se restringiu apenas à tipologia, do padrão vertical para o padrão horizontal. Também houve uma pequena diminuição na dimensão dos conjuntos de edifícios, apesar de todos serem considerados de pequeno porte (abaixo de 160 uh). Em 2000, primeiro ano de desenvolvimento do programa, a maioria dos conjuntos construídos era composta por mais de 100 unidades, mais entrevista foi feita antes do financiamento do Residencial Valentina, não se tem informação sobre se esse residencial é um empreendimento PAR 1 ou PAR 2. Capítulo V ____________________________________________________________________ 215 especificamente 128, 144 ou 160 unidades em cada empreendimento (exceto o Residencial Jardim Tropical). No ano seguinte, 2001, a dimensão foi reduzida e os conjuntos passaram a ser compostos por quatro, seis ou sete dezenas de unidades (Tabela 34). Não obstante a redução da dimensão dos conjuntos, o padrão vertical manteve suas principais características em 2000 e 2001. Seguindo a tendência nacional, esse padrão foi marcado por edifícios multifamiliares de até quatro pavimentos (térreo mais três andares, para se evitar o uso de elevadores), em que o pilotis foi suprimido e, em seu lugar, foram instaladas unidades habitacionais. A verticalização e a ocupação do pilotis proporcionam adensamento populacional e visam à diminuição do custo unitário das habitações. Na maioria dos casos – 72,73% (oito conjuntos) –, o padrão vertical é formado, ainda, por quatro apartamentos em cada pavimento. Essa solução de organização espacial dos edifícios é freqüentemente adotada devido à economia que proporciona, uma vez que resulta num formato quase quadrado (um paralelepípedo), que confere à edificação uma maior compacidade – ocupa menos espaço no lote –, possibilitando construírem-se mais blocos de apartamentos. Além disso, esse tipo de planta reduz o espaço de circulação coletiva, contribuindo para o aumento do espaço privativo. Assim, o edifício com quatro unidades em cada um dos quatro pavimentos vem se tornando um modelo paradigmático na construção de edifícios para a população de menor renda, o que já vinha sendo adotado na produção da CEHAP e nas produções financiadas pelo programa Carta de Crédito Associativo, desde o início da década de 1990. Todavia, o Residencial Tropical Tambiá e os Residenciais Estado do Acre e Estado de São Paulo adotaram outra solução de planta, com cinco e seis unidades por pavimento, respectivamente. O programa de necessidades adotado é o programa básico recomendado pelo PAR, composto por sala, dois quartos, banheiro social, cozinha e área de serviço. No entanto, há pequenas variações, na medida em que alguns projetos previram varanda e outros transformaram um dos quartos em suíte, acrescentando, portanto, mais um banheiro. Saliente-se que esse programa de necessidades foi também muito adotado nas unidades produzidas pela CEHAP: por exemplo, o conjunto Mangabeira VII e o Portal do Seixas (ver Figuras 43 e 50). Já a área média privativa dessas unidades do PAR é igual a 52,89m², ou seja, a dimensão dos apartamentos está acima da mínima recomendada pelo programa para a região Nordeste, que é igual a 35m². Quanto à organização espacial dos apartamentos do PAR, estes podem ser divididos em dois modelos, que adotaram soluções de planta diversificadas. De modo geral, o primeiro modelo é aquele em que um quarto está ao lado da sala, seguido pelo outro dormitório, como ilustra a planta do Residencial Litoral Sul (Figuras 77 e 78). Também Capítulo V ____________________________________________________________________ 216 seguem esse modelo os Residenciais Jardins do Sul, Tropical Tambiá, Estado do Acre, Estado de São Paulo, Cristo Redentor I, Raquel de Queiroz e Victória. Figura 77: Residencial Litoral Sul, no bairro Jardim São Paulo (Bancários) (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 78: Planta baixa do Residencial Litoral Sul Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) O segundo modelo é aquele em que os dormitórios estão ao longo do comprimento da sala, como no caso dos Residenciais Via Norte II, Jardins e Jardim Tropical (Figuras 79 e 80). Figura 79: Residencial Via Norte II, localizado no Alto do Céu (norte/nordeste) Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 80: Planta baixa do Residencial Via Norte II Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Apesar dos dois modelos de planta, a solução plástica é bem semelhante entre ambos: blocos de apartamentos com pouca ou nenhuma intenção volumétrica. Em função Capítulo V ____________________________________________________________________ 217 disso, os arquitetos fazem uso de grafismos nas fachadas, utilizando cores diversas. Conforme já foi demonstrado em capítulos anteriores, os blocos – predominantemente – monolíticos e o grafismo foram empregados também em conjuntos do PAR localizados em outras cidades brasileiras. Em relação aos aspectos da construção, houve uma preocupação em se produzir com qualidade, expressa no emprego de materiais de bom padrão construtivo, como lambris (que foram empregados em alguns edifícios), e de materiais com qualidade certificada pelo PBQP-H. Ademais, em razão da exigência da CAIXA regional da Paraíba, todos os edifícios foram revestidos externamente com material cerâmico (o que demonstra um cuidado com o acabamento e a durabilidade da construção), característica que marcou a capital paraibana. Em outros estados brasileiros, muitos edifícios do programa são apenas pintados, o que não significa que são de qualidade construtiva e estética duvidosa ou inferior. Em João Pessoa, inclusive, muitos edifícios construídos na década de 1990 – aqueles produzidos pela CEHAP ou os financiados pelo programa Carta de Crédito Associativo – também são pintados. É interessante lembrar que o Carta de Crédito Associativo é um programa que, muitas vezes, destina-se a um público-alvo de capacidade de pagamento maior que a do público-alvo do próprio PAR, mas isso não impediu que seus edifícios fossem pintados, em vez de revestidos. Então, percebe-se que o PAR faz certas exigências com a qualidade da sua construção (o que é considerado um aspecto positivo), porém tais exigências têm gerado conflitos entre a GIDUR da Paraíba e alguns construtores. Estes alegam incompatibilidade entre o valor máximo estipulado para as unidades habitacionais e as exigências feitas pela CAIXA. A busca pelo barateamento da construção também tem sido observada na produção do PAR, embora de uma forma diferente do barateamento da construção estimulado pelos IAPs ou o empregado pelo BNH. Para os Institutos de Aposentadoria e Pensões, diminuir o custo das habitações tinha um objetivo social: promover uma maior produção, para um maior número de pessoas. Com o advento do BNH, barateavam-se as construções reduzindo-se concomitantemente a qualidade da construção, a fim de se promover habitação de baixo custo para a população de renda mais baixa. Já no PAR, as construtoras perseguem o barateamento da construção, mas não comprometendo a qualidade construtiva, devido às exigências e fiscalizações promovidas pela CAIXA. Por isso, uma das técnicas empregadas para o barateamento foi a reprodução de um mesmo projeto arquitetônico em três empreendimentos financiados pelo programa, diminuindo-se, assim, as despesas com projetos (Figuras 81, 82, 83 e 84), assim como verificado em Natal, no Residencial Ribeira I e II. Vale salientar que essa técnica não é exclusiva do PAR, uma vez que a CEHAP também reproduziu o mesmo projeto em diferentes conjuntos espalhados Capítulo V ____________________________________________________________________ 218 pela cidade (o Portal do Seixas e o Celso Mariz são exemplos da produção da CEHAP com um mesmo projeto arquitetônico). Figura 81: Residencial Cristo Redentor I, localizado no bairro do Cristo (região sul) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 82: Residencial Victoria, localizado no bairro do Cristo (região sul) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 83: Residencial Raquel de Queiroz, localizado no bairro Cidade Universitária (região sudeste) Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 84: Planta baixa do Residencial Cristo Redentor I igual à planta do Residencial Victória e Raquel de Queiroz Fonte: ARRUDA (2005)124 Dessa primeira fase da produção habitacional do PAR, o projeto arquitetônico do arquiteto Expedito Arruda (figuras acima) pode ser destacado, por se preocupar com as questões volumétricas e estéticas. Há intenção volumétrica através da diferenciação entre algumas superfícies, evitando-se os blocos totalmente compactos e sem recortes. Entretanto, ao analisar-se a produção do PAR à luz do projeto arquitetônico dos conjuntos verticais construídos pela CEHAP entre 1995 e 1998 – conjuntos Portal do Seixas e Celso Mariz (Figuras 48 e 49) –, percebem-se algumas semelhanças: ambos os projetos são 124 Escritório de Expedito Arruda, arquiteto pernambucano que atua na capital paraibana há anos. Trabalhou em projetos importantes da cidade, como o Espaço Cultural e é autor de muitos outros projetos de destaque. Capítulo V ____________________________________________________________________ 219 contemplados com unidades habitacionais compostas por sala, dois quartos, um banheiro social, cozinha/serviço, de maneira que os cômodos apresentam a mesma disposição. A presença de uma varanda é também um ponto de semelhança entre as duas produções, apesar de, no peitoril, terem sido utilizados materiais diferentes – a edificação do PAR foi contemplada com gradis nos peitoris, o que confere um pouco de leveza ao bloco sólido do edifício. Em contrapartida, foram observadas várias diferenças entre os edifícios da CEHAP e os do PAR, sobretudo no que tange aos tipos de materiais empregados: enquanto os edifícios do primeiro agente são apenas pintados, todos os edifícios do PAR são revestidos externamente com material cerâmico. Há, ainda, a instalação de lambris no teto do Residencial Cristo Redentor I e no do Jardim Tropical, ambos financiados pelo Programa de Arrendamento Residencial. Em outras palavras, os edifícios do PAR, quando comparados aos da CEHAP, apresentam uma melhor qualidade construtiva. Outro aspecto observado na produção vertical do PAR em João Pessoa foi a presença de varandas no programa de necessidades, a qual contribui para os efeitos volumétricos. Inicialmente, é importante mencionar que, na história da arquitetura brasileira as varandas têm sido fundamentais na composição arquitetônica – o terraço das casas- grandes e das casas coloniais dos bandeirantes, o alpendre das residências construídas no início do século XX, o terraço-jardim dos projetos modernistas, etc. Em cada caso, a varanda desempenhou funções diferentes, no entanto salienta-se sua importância como elemento de proteção climática (colaborando, em particular, para o sombreamento da unidade habitacional). Ela é, ainda, responsável por estabelecer uma relação entre os ambientes interno e externo e é utilizada como um espaço social, estimulando a socialização entre família e visitantes. Em João Pessoa, o edifício “18 andares” é um bom exemplo do uso da varanda em edificações residenciais. Em relação aos edifícios do PAR, as unidades habitacionais de cinco deles (45,45%) dispõem de varanda. São eles: o Residencial Jardim Tropical, o Tropical Tambiá, o Cristo Redentor I, o Raquel de Queiroz e o Residencial Victória (Figuras 85 e 86). A importância da varanda, inclusive, foi declarada nas respostas aos questionários aplicados com os arrendatários: aqueles que moravam em unidades sem varanda demonstraram insatisfação com a ausência desse elemento em seus apartamentos, alegando a importância do ponto de vista funcional (para secar roupa e ventilar mais a moradia) e até mesmo do ponto de vista estético, pois consideravam que a varanda é uma condição para se garantir a estética do edifício. Capítulo V ____________________________________________________________________ 220 Comparando-se dois edifícios do PAR, dos quais um tinha varanda e o outro não, percebeu-se que o edifício com varanda oferecia à edificação maior possibilidade volumétrica, pois evitava a forma de um paralelepípedo contendo pequenas janelas, que confere um aspecto monótono à edificação125 (Figuras 85, 86, 87 e 88). Figura 85: Residencial Jardim Tropical localizado no bairro José Américo (sudeste), com varanda Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 86: Planta baixa do Residencial Jardim Tropical Fonte: ROCHA (2005)126 Figura 87: Residencial Jardins do Sul localizado no bairro Água Fria (sudeste), sem varanda Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 88: Planta baixa do Residencial Jardins do Sul Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) É importante ressaltar, ainda, que, embora não sendo exigido pelo programa – para a região Nordeste, especificamente –, nos conjuntos verticais do PAR há presença 125 Não significa dizer que o edifício em paralelepípedo expressa uma arquitetura formalmente pobre. O edifício do “18 andares”, por exemplo, apresenta uma forma simples, porém com outros elementos como grandes esquadrias e varandas, que colaboravam com a ventilação das unidades e ofereciam uma visão panorâmica, contribuindo para relacionar o interior com o exterior. Os edifícios do PAR, por sua vez, são blocos compactos (tipologia com quatro apartamentos por andar), incrustados de pequenas esquadrias, distribuídas uniformemente na fachada, que recebe, no máximo, um tratamento cromático, um grafismo na fachada, a fim de evitar uma monotonia visual 126 Escritório de Cristina Rocha, arquiteta paraibana. Capítulo V ____________________________________________________________________ 221 maciça de equipamentos comunitários, como portarias de entrada nos empreendimentos, salão de festas, quadras poliesportivas, playgrounds, etc. Essa foi uma característica evidenciada também em outros conjuntos do PAR no país, como no conjunto Laçador, de Pelotas, e no conjunto Galápagos, de Maceió. Em suma, as características da produção do padrão vertical são sintetizadas a seguir: x o programa de necessidades adotado nas unidades financiadas pelo PAR em João Pessoa é o básico recomendado pelo programa; x os apartamentos apresentam uma área média de 52,89m²; x os blocos de apartamentos têm pouca – ou não têm nenhuma – intenção volumétrica, mas há grafismos nas fachadas; x há preocupação com a qualidade da produção, exigida e fiscalizada pela CAIXA; x há poucas formas de comunicação entre o ambiente interno e o externo: as janelas são de pequenas dimensões e apenas em alguns edifícios os apartamentos contêm varanda. Padrão horizontal O outro padrão arquitetônico do PAR, o padrão horizontal, passou a existir apenas a partir de 2002, quando a produção se deslocou para a região sudeste, em bairros onde o preço da terra urbana era mais baixo (Valentina e Geisel), possibilitando a construção de casas. Nesse padrão foram consideradas três tipologias diferentes: unifamiliar térrea, unifamiliar duplex e geminada multifamiliar. Não obstante, o fato é que a maioria das unidades habitacionais é do tipo casa isolada em lote individual, solução extremamente disseminada pela política do BNH. Os conjuntos do padrão horizontal podem estar organizados em duas formas: condomínios fechados (Residenciais Maria Apolônia e Araçá) ou loteamentos (Residenciais Vista Bela e Sérgio Queiroz), este último preferencialmente recomendado pela CAIXA (Figuras 89, 90, 91 e 92). A forma de loteamento também foi mais disseminada na produção habitacional promovida pela CEHAP, pelo IPEP e pela FAC. Já no programa Carta de Crédito Associativo, os condomínios fechados constituíram uma importante forma de produção. Capítulo V ____________________________________________________________________ 222 Figura 89: Residencial Maria Apolônia, localizado no bairro José Américo (região sudeste) e organizado na forma de condomínio fechado Fonte: Acervo da autora (2005) Figura 90: Residencial Sérgio Queiroz, localizado em Valentina (região sudeste) e organizado na forma de loteamento Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 91: Residencial Araçá, localizado no Geisel (região sudeste), na forma de condomínio fechado Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 92: Residencial Emídio Sarmento, localizado no Geisel (região sudeste), unidades do tipo duplex, na forma de condomínio fechado Fonte: Acervo da autora (2006) Nos condomínios fechados, encontram-se alguns equipamentos coletivos, como portaria, salão de festas, playgroud, e até quadra. O melhor exemplo é o condomínio Maria Apolônia, que conta com todos esses equipamentos, apesar do estado de degradação deles (Figuras 93 e 94). Já a composição dos loteamentos é mais simples, contando apenas com as unidades habitacionais. No que tange às características das unidades, assim como o padrão vertical, o padrão horizontal empregou o programa de necessidades básico do PAR, com exceção do Residencial Maria Apolônia, que é o único conjunto do programa com três dormitórios na unidade. A área média privativa dessas unidades sofreu um processo de diminuição: inicialmente as unidades continham 60 e 58m² – Residenciais Maria Apolônia e Major Emídio Sarmento, respectivamente. Com o governo Lula e os novos mecanismos legislativos para a inserção da população de menores rendas (até 4sm), as casas foram diminuindo de dimensão para se fazer frente à capacidade de pagamento desse novo Capítulo V ____________________________________________________________________ 223 público-alvo: área média dessas casas passou para a faixa de 35m² (Tabela 34). De modo global, a área média privativa do padrão horizontal é igual a 45,37m², superior à área mínima recomendada pelo programa (igual a 35m² para a região Nordeste, como indicado no Capítulo III). Figura 93: Praçinha e playground no Residencial Maria Apolônia Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 94: Quadra e salão de festas do Residencial Maria Apolônia Fonte: Acervo da autora (2006) Comparando-se as unidades habitacionais do modelo horizontal com as do modelo vertical, as primeiras têm menores dimensões. No entanto, se estas forem comparadas às unidades habitacionais produzidas pelos agentes discriminados no Capítulo IV, como a CEHAP, o IPEP, a FAC e a própria PMJP, as unidades financiadas pelo PAR são de maior dimensão e contam com dois quartos, como ilustram as Figuras 95 e 96: Figura 95: Planta baixa do Residencial Araçá Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Figura 96: Planta baixa do Residencial Sérgio Queiroz Fonte: Levantamento realizado na CAIXA (2006) Além disso, como o tipo predominante é a casa unifamiliar, observa-se uma inter-relação entre os espaços interno e externo facilitada pela presença de quintais, jardins Capítulo V ____________________________________________________________________ 224 e varandas, em algumas unidades, como o Residencial Maria Apolônia e o Major Emídio. Já no caso das unidades não contempladas com varanda é permitido aos arrendatários construírem terraços, desde que observado o padrão de expansão proposto pelo projeto de arquitetura e com expressa anuência da CAIXA. Outra questão que deve ser apontada nas casas unifamiliares é a possibilidade de ampliá-las, na medida em que surge a necessidade de mais um cômodo. As características gerais do padrão horizontal podem ser resumidas em quatro itens: x o programa de necessidades adotado nas unidades financiadas pelo PAR em João Pessoa é o básico recomendado pelo programa; x as unidades têm uma área média de 45,37m²; x a arquitetura das habitações é simples; as casas são construídas com telhado na forma de duas águas, da mesma forma que a produção das casas da CEHAP, do IPEP e da FAC; x há preocupação com a qualidade da produção, exigida e fiscalizada pela CAIXA, assim como no padrão vertical; x há maior possibilidade de inter-relação entre os espaços interno e externo; Pode-se afirmar, por fim, que o padrão horizontal buscou atender um público- alvo de menor renda, comparando-se com o do padrão vertical. Com isso, promoveu-se a redução de custos, primeiramente por meio da escolha do local de implantação dos empreendimentos, mas também pela diminuição do tamanho das unidades e a ausência de equipamentos coletivos em alguns conjuntos. As casas foram construídas com materiais simples, porém de boa qualidade, e algumas unidades, como as do Residencial Vista Bela, por exemplo, não têm nem laje. * * * Em linhas gerais, independentemente da tipologia, com o objetivo de promover uma produção com qualidade construtiva, a regional da CAIXA apresenta um maior controle qualitativo, especialmente na fiscalização das obras. Através da GIDUR, ela exige dos construtores que os materiais utilizados nos empreendimentos sejam certificados pela Capítulo V ____________________________________________________________________ 225 norma ISO 9001127, além de fazer outras exigências, como o revestimento cerâmico nos edifícios, conforme já foi mencionado. No entanto, apesar dessas exigências, foram constatados, em muitos conjuntos, os chamados “vícios de construção” que são os problemas encontrados devido à má execução dos serviços na obra, como as infiltrações, o mau funcionamento das instalações hidráulicas, etc., gerando insatisfação dos arrendatários, como será explanado mais adiante. Outro aspecto de insatisfação dos moradores, encontrado nos dois padrões aqui estabelecidos – vertical e horizontal –, diz respeito às garagens dos veículos automotivos. Em todos os conjuntos há vagas, todavia estas são entregues sem a cobertura. Em razão disso, alguns moradores vêm providenciando, por conta própria, a cobertura de suas próprias garagens (muitos com a devida concessão da administradora e da CAIXA), enquanto outros permanecem insatisfeitos, pois não são autorizados a construir sua garagem coberta, já que sua vaga se localiza no recuo do lote, que é uma área não edificável. Mesmo diante desses problemas com a qualidade construtiva dos conjuntos do PAR e alguma insatisfação apresentada pelos moradores, essa produção se constitui em uma evolução na produção habitacional brasileira para os últimos anos, se seus problemas forem comparados aos problemas qualitativos encontrados em muitos conjuntos financiados pelo BNH, em especial. Comparando-se, ainda, com a produção efetuada pelos agentes públicos (e até de alguns conjuntos construídos via programa Carta de Crédito Associativo), na cidade de João Pessoa, a partir da década de 1990, verifica-se que a produção do PAR tem melhor padrão construtivo. Finalmente, no tocante à arquitetura das moradias financiadas pelo PAR, observa-se uma transformação de unidades multifamiliares para unidades unifamiliares e a gradual redução da área privativa das habitações e dos equipamentos comunitários. Tudo isso tem como objetivo a máxima redução dos custos, visando ao atendimento da população que ganha até quatro salários mínimos. Pode-se afirmar também que muitas dessas mudanças foram frutos de uma série de outros fatores, dentre os quais se destacam as condições urbanas, pois, segundo o construtor Gilmar Graciliano de Vasconcelos (da Construtora Tropical LTDA.)128, o preço dos terrenos vem aumentando nos últimos anos e, provavelmente, apenas Valentina e Geisel (região sudeste) comportariam empreendimentos com as características do PAR, devido ao baixo valor do solo urbano naqueles bairros, que 127 Exigência mencionada em entrevista realizada com o Sr. Milton Gomes de Queiroz, proprietário da Construtora Poliedro LTDA., no dia 26 de abril de 2006. 128 Entrevista realizada no dia 26 de maio de 2006. Capítulo V ____________________________________________________________________ 226 possibilitaria a construção de unidades a baixo custo e compatíveis com as exigências construtivas do programa e da CAIXA. 5.4 AGENTES PARTICIPANTES DO PAR EM JOÃO PESSOA Até o presente momento, procurou-se identificar as características tipológicas e locacionais dessa forma diferente de financiamento que surgiu no final da década de 1990 e vem se destacando na construção de conjuntos habitacionais de melhor padrão construtivo na cidade de João Pessoa. O surgimento de uma forma de produção diferente gera vários questionamentos: Qual o perfil dos vários agentes envolvidos nessa nova forma de produção? O que leva cada agente a se envolver no processo de produção habitacional do PAR, ou seja, de que maneira cada envolvido no processo se beneficia do financiamento? e Quais são as visões formadas pelos diversos envolvidos no programa a respeito do PAR? Procurando-se elucidar tais questões, a seguir serão caracterizados alguns desses agentes, a fim de se compreender quem são e qual a posição de cada um deles no programa. 5.4.1 PREFEITURA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA Como já foi mencionado, o governo estadual ou o municipal podem atuar em várias frentes no desenvolvimento do programa – na isenção de algumas taxas e impostos, na indicação de áreas de intervenção, na implantação de infra-estrutura, na alocação de recursos e na geração da demanda. No caso da capital paraibana, a Prefeitura Municipal de João Pessoa vem atuando de duas formas principais: promovendo projetos de reutilização de edifícios localizados no sítio histórico para serem financiados pelo programa, e com um conjunto de medidas de isenção de algumas taxas e impostos. Esse conjunto de medidas visa à redução do valor final da mercadoria moradia, estimulando-se a produção das habitações inseridas na malha urbana dotada de infra-estrutura. Tais medidas foram instituídas em 2004, quando foi sancionada a Lei Complementar n. 035, de 07 de julho. As isenções de que trata essa lei referem-se às seguintes taxas e impostos: x Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis – ITBI; x Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU; x Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISSQN; Capítulo V ____________________________________________________________________ 227 x Taxa de Licença para Construção de Obras Particulares, Arruamentos, Loteamentos e Habite-se; x Taxa de Coleta de Resíduos – TCR. A isenção dessas taxas ou impostos pode ser isolada ou cumulativa e pode ser concedida para diversos agentes: para a empresa construtora, para os arrendatários, etc. Como a vigência da lei começa em 2004, poucos foram os empreendimentos beneficiados por ela. Após esse ano, apenas três conjuntos foram financiados – Residenciais Sérgio Queiroz, Araçá e Valentina –, e todos eles foram contemplados pela lei. É importante salientar que, dentre os programas habitacionais do governo federal, além do Crédito Solidário, que isenta a construção de habitações da taxa de alvará, o PAR é o único que recebe legalmente um pacote de benefícios de isenção de taxas e impostos concedidos pela prefeitura. A outra forma de atuação da PMJP no PAR não foi instituída por lei nem está documentada no normativo da CAIXA-PAR (2006), mas vem sendo desenvolvida desde 2004, na elaboração da proposta de reutilização de um conjunto de oito casarões: sete localizados na Rua João Suassuna, e um localizado na Rua 15 de Novembro, todos no centro histórico da capital paraibana (Figuras 97 a 99). Segundo o secretário de Habitação, João Azevedo129, o Ministério Público promoveu uma ação contra os proprietários dos casarões para que estes recuperassem seus imóveis, que são importantes para a história da cidade mas estavam abandonados e em estado avançado de degradação. Como os imóveis eram detentores de elevados débitos com a prefeitura – referentes ao IPTU ou de outra natureza –, os proprietários negociaram a retirada das dívidas em troca da doação dos imóveis ao governo municipal. Após essa etapa, previu-se a revitalização e a reutilização das casas por meio dos recursos do FAR, para serem destinadas preferencialmente ao uso habitacional dos funcionários da própria prefeitura130. O projeto de reutilização prevê cinco unidades habitacionais em cada casarão, e as unidades são compostas por sala, dois quatros, banheiro, cozinha e serviço em uma área oscilando entre 40m² e 60m². Tais propostas reúnem duas grandes vantagens: de um lado, a revitalização do centro histórico da cidade, que, como vários outros centros históricos do país, não está sendo objeto de uso residencial, tornando-se espaço restrito para o desenvolvimento de 129 Entrevista realizada no dia 24 de abril de 2006 (roteiro da entrevista em Anexo B). 130 Durante a realização da entrevista com o secretário de Habitação, João Azevedo, no dia 24 de abril de 2006, o prefeito Ricardo Coutinho entrou na sala em que ocorria a entrevista e expressou tal vontade. Capítulo V ____________________________________________________________________ 228 atividades terciárias; e, de outro lado, a oferta de habitação, em localização central, para a população de menor renda, que é a que mais usa o transporte coletivo (muitos ônibus convergem para a área central da cidade). Até junho de 2007, o financiamento dessas propostas estava em processo de licitação na CAIXA. Apesar disso, não se pode deixar de mencionar que esse é um processo que encontra muitas dificuldades para definitivamente concretizar-se, motivo pelo qual são poucos os exemplos dessa forma de atuação do PAR na revitalização dos centros históricos no país, como já foi discutido no Capítulo III. Figura 97: Conjunto de casas da Rua João Suassuna Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 98: Casarão 27 da Rua João Suassuna Fonte: Acervo da autora (2006) Figura 99: Casarão 13 da Rua João Suassuna Fonte: Acervo da autora (2006) 5.4.2 EMPRESAS CONSTRUTORAS Como resultado da pesquisa de campo, com as entrevistas semi-estruturadas realizadas com os empresários da construção civil envolvidos no processo produtivo do PAR foi possível traçar o perfil desse agente bem como averiguar suas opiniões acerca do programa, permitindo um maior conhecimento da operacionalização do Programa de Arrendamento Residencial. As entrevistas foram divididas em três partes, quais sejam: 1) Identificação e caracterização da empresa; 2) Em relação ao financiamento do PAR; 3) Localização e arquitetura do conjunto (modelo em Anexo C). Em João Pessoa, foram identificadas onze empresas construtoras que já participaram ou ainda participam do PAR. Da totalidade das empresas, apenas cinco foram entrevistadas; as outras não o foram por razões diversas: em alguns casos, as empresas ou os construtores não disponibilizaram horário para a realização da entrevista; em outros, as empresas não foram encontradas, nem o telefone, nem o endereço, tornando-se impossível qualquer contato (Quadro 13). Capítulo V ____________________________________________________________________ 229 A partir dos dados coletados na pesquisa de campo, juntamente com pesquisa documental realizada nos sites oficiais das empresas e da análise do material de propaganda dos seus empreendimentos, foi possível classificá-las, grosso modo, em três grupos: Grupo 1, Grupo 2 e Grupo 3. Há, ainda, um grupo chamado “Não classificado” que, devido à falta de informação, dificultou a caracterização e, por conseguinte, a classificação. Utilizou-se como critério para classificar essas empresas a clientela principal (não exclusiva) e o padrão de construção e localização mais adotado nos seus empreendimentos (Quadro 13). Quadro 13 Síntese das empresas construtoras envolvidas com o PAR e a respectiva construção (1999- 2005) Entrevistados Construtora Conjunto Classificação Sim (27-04-06) CRE – Engenharia Ltda Residencial Vista Bela Módulo II Res. Jardim Tropical Sim (26-05-06) Cogran Engenharia Ltda Res. Tropical Tambiá Grupo 1 Res. Via Norte II Res. Jardins do Sul Sim (25-04-06) Proenco – Projetos Empreendimentos e Construção Ltda Res. Estado do Acre Embora não tenha sido entrevistada, a Conserpa compartilha as mesmas opiniões da Proenco, uma vez que a segunda coordenou as obras da primeira (segundo o entrevistado da Proenco) Conserpa Res. Estado de São Paulo Res. Litoral Sul Sim (28-04-06) Ômega Construtora e Imobiliária Ltda Residencial Araçá Não RD Incorporações Ltda Res. Maria Apolônia Grupo 2 Sim (26-04-06) Construtora Poliedro Ltda Residencial Sérgio Queiroz Grupo 3 Não encontrado WR Engenharia Ltda Res. Jardins Res. Cristo Redentor I Res. Victória Faliu, de acordo com outros entrevistados Não encontrado Queiroz Ribeiro Engenharia Ltda J. Motta Engenharia Ltda Res. Raquel de Queiroz Não encontrado IPÊ Incorporações, Planejamento e Engenharia Ltda Res. Major Emídio Sarmento Não classificado Nota: Elaboração da autora O primeiro grupo é composto por empresas que atendem a uma clientela preferencialmente de baixa renda, atuando através de programas habitacionais do governo federal, como o PAR e, principalmente, através do programa Carta de Crédito Associativo. Por meio desse último programa as empresas do Grupo 1 construíram juntas 1.049 moradias em João Pessoa entre 1997 e 2003 (a “CRE Engenharia” construiu 716 novas unidades e a “Cogran Engenharia” construiu 333 novas unidades). Capítulo V ____________________________________________________________________ 230 Embora atendam à população de menor poder aquisitivo, essas empresas alegaram que, até o momento da entrevista (maio de 2006), não tinham se envolvido diretamente com a produção habitacional promovida pelos agentes públicos CEHAP ou IPEP, os quais se dirigem principalmente à classe de renda média baixa e à renda baixa. Mas é interessante frisar que os proprietários dessas construtoras já haviam tido uma participação com aqueles agentes, ora atuando profissionalmente na forma de assessoria técnica, ora por meio de uma outra empresa – a “Coesa Engenharia” (antiga “Cogran Engenharia”), que construiu pela CEHAP. Devido ao público-alvo, o primeiro grupo adota a região sudeste da cidade para a implantação de seus conjuntos, predominantemente compostos por unidades unifamiliares. Os bairros do Geisel, José Américo, Água Fria, Valentina e Bancários são os mais procurados, uma vez que apresentam maior disponibilidade de terrenos baratos, o que é fundamental para viabilizar a construção de habitação para baixa renda. A “Cogran Engenharia” também atua em bairros centrais, como Tambiá, construindo conjuntos compostos por edifícios, tanto pelo sistema PAR quanto pelo Carta de Crédito Associativo. O segundo grupo, por sua vez, é formado por empresas que, atendendo à população de média a alta renda, atuam, portanto, mais no mercado imobiliário. Em função dessa característica, preferem atuar em bairros da orla marítima, como Manaíra, Tambaú, Cabo Branco, Bessa, onde o metro quadrado do terreno é mais caro. O tipo mais empregado por essas empresas é o edifício verticalizado (a fim de fracionar o valor do terreno) e de melhor padrão construtivo, como pode ser observado nas figuras abaixo. Figura 100: Edifício Dom João, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “RD Incorporações” Fonte: Site da RD (2006) Figura 101: Edifício Porto Gurupi, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “Conserpa” Fonte: Site da Conserpa (2006) Figura 102: Ambassador Residence, localizado no bairro de Manaíra e construído pela “Ômega Construtora” Fonte: Acervo da autora (2007) No terceiro grupo, a única empresa classificada tem características dos dois grupos anteriores, ou seja, atua com a clientela de média e alta rendas e implanta seus Capítulo V ____________________________________________________________________ 231 empreendimentos tanto na orla marítima quanto em bairros de menor status social, como José Américo. Atua na construção de unidades habitacionais, mas também na construção de unidades comerciais e em obras industriais. Pela classificação acima exposta, percebeu-se que há empresas com perfis diversificados atuando no PAR. Eis que surge, então, uma questão: que fatores induziram as diferentes construtoras – especialmente aquelas cuja clientela é de maior rendimento – a se envolverem na produção de habitações ditas sociais, voltadas à baixa renda? Respondendo a essa questão, foram identificados alguns elementos que determinaram a participação dessas empresas no processo produtivo do PAR, quais sejam: x o pagamento imediato após as medições da obra pelos engenheiros da CAIXA, as quais se referem à conclusão de cada etapa da construção estipulada no cronograma de execução das obras; x o fato de o construtor não se responsabilizar pela demanda nem, tampouco, pela comercialização das unidades habitacionais. Em virtude dessas vantagens, quatro dos cinco entrevistados alegaram que pretendiam participar novamente do programa. Não obstante, muitas foram as dificuldades elencadas pelas construtoras: x elevado grau de exigência na GIDUR da CAIXA (regional da Paraíba) quanto à aprovação dos projetos, sobretudo quanto às especificações das habitações. Segundo um dos entrevistados, o grau de exigências é maior no PAR que em outros financiamentos da CAIXA; x burocracia para a aprovação dos projetos; x estimativas de custo máximo da construção das unidades habitacionais muito baixas (inicialmente em torno de R$ 20.000,00), quando confrontadas com as exigências da CAIXA; x baixa margem de lucro (segundo as entrevistas, em torno de 5 a 10%131. Alguns construtores disseram que a margem de lucro chega a ser até menor que 5%, por isso tinham tido prejuízo), e; x responsabilidade com a manutenção dos conjuntos por um período de cinco anos após a construção. 131 Segundo um dos engenheiros que avalia os projetos na CAIXA-RN (Eduardo Oliveira), a margem de lucro é, em média, 15% para o PAR. Por outro lado, em conversas informais com outros engenheiros e construtores, verificou-se que, no mercado imobiliário, normalmente a margem de lucro varia entre 20% e 30%. Capítulo V ____________________________________________________________________ 232 A baixa margem de lucro e o elevado grau de exigência da CAIXA em relação ao valor máximo das habitações foram considerados pelos entrevistados as maiores dificuldades enfrentadas pelas construtoras que atuaram em João Pessoa; mas esses problemas também ocorreram em Natal, por exemplo. Uma técnica da CAIXA consultada expressou a opinião de que a exigência se resume na fiscalização das obras (cumprimento do cronograma de execução) para a liberação dos recursos, a qual é mais rigorosa no PAR que nos demais programas de habitação132. Essa técnica, entretanto, é funcionária da GIDUR, regional da CAIXA do Rio Grande do Norte, onde o nível de exigência foi relativamente menor que na Paraíba, como foi explicado abaixo. Dentre as principais exigências da regional da Paraíba, destacam-se as seguintes: a localização dos empreendimentos na malha urbana infra-estruturada; as empresas, assim como os materiais utilizados deveriam ser normatizados pelo PBQPH133, e os edifícios de quatro pavimentos deveriam ser revestidos externamente; diferentemente da produção habitacional do PAR em outras cidades, onde os edifícios são apenas pintados, logo o custo final da obra foi menor. Visava, assim, a garantir uma melhor qualidade da construção. Ademais, pode-se perceber que, nos primeiros empreendimentos construídos, os apartamentos tinham área média privativa com cerca de 50,00m², e os conjuntos eram todos compostos por equipamentos coletivos, como salão de festas, quadra poliesportiva com tela, ou playground, o que contribuía para a aprovação dos projetos pela agência. Com o desenvolvimento do programa, conforme se observa nas características da produção do PAR na capital paraibana, houve uma gradativa diminuição na área das unidades e na presença de equipamentos coletivos, sobretudo no padrão horizontal. Portanto, pode-se afirmar que, inicialmente, o programa adotou características “ambiciosas”, seja por parte dos construtores, com a construção de equipamentos coletivos, seja da CAIXA, cujas exigências, muitas vezes, eram incompatíveis com o custo máximo estipulado para cada unidade, gerando, por fim, um conflito entre o agente financiador e o construtor. Devido a essas exigências, as primeiras empresas a participarem do programa afirmaram que “obtiveram prejuízo” participando do PAR. A produção das primeiras empresas coincidiu também com uma conjuntura econômica em que a inflação sofreu um aumento (depois de anos de controle), que afetou diretamente o custo da construção e, por conseguinte, causou a redução do lucro das empresas. Estas não puderam suplementar recursos para compensar a inflação do período de 2002 a 2003, sendo necessário, em 132 Segundo informações obtidas na entrevista informal com a arquiteta Elisabeth Silva, da GIDUR- RN, no dia 09 de maio de 2007. 133 Segundo informações obtidas na entrevista com o Sr. Milton Gomes de Queiroz, proprietário da “Construtora Poliedro”, no dia 26 de abril de 2006. Capítulo V ____________________________________________________________________ 233 alguns casos, que a própria empresa os suplementassem do próprio orçamento. Exatamente nesse período, ocorreu a falência de algumas empresas, como a “Queiroz Ribeiro Engenharia Ltda.”, sediada em Fortaleza. Participando do programa, essa construtora entrou em processo de decadência e, por isso, abandonou as obras inacabadas, segundo um dos construtores e a administradora do programa. Entretanto, esse tipo de processo não ocorreu apenas em João Pessoa134. Assim, as exigências, a dificuldade de suplementação de recursos e a conjuntura econômica, entre 2002 e 2003, formaram um conjunto de fatores que provocou um acentuado arrefecimento na produção do PAR em João Pessoa, onde não se produziu nenhuma nova moradia em 2003, diferentemente da produção no país, que alcançou o maior pico de crescimento no que tange à quantidade de novos financiamentos pelo PAR naquele ano. Como a dificuldade de suplementação de recursos e a conjuntura econômica equivalem para todo o território nacional, no caso específico da capital paraibana as exigências da regional da CAIXA foram a especificidade local, que provocou o arrefecimento da sua produção. Apenas em 2004 o PAR voltou a atuar, quando a postura da CAIXA parece ter mudado no tocante ao grau de exigência das características de produção, fato que, inclusive, foi confirmado na entrevista realizada com a “Ômega Construtora e Imobiliária”135. O proprietário da empresa afirmou ter voltado a participar do PAR, pois a “CAIXA está revendo alguns conceitos, […], está melhorando”. Outro problema enfrentado pelas empresas é a manutenção dos conjuntos. Os construtores são acionados para consertarem os problemas construtivos, no entanto eles alegam que, muitas vezes, são problemas provenientes do mau uso dos arrendatários, logo não são de sua responsabilidade, embora alguns retifiquem mesmo assim. É bem verdade que, contrariamente ao que alegam, os principais problemas que os construtores vêm retificando na manutenção são referentes aos “vícios de construção” deixados por eles mesmos na obra (exemplificando: infiltração no gesso, cerâmica do piso descolando do contrapiso, etc.). As entrevistas possibilitaram perceber, então, que o lucro das empresas do ramo da construção civil no PAR é mais baixo daquele obtido com a produção voltada para o mercado imobiliário, sendo que, no início da produção do PAR em João Pessoa, esse lucro foi prejudicado ainda mais devido ao maior nível de exigência da CAIXA na construção dos conjuntos e à conjuntura econômica. Como conseqüência o programa torna-se pouco atrativo financeiramente para as construtoras participarem, pois são empresas capitalistas 134 Em Natal-RN, por exemplo, duas empresas faliram, segundo informações obtidas na entrevista informal com a arquiteta Elisabeth Silva, da GIDUR-RN, no dia 09 de maio de 2007. 135 Entrevista realizada com o Sr. José Irenaldo Quintans, proprietário da “Ômega Construtora e Imobiliária”, no dia 28 de abril de 2006. Capítulo V ____________________________________________________________________ 234 que buscam o lucro. Apesar disso, se, por um lado, a margem de lucro é pequena, por outro, o investimento na construção de habitações pelo programa é garantido, uma vez que a CAIXA efetua o pagamento conforme é previsto no cronograma de atividades, e a demanda também é garantida (embora não seja responsabilidade da empresa construtora). Essa última característica é que atrai diferentes tipos de empresas, inclusive incorporadores e aquelas empresas voltadas para a construção de habitações para a população de alta renda. 5.4.3 ADMINISTRADORA136 Na etapa do consumo, a administradora assume um papel fundamental no funcionamento do PAR, especialmente na administração dos contratos de arrendamento e de condomínio – nesse caso, a empresa atua como síndica dos conjuntos, conforme já foi explicado. A administradora dos onze conjuntos habitados do PAR (até o dia 21 de julho de 2006) era uma empresa de Pernambuco, que tinha filial na capital paraibana. Ela atuava na Paraíba, tanto na cidade de João Pessoa (administrando dez conjuntos) quanto em Campina Grande (um conjunto), atendendo preferencialmente a média e baixa rendas, através do PAR. Em Recife, entretanto, além de participar da administração dos imóveis do Programa de Arrendamento Residencial (16 conjuntos até o dia da entrevista), ela atendia à alta e à média renda, funcionando como imobiliária, na venda, aluguel e administração de imóveis particulares. Como a empresa assume duas funções principais no processo do PAR, por conseguinte ela recebe pagamento pelas duas atividades realizadas. Em outras palavras, para a administração do condomínio, a administradora recebe 10% do valor total do condomínio arrecadado em cada empreendimento, já para a administração do contrato de arrendamento, ela ganha 9,5% dos adimplentes de arrendamento também de cada conjunto. Essa forma de remuneração da taxa condominial, sendo proporcional aos gastos do condomínio, é uma das vantagens do programa para a empresa administradora, quando comparada à remuneração oferecida para a administração de imóveis particulares. Em se tratando dos condomínios particulares, a empresa afirmou ganhar, de modo geral, entre 1 e 136 Para se compreender a atuação desse agente, foi realizada uma entrevista com a gerente administrativa da administradora do PAR em João Pessoa, Inaluce Simone B. Marinho, no dia 21 de julho de 2006 (modelo de entrevista em Anexo D). Capítulo V ____________________________________________________________________ 235 ½ salário mínimo ao mês por condomínio, ao passo que os honorários para administrar o condomínio do PAR, de 10% do valor arrecadado na taxa condominial, usualmente é maior que ½ salário mínimo, uma vez que os conjuntos do PAR, na sua maioria, são compostos por muitas unidades habitacionais. Para exemplificar essa relação entre o que é obtido com a administração de conjuntos privados e com a administração de conjuntos do PAR, elaborou-se a Tabela 35, a qual indica que, dos nove condomínios administrados pela mesma empresa administradora na capital paraibana, seis proporcionam uma remuneração superior a ½ salário mínimo. Os três restantes, que apresentam uma remuneração inferior a um salário mínimo, são compensados pelos outros seis condomínios. É por essa razão que a administradora afirma que, para se ter bons rendimentos com a administração dos imóveis do PAR, é necessário gerir-se, simultaneamente, uma grande soma de empreendimentos, pois “ganha-se bem em cima da quantidade”, uma vez que alguns condomínios não rendem nem um salário mínimo, em especial, aqueles que têm poucas unidades. Há, então, uma relação direta entre a quantidade de unidades e a remuneração da administradora. Tabela 35 Remuneração da empresa administradora pernambucana obtida com a administração dos condomínios do PAR em João Pessoa Nome Unidades Taxa condominial (07-2006) Remuneração da administradora (R$) Remuneração da administradora (sm)137 Res. Via Norte II 128 85,00 1.088,00 3,11 Res. Jardim Tropical 32 75,00 240,00 0,68 Res. Jardins 160 74,00 1.184,00 3,38 Res. Jardins do Sul 144 81,00 1.166,40 3,33 Res. Litoral Sul 128 80,00 1.024,00 2,92 Res. Estado do Acre 72 88,00 633,60 1,81 Res. Estado de São Paulo 72 80,00 576,00 1,65 Res. Tropical Tambiá 40 80,00 320,00 0,91 Res. Maria Apolônia 118 22,00 259,60 0,74 Res. Vista Bela Módulo II 91 0,00 - - TOTAL 1.613 6.491,60 - Fonte: Levantamento realizado na administradora (2006) Nota: Elaboração da autora Como a remuneração da administradora está atrelada aos gastos condominiais, muitos arrendatários afirmaram haver superfaturamento nas despesas, em benefício da empresa. No entanto, vale salientar que, segundo a administradora, a CAIXA exige que as compras para o condomínio sejam feitas a empresas fornecedoras que não apresentem 137 Considerando-se o salário mínimo igual a R$350,00 Capítulo V ____________________________________________________________________ 236 nenhuma irregularidade e, principalmente, que emitam nota fiscal. Devido a essas formalidades, muitas vezes, essas empresas fornecedoras apresentam mercadorias com preço um pouco superior ao das empresas de mesma natureza que estão irregulares. Além da vantagem financeira, a administradora mencionou o “tempo de contrato” como outro aspecto positivo na participação no PAR. Com a CAIXA, a administradora tem um contrato de cinco anos, o qual pode ser renovado. Já na atividade de administrar imóveis particulares, o “tempo de contrato” mais comum é um ano. Isso significa que o PAR oferece uma segurança a mais para a administradora. Por outro lado, a empresa enumerou muitas dificuldades no PAR, no que tange ao seu relacionamento tanto com a CAIXA quanto com os arrendatários. Com a CAIXA, pode-se dizer que as principais dificuldades estão relacionadas à burocracia e à morosidade do banco para realizar os serviços solicitados pela administradora, muitos de caráter construtivo – relacionados com os “vícios de construção” encontrados nos conjuntos. Com os arrendatários, as dificuldades são as seguintes: x as dúvidas permanentes quanto ao sistema de funcionamento do PAR; x os problemas condominiais, sobretudo a demora na prestação de contas e na solução dos “vícios de construção”, para os quais os arrendatários solicitam providências mas, devido à burocracia e morosidade da CAIXA, os problemas não são resolvidos com a agilidade esperada; x o serviço da mão-de-obra quarteirizado138, que eleva o custo condominial. No que tange ao serviço da mão-de-obra quarteirizado, de fato, a gestão de um condomínio terceirizado pela CAIXA mais um serviço de vigilância e de limpeza quarteirizados pela administradora139 elevam a taxa condominial. Conforme já foi mostrado na Tabela 32, a taxa de condomínio, nos conjuntos do PAR, aumentou uma média de 16,46% entre 2002 e 2006, chegando, em alguns casos, até a 50% de acréscimo. Diferentemente, o maior acréscimo verificado na taxa de arrendamento foi 12,80%, vinculado à TR anual e a média não ultrapassou 6,87%, no mesmo intervalo de tempo. Diante do elevado acréscimo na taxa condominial, muitos condomínios reduziram seu quadro de funcionários nos últimos anos, com o objetivo de reduzir as despesas. Esse fato foi visto com descontentamento por parte dos arrendatários, pois mesmo com a redução, o 138 Considera-se quarteirizado porque a administradora já é terceirizada pela CAIXA e esta, ainda, contrata, ou quarteiriza, uma outra empresa para os serviços de zelador, faxineiro, etc. 139 A administradora quarteirizada cobra 10% do valor do quadro de funcionários disponibilizados para cada condomínio para administrar a mão-de-obra, oferecendo todas as garantias trabalhistas. Capítulo V ____________________________________________________________________ 237 condomínio continuou elevado para eles, especialmente se comparado à taxa de arrendamento. Não se pode deixar de comentar que a quarteirização é uma opção da administradora140. Mas a verdade é que o serviço é quarteirizado porque esse tipo de atividade gera, muitas vezes, problemas trabalhistas na justiça e, dessa forma, nem a CAIXA, nem tampouco nenhuma empresa a ela ligada diretamente deve se envolver com essas questões. Para exercer suas atividades de administrar o condomínio e o arrendamento concomitantemente, a administradora realiza reuniões periódicas (a depender das necessidades do condomínio, mas em geral, é mensalmente ou bimestralmente) nos conjuntos e, também realiza vistorias, semestralmente. Com as vistorias, ela objetiva verificar se o contrato dos arrendatários está sendo cumprido quanto à obrigatoriedade destes de manter os imóveis bem conservados e de residirem no imóvel por 15 anos, não podendo alugá-los ou vendê-los. Não obstante, as vistorias indicam principalmente os “vícios de construção”. Como administradora do condomínio, a empresa realiza, ainda, serviços de manutenção nos conjuntos, tal como manutenção das bombas, recarga de extintores de incêndio, dedetização, limpeza de jardim, limpeza em caixa de gordura, esgoto, etc. Essa manutenção é outra fonte de conflito entre administradora e arrendatários. Estes últimos demonstraram muita irritação com os serviços prestados pela administradora e afirmaram que ela não cumpre adequadamente sua função de gerir e zelar pelo conjunto, nem realiza a devida manutenção; pelo contrário, só se preocupa com fazer as cobranças das taxas de arrendamento e de condomínio. Alguns arrendatários, inclusive, afirmaram que eles próprios, reunidos em grupos, realizam alguma manutenção. Do ponto de vista estatístico, a insatisfação dos arrendatários em relação à administradora chega a atingir um percentual de 67,18% das famílias residentes nos conjuntos do PAR, envolvendo desde a insatisfação com o progressivo aumento da taxa condominial, com o serviço quarteirizado e “vícios de construção”, até com a forma de manutenção do condomínio pela administradora (Figura 103). 140 “Os empregados lotados no Condomínio devem pertencer ao quadro de funcionários da Administradora, ou de terceiros, no caso de terceirização pela Administradora, sendo de sua inteira responsabilidade a contratação, a remuneração e os encargos e demais obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive as indenizações trabalhistas decorrentes do vínculo empregatício” (normativo da CAIXA-PAR, 2006, p.36). Capítulo V ____________________________________________________________________ 238 Figura 103: Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços prestados pela administradora Tabela 36: Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços prestados pela administradora Gosta da administradora? n. absoluto n. relativo (%) Insatisfeitos 131 67,18 Satisfeitos 35 17,95 Regular 28 14,36 Não respondeu ou não sabe 1 0,51 67,18 17,95 14,36 0,51 Insatisfeitos Satisfeitos Regular Não respondeu Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Essa insatisfação pode, inclusive, ser um dos motivos impulsionadores da transformação, na tipologia da produção do PAR, do padrão vertical, e também condominial, para o padrão horizontal, que nem sempre tem condomínio, pois muitos conjuntos são do tipo loteamento. Em se tratando da construção de conjuntos em forma de loteamentos e sem responsabilidades condominiais, o conflito entre a administradora e os arrendatários teoricamente se reduziria. Por essa razão, o programa expressa preferência pela constituição de loteamentos, ao invés de condomínios fechados, conforme foi discutido no Capítulo III. Além disso, grande parcela dos arrendatários provém de residências do tipo unifamiliar, o que facilita a adaptação, na mesma medida em que se reduzem os conflitos supracitados. Por fim, constatou-se que a insatisfação dos arrendatários está geralmente relacionada com a administradora e, ideologicamente, esse tipo de insatisfação não afeta a CAIXA, que mantém uma imagem de agente benfeitor. Além disso, a administradora assume mais eficientemente que o poder público a função de administrar os imóveis do PAR. Como já foi citado no Capítulo III, “o Estado brasileiro é por demais burocratizado, cartorial e incompetente para administrar aluguéis eficientemente” (BOLAFFI, 1986, p.30), sendo necessária intervenção de uma empresa privada para garantir essa eficiência, que se expressa, especialmente, na redução do índice de inadimplência do programa. Devido às cobranças sistemáticas realizadas pela empresa, há uma redução nesse índice. Também contribuíram para a redução da inadimplência a própria forma de financiamento – arrendamento –, a qual conta com instrumentos que facilitam a retomada do imóvel, assim como a pressão psicológica que o programa faz – seja por meio da administradora, seja por meio do “trabalho técnico social” – para que os arrendatários paguem em dia suas prestações, sob pena de perder o imóvel. Capítulo V ____________________________________________________________________ 239 Deve-se ressaltar, ainda, que, se as empresas do ramo da construção civil reclamam da baixa taxa de lucratividade, o mesmo não ocorre com a empresa do ramo da administração dos imóveis do PAR em João Pessoa – pelo menos, por enquanto. 5.4.4 ARRENDATÁRIOS Com base nos questionários aplicados aos moradores, traçou-se o perfil dos arrendatários, revelando sua percepção acerca do programa e da forma de financiamento, da localização dos conjuntos, da qualidade da obra e da tipologia das habitações financiadas, seguindo as quatro etapas previstas nos questionários: 1) Características gerais dos arrendatários; 2) Visão dos arrendatários em relação ao financiamento do PAR; 3) Visão dos arrendatários em relação à localização dos seus conjuntos do PAR; e 4) Visão dos arrendatários em relação aos aspectos tipológicos e construtivos dos seus conjuntos do PAR (modelo em Anexo E). Características gerais dos arrendatários141 Iniciando pelo perfil dos arrendatários, na capital paraibana eles são geralmente pessoas que têm boa instrução escolar, e grande parte deles são funcionários públicos (32,31% do total de entrevistados), sobretudo do âmbito municipal, como pode ser observado nas Figuras 104 e 105. Figura 104: Percentual do nível de escolaridade dos arrendatários Tabela 37: Resultado do nível de escolaridade dos arrendatários Escolaridade? n. absoluto n. relativo (%) 1º. Grau 27 13,85 2º. Grau 111 56,92 Superior 57 29,23 13,85 56,92 29,23 1o. Grau 2o. Grau Superior Total 195 100% Nota: Elaboração da autora 141 Importante destacar que, embora tenha-se questionado sobre a renda salarial dos entrevistados quando ingressaram no programa, optou-se em não utilizar tal informação, em razão da pouca confiabilidade em torno desta resposta (muitos não lembraram, outros não responderam, etc.). Capítulo V ____________________________________________________________________ 240 Além dos funcionários públicos, as outras ocupações declaradas (e que estão agrupadas em grupos para facilitar a análise) foram: professor (7,18%), funcionário da segurança pública (6,15%), autônomo ou empresário (5,64%), profissional da área da saúde – destacando-se os técnicos em enfermagem – (4,62%), mas também aposentados e pensionistas (4,10%). Muitos entrevistados afirmaram que o programa inicialmente destinava-se somente aos funcionários municipais e, depois, estendeu-se à população em geral. Alguns arrendatários (22,51% = 43 deles), inclusive, tiveram conhecimento do programa por meio da prefeitura, apesar de a propaganda “boca-a-boca” (por parte de amigos e familiares) ter sido a mais eficiente na divulgação do programa – 44,50% (85 arrendatários). A preferência por inscrever os funcionários municipais pode ser visualizada como uma política institucional, da prefeitura – talvez com viés clientelista –, que é a principal responsável em realizar a inscrição dos candidatos. Por outro lado, a preferência por esse público-alvo está relacionada com a estabilidade econômica que os funcionários públicos têm devido ao contracheque, característica que, em geral, assegura o pagamento das parcelas de arrendamento e, conseqüentemente, induz a redução do nível de inadimplência. Figura 105: Percentual do tipo de ocupação dos arrendatários Tabela 38: Resultado do tipo de ocupação dos arrendatários Ocupação do arrendatário? n. abs n. rel Outros 75 38,46 Funcionário público. 63 32,31 Professor 14 7,18 Segurança pública 12 6,15 Autônomo ou empresário 11 5,64 Área da Saúde 9 4,62 Aposentado ou pensionista 8 4,10 Desempregad 3 1,54 38,46 32,31 7,18 6,15 5,64 4,62 4,1 1,54 Outros Funcionários públicos Professor Segurança pública Autônomo ou empresário Área da saúde Aposentados ou pensionistas Desempregado Total 195 100% Nota: Elaboração da autora A composição familiar dos arrendatários é de poucas pessoas, de maneira que o padrão mais encontrado – 34,36% (67 entrevistados) – foi de famílias com três membros Capítulo V ____________________________________________________________________ 241 (em geral, o casal mais um filho). Também ocorrem com bastante freqüência as famílias formadas apenas por dois membros (24,62% = 48) – o casal –, seguidas pelas famílias formadas por quatro membros (24,10% = 47) – casal mais dois filhos (Figura 106). Figura 106: Percentual da composição familiar dos arrendatários Tabela 39: Resultado da composição familiar dos arrendatários Número de pessoas na família? n. absoluto n. relativo (%) 1 Membro 18 9,23 2 Membro 48 24,62 3 Membro 67 34,36 4 Membro 47 24,10 5 Membro 14 7,18 6 Membro 1 0,51 9,23 24,62 34,36 24,1 7,18 0,51 1 Membro 2 Membros 3 Membros 4 Membros 5 Membros 6 Membros Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Para se conhecer o padrão de vida dos arrendatários, perguntou-se sobre o meio de transporte mais utilizado pelas famílias. Constatou-se, então, que o transporte coletivo é um meio de locomoção bastante utilizado – 49,23% (96 arrendatários) –, seguido imediatamente pelo carro – 42, 56% (83). O uso da motocicleta foi mencionado apenas em 8,21% das respostas (16). Assim, metade dos arrendatários tem um padrão de vida e uma renda média que possibilita a compra de um veículo. Quanto ao tipo de moradia em que os arrendatários residiam antes do PAR, fruto da produção de moradias unifamiliares promovida pelo BNH, 62,05% dos arrendatários (ou 121 entrevistados) nunca tinham morado em apartamento antes. Apesar disso, a maior parcela da produção do PAR (59,89%) é representada por unidades multifamiliares, o que vai de encontro à cultura da população de habitar casas. Portanto, uma das razões do grande número de conflitos entre os arrendatários e a administradora pode ser o fato de os primeiros não estarem acostumados com o sistema condominial. Conforme foi dito anteriormente, esse tipo de conflito pode, inclusive, ter contribuído para a substituição do padrão vertical pelo padrão horizontal, nos últimos anos. Todavia, essa questão cultural deve ser superada, uma vez que as cidades não dispõem atualmente de grandes áreas para a expansão horizontal, o que implica fazer crescer as periferias. A produção habitacional vem, assim, expandindo-se verticalmente, como é comentado no capítulo anterior. Capítulo V ____________________________________________________________________ 242 No tocante ao bairro de origem, as famílias que moram nas habitações do PAR são oriundas de várias regiões da cidade, das quais a região sudeste142 é a principal área de origem, representando 41,54% do total dos entrevistados (81 arrendatários). Os principais bairros dessa região foram Mangabeira, com 13,85% (27), seguido pelos Bancários, com 9,74% (19). Essa região foi preferencialmente adotada pela política do BNH e pelos programas de habitação atuantes no período pós-BNH na implantação da suas unidades, pois os terrenos nessa área eram mais baratos. Portanto, essa é uma região em que vem se configurando uma vocação para a produção de moradias para a população de renda mais baixa e que passou a ser mais adotada também pelo PAR, mais enfaticamente depois de 2002. Pode-se dizer, então, que os arrendatários provêm de famílias de classe de renda média baixa. Além disso, 43,59% dos arrendatários vieram do sistema de aluguel, como pode ser observado na Figura 107. A segunda condição de ocupação mais comumente adotada pelos arrendatários foi “outros”, em 40,51% das respostas, correspondendo àqueles arrendatários que moravam em casas de familiares, praticando, em especial, a coabitação familiar. Sendo assim, de fato, o programa cumpre efetivamente uma de suas diretrizes listadas na Portaria n. 231 (2004), a de atender os problemas de moradia da população que sofre com o problema de adensamento e do ônus excessivo com o aluguel. Na Figura 107, observa-se também que 7,69% dos entrevistados já possuíam uma casa própria, apesar de ser proibida a inscrição de pessoas proprietárias de outros imóveis para evitar possíveis especulações com as habitações do PAR para aluguel. O imóvel desses arrendatários, muitas vezes, está no nome de outra pessoa, como, por exemplo, o cônjuge. Já detendo a propriedade de um imóvel, as razões que os levaram a participar do programa foram diversas: alguns afirmaram que queriam uma moradia mais bem localizada; outros declararam a oportunidade de investir em mais um imóvel a baixo custo, uma vez que as taxas de arrendamento são relativamente baratas quando comparadas com as parcelas de outras formas de financiamento, como o Carta de Crédito Associativo. A maioria desses proprietários (45,46% = 5), todavia, vendeu seus imóveis depois de terem se mudado para o PAR; outros (36,36% = 4) alugaram, e ainda há aqueles (18,18% = 2 arrendatários) que disseram ter cedido seu imóvel para outra pessoa. 142 Considerando-se os seguintes bairros de onde os arrendatários provinham: Água Fria, Bancários, Castelo Branco, Cidade Universitária, Cristo, Geisel, José Américo, Mangabeira e Valentina. Capítulo V ____________________________________________________________________ 243 Figura 107: Percentual do tipo de ocupação domiciliar anterior dos arrendatários Tabela 40: Resultado do tipo de ocupação domiciliar anterior dos arrendatários Tipo de Ocupação domiciliar? n. absoluto n. relativo (%) Alugado 85 43,59 Outros 79 40,51 Cedido 16 8,21 Próprio 15 7,69 43,59 40,51 8,21 7,69 Alugado Outros Cedido Próprio Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Vale salientar, ainda que, apesar de a maioria dos arrendatários vir de um sistema de aluguel ou da coabitação familiar, poucos foram os que antes já tinham tentado outro financiamento habitacional, seja na CEHAP (15,38%), seja na CAIXA (12,82%), seja em outros bancos, seja mesmo em construtoras (Outros = 2,05%). Como a maioria não conseguiu financiamento habitacional por outras vias, partiu, então, para o PAR, como pode ser observado na Figura 108. Figura 108: Percentual do número de arrendatários que buscaram outras formas de financiamento da casa própria Tabela 41: Resultado do número de arrendatários que buscaram outras formas de financiamento da casa própria Já solicitou outro financiamento? n. absoluto n. relativo (%) Nunca 136 69,75 CEHAP 30 15,38 CAIXA 25 12,82 Outros 4 2,05 69,75 15,38 12,82 2,05 Nunca CEHAP CAIXA Outros Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Em suma, o perfil dos arrendatários do PAR é de pessoas de classe de renda média baixa com um bom grau de escolaridade. A maioria são famílias recém-formadas e de pequena composição (no máximo quatro pessoas) e veio do sistema de aluguel ou da casa de familiares, sendo o Programa de Arrendamento Residencial o primeiro meio de financiamento em busca de uma casa própria. Capítulo V ____________________________________________________________________ 244 Visão dos arrendatários em relação ao financiamento do PAR Várias foram as razões que levaram os arrendatários a optarem por esse financiamento, das quais as mais comuns são: necessidade de ter uma casa própria (16,93% = 32) e facilidade de pagamento (48,14% = 91)143. A primeira opção refere-se às respostas que indicaram o anseio de sair do sistema de aluguel e de ter a propriedade de uma casa; a segunda opção, por sua vez, refere-se às características da operação financeira do programa, como o pequeno reajuste da prestação, o financiamento sem precisar de entrada (ou intercalada), a baixa prestação da taxa de arrendamento, entre outras. Alguns arrendatários alegaram ter sido essa a única opção, outros citaram aspectos diversos, como a localização dos conjuntos ou o desejo de morar em apartamento. Alguns, ainda, assinalaram mais de uma opção, como a facilidade de pagamento e a necessidade de ter uma casa própria, por exemplo. Apesar dessas variadas respostas, quase todos os arrendatários (97,43% = 190) tinham o objetivo de se tornar proprietários do imóvel, fazendo a opção de compra ao final do prazo contratado. Dessa forma, constata-se que, embora o PAR seja um programa de arrendamento, as pessoas buscam, por meio dessa forma diferente de acesso à moradia, concretizar o “sonho da casa própria”, ideologia extremamente disseminada entre os arrendatários. A expectativa da casa própria é tão forte que 69,57% dos entrevistados (ou 128 arrendatários)144 não consideram o instrumento da facilidade de desistência do imóvel (sem burocracia, sem precisar vender a “chave”, etc.) como uma vantagem a mais do programa, apesar de ser ele que diferencia esse financiamento habitacional dos demais. Eles vêem o pagamento das taxas de arrendamento como um investimento, que visa à concretização do almejado sonho, portanto não vêem o arrendamento como um mero aluguel, do qual eles poderiam desistir facilmente a qualquer momento (Figuras 109). Já o outro instrumento do PAR, aqui denominado de mobilidade residencial, é bem aceito pelos arrendatários, uma vez que 65,23% dos entrevistados145 declararam vantajosa essa opção, embora muitos desconhecessem essa possibilidade (Figura 110). Um aspecto importante a ser mencionado é que muitos daqueles que declararam o contrário achavam que, para efetuar a mobilidade, perderiam tudo o que haviam pago até então. Isso significa dizer que estavam mal informados, pois as parcelas pagas em um imóvel são reaproveitadas no imóvel para o qual o arrendatário se muda. 143 Para essa questão, apenas 189 arrendatários constituem o total (100%). 144 Para essa questão, o total (100%) compreende apenas 184 arrendatários. 145 Para essa questão, o total (100%) compreende apenas 184 arrendatários. Capítulo V ____________________________________________________________________ 245 Figura 109: Percentual de arrendatários que consideram vantajosa a facilidade de desistir do imóvel a qualquer momento Tabela 42: Resultado do número de arrendatários que consideram vantajosa a facilidade de desistência do imóvel a qualquer momento Considera vantajosa a desistência do imóvel? n. absoluto n. relativo (%) Sim 53 28,80 Não 128 69,57 Depende 1 0,54 Não respondeu ou não sabe 2 1,09 28,8 69,57 0,54 1,09 Sim Não Depende Não respondeu Total 184 100% Nota: Elaboração da autora Figura 110: Percentual de arrendatários que consideram vantajosa a mobilidade residencial Tabela 43: Resultado do número de arrendatários que consideram vantajosa a mobilidade residencial Considera vantajosa a mobilidade residencial? n. absoluto n. relativo (%) Sim 120 65,23 Não 47 25,54 Depende 7 3,80 Não respondeu ou não sabe 10 5,43 65,23 25,54 3,8 5,43 Sim Não Depende Não respondeu Total 184 100% Nota: Elaboração da autora Diante dos resultados, percebe-se a força do sonho da casa própria entre os arrendatários, mas esse sonho enfrenta um dilema de difícil resposta: quais os desdobramentos do programa no final do prazo contratado? Conforme já foi discutido no Capítulo III, caso o arrendatário opte pela compra do imóvel, existem três possibilidades. Em duas delas, a unidade passará a ser automaticamente do arrendatário, quando o valor pago por este for igual ou superior ao valor atualizado do imóvel. A outra possibilidade é que o arrendatário terá que pagar um saldo residual, o que, de acordo com as simulações realizadas anteriormente, é a hipótese mais provável de se efetivar, especialmente no PAR 2; apesar de esta ser uma informação desconhecida por grande parte dos arrendatários. A maioria deles (48,98%) acredita que, no final do prazo do contrato, se tornarão automaticamente proprietários do imóvel; apenas 31,63% declaram haver resíduo e 13,27% não têm opinião acerca do que acontecerá no final do tempo de contrato. Dois arrendatários (2,04%) afirmaram que teriam de pagar apenas um saldo residual no valor de apenas uma Capítulo V ____________________________________________________________________ 246 prestação após os 15 anos, como está declarado no contrato (e foi comentado no item 1.1 do Capítulo III) (Figura 111)146. Figura 111: Percentual da expectativa dos arrendatários em relação ao programa ao final dos 15 anos de contrato Tabela 44: Resultado da expectativa dos arrendatários em relação ao programa ao final dos 15 anos de contrato O que vai acontecer ao final dos 15 anos? n. absoluto n. relativo (%) Será proprietário 48 48,98 A CAIXA negociará antes 3 3,06 Não sabe 13 13,27 Pagará apenas 1 prestação depois 2 2,04 Pagará resíduo 31 31,63 Seguro pagará resíduo 1 1,02 48,98 1,54 13,27 2,04 31,63 1,02 Será proprietário A CAIXA negociará antes Não sabe Pagará apenas 1 prestação depois Pagará resíduo Seguro pagará o resíduo Total 98 100% Nota: Elaboração da autora Ainda no que se refere às opiniões relativas ao financiamento do PAR, verificou- se uma insatisfação dos arrendatários com a administradora responsável pelos conjuntos do programa. Esse problema não se resume apenas ao caso específico da capital paraibana, mas também já foi noticiado em outras cidades brasileiras. Como já foi mencionado no item anterior, grande parcela dos arrendatários (67,18% = 131) declarou não gostar dos serviços prestados pela empresa, o que indica uma incompatibilidade entre eles e a administradora. Os problemas de relacionamento entre ambos são visualizados, sobretudo, nas reuniões de condomínio, quando ocorrem muitas discussões e, muitas vezes, os problemas não são definitivamente resolvidos. Por isso, uma parte dos arrendatários (34,36% = 67) alegou não participar mais das reuniões, pois segundo eles, não vêem resultado (Figura 112). Não obstante, a maioria (54,87% = 107) ainda participa. No que tange a essa insatisfação foi declarado, ainda, que as pautas são elaboradas restritamente pela administradora e eles apenas obedecem às resoluções daquela. Esse quadro de insatisfação dos arrendatários com a administradora merece uma reflexão. A CAIXA contratou uma empresa privada para tratar da administração dos 146 Esse dado não se refere ao total dos empreendimentos do PAR. Foram entrevistadas para essa questão 98 moradores do PAR, nos seguintes conjuntos: Residencial Litoral Sul, Via Norte II, Vista Bela, Jardins do Sul, Jardins, Estado do Acre e Estado de São Paulo. Capítulo V ____________________________________________________________________ 247 seus imóveis, no entanto essa relação vem sendo constantemente questionada pelos arrendatários. Teoricamente, para a agência financeira, os serviços prestados pela administradora são eficientes, pois assim se consegue reduzir o nível de inadimplência. Em todo caso, mesmo com todos os problemas de relacionamento da administradora com os moradores, a inserção de uma empresa privada na administração dos imóveis do PAR ainda é uma solução melhor para o sistema do que uma administração realizada pelo próprio poder público, como defendeu Bolaffi (1986) em tempos pretéritos. Figura 112: Percentual de arrendatários que participam das reuniões de condomínio Tabela 45: Resultado do número de arrendatários que participam das reuniões de condomínio Participa das reuniões de condomínio? n. absoluto n. relativo (%) Sim 107 54,87 Às vezes 18 9,23 Não 67 34,36 Não respondeu 3 1,54 54,87 9,23 34,36 1,54 Sim As vezes Não Não respondeu Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Diferentemente, o relacionamento dos arrendatários com seus vizinhos foi considerado bom, em 92,82% dos casos (181 entrevistados); outros 5,64% (11) o consideraram regular; um arrendatário o considerou como ruim (0,51%) e dois (1,03%) se abstiveram de responder. Essa boa relação pode ser fruto do trabalho técnico social realizado no início do arrendamento, em cada condomínio, para promover a integração entre os moradores. Visão dos arrendatários em relação à localização dos seus conjuntos do PAR No tocante às opiniões acerca da localização dos conjuntos, 91,79% dos arrendatários (ou 179 dos 195 entrevistados) afirmaram gostar da localização de suas habitações (considerando-as “boa”). Isso sugere que, do ponto de vista dos usuários, as habitações financiadas pelo PAR estão bem localizadas na malha urbana, cumprindo-se, assim, um dos objetivos do programa. Em contrapartida, um pequeno percentual – apenas 8,21% (16) – afirmou ser “regular”, ou “ruim”. Como já foi citado no Capítulo I, a habitação necessita basicamente de um espaço infra-estruturado, acessível, com equipamentos coletivos e condições naturais de sítio favoráveis (terrenos mais planos), além de condições que assegurem uma “boa Capítulo V ____________________________________________________________________ 248 localização”, como a presença de alguns objetos imobiliários de influência na sociedade. Em função das exigências do PAR, os seus conjuntos estão implantados em localidades dotadas de infra-estrutura, acessibilidade e serviços. O atendimento de transportes públicos e de serviços gerais, como mercados, padarias, etc. também foi constatado in loco. Estatisticamente, a maioria dos arrendatários (58,98% = 115) considerou o serviço de transporte público “bom”, ao passo que 40,51% (79) o classificaram como sendo “regular” ou “ruim”. Todavia, voltando-se estritamente para os usuários de ônibus (total: 96 entrevistados), o número de insatisfeitos – aqueles que consideraram como sendo “regular” ou “ruim” esse serviço – aumentou para 50% (48). As principais razões que justificaram esse tipo de resposta foram: a circulação de poucas linhas de ônibus e o fato de o intervalo entre a passagem de um ônibus e a de outro ser prolongado; ou seja, trata-se de um problema de eficiência no planejamento do transporte público, não da localização dos conjuntos147 (Figura 113). Figura 113: Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços de transporte público Tabela 46: Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação ao serviço de transporte público Considera o atendimento a transporte público? n. absoluto n. relativo (%) Bom 115 58,98 Regular 30 15,38 Ruim 49 25,13 Não respondeu ou não sabe 1 0,51 58,98 15,38 25,13 0,51 Bom Regular Ruim Não respondeu Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Em relação aos serviços gerais, o nível de satisfação foi ainda maior: 63,08% dos arrendatários. Nesse sentido, verificou-se que o entorno dos conjuntos é repleto de pequenos serviços, havendo, em particular, a presença de pequenos mercados (Figura 114). 147 Para medir o grau de satisfação dos arrendatários quanto ao atendimento de transportes coletivos e serviços gerais, utilizou-se uma escala que varia entre “bom” e “ruim”. Todavia, deve-se esclarecer que o termo “regular” não foi adotado no questionário, mas, diante do grande número de respostas com essa denominação, foi considerado no tratamento dos dados, integrando a classificação dos resultados. Capítulo V ____________________________________________________________________ 249 Figura 114: Percentual do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços gerais Tabela 47: Resultado do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos serviços gerais Considera o atendimento a serviços gerais? n. absoluto n. relativo (%) Bom 123 63,08 Regular 32 16,41 Ruim 40 20,51 Não respondeu ou não sabe 0 0 63,08 16,41 20,51 0 Bom Regular Ruim Não respondeu Total 195 100% Nota: Elaboração da autora Pode-se dizer, então, que nesse primeiro momento (até 2004), evidencia-se um bom nível de satisfação dos arrendatários em relação aos aspectos locacionais, o que é compreensível em razão das exigências de localização dos empreendimentos impostas pelo programa, as quais conferem uma maior qualidade de vida aos arrendatários. Essa característica diferencia os conjuntos do PAR, de muitos conjuntos financiados na época do BNH, cujos problemas de localização geravam muitas insatisfações dos mutuários. Visão dos arrendatários em relação aos aspectos tipológicos e construtivos dos seus conjuntos do PAR Quanto aos aspectos construtivos e tipológicos, foi possível verificar que, de modo geral, os arrendatários também demonstraram certo nível de satisfação148. A Tabela 48 sintetiza as opiniões dos arrendatários. A maior satisfação – “ótimo” e “bom”, em conjunto – é relacionada com o tamanho e a subdivisão das unidades (82,56% e 85,13%, respectivamente). Em outras palavras, o programa de necessidades padrão do PAR – sala, dois quartos, banheiro, cozinha e serviço – é bem aceito pelos arrendatários, mesmo porque a área média das unidades do PAR em João Pessoa está acima do recomendado pelo programa. A estética dos edifícios também foi aprovada entre os entrevistados, com 73,84% (ou 144 entrevistados) classificando-a de “boa” e 12,31% (24) considerando-a “ótima”, embora a maioria dos edifícios tenham formato de paralelepípedos compactos, sem intenções volumétricas, apresentando apenas um estudo cromático, e as casas tenham 148 Utilizou-se a mesma escala de satisfação empregada nas questões relacionadas à localização, entretanto com uma diferença: a escala variou entre “ótimo” e “péssimo”. No mesmo sentido, o termo “regular” não foi contemplado no questionário, porém muitos optaram apenas por essa classificação, que foi incorporada no tratamento dos dados. Capítulo V ____________________________________________________________________ 250 arquitetura simples, com formato padrão: duas águas. Em outras palavras, do ponto de vista arquitetônico, os conjuntos do PAR são formalmente pobres, pois não apresentam soluções volumétricas diferentes do usualmente encontrado na produção de moradias para baixa renda, no entanto, apesar disso, são bem aceitos pela população. É bem verdade que alguns entrevistados declararam a falta de varandas e de janelas maiores como fatores que prejudicavam a estética. A qualidade da construção, apesar das inúmeras reclamações em relação aos “vícios de construção” dos conjuntos, foi, em grande parte, considerada “ótima” ou “boa”, por 60% dos entrevistados (117 deles). Esses “vícios de construção” são, inclusive, uma das grandes fontes de conflito entre os arrendatários e a administradora, pois as construtoras – responsáveis por reparar esses problemas durante os primeiros cinco anos – não corrigem os problemas construtivos, e os moradores exigem soluções do síndico (administradora), que é impossibilitado de resolver, pois se trata de um problema do âmbito da GIDUR-CAIXA com as empresas da construção civil. Tabela 48 Resumo do nível de satisfação dos arrendatários em relação aos aspectos construtivos e tipológicos Nível de satisfação Número absoluto (Número relativo – %) Critérios destacados Ótimo Bom Regular Ruim Péssimo Nãorespondeu Total Tamanho da habitação 52(26,66) 109 (55,90) 10 (5,13) 20 (10,26) 3 (1,54) 1 (0,51) 195 (100) Subdivisão dos cômodos 42 (21,54) 124 (63,59) 10 (5,13) 15 (7,69) 4 (2,05) 0 (0) 195 (100) Qualidade da construção 9 (4,62) 108 (55,38) 20 (10,26) 40 (20,51) 18 (9,23) 0 (0) 195 100 Estética dos edifícios ou casas 24 (12,31) 144 (73,84) 6 (3,08) 18 (9,23) 1 (0,51) 2 (1,03) 195 100 Conservação do conjunto 8 (4,10) 78 (40,01) 12 (6,15) 57 (29,23) 40 (20,51) 0 (0) 195 100 Equipamentos coletivos149 25 (14,12) 97 (54,81) 8 (4,52) 26 (14,69) 19 (10,73) 2 (1,13) 177 100 Fonte: Elaboração da autora Outro problema encontrado relaciona-se à conservação dos conjuntos: 49,74% dos entrevistados (97 arrendatários) classificaram a conservação entre “ruim” e “péssima”. Essa questão é também fonte de conflito entre os arrendatários e a administradora, uma vez que os primeiros alegam que a segunda não mantém nem conserva o condomínio, mesmo sendo isso de sua inteira responsabilidade. 149 Para essa questão, apenas 177 arrendatários compõem o total (100%). Capítulo V ____________________________________________________________________ 251 Há, na verdade, uma certa dubiedade quanto a esse aspecto: se a CAIXA deveria pagar por essa manutenção ou se seriam os arrendatários, com o condomínio. De qualquer forma, o FAR destina uma parcela do seu fundo para essa finalidade, sendo isso inclusive, um dos fatores que ocasionam a baixa liquidez do sistema, o que resulta na solução da transformação do arrendamento em financiamento, como já foi explicado. Por fim, quanto aos equipamentos coletivos encontrados em alguns conjuntos – como salão de festas, quadras, etc. –, 68,93% dos arrendatários que moravam em condomínios com esses equipamentos (ou 122 entrevistados) consideraram a existência desses espaços comunitários como sendo “ótima” e “boa”, apesar de poucos usufruírem deles, conforme ilustra a Figura 115. Figura 115: Percentual de arrendatários que utilizam os equipamentos coletivos Tabela 49: Resultado do número de arrendatários que utilizam os equipamentos coletivos Com que freqüência utiliza os equipamentos? n. absoluto n. relativo (%) Muito 15 8,47 Às vezes 29 16,38 Pouco 61 34,46 Nunca 72 40,69 8,47 16,38 34,46 40,69 Muito As vezes Pouco Nunca Total 177 100% Nota: Elaboração da autora Esse fato gera uma reflexão histórica: a presença de equipamentos coletivos era comum nos conjuntos modernistas, mas, com a política do BNH foi perdendo espaço. Nesse novo momento histórico, os equipamentos coletivos ressurgem, no entanto são pouco utilizados pelos arrendatários, o que indica a pequena socialização dos dias atuais. Salienta- se, todavia, que as observações in loco permitiram visualizar que, nos conjuntos de populações mais pobres – ou localizados em bairros mais periféricos, como o Residencial Jardins, Jardins do Sul e Via Norte II –, a socialização e a utilização dos equipamentos coletivos era maior que nos demais conjuntos. O elevado nível de satisfação dos arrendatários com os aspectos tipológicos fica evidente quando se confronta a produção de conjuntos do PAR com a de conjuntos promovidos por outros agentes, especialmente os agentes públicos, como a CEHAP, o IPEP, a FAC e a PMJP. Constatou-se que a produção do Programa de Arrendamento Residencial apresenta uma maior qualidade construtiva, além de melhor qualidade na Capítulo V ____________________________________________________________________ 252 localização dos conjuntos, o que se reflete no bom nível de satisfação dos arrendatários em relação aos aspectos locacionais e tipológicos. Enfim, apesar de alguns problemas, a maioria dos quais está voltada especificamente para a relação com a administradora, de modo geral, percebe-se, entre os arrendatários, mais satisfações que insatisfações, motivo pelo qual 98,39% (ou 122 entrevistados) gostam de participar do programa150. 150 Para essa questão, apenas 124 arrendatários compõem o total (100%). Considerações finais_____________________________________________________________ 254 Analisando-se a política habitacional brasileira sob uma perspectiva histórica, verifica-se que, entre a década de 1930 e meados da de 1980, o país desenvolveu políticas voltadas para a provisão da casa própria, através de três instituições, que atuaram de acordo com o modelo central-desenvolvimentista de desenvolvimento econômico. Essas instituições são: os Institutos de Aposentadoria e Pensões, a Fundação da Casa Popular e o Banco Nacional de Habitação. Cada uma apresentou diferente natureza de atuação, especialmente no que diz respeito ao enfoque na difusão da política da casa própria. Depois de 1986, com o desmantelamento do sistema do BNH, a política habitacional no país ficou à deriva, sem uma ação pública contínua e ampla para o enfrentamento dos problemas de moradia: os programas de habitação passaram a atuar de uma forma isolada e sem articulação com uma política habitacional federal, de maneira que apenas alguns programas continuaram em voga de uma gestão para outra. Ou seja, o fechamento do BNH marcou a passagem de uma política de Estado para uma política de governo, que muda a cada novo mandato presidencial. Portanto, para melhor compreender o panorama da produção habitacional estatal no período pós-BNH, faz-se necessário dividir as ações de acordo com os seis governos que sucederam o fechamento do citado banco: Sarney (1986-1989), Collor (1990-1992), Itamar Franco (1993-1994), primeiro mandato de FHC (1995-1998), segundo mandato de FHC (1999-2002) e, por fim, o primeiro governo Lula (2003-2006). O primeiro período, correspondente ao governo de Sarney, pode ser considerado um período de transição da política de habitação de Estado para a política de habitação de governo. Durante o período de transição, o BNH foi extinto, e como nada foi posto em seu lugar, o país sofreu com a ausência de uma política habitacional, o que contribuiu para o agravamento das condições habitacionais. No segundo período, correspondente aos anos de 1990 a 1992, o governo Collor criou novos programas habitacionais, com características diversas entre si mas operando ainda com a fonte de recursos tradicional do setor, isto é, com os recursos do FGTS. Ademais, esse período corresponde ao início do neoliberalismo no país, provocando um forte retraimento do papel do Estado na resolução das questões sociais. Isso significa que, na área habitacional, os programas foram voltados para o financiamento dos agentes privados, ficando em segundo plano o financiamento direto à população de menor renda. O terceiro período, do governo de Itamar Franco, sofreu um acentuado arrefecimento na produção de moradias, provocado pela crise do FGTS, deflagrada no governo Collor. Esses dois anos (1993-94), todavia, foram importantes para a discussão das Considerações finais_____________________________________________________________ 255 questões qualitativas que permeiam a questão habitacional e culminaram com a criação de dois programas, o Habitar-Brasil e o Morar-Município, alimentados com os recursos do OGU, em vez do tradicional FGTS. Ainda em 1994, a implantação do Plano Real proporcionou a estabilização da economia do país, favorecendo, posteriormente, a criação de novos programas e contribuindo para que a política habitacional tivesse melhores condições para se desenvolver. O quarto período inicia-se em 1995, com o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, quando o interesse pela questão da habitação se destacou, sendo esse interesse impulsionado pelo HABITAT II, que resultou na criação de uma nova política de habitação, curiosamente durante o auge do neoliberalismo no Brasil. De fato, nesse período, foi elaborada uma Política Nacional de Habitação mais consistente e composta por inúmeros programas voltados para lidar com as necessidades habitacionais tanto quantitativas quanto qualitativas. Os programas apresentavam características diversificadas, porém restritivas, uma vez que cada um atendia a uma demanda específica e em localidades específicas. Apesar disso, o governo incentivou, em particular, aqueles que concediam crédito direto aos cidadãos, através do Carta de Crédito, marcando uma redução da responsabilidade do poder público com a oferta de moradias (ao atuar fortemente sobre a demanda). Dessa forma, esse modelo se diferenciou bastante daquele apregoado pelo governo Collor, que privilegiou o financiamento para as empresas privadas. Passou-se a perceber também, de um governo para outro, certa continuidade nos programas (iniciada com o Habitar-Brasil, de Itamar, que foi mantido, provavelmente em função dos contratos com o BID), ao invés de ações isoladas que mudam a cada governo. Nesse sentido, o segundo mandato de FHC assegurou todos os programas que já vinham sendo desenvolvidos e criou dois novos: o Programa de Subsídio à Habitação (voltado para a baixa renda) e o Programa de Arrendamento Residencial. Este último se destacou como um programa que atua tanto na demanda quanto na oferta, por meio da construção de novos conjuntos habitacionais, processo que estava, de certa forma, arrefecido, pois antes se incentivava o crédito direto aos usuários, em contraposição à construção de conjuntos. Apesar da criação deste, o programa Carta de Crédito continuou sendo o carro-chefe da política habitacional brasileira, devido à maior quantidade de recursos alocados para esse programa. Por fim, o governo de Lula também seguiu dando continuidade aos programas implementados pelas gestões anteriores, além de ter criado o Crédito Solidário. Ao longo dos últimos anos, todos os programas criados refletem dois modos de atuação do Estado na redução das necessidades habitacionais: através da elaboração e promoção de programas de concessão de crédito para produtores e para população de maior poder aquisitivo e Considerações finais_____________________________________________________________ 256 através dos programas voltados para estados e municípios, para atendimento à parcela da população com renda abaixo de três salários mínimos. O primeiro modo se desenvolve por meio de dois programas principais: Carta de Crédito e PAR, ou seja, aqueles financiados pelo FGTS e pelo FAR, respectivamente. Pode- se inferir, ainda, que esses programas do governo federal são de formato neoliberal, pois são desenvolvidos com a parceria privada e estão voltados para a parcela da população cujo problema da moradia pode ser resolvido pelo mercado imobiliário (pois se destinam para a população de classe de renda média baixa, no mínimo,), sendo necessária a intervenção estatal apenas para promover o financiamento, já que a habitação é uma mercadoria de elevado valor agregado. A outra forma de intervenção governamental se deu por meio dos programas alimentados pelo OGU (como o Habitar-Brasil, o Morar-Melhor, o PSH, etc.), que atendem à parcela da população com renda abaixo de três salários mínimos. Com a participação dos governos estaduais e municipais, o governo federal aloca os recursos necessários, caracterizando-se um processo de descentralização das ações do poder público. Em outras palavras, no período pós-BNH passa a haver, teoricamente – embora ainda de forma embrionária –, um maior comprometimento do Estado para com a faixa de renda mais pobre da sociedade. Ele age via ações fragmentadas, nas três esferas do poder, e via concessão de subsídios para viabilizar a produção. Apesar do avanço, de modo global, o montante de recursos orienta-se mais para a população de maior renda, pois é nessa faixa que parece ser possível estabelecer um mínimo de eficácia nos programas de habitação, em função do retorno do capital aplicado. Percebe-se, portanto, a reprodução das características das políticas do modelo central-desenvolvimentista, que privilegiavam as camadas de maior renda. Outros valores também foram reproduzidos, como a continuidade da política da casa própria, uma vez que todos os programas formulados pelo Estado, inclusive o PAR, oferecem o sonho da propriedade privada. O PAR é um programa relativamente recente no contexto da política habitacional brasileira, e até 2005 (último ano sobre o qual a pesquisa coletou informações) obteve grande êxito, com a produção expressiva de 177.150 novas moradias, em 1.223 conjuntos. Além disso, ele vem sendo beneficiado pelo aporte de consideráveis recursos, só perdendo para o montante de recursos destinado ao programa Carta de Crédito Associativo, em particular durante o governo Lula (excetuando-se o Carta de Crédito Individual e os financiamentos do SBPE, os quais não foram aqui analisados). Trata-se de um programa com uma forma diferenciada de acesso à moradia, que é o arrendamento mercantil, ou leasing. É diferenciado porque contém elementos de uma política da casa própria como Considerações finais_____________________________________________________________ 257 também elementos de uma política de aluguel, ou seja, aglutina características de ambas, podendo ser considerado um “aperfeiçoamento” na forma de acesso à moradia no Brasil, mas sendo a casa própria o objetivo final. Na verdade, o caminho para se chegar à propriedade privada é apenas diferente. As prerrogativas de uma política da casa própria, todavia, são parcialmente atendidas, quando se trata da questão da segurança que a casa própria oferece aos trabalhadores e da possibilidade de transformar a habitação em um investimento. Pode-se dizer que o PAR oferece apenas uma “sensação de segurança”, pois a propriedade da casa não é dos arrendatários (eles têm apenas a cessão de uso). Não oferece também a possibilidade de transformar o valor de uso da moradia em valor de troca, pelo menos ao longo do contrato de arrendamento, vigente durante 15 anos (tempo de contrato menor que outros financiamentos, como o Carta de Crédito, por exemplo). Apesar disso, o programa apregoa a ideologia da casa própria, sem a casa ser própria, uma vez que a habitação permanece sob a propriedade fiduciária da Caixa Econômica Federal, pelo menos até o final do contrato de arrendamento, quando poderá ser feita a opção de compra, isto é, após o pagamento de saldo residual, se houver. Há, de fato, uma grande probabilidade de existência desse saldo, especialmente em se tratando do PAR 2 (público-alvo de até quatro salários mínimos, beneficiado com a taxa de arrendamento igual a 0,5% do valor do investimento), apesar de a maioria dos arrendatários acreditar que o imóvel será automaticamente deles no final do tempo de contrato. A partir de um estudo mais aprofundado, acredita-se que, na formulação do Programa de Arrendamento Residencial, foram considerados os erros e acertos avaliados nas experiências das políticas anteriores, aprimorando-se a forma de atuação do programa. Por exemplo, ele procurou evitar alguns erros cometidos pelas políticas implementadas anteriormente, como os elevados níveis de inadimplência, a periferização e a péssima qualidade construtiva dos conjuntos, que gerou a deterioração destes antes mesmo da comercialização de alguns empreendimentos, sendo necessária a intervenção do Estado na promoção de melhorias. Para isso, o programa incorporou uma série de elementos com a finalidade de enfrentar o problema habitacional. Alguns desses novos elementos, foram indicados no Capítulo III, que procurou responder à primeira questão-problema levantada na introdução desta dissertação (Em que medida essa forma de acesso – o arrendamento residencial – incorpora novos elementos para enfrentar o problema habitacional?). A mobilidade residencial, a facilidade de desistência, a facilidade de retomada do imóvel, a existência de uma administradora de imóveis, a nova função da CAIXA e a nova fonte de recursos disponibilizada especialmente para este programa são os novos elementos incorporados pelo PAR. Considerações finais_____________________________________________________________ 258 A mobilidade residencial e a facilidade de desistência oferecem aos arrendatários possibilidades de escolha: se for necessário, estes podem mudar-se ou, ainda, desistir do imóvel facilmente, de modo que a taxa de arrendamento passa a vigorar como uma taxa de ocupação, considerada como um aluguel. No caso de João Pessoa, observou- se que ambos os instrumentos são pouco utilizados pelos arrendatários; a facilidade de desistência é, inclusive, vista por eles não como uma vantagem para si próprios, mas como um investimento perdido, uma vez que 97,43% dos arrendatários pessoenses objetivam a propriedade da casa, o que ilustra o valor da casa própria na sociedade brasileira (alimentado ao longo de anos de política da casa própria). O terceiro elemento – a facilidade de retomada do imóvel – todavia, parece ser o principal do programa. Esse instrumento é operacionalizado em função do fato de a CAIXA ser a proprietária fiduciária dos imóveis e de haver um tempo mínimo de dois meses de tolerância quanto à inadimplência. São medidas jurídicas que vieram com o objetivo de otimizar o sistema de crédito, notadamente do ponto de vista administrativo (para a CAIXA), evitando a inadimplência e assegurando o retorno do capital investido. A efetiva redução do nível de inadimplência é, portanto, a grande meta alcançada pelo programa, fazendo a diferença no contexto dos demais programas habitacionais, que sofrem com essa questão. A redução é atingida, ainda, em vista da atuação da administradora dos imóveis, que faz as cobranças, e do agente técnico social, que pode atuar como mecanismo de pressão psicológica sobre os arrendatários. Esses dois agentes são também elementos exclusivos do PAR. A administradora atua no processo de consumo e obtém uma série de vantagens financeiras, participando do programa na tarefa de gerir os contratos de arrendamento e os de condomínio. Há, porém uma desvantagem, que é a relação um tanto conflituosa que mantém com os arrendatários – estes insatisfeitos com os serviços prestados pela administradora. Salienta-se que, com a figura desse agente, cobrando as taxas e administrando os imóveis do PAR, a CAIXA mantém uma imagem de agente benfeitor diante dos arrendatários, sendo a empresa administradora considerada a “vilã”. Assim, teoricamente, não haveria influência no pagamento das taxas. As empresas da construção civil também obtêm vantagens, em relação ao pagamento imediatamente após as medições da obra e em relação à comercialização das unidades construídas, que não é de sua responsabilidade. Apesar disso, alegam obter pequena margem de lucro e ter problemas com a manutenção dos imóveis. Em suma, tanto a administradora quanto as construtoras são empresas capitalistas, que visam ao lucro e oneram o custo final da habitação. O principal agente do programa, todavia, é a CAIXA, cuja forma de atuação, é, no caso do PAR, é mais um elemento diferencial nessa linha de crédito. Esse agente passa Considerações finais_____________________________________________________________ 259 a atuar de uma forma mais intensa que o convencional no financiamento de moradias, devido ao formato operacional do programa, que exige maiores responsabilidades tanto no processo de produção quanto no de consumo. Dessa forma, a CAIXA, além de agência financeira, passa a exercer algumas das atividades que definem o agente incorporador empiricamente, na medida em que organiza e coordena uma série de ações e de agentes. Sua remuneração, no entanto, é independente de fatores como o sobrelucro da comercialização e a valorização fundiária, elementos definidores do sistema de incorporação imobiliária, definidos teoricamente por Ribeiro (1997). Para participar do PAR, a CAIXA faz uso dos instrumentos administrativos que objetivam a redução da inadimplência, no entanto ela enfrenta uma série de dificuldades, entre as quais se destaca a manutenção dos imóveis. Essa questão, inclusive, chega a comprometer o FAR. Devido a esse problema, em especial, o programa de arrendamento está ameaçado pela possibilidade de transformação em financiamento convencional. Assim, o PAR poderá perder seu maior diferencial, que é a forma de acesso à moradia. A Lei n. 11.474, de 15 de maio de 2007, possibilita a desimobilização das unidades da CAIXA em favor da opção dos arrendatários, antes do fim do contrato (concretização do que havia sido previsto por César Ramos151). O fundo do PAR é mais um elemento que diferencia esse programa dos demais programas habitacionais. Utiliza-se o Fundo de Arrendamento Residencial como fonte de recursos, em vez da fonte tradicional, o FGTS, embora este último também contribua para o FAR. Do ponto de vista operacional, portanto, uma série de novos elementos foram incorporados ao PAR, diferenciando-o em relação às linhas de financiamento convencionais. As diferenças do programa se estendem, ainda, para outros aspectos, como os locacionais, os tipológicos e os construtivos da produção. Procurando responder à segunda questão- problema (Qual a implicação do PAR para a implantação dos conjuntos no tecido urbano e para as características tipológicas das unidades habitacionais?), pode-se dizer que o fato de a CAIXA ser a proprietária fiduciária dos imóveis financiados pelo FAR influiu positivamente no melhor padrão dessa produção, sob os aspectos acima assinalados, como será explicado a seguir. Depois de todos os problemas que ocorreram com o modelo periférico expansionista de implantação dos conjuntos do BNH (posteriormente estendidos para os 151 Entrevista semi-estruturada realizada com César Ramos, gerente de Projetos do Ministério das Cidades, no I Seminário Internacional das Cooperativas Habitacionais, realizado no Hotel Blue Tree Park, em Natal-RN, entre os dias 28-02-07 e 01-03-07. A entrevista ocorreu no segundo dia do evento. Considerações finais_____________________________________________________________ 260 conjuntos financiados pelo PAIH, PROHAP, etc.), o PAR procurou adotar medidas para evitar esses problemas (Quadro 14). Uma dessas medidas foi a exigência de que os seus conjuntos sejam inseridos na malha urbana, dotada de infra-estrutura e serviços gerais. Com isso, há uma certa pressão no sentido de aproveitar os vazios urbanos deixados pela recente expansão das cidades, com a construção majoritária de conjuntos de pequeno porte – 75,66% dos conjuntos tinham menos que 160 unidades, até 2003. Por isso, o programa considera 160 unidades a quantidade recomendada para cada conjunto financiado. O objetivo é preencher os vazios urbanos, possibilitando melhor aproveitamento da infra- estrutura instalada e beneficiando-se da melhor acessibilidade. Como decorrência da implantação pontual na cidade, a produção do PAR se desenvolveu de uma forma fragmentada, que não chega a causar transformações na estrutura nem na paisagem urbana já consolidada, diferentemente do que ocorreu anteriormente, com a expansão horizontal promovida pelo BNH. No Capítulo IV, o estudo do desenvolvimento urbano da cidade de João Pessoa, tendo como foco a produção de moradias, permitiu visualizar, na prática, as questões locacionais do PAR já explicitadas. Comparando-se à produção estatal de conjuntos habitacionais para a população de menor renda, efetuada pelos agentes públicos e privados, a produção do PAR se destacou no aspecto locacional, especialmente em razão da diversidade que o programa tentou imprimir, a priori, na implantação dos seus conjuntos em diversas áreas da cidade (com maior ou menor status social), diferentemente da ação dos agentes públicos, que atuaram predominantemente em uma única região, a sudeste. É interessante verificar que, mesmo se tratando de habitações destinadas à população de renda mais baixa, inicialmente elas não foram segregadas para bairros essencialmente de baixa renda, como é comum na produção de moradias – a heterogeneidade da produção e das classes se aplica ao espaço urbano. Somente depois de 2002, acentuado-se após 2003 com as mudanças legislativas que ampliaram o atendimento à população de menores rendimentos, essa diversidade de implantação dos conjuntos do PAR foi sendo substituída por uma produção também concentrada na região sudeste, mais precisamente nas franjas da malha urbana, onde o custo do solo era baixo, percebendo-se a influência da valorização do mercado de terras na produção habitacional. Os conjuntos do PAR passaram, dessa forma, por um processo de periferização, contudo esse processo não chegou a causar impactos no espaço urbano (diferentemente do modelo promovido pelo BNH), em razão da pequena dimensão dos empreendimentos, a qual segue a recomendação do próprio programa. Esse processo de periferização é observado também em outras cidades brasileiras. Considerações finais_____________________________________________________________ 261 Em todo caso, a localização dos empreendimentos do PAR foi avaliada como “boa”, de forma quase unânime, pelos arrendatários, considerando-se principalmente a produção efetuada até 2004. Em síntese, as características locacionais apontadas indicam que esse programa não é apenas habitacional, mas também influi na política urbana, uma vez que reflete uma série de preocupações com os aspectos fundiários, conferindo uma maior qualidade para a política pública de habitação. Para fazer frente às exigências locacionais do programa, seja no nível nacional, seja no municipal, a produção do PAR foi marcada pela construção de conjuntos formados predominantemente por edifícios. A verticalização e o adensamento dos terrenos escolhidos são necessários para baratear o custo final das unidades (pré-estabelecido), em função do alto custo do solo urbanizado, na maioria das cidades brasileiras. Outra medida adotada para o barateamento das unidades foi a redução de alguns impostos concedidos pelas prefeituras, como, por exemplo, a Prefeitura Municipal de João Pessoa. O tipo predominante do PAR sendo o edifício multifamiliar com altura limitada, em geral, a até quatro pavimentos (ou cinco no Sul e Sudeste), assemelha-se à tipologia dos IAPs. No entanto, se a produção dos Institutos foi marcada pelos princípios da arquitetura modernista, que conferiram uma qualidade estética e arquitetônica aos conjuntos, esses princípios não foram adotados na produção do PAR (Quadro 14). Muitas características modernistas, que produziam a qualidade na produção dos IAPs, se transformaram, ao longo do desenvolvimento da política habitacional brasileira, provocando um empobrecimento formal, uma vez que o custo passou a prevalecer e, inequivocadamente, passou-se a dar menos importância aos aspectos arquitetônicos. Os pilotis foram sendo substituídos por unidades habitacionais no pavimento térreo, buscando o adensamento e, por conseguinte, o barateamento do custo das unidades; o terraço-jardim, a planta e as fachadas livres foram sendo abolidos; os panos de janelas foram sendo suprimidos por janelas de pequenas dimensões. Além de adotar essas características transformadas, os edifícios do PAR são de volumetria simples, marcada pelo grafismo nas fachadas, tanto no nível nacional quanto no município de João Pessoa. É importante esclarecer que os IAPs também tinham volumetria simples (em forma de paralelepípedos), mas como também tinham os princípios da arquitetura modernista (como o pilotis), isso conferia aos seus blocos certa leveza, enquanto os blocos dos edifícios do PAR são compactos. Assim, muitos princípios modernistas não foram adotados, excetuando-se a presença dos equipamentos comunitários nos conjuntos, apesar de estes não serem muito freqüentados pelos arrendatários pessoenses, devido ao mau estado de conservação em que geralmente se encontram. Considerações finais_____________________________________________________________ 262 Outra preocupação modernista encontrada na produção do PAR é a garantia da habitabilidade mínima das unidades. A habitabilidade mínima é alcançada com as chamadas especificações mínimas, responsáveis pelo padrão mínimo de qualidade. A qualidade da construção também foi uma preocupação constante no programa, constatada nas exigências da CAIXA. No caso da cidade de João Pessoa, essa qualidade construtiva foi ainda maior que a exigida pelo programa, devido às exigências da regional da CAIXA na Paraíba, as quais geraram insatisfação nos empresários da construção civil. Com essa preocupação direcionada aos aspectos construtivos, a CAIXA procura evitar futuras despesas para o erário público com a devida manutenção dos empreendimentos, ao longo dos 15 anos de contrato. Mas, mesmo com tanta exigência, são incontáveis os chamados “vícios de construção” nos empreendimentos do PAR na capital paraibana e também em outras cidades, para descontentamento dos arrendatários. Apesar disso, não se pode deixar de comentar que, comparativamente, a qualidade de construção dos empreendimentos do PAR é superior à da maioria dos empreendimentos produzidos pelos agentes públicos e privados estudados no Capítulo IV. Ainda no que se refere aos aspectos tipológicos, o maior diferencial relaciona-se a uma vertente do PAR que trabalha com a reutilização e a revitalização de prédios antigos localizados em sítios históricos. Contudo, essa vertente encontra dificuldades para se desenvolver com mais intensidade, embora, de qualquer forma, já constitua um significativo avanço na política habitacional a previsão da ocupação e reutilização dos imóveis ociosos dos centros das cidades brasileiras. Todas as características comentadas apontam similitudes e diferenças entre o PAR e os demais programas implementados anteriormente, como pode ser observado no Quadro 14, elaborado para tornar mais visíveis tais características. No entanto, uma característica perpassou todos esses distintos momentos históricos: a difusão da ideologia da casa própria, inclusive, no PAR. Q ua dr o 14 : S ín te se d as p rin ci pa is c ar ac te rís tic as ti po ló gi ca s, c on st ru tiv as e lo ca ci on ai s id en tif ic ad as n a pr od uç ão h ab ita ci on al d e qu at ro m om en to s hi st ór ic os d is tin to s – do s IA Ps , do B N H , d o pr og ra m a PA IH e d o PA R P ro gr am as e p ol íti ca s ha bi ta ci on ai s no B ra si l C ar ac te rís tic as d a pr od uç ão IA P s (1 93 7- 19 64 ) B N H (F G TS ) ( 19 64 -1 98 6) P A IH (1 99 0- 19 92 ) PA R (1 99 9- at ua l) pe río do g et ul is ta C on te xt o hi st ór ic o ap og eu d o M ov im en to M od er no n o B ra si l re gi m e m ili ta r in íc io d o ne ol ib er al is m o no B ra si l (G ov er no C ol lo r) au ge d o ne ol ib er al is m o (G ov er no FH C ) Ti po d e ac es so à m or ad ia po lít ic a da c as a pr óp ria e p ol íti ca d e al ug ue l po lít ic a da c as a pr óp ria pr og ra m a de d ifu sã o da c as a pr óp ria pr og ra m a de a rr en da m en to , m as co m id eo lo gi a da c as a pr óp ria Im pl an ta çã o m od el o su bu rb an o de im pl an ta çã o, em bo ra a lg un s co nj un to s te nh am si do im pl an ta do s em b ai rr os co nt íg uo s ao c en tro u rb an o. O ut ro s, to da vi a, a pr es en ta m lo ca liz aç õe s pr iv ile gi ad as , i nc lu si ve , n os c en tro s ur ba no s. m od el o pe rif ér ic o de im pl an ta çã o, m ui ta s ve ze s, e m lo ca is s em in fra - es tru tu ra se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o do B N H . P és si m as lo ca liz aç õe s in se rid os n a m al ha u rb an a, e m lo ca is d ot ad os d e in fra -e st ru tu ra . A pr ov ei ta m en to d e va zi os u rb an os , ge ra nd o um a im pl an ta çã o fra gm en ta da n a ci da de . Fo rm aç ão d os c on ju nt os pr es en ça d e eq ui pa m en to s co m un itá rio s e de á re as v er de s au sê nc ia d e eq ui pa m en to s co m un itá rio s e at é m es m o de in fra - es tru tu ra n os c on ju nt os se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o do B N H pa rc ia l p re se nç a de e qu ip am en to s co m un itá rio s e po uc as á re as v er de s. Tr an sf or m aç õe s na e st ru tu ra u rb an a si m , e m bo ra p eq ue na . O cu pa çã o do s va zi os lo ca liz ad os n as fr an ja s da m al ha u rb an a si m (e xp an sã o da m al ha u rb an a) - nã o Tr an sf or m aç õe s na p ai sa ge m ur ba na si m (c on st ru çã o de c on ju nt os re si de nc ia is v er tic ai s) si m (c on st ru çã o de c on ju nt os ho riz on ta is d e gr an de p or te ) - nã o U rb an is m o X A rq ui te tu ra in te r- re la ci on ad os “d es vi nc ul ad os d o co nt ex to u rb an o e do m ei o fís ic o e, p rin ci pa lm en te , de sa rti cu la do s de u m p ro je to s oc ia l” se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o ap re go ad o pe lo B N H pa rc ia l p re oc up aç ão e m a rti cu la r a ar qu ite tu ra e o u rb an is m o Ti po lo gi a ha bi ta ci on al m ul tif am ili ar , c om o sí m bo lo pr op ag ad or d a ar qu ite tu ra m od er ni st a; e u ni fa m ili ar m ul tif am ili ar e u ni fa m ili ar , e st e úl tim o se nd o m ai s fre qü en te n o N or de st e br as ile iro - m ul tif am ili ar e u ni fa m ili ar , s en do o pr im ei ro a ti po lo gi a m ai s co m um en te ut ili za da C ar ac te rís tic as a rq ui te tô ni ca s ad oç ão d os p re ce ito s m od er ni st as , qu e ga ra nt ira m e xc el en te q ua lid ad e es té tic a. “r ac io na lis m o fo rm al d es pr ov id o de co nt eú do ”, cu jo s pr oj et os m on ót on os , r ep et iti vo s ap re se nt av am p és si m a qu al id ad e ar qu ite tô ni ca se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o do B N H . P és si m a qu al id ad e co ns tru tiv a ar qu ite tu ra d e vo lu m et ria s im pl es , em fo rm a de p ar al el ep íp ed os , m as co m g ra fis m os n as fa ch ad as ra ci on al iz aç ão , i nd us tri al iz aç ão e ve rti ca liz aç ão . ra ci on al iz aç ão e in du st ria liz aç ão , m as ta m bé m d a re du çã o da qu al id ad e da c on st ru çã o se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o do B N H . ve rti ca liz aç ão d os c on ju nt os , m as se m re du zi r a q ua lid ad e co ns tru tiv a B ar at ea m en to d a co ns tru çã o tin ha u m o bj et iv o so ci al , p or tr ás d o ba ra te am en to : p ro po rc io na r m or ad ia de b oa q ua lid ad e pa ra m ai or n úm er o de p es so as vi sa va a o ba ra te am en to d as co ns tru çõ es p ar a fa ze r f re nt e à ca pa ci da de d e pa ga m en to d o pú bl ic o- al vo . I nd ire ta m en te o ba ra te am en to d a co ns tru çã o vi sa va ao m ai or lu cr o pa ra o c on st ru to r se gu e da nd o co nt in ui da de a o m od el o do B N H . ob je tiv am a re du çã o do c us to d a m or ad ia , p ar a fa ze r f re nt e à ca pa ci da de d e pa ga m en to d a po pu la çã o de m en or re nd a N ot a: E la bo ra çã o da a ut or a Considerações finais_____________________________________________________________ 264 Diante dos fatos apresentados – forma de acesso, características locacionais, construtivas e tipológicas –, conclui-se que o PAR proporciona muitos pontos positivos para os arrendatários. Estes se beneficiam com uma linha de crédito mais acessível financeiramente, por um contrato de menor tempo, comparando-se com outros programas habitacionais, que, usualmente, financiam em 20 anos. Eles são contemplados com unidades produzidas a baixo custo, embora bem construídas e, em geral bem localizadas no tecido urbano. Por essas razões, o programa tem um bom nível de aceitação pelos arrendatários entrevistados: 98,39% gostam de participar do PAR, apesar dos problemas citados, em relação à administração dos imóveis e dos “vícios de construção”, principais pontos negativos por eles. A probabilidade de haver saldo residual no final da vigência do contrato também se apresenta como um ponto negativo, podendo vir a dificultar a concretização do sonho que os arrendatários alimentam de se tornarem proprietários da casa. É importante salientar que a ideologia da casa própria, no PAR, compreende elementos que atendem preferencialmente aos interesses do agente financeiro, dotando-o de instrumentos que garantem a eficácia e o melhor desempenho do programa. Para tanto, fez-se necessária a diminuição de algumas prerrogativas que uma política da casa própria proporciona aos trabalhadores, que aspiram pela propriedade de um imóvel. Isso acontece porque a produção habitacional do PAR consiste na produção de uma mercadoria inserida na lógica capitalista de produção. Como tal, ela busca o lucro, embora este seja relativamente pequeno para os construtores, e objetiva os princípios de toda e qualquer produção capitalista: o melhor desempenho e eficiência do sistema. Não se pode deixar de falar da preocupação em manter o SFH estável. Percebe-se que os objetivos capitalistas vêm sendo alcançados, assim como muitas das diretrizes estipuladas pela legislação do programa (Portaria n. 231, 2004). Visando à modificação do tecido social traçado inicialmente como problemático, as principais diretrizes atendidas são: o incremento do estoque de moradias com qualidade construtiva e locacional voltado para a população de menor renda; a redução do número de famílias que sofrem com a coabitação ou com o ônus excessivo do aluguel; a promoção da economia através do ramo das empresas da construção civil e do ramo das empresas imobiliárias; e o aproveitamento de imóveis e terrenos ociosos. Outros objetivos também vêm sendo alcançados, como a redução da inadimplência na política habitacional brasileira e a diminuição da especulação de imóveis. Verifica-se, então, que o PAR é um programa inserido em uma política de governo, mas que vem se fortalecendo ao assumir um papel relevante no cenário das políticas de habitação, pois reativou a construção de conjuntos habitacionais de qualidade Considerações finais_____________________________________________________________ 265 para a população de mais baixa renda, quando comparados com as habitações financiadas por outros programas voltados para baixa renda, conforme se verifica no caso de João Pessoa. É um programa complexo, que tem implicações na política urbana, na questão dos imóveis ociosos, além de todos os outros aspectos já levantados. Por isso, conta com um maior comprometimento do poder público, que se preocupa em enfrentar a problemática habitacional na mesma medida em que se preocupa em manter a economia estável. No entanto, para a concretização das diretrizes traçadas, o programa exige mais ações efetivas e maiores responsabilidades, não apenas do governo federal, mas também dos governos estadual e municipal. Resumindo, por fim, o programa traz uma série de inovações e novos elementos para enfrentar o problema habitacional, no entanto suas maiores particularidades – a forma diferente de acesso à moradia e a localização dos conjuntos – estão ameaçadas seja pela possibilidade de se transformar o arrendamento em financiamento convencional, seja pela periferização dos conjuntos. Referências ___________________________________________________________________ 266 REFERÊNCIAS ABRUCIO, Fernando Luiz; COUTO, Cláudio Gonçalves. A redefinição do papel do Estado no âmbito local. São Paulo em Perspectiva, v.10, n.3, p.40-47, jul.-set., 1996. ANDRADE, Patrícia Mendonça Dinoá. Programa de intervenção em núcleos favelados. Vila São Paulo: um estudo de caso. João Pessoa: UFPB, Monografia. 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Referências ___________________________________________________________________ 272 Inserção Urbana e Avaliação Pós-ocupação (APO) da habitação de interesse social. São Paulo: FAUUSP, 2002 (Coletânea Habitare – FINEP, 1). p.34-55. Anexos _______________________________________________________________________ 273 ANEXOS ANEXO A – Roteiro de questões para a entrevista na GILIE da CAIXA ANEXO B – Roteiro de questões para a entrevista com o secretário de Habitação da Prefeitura Municipal de João Pessoa ANEXO C – Roteiro de questões para as entrevistas com os construtores que produziram pelo PAR ANEXO D – Roteiro de questões para a entrevista com a administradora de imóveis do PAR ANEXO E – Roteiro de questões para as entrevistas com os arrendatários ANEXO F – Roteiro de questões para a entrevista na CEHAP Anexos _______________________________________________________________________ 274 ANEXO A: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA A ENTREVISTA NA GILIE DA CAIXA DATA: __________ ENTREVISTADO: _________________________________________________________________________________ FUNÇÃO DO ENTREVISTADO: _________________________________________________________________________________ Qual a função da GILIE no PAR? _________________________________________________________________________________ Qual a Gerência da CAIXA que se responsabiliza em repassar o financiamento para a construção? _________________________________________________________________________________ Quais são as vantagens do PAR em relação aos outros tipos de financiamentos da CAIXA? _________________________________________________________________________________ Quais são as vantagens que o PAR oferece aos construtores? _________________________________________________________________________________ Quais são as vantagens que o PAR oferece aos moradores? _________________________________________________________________________________ Existe estudo de demanda para o PAR? SIM (____) NÃO (____) Qual a demanda do PAR na Paraíba?___________________________________________________ Qual a demanda do PAR em João Pessoa?______________________________________________ A procura é maior por casas ou apartamentos? (quais os números?)___________________________ Qual a faixa de renda predominante na demanda? ________________________________________ Qual a remuneração da CAIXA pela operacionalização do programa? (15%?) ___________________ LOCALIZAÇÃO DOS CONJUNTOS Quais os critérios de inclusão e exclusão dos municípios no PAR? (ex.: porque Bayeux não é beneficiada pelo programa?) __________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 275 Existe algum projeto de revitalização do centro histórico pelo PAR em João Pessoa: SIM (____) NÃO (____) Se sim, quantos? ________________________ onde? ________________________ SOBRE A ADMINISTRADORA E PMJP: Quais são as funções incumbidas à administradora? _________________________________________________________________________________ No valor do financiamento, qual o percentual destinado à prestação de serviços da MG? _________________________________________________________________________________ Com que freqüência a administradora realiza as reuniões nos conjuntos? ______________________ Para a CAIXA, quanto às funções que lhes são incumbidas, ÓTIMO BOM RUIM PÉSSIMO A atuação da administradora é: A atuação da PMJP SOBRE OS USUÁRIOS: Qual a faixa de renda mais beneficiada pelo PAR? ________________________________________ Qual o público alvo mais beneficiado (policiais, funcionários públicos, etc.)? ____________________ Existe distribuição entre faixa de renda e conjuntos? _______________________________________ Quais conjuntos destinam a qual tipo de renda? ____________________________________ Qual o valor das prestações do financiamento por edifício?__________________________________ Qual o tempo necessário sem efetuar pagamento para o usuário tornar-se inadimplente? __________ O inadimplente tem seu nome em cadastrado em Serasa ou outros? __________________________ Quantas pessoas estão inadimplentes no momento? Qual o percentual de inadimplentes? _________________________________________________________________________________ Quantas pessoas já foram retiradas do programa, devido à inadimplência? _____________________ Quantas unidades estão vagas no momento?_____________________________________________ Desde quando?______________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 276 Algum arrendatário já quitou a unidade (possível, conforme o item 7.2, da Portaria n. 231, de 04 de junho de 2004)? SIM (____) NÃO (____) Se sim, quantos?______________________________________________________ O que é necessário para o usuário quitar o imóvel, agora ou depois de 15 anos? _________________________________________________________________________________ Os usuários conservam o imóvel: SIM (____) NÃO (____) Os usuários podem pintar suas casas com cores distintas para se diferenciarem das demais, uma vez que isso é uma prática bastante comum no processo habitacional? SIM (____) NÃO (____) A CAIXA faz vistoria nos conjuntos? SIM (____) NÃO (____) Com que freqüência? _________________________________________________________ A CAIXA realiza manutenção nos conjuntos (para conservação)? SIM (____) NÃO (____) Com que freqüência? _________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 277 ANEXO B: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA A ENTREVISTA COM O SECRETÁRIO DE HABITAÇÃO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA DATA: __________ ENTREVISTADO: __________________________________________________________________ FUNÇÃO DO ENTREVISTADO: _______________________________________________________ Qual a função da PMJP no PAR? ______________________________________________________ Quais são os critérios para a população se inscrever no PAR?_______________________________ Qual a demanda do PAR na Paraíba?___________________________________________________ Qual a demanda do PAR em João Pessoa?______________________________________________ A procura é maior por casas ou apartamentos? (quais os números?)___________________________ Qual a faixa de renda predominante na demanda?_________________________________________ Quais os incentivos e benefícios que a PMJP oferece para a construção de empreendimentos do PAR? (isenção de impostos? Quais?) ___________________________________________________ Quantos projetos já foram beneficiados pela Lei Complementar n. 035, de 07 de julho de 2004? _________________________________________________________________________________ A PMJP oferece os incentivos e benefícios do PAR para outros tipos de financiamento? SIM (____) NÃO (____) Qual? ____________________________________________________________________________ Existe algum projeto de revitalização do centro histórico pelo PAR em João Pessoa: SIM (____) NÃO (____) Se sim, quantos? ________________________ onde? ________________________ Quem propôs a revitalização das casas do centro? __________________________________ Quem escolheu as residências na Rua João Suassuna? _____________________________ Por que aquelas casas? _______________________________________________________ Como se desenvolveu o processo de negociação das casas? _________________________________________________________________________________ As casas foram negociadas quando? ___________________________________________________ Já pertencem à PMJP? ______________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 278 Para essas casas, qual a faixa de renda que será beneficiada? ______________________________ Para essas casas, qual o público alvo preferencial? ________________________________________ SOBRE AS HABITAÇÕES CONSTRUÍDAS NA GESTÃO DE CÍCERO LUCENA: Qual a faixa de renda da população residente nos apartamentos da PMJP? ____________________ Qual o público alvo predominante (ex.: funcionários da PMJP)? ______________________________ Qual a forma de financiamento? _______________________________________________________ Qual o ano de construção dos edifícios? ________________________________________________ Qual o programa de necessidades dos apartamentos e área privativa? _________________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 279 ANEXO C: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA AS ENTREVISTAS COM OS CONSTRUTORES QUE PARTICIPARAM DO PAR DATA: __________ IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA EMPRESA: Empresa Construtora: _____________________________________________ Ano de criação: ____ Empresa paraibana: SIM (____) NÃO (____) Produção do PAR: __________________________________________________________________ Entrevistado: ______________________________________________________________________ Função do Entrevistado: _____________________________________________________________ Qual o porte da Empresa? (____) GRANDE (____) MÉDIO (____) PEQUENO Que tipo de clientela é preferencialmente atendida pela Empresa (conforme o CUB – Custo Unitário Básico): (____) ALTA (____) MÉDIA (____) BAIXA Especialidade da Empresa (por %): (____) Construção de edifícios habitacionais multifamiliares (____) Construção de unidades habitacionais unifamiliares (____) Construção de edifícios comerciais (____) Outro tipo de construção Principais bairros que a Empresa prefere atuar: _________________________________________________________________________________ Principais bairros que a Empresa atua? Por quê? _________________________________________________________________________________ Recursos da Empresa (por %): (____) As construções são geralmente financiadas com recursos próprios (____) As construções são geralmente financiadas com recursos por bancos privados (____) As construções são geralmente financiadas com recursos pelo Banco do Brasil (____) As construções são geralmente financiadas com recursos da CAIXA Qual o tipo de financiamento da CAIXA mais utilizado pela empresa? _____________ Anexos _______________________________________________________________________ 280 Por quê? ______________________________________________________ A Empresa já havia construído habitação para órgãos estaduais como CEHAP ou IPEP? SIM (____) NÃO (____) EM RELAÇÃO AO FINANCIAMENTO DO PAR Dos financiamentos da CAIXA, considera o PAR melhor ou pior que os demais? MELHOR (____) PIOR (____) Quais as vantagens que a CAIXA oferece para esse tipo de financiamento em relação aos outros tipos? _________________________________________________________________________________ E as desvantagens? _________________________________________________________________________________ A PMJP ofereceu à Empresa incentivos ou benefícios para a construção do PAR? SIM (____) NÃO (____) Que tipo de incentivos e benefícios a PMJP oferece para a construção de um PAR? ______________ Porque resolveu participar do PAR? _________________________________________________________________________________ Que elementos determinaram a participação no programa (por ordem de prioridades): (____) Existência de terrenos (____) Características da demanda (____) Fontes e plano de financiamento (____) Vantagens econômicas (____) Características técnicas do terreno (____) Localização do terreno Pretende participar novamente do programa? SIM (____) NÃO (____) Por que? _____________________________________________________________ Foi vantajoso economicamente para você? MUITO (____) MÉDIO (____) (____) POUCO Quais principais dificuldades que a Empresa enfrentou com o programa? _________________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 281 LOCALIZAÇÃO E ARQUITETURA DOS CONJUNTOS Qual o papel da Empresa na determinação da localização? _________________________________ Que fatores foram considerados na escolha da localização dos conjuntos, além da acessibilidade e disponibilidade de infra-estrutura requeridos pelo programa? (por prioridade) (____) Proximidade com serviços básicos como escolas, padarias, mercadinhos, farmácias, etc (____) Proximidade com meios de transporte coletivos (____) Localização social (____) Situação geográfica (____) Condições topográficas do terreno (tamanho, forma e declividade do lote) (____) Uso do solo (Plano Diretor ou código de urbanismo) (____) Demanda no bairro (____) Imposição da CAIXA (____) Preço dos terrenos (____) Nenhum dos fatores acima listados Qual foi o critério adotado para a escolha do terreno, além dos acima listados? (____) Era proprietário do terreno (____) Terrenos baratos à venda No valor total do empreendimento, qual a porcentagem relativa ao terreno? _____________________ O terreno escolhido apresentava área construída antes da construção do conjunto do PAR: SIM (____) NÃO (____) Se sim, qual era a tipologia da construção? _________________________________ A localização influencia a tipologia habitacional e/ou o padrão construtivo? SIM (____) NÃO (____) O que (ou quem) determinou o tipo de construção, se casa ou apartamento? _________________________________________________________________________________ A Empresa prefere construir: CASA (____) APARTAMENTO (____) Por quê? ___________________________________________________________________ O que (ou quem) determinou o padrão construtivo (tipo de materiais)? _________________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 282 Considera compatível o valor das unidades com as exigências do programa (tipologia, especificações mínimas)? SIM (____) NÃO (____) Por quê? _________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 283 ANEXO D: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA A ENTREVISTA COM A ADMINISTRADORA DE IMÓVEIS DO PAR DATA: __________ ENTREVISTADO: __________________________________________________________________ FUNÇÃO DO ENTREVISTADO: _______________________________________________________ Qual a função da MG no PAR? _________________________________________________________________________________ De que forma a MG veio participar do PAR? _________________________________________________________________________________ Quantos empreendimentos do PAR a MG administra? Onde? _________________________________________________________________________________ O empreendimento Santa Teresa, em Campina Grande, é composto por casas ou apartamentos? _________________________________________________________________________________ A MG administra outros imóveis da CAIXA? SIM (____) NÃO (____) Quais? _________________________________________________________________________________ Quais as principais vantagens em administrar os imóveis do PAR em relação aos outros imóveis administrados? _________________________________________________________________________________ Quais são as principais vantagens que a CAIXA oferece para administrar os imóveis do PAR? _________________________________________________________________________________ Quais são as principais desvantagens em administrar os imóveis do PAR? _________________________________________________________________________________ Quais as principais dificuldades encontradas em administrar os imóveis do PAR? _________________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 284 Qual o percentual da empresa na atividade de administrar os imóveis do PAR? (percentual pela administração do condomínio e pelos contratos de arrendamento)? _________________________________________________________________________________ Quais são as responsabilidades do condomínio? _________________________________________________________________________________ Com que freqüência a MG realiza reuniões de condomínio? _________________________________________________________________________________ Quais são as principais dificuldades encontradas com os moradores nas reuniões de condomínio? _________________________________________________________________________________ Qual o valor da primeira e da mais recente taxa de arrendamento e de condomínio dos conjuntos do PAR administrados pela MG? Conjunto Arrendamento inicial Arrendamento atual Condomínio inicial Condomínio atual Tempo de arrendamento Tropical Tambiá Jardim Tropical Jardins Jardins do Sul Via Norte II Litoral Sul Estado de São Paulo Estado do Acre Maria Apolônia Vista Bela II Qual a finalidade das vistorias da MG? _________________________________________________________________________________ Com que freqüência a MG vistoria as unidades habitacionais? _________________________________________________________________________________ Quais são as principais irregularidades encontradas? _________________________________________________________________________________ Quais as providências tomadas com as irregularidades encontradas? _________________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 285 Qual o tipo de manutenção que a MG faz nos condomínios? _________________________________________________________________________________ Com que freqüências as manutenções são realizadas? _________________________________________________________________________________ Quantos arrendatários conseguiram mudar de empreendimento do PAR na cidade de João Pessoa? _________________________________________________________________________________ Quantos arrendatários já desistiram do programa? _________________________________________________________________________________ Quais foram os principais motivos para as desistências? _________________________________________________________________________________ Quantos contratos já foram rescindidos? _________________________________________________________________________________ Quais foram os principais motivos para a rescisão? _________________________________________________________________________________ Qual o percentual de inadimplentes na taxa de arrendamento? _________________________________________________________________________________ Qual o percentual de inadimplentes na taxa condominial? _________________________________________________________________________________ Quantos apartamentos se encontram vagos no momento? Por quê? _________________________________________________________________________________ A MG tem conhecimento da insatisfação dos moradores acerca da administração dos condomínios? SIM (____) NÃO (____) Quais são as principais reclamações dos moradores para a MG? ____________________________________________________________________ Quais são as providências que a administradora vem tomando para melhorar essa insatisfação? ____________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 286 Como a MG considera sua relação com os moradores? Ótimo Bom Regular Ruim Péssimo Por quê? _________________________________________________________________________ Como a MG considera sua relação com a CAIXA? Ótimo Bom Regular Ruim Péssimo Por que? _________________________________________________________________________ Anexos _______________________________________________________________________ 287 ANEXO E: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA AS ENTREVISTAS COM OS ARRENDATÁRIOS CONTROLE: ______/______/______ DATA: ______________ CONJUNTO BLOCO APTO EQUIPAMENTOS COLETIVOS DO CONJUNTO: CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS USUÁRIOS: Entrevistado (parentesco) Escolaridade do arrendatário Emprego do arrendatário Número de pessoas na família: Meio de transporte utilizado: Tempo que mora no edifício: Qual a condição de ocupação do domicílio em que morava anterior ao PAR: PRÓPRIO (____) ALUGADO (____) CEDIDO (____) OUTROS (____) Em caso de alugado, a prestação do aluguel era maior que a prestação do financiamento: SIM (____) NÃO (____) Qual o valor do antigo aluguel? ______________ Tipo de domicílio anterior: CASA (____) APARTAMENTO (____) Prefere casa ou apartamento: CASA (____) APARTAMENTO (____) Já morou em apartamento antes: SIM (____) NÃO (____) Bairro de origem do domicílio anterior SOBRE O FINANCIAMENTO: Como ficou sabendo do programa? ____________________________________________________ Por que escolheu o programa? ________________________________________________________ No financiamento, o (a) senhor (a) foi classificado (a) como: 2-3 s.m (____) 3-4 s.m. (____) 4-5 (____) 5-6 s.m. (____) acima de 6 s.m (____) Anexos _______________________________________________________________________ 288 Qual (is) o (s) valor (es) da (s) sua (s) prestação (ões)? _____________________________________ O aumento do valor das prestações está de acordo com o seu orçamento familiar? SIM (____) NÃO (____) A família pretende morar neste residencial por quanto tempo? _______________________________ A família tem o objetivo de quitar o financiamento para ter a propriedade da casa (ao final dos 15 anos)? SIM (____) NÃO (____) Considera vantajoso: SIM NÃO Mudar para outro condomínio do PAR? (mobilidade residencial) Desistir do financiamento? Morar aqui, mas por um valor abaixo do mercado? Ir pagando pequenas prestações mensais para comprar a casa própria? Já solicitou outro tipo de financiamento habitacional? NÃO (____) CEHAP (____) IPEP (____) CAIXA (____) OUTROS BANCOS (____) Qual forma de financiamento? __________________________________________________ Com que freqüência a MG realiza as reuniões de condomínio? _______________________________ Você participa das reuniões realizadas pela MG? SIM (____) NÃO (____) Por quê? _____________________________________________________________ Você gosta da administração realizada pela MG: SIM (____) NÃO (____) Por quê? _____________________________________________________________ O seu contato com a CAIXA é apenas para pagar o financiamento? SIM (____) NÃO (____) Você gosta do atendimento da CAIXA? SIM (____) NÃO (____) Por quê? _____________________________________________________________ Com que freqüência a CAIXA e a MG vistoriam a sua casa? _________________________________ A CAIXA faz manutenção no conjunto e na sua casa? E a MG faz manutenção? SIM (____) NÃO (____) SIM (____) NÃO (____) Anexos _______________________________________________________________________ 289 Você participa de alguma organização do condomínio (associações)? Qual? ____________________ SIM (____) NÃO (____) De forma geral, considera seu relacionamento com os vizinhos: BOM (____) RUIM (____) SOBRE A LOCALIZAÇÃO DO EDIFÍCIO: O entrevistado gosta da localidade da sua habitação? SIM (____) NÃO (____) Considera BOM RUIM O atendimento de transportes públicos? O atendimento de serviços básicos como escolas, padarias, mercadinhos, farmácia, etc? Já tinha morado nesse bairro? SIM (____) NÃO (____) SOBRE A ARQUITETURA DO EDIFÍCIO: O que o entrevistado acha do: ÓTIMO BOM RUIM PÉSSIMO Tamanho da habitação: A subdivisão dos cômodos (2 quartos, sala, cozinha, banheiro): Qualidade da construção (acabamento e durabilidade dos materiais) Beleza das habitações (fachadas dos edifícios): Os equipamentos coletivos do condomínio Conservação do conjunto: Conservação da unidade: MUITO ÀS VEZES POUCO NUNCA Com que freqüência a família utiliza os equipamentos coletivos: Anexos _______________________________________________________________________ 290 ANEXO F: ROTEIRO DE QUESTÕES PARA A ENTREVISTA NA CEHAP ENTREVISTADO: __________________________________________________________________ FUNÇÃO DO ENTREVISTADO: _______________________________________________________ Este programa “Melhorias” corresponde apenas às melhorias nas unidades habitacionais já existentes ou também contempla com a construção de novas moradias? _________________________________________________________________________________ Qual a fonte de recursos do Ficam (Programa de financiamento da construção, conclusão, ampliação ou melhoria de habitação de interesse social)? _________________________________________________________________________________ Qual a fonte de recursos do Conso (Carteiras de Operações de Natureza Social)? _________________________________________________________________________________ Como funciona o financiamento “Terrenos próprios”? É de casas isoladas? _________________________________________________________________________________ Quais os bairros dos conjuntos? _________________________________________________________________________________ Os terrenos em que os conjuntos são construídos são do Governo do Estado? _________________________________________________________________________________