Nexus
da Relacionalidade do Princípio à
“Metafísica do Inominável” em
Nicolau de Cusa
José Teixeira Neto
SOBRE O LIVRO
O estudo em questão é o resultado da pesquisa desenvolvida
durante o Doutorado em Filosofia na Universidade Federal do
Rio Grande do Norte – UFRN, sob a orientação do Prof. Dr. Oscar
Federico Bauchwitz, com Estágio de Doutorando no Exterior
(com Bolsa da CAPES) na Universidade de Coimbra – Portugal
sob a orientação do Prof. Dr. João Maria André.
O título do livro, “Nexus: da Relacionalidade do Princípio
à ‘Metafísica do Inominável’ em Nicolau de Cusa”, procura dar
conta da tentativa de se interpretar a especulação cusana a
partir da busca pelo nome inominável do princípio primeiro
que transparece em todas as fases do pensamento do Cardeal
alemão, embora com nuanças diversas. A leitura das obras
do chamado “período tardio”, mostrou a necessidade de se
pensar o modo intenso e decisivo com o qual Nicolau de Cusa
(1401-1464) se propusera em suas últimas obras a buscar um
nome para nomear o princípio divino. Contudo, o presente
texto não pretende apenas destacar nessa questão quais os
modos do discurso humano ou quais os nomes divinos são os
mais adequados para dizer e nomear o princípio inominável
entre aqueles que Nicolau de Cusa ou retomou da tradição ou
concebeu tendo em vista o seu próprio caminho especulativo.
Mais do que isso, é necessário perguntarmo-nos fundamen-
talmente pela compreensão cusana do princípio primeiro e
como essa compreensão funda a possibilidade de se conhecer
e de se nomear, mesmo que inadequadamente, o princípio de
todas as coisas.
Oitavo campo – Nexo
Caçando agora no campo do nexo, descobrimos que o nexo
se constitui antes de toda divisão. Vemos que a eternidade
indivisível é o-que-pode-ser (quod esse potest), que precede ao
poder-ser-feito (posse fieri) e procede diretamente da unidade
eterna e da igualdade da unidade. Como a divisão procede da
pluralidade e da desigualdade, assim o nexo amoroso procede
da unidade e da igualdade da unidade. E porque na eternidade
indivisível e simples a unidade e a igualdade da unidade são
anteriores à pluralidade, também o nexo entre elas será eterno.
Portanto, a unidade, a igualdade gerada a partir da unidade e
o nexo de ambas, anteriores ao poder-ser-feito (posse fieri) e à
pluralidade divisível, são a eternidade simples. A unidade eterna,
a igualdade da unidade eterna, o nexo eterno entre ambas não
são eternos múltiplos e divisíveis, mas a própria eternidade não
multiplicável, indivisível e completamente inalterável.
Portanto, porque todas as coisas que são “são o que são”
a partir dessa trindade eterna – que é nomeada assim não
impropriamente –, vejo que imitam a trindade. Em qualquer
coisa vejo a unidade, a entidade e o nexo de ambas, de modo
que cada coisa seja em ato o que é: a entidade, que é a forma
de ser (forma essendi), é a igualdade da unidade. A unidade que
une, gera a partir de si a sua igualdade. A igualdade da unidade
não é senão a espécie ou a forma de ser (forma essendi) que é
chamada entidade, porque em grego “entidade” deriva de “uno”.
Tudo que existe não é outra coisa senão a unidade, a igual-
dade da unidade (que também é entidade) e o nexo de ambas.
A unidade é a constrição da fluxibilidade (fluxibilitatis constrictio);
a igualdade da unidade é a formação do unido e do constrito;
o nexo é a amorosa conexão de ambas. Se o poder-ser-feito
(posse fieri) não fosse constringido da sua confusa fluxibilidade
(confusa f luxibilitate) por um princípio unificante, não teria
nenhuma beleza, espécie ou forma. E, porque é constringido
pela unidade que faz todas as coisas segundo um fim, a própria
unidade gera a forma que tal constrição requer ou merece. Por
isso, da unidade e da forma procede o nexo amoroso de ambas.
De venatione sapientiae (cap. XXIV, n. 71, linhas 3-14;
n. 72, linhas 1-15)
SOBRE O AUTOR
José Teixeira Neto nasceu em Jardim de Piranhas – RN. Bacharel
em Filosofia – Faculdade Eclesiástica de Filosofia João Paulo II
da Arquidiocese do Rio de Janeiro (1994); bacharel em Teologia
– Ateneo Pontificio Regina Aposotolorum – Roma/Italia (1998);
mestre em Filosofia Sistemática pela Pontificia Univiversità
Gregoriana – Roma/Italia (2001) sob a orientação do Prof. Paul
Gilbert, SJ. Doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio
Grande do Norte – UFRN (2012) sob a orientação do Prof. Dr. Oscar
Federico Bauchwitz com Estágio de Doutorando no Exterior
(com Bolsa da CAPES) na Universidade de Coimbra – Portugal
sob a orientação do Prof. Dr. João Maria André. Desde 2004 é
professor do Curso de Filosofia, Campus Caicó da Universidade
do Estado do Rio Grande do Norte – UERN.
Reitora Ângela Maria Paiva Cruz
Vice-Reitor José Daniel Diniz Melo
Diretor da EDUFRN Luis Álvaro Sgadari Passeggi
Diretor Adjunto da EDUFRN Wilson Fernandes de Araújo Filho
Secretária da EDUFRN Judithe da Costa Leite Albuquerque
Conselho Editorial Luis Álvaro Sgadari Passeggi (Presidente)
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Nedja Suely Fernandes
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Secretária de Educação a Distância da UFRN Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo
Secretária Adjunta de Educação a Distância da UFRN Ione Rodrigues Diniz Morais
Coordenadora de Produção de Materiais Didáticos Maria Carmem Freire Diógenes Rêgo
Coordenadora de Revisão Maria da Penha Casado Alves
Coordenador Editorial José Correia Torres Neto
Gestão do Fluxo de Revisão Rosilene Paiva
Revisão Linguístico-textual Cristinara Ferreira dos Santos
Revisão Tipográfica André Soares
Leticia Torres
Renata Ingrid de Souza Paiva
Diagramação/Design Editorial André Soares
Anderson Gomes do Nascimento
Capa Anderson Gomes do Nascimento
AGRADECIMENTOS
À Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, pelo apoio
institucional e financeiro.
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior-
CAPES, pelo apoio financeiro (Processo: BEX 5134/09-9)
Ao Professor doutor Oscar Federico Bauchwitz, pela orientação,
diálogo sincero e incentivo.
Ao Professor doutor João Maria André, que me disponibilizou
sua biblioteca pessoal em Paradela da Cortiça/Portugal e, acima
de tudo, pela orientação durante os quatro meses que estive
em Coimbra/Portugal.
À Professora doutora Claudia D’Amico, pelo diálogo e incentivo.
Ao Pe. Edmundo Kagerer (Diocese de Caicó-RN), pela leitura
dos textos em alemão.
A Sra. Eugénia Simões Gonçalves, pelo cuidado e ajuda na
Biblioteca do Instituto Filosófico da Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra/Portugal.
Aos meus pais (in memoriam)
A Joselaide, esposa.
A Pedro Lucas e Laura Valentina, meus filhos.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
cp. – Cusanus-Portal.
h. – Edição Crítica de Heidelberge.
jh. – Texto latino do De ignota litteratura editado por
Jasper Hopkins.
nh. – Texto latino de Thierry de Chartres editado por
Nicolaus Häring.
s. – Edição bilíngue latim-italiano a cura de Giovanni
Santinello.
w. – Philosophisch-theologische werke.
Sumário
Apresentação
......................................................................................................14
1
À procura de uma interpretação
......................................................................................................24
1.1 Tradição, inovação e modernidade
da especulação cusana
......................................................................................................25
1.2 O verbo divino: eficácia e imprecisão
dos nomes humanos
......................................................................................................38
2
Contexto de questionamento e o horizonte
teológico-religioso medieval
......................................................................................................53
2.1 Mútuo entrelaçamento dialético e dinâmico
entre filosofia e teologia no pensamento cusano
......................................................................................................54
2.2 Especulação e conjectura
......................................................................................................76
3
Conjecturas sobre a unidade da
trinidade do princípio
......................................................................................................83
3.1 Unitas-Aequalitas-Conexio
......................................................................................................86
3.2 O Nexus como campo de caça no
De venatione sapientiae .............................................................90
3.3 De docta ignorantia: o máximo é
necessariamente trino
....................................................................................................112
3.4 O universo imita a trindade
....................................................................................................134
3.5 A mens, vis assimilativa, imita a trindade
....................................................................................................163
4
Os nomes divinos como enigmas
conduzem à unitrinidade do princípio
....................................................................................................186
4.1 Razão e nomeação
....................................................................................................186
4.2 Os nomes divinos e a unidade da trindade
do princípio
....................................................................................................202
4.3 O possest: nome divino que em si mesmo
indica o nexus
....................................................................................................223
Considerações finais
....................................................................................................244
Notas
....................................................................................................253
Referências
....................................................................................................412
APRESENTAÇÃO
O título deste livro, “Nexus: da relacionalidade do princípio à
‘metafísica do inominável’ em Nicolau de Cusa”, procura dar
conta da tentativa de se interpretar a especulação cusana a
partir da busca pelo nome inominável do princípio primeiro, que
transparece em todas as fases do pensamento do Cardeal alemão,
embora com nuanças diversas. A leitura das obras do chamado
“período tardio” mostrou a necessidade de se pensar o modo
intenso e decisivo com o qual Nicolau de Cusa (1401-1464) se
propusera em suas últimas obras a buscar um nome para nomi-
nar o princípio divino. Contudo, o presente texto não pretende
apenas destacar nessa questão quais os modos do discurso
humano ou quais os nomes divinos são os mais adequados para
dizer e nomear o princípio inominável entre aqueles que Nicolau
de Cusa ou retomou da tradição ou concebeu tendo em vista o
seu próprio caminho especulativo. Mais do que isso, é necessário
perguntarmo-nos fundamentalmente pela compreensão cusana
do princípio primeiro e sobre como essa compreensão funda a
possibilidade de se conhecer e de se nomear, mesmo que inade-
quadamente, o princípio de todas as coisas.
O livro está dividido em quatro capítulos. No primeiro,
denominado “A procura de uma interpretação”, destacaremos,
em um primeiro momento, que reconhecer que o fundamento
da metafísica cusana é uma certeza de fé só representaria um
dietro-front com relação à Modernidade que o autor parece
antecipar, caso estivéssemos pensando essa mesma metafísica
a partir de um determinado conceito de Modernidade. Além
disso, também buscaremos mostrar que esse reconhecimento
não deve apenas servir para ilustrar a situação epocal de
APRESENTAÇÃO
Nicolau de Cusa na sua ligação com a tradição cristã medieval,
impedindo-nos de ver o quanto ele “inova” a partir dessa
mesma tradição. Assim, por considerarmos que o Cardeal de
Cusa assume uma certeza de fé como fundamento e ponto de
partida para a sua especulação metafísica e que essa mesma
especulação ilumina essa certeza de fé, parece-nos razoável que
a especulação cusana possa inicialmente ser determinada como
uma “filosofia na Teologia” (PEREIRA, 2010).
Para corresponder a essa primeira intuição, escrevemos o
segundo capítulo, “Contexto de questionamento e o horizonte
teológico-religioso medieval”, no qual buscaremos aprofundar
essa disposição da especulação cusana. Assim, no primeiro
momento desse segundo capítulo intitulado “Mútuo entrelaça-
mento dialético e dinâmico entre filosofia e teologia no pensa-
mento cusano”, buscaremos compreender como a filosofia e a
teologia se articulam dialeticamente em um único pensamento
e como essa relação transparece da obra de Nicolau de Cusa.
No segundo momento, “Especulação e Conjectura”, concluire- 15
mos pela inutilidade das expressões construídas a propósito para
indicar o status teórico do pensamento cusano, pois nos parece
que os termos conjectura e especulação mostram, enquanto
termos propriamente cusanos, os aspectos mais genuínos do seu
pensamento (D’AMICO, 2003, p. 24).
Por sua vez, no segundo momento do primeiro capítulo
“O verbo divino: eficácia e imprecisão dos nomes humanos”,
mostraremos que a especulação sobre a inominabilidade divina
implica simultaneamente que o pensamento se volte para a
reflexão sobre a própria linguagem humana e que uma teoria da
linguagem que pretenda se fundar no pensamento cusano exige,
como as teses analisadas mostram, uma referência direta à teolo-
gia do Logos ou Verbo divino. Assim, a inominabilidade termina
por ser pensada na ótica dos limites e da força da linguagem.
O nome divino se mostra inalcançável para uma linguagem que
funciona nos limites da razão e da alteridade. Mas, essa mesma
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
relação das palavras humanas com o Verbo inefável pretende
mostrar o valor ou força das palavras que, apesar da sua impre-
cisão e limitação, exprimem de modo variado o Verbo divino do
qual procedem. Entretanto, considerando que o nome de Deus é
o próprio Verbo, ou seja, sua igualdade, (GONZÁLEZ RÍOS, 2010,
p. 182) e que, por isso, não existe distinção “entre aquilo que é
significado por meio do nome e o nome por meio do qual se signi-
fica”, questionamos: não deveríamos nos perguntar pelo lugar do
nexus como a conexão eterna entre o que é significado pelo nome
e o nome que significa que em relação ao divino é um e o mesmo?
No caso das coisas que recebem o nome pelo advento da forma à
matéria, não deveríamos nos perguntar por aquele movimento
que faz com que a forma e a matéria sejam o composto e que,
portanto, receba o nome que lhe é adequado, mesmo sendo
impreciso já que uma adequação precisa entre o nome e o que
é nomeado não é possível? Como se dá que um nome possa ser
o nome, mesmo que inadequado, do que se furta a todo nome?
O nexus que, se entendido como nexo do inteligente com o inteli- 16
gível e do amor amante com o amor amável, funda a possibilidade
de nomear, ainda que inadequadamente, o inominável pelo qual
o Verbum não é somente de Deus, mas é já sempre Deus.
Para responder a essas interrogações, escrevemos o
terceiro e quarto capítulos do nosso trabalho. No terceiro capí-
tulo, “Conjecturas sobre a unidade da trindade do princípio”,
principiaremos por mostrar que Nicolau de Cusa se apropria das
implicações matemáticas da tríade “Unitas-Aequalitas-Conexio”
que Thierry de Chartres havia desenvolvido na especulação
sobre a Trindade e recordaremos que o primeiro a perceber
essa referência de Nicolau de Cusa ao platonismo de Chartres
e especialmente a Thierry foi Pierre Duhem em um artigo
publicado em 1909. No segundo tópico do terceiro capítulo,
“O nexus como campo de caça no De venatione sapientiae”,
concluíremos a partir dessa obra que a unidade na Trindade é
pensada por meio dos trinômios unitas-aequalitas-conexio/nexus,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
indicando um diálogo ativo entre a revelação cristã e a tradição
“platônica” e neoplatônica, especialmente o neoplatonismo da
escola de Chartres. A conexio é, na eternidade simples, a eterna
indivisibilidade de unidade e igualdade do princípio fundante
e delas procede. Mas, também é o nexus amorosus do poder que
une o que no poder-ser-feito de todas as coisas permanece-
ria confuso, possibilitando a beleza de tudo o que vem a ser.
Também o nexo mantém as coisas naquilo que elas são, conser-
vando-as para que elas sejam e as conectando com a totalidade
do mundo. Sem o nexo que une, não teríamos um universo, mas
um caos de multiplicidade, alteridade, desigualdade e, portanto,
de divisão. Da mesma forma, esse mesmo espírito de conexão é
o que une a alma ao corpo, vivificando-os. No caso da natureza
intelectual, o nexo não somente a mantêm e a conserva, mas a
adapta para que ela possa unir-se àquilo que ela naturalmente
ama, ou seja, a sabedoria eterna. E como o entender vive dessa
eterna sabedoria, o nexo entre o inteligente e o inteligível do
intelecto não se expira jamais. 17
Nesse mesmo contexto será necessário demarcar de
modo mais específico a relação e a diferença entre o neoplato-
nismo e a posição que Nicolau de Cusa, no diálogo com a tradi-
ção tanto filosófica quanto teológica, ia assumindo. Pois, como
tentaremos mostrar, as discussões sobre o nexus no De venatione
sapientiae estão fundadas na ideia de que Nicolau de Cusa pensa
a unidade como uma unidade trina e, portanto, em si mesma
relacional. Além disso, também assumiremos que a unidade
da trindade é determinada neoplatonicamente e, por último,
sugeriremos que o vocabulário utilizado pelo Cardeal de Cusa é
tanto o da tradição teológica cristã quanto o do neoplatonismo
e que a unidade será pensada a partir do uno neoplatônico, mas
ao mesmo tempo a partir da doutrina cristã do Deus uno e trino.
A partir desses pressupostos, questionaremos: a compreensão
de um princípio fundante em si relacional se coaduna ou não na
especulação cusana com a concepção do uno de sabida influência
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
neoplatônica? Para responder a essa questão, tomaremos o De
principio como parâmetro e apresentaremos a crítica que Nicolau
faz a Proclo, pois, segundo ele, Proclo havia se equivocado ao
afirmar que muitas coisas seriam coeternas.
Retomando o caminho assumido ao interpretarmos o De
venatione sapientiae como um “repetir resumindo” o já pensado
sobre o nexus e, naturalmente, sobre a Trindade, perseguiremos a
ideia de que o mundo e o homem, enquanto são o que são a partir
da Trindade, imita-a. Por isso, nos tópicos “De docta ignorantia: o
Máximo é necessariamente trino”, “O universo imita a trindade”
e “A mens, enquanto vis assimilativa, imita a trindade” que são
respectivamente o terceiro, o quarto e o quinto momentos do
terceiro capítulo, mostraremos a partir do primeiro e do segundo
livro do De docta ignorantia e a partir do De coniecturis, Idiota de
sapientia I e, principalmente, a partir do Idiota. De mente em que
sentido o mundo ou universo e o homem imitam o quanto podem
a Trindade divina.
No quarto e último capítulo, “Os nomes divinos, enquanto 18
enigmas, conduzem à unitrinidade do princípio”, buscaremos
recuperar no primeiro momento as principais indicações das
obras de Nicolau de Cusa sobre a relação entre “razão e nomea-
ção”. Assim, acentuaremos que o De docta ignorantia apresenta as
perspectivas a partir das quais se pode elaborar uma metafísica
do inominável, já que o princípio da douta ignorância impõe que
se pode compreender de modo incompreensível e se nomear de
modo inominável o princípio primeiro e absoluto. Além disso,
também o De docta ignorantia aponta para a relação entre razão e
nomeação que será reafirmada em outros contextos e em outras
obras de períodos diversos.
Por sua vez, no De coniecturis, o Cardeal, de modo mais
preciso, determina as quatro unidades mentais (Deus, intelec-
to, razão e sentidos) e afirma que, para cada uma delas, existe
uma linguagem e um uso de termos adequados. Mas, se cada
unidade é ultrapassada tendo em vista o acesso a uma unidade
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
posterior até a “intuição” da unidade primeira, para além da
coincidência dos opostos, permanece que a linguagem mais
próxima para dizer o indizível é a linguagem da coincidência
pela relação de imagem que a mente ou intelecto guarda com
a mente infinita, embora se possa “intuir” um modo divino de
falar das coisas divinas. Por último, o Idiota. De mente e o capí-
tulo 33 do De vanatione sapientiae apontam para a insuficiência
dos nossos termos, mas também para a sua força quanto
buscamos nomear as coisas. Assim, embora não alcancemos o
nome preciso de cada uma delas, enquanto não conhecemos a
quididade das coisas, entretanto o nome imposto pela razão é
um nome conveniente em que, por sua vez, resplandece aquele
nome inefável que é o Verbo divino.
No segundo momento do quarto capítulo, “Os nomes
divinos como enigmas e o princípio unitrino”, será necessário
retomar a ideia de aenigmatica scientia do De beryllo a partir do
qual destacaremos a compreensão intelectual e expressionista
do princípio primeiro, o que permitirá recuperar nesse texto 19
tanto a ideia da relacionalidade interna do princípio quanto
a ideia de que o princípio se mostra no mundo e no homem.
Assim, puderemos compreender em que sentido será possível um
conhecimento enigmático ou simbólico do princípio unitrino.
Além disso, também destacaremos que, para Nicolau de
Cusa, a necessidade de um terceiro princípio para se pensar a
constituição das coisas e, a partir daí, também ver a trindade
do princípio simples não foi atingida nem por Aristóteles nem
por outros filósofos. Eles teriam falhado ao considerarem que
os princípios inerentes à substância eram contrários entre
si, e, dado que os contrários não coincidem, então, eles não
conseguiram chegar a uma correta compreensão de um terceiro
princípio certamente necessário. A partir do princípio lógico,
segundo o qual se nega que os contraditórios sejam ao mesmo
tempo verdadeiros, Aristóteles teria demonstrado que também
os contrários não poderiam ser simultaneamente verdadeiros.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
O berilo, entretanto, mostraria os opostos antes da sua duali-
dade, no princípio conectivo, ou seja, antes de esses opostos se
tornarem dois contraditórios e seria como se pudéssemos ver os
contrários coincidirem no seu grau mínimo. Assim, no princípio
da conexão também coincidiria, na simplicidade, os graus míni-
mos dos contrários. Mas, a “fidelidade” ao princípio da lógica
não permitiu que os filósofos chegassem ao terceiro princípio
necessário e, por isso, “todos os filósofos não souberam chegar
ao Espírito, que é o princípio da conexão e é, em Deus, a terceira
pessoa, segundo a nossa teologia perfeita”, como afirmava o
Cardeal de Cusa.1
Após as considerações do De beryllo (1458), numa sequên-
cia cronológica, discutiremos como o problema da inominabi-
lidade e da trindade do princípio reaparecem no De aequalitate
(1459) e no De principio (1459). Porém, antes de considerarmos
o De possest (1460) e, consequentemente, o termo possest como
nome divino que em si mesmo mostra a ideia de nexus e, por
isso mesmo, enigmática ou simbolicamente mostra o princípio 20
trino, inverteremos a ordem cronológica e apresentaremos
primeiramente as discussões do De non aliud (1462), por enten-
dermos que, nesse texto, a ideia do nome como enigma é clara-
mente tematizada.
Com isso, chegaremos ao terceiro momento do quarto
capítulo e, portanto, ao último momento do livro: “O possest:
nome divino que em si mesmo indica o nexo”. O caminho
percorrido conduziu à compreensão do princípio como unitri-
no e indicou que, sobre o fundamento da concepção trinitária,
poderíamos ver o princípio que se conhece a si mesmo por meio
do seu Verbo e que, por meio desse mesmo Verbo, se exterioriza
na criação. Contudo, o movimento do princípio sem princípio
para o princípio a partir do princípio é o nexus entre ambos.
Esse mesmo nexus possibilita que o amante possa ser amado
no amável, que o inteligente possa ser entendido no inteligí-
vel e que o princípio inominável seja nomeado no princípio
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
nominável, pois o objeto da vontade é o amor amável e do
intelecto é o inteligível e o nominável, afirma Nicolau de Cusa.
Assim, como o principiado ou causado tem tudo o que
é do princípio e da sua causa, de algum modo portanto, imita
o quanto pode o seu princípio simples. A partir da análise da
obra cusana nos capítulos anteriores, pudemos mostrar que o
universo, enquanto máximo contraído, imita contraidamente a
unidade e a trindade do princípio unitrino. Além disso, também
consideramos que a mente, enquanto imagem de Deus, imita a
trindade do princípio no seu dinâmico operar que se mostra no
posse assimilare, no posse assimilari e no nexus de ambos. Daí que
ser imagem não significa que a mente já é uma “cópia” perfeita
do seu princípio. Mas, a mente é imagem viva enquanto busca
assimilar-se cada vez mais ao seu exemplar. Como o princípio
é eterno e absoluto, o movimento da assimilatio não pode
terminar, pois a imagem somente encontra repouso naquilo do
qual é imagem. Da mesma forma, enquanto imagem da divina
complicação, a mente pode assimilar a explicação de todas as 21
coisas sendo, assim, antecipadamente a unidade de tudo aquilo
que ela mesma concebe. Esperamos, portanto, alcançar com o
possest aquele nome que, como os outros nomes divinos, condu-
zem à compreensão do princípio. Nesse caso, de modo mais
específico, acreditamos que o possest indica, enquanto enigma,
a trindade do princípio e, mais ainda, conduz o que especula
ao nexus que se mostrou como princípio fundamental para a
compreensão dessa mesma unitrinidade.
Dentre todas as obras cusanas, o termo “possest” apare-
cerá apenas em três textos do chamado “período tardio”.
As duas últimas aparições do termo em questão se dão no De
apice theoriae, provavelmente a última obra escrita por Nicolau
de Cusa. Por sua vez, no De venatione sapientiae, o possest será
considerado o segundo campo, logo após o da douta igno-
rância e antes do non aliud, no qual se dá a caça da sabedoria.
Um aspecto importante que lembraremos no contexto do
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
capítulo XIII do De venatione sapientiae é que aqueles que limitam
a caça de Deus ao âmbito do princípio “qualquer coisa é ou não
é” não puderam buscar a Deus dentro do campo do possest no
qual coincide o poder ser e o ser em ato. Assim, ao se pressupor
que toda busca se limite ao princípio de não contradição e que
não se pode buscar nada aquém da diferença dos opostos, não se
busca, portanto, a Deus que é mais antigo do que este princípio
e supera o seu campo.
Já no De possest, o momento que antecede o aparecimento
do termo “possest” dentro desse triálogo se conclui com as
seguintes afirmações de João, um dos interlocutores do Cardeal,
que consegue captar, segundo as palavras do próprio Nicolau de
Cusa, a raiz do que foi exposto: Deus é tudo, de modo que não
pode ser outro; Deus está em todas as partes, de modo que não
pode está em um lugar outro; é a medida mais adequada de todas
as coisas, de modo que não pode ser mais igual. Sendo assim,
João, então, conclui que se pode ver por esta via que Deus está
livre de toda oposição, que as coisas que parecem ser opostas, 22
nele são idênticas e que a negação não se opõe à afirmação.
Mas, a contemplação de tudo isso, tal como afirma o
Cardeal, uma contemplação que não é explicável em muitos
discursos, estaria complicada em uma brevíssima palavra.
O que Nicolau está buscando é um termo que possa significar,
de modo simples, a expressão complexa “posse est”, ou seja, que
possa significar que o próprio poder é. O possest, enquanto nome
divino, possui as mesmas características que outros nomes divi-
nos. Assim, ele deve conduzir aquele que especula por sobre os
sentidos, a razão e o intelecto à visão do princípio. No De possest,
o nome divino conduz aquele que busca a verdade à visão místi-
ca na qual, terminada a ascensão das forças cognitivas, começa
a revelação do Deus desconhecido. A ascensão para além das
coisas, para além das nossas capacidades cognitivas e de nós
mesmos nos revela que não existe mais nenhum modo de apro-
ximação ao que permanece invisível, inascecível e inominável.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
APRESENTAÇÃO
Aqui existe uma tênue, mas clara separação entre o que alcan-
çamos com as nossas próprias forças e o que desejamos que de
fato ocorra. Terminado todo o caminho aproximativo, o que nos
resta é esperar que o Deus desconhecido e invisível se revele e
apareça, destruindo as trevas que o esconde, de tal modo que
possamos ver o invisível no modo como ele pode se manifestar.
23
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
1 À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
A filosofia de Nicolau de Cusa termina por não figurar nas
grandes sínteses da história da filosofia ocidental. Algumas ou
fazem apenas uma breve referênica ou até mesmo o esquecem.
Mais ainda, para Gadamer (1964, p. 929), “Nicolau de Cusa é uma
descoberta tardia da nossa consciência histórica”2. Talvez por
isso, quando nos aproximamos do seu pensamento, quase sempre
nos preocupamos em determinar o espaço que certamente lhe
seria devido nessa história. Assim, buscamos em suas obras os
temas, temáticas e conceitos mais significativamente filosóficos
para ver como os mesmos funcionam tanto em relação à Idade
Média quanto em relação à Modernidade. O esforço empenhado
na fixação de uma demarcação histórica terminou por cunhar
diversas metáforas quase todas elas determinadas pelo “proble-
ma do conhecimento”, que surge do De docta ignorantia, sua
primeira grande obra de espessura filosófica, e da sua doutrina
da mente como imago Dei. Algumas delas reconhecem Nicolau
como o “primeiro dos modernos” ou o “último dos medievais”.
Outros viram nele um pensador de fronteira ou um pensador
de tempos de crise e a sua filosofia foi vista como “uma forma
prévia” da moderna metafísica do conhecimento, cujo funda-
mento é a questão da subjetividade. Pretendemos no que segue
explorar alguns desses ensaios de demarcação na tentativa de
pensar os seus limites quando pleiteiam fixar historicamente
o pensamento cusano. A história das interpretações do pensa-
mento do Cardeal alemão já está bastante documentada3 e essa
história, de certa forma e em certos aspectos, confunde-se com
a história da redescoberta de um autor esquecido4.
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
Tomaremos como ponto de partida duas interpretações
que se destacam, especialmente, por chamarem a atenção da
filosofia contemporânea para o pensamento cusano. Essas inter-
pretações pretendem reconhecer certos aspectos na filosofia de
Nicolau de Cusa que fariam dele um precursor da Modernidade
e da sua filosofia uma forma prévia da moderna metafísica do
conhecimento. Contudo, esses mesmos autores reconhecem que
ele permanece ligado aos problemas centrais da filosofia medie-
val. Referimo-nos as interpretações de Cassirer (1953, 2001) e
de Volkmann-Schluck (1993). Acreditamos que essas duas
interpretações nos indicarão que a compreensão que buscamos
da metafísica cusana não se dará insistindo no supostamente
novo da sua especulação e na relação de Nicolau com a filosofia
que lhe é posterior, mas na sua vinculação a uma determinada
tradição filosófica e teológica.
1.1 TRADIÇÃO, INOVAÇÃO E MODERNIDADE 25
DA ESPECULAÇÃO CUSANA
Já no início do século XX, Cassirer5 havia afirmado que
o fundamento do juízo que considera Nicolau de Cusa como
“[...] o fundador e o antecipador da filosofia moderna [...]”
não pode ser a “[...] peculiaridade e o conteúdo objetivo dos
problemas que em sua doutrina se expõem e se desenvolvem”.
Segundo este autor, encontramo-nos aqui diante dos mesmos
problemas que preocuparam a Idade Média e a sua filosofia,
“[...] brota e se desenvolve em torno dos problemas da cristo-
logia, em torno dos problemas da Trindade e da Encarnação”
(1953, p. 65). Entretanto, ele salienta, que:
O característico da posição histórica do sistema é que não
se orienta diretamente para o novo conteúdo, mas que
introduz na mesma matéria tradicional uma mudança e um
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
desenvolvimento que a faz exequível às exigências de um
novo modo de pensar e de uma nova colocação do problema
(1953, p. 65).
Para Cassirer, portanto, o novo não se encontra nos
problemas e nos conteúdos, mas em uma teoria do conhecimen-
to que faz do Cardeal alemão um “antecipador” das temáticas
modernas.6 O que faz da “[...] teoria cusana a antessala e o arqué-
tipo da filosofia do Renascimento” é, segundo Cassirer (1953, p.
67), o fato de “[...] junto à tendência de manter o ser divino em
sua pureza isenta de toda mancha” destacar-se nela a tendência
de “compreender o ser individual em seu valor próprio e de
afirmá-lo em sua particularidade finita”. Nesse sentido, Cassirer
(1953, p. 69) falará de uma “mutação da teoria de Deus” na
filosofia cusana, mutação essa cuja importância se encontra
no fato de manifestar e espelhar “[...] o conceito fundamental
da teoria do conhecimento de Nicolau de Cusa: o conceito da ‘docta
ignorantia’”, que será compreendido por ele como sendo “[...] a
abolição da pretensão absoluta do conhecimento, como uma 26
barreira posta à experiência humana e ao conceito de homem”.
No que se refere à atitude fundamental da “época
moderna”, ou seja, a imanência do objeto em relação ao sujeito
cognoscente e a compreensão do processo de conhecimento
como um processo interminável, já se encontram, segundo
Cassirer (1953, p. 72), em germe na filosofia de Nicolau de Cusa,
pois o mesmo sublinha, por um lado, o caráter ilimitado do
processo do conhecer e, por outra parte, que o conhecimento
não faz senão “desdobrar e desenvolver” o que já possuímos.
Tal atitude (CASSIRER, 1953) se encontra exposta no seguinte
passo do De visione Dei:
É, com efeito, invadido de uma alegria muito maior quem
encontra um tal tesouro que sabe totalmente inumerável e
infinito do que quem encontra um numerável e finito. Por
isso, esta sacratíssima ignorância da tua grandeza é o alimento
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
mais desejável do meu intelecto, sobretudo quando encontro
assim um tal tesouro no meu campo por esse tesouro ser meu.7
Será uma “transformação histórica interna” e que será
repetida em outros lugares, argumenta ele: Idiota, De sapientia lib.
I; De beryllo, cap. XXX; De venatione sapientiae, cap. XII. De modo
geral, portanto, Cassirer (1953, p. 97) considera que o alcançado
na filosofia moderna, de certa forma antecipado na filosofia
cusana, e que diferencia com a Idade Média, encontra-se no fato
de que, enquanto esta colocava a “[...] meta de todo saber em
um ser situado mais além [...]”, aos poucos vai amadurecendo
“[...] o conhecimento de que é o conteúdo imanente da cons-
ciência da humanidade e somente ele que luta por voltar à
claridade no transcurso da história do espírito”8.
A tese de Cassirer, motivada por um interesse moderno do
problema da teoria do conhecimento9, não forneceria, porém,
segundo Volkmann-Schluck (1993, p. 21), “[...] um modelo para
a metafísica de Nicolau de Cusa”. Ele resume os pontos chaves da 27
apresentação de Cassirer: a douta ignorância interpretada como
problema gnosiológico, a doutrina da autoprodução da mens
do homem partindo da sua própria unidade como uma forma
que precede a apercepção transcendental de Kant, o pensar
por meio de símbolos matemáticos como ideia que antecede a
ciência moderna e o início de uma doutrina da individualidade
humana como um microcosmo que é significativo para uma
investigação do renascimento em termos de ciência do espírito.
Entretanto, salienta Volkmann-Schluck (1993), Cassirer não
teria sido capaz de “acolher” a densidade filosófica da posição
metafísica de fundo de Nicolau de Cusa, já que essa não interes-
sa à problemática moderna. Assim, a Modernidade teria conse-
guido se liberar dela e a teria relegado à pesquisa de história
da filosofia, que ainda não teria olhado para a tarefa filosófica
nem poderia resolvê-la em relação ao pensamento cusano:
essa tarefa “[...] consiste em permitir que o que Nicolau de Cusa
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
pensou alcance o nosso pensamento na luz dos seus próprios
pensamentos de fundo” (1993, p. 21-22).
A tese central de Volkmann-Schluck em relação à filosofia
cusana é a de que o Cardeal “[...] pensa o ente a partir do ser
visto como unidade infinita” (1993, p. 24). Entretanto, a intenção
cusana não é subverter a tradição, mas recuperar o que faltava
à própria tradição: o desenvolvimento da ideia de infinitude de
Deus liberada das barreiras da filosofia antiga, de modo que o
mundo e o homem pudessem ser vistos na sua verdade metafí-
sica. O mais surpreendente nesse processo da filosofia cusana é
que nele um evento acontece:
do pensamento que se volta para fora, em direção ao
ser como unidade infinita, resulta por contragolpe um
retorno do homem sobre si mesmo, que se torna o fim
do pensamento medieval e prepara indiretamente o
modo de pensar moderno10 (1993, p. 25).
Todavia, Volkmann-Schluck (1993, p. 27-28) reconhece 28
que tanto o ponto de proveniência, aquele do qual se destaca este
pensamento em traspasso, como aquilo ao qual ele traspassa,
são em certa medida conhecidos, mas o mais difícil é determinar
a própria passagem e onde essa acontece.
O texto de Volkmann-Schluck que estamos analisando
divide-se em cinco partes: a primeira e a segunda são dedica-
das à metafísica (Deus, mundo e homem) presente no De docta
ignorantia. A doutrina sobre o homem, no terceiro livro do De
docta ignorantia, conduzirá à doutrina da mens (Terceira parte).
A quarta parte, centrada na interpretação do De beryllo, está
dedicada a uma repetição do esquema metafísico fundamental
do De docta ignorantia, mas agora pensado a partir de uma nova
concepção sobre a substância e a species (SANTINELLO, 1993,
p. 12)11. Tanto o título do De beryllo quanto aquele do De docta
ignorantia indicariam “[...] aquele modo de considerar as coisas,
a partir do qual se pensa”. Entretanto, no De beryllo, o olhar de
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
Nicolau de Cusa estaria voltado totalmente para a mens como
perspectiva-guia (VOLKMANN-SCHLUCK, 1993, p. 155). A quinta
parte é a resposta, segundo Santinello (1993, p. 13), à seguinte
questão: “Qual lugar ocupa esta ontologia cusana na história
do pensamento?”. Tendo em vista o que estamos discutindo,
vamos considerar mais de perto essa última parte.
A ideia central de Volkmann-Schluck (1993, p. 215) é a de
que o pensamento cusano “[...] se apresenta como um singu-
lar entrelaçamento de ressonâncias do ântico e ouverture do
novo”; ou, tal como ele havia afirmado na introdução, a de que
“Nicolau de Cusa conduz o pensamento medieval a sua conclu-
são [...]” e guia “[...] o conjunto da tradição a traspassar no modo
de pensar moderno” (1993, p. 21). Portanto, esse é, segundo o
autor, o “ponto justo” no qual deve ser colocado o pensamento
cusano: um pensamento que resume e conclui uma época, mas
que ao mesmo tempo coloca os fundamentos para uma nova
época que está começando12. Mas, se é difícil determinar a
própria passagem e onde essa acontece, parece que os vestígios 29
dessa mudança de época podem ser ao menos vislumbrados.
Porém, assegura o autor que apesar da nova posição de
fundo que o homem assume no Renascimento, este permanece,
na sua essência, “fundamentalmente platônico-cristão” (1993,
p. 224). Isso significa que o Renascimento carrega em seu bojo
uma contradição que marca a falta de “solidez duradoura” de
uma época que fundamenta o mundo sobre a natureza humana,
mas que mantém a infinitude como traço característico do ser.
Nesse sentido, é compreensível quando Volkmann-Schluck
(1993, p. 223) afirma que o Renascimento carrega em si os
motivos do seu tramontar. O fundamento histórico dessa
contradição, característica do Renascimento, é a doutrina da
mens de Nicolau de Cusa pensada na totalidade da sua metafí-
sica (1993, p. 214). Ora, considerando que, em Nicolau de Cusa,
o pensamento que pensa fora de si a infinitude como traço
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
característico do ser volta-se, ao mesmo tempo, para si mesmo,
tendo em vista que, por ser infinito, o ser é incompreensível
em si e, por isso, aparece apenas na imagem de si que é a mens,
Volkmann-Schluck conclui que (1993, p. 212)
[...] os entes no mundo se tornam acessíveis somente pelo
fato de que a mens torna visível nele a unidade por meio da
autorrepresentação. Conhecer significa agora reconduzir as
coisas naquela imagem que a própria mens é.
Tendo assim interpretado o Renascimento e o seu funda-
mento histórico, o autor passa a considerar o passo decisivo para
o início da metafísica moderna. Para ele, esse passo é simples
e bem conhecido desde muito tempo. Tem a ver não somente
com uma compreensão que coloca a mens humana no centro,
mas que a põe como fundamento, na medida em que o seu ver
[...] torna-se um ver consciente de si, a partir do qual unica- 30
mente e somente depende o fato de que esse seja consciente
do próprio objeto visto e de tal modo consciente de si mesmo.
Somente um tal ver é considerado por Descartes conhecimen-
to. (VOLKMANN-SCHLUCK, 1993, p. 225).
Essa transformação, ou seja, a mente que se reporta ao seu
fundamento, o ser como unidade infinita, do qual ela é imagem e
a mente que agora olha para si mesma e torna-se fundamento
do próprio conhecimento “encontra expressão, nas palavras
de Volkmann-Schluck, ali onde a similitudo de Nicolau de Cusa,
ou seja, a autorrepresentação da mens, torna-se perceptio”: em
Descartes. A aproximação a essa mudança se dará pela contrapo-
sição entre a aenigmatica scientia de Nicolau de Cusa e a mathesis
universalis de Descartes (1993, p. 225)13.
Seguindo ainda o caminho aberto por Volkmann-Schluck,
gostaríamos de tocar “o fundamento do processo que conduz
o pensamento à idade moderna”, ou seja, como indica o título
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
do terceiro capítulo da quinta e última parte: o fundamento
do traspasso (1993, p. 237). O nosso objetivo neste parágrafo
é apenas acentuar o fundo da metafísica cusana e, ao mesmo
tempo, o que a idade moderna deixa de lado. O problema tratado
no capítulo é, portanto, o indicado na questão: como se chega
ao início da Modernidade, quando a mens se mostra como visão
autoconsciente? A aproximação ao questionado na pergunta
acima se fará por meio de duas indicações de Nietzsche.
De modo especial seguindo a indicação de que o século XVII
sofreria em relação ao homem, assim como em relação a uma
soma de contradições. Nessa indicação, Nietzsche nomeia a
necessidade que conduziu o homem à sua posição frente à razão
fundada em si mesma (1993, p. 240).
A ideia do autor será a de perseguir a origem dessa neces-
sidade que, para ele, deve ser buscada em Nicolau de Cusa e na
sua doutrina da mens como imago Dei, que, como ele esclarece,
não se baseia no pensamento metafísico de origem grega, mas
na fé hebraico-cristã sobre a criação. O homem torna visível a 31
unidade infinita no movimento incessante e contínuo do conhe-
cimento. Mas, pergunta-se Volkmann-Schluck, e quando essa
fé se torna facultativa para a definição metafísica do homem?
Então aquele poder-ser-tudo da mens que a fazia imago Dei se
impõe como uma soma de contradições que dilacera o homem
em todas as direções. Agora, a tarefa que se impõe é buscar
“o fundamento para uma possível certeza” (1993, p. 241).
Perseguindo esta ideia, estamos aqui tentando tocar o
fundamento que se encontra na base da concepção metafísica
cusana. Para Volkmann-Schluck, “a metafísica cristã da Idade
Média foi continuamente guiada por certezas de fé” (1993, p.
247). Nicolau de Cusa estaria no fim desse processo, fundando a
metafísica sobre a mens como imago Dei. Nesse sentido, o autor
fala de um “dietro-front” na doutrina de Nicolau, ou seja, de certa
forma adianta-se em relação à metafísica medieval, mas volta
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
para aquele mesmo fundamento. Assim, ele se encontra naquele
mesmo horizonte que surge quando
[...] a reflexão filosófica encontrou-se em condições de supor-
tar a exigência de ter que pensar o ser em conformidade às
verdades da fé cristã, e desde quando, vice-versa, a teologia
procurou colher estas verdades em conceitos metafísicos [...]
(1993, p. 245).
Resumindo, portanto, teríamos que a aenigmatica scientia
se baseia na concepção da mens como representação da unidade,
ou seja, imagem de Deus. Todavia, essa concepção da mente não
é ela mesma metafísica, mas “[...] precede toda interpretação
metafísica e se funda em uma certeza de fé [...].” (1993, p. 247).
Dessa forma, o fundamento da verdade que se pode conhecer é
uma certeza de fé, que a tudo sustenta, sobre o homem como
imagem de Deus. Assim, na medida em que a interpretação dos
entes acontece numa perspectiva que olha para a mens, “[...] esta
certeza sustenta também a metafísica de Nicolau de Cusa no 32
todo” (1993, p. 247)14 .
Nessas teses defendidas durante todo o século XX,
percebemos que o foco principal se coloca sob um determinado
conceito de Modernidade e que, olhando para trás, julga a filoso-
fia cusana como uma antecipação das temáticas que aparecerão
em Descartes e Kant a partir da passagem de uma metafísica
do ser para uma metafísica da subjetividade. Neste sentido,
busca-se julgar a sua filosofia como forma antecipadora, prévia
ou como estando ligada à Idade Média nos problemas, mas à
moderna pela forma como Nicolau aborda essas problemáticas.
Pensamos que, mesmo naquele aspecto mais saliente da filosofia
moderna, o problema do conhecimento, não é simples aproxi-
mar o pensamento cusano do pensamento filosófico moderno.
Nesse sentido, cremos que o aspecto gnosiológico presente no
De docta ignorantia não deveria levar simplesmente a ver Nicolau
como sendo um autor moderno ou, tal como afirma André,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
a considerar o seu pensamento como “uma forma prévia da
metafísica moderna”15.
Em um artigo publicado em 198616, André (1986, p. 373)
situava a “douta ignorância” de Nicolau de Cusa “[...] como uma
reflexão sobre o sentido do discurso filosófico, motivada pela
crise da escolástica nos fins da Idade Média”. Essa perspectiva
o levará a sustentar um “primado da questão do sentido sobre a
questão do ser” e, por isso, assumirá que talvez a originalidade
cusana e o modo como ele se posiciona em relação à tradição
se encontre no fato de que o seu discurso filosófico pode ser
visto como uma filosofia da interpretação (1986, p. 373)17. Portanto,
para ele, um equacionamento do pensamento cusano não se
resumiria simplesmente a sublinhar a “[...] passagem de uma
metafísica do ser para uma metafísica do sujeito [...]”, mas seria
indispensável “[...] determinar as suas motivações e as coor-
denadas [...]” em que esse pensamento “[...] se exprime ou que
subjazem à sua progressiva adoção”. Para realizar esta tarefa,
algumas perguntas se imporiam: em qual tradição Nicolau de 33
Cusa se movimenta? Dentro dessa tradição, quais as linhas de
pensamento que mais influíram na sua reflexão filosófica? Quais
os seus interlocutores, ou seja, com quem dialogou, de quem
se apropriou e com quem polemizou? (ANDRÉ, 1986, p. 370).
André indica quatro tendências que, segundo ele, confluem no
pensamento cusano: o pensamento místico e neoplatônico da
escola dos Irmãos da Vida Comum de Deventer17, o ockhamismo
de Heidelberg, o humanismo italiano de Pádua e o tomismo e o
albertismo de Colônia, e conclui que, tendo em vista esse conta-
to com diferentes linhas de pensamento, “[...] a problemática
fundamental que se abre é efetivamente a do sentido do discurso
filosófico” (1986, p. 372). Portanto, só no aprofundamento dessa
questão essencial é que o problema dos limites do conhecimento
humano e a consequente discussão sobre a essência da mente
se justificariam e se poderia falar “[...] do deslocamento de uma
metafísica do ser para uma metafísica do sujeito” (1986, p. 373)18.
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
Uma década mais tarde, André (1997, p. 45) assumirá
como uma das dificuldades internas para a interpretação do
pensamento cusano justamente a sua “situação epocal”. Na clari-
ficação dessa problemática, é “[...] um lugar comum afirmar que
ele se situa na fronteira de dois mundos ou no limiar entre duas
épocas históricas”. A questão, levantada pelo o autor, refere-se
às divergências que surgem quando se pretende esclarecer e
explicar essa expressão. Se por um lado alguns o veem “[...] mais
do lado da Medievalidade do que da Modernidade [...]”, como H.
Blumenberg que pelas “[...] referências teológico-religiosas [...]”
afirma ser o Cardeal de Cusa “[...] ainda profundamente marcado
pelo mundo medieval”, outros, sem abandonar essa situação,
o reconhecem como “[...] o primeiro de todos os Modernos”.
Entre os defensores da segunda posição, André (1997, p. 46)
reconhece Volkmann-Schluck e W. Schulz que seguem a via
aberta por Cassirer numa dupla direção. O primeiro
[...] situa na concepção de mente humana de Nicolau de Cusa e 34
no seu aprofundamento filosófico da matemática o momento
mais significativo da passagem de uma metafísica do ser para
uma metafísica do sujeito que encontraria na ‘mathesis’ carte-
siana a sua primeira tematização.
O outro pretende que o conceito cusano de “[...] Deus
como subjetividade absoluta constitui verdadeiramente o
início da metafísica moderna”. De acordo com o juízo de
André, qualquer uma das duas posições possui um “caráter
reducionista”. Portanto, seria preciso “[...] situar Nicolau de
Cusa no seu tempo [...]”; e daí a necessidade de reconhecer
que ele está ligado à tradição, quando pretende responder às
questões que filosoficamente a sua época colocava “a partir dos
instrumentos conceituais de que dispunha [...]”, mas abre novos
caminhos quando, na elaboração dessas mesmas respostas, redes-
cobre alguns instrumentos conceituais. Para André (1997, p. 47)
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
“[...] só neste pleno respeito à sua situação de fronteira será possível
captar a sua originalidade e a singularidade do seu pensamento”.
Além dessas posições, outros pretendem situar Nicolau
de Cusa em plena Medievalidade. Em primeiro lugar, para
D’Amico (2007, p. 24)19, deve-se considerar que o pensamento
cusano se inscreve dentro da problemática de um pensador
medieval, mais precisamente de um neoplatônico medieval,
pois, para ele, a verdade absoluta representa “[...] um princí-
pio negativo inalcançável mediante a especulação racional”.
Nesse sentido, a mesma autora afirma que
O homem cusano não é aquele que se propõe analisar os
limites de suas faculdades cognoscitivas, mas aquele ao qual
seu próprio modo de operar cognoscitivo lhe confirma aquilo
que, de alguma maneira, pré-conhece: a infinita inacessibili-
dade da Verdade.
Na mesma direção também temos Cuozzo (2002, p. 13)20
que, citando, entre outros, G. Santinello, E. Vansttenberghe, 35
E. Cassirer, J. Übinger, K.H. Volkmann-Schluck e K. Jaspers, se
recusa a aceitar a denominação de Nicolau como “precursor
do pensamento moderno” ou como “pensador de transição”.
Ele defende que
A relação razão-fé, intelecto-graça, filosofia-revelação consti-
tui o entrelaçamento conceitual inseparável que faz de Nicolau
de Cusa [...] ao mesmo tempo um pensador tradicional, ligado
ao platonismo Cristão e à escolástica medieval, e um pensador
que atua nesta mesma tradição de um modo profundamente
inovador (2002, p. 13).
E, mais adiante, ele conclui que, contra qualquer leitura
modernizante do seu pensamento, Nicolau parece encontrar
justamente na transcendência ou no mistério insondável do divi-
no, admitidos com anterioridade a qualquer pesquisa filosófica,
a causa do limite intrínseco e do caráter aproximativo ou
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
conjetural daquele impulso indefinido no qual se explica o
poder de indagação de toda a ciência humana (a venatio sapien-
tiae de Nicolau de Cusa).
Entretanto, extremamente instrutivas e fundamentais
para a nossa própria posição são as teses defendidas por
Beierwaltes (2005)21. Segundo ele, a demarcação dos limites
históricos, a partir dos quais os conceitos de fronteira, limiar
ou umbral poderiam se tornar operativos, “[...] não podem ser
concebidos como um limite claramente fixado”. Isso significa
que as tentativas de “[...] uma delimitação epocal nítida e
supostamente unívoca se evidencia [...] como uma ficção histo-
ricista” (2005, p. 49). É nesse sentido que se justificaria pensar
a relação entre o novo e o antigo, entre a tradição e a inovação
ou entre descontinuidade e continuidade a partir de uma
“[...] inter-referência dialética do antigo com o novo e do novo
com o antigo” (2005, p. 50) e, portanto, “na determinação do
‘começo’ da época da ‘Modernidade’”, afirma Beierwaltes
(2005, p. 49), ele segue a tese de que, nela, “[...] deve-se pensar 36
a continuidade com a tradição filosófica apesar de e na descon-
tinuidade”. A partir dessas perspectivas compreende-se que ele
(2005, p. 47) se oponha a determinadas metáforas que fazem
de Cusano um precursor da Modernidade, ao acentuar o que,
“[...] supostamente ou também realmente futurista [...]”, se
encontra na sua especulação. Beierwaltes (2005, p. 48) deter-
mina a sua atitude como um opor-se “[...] à sede de atualização
otimista com o progresso, como se só o ‘novo’ fosse melhor e
digno de considerar no antigo [...]” e como um opor-se decidido
à “obstinação pela novidade” que prejudica Nicolau de Cusa
e “[...] o priva da sua própria palavra”22. Para tentar mostrar
como essa “inter-referência dialética” ocorre no pensamento
de Nicolau de Cusa e como este reelabora produtivamente23 a
tradição, Beierwaltes se concentra sobre “a busca do uno” no
pensamento cusano24.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
A partir do quadro de demarcação epocal e das conse-
quentes críticas levantadas anteriormente e dentro dos
limites pretendidos em nossa pesquisa, parece-nos bastante
iluminador pensar que Nicolau “inova a partir da tradição”
(BEIERWALTES, 2005). Acreditamos, assim, que a relação entre
Nicolau de Cusa e uma determinada tradição do neoplato-
nismo medieval nos conduzirão a ver que o fundamento da
metafísica cusana se deixa compreender a partir de uma
compreensão unitrinitária do divino. Assim, o reconheci-
mento de que o fundamento da metafísica cusana é uma
certeza de fé só representará um dietro-front, caso estejamos
pensando essa mesma metafísica a partir da Modernidade.
Também esse reconhecimento não deveria apenas servir
para ilustrar a situação epocal do Cardeal de Cusa na sua
ligação com a tradição cristã medieval, impedindo-nos de
ver o quanto ele “inova” a partir dessa mesma tradição.
Se Nicolau assume uma certeza de fé como fundamento e
ponto de partida para a especulação metafísica e se essa mesma 37
especulação ilumina essa certeza de fé, então nos parece que a
especulação cusana poderia ser determinada a partir daquela
relação entre fé e razão que os grandes filósofos e teólogos
medievais souberam tão bem manter nos seus pensamentos
e que em Nicolau poderíamos chamar, a princípio, de uma
filosofia na Teologia25.
A tarefa que se abre é permitir que a compreensão cusana
do princípio fundante nos alcance no pleno respeito ao seu
pensamento e à sua palavra. Permitiremos que essa compreen-
são chegue até nós por meio do que chamamos “metafísica do
inominável” e que corresponde a perguntar de que modo pode-
mos nomear o que escapa a todo nome. A nossa especulação
se sustenta na certeza de que o princípio se deixa nomear de
modo inominável, assim como se deixa ver de modo invisível no
mundo e no homem; e isso corresponde a supor que os nomes
divinos manifestam, como o mundo e o homem, a unitrinidade
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do princípio fundante. Daí que seria possível recuperar uma
compreensão cusana do princípio através dos nomes enigmáti-
cos que nomeiam não nomeando, mas indicando o caminho para
uma compreensão enquanto buscam dizer o que em todo nome
permanece não dito. No que se segue pretendemos apresentar
algumas discussões a partir das quais podemos introduzir alguns
problemas sobre a teoria do nome em Nicolau de Cusa.
1.2 O VERBO DIVINO: EFICÁCIA E IMPRECISÃO DOS
NOMES HUMANOS
Na segunda metade do século XX, Gadamer (1964, p. 934)
havia sublinhado que existem três problemas metafísicos para
os quais Nicolau de Cusa busca uma resposta: o problema do
panteísmo, a semelhança do espírito humano com o divino e o
ser enquanto palavra. Entre essas três questões que ainda tocam
muito de perto a filosofia contemporânea, assegura Gadamer, a 38
terceira é uma tarefa não totalmente resolvida pelos intérpretes
da filosofia cusana. Assim, tendo em vista que, com a “metafísica
do inominável”, também pretendemos pensar que os nomes,
enquanto enigmas do princípio fundante, não podem deixar de
indicar a trindade desse princípio tal como ele mesmo se mostra
trino no mundo e no próprio homem, retomaremos algumas
discussões sobre o problema da nomeação e a sua vinculação na
especulação cusana com as constantes tentativas de se nomear
a Deus. Não pretendemos com isso afirmar que o problema da
linguagem na especulação cusana se resuma ao problema da
denominação, nem pretendemos afirmar que existe uma filoso-
fia da linguagem no seu pensamento26. No entanto, parece que
podemos assumir como ponto de partida a perspectiva adotada
por González Ríos (2010, p. 15) de que seria
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
[...] lícito recompor através de certos elementos [do sistema
cusano] uma teoria cusana da linguagem na qual se evidencie a
função sistemática que adiquire a linguagem em sua teologia
especulativa [...].
Essa problemática se insere como uma discussão prévia
em nossa própria pesquisa, tendo em vista que buscaremos
mostrar, em um segundo momento, a partir, principalmente,
do De possest, como os nomes enigmáticos também manifestam
a unitrinidade do princípio primeiro.
Como à especulação da incompreensibilidade e da incog-
noscibilidade de Deus se segue um exame das dimensões cognos-
citivas da mente humana, da mesma forma à especulação sobre a
inominabilidade de Deus é acompanhada de uma reflexão sobre
os limites e possibilidades da linguagem humana. As teses que
proporemos em seguinda mostram que, em Nicolau de Cusa,
a sua especulação sobre a linguagem se vincula e se funda na
Teologia do Logos: Deus se revela como criando pela Palavra. 39
Entretanto, apesar de a trindade do princípio fundante estar
sempre pressuposta nessas discussões, tendo em vista que a
Palavra é a segunda dimensão trinitária, não se dá atenção à
terceira dimensão trinitária, isto é, ao nexus que, se entendido
como nexo do inteligente com o inteligível e do amor amante
com o amor amável, funda a possibilidade de que o intelecto
humano possa compreender e nomear, ainda que inadequada-
mente, o inominável. Ou seja, embora se pressuponha o movi-
mento intratrinitário de autorreflexão, a atenção não se volta
para o movimento pelo qual o Verbum não é somente de Deus,
mas é já sempre Deus.
Tomemos como ponto de partida a avaliação estabe-
lecida por González Ríos (2010) sobre os autores que, dentro
ou fora dos estudos cusanos, reconheceram ou analisaram os
problemas da linguagem no pensamento de Nicolau de Cusa.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
Segundo González Ríos (2010, p. 265), Gadamer está entre
os autores que souberam reconhecer “[...] a centralidade da
doutrina do Logos ou Verbum no desenvolvimento da metafísica
ocidental”. No caso de Gadamer, apesar de ter reconhecido “[...]
a centralidade da doutrina do Verbo divino na história filosó-
fica da linguagem, [...]” e de aqui reconhecer a importância de
Nicolau de Cusa, falta-lhe, contudo, “[...] um exame exaustivo
do problema da linguagem no pensamento cusano”. De modo
especial, falta a Gadamer uma discussão sobre “[...] os nomes
enigmáticos, tão decisivos para a compreensão da função siste-
mática da palavra no pensamento de Nicolau de Cusa” (2010, p.
266). Por outro lado, no campo dos estudos cusanos, González
Ríos recorda que, em muitas interpretações, por carecerem de
uma visão de conjunto, o problema da linguagem em Nicolau
de Cusa é reduzido a uma teoria do nome ou da denominação.
Entretanto, reconhece que a análise desse problema é feita
“[...] a partir do estudo de suas obras e das fontes das diversas
tradições que convergem ou concorrem em seu pensamento, 40
[...]” (2010, p. 266).
Considerando a centralidade da analogia entre o Verbum
divino, princípio criador e produtivo, e a mens humana, compreen-
de-se que, como adverte González Ríos (2010, p. 63), a concepção
cusana da linguagem “[...] não pode ser separada dos princípios
da sua teologia especulativa”. Daí o autor chamar a atenção para
a doutrina do Verbo divino e afirmar que a teoria da linguagem
de Nicolau de Cusa não apenas exige uma “remissão ineludível”
a essa doutrina, mas que deve ser compreendida à sua luz27.
De modo especial, o que se evidencia é a concepção dinâmica
tanto do Verbo divino quanto da mente humana fundada na
“[...] concepção do princípio primeiro como princípio intelectual
e como Palavra” (2010, p. 63). Enquanto o princípio primeiro se
conhece a si e a todas as coisas na sua Palavra, criando tudo por
meio dela, mostra-se também como “origem última” das palavras
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temporais de todas as linguagens. Por outro lado, também para
González Ríos (2010, p. 99), essa concepção de linguagem pensada
como “[...] o fruto do dinamismo produtivo da mente por meio do
qual ela se explica e se expressa [...]”, não só se deduz da doutrina
do Verbo, princípio fundamental da teologia especulativa de
Cusano, mas também a “ilumina”. Isso significa que o alcança-
do por meio da especulação teológica, ilumina também essa
mesma especulação. Porém, esse dinamismo divino só pode ser
compreendido como “um movimento intratrinitário” por meio
do qual o princípio se conhece e se concebe a si mesmo no seu
Verbo, na sua palavra ou imagem. É nesse sentido que justamente
González Ríos (2010) pode falar, levando em consideração os
primeiros sermões de Nicolau de Cusa, de uma potência da
Palavra divina que cria tudo, mas também da palavra humana
que busca expressar, mesmo que limitadamente, aquela Palavra
que é imagem e igualdade de Deus.
Quanto ao problema dos nomes divinos, González Ríos
(2010, p. 146) considera que todas as potências cognoscitivas da 41
mente humana e todas as linguagens por meio das quais ela se
manifesta, se comunica e se revela são postas em movimento
na busca pelo “[...] nome e pela natureza de um objeto em si
mesmo inalcançável, incognoscível e inefável”. Assim, o autor
(2010, p. 149) considerará em sua tese que Nicolau, mesmo
tendo preferência pelos termos intelectuais que ele considera
enigmáticos, também utiliza termos que operam na região
racional. Por isso, dispondo os nomes divinos de acordo com as
unidades mentais apresentadas no De coniecturis, ele divide os
seis capítulos da segunda parte da sua tese do seguinte modo:
em primeiro lugar, partindo da análise de alguns sermões, ele
pretende mostrar que, embora tenha “uma clara e manifesta
preferência pela via negationes”, Nicolau de Cusa “oferece
formulações nominais e discursos teológicos que operam no
âmbito da oposição dos opostos”, ou seja, na região da razão.
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Em segundo lugar, partindo do De docta ignorantia, primeira gran-
de obra do Cardeal alemão, será apresentado o nome enigmático
“maximum et minimum absolutum” tendo como chave interpreta-
tiva a compreensão do divino como “coincidentia oppositorum”.
Aqui, já não estamos mais no nível da razão, mas na região do
intelecto. Em terceiro lugar, serão apresentados alguns “termos
intelectuais”28 como nomes enigmáticos do divino, mas agora
seguindo a indicação do De coniecturis “[...] de pensar além da
coincidência dos opostos”. Aos nomes que são compreendidos
de modo intelectual, acrescenta González Ríos (2010, p. 147),
Nicolau os denomina enigmáticos. O próprio desses termos é
dirigir o olhar do que especula para a compreensão incompreen-
sível do princípio eterno e simples que em si mesmo é incom-
preensível. Mas, tendo em vista o postulado no De coniecturis, o
olhar especulante é lançado não somente para lá da oposição dos
opostos (rationaliter), mas também para lá da coincidência dos
opostos (intellectualiter).
A centralidade da teologia do Logos é também reconhe- 42
cida por Casarella (1992)30 que busca em sua tese mostrar a
relação entre a expressão da Palavra divina na ordem criada
e o fenômeno natural da linguagem. Porém, segundo ele, uma
compreensão histórica e sistemática da doutrina cristã do Logos
está subordinada a uma compreensão que enfatize a theologia
sermocinalis cusana ou a teologia da palavra falada – the theology
of the spoken word (1992, p. 6). Quanto ao desenvolvimento global
do pensamento de Nicolau de Cusa sobre a linguagem, o autor
aponta como ponto crucial os anos de 1450, quando Nicolau
escreve os textos do Idiota (De sapientia, De mente e De staticis
sperimentis). Neste sentido, ele (1992, p. 17) afirma que começa
a surgir uma “distinct turn to language” nas obras especulativas
de Nicolau de Cusa. Assim, antes de 1445 a discussão sobre a
linguagem se centrava nas palavras como meros nomes que são
incapazes de representar a inefabilidade e a transcendência
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divina. Em 1450, começando com o Idiota. De mente, o Cardeal
de Cusa daria uma nova legitimidade à linguagem, pois aí ele
consideraria a imposição de nomes como um ofício ou uma ars.
Quando, nas obras tardias, Nicolau retoma os problemas dos
nomes divinos, ele o faz somente depois de ter discutido sobre a
convergência e a divergência entre a visão não discursiva, forne-
cida pela teologia especulativa, e o conhecimento discursivo,
que pode ser significado em palavras, faladas ou escritas.
A passagem da productio Verbi para uma speculatio Verbi
representa para Casarella (1992, p. 208) uma virada linguística
no pensamento cusano. Por exemplo, nos sermões que vão de
1430 até 1440, a reflexão cusana sobre a linguagem serviria
principalmente para fundar uma especulação analógica e
trinitária do Verbum. Outro aspecto desses textos escritos
antes de 1440 é que a concepção de linguagem está dominada
pela teologia da inefabilidade divina. Assim, por exemplo, os
capítulos 24-26 do Livro I do De docta ignorantia, que tratam
sobre os nomes divinos teriam, segundo ele, um importante 43
precedente nos sermões. Em ambos os casos, Nicolau daria
uma relativa prioridade à teologia negativa em relação àquela
afirmativa. Segundo Casarella (1992), essa posição entraria em
conflito com a teologia sermocinalis.
Dando continuidade à análise dos principais textos
cusanos sobre a linguagem, ele afirma que a primeira menção
à “linguagem” como tema só ocorrerá no De coniecturis, texto
escrito entre 1440 e 1444. Aqui, Nicolau explicaria as bases
filosóficas para a teologia da inefabilidade divina, pois, quando
o Cardeal de Cusa discute sobre a segunda unidade, a unidade
intelectual, ele sustentaria que a ascensão da ratio, terceira
unidade, para o intellectus, ou seja, da razão discursiva para a
intuição intelectual, transcenderia também a linguagem. Desse
modo, segundo o autor, uma analogia poderia ser estabelecida
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entre a inefável transcendência divina e a origem apofática da
intelligentia humana (CASARELLA, 1992, p. 209).
O ano de 1445 seria um ano de mudança no pensamento
cusano sobre a linguagem. No De filiatione, texto desse mesmo
ano, Casarella (1992) identifica uma oposição em relação aos
primeiros sermões, pois a origem apofática do intelecto huma-
no assumiria uma forma explicitamente cristológica. Dessa
forma, em oposição à reflexão intratrinitária dos sermões, a
imagem humanamente visível de Cristo torna-se o espelho da
linguagem, ou seja, em Cristo vemos de modo perfeito o que
pode ser expresso por meio da linguagem. Cristo torna-se,
então, a condição de possibilidade de usar a linguagem afir-
mativamente para mediar o que só conhecemos por meio da
palavra interna da mente.
Para ele, a virada de 1445 é apenas uma preparação
para o segundo capítulo do Idiota. De mente, o primeiro texto
no qual Nicolau de Cusa discute sistematicamente sobre a
linguagem. Casarella identifica neste capítulo do Idiota. De mente 44
uma mudança de ênfase em relação aos textos anteriores.
Ele (CASARELLA, 1992) explica que a metáfora do artesão de
colheres é aqui aplicada como uma analogia para se compreen-
der a formação de conceitos, ou seja, a ars com a qual o artesão
de colheres imagina o modelo mental da colher é uma analogia
para se pensar a criação da linguagem a partir das palavras
interiores. As palavras, portanto, seriam formações mentais,
arbitrariamente impostas e, mesmo assim, refletiriam as
formas inefáveis cuja absoluta precisão lhes falta. Partindo
dessas considerações ele afirma que a identificação cusana
da linguagem com uma arte ou ofício (craft) implicaria, por
parte de Cusano, reconsiderar a origem apofática da unidade
intelectual. A sua conclusão, portanto, é de que levando em
consideração que as obras anteriores a 1450 enfatizariam que
a compreensão do infinito, a Palavra inominável, ultrapassa
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a fragilidade perceptível do discurso humano, assim o Idiota.
De mente inverteria a direção do nosso olhar partindo da explica-
ção universal da Palavra infinita em diversos idiomas e palavras
(CASARELLA, 1992, p. 210).
Nas obras do último período, a discussão sobre a lingua-
gem assumirá um lugar privilegiado. Neste sentido, por exem-
plo, no De li non aliud e no De venatione sapientiae, a linguagem
é colocada pela primeira vez no contexto de um permanente
diálogo com os antigos, de modo especial, com Aristóteles e
Platão. Outro aspecto que a Casarella não passa despercebido é
o uso enigmático e até mesmo “lúdico” da linguagem nas obras
do último período. Ele recorda, por exemplo, a criação do termo
possest pela junção dos termos latinos posse e est para significar
que Deus é anterior à diferenciação da possibilidade e da atua-
lidade. Para ele, também se pode encontrar no De li non aliud de
1462 traços do uso enigmático e “lúdico”. Por exemplo, no uso
reduplicativo do termo non aliud na frase “non aliud est non aliud
quam non aliud” (1992, p. 211). Outro aspecto importante para o 45
qual Casarella (1992, p. 212) chama a atenção é que, segundo ele,
a virada linguística (linguistic turn) de 1450 se revelaria como
uma volta transcendental (transcendental turn) nas obras depois
de 1450. A esse respeito, segundo ele, também Duclow teria
escrito em relação ao significado do termo non aliud. Por fim,
Casarella (1992) acrescenta que, para se falar de um giro trans-
cendental no pensamento de Nicolau de Cusa, se deve admitir
tanto a livre criatividade humana quanto um giro especulativo
para a transcendência divina, que é constitutiva dessa mesma
criatividade. Assim, a virada linguística do non aliud coincide
com um giro transcendental do sujeito do conhecimento,
mas não sem colocar entre parênteses a fonte transcendente
que fundamenta essa mesma subjetividade. Da mesma forma,
pode-se dizer que a teologia sermocinalis cusana é reflexiva e
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
hermenêutica no sentido de que “Toda pergunta sobre Deus
pressupõe o questionado”31.
A centralidade do Idiota. De mente no pensamento cusano
é também reconhecida por André32. Segundo ele (1997, p. 122), a
história da interpretação do pensamento cusano apresenta uma
alternativa entre uma “metafísica do ser” e uma “metafísica
da unidade”33, que posteriormente seria superada, acentuan-
do-se a importância do problema do conhecimento, por uma
metafísica da mente. Esse último estágio começa com a redes-
coberta de Nicolau pelos neokantianos e, na sequência, com
Volkmann-Schluck. Na sequência desse filão aberto, ou seja, na
possibilidade de se superar a alternativa entre metafísica do ser
e metafísica da unidade por uma metafísica da mente, ele cita
autores como G. Schneider e K. Flasch. Todavia, é Stallmach que
apresenta a metafísica da mente como uma chave de leitura para
se interpretar a metafísica cusana. Apesar de André (1997, p. 124)
reconhecer que parece haver entre a sua própria interpretação e
a interpretação de Stallmach “[...] uma grande coincidência [...]”, 46
ele afirma “[...] que ela se reduz à forma de perspectivar a teoria
cusana do conhecimento e a sua importância no contexto do
pensamento do autor [...]”. Segundo ele, existe ainda “[...] uma
última chave para a leitura dessa metafísica da mente”, que seria
conceder o primado da “transcendentalidade de sentido” em
relação à “transcendentalidade de conhecimento”.
A originalidade da impostação de André (1997, p. 124)
está fundamentada em uma interpretação da doutrina sobre
a mente nos textos de Nicolau de Cusa que acentua o aspec-
to simbólico da mente humana em um dúplice sentido. Em
primeiro lugar, ele afirma que a mente só ocupa um lugar de
destaque no pensamento cusano, “[...] na medida em que é um
símbolo da mente divina e como tal é especificamente encara-
da”. Por outro lado, ele reconhece que ela “é um símbolo com
características especiais” enquanto possui não somente a
capacidade de interpretar outros símbolos, mas possui também
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a capacidade de criar os seus próprios símbolos. Assim, ela é
capaz de interpretar ou “re-produzir” os símbolos que a mente
divina cria com a intenção de manifestar-se e de produzir os seus
próprios, algo que André (1997) chama de “metáforas e enigmas”,
com a intenção de facilitar a assimilação dos símbolos divinos.
É nesse contexto que ele interpreta a “scientia aenigmatica”
como a outra face da “symbolica investigatio” e reconhece que “a
uma e a outra estaria subjacente o exercício da atividade filo-
sófica como interpretação”. Pensada dessa forma, “o conceito
de sentido” sobredeterminaria de tal forma a metafísica da
mente de Nicolau de Cusa que esta poderia ser caracterizada
como uma “metafísica do sentido” à qual corresponderia uma
“filosofia da interpretação”.
Porém, e essa é parte que nos interessa, ainda é possível
um passo atrás na tentativa de determinar sobre que funda-
mentos se assentam tanto essa “metafísica do sentido” quanto
uma “filosofia da interpretação” no pensamento cusano.
Segundo André, (1997, p. 125) “subjacente a tudo isso está [...] a 47
sobredeterminação do conhecimento pelo discurso” e, no caso
de Nicolau de Cusa, as raízes que sustentam a centralidade do
discurso seria, segundo o autor, a teologia do logos:34
Se os entes finitos são o resultado do conhecimento da mente
divina, esse conhecimento é entendido como produção de
discurso, de palavra dinâmica e criadora. A filosofia da
linguagem, sem ter sido sistematicamente abordada por
Nicolau de Cusa, constituiria, assim, um princípio funda-
mental para a interpretação do seu pensamento.
Além de assumir a filosofia da linguagem como chave últi-
ma para a interpretação do pensamento especulativo cusano,
André (1997) coloca o discurso, seja ele verbal ou matemático,
no mesmo horizonte do simbólico no qual aparecerá também o
mundo, o homem, o conhecimento e a arte. Assim, se, por exem-
plo, o objetivo último do pensamento cusano é o “conhecimento
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de Deus” (1997, p. 134), desafiadora é também a tarefa que se
coloca ao discurso humano de dizer algo com sentido sobre esse
princípio (1997, p. 137). Dito de outra maneira: um pensamento
que funda suas raízes no cristianismo e busca pensar a identida-
de e a diferença, a unidade e a multiplicidade, encontra na ideia
de criação, interpretada como “posição de sentido”, o caminho
para pensar a relação entre a transcendência e a imanência
do princípio criador em relação ao mundo criado; da mesma
forma, esse mesmo pensamento encontra que o princípio é
trino, que acolhe a distinção das pessoas na unidade da divinda-
de e que a segunda pessoa se revela como palavra, como Verbo.
Um pensamento assim fundado também deve reconhecer que “a
transcendência e a infinitude da realidade divina não parecem
compatíveis com a finitude inerente a um discurso racional [...]”
(1997, p. 74). Em uma pergunta, André (1997, p. 75) resume a
densidade dos problemas impostos a um pensamento que assim
se funda: “Como pensar, assim, o acesso cognoscitivo a uma
transcendência que parece escapar às possibilidades discursi- 48
vas do homem?”. É a esse desafio, portanto, que, segundo ele,
Nicolau procurará responder ao acentuar a dimensão simbólica
do conhecimento e do discurso salvaguardadas pelo primado do
sentido que comporta não somente a superação da dicotomia
entre metafísica da unidade e metafísica do ser, mas que exige
uma inflexão, na concepção de mente no pensamento cusano,
do primado do sentido sobre o primado do conhecimento.
Por conseguinte, André (1997) também afirma que a ideia
de criação, interpretada como “posição de sentido”, é o funda-
mento para a compreensão do uso do símbolo no pensamento
cusano35 uma vez que, na ideia de que Deus se manifesta ao
criar e de que a criação é o modo de Deus fazer-se conhecer está
embutida a ideia de que o símbolo é,
antes mesmo do [...] discurso, presentificação de uma verdade
[que se oferece no homem e no mundo], razão pela qual tal
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símbolo pode ser, por meio do discurso humano, caminho
para essa mesma verdade” (1997, p. 400).
Por outro lado, a manifestação interna da divindade é
a Palavra e, pela Palavra, ela se manifesta na criação. Assim, a
teologia do Logos permite pensar os entes criados como “simbó-
licas subunidades semânticas” (1997, p. 570). No mundo e no
homem, portanto, articula-se a dialética entre a manifestação
de Deus e o retorno para Deus e, nessa articulação, pode-se
entender a afirmação de André (1997, p. 569), segundo a qual o
homem reassume esses mesmos símbolos numa “re-produção
de sentido” como caminho de retorno ao princípio fundante.
Subjacente à compreensão de que Deus se manifesta ao
criar e de que a criação é “posição de sentido” está o “para-
digma expressionista”, uma expressão retomada por André
(1997, p. 83) de Duclow (1974). O mesmo paradigma ajuda-nos a
compreender a atividade da mente, tendo em vista a mente ser
pensada “como imagem da divina força criadora” (1997, p. 570). 49
Por um lado, existe uma “expressividade interna” da mente
humana que é a “construção dos conceitos” e a “[...] interna
rede semântico-gnosiológica em que eles [os conceitos] se
estruturam”; por outro lado, há uma “expressividade externa”,
pois o conhecimento tende para uma espécie de “plasmação
sensível”. É a partir dessa circulação entre o movimento interno
e o externo da mente humana que André buscará “[...] aprofun-
dar a natureza simbólica do discurso [...]”, seja o verbal seja o
matemático, na marcha do pensamento cusano.
Para Duclow (1974)36, o termo “douta ignorância” não
indica somente uma unidade sistemática do pensamento no
Pseudo-Dionísio Areopagita, em Scoto Eriúgena e Nicolau de
Cusa, mas significa também um projeto hermenêutico, isto
é, a hermenêutica dos nomes divinos. Por outro lado, Duclow
(1974) reconhece que a questão da linguagem é o primeiro
estágio de uma discussão sobre a douta ignorância e, portanto,
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a questão a ser considerada é se é possível encontrar, na tradi-
ção medieval, uma filosofia da linguagem adequada para essa
hermenêutica. As considerações sobre essa pergunta aparecem
no segundo capítulo da tese dedicado a Agostinho e Nicolau de
Cusa. Duclow (1974) exclui dessa consideração tanto Dionísio
quanto Eriúgena, tendo em vista a orientação profundamente
ontológica das suas reflexões sobre o simbolismo. Por outro
lado, apesar de esses autores terem compreendido a teofania
a partir do simbolismo e terem elaborado uma lógica do nome
divino, teologia e lógica essas que são fundamentais para a
douta ignorância, esses desenvolvimentos não constituiriam
uma teoria da linguagem como tal37. Assim, ainda que a tese de
Duclow (1974) não esteja voltada somente para a discussão da
hermenêutica dos nomes divinos no pensamento de Nicolau de
Cusa, o autor esclarece que a epistemologia do De coniecturis e a
especulação sobre a nomeação e definição no Idiota. De mente e
De li non aliud concorrem para formar uma filosofia da lingua-
gem completamente desenvolvida (1974, p. 28). 50
Depois de apresentar alguns aspectos da filosofia da
linguagem de Agostinho que incidem sobre a hermenêutica
dos nomes divinos e que são fundamentais para a filosofia da
linguagem cusana, presentes na teoria do signo do De magistro e
do De doctrina christiana e na discussão sobre “a palavra interior”
do De Trinitate38, Duclow (1974) começa a discutir alguns dos
traços fundamentais da filosofia da linguagem cusana presentes
no Compendium: a linguagem como uma “art”, os signos como
convenção humana e a doutrina da linguagem como manifes-
tação da mente. Em primeiro lugar, ele enxerga na afirmação
cusana de que a arte do falar é a mais natural e mais fácil ao
homem, pois não falta a nenhum homem perfeito indicações da
origem prática e da função teórica da linguagem, afirmando que
a linguagem e o conhecimento estão essencialmente relaciona-
dos com o âmbito das necessidades e das atividades humanas.
Em seguida, da interpretação cusana do texto da Metafísica de
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Aristóteles, segundo o qual “todo homem deseja por natureza
conhecer”, e da admitida necessidade de que esse conhecimento
deva ser transmitido por meio dos signos, ele também reconhe-
ce em Nicolau uma virada para a linguagem, tendo em vista que
ela será, entre os signos convencionais, o principal terreno para
esta comunicação. Daí, segundo Duclow (1974), Nicolau de Cusa
insistir que “a primeira ciência consiste no designar as coisas
por meio das palavras percebidas com o ouvido”. Essa virada
para a linguagem, entretanto, também comporta uma guinada
da origem prática da linguagem para a sua função teórica, pois a
busca do conhecimento encontra a sua primeira articulação no
discurso (1974, p. 48). Duas conclusões podem ser tiradas dessa
introdução ao problema da linguagem no Compendium: a primei-
ra é que a linguagem, fundada nas demandas da comunidade e
na práxis, torna-se um signo vivo da criatividade da mente e da
sua relação com o mundo. Por outro lado, na doutrina da mente
como imago Dei e da criação como signo e palavra do Verbo não
criado, a linguagem se torna, então, um símbolo paradigmático 51
(paradigmatic symbol) tanto para a reflexão sobre a mente e sua
autocompreensão e articulação como sobre a divindade na sua
constituição interna e na sua presença teofânica na criação.
A reflexão sobre a linguagem nos textos cusanos pode
ser pensada como um processo que encontra a sua conclusão
ou termo tanto na epistemologia, na antropologia e, em última
instância, na teologia e na metafísica. Ainda segundo Duclow
(1974), pode-se traçar este progresso partindo de quatro temas
centrais para a concepção de linguagem cusana: a relação entre
nomeação e razão; a função da razão na unidade dinâmica da
mente; a relação entre os nomes impostos pela razão e o nome
“natural” preciso; e o non-aliud que significa tanto a fundação
da linguagem quanto a sua orientação transcendental. A função
central atribuída à linguagem pela sua ligação com a razão será
a tarefa da nomeação (1974, p. 50).
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À PROCURA DE UMA INTERPRETAÇÃO
A especulação sobre a inominabilidade divina implica
simultaneamente que o pensamento se volte para a reflexão
sobre a própria linguagem humana e uma teoria da linguagem
que pretenda fundar-se no pensamento cusano exige, como as
teses analisadas pretendiam mostrar, uma referência direta à
teologia do Logos ou Verbo divino. Assim, a inominabilidade
terminava por ser pensada na ótica dos limites e da força da
linguagem. O nome divino é inalcançável para uma linguagem
que funciona nos limites da razão e da alteridade. Mas essa
mesma relação das palavras humanas com o Verbo inefável39
pretendia mostrar o valor ou força das palavras que, apesar
da sua imprecisão e limitação, exprimiriam de modo variado
o Verbo divino do qual procedem. Entretanto, considerando
que o nome de Deus é o próprio Verbo, ou seja, sua igualda-
de, (GONZÁLEZ RÍOS, 2010, p. 182) e que, portanto, não existe
distinção “entre aquilo que é significado por meio do nome
e o nome por meio do qual se significa”, questionamos: não
deveríamos nos perguntar sobre o lugar do nexus como a cone- 52
xão eterna entre o que é significado pelo nome e o nome que
significa que em relação ao divino é um e o mesmo? No caso das
coisas que recebem o nome pelo advento da forma à matéria,
não deveríamos nos perguntar por aquele movimento que faz
com que forma e matéria sejam o composto e que, portanto,
conquista o nome que lhe é adequado, mesmo sendo impreciso
já que uma adequação precisa entre o nome e o que é nomeado
não é possível ao homem? Partimos da questão: como ocorre
de podermos nomear as coisas e também o inominável? Como
ocorre de um nome poder ser o nome, mesmo que inadequado,
do que se furta a todo nome? O nexus que, se entendido como
nexo do inteligente com o inteligível e do amor amante com o
amor amável, funda a possibilidade de nomear, ainda que inade-
quadamente, o inominável pelo qual o Verbum não é somente de
Deus, mas é já sempre Deus, como dissemos antes.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
2 CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO--RELIGIOSO MEDIEVAL
Não é a sua situação histórica, a sua posição e as diversas
atividades de relevo que exerceu dentro da Igreja que deter-
minam o fato de Nicolau de Cusa ter sido um filósofo cristão.
Isso significa, que o caráter cristão da sua filosofia não é
determinado por “motivos meramente externos”, mas “a sua
mundividência é uma mundividência cristã” (ANDRÉ, 1997,
p. 65). Por isso, quando olhamos para o processo de formação
desse pensador, para a sua atuação político-religiosa e para
os seus escritos, tanto os ocasionais como os mais elaborados,
damo-nos conta, como afirma André (1997, p. 65), “[...] duma
profunda religiosidade, que brota do seu cristianismo, a
marcar o ritmo, o horizonte e o conteúdo das suas reflexões”.
Nicolau de Cusa é um pensador cristão, afirma Gadamer
(1964, p. 935), e, por ter consciência das limitações insanáveis
da filosofia grega “para ascender ao Deus infinito e à palavra
revelada”, ele se abre à escuta da Palavra40. Por outro lado,
também podemos assumir que os elementos cristãos do seu
pensamento não conformam o seu sistema simplesmente como
um acréscimo ou como uma exigência externa. Por exemplo, a
discussão sobre a Trindade divina não seria introduzida no seu
sistema filosófico simplesmente por Nicolau de Cusa ser cristão,
mas que o princípio primeiro seja uni-trino exigiria a própria
pluralidade e multiplicidade das coisas do mundo, como o vere-
mos. Assim, os pressupostos cristãos são assumidos e pensados
de modo radical e não é a filosofia que se conforma à teologia ou
vice-versa, mas é no diálogo que uma e outra se interpenetram
e se complementam mutuamente.
CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
Por isso, do ponto de vista teórico, consideramos que não
se pode diminuir ou até mesmo não considerar esse cristianismo
latente ao se apreciar a filosofia e a metafísica cusana. Tal atitu-
de não é nem sempre possível nem é mesmo desejável no caso
do pensamento e das obras de Nicolau de Cusa, pois ela, ao que
nos parece, eliminaria a posição fundamental da especulação
cusana, acarretando no esvaziamento do conteúdo desse mesmo
pensamento. Inicialmente, é imprescindível aceitarmos que
filosofia e teologia, enquanto formas de pensar, concorrem lado
a lado para a estruturação de um único modo de pensar ou, em
outras palavras, os dois modos de pensar coincidem harmonio-
samente em um mesmo pensamento. Entretanto, é necessário
compreendermos como esses dois momentos se articulam e
perguntarmo-nos pelo tipo de relação que transparece da obra
de Nicolau. Dessa forma, interessa-nos interpretar a compreen-
são do princípio primeiro no mesmo horizonte em que ela se dá
ao pensamento cusano. 54
2.1 MÚTUO ENTRELAÇAMENTO DIALÉTICO E DINÂMICO ENTRE
FILOSOFIA E TEOLOGIA NO PENSAMENTO CUSANO
Nicolau de Cusa, homem que sempre buscou a unidade,
também procurou edificar a sua especulação na unidade da
filosofia e da teologia. No caso específico da intepretação do
pensamento cusano, algumas respostas significativas já foram
dadas a esse problema. Porém, gostaríamos de retomar a
discussão a partir do texto sobre os Mysteria Fidei do De docta
ignorantia, acentuando a relação dialética entre a filosofia e a
teologia interpretada por meio da relação entre fé e conheci-
mento intelectual pensada a partir da doutrina da complicatio-
-explicatio. Indicamos essa disposição do pensamento cusano,
seguindo Pereira (2010) no seu Prefácio à tradução portuguesa
do De visione Dei, como “[...] uma filosofia na Teologia, em que o
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
modelo da razão é extático, circular e dialético e sempre aberto
sobre o mistério do Inefável e do Indizível” (2010, p. 67).
Tocamos com esta discussão o problema da relação entre
fé e razão (fides et ratio) que, no contexto do pensamento esco-
lástico, recebeu diversas soluções41. Porém, essa questão é ainda
mais fundamental quando pensada em relação a Nicolau de Cusa
e não se resume apenas à tentativa de situá-lo entre os medievais.
Abordar essa problemática no contexto do pensamento cusano
é imprescindível para uma correta interpretação da sua obra.
O mérito da questão foi reconhecido por Beierwaltes (2005) que,
seguindo a Rudolf Haubst42 e às reflexões de Jarsper Hopkins43,
identificou na relação dialética o modelo de vinculação entre
esses dois âmbitos no pensamento cusano44. A resposta à pergun-
ta sobre essa relação, garante Beierwaltes (2005), é central para
“[...] a compreensão da estrutura e da intenção fundamental do
pensamento cusano” e “[...] concerne e determina todas as refle-
xões, [...]”, especialmente as tentativas de compreender a Deus
por meio de um conceito o menos inadequado possível, mas 55
também as reflexões matemáticas e eclesiológicas (2005, p. 11).
Claro que Nicolau não pensa por fora da tradição que, partindo
de Santo Agostinho chega até ele; tradição essa que entende
filosofia e teologia como
[...] forças do pensamento que operam conjuntamente, que
se fomentam e se clarificam mutuamente, olhando conjun-
tamente para a essência e para a obra do pensamentocristão
(2005, p. 12).
Beierwaltes (2005) adverte também que a tentativa de
esclarecer essa relação no pensamento cusano, partindo “de um
conceito preliminar moderno dos modos de saber” acarretaria
em uma dificuldade hermenêutica, pois ocultaria “o contexto
medieval de questionamento”. Além disso, Beierwaltes (2005)
também lembra que Nicolau diretamente pouco refletiu sobre
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CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
o uso e o alcance de termos como “philosophia”, “philosophi”,
“speculatio philosophica” e “theologia”. Porém, por meio de
outros conceitos que pertencem à filosofia e à teologia, seria
possível alcançar esses dois modos de pensar ou de saber e
também por meio de
uma reflexão sobre a relação entre a razão (ratio, intellectus), a
intelecção (intelligere, videre), a compreensão (comprehendere),
ou o saber (scire) com a fé (credere, fides) como um abrir-se dian-
te de uma verdade transmitida como revelação (2005, p. 13).
Isso aconteceria, no caso do pensamento cusano, quando
Nicolau conceitualmente explica alguns temas “teológicos”
essenciais, por exemplo, a Trindade e a Encarnação.
Por outro lado, Duclow (1974, p. 18), ao analisar o contex-
to cultural no qual o conceito de douta ignorância nasce e se
desenvolve, reconhece que tanto em Nicolau de Cusa, como
em Eriúgena e no Dionísio Pseudo-Areopagita as suas reflexões 56
estão orientadas e fundadas no horizonte do pensamento
religioso medieval. Recordamos que, para ele, o termo docta
ignorantia indica uma unidade sistemática de pensamento e
expressa, nesses três pensadores, um projeto hermenêutico,
isto é, a hermenêutica dos nomes divinos. Ao mesmo tempo, e
que pensada como uma tarefa filosófico-teológica, ela estaria,
segundo ele, firmemente situada no horizonte religioso. Por fim,
Duclow (1974, p. 20) sustenta que a relação entre fé e entendi-
mento (faith and understanding) constitui uma dialética dinâmica
e integral, na qual o homem continuamente se move da inteli-
gibilidade implícita e potencial dada na fé para o conhecimento
explícito e atual dado no entendimento. Mas, para Duclow (1974,
p. 21), porém, não são somente o início e o princípio da reflexão
que estão fundados na fé, mas também o seu fim e o seu telos se
encontram na adoração. Podemos dizer, portanto, que o fim da
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reflexão é a adoração, já que uma fé amadurecida pela reflexão
intelectual afasta o perigo da idolatria.
Esse mesmo dinamismo dialético é confirmado por André
(1997, p. 70). Ele sustenta, baseando-se nas conclusões de Duclow
(1974) acima expostas, que essa dialética “[...] configura todo o
movimento do pensamento de uma inteligibilidade implícita e
virtual proporcionada pela fé para um conhecimento natural que
a desenvolve e explicita”. Para demonstrar a intrínseca unidade
entre filosofia e teologia pensada não como identificação, mas
como “dialética interpenetração e complementaridade”, André
(1997) recorda que no De non aliud e no De possest, por exemplo,
duas obras de grande “densidade especulativa”, Nicolau nutre a
esperança de encontrar em dois conceitos filosóficos uma possí-
vel expressão intelectual para Deus entendido como “Máximo
absoluto”. Além disso, André (1997) chama a atenção para os
pressupostos teológicos do De docta ignorantia que sustentam
e alimentam a sua estrutura unitária. Recorda o autor que,
neste escrito, a reflexão se desenvolve articuladamente em três 57
momentos: o primeiro é uma reflexão sobre o Máximo absoluto
ou Deus, segundo a fé de todos; o segundo visa à reflexão sobre
o universo como máximo contraído e o terceiro é uma reflexão
sobre o máximo ao mesmo tempo absoluto e contraído. É nesse
sentido que o terceiro livro é uma reflexão sobre Jesus, pois sua
natureza humana e divina representa o encontro do Máximo,
em sentido absoluto, e do máximo contraído (1997, p. 67).
O fundamento do caráter unitário dessa primeira
obra cusana encontra-se, também para Machetta (2010)46, na
concepção de “maximidade”, uma vez que é ela que articula
a relação e a caracterização dos três livros. Além disso, ele
acrescenta que, a partir de uma “perspectiva neoplatônica”,
o terceiro Livro aparecerá como “conclusão de um ciclo” e,
assim, teríamos que “a douta ignorância desenvolve a concep-
ção do máximo como princípio (livro primeiro), saída (livro
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segundo), retorno (terceiro livro)”. Pensado a partir deste esque-
ma neoplatônico, o terceiro livro do De docta ignorantia desen-
volve a temática do retorno da criatura ao criador, descrevendo
“o cumprimento do destino final do homem: a união com Deus,
realizada em Jesus” (2010, p. 450). Nessas mesmas páginas,
Machetta (2010) também sublinha dois aspectos da antropo-
logia cusana: o primeiro refere-se à situação negativa na qual
a humanidade se encontra depois do pecado que a impediria
de ascender a Deus. A consequência do pecado é o domínio dos
sentidos sobre a razão e o intelecto. O segundo aspecto refe-
re-se ao modo de superação dessa situação. Assim, enquanto o
primeiro exige a encarnação do Verbo como evento soterioló-
gico, o segundo exige a fé em Cristo para que o homem possa
ascender a Deus. Entretanto, não devemos esquecer que, pela
encarnação, a natureza intelectual humana é sanada e, neste
sentido, reencontra a sua ordenação para a verdade. A primazia
do intelecto sobre as outras potências humanas indica que a
conversão pela fé não é contrária às potências intelectuais, pois 58
é conversão à verdade eterna que é o próprio Cristo. O anseio
pela verdade, própria do intelecto, culmina, sanada a nossa
natureza, no encontro com o Verbo de Deus47.
Tomada separadamente, essa antropologia cristológica
desenvolvida no último livro parece opor-se ao restante do
De docta ignorantia e coloca em um segundo plano a própria
intenção do autor sobre a estrutura da sua obra48. Por isso, a
necessidade de não separarmos o texto em dois momentos
distintos acentuando o caráter mais filosófico dos dois primei-
ros livros e o caráter teológico do último. Justapor esses dois
momentos pensados distintamente não só extingue a unidade
da primeira grande obra de Cusano, mas também elimina o
seu caráter antropológico. Dessa forma, o De docta ignorantia
aparece empobrecido, limitado e amputado, tendo em vista que
obras posteriores desenvolvem essa antropologia cristocêntrica
(ANDRÉ, 1997, p. 68).
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CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
A partir das diversas abordagens anteriormente apre-
sentadas, podemos concluir que a perspectiva a partir da qual
pode ser vista a relação entre filosofia e teologia no pensamen-
to cusano é o da interpenetração e do mútuo condicionamento
entre esses dois modos de saber. Porém, será preciso, em
primeiro lugar, assumir com Beierwaltes (2005) que somente
seria possível um acesso à relação entre filosofia e teologia se
a pensássemos por meio de conceitos que estão ligados a essa
relação, tendo em vista que o próprio Nicolau de Cusa não
pensa a relação entre filosofia e teologia. Em segundo lugar,
também consideramos necessário demarcar a diferença entre
ratio e intellectus, na medida em que tendo em vista que o texto
do De docta ignorantia, ao qual em seguida faremos referência,
aborda aquela relação por meio dos termos fides e intellectus, ou
seja, entre a fé e o conhecimento intelectual49.
Assim, a interpretação anterior do De docta ignorantia a
partir da doutrina do Máximo (absoluto, contraído e absoluto
e contraído simultaneamente) por um lado e, por outro lado, 59
a interpretação da sua estrutura interna a partir do princípio
neoplatônico da saída e do retorno tencionava garantir a
unidade do texto. Pretendida por Nicolau de Cusa, essa unidade
textual é o símbolo de uma unidade interna de pensamento que
se sustenta e se conserva no movimento dialético entre a fé e o
intelecto e, por isso, entre a especulação filosófica e a teológica.
Nicolau expressa essa relação no capítulo XI, Mysteria fidei50, do
terceiro livro do De docta ignorantia, e que deve ser lido a partir da
estrutura unitária e dialética da obra e do pensamento cusano.
Esse texto, comenta Beierwaltes,
[...] coloca o começo da reflexão sobre a ‘fides’ na região natu-
ral da experiência [Erfahrung]51 e do pensamento [Denkens],
e mostra a transição dessa reflexão para a visão [Einsicht] da
verdade absoluta que aperfeiçoa a fé (2003, p. 78)52.
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RELIGIOSO MEDIEVAL
Citemos toda a rica passagem do De docta ignorantia:
Os nossos antepassados afirmaram em concordância uns com
os outros que a fé é o início do conhecimento intelectual. Com
efeito, em qualquer disciplina pressupõem-se coisas como
princípios, que só são aprendidos pela fé, dos quais brota a
inteligência do que deve ser tratado. É necessário que todo
aquele que quer ascender ao saber creia neles, sendo impos-
sível, sem eles, ascender. Diz efectivamene Isaías: “Se não
acreditardes, não entendereis”. Por isso, a fé é o que complica
em si tudo o que é inteligível. E o conhecimento intelectual é a
explicação da fé. Assim, o conhecimento intelectual é dirigido
pela fé e a fé estende-se pelo conhecimento intelectual. Daí
que onde a fé não é sã, nenhum conhecimento intelectual é
verdadeiro. É bem manifesto a que conclusão conduzem o erro
dos princípios e a debilidade dos fundamentos. Mas nenhuma
fé é mais perfeita que a própria verdade que é Jesus53.
Comecemos por esclarecer algumas questões introdutó-
rias. Em primeiro lugar, de modo geral podemos dividir o texto
em dois grandes momentos que se articulam e se concluem com 60
afirmações próprias à teologia da revelação: por um lado, o texto
de Isaías, e, por outro, a identificação da verdade com Jesus.
Esse esquema é idêntico ao determinado por Santinello (1990,
p. 85) ao afirmar que quando Nicolau de Cusa pensa o conceito de
homem como “imago Dei”, por exemplo, pensa-o primeiramente
em um contexto de uma teologia revelada, segundo a tradição.
Depois, porém, essa teologia será utilizada em sede especulativa,
ou seja, ele parte de um contexto da Escritura e transfere-se
depois para um contexto especulativo. Podemos encontrar
o mesmo esquema ou procedimento ilustrado também por
Reinhardt (2002, p. 136) em uma conferência, já anteriormente
citada, na qual ele pretendia “[...] demonstrar a concordância
entre exegese bíblica e especulação filosófica na obra cusana de
uma maneira concreta [...]”. Quando da análise do Sermão CCIV,
Cum omni militia caelestis exercitus, pronunciado por Nicolau de
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Cusa em Brixen/Bressanone no dia 29 de setembro de 1455, dia de
São Miguel, Reinhardt pretende que, nesse sermão, se possa ver
um procedimento muito característico praticado pelo Cardeal
de Cusa: “parte de uma verdade de fé, para fazê-la inteligível por
meio de uma especulação filosófica” (2002, p. 138).
Em segundo lugar, antes de apresentarmos o texto dos
Mysteria fidei, outra questão prévia precisa ser colocada.
Referimo-nos ao esclarecimento do vocabulário utilizado por
Nicolau de Cusa. Inicialmente devemos recordar que no texto
cusano citado acima, pelo menos do ponto de vista textual, a
relação pretendida é entre a fides e o intellectus (intelecção ou
conhecimento intelectual). Devemos nos perguntar, portan-
to, se o De docta ignorantia já guarda a diferença entre ratio e
intellectus, plenamente tematizada no De coniecturis, e se essa
diferença seria significativa ou não para pensar a relação com
a fides. Hopkins (1996b) analisa e aponta a inconsistência de
quatro linhas interpretativas que negavam a possibilidade de
mostrar que no pensamento cusano se poderia encontrar uma 61
doutrina em que se estabelecesse uma possível relação entre
fé e razão54. Para apresentar uma concepção cusana dessa
possível relação, ele (1996b, p. 9) parte do reconhecimento de
que os termos fides e ratio são termos ambíguos e que reque-
rem, para um emprego claro, um esclarecimento prévio dos
seus diversos usos. Incialmente, Hopkins (1996b) distingue em
Nicolau de Cusa uma fé empírica e uma fé religiosa. A primeira
é um “ver para crer” no sentido de que é impossível não acre-
ditar no que se viu (non potest non credi quod videtur); mas a fé
religiosa está em outro nível. Nesse sentido, podemos dizer que
é uma fé que exige mais e em relação à primeira é demasiada
excessiva enquanto vai além do “provado” pela evidência e é,
portanto, um acreditar apesar de não ver. É, assim, um excesso
de fé (over-belief). Quanto ao termo fides, Hopkins (1996b, p. 9)
consegue distinguir três tipos ou três diferentes noções de fé e
conclui que a fé está localizada entre dois polos: a credulidade
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(credulity) e o conhecimento (knowledge): a fé proposicional
(propositional faith) é acreditar na verdade de uma proposição
tendo em vista a autoridade daquele que a propõe; a fé salvado-
ra (saving faith) é a fides ut fiducia, ou seja, a fé como um confiar
em Deus; o terceiro tipo de fé é a fé sistemática (systematic faith),
ou seja, a fé como um sistema de artigos de fé ou conjunto de
doutrinas que constituem uma religião. Para Nicolau de Cusa,
assegura Hopkins (1996b), o homem de fé não é um fanático.
Mas a fé que ele possui também não se confunde com conheci-
mento no sentido comum de “conhecimento”. O homem de fé
acredita com base no testemunho e à luz de algumas evidências.
A evidência por si só, porém, é insuficiente para justificar a sua
crença. Acreditar à luz da evidência suficiente não tem nenhum
valor religioso, reconheceria Nicolau.
Da mesma forma, na expressão “fides et ratio”, podem-se
distinguir diferentes sentidos do termo ratio55. Hopkins (1996b,
p. 10) propõe que “reasons” [Verstand], enquanto capacidade ou
função cognitiva da mente, diz respeito tanto aos argumentos 62
racionais suficientes para provar e demonstrar como também
diz respeito àqueles que não servem nem para provar nem para
demonstrar, mas servem para proporcionar um fundamento
racional; esses argumentos não são concludentes, mas, em vez
disso, desses resultam apenas plausibilidades. Nesse sentido,
esses argumentos somente indicariam que é razoável, por exem-
plo, acreditar ou agir de uma determinada maneira. Poder-se-ia
encontrar essa diferença em Santo Anselmo (rationes necessariae e
rationes congruentes), que supõe as rationes congruentes para forne-
cer um fundamento racional (a rationale) para uma determinada
doutrina teológica, e ela se estende até o século XVII com Blaise
Pascal, que fala das razões do coração (Le coeur a ses raisons que
la raison ne connaît point). Para Hopkins (1996b), portanto, como
Anselmo e Pascal, Nicolau teria reconhecido que a fé religiosa,
enquanto possui um valor religioso, não é uma questão de prova,
mas de convicção. Isso significaria que a inteligência da fé não se
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determina por uma busca de provas conclusivas, mas que, à luz
de um fundamento racional, se poderia mostrar a razoabilidade
do seu conteúdo.
Além de retomar a diferença proposta por Hopkins (1996b)
entre os diversos sentidos de fé e razão no contexto da relação
entre fides et ratio, parece-nos importante também considerar
a relação entre ratio e intellectus, tendo em vista que no texto
específico dos Mysteria fidei é o segundo termo a ser utilizado.
A diferença acima mencionada no âmbito da razão pretendia
demarcar o distanciamento de Nicolau das tentativas de se buscar
uma prova da existência de Deus, no sentido da primeira tese de
Hopkins (1996b). É possível também no contexto do problema
da relação entre fé e razão que se dê uma diferença entre razão
(ratio) e intelecto (intellectus)? Em dez teses, Hopkins (1996b)56
pretende apresentar o núcleo da relação entre fé e razão (reason
– Vernunft) no pensamento cusano e adverte que esses pontos
percorrem toda obra cusana e que não seria apropriado afirmar
que ele tenha mudado de posição no decorrer dos seus escritos57. 63
No contexto da nossa investigação, interessa-nos relembrar aqui
a quarta e a oitava tese.
Na oitava tese, Hopkins (1996b) propõe que “a relação
entre fé e razão (ratio – reason – Verstand) é exatamente a mesma
relação que entre fé e entendimento (intellectus – understanding
– Vernunft)”58. E, ele justifica essa sua posição, argumentando
que a distinção entre ratio e intellectus não tem nenhuma impor-
tância neste contexto, já que aqui Nicolau usa esses termos em
sentido não técnico e também de acordo com linguagem teoló-
gica comum59. Por último, ele lembra que o caráter racional da
mente humana abrange tanto a razão quanto o entendimento.
Portanto, Nicolau abordaria esse problema a partir da relação
entre fé e racionalidade (rationality), que inclui tanto o racio-
cínio quanto a compreensão (reasoning and understanding).
Nesse sentido, parece que Nicolau se afastaria de uma tentativa
de “provar”, por exemplo, a existência de Deus, preferindo
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assentar a discussão ao abrigo de fundamentos racionais que
não oferecem provas, mas podem afastar o risco do fideísmo,
se não cego, pelo menos míope. A quarta tese de Hopkins, que é
a intepretação de uma das frases centrais do texto dos Mysteria
fidei (Dirigitur igitur intellectus per fidem, et fides per intellectum
extenditur), conduz justamente a essa conclusão. Os termos
Vernunft e understanding traduzem o termo intellectus latino.
Hopkins (1996b) conclui, portanto, que uma determinada
compreensão inicial é necessária para que a fé não seja vazia,
mas também é necessária uma orientação da fé, para que a
compreensão não seja cega ou míope.
Consideramos que a relação entre fides et ratio possa de
fato ser pensada como uma relação entre a fé e a racionalidade
da mente humana. Porém, isso não significa que não seja razoá-
vel e até mesmo instrutivo perguntarmo-nos sobre o signifi-
cado que o termo intellectus assume no texto sobre os Mysteria
fidei e tentarmos iluminar esse sentido a partir de outros textos
cusanos. Nesse contexto, parece-nos importante retomar 64
rapidamente o sexto capítulo, Mysterium mortis Iesu Christi, do
terceiro livro do De docta ignorantia, no qual Nicolau reconhece
a necessidade de fazer uma “pequena digressão” para dar conta
dos seus objetivos no sentido de “[...] atingir mais claramente o
mistério da cruz”, ou seja, os mistérios da morte de Jesus. Nessa
digressão, Nicolau de Cusa afirma que o homem é dotado de
sentido e de intelecto e da razão que os une, mas que “[...] a
ordem [das coisas] faz com que os sentidos estejam submetidos
à razão e a razão ao intelecto”60. A diferença e a relação entre os
três será determinada, portanto, por um movimento pelo qual o
homem se deixa atrair e dominar pelos sentidos “para a carne”
e, assim, “afastado de Deus”, estaria totalmente privado do gozo
ou da posse do
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[...] supremo bem que é intelectualmente mais elevado e
eterno. Mas se a razão domina os sentidos, é necessário ainda
que o intelecto domine a razão, para que, acima da razão, pela
fé atuada, adira ao mediador, afim de que, assim, possa ser
atraído por Deus Pai à glória61.
O que se pretende determinar no texto é a impotência
ou incapacidade do homem “chegar por si ao fim dos seus
afectos intelectuais e eternos”. Mas essa impotência já indica
que existe de fato uma diferença entre os âmbitos da razão e do
intelecto ou que já aqui os termos são usados para determinar
uma diferença ao indicarem que a “adesão” a Cristo, por meio
da “fé atuada”, se dá quando os sentidos forem superados pela
razão e esta pelo intelecto. Certamente esta ainda não é uma
reflexão especificamente gnoseológica sobre os diversos modos
de conhecer da mente humana. Para isso, devemos esperar as
lições do De coniecturis62.
A diferença entre o intelecto (segunda unidade) e a
razão (terceira unidade) é estabelecida a partir do quarto 65
capítulo da primeira parte do De coniecturis (De quattuor unita-
tibus)63.Esse capítulo e os quatro sucessivos envolvem uma
diversidade de problemas que aqui podemos apenas sugerir64.
Nesse texto, a diferença entre razão e intelecto encontra-se
situada no contexto da discussão sobre as quatro “unidades
mentais”. Pensando cada uma das quatro unidades a partir
da relação entre a unidade e a alteridade, então teríamos que,
enquanto a primeira unidade é simplíssima, pois nela não há
alteridade alguma, a segunda não será simplíssima, mas será
composta, pois o que não é a primeira unidade descende dela e vai
em direção à alteridade. No entanto, o fundamento da composi-
ção na segunda unidade é a coincidência dos opostos (alteridade)
na unidade. Porém, isso não significa que os opostos a precedam
de modo que a unidade intelectiva derive dela. Nicolau afirma
que a segunda unidade é como que uma raiz que complica os
opostos e, ao utilizar o esquema da complicatio-explicatio, sugere
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que na terceira unidade está explicado o que na segunda resulta
complicado. Assim, os opostos podem coexistir na segunda
unidade, mas na terceira seriam incompatíveis. Por exemplo, na
unidade racional o movimento e o repouso se opõem, mas na
segunda não se eliminam, uma vez que essa unidade é similitude
da unidade divina. Assim, como o movimento infinito coincide
com o repouso na unidade divina, da mesma forma o movimento
do intelecto não se opõe ao seu repouso.
Outro modo de impostar a diferença entre intellectus e
ratio é pensar a relação entre essas duas unidades como sendo
uma a imagem na qual resplandece a outra ou como sendo uma
o discurso da outra. Assim, teríamos que, “como o intelecto é
raiz da razão, assim os termos intelectuais são raízes daqueles
racionais. Por isso, a razão é como o verbo da inteligência, na
qual essa resplandece como na própria imagem”65. Da mesma
forma, pode-se dizer que, como a alma ou a razão explicam a
unidade do intelecto, logo essa unidade resplandece na alma
como em sua própria imagem. O intelecto é o lume da alma, 66
na medida em que é a sua unidade. Por outro lado, também
devemos dizer que não intuímos a unidade do intelecto em si
mesmo, mas na razão que é a sua explicação66.
Por último, retomamos a diferença entre as unidades
a partir do princípio da coincidência dos opostos. A primeira
unidade está além da coincidência; na segunda unidade se dá
a coincidência dos opostos e, por último, a razão, com base no
princípio de não contradição, nega a complicação dos opos-
tos. Nicolau afirma que “a raiz de todas as asserções da razão
é esta, que não se pode atingir a coincidência dos opostos”67.
Entretanto, a razão possui um poder de complicar e isto acon-
tece no silogismo, quando ela “passa de um discurso lógico da
complicação para a explicação indagando racionalmente sobre
o idêntico na diversidade”68. Como a razão é ao mesmo tempo
unidade da alteridade dos sensíveis e alteridade da unidade
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intelectiva, ela possui, portanto, o poder de complicar e de
explicar. Entretanto, Nicolau recorda que
O tipo de complicação e explicação que pertence à razão não
opera entre os opostos, que coincidem somente na unidade
intelectiva. Na complicação divina, todas as coisas coincidem
sem diferença, na complicação intelectiva são compatíveis os
contraditórios, na razão os contrários, como no gênero coinci-
dem as diferenças que são opostas entre si.
Portanto, na razão há “uma certa coincidência de opos-
tos, que não se pode colher com os sentidos, pois os sentidos
não alcançam a coincidência dos contrários”70.
A diferença entre ratio e intellectus será determinante
para a compreensão da doutrina da coincidentia oppositorum
que sustenta a compreensão cusana de Deus no De docta
ignorantia. Prova disso é a Apologia doctae ignorantiae71, na qual
Nicolau responde à as acusações feitas por Iohannes Wenck
de Herrenberg no seu De ignota litteratura72. Em primeiro 67
lugar, Wenck parte do princípio de que o De docta ignorantia é
contrário à fé73, pois o espírito que anima o texto cusano é o
mesmo espírito de doutrinas que já foram antes condenadas
como heréticas74. Em segundo lugar, o que soa contrário à fé,
para Wenck, é segundo ele, que Nicolau identifique o criador e
a criatura. Por isso, ao recorrer ao Salmo 45, 11 [Vacate et videte
quoniam ego sum Deus], Wenck insistirá sobre a singularidade
de Deus. Por outro lado, repugna também a Wenck a afirmação
cusana de que o homem compreenda incompreensivelmente
o incompreensível75 e que por esse conhecimento se alcance a
simplicidade na qual os contraditórios coincidem. Para Wenck,
a coincidência dos contraditórios, por um lado, e a compreensão
incompreensível ou douta ignorância, por outro, terminam por
exigirem que se negue o princípio de não-contradição aristoté-
lico e, consequentemente, a possibilidade de qualquer ciência76.
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Respondendo a essa acusação, Nicolau retomará a distin-
ção, explicitada somente no De coniecturis, entre a região da razão
e a região do intelecto, para afirmar que a douta ignorância não
diz respeito à razão, mas “ao olho da mente e da inteligibili-
dade” e a essa diferença Wenck não havia prestado atenção.77
Isso significa que, para Nicolau de Cusa, no contexto no qual
se exige o discurso, ou seja, no âmbito da razão e do finito, o
princípio aristotélico continua sendo válido. Por outro lado, o
Cardeal de Cusa recorda também que no De coniecturis sustentou
que Deus está além da coincidência, sendo, portanto, oposição
dos opostos78. Segundo Verd (1970, p. 165)79, Nicolau negou
diversas vezes expressamente o princípio de não contradição
em relação a Deus. Verd (1970) também explica que o princípio
“quodlibet est vel non est” não valeria para Deus, pois não é um
quodlibet, ou seja, não é finito, mas totalidade e unidade infinita.
Portanto, conclui o autor, que se para o finito vale o princípio de
não contradição, para Deus valeria um princípio oposto, ou seja,
o princípio da coincidência. 68
Mantendo a relação e a diferença entre a segunda e a
terceira unidade, ou seja, entre o intellectus e a ratio, podemos
compreender, como aponta Gilbert (1999, p. 96), que não é a
ratio calculadora e discursiva, mas o intellectus que, feito para
a verdade, acompanha a fé. O intellectus é mais penetrante que
analítico, sugere Gilbert (1999). Por isso, o intellectus conhece a
res e a insere em um discurso metafísico que desposa o desejo
e a atenção da fé80. Nesse sentido, fica claro que a razão discur-
siva, determinada pelo princípio de não contradição, é incapaz
de, voltando-se para o implícito na fé, explicá-lo. Todavia, por
está mais próximo e aberto à verdade, o intellectus é capaz
de instaurar com a fé uma relação, na qual ao mesmo tempo
em que o intellectus se deixa guiar pela fé, também a estende
(a compreensão do seu conteúdo implícito) e a complementa.
Embora fé e intellectus mantenham cada um, a seu modo, uma
relação com a verdade, o fundamento dessa relação não se
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encontra em nenhum deles, mas na verdade que é Jesus. É na
escuta e na adesão ao Verbo, palavra de Deus, que fé e intelecto
se encontram. Os dois mantêm suas identidades, enquanto são
duas instâncias diversas de conhecimento, mas uma não ignora
a outra e, assim, não existe separação, isolamento ou superação.
O intelecto se dirige pela fé e a fé necessita da ação do intelecto.
Nas palavras de Beierwaltes (2003; 2005), a intelecção ou
conhecimento intelectual [Einsicht] é autoculminância da fé.
Entretanto, é o próprio Beierwaltes (2005, p. 21) a recordar: não
podemos pensar que, em todos os textos e em todas as fases
do seu pensamento, Nicolau de Cusa conseguiu “manter um
equilíbrio estrito entre ambas as formas de pensar”. Pode-se
dar o predomínio de um ou de outro âmbito com o consequente
quase “esquecimento” do outro.
Finalmente, consideramos ainda que, no texto dos
Mysteria fidei, três aspectos merecem destaque: em primeiro
lugar, as fontes cusanas são tanto a tradição filosófico-teológica
quanto o próprio texto sagrado; em segundo lugar, Nicolau 69
refere-se a Isaias 7, 9 que é o texto utilizado para fazer pensar a
relação entre fé e razão (fides et ratio) na tradição cristã medie-
val. Todavia, Nicolau impõe uma visão muito própria ao utilizar
termos que adotou do platonismo de Chartres e que, no segun-
do livro do De docta ignorantia81, por exemplo, buscava escla-
recer a relação entre criador e criatura, unidade e alteridade.
Além disso, devemos notar a vinculação entre a fé, o conheci-
mento intelectual ou intelecção e a verdade.
Quanto às fontes cusanas do texto dos Mysteria fidei,
Machetta (2010, p. 452) lembra que a invocação aos “maiores
nostri” não exclui os filósofos da antiguidade e, nesse sentido,
essa tradição não é somente patrística, mas também filosófica.
Por isso, não somente Agostinho, mas também Aristóteles,
com a pressuposição dos princípios primeiros, pode ser
incluído entre esses antepassados. Tendo em vista o exposto
anteriormente, Machetta (2010, p. 453) observa que a fé deve
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ser considerada aqui como “[...] um precedente necessário
para justificar os princípios que sustentam as conclusões.
Portanto, não tem aqui um especial matiz religioso”. Caso essa
interpretação seja justa, parece-nos que não podemos reduzir,
no texto que estamos analisando, a função da fé a início e
fundamento apenas do saber teológico (BONETTI, 1973, p. 16).
Claro que não devemos esquecer que a outra fonte cusa-
na é o texto de Isaias 7, 9 (“Se não acreditardes, não entende-
reis”)82 e que, lido à luz da tradição, tanto agostiniana quanto
anselmiana, coloca Nicolau dentro da problemática mais geral
da relação entre fé e razão (fides et ratio) já clássica na Idade
Média. A utilização dos termos dialéticos complicatio e explicatio,
porém, parece indicar que Nicolau não pretendia simplesmente
demarcar uma dependência do intelecto em relação à fé e,
portanto, mostrar que entre fé e intelecto não existiria uma
contraposição insuperável. A partir dos textos cusanos cabe-
rá uma leitura que não acentue a diferença, mas evidencie a
mútua reciprocidade entre esses dois momentos e, por isso, a 70
necessidade de pensar a relação entre fé e intelecto a partir de
uma dialética dinâmica que encontra na referência à verdade o
seu princípio e o seu fim. Assim, tendo em vista que a garantia
de um conhecimento intelectual verdadeiro é um fundamento
indubitável, Nicolau se volta novamente para o contexto da
teologia da revelação ao identificar a fé perfeita com a verdade
que é Jesus. A verdade é o fundamento sobre o qual repousa
qualquer conhecimento intelectual verdadeiro, mas também é
o fim para o qual ele tende, pois alcançar a verdade é o que
anseia todo aquele que deseja saber83.
Apesar de se ligar diretamente à tradição filosófico-teo-
lógica, como vimos anteriormente, Nicolau de Cusa utilizará
conceitos e termos próprios para explicitar tanto a relação
entre fé e intelecto como também para explicar o conteúdo da
fé em Cristo. Citemos alguns exemplos. Ainda no texto citado
acima, a relação é pensada por meio dos termos complicatio e
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explicatio. No entanto, logo em seguida, ele esclarece que a fé em
Cristo pode ser “estendida e explicada” segundo a doutrina da
douta ignorância. O fiel, por meio de um processo ascendente, é
conduzido na douta ignorância a superar a razão e a inteligên-
cia e a contemplar o Verbo
[...] incompreensivelmente no corpo de modo incorpóreo,
porque espírito, e no mundo não de modo mundano, mas celes-
tial e incompreensível, e para que assim se veja que ele não pode
ser compreendido por causa da excelência da sua imensidão85.
Aqui, como podemos perceber, domina o tema da
compreensão incompreensível, ou seja, a douta ignorância.
Outro texto pode deixar mais claro ainda a utilização desse
conceito para a compreensão da força da fé. Nicolau afirma
que, se “[...] arrebatados à intelectualidade mais simples [...]”,
se poderia ver coisas que não podem ser reveladas enquanto
estão “[...] para lá de tudo o que é ouvido e de toda a doutrina 71
expressa por palavras”. E explica que se essas coisas pudessem
ser ditas, então seria dito o que não é dizível, ouvido o que não
é audível, “[...] tal como aí se vê o invisível”86.
Ainda é importante recordar, no âmbito desse texto, a
articulação entre a doutrina do Verbo e a palavra humana que
será posteriormente tão importante em todo o pensamento
cusano. Lembramos que em muitos textos cusanos a linguagem
humana será o símbolo para se pensar a relação trinitária e a
relação entre Deus e o mundo e, da mesma forma, partindo
dos conceitos próprios à teologia da revelação, Nicolau de
Cusa poderá explicar a sua compreensão sobre a linguagem.
Portanto, articulam-se aqui tanto os conhecimentos derivados
da revelação quanto conceitos ligados à compreensão sobre a
linguagem humana. Por exemplo, Nicolau afirma que toda pala-
vra procede e para Jesus retorna como ao seu termo e que ele
é o fundamento do que há de verdadeiro nela. Por outro lado,
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Nicolau afirma também que “as palavras representam-se na
escrita”, que “toda a palavra corporal é sinal do verbo mental.
E a causa de todo o verbo mental corruptível é o verbo incorrup-
tível, que é a razão”; depois, citando o Salmo 33 (32), 6, recorda
que “no Verbo do Senhor foram estabelecidos os céus com
firmeza”. Assim, Nicolau poderá concluir que “todas as coisas
criadas são, por isso, sinais do Verbo de Deus” e, “porque o verbo
se fez carne”, “Cristo é a própria razão encarnada de todas as
razões”. Vemos claramente o tema da criação ex nihilo ser pensa-
do a partir da analogia com as palavras humanas. As criaturas
são sinais do Verbo de Deus, do mesmo modo que as palavras,
enquanto faladas e escritas, são sinais do verbo mental87.
Por último, Nicolau de Cusa retoma os conceitos de
máximo e mínimo e a doutrina da coincidência entre eles já
expressa tanto no Livro I quanto no Livro II do De docta igno-
rantia para pensar em que sentido se deve entender o fato de
que a fé é poderosa. Grande é a fé que é atuada na caridade
que une a Cristo, fundada na “santa esperança”89 e capaz de 72
tornar o homem “cristiforme”90. Para Nicolau, “a fé perfeita em
Cristo” deve ser “a mais pura e a maior” e sem mistura, e aquele
que possui uma “fé grande” se une a Cristo e opera como ele.
É nesse contexto que o autor retoma a dialética da coincidência
de máximo e mínimo ao afirmar que o mesmo se dá com a fé
“que é máxima de modo simples”. E pensada a partir daquele
que deseja possuir uma fé como a de Cristo91, Nicolau aponta
para a necessidade de “[...] que a fé nele seja elevada a um tal
grau de certeza indubitável que seja também fé de um modo
mínimo, sendo antes uma suma certeza sem hesitação em coisa
alguma”92. Por último, Nicolau lembra que essa fé poderosa,
“que é de tal modo máxima que é também mínima”, talvez não
possa ser atingida no mesmo grau por todos “devido à impossi-
bilidade da igualdade”, mas que cada um deve crer “em ato de
modo máximo”, de modo que se alguém tiver “uma fé como um
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grão de mostarda”, como na parábola evangélica, ela será tão
poderosa que moverá montanhas93.
Retomemos brevemente o contexto no qual a doutrina
da complicatio-explicatio surge no De docta ignorantia, tendo em
vista a importância que esses termos dialéticos adquirem no
texto sobre os Mysteria Fidei, pois ali se afirma que “a fé é o
que complica em si tudo o que é inteligível. E o conhecimento
intelectual é a explicação da fé”. Em primeiro lugar, devemos
recordar que os termos complicatio e explicatio são utilizados
nos capítulos XXII, XXIV e XXV do primeiro livro. No primeiro
caso são aplicados ao problema da providência divina94 e nos
outros dois capítulos são aplicados à questão do nome divino95.
Mas, como nos mostra André (1997, p. 189), “[...] a verdadeira
tematização dos conceitos de “complicatio” e “explicatio” e a
sua aplicação à relação entre Deus e as coisas é feita no Capítulo
3 do Livro II do De docta ignorantia” intitulado “Quomodo maximum
complicet et explicet omnia inintelligibiliter”.
O título do capítulo acima citado indica o modo como 73
a doutrina da complicatio-explicatio deva ser entendida: no
âmbito da coincidência e da incompreensibilidade. Parte-se da
aceitação já proposta no primeiro livro de que existe apenas
“[...] um máximo com o qual coincide o mínimo em que a
diversidade explicada não se opõe à identidade complicante”96.
Daí que a unidade infinita deva ser pensada como a única
“complicação de tudo”, ou seja, “[...] Deus é o que complica tudo
pelo fato de que tudo está nele. E é o que tudo explica pelo fato
de que ele está em tudo”.97 Portanto, devemos concluir que a
redução dessa conclusão a um puro “Deus está em tudo e tudo
está n’Ele” sem levar em consideração a relação dialética da
complicatio-explicatio inevitavelmente nos leva a suspeitar que
Nicolau de Cusa seja panteísta, pois parece não haver distinção
entre criador e criatura.
Nicolau de Cusa sabe desse perigo e, por isso, procura
mostrar, através de exemplos, como podemos nos aproximar
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do discurso da coincidência. Assim, o modo como a unidade
infinita une todas as coisas pode ser previsto pela relação que
se dá entre a unidade numérica e a pluralidade do número:
“[...] assim como no número que explica a unidade não se
encontra senão a unidade, assim em todas as coisas que são
não se encontra senão o máximo”98. Posteriormente, Nicolau
retoma a ideia de que “o número é a explicação da unidade”99 e
propõe que, como o número nasce da mente pelo modo como
a mente pensa “como sendo singularmente muitas coisas uma
coisa que é comum”, também “a pluralidade das coisas sai da
mente divina”. A criação é pensada, portanto, como o resultado
do entendimento divino. Por exemplo, embora possamos dizer
que a humanidade é participada igualmente em cada indivíduo
humano, não se deduz daí que cada um deles participe igual-
mente da humanidade. Se tal fato acontecesse, não teríamos
uma pluralidade de indivíduos humanos. Da mesma forma,
[...] como as coisas não podem participar igualmente da 74
própria igualdade de ser, Deus, na eternidade, compreende
uma assim, outra de outro modo, daí surgindo a pluralidade,
que nele é unidade99.
Todavia, além da relação entre os números e a unidade
matemática, Nicolau propõe outras relações que podem aclarar
a sua proposta: assim como o número é a explicação da unidade
matemática e essa unidade é a sua complicação, também o
mesmo vale para a relação entre a quantidade (linha, superfície
e corpo) e o ponto, para o movimento e o repouso, para o tempo
e o agora ou presente, para a diversidade e a identidade, para a
desigualdade e a igualdade, para a divisão e a simplicidade100.
Portanto, podemos afirmar, por um lado, que Deus é
todas as coisas e todas as coisas em Deus são Deus; por outro
lado, devemos dizer que Deus não é nenhuma das coisas, pois
a unidade infinita complica em si a pluralidade e a alteridade,
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que, por sua vez, é a mesma unidade infinita explicada, ou, dito
de outra maneira, o mundo é, explicative, Deus e Este é, compli-
cative, o mundo. A explicatio nos diz que Deus não é as coisas
e a complicatio afirma que, em Deus, não existe composição.
No caso da relação entre fé e conhecimento intelectual, pode-
ríamos interpretar, a partir dialética da complicatio-explicatio,
que no modo da complicação se dá uma identidade entre esses
dois âmbitos, mas no modo da explicação se dá uma diferença.
O conhecimento intelectual é explicative a fé e esta é complica-
tive o conhecimento intelectual. Porém, ambos os modos de
conhecer estão vinculados à única verdade que é Jesus. Por sua
vez, essa mesma verdade também sugeriria que não se dá uma
confusão entre a teologia e a filosofia, ou seja, não se dá nem
uma identificação que implique que uma se reduza à outra
nem uma diferença que implique uma luta de oposição entre
uma e outra. As duas se encontram fundadas na mesma verda-
de e dialeticamente nos conduzem a essa. 75
O nosso objetivo na reflexão acima sobre esse texto
específico do De docta ignorantia era mostrar que a articulação
entre fé e intelecto, entre teologia e filosofia percorre um arco
dialético e isso se mostrou na compreensão de que a fé dirige
o conhecimento intelectual, mas a compreensão do que está
implícito nas certezas assumidas na fé aumenta com a atuação
do intelecto. O intelecto busca compreender as certezas de
fé e, nessa tentativa, se deixa fundar por ela. A fé se permite
ao intelecto deixando com que suas verdades se abram à
compreensão intelectual. Embora a relação dialética se mostre
nesse entrelaçamento entre teologia e filosofia, não devemos
esquecer que o pensamento cusano não se deixa compreender,
se esquecermos que esse sempre se funda em um pressuposto
último101 e que no texto sobre os Mysteria fidei se encontra
expresso em suas últimas palavras: “Nulla autem perfectior fides
quam ipsamet veritas, quae Iesus est”.
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2.2 ESPECULAÇÃO E CONJECTURA
Percorremos um longo caminho ao tentarmos pensar o
modo próprio da especulação de Nicolau de Cusa. Partimos do
princípio de que ele se insere no horizonte teológico-religioso
medieval e a sua “mundividência cristã”, na expressão de André
(1997), não pode ser excluída da sua metafísica. Em outras pala-
vras, não é apartando ou separando o conteúdo teológico ou
religioso que o “filosófico” surge no pensamento cusano, mas
é preciso antes aceitar que uma ação desse tipo esvaziaria a
sua posição fundamental. Daí a necessidade de se compreender
como a teologia e a filosofia, a fé e o conhecimento intelectual se
encontram e se afastam circunscrevendo a especulação cusana.
Nesse sentido, os intérpretes do pensamento cusano, citados
acima, são unânimes em afirmar que, em Nicolau de Cusa, a
relação entre filosofia e teologia deve ser pensada a partir de
um mútuo entrelaçamento dialético e dinâmico em que a fé e
o conhecimento intelectual se interpenetram e se complemen- 76
tam. Entretanto, a importância dessa questão não se resume
simplesmente a situar Nicolau de Cusa entre os medievais.
Beierwaltes (2005, p. 11) nos lembrou de que a relação entre
filosofia e teologia toca a estrutura e a intenção fundamental da
especulação cusana.
Podemos encontrar diversos exemplos que nos ajudam a
pensar esse entrelaçamento dialético entre teologia e filosofia.
Vimos que a unidade literária do De docta ignorantia pretendida
pelo próprio Nicolau pode ser tomada como o símbolo de uma
unidade interna tanto desse texto como de toda a sua especu-
lação. André (1997) e Machetta (2010) sugerem que a unidade
desse texto é sustentada e alimentada por pressupostos teoló-
gicos pensados à luz do conceito de “máximo”. Por isso, o
terceiro livro não pode ser visto como algo à parte e separado
do restante da obra; não deve ser visto como menos filosófico
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em relação aos outros, mas a antropologia cristológica do De
docta ignorantia se insere e se articula com os outros dois livros e
com outras obras cusanas.
Após garantir essa unidade interna do pensamento cusa-
no, nós nos debruçamos sobre o texto dos Mysteria fidei para
compreendermos como o próprio Nicolau pensou a relação entre
fé e conhecimento intelectual. Tendo em vista que, com esta
questão, o Cardeal de Cusa também se insere no problema mais
amplo da relação entre a fé e a razão (fides et ratio), pareceu-nos
importante elucidar o vocabulário por ele utilizado. Em primeiro
lugar, vimos com Beierwaltes (2003; 2005) que Nicolau pouco
refletiu sobre o significado de termos como filosofia e teologia,
mas que uma compreensão desses dois modos de saber seria
possível tanto por meio de outros conceitos que a eles perten-
cem como por meio de uma reflexão sobre a relação entre a
razão [Vernunft] (ratio, intellectus), a intelecção [Einsicht] (intelli-
gere, videre), a compreensão (comprehendere), ou o saber (scire)
com a fé (credere, fides). Em segundo lugar, citamos a oitava tese 77
de Hopkins (1996a; 1996b), na qual ele advertia que a distinção
entre ratio e intellectus, no contexto da relação entre fé e razão,
não desempenha nenhum papel importante. Segundo Hopkins
(1996a; 1996b), como vimos, nesse contexto Nicolau usa esses
termos em sentido não técnico e de acordo com linguagem
teológica comum. Da mesma forma, Hopkins (1996a; 1996b)
recordava também que o caráter racional da mente humana
abrange tanto a razão quanto o entendimento. Mesmo assim,
tentamos mostrar que manter a distinção entre a razão e o inte-
lecto era necessário tanto de um ponto de vista textual, como
também tendo em vista que essa diferença aparece no De docta
ignorantia, mesmo não tematizada completamente no contexto
de uma gnoseologia, tornando-se imprescindível para se pensar
os aspectos centrais da metafísica cusana.
O texto dos Mysteria fidei não somente mostra em que
sentido podemos pensar a relação entre fé e conhecimento
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intelectual, mas também que na própria especulação cusana
filosofia e teologia estão intimamente imbricadas. Tentamos
evidenciar esse íntimo entrelaçamento ao mostrar que, no
restante daquele texto, Nicolau utilizará o seu próprio voca-
bulário para compreender a fé que se fundamenta em Cristo.
Algumas afirmações são bastante esclarecedoras a esse respeito.
Por exemplo, quando Nicolau de Cusa afirma que a fé em Cristo
pode ser “estendida e explicada” por meio da doutrina da douta
ignorância ou quando ele afirma que, na douta ignorância, o fiel
supera a razão e a inteligência e contempla o Verbo. Também
quando ele utiliza a sua doutrina da compreensão incompreen-
sível e a da coincidência de máximo e mínimo. Tudo isso nos
mostrou, portanto, que o pensamento cusano se funda e se
desenvolve no entrelaçamento dinâmico e dialético de fé e
intelecto.
Determinado, assim, que o entrelaçamento entre a fé e o
conhecimento intelectual deve ser pensado a partir da relação
dialética revelada pela doutrina da complicatio-explicatio que 78
insiste na coincidência no modo da complicação, mas também
na diferença no modo da explicação, devemos nos perguntar
como podemos nomear um pensamento que assim se constrói.
Nicolau, em algumas ocasiões, para referir-se ao próprio pensa-
mento, utiliza o termo conjectura. No De filiatione dei (1445),
Nicolau de Cusa refere-se aos seus escritos anteriores (De docta
ignorantia, De coniecturis e De quaerendo deum) como aqueles que
exprimem as suas conjecturas gerais102, mas também se refere
ao pensamento exposto nesse texto como sendo as suas conjec-
turas sobre a théosis103. Também no De venatione sapientiae (1463)
afirma que as suas conjecturas de caça se fundam em que existe
uma só causa de tudo104. Não se faz necessário retomar todas
as obras de Nicolau de Cusa para percebermos que o termo
conjectura sempre assume um significado muito preciso e que
foi determinado já no De coniecturis105. No Prólogo da primeira
parte dessa obra, ele afirma que ilustrará a sua concepção
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de conjectura e que, para esclarecer com mais facilidade o
segredo das suas conjecturas, desenvolverá o seu texto em dois
momentos, sendo que é no primeiro que o seu discurso poderá
esclarecer “a arte geral das conjecturas” (ars generalis coniectu-
randi)106. Diferentemente, no De docta ignorantia, ele se refere ao
seu pensamento expresso nessa obra como “um certo modo de
raciocinar sobre as coisas divinas”107.
O fundamento das conjecturas, ainda segundo o Prólogo do
De coniecturis, é o princípio já estabelecido no De docta ignorantia
de que a precisão da verdade é inatingível108 e, portanto, todas as
nossas afirmações sobre a verdade são conjecturas, pois não há
proporção entre a nossa ciência e aquela máxima. Essa despro-
porção, contudo, não se limita apenas a essa relação, podemos
dizer, vertical entre as nossas afirmações e a verdade máxima.
Também em um plano horizontal, no plano das relações entre
os próprios conjecturantes, não se dá precisão. Existe, por isso,
tanto uma “diferença de grau” das conjecturas “em relação
à identidade com o verdadeiro que permanece inatingível”, 79
ocasionando a diversidade das conjecturas, quanto impossibili-
dade de que alguém compreenda uma conjectura com precisão.
Segundo Nicolau, como os próprios conjecturantes estão na
diversidade e na alteridade, é impossível a alguém se aproxi-
mar do sentido das conjecturas de outro, ninguém consegue
compreendê-las plenamente. Por isso, Nicolau sugere que
também suas descobertas sejam acolhidas como conjecturas109.
Os termos conjectura e precisão manifestam a relação
que se dá entre a verdade infinita e o conhecimento possível
que dela podemos ter. Mas, como vimos, a precisão não se dá
também entre os conjecturantes, pois é sempre possível se
conhecer melhor a conjectura de outro. A carência de precisão
não faz da conjectura um juízo sem fundamento. Pelo contrário,
o caráter positivo da conjectura deve-se ao fato de ela se fundar
na própria verdade, embora seja dela um “decaimento”. É uma
queda da unidade na diversidade e, portanto, da precisão na
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
conjectura: da unidade divina para a diversidade do intelecto;
da unidade do intelecto para a diversidade da razão e da unida-
de da razão para a diversidade dos sentidos110.
Nicolau de Cusa propõe pensar a vinculação da conjec-
tura com a verdade por meio do conceito de participação.
Como a origem das conjecturas é a mente humana e esta parti-
cipa, enquanto similitude de Deus, da fecundidade da natureza
criadora, também a conjectura será pensada como partici-
pando da verdade. O mundo das conjecturas vem da nossa
mente, assim como o mundo dos entes vem da mente divina111.
Assim, é próprio da mente divina compreender as coisas tais
como elas são em si mesmas, mas a nossa mente que participa
na diversidade e na alteridade da mente divina imparticipá-
vel não compreende as coisas em si, mas na diversidade e na
alteridade. Se a unidade, enquanto idêntica a si mesma, não
se comunica, não se explica e é em si mesma inatingível; e,
se cada coisa é o que é apenas no seu modo próprio de ser e
em outro é de outro modo, isso significa que somente em sua 80
própria unidade ou região algo é idêntico a si mesmo, mas que
em outra é de outro modo. Por exemplo, na unidade racional, o
círculo possui todas as suas perfeições, é preciso. No entanto,
na unidade sensível não existe um círculo tão preciso que não
possa se dar um outro ainda mais preciso. Portanto, a unidade
racional decai na variedade da unidade sensível. O mesmo se
dá com a verdade, pois o intelecto finito, que não é a própria
verdade, não pode compreendê-la de modo preciso ou como
é em si. Somente o intelecto divino, pelo qual todas as coisas
existem, pode colher a verdade das coisas tais como elas são.
Quanto ao intelecto finito que é outro em relação à verdade
inteligível, ele entende a verdade das coisas com alteridade e
de várias maneiras. Entretanto, a verdade em si, na identida-
de da unidade divina, não é outra em relação à verdade que
se compreende na alteridade do intelecto, pois a identidade
inexplicável se explica de modo variado e diverso na alteridade
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
e essa mesma alteridade se complica concordando na unidade
da identidade. Assim, a verdade decai da unidade divina para a
alteridade do intelecto.113
O fundamento dessa possibilidade, ou seja, da possibili-
dade de que o intelecto humano possa colher a verdade, mesmo
que na alteridade, está ligado à participação da mente finita na
mente divina infinita que não se participa como é em si mesma,
mas na alteridade e na variedade. Por isso, se em relação à verda-
de podemos afirmar que a mente divina é plenamente em ato, o
mesmo não se pode dizer da mente finita. Pelo contrário, deve-
mos supor que o que nos convém como possibilidade (entender
a verdade tal como ela é) convém a Deus como algo que lhe é
próprio114. A conjectura, portanto, é uma afirmação positiva que
participa da verdade, como é em si, mas na alteridade115.
Segundo Beierwaltes (2005), porém, o que poderia
caracterizar de modo mais apropriado o “status teórico” do
pensamento cusano é o termo “especulação”77. Com essa ideia,
Beierwaltes (2005) pretende se afastar tanto das interpretações 81
de K. Jaspers quanto de algumas formulações de K. Flasch.
O termo “especulação” possui um sentido genuinamente cusa-
no que não se confunde, para Beierwaltes (2005, p. 19), com o
sentido hegeliano, jaspersiano nem com o sentido presente
na linguagem cotidiana atual. Assim, speculatio, em sentido
cusano, refere-se a “um ver compreensivo do que em si mesmo
é incompreensível”78 e, ao mesmo tempo, esse termo também
indica o elemento conjectural na razão finita. Esse sentido pode
ser vislumbrado, como no De filiatione dei, a partir do exemplo
dos espelhos79. O que Nicolau pretende é conduzir80 Conrado, a
quem o De filiatione dei é dirigido, a compreender de que forma
se pode conseguir a filiação divina, ou seja, a visão clara e face
a face de Deus e do seu Verbo, levando-se em consideração que
Deus permanece incompreensível.
Em conclusão, qualquer uma das expressões, “uma filo-
sofia na teologia” (PEREIRA, 2010, p. 66), uma “teologia na
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONTEXTO DE QUESTIONAMENTO E O HORIZONTE TEOLÓGICO-
RELIGIOSO MEDIEVAL
filosofia” ou “filosofia na teologia” (HAUBST apud CASARELLA,
1992), ou ainda uma “teologia filosófica ou filosofia teológica”
(BEIERWALTES, 2005, p. 115), pretendem, ao tentar sintetizar
o pensamento cusano, levar-nos a pensar no entrelaçamento
e na vinculação dialética entre fé e intelecto que o funda, o
constitui e o direciona. Porém, Claudia D’Amico argumenta que
é a inutilidade dessas alternativas que revela “o mais genuíno
do pensamento cusano” (2003, p. 24)120. Além disso, acredita-
mos ser necessário excluir qualquer tipo de pensamento que
tenha como objetivo diminuir qualquer um desses polos para
fazer sobressair um ou outro aspecto do pensamento cusano
e, portanto, cremos que os termos conjectura e especulação
podem, enquanto termos genuinamente cusanos, melhor do
qualquer outro termo construído a propósito indicar o status
teórico do pensamento cusano.
82
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
3 CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Tendo identificado no mútuo entrelaçamento entre filosofia e
teologia,121 pensado a partir da dialética da complicação e da
explicação, o núcleo ou ponto central a partir do qual pudemos
circunscrever e delimitar a estrutura do pensamento cusano,
também mostramos o contexto no qual surge e de modo
especial se desenvolve a doutrina da complicatio-explicatio.
Será justamente a partir de algumas afirmações do De docta
ignorantia concernentes à doutrina da coincidência, que Wenck
acusará Nicolau de Cusa de fazer coincidir o Criador e a criatura
e de eliminar a Trindade. A resposta cusana baseou-se em pensar
a vinculação entre Criador e criatura a partir da relação dialética
da complicatio-explicatio e sobre a Trindade, em reafirmando o que
ele já havia escrito no De docta ignorantia, ou seja, a coincidência
na “simplicidade infinita” entre a unidade e a trindade. Tanto a
doutrina da criação quanto a doutrina da Trindade, núcleo da fé
cristã, são reafirmadas por Nicolau de Cusa contra as acusações
de heresia de Wenck.
Esse núcleo da fé cristã é articulado como fundamento do
pensamento cusano por André (1997). Em primeiro lugar, André
(1997, p. 72) reconhece a “profunda originalidade” da doutrina
cristã da creatio ex nihilo em relação à crença grega na eternidade
do universo. Em segundo lugar, ele afirma que, embora essa
doutrina não tenha sido “explicitamente tematizada” em deter-
minados contextos da idade média, ela está presente
[...] em todo o filão místico que, com raízes no Pseudo-Dionísio,
atravessa subterraneamente a Idade Média e aparece com toda
a sua evidência em João Escoto Eriúgena, na Escola de Chartres
e em Mestre Eckhart (1997, p. 72);
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
e, por influência desses, em Nicolau de Cusa. Finalmente
André (1997) considera que essa doutrina recebida da fé
como “dado adquirido” coloca para Nicolau o problema
do “fundamento” ou do “sentido” da criação. Em termos
filosóficos, assegura André (1997, p. 73), este é o problema
“[...] do sentido da diferença e da multiplicidade na sua arti-
culação com a identidade e a unidade originárias fundantes
[...]”; numa outra perspectiva, trata-se “[...] do problema da
presença de Deus no mundo das criaturas [...]” ou, filosofi-
camente falando, “[...] é do problema da sua transcendência
imanente e da sua imanência transcendente”. Esse princípio é
“[...] formulado como questão filosófica originária e principal
[...]” no De venatione sapientiae quando Nicolau afirma que
“[...] não há senão uma só causa de tudo, criadora do poder ser
feito de todas as coisas”. Por outro lado, “[...] esse princípio
divino fundante é de natureza trinitária, acolhendo, assim a
diferença na sua constituição originária [...]”. Além disso, o
segundo elemento é o Verbo ou Logos divino e esse aspecto é 84
acentuado por André, na medida em que, segundo ele, introdu-
ziria “[...] uma dinâmica de expressividade e, logo, de sentido,
nessa mesma natureza” (1997, p. 73).
Posteriormente, André (1997) considera que “[...] a teoria
da Trindade, na sua aplicação ao Máximo como princípio fundan-
te, atravessa todas as obras em que Nicolau de Cusa condensou a
densidade especulativa do seu pensamento [...]”, e que nos nomes
enigmáticos “[...] tal teoria continua sucessivamente a irromper
sob novas formulações [...]” (1997, p. 177). Por outro lado, André
(1997) afirma também que é possível deduzir que a dimensão
trinitária é um “[...] componente fundamental tanto da teoria da
criação formulada por Nicolau de Cusa, como da sua resposta ao
problema do sentido dessa mesma criação, subjacente a toda a
sua metafísica da mente”. Isso porque Nicolau reconhece nessa
dimensão trinitária tanto a afirmação da expressividade interna
de Deus quanto “[...] o ponto de partida para a tematização da
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
sua expressividade externa” e para que o entendimento huma-
no possa compreendê-la. No primeiro caso, o Logos, segundo
elemento trinitário, assumirá “[...] a dimensão do Logos criador,
ou seja, a atualização do sentido nele complicado [...]” e o nexus/
conexio, terceiro elemento trinitário, pensado
[...] a partir da ideia de nexo ou conexão do inteligível com o
inteligente, abre a possibilidade de captação dessa expressivi-
dade por parte do entendimento humano enquanto entidade
assimiladora desse mesmo sentido [...] (1997, p. 178).
Isso significa que o entendimento humano só pode
compreender a Deus enquanto Deus se mostrar na sua criação122.
Deus se mostra, no modo das nossas possibilidades, inteligível
e, nesse movimento, ele já nos direciona para ele, colocando em
cada homem o desejo de busca-lo. Com a ideia de nexus, podemos
dizer que, no retorno compreensivo do homem para Deus, ele o
nomeia. O nexus, portanto, se configura como condição para que 85
a razão possa compreender e nomear, mesmo que inadequada-
mente, o que o intelecto vê incompreensível e inominável.
Parece, portanto, que podemos aceitar que a concepção
trinitária do Máximo é, antes de tudo, uma exigência da própria
estrutura do pensamento de Nicolau de Cusa e, portanto, não
se justificaria apenas como um elemento externo tendo em
vista o cristianismo latente em sua especulação, mesmo quando
ele toma como “dado adquirido” algumas afirmações de fé.
Assim, acreditamos que a compreensão trinitária do princípio
fundante se mostrará fundamental e fecunda para a inter-
pretação da especulação cusana em seus diversos aspectos.
Pressupomos, a partir do De docta ignorantia, que o princípio
primeiro é incompreensível e inominável, mas que inadequa-
damente se deixa compreender na sua incompreensibilidade e
se deixa nomear na sua inominabilidade, na medida em que é o
visado ou desejado em nossa compreensão e em nosso discurso.123
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
É nesse contexto que a meditação sobre o nexo (nexus) ou cone-
xão (connexio) pode se mostrar fecunda, pois acreditamos que,
se o nexo (entendido como nexo do inteligente com o inteligível
e do amor amante com o amor amável) funda a possibilidade
do entendimento humano “captar” o sentido do princípio trini-
tário na sua expressividade externa (ANDRÉ, 1997), também
funda a possibilidade de que esse mesmo entendimento possa
nomear, ainda que inadequadamente, o inominável. Daí o nosso
interesse em tentar perceber como em cada um dos nomes se
reflete a Trindade e, através da Trindade, a presença do nexo.
Partiremos, portanto, da ideia de que Nicolau de Cusa
pensa o princípio trinitariamente e que a sua especulação se
nutre dos trinômios neoplatônicos, especialmente, o trinômio
unidade-igualdade-nexo, que ele recebe da Escola de Chartres.
Entretanto, a nossa reflexão sobre a Trindade visa alcançar
a concepção cusana de nexus ou connexio para indicar de que
maneira esse princípio pode ser nomeado. Após fundamentar
essa concepção pretendemos avançar para os nomes enigmá- 86
ticos, pois é também verdade que os nomes divinos, enquanto
enigmas do princípio fundante, não podem deixar de indicar
a Trindade desse princípio como o mesmo princípio fundante
se mostra trino no mundo e no próprio homem. Em síntese,
pretendemos no que se segue apontar os aspectos centrais da
compreensão cusana do princípio primeiro como uno e trino e
mostrar como essa compreensão é expressa nos nomes enigmá-
ticos e, de modo especial no possest, que ele utiliza para nomear
o princípio inominável.
3.1 UNITAS-AEQUALITAS-CONEXIO
A relação entre Nicolau de Cusa e o neoplatonismo é
atestada pelos vários textos de autores diversos com os quais
ele teve contato e os quais ele leu, comentou e citou. Já vimos,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
a partir da Apologia doctae ignorantiae, em que condições se esta-
belecem a sua relação com Eckhart e com o neoplatonismo de
Chartres a partir da doutrina da complicatio-explicatio. Também
as relações com o Pseudo-Dionísio124 e com Proclo125 são
abundantemente atestadas. O que pretendemos no que segue
é pensar a relação com o neoplatonismo da Escola de Chartres
e, de modo especial, a relação entre Nicolau de Cusa e Thierry
de Chartres principalmente no que diz respeito à especulação
sobre a Trindade a partir da tríade unidade-igualdade-nexo126. A
história da interpretação dessa relação começa com Pierre
Duhem. Para Beierwaltes (2005, p. 132), o Cardeal de Cusa se
apropria das implicações matemáticas da tríade que Thierry
havia desenvolvido na especulação sobre a Trindade e recorda
que o primeiro a perceber essa referência de Nicolau de Cusa ao
platonismo de Chartres e, especialmente, a Thierry foi Pierre
Duhem127 em um artigo publicado em 1909 intitulado “Thierry
de Chartres et Nicolas de Cues”.128
As indicações de Duhem (1909), mesmo em um contexto 87
de escassos estudos tanto do pensamento de Nicolau de Cusa
quanto das fontes nas quais ele se inspira, são importantes para
se começar a pensar a especulação cusana sobre a Trindade
e também sobre o nexus. Vale lembrar que a redescoberta do
pensamento cusano é um processo que se inicia no final do
século XIX e início do século XX e, principalmente, após o
início da publicação da obra crítica desse autor. Por outro lado,
no caso de Thierry de Chartres, Duhem (1909) se baseou no
De opere sex dierum libellus (Tractatus de sex dierum operibus), o
que o levou a pensar que Nicolau teria plagiado do chartrense a
doutrina da unidade e da igualdade e que a doutrina da connexio
pertenceria a outra fonte129. De fato, o Tractatus de Thierry de
Chartres termina apenas anunciando que se tratará também da
connexio130. Somente na segunda metade do século XX é que os
comentários ao De Trinitate de Boécio (Commentum super Boethii
librum de Trinitate; Lectiones in Boethii librum De Trinitate; Glosa
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
super Boethii librum de Trinitate) serão identificados e editados
por Nikolaus Häring. Esses três textos “[...] são escritos anôni-
mos, porém, segundo Häring, sua autoria pode ser atribuída
com bastante probabilidade a Thierry” (REINHARDT, 2007,
p. 32)131. Assim, partindo da sugestão de Duhem (1909) de que
a leitura de Thierry de Chartres pode iluminar a especulação
cusana sobre a trindade, será necessário, além do Tractatus,
também considerar os comentários anônimos ao De Trinitate de
Boécio que são atribuídos ao chartrense.132
É nesse contexto que nos parece importante a retomada
de um texto do Apologia doctae ignorantiae, no qual Nicolau se
defende da acusação de ter eliminado a Trindade133. Contra a
conclusão de Wenck de que no De docta ignorantia se chega ao
ponto em que a criatura coincide com o criador, o Cardeal de
Cusa lembra que ela não se encontra em seu texto e, pela boca
do seu discípulo, faz saber que ali, pelo contrário, afirma-se
que a criatura não é nem Deus nem nada. O que coincide em
Deus são seus atributos e é neste sentido que toda teologia é 88
circular e, com isso, concordam todos os que consideraram a
simplicidade divina134.
Entretanto, para Nicolau de Cusa, a coincidência na
simplicidade infinita de Deus é ainda mais radical135, pois
também não repugna a essa simplicidade, como ele já havia
considerado no De docta ignorantia, afirmar que Deus é tanto
uno quanto trino, tanto trino quanto uno. Portanto, quem não
considera a coincidência da unidade e da trindade não pode
compreender qualquer questão teológica. Mas o verdadeiro
sentido da coincidência não confunde as pessoas e, por isso,
mantém a distinção entre elas. Porém, como entender que na
coincidência se mantenha ainda a distinção?
Para Nicolau, o que causa embaraço a Wenck são as pala-
vras cujos significados não convêm à teologia. O que Wenck
não compreende é como se possa afirmar que, na coincidência
da máxima simplicidade e indivisibilidade, da unidade e da
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Trindade, outra seja a pessoa do Pai, outra a pessoa do Filho e
outra a do Espírito Santo136. É o significado do termo alteridade
que deve ser repensado. No âmbito da simplicidade divina, não
se dá uma alteridade que é contrária à unidade, ou seja, nesse
âmbito, alteridade e unidade não podem possuir um signifi-
cado numérico. Portanto, a alteridade numérica não convém
à Trindade divina. De fato, Nicolau toma como testemunhos
dessa doutrina um comentador do De Trinitate de Boécio e
Santo Agostinho:
[...] do fato de que no divino [in divinis] não existe número, no
qual a trindade é unidade – no qual, como diz Santo Agostinho,
se começas a contar, começas a errar – não existe propriamen-
te [proprie] diferença.137
Para o comentador de Boécio, interpreta Nicolau de Cusa,
proprie significa que in divinis não existe “diferença” segundo
o modo de “imposição” da palavra. Sabemos pelo De docta
ignorantia que os nomes são atribuídos por um movimento 89
da razão.138 Portanto, parece que é nesse sentido que o termo
“diferença” não deve ser tomado in divinis. Entretanto, não
devemos esquecer que, embora o termo “diferença” deva ser
entendido de um modo melhor, isso não significa que ele possa
ser tão perfeitamente entendido que mais perfeitamente não
possa ser entendido ainda. Assim, embora devamos superar,
para compreender o modo divino, todos os modos imagináveis
e inteligíveis, não podemos esquecer que o modo divino supera
todos os modos da nossa mente. Portanto, pergunta-se Nicolau,
quem poderá conceber de que modo seja distinto sem distinção?
Todas as imagens, comparações ou exemplos (similitudines) que
possam ser inventadas para nos aproximarmos do modo divino
são desproporcionais em relação à verdade. E, para aqueles,
que não possuem a douta ignorância, que não sabem que esses
exemplos são completamente desproporcionais, essas imagens
são muito mais inúteis do que úteis.139
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
3.2 O NEXUS COMO CAMPO DE CAÇA NO
DE VENATIONE SAPIENTIAE
Nicolau de Cusa teve oportunamente, em alguns
momentos de sua vida, a possibilidade de revisitar a sua obra140.
Vimos anteriormente como ele, para defender-se das acusa-
ções feitas por Johannes Wenck no De ignota litteratura, escreve
a Apologia doctae ignorantiae na qual, como vimos, retoma e
explica alguns aspectos importantes da sua especulação como
a doutrina da douta ignorância, a coincidência dos opostos etc.
Também esclarece sua relação com as obras do Mestre Eckhart
e, ao tratar da Trindade, retoma Agostinho e os platônicos de
Chartres. Gostaríamos aqui de retomar as discussões sobre a
concepção cusana da Trindade e, especificamente, do nexus a
partir do De venatione sapientiae (1462)141 que pode ser considera-
do o “testamento filosófico” de Nicolau de Cusa (BEIERWALTES,
2005 apud K. FLASCH, 1998142). Em todo caso, acrescenta
Beierwaltes (2005, p. 51), essa obra oferece “[...] uma autêntica 90
visão de todo o vital movimento anterior [...]” do pensamento
cusano. No Prologus do De venatione sapientiae143, Nicolau oferece
a situação histórico-concreta da sua obra, qual a sua intenção
e os motivos que o levaram a escrevê-la. Além disso, descreve
também de que modo procederá. A caça da sabedoria desen-
volver-se-á, conforme o capítulo XI, em três regiões e em dez
campos: a douta ignorância, o possest, o non-aliud, a luz, o louvor,
unitas, aequalitas, conexio, o termo e a ordem144.
Beierwaltes (2005, p. 51), apesar de admitir que a sequên-
cia dos campi apresentada no De venatione sapientiae não está
determinada pela biografia de Nicolau de Cusa nem mesmo
pelos temas tratados, reconhece, porém, que o fato de ele conti-
nuar sua caça sobre a unidade “[...] nos ‘campos’ da ‘igualdade’
(aequalitas) e do ‘nexo’ (nexus, conexio)” mostra como o tema
da “sanctissima tri-unitas” o acompanha “em toda a sua vida”
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
(2005, p. 56). Para nós, isso também significa, tal como inter-
pretou André (1997), que, como “[...] o Máximo comporta uma
estrutura relacional [...]”, a sua natureza trinitária não é algo
[...] que lhe seja acrescentado por uma exigência de natureza
externa, à margem dos pressupostos filosóficos do Cardeal,
mas antes a partir de uma determinação interna do seu siste-
ma filosófico.
Daí o autor chamar a atenção para o fato de que, no
De docta ignorantia, a dimensão trinitária do Máximo é antes
configurada
[...] filosoficamente como unidade, igualdade e nexo, para
só mais tarde operar a identificação desta configuração com
a tradicional nomenclatura teológica de Pai, Filho e Espírito
Santo (1997, p. 169)145.
Além disso, à luz da dimensão necessariamente dialógica
da especulação cusana, devemos sublinhar que o alcançado no 91
campo unitatis, a partir de uma reflexão sobre os pressupostos
da tradição “platônica” e “neoplatônica”, será fundamental
para a compreensão dos outros dois campi. Isso significa que
a unidade da trindade ou, como afirma Beierwaltes (2005), o
ser-uno da trindade são determinados neoplatonicamente. Por
último, buscaremos mostrar que tanto a reflexão sobre o campo
unitatis quanto a reflexão nos outros dois campi seguintes já são
determinadas por uma visão trinitária recebida da tradição e
que, iluminada pela revelação, ensina que a causa primeira é
tricausal, isto é, eficiente, formal e final e é una por ser trina
e trina por ser una. Entretanto, só é possível atingir a visão da
“santíssima Trindade na unidade” em enigma146. Assim, mais
esclarecedor da intensa e constante presença da doutrina trini-
tária no pensamento especulativo cusano é a sua insistência
em pensar a unidade trinitariamente por meio de trinômios
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
recebidos da tradição especulativa teológica, especialmente por
meio dos termos unitas-aequalitas-conexio que designam nessa
mesma tradição a Trindade divina.
Por exemplo, o capítulo do De venatione sapientiae, no qual
se dá a “caça” no campo unitatis, começa com uma afirmação
do De ordine de Agostinho de que a atenção de todos os filóso-
fos se centra em torno ao uno147, mas curiosamente também
se conclui com outra citação que Nicolau acredita ser do De
Trinitate de Agostinho para evidenciar que fazem “caças sápi-
das” os que veem na eternidade que a fecunda unidade gera de
si mesma a igualdade e que o amor que une procede da unidade
e da igualdade, pois são a própria simplicíssima eternidade.
Essas indicações de Nicoalau de Cusa dão conta de que o alcan-
çado com essa visão não é uma ciência, mas a sabedoria ou uma
“ciência sápida”150, e que a região na qual essa se dá não é o da
similitude perpétua ou do fluxo temporal, mas o da primeira
região, ou seja, aquela em que a unidade se encontra assim
como é eternamente151. 92
Da mesma forma, no campo aequalitatis, a igualdade é
também pensada a partir da relação trinitária, pois ao final do
capítulo Nicolau a identifica com Verbo do non aliud, ou seja, do
Deus criador que fala e que define a si e a todas as coisas. Assim,
a igualdade é pensada como forma de ser da qual participam
todas as coisas152 que são desiguais entre si. Por isso, as coisas
desiguais entre si são iguais enquanto participam da igualda-
de, mas são desiguais por participarem desigualmente. Com o
exemplo da relação entre a espécie e as coisas que dela partici-
pam, a referência trinitária se mostra claramente: a espécie é ao
mesmo tempo a unidade que une todas as coisas que pertencem
a essa espécie, é também a igualdade que igualmente forma as
coisas unidas e é o nexo ou a união de todas elas153. Quando toma-
mos por base o campo nexu, a referência trinitária se completa,
pois o nexo amoroso procede da unidade e da igualdade154. Por
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
último, o capítulo vinte e seis é uma manuductio matemática
com o objetivo de fazer ver que “a trindade da qual se falou
anteriormente”, ou seja, no campo nexu e, portanto, a unidade,
a igualdade da unidade e o nexo de ambas, “sendo unidade, é o
que pode ser”, precede o intelecto e é compreendida pela mente
humana “de modo incompreensível”155. Também importante no
contexto desse capítulo é a referência ao possest que é, dentre os
nomes divinos, aquele que em si mesmo é já nexo, revelando a
Trindade do princípio156.
Isso deve significar que o que é alcançado no campo
unitatis, ou seja, o que se logrou na compreensão do uno ou
da unidade, pensado na esteira da tradição platônica e neopla-
tônica a qual Nicolau se vincula, deve não só iluminar, mas
também sustentar e garantir a compreensão cusana da unidade
trina ou do ser uno da Trindade pensada no esteio da doutrina
trinitária. Portanto, seguindo o De venatione sapientiae, será
necessário afirmar que o alcançado no campo unitatis, a partir
da tradição platônica e neoplatônica, a qual o próprio Nicolau 93
faz menção, de Agostinho, Boécio, Platão, Proclo e Dionísio,
determina também a caça da igualdade e do nexo perseguida
nos campos seguintes.
Da unitas-aequalitas-conexio deve-se, portanto, afirmar a
eternidade, a simplicidade, a incorruptibilidade, a imutabilida-
de, a incompreensibilidade e a inefabilidade. Deve-se também
dizer que é o que pode ser e é anterior ao pode ser feito157 de cada
coisa. Isso leva Nicolau a concluir no campo nexu que a unidade,
a igualdade da unidade e o nexo de ambas, enquanto anteriores
ao poder-ser-feito e à multiplicidade, são a eternidade simples.
Portanto, não são três eternos separados, “[...] mas a própria
eternidade não multiplicável, indivisível e completamente
inalterável”158. É necessário, por isso, repensar o conceito de
diferença e de alteridade. Dá-se na Trindade uma distinção,
mas não alteridade, pois a unidade que gera não é a igualdade
gerada nem o nexo que delas procede. Entretanto, enquanto são
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o non aliud anterior ao outro, a unidade não pode ser outro, nem
outro a igualdade e da mesma forma o nexo. Por fim, enquanto
eternidade simples que é o-que-pode-ser, a unidade complica
em si de modo unido todas as coisas, a igualdade complica de
modo igual e o nexo conecta todas as coisas159.
Alcança-se também a unidade, a igualdade e o nexo a
partir do mundo e daquilo que é necessário para que o mundo
seja no melhor modo possível.160 A multiplicidade, a diversidade
e a divisão das quais nos damos conta nos remetem para uma
unidade, uma igualdade e para uma conexão que, entretanto,
não são absolutas. Dá-se multiplicidade, pois as coisas são
unas em relação a si, mas outras em relação às demais; dá-se
diversidade, pois as coisas são iguais em relação a si e, portanto,
desiguais em relação às outras. E assim como da multiplicidade
e da diversidade ou desigualdade surge a divisão, também da
unidade e da igualdade procede o nexo ou conexão. A unidade,
a igualdade e a conexão nas coisas do mundo não são absolutas,
uma vez que elas não são o-que-pode-ser. Por exemplo, todas as 94
coisas iguais, que não são a igualdade absoluta, podem ser mais
iguais ainda e só podem ser pela igualdade absoluta anterior ao
poder-ser-feito de cada coisa. Assim, anteriormente à multipli-
cidade se dá a unidade; antes da diversidade e da desigualdade
se dá a igualdade162 e, por último, antes de toda divisão se dá o
nexo, a conexão ou a união163 e, por serem o-que-pode-ser, só se
encontram in regione aeternitatis.
Tomando como parâmetro os capítulos do De venatio-
ne sapientiae nos quais Nicolau especula sobre a unidade, a
igualdade e o nexo, podemos afirmar que ele, ao tratar desse
trinômio, se refere, como vimos anteriormente, a Agostinho.
Beierwaltes (2005, p. 53) chama a atenção para o fato de que, no
campo unitatis, Nicolau não se refira aos platônicos de Chartres,
“[...] cujo pensamento foi determinante, especialmente, para
a concepção cusana da Trindade como a referência unificante
de ‘unidade-igualdade-nexo’ (unitas-aequalitas-nexus)”. A edição
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
crítica das obras de Nicolau de Cusa corrige a referência ao
texto de Agostinho e remete para três indicações nos textos de
Thierry de Chartres, nos quais a Trindade é nomeada com os
termos agostinianos 164.
Gostaríamos de aludir a outra passagem da Glossa, na
qual o próprio Thierry faz referência a Agostinho. Ao tratar dos
modos segundo os quais se pode considerar a Trindade, Thierry
afirma que Agostinho, segundo a doutrina física, encontrou
peso, medida e número como a presença da Trindade nas
coisas. Além desse modo de considerar, ou seja, segundo a
doutrina física, também se pode considerar segundo a teologia,
segundo a matemática e segundo a ética. A consideração ética
atenta para a Trindade segundo a fé, a esperança e a caridade
que os teólogos também tomam para estudo do ponto de vista
teológico. Mas, afirma Thierry, somente Agostinho considera
matematicamente a Trindade, quando diz que a unidade é no
Pai e a igualdade da unidade no Filho e a conexão e amor da
unidade e da igualdade é no Espírito Santo165. 95
Após apresentar de modo geral a unitrinidade divina
nos campos da unidade, da igualdade e do nexo, tentaremos
demarcar particularmente a compreensão cusana do nexus no
De venatione sapientiae. Vimos de modo geral que aquilo que
é afirmado da unidade é também válido para a igualdade e
para o nexo, na medida em que, tendo em vista que in divinis
ou na eternidade, a Trindade é a própria eternidade simples.
Por outro lado, sabemos que a especulação sobre cada uma
delas parte do mundo (multiplicidade, desigualdade, divisão)
e que se pode, a partir da matemática, buscar entender a
unitrinidade do princípio primeiro. No caso do nexo, como já
vimos também, Nicolau parte do pressuposto de que o nexo
se constitui antes de qualquer divisão e, como essa procede
da multiplicidade e da desigualdade, também o nexo amoroso
procede da unidade e da igualdade166.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
O vocabulário utilizado é, portanto, o da tradição
teológica e o da tradição neoplatônica. É uma unidade pensa-
da neoplatonicamente, mas, devido à revelação cristã e da
tradição teológica, também pensada trinitariamente. Assim, a
unidade gera e não é gerada, a igualdade é gerada e não gera
nem procede e o nexo nem gera, nem é gerado, mas procede.
Ora, mas, o que Nicolau de Cusa compreende como nexus?
O aspecto importante que o texto do De venatione sapientae
mostra é o fato de que ele considera o nexo como um campo de
caça pelo qual se pode alcançar a sabedoria; também reconhece
que poucos filósofos conheceram o princípio da conexão e afir-
ma ter dito e escrito muitas coisas sobre o nexo e inclusive em
vários sermões167.
Quais as indicações que o texto do De venatione sapientiae
nos sugere? Como já apontamos, o ponto de partida é a consi-
deração de que o nexo se constitui antes da divisão e, como esta
“procede da multiplicidade e da desigualdade”, assim também o
“nexo amoroso procede da unidade e da igualdade”. Isso signifi- 96
ca que se dá divisão porque já sempre as coisas estão complica-
das em uma unidade. “Caçando” na região da eternidade, vemos
que o nexo enquanto indivisível eternidade é o-que-pode-ser
e é anterior ao poder-ser-feito, e “procedendo diretamente
da unidade eterna e da sua igualdade”. Na eternidade não se
dá pluralidade e, assim, a unidade, a igualdade e o que delas
procede não são três, mas são anteriores a qualquer alteridade
e, portanto, o nexo também é eterno. Os três são uma única
eternidade simples. E, embora os termos “unidade geradora”,
“igualdade gerada a partir da unidade” e “nexo que de ambos
procede” indiquem uma distinção, deve-se, contudo, negar a
alteridade, ou seja, a unidade não é uma coisa, outra a igualdade
e outra ainda o nexo tendo em vista que são o Não-outro que
antecede o outro.168 Na sequência do capítulo, o nexo é nova-
mente denominado amorosa conexio de unidade e igualdade em
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todo existente que, por ser tudo-o-que-é a partir da Trindade,
a imita. Também é o nexus amorosus de unidade e igualdade do
princípio ou poder unificante que liga estreitamente a confusa
fluxibilidade do poder-ser-feito para que este possa ser capaz
de beleza, espécie ou forma169.
O nexo, portanto, é o que procede da unidade e da igual-
dade, que são o seu princípio muito natural. A partir delas, o
nexo, no qual elas se unem muito desejosamente, é soprado170.
Mas o desejo ou a saudade na Trindade não cedem lugar à falta.
A unidade não sente a falta da sua igualdade e, da mesma forma,
essa não sente a falta da unidade, mas sempre já se possuem.
O nexo é, assim, o mútuo pertencimento amoroso pelo qual a
unidade é já sempre a sua igualdade e vice-versa. Nesse sentido,
nega-se qualquer tipo de movimento no interior da Trindade.
Ou melhor, o nexo é o próprio movimento eterno e, desse modo,
deve-se dizer que se dá um movimento no qual ir e vir, subir e
descer, sair e entrar já sempre são o mesmo.
Olhando agora para os entes finitos que imitam a 97
Trindade, vemos que o nexo ou amor se mostra como algo muito
natural e como um invisível espírito de conexão que penetra
e atravessa todas as coisas, garantindo que elas permaneçam
firmes no que são e não se corrompam. Por outro lado, além
de manter as coisas individualmente no que são, conservando-
-as em si, esse espírito de conexão também as conecta com a
totalidade do mundo. Por último, Nicolau considera a relação
entre alma e corpo e afirma que esse é o mesmo espírito que os
conecta e que, se expirado, cessa a vivificação. O nexo, por isso,
é o que dá a vida, mantém e conserva tudo na existência; funda
a união de alma e corpo e, por sustentar a união das coisas na
totalidade, funda também o universo171.
Porém, entre todos os entes finitos que imitam em si a
Trindade, a natureza intelectual reproduz na sua relação com
a sabedoria, que é o seu alimento, aquele movimento trinitá-
rio com maior perfeição. De modo que a natureza intelectual
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encontra o seu fundamento, dele se nutre e é feliz172. Nicolau
afirma que “a natureza intelectual jamais será privada de tal
espírito de conexão, cum ipsa sit spiritualis naturae”173. Por um
lado, se ipsa se refere a natura, então a natureza intelectual,
enquanto é de natureza espiritual, não será jamais privada do
espírito de conexão, e, portanto, inteligente, inteligível e enten-
der serão sempre o mesmo intelecto. Por outro lado, se ipsa se
refere a conexio, então se afirma que a conexão é uma união de
natureza espiritual. A segunda opção parece não trazer nenhuma
novidade, pois simplesmente afirma que o espírito de conexão é
de natureza espiritual. No primeiro caso, porém, teríamos que
a natureza intelectual é de natureza espiritual e, portanto, o
nexo ou conexão espiritual lhe é muito natural. Assim, como o
nexo é muito natural à Trindade, enquanto procede da unidade
e da igualdade, da mesma forma o espírito de conexão é muito
natural ao intelecto enquanto natureza espiritual. Por isso, a
unidade e a entitas do intelecto são mantidas solidamente unidas
pelo nexo intelectual. O inteligente e o inteligível do intelecto 98
são conservados sempre unidos pelo “nexo de amor intelectual”,
pois, assim como o entender se alimenta e se nutre de uma sabe-
doria imortal, o nexo não pode morrer nem expirar jamais174.
Diferentemente do que ocorre com os outros entes que
imitam a Trindade, o nexo natural da natureza intelectual,
sempre inclinada para a sabedoria, não somente a conserva e a
mantém para que ela seja, mas a adapta àquilo que ela natural-
mente ama para que possam se unir. Nesse movimento de união,
descrito por Nicolau de Cusa, o espírito da sabedoria desce no
espírito do intelecto e o converte a si e isso os une por amor.
E, neste nexo de amor, o intelecto se alegra e vive feliz. O nexo
de intelecto e sabedoria, pelo qual a sabedoria sempre já se
dá ao intelecto e este se mantém inclinado para ela, é uma
tendência e não uma posse. Embora a sabedoria sempre se dê
completamente, o intelecto a recebe segundo a sua capacidade.
Assim, contrariamente ao que ocorre no seio da Trindade,
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a inclinação indica uma falta e, por isso, o intelecto sempre
buscará ser um com a sabedoria175. Nicolau esclarece esse movi-
mento de união, afirmando que se dá algo parecido na relação
entre o que é desejado e aquele que deseja. O desejado chega ao
que deseja de acordo com o fervor do desejo. Ou seja, quanto
mais deseja aquele que deseja, mais o desejado se fará um com
ele. E cita um exemplo do De ecclesiastica Hierarchia do Pseudo-
Dionísio: o fogo assimila a si o que a ele se une de acordo com a
aptidão da coisa assimilada176. Talvez possamos acrescentar que
o nomeado aproxima-se do que nomeia de acordo com a força
enigmática do nome.
Concluindo, podemos afirmar a partir do De venatione
sapientiae que a unidade na Trindade é pensada por meio dos
trinômios unitas-aequalitas-conexio/nexus, indicando um diálogo
ativo entre a revelação cristã e a tradição “platônica” e neopla-
tônica, especialmente o neoplatonismo da escola de Chartres.
A conexio é, na eternidade simples, a eterna indivisibilidade
de unidade e igualdade do princípio fundante e de ambas 99
procede. No entanto, também é o nexus amorosus do poder
que une o que no poder-ser-feito de todas as coisas permane-
ceria confuso, possibilitando a beleza de tudo que vem a ser.
Assim, todo existente que é tudo-o-que-é a partir da Trindade
a imita. Também o nexo mantém as coisas naquilo que elas são,
conservando-as para que sejam e as conectando com a totalida-
de do mundo. Sem o nexo que une, não teríamos um universo,
mas um caos de multiplicidade, alteridade, desigualdade e,
portanto, de divisão. Da mesma forma, esse mesmo espírito de
conexão é o que une a alma ao corpo vivificando-os. No caso
da natureza intelectual, o nexo não somente a mantêm e a
conserva, mas a adapta para que ela possa unir-se àquilo que
ela naturalmente ama, ou seja, a sabedoria eterna. E como o
entender vive dessa eterna sabedoria, o nexo entre o inteli-
gente e o inteligível do intelecto não se expira jamais. Sem o
nexo, não teríamos o entender do intelecto, pois o inteligente
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
estaria sempre separado e afastado do inteligível. Sem o nexo,
não teríamos o amar, mas o amante e o amado estariam sempre
afastados. Sem o nexo, não teríamos o desejar, mas o que
deseja e o desejado estariam sempre afastados. Sem o nexo não
teríamos o nomear, pois o que nomeia e o nomeado estariam
sempre afastados. Antes da divisão, da separação e da distância
se mostra o nexo.
Porém, parece-nos importante ainda demarcar de modo
mais específico a relação e a diferença entre o neoplatonismo e
a posição que Nicolau de Cusa, no diálogo com a tradição tanto
filosófica quanto teológica, vai assumindo. As discussões sobre
o nexus no De venatione sapientiae estiveram fundadas na ideia
de que Nicolau de Cusa pensa a unidade como uma unidade
trina e, portanto, em si mesma relacional. Além disso, também
assumimos que a unidade da Trindade é determinada neopla-
tonicamente e que o afirmado sobre a unidade de acordo com a
tradição platônica e neoplatônica deve ser afirmado da igualda-
de e do nexo e, portanto, da unidade trina, eterna e indivisível. 100
Por último, sugerimos que o vocabulário utilizado por Nicolau é
tanto o da tradição teológica cristã quanto o do neoplatonismo e
que a unidade seria pensada a partir do uno neoplatônico, mas,
ao mesmo tempo, a partir da doutrina cristã do Deus uno e trino.
Poderíamos colocar a seguinte questão: como a compreensão de
um princípio fundante-original em si relacional se coaduna ou
não na especulação cusana com a concepção do uno de sabida
influência neoplatônica? Tomemos como ponto de partida
algumas posições defendidas por Santinello (1990) e Beierwaltes
(2005), para depois concluirmos com algumas considerações
sobre a posição cusana no De principio, texto no qual a relação
entre a posição cusana e aquela do neoplatonismo de Proclo são
esclarecedoras para esse contexto177.
Em seu artigo L’uomo “ad imaginem et similitudinem” nel
Cusano178, Santinello (1990) defende que os esquemas trinitários
são continuamente utilizados por Nicolau de Cusa, uma vez que
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
o Cardeal de Cusa encontraria nesses “[...] a fundação de certas
categorias, explicativas da doutrina do ser e do conhecer”
(1990, p. 87). Segundo o autor, a atividade criativa divina é
pensada por Nicolau não como simples causalidade eficiente,
mas a modo platônico, como causalidade exemplar, e a ativi-
dade cognoscitiva humana é pensada como um procedimento
que reconstrói “[...] um mundo unitário de semelhanças e de
conexões a partir da primeira experiência da alteridade e da
multiplicidade” (1990, p. 87). Assim, a recondução da “multipli-
cidade à unidade” teria como modelo exemplar “[...] não o uno
inconexo [irrelato], mas a unitariedade de uma relação perfeita.
Tal exemplar é a relação unitrinitária em Deus” (1990, p. 88).
Esses aspectos aqui retomados rapidamente por Santinello
(1990) foram desenvolvidos em algumas páginas da sua obra
sobre a perspectiva estética do pensamento cusano. Tanto o
pensamento que pensa o mundo como relação quanto o pensa-
mento que pensa o mundo como manifestação de Deus estariam
enraizados na doutrina trinitária. Tomemos como referência 101
apenas o primeiro aspecto. Santinello (1958) parte do pressu-
posto de que “o ponto de partida é o mundo, o qual apresenta
algumas características problemáticas” como a alteridade e
mutabilidade, a desigualdade e a divisão cuja solução reenviaria
para um caráter exemplar que o mundo não possui (1958, p.
132). Entretanto, ele adverte que não se trataria de alteridade,
desigualdade e divisão absolutas, mas relativas e, nesse sentido,
implicariam a unidade, a igualdade e a conexão. Assim, como se
deve afirmar que o mundo não é absoluta unidade nem absoluta
alteridade, Santinello (1958, p. 134) aponta para o caráter rela-
cional do mundo:
A verdadeira marca das coisas está, portanto, na relação que
nelas acontece entre unidade-alteridade, igualdade-desigual-
dade, nexo-divisão [...]. O modelo dessa relação se encontra em
Deus, na unidade que é trina.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Ainda segundo o autor, esse aspecto não poderia ser expli-
cado pela unidade inconexa [irrelata] e essa era a dificuldade do
“[...] platonismo e do neoplatonismo que o pensamento cusano
encontra uma maneira de superar admitindo, com o mistério
cristão, a relação no seio do próprio uno” (1958, p. 135).
Mas em que sentido pensar o Uno a partir da relação
trinitária significaria uma superação na especulação cusana de
traços tipicamente platônicos e neoplatônicos? Até que ponto
uma possível superação corresponderia a uma ruptura com as
concepções platônicas e neoplatônicas do uno? Vimos ante-
riormente com Beierwaltes (2005) que a relação entre tradição
e inovação deveria ser pensada dialeticamente e, no caso das
especulações cusanas, dar-se-ia uma “reelaboração produtiva da
tradição” (2005, p. 50). A partir da venatio unitatis, sexto campo
da caça da sabedoria, Beierwaltes (2005, p. 56) mostra como os
“[...] princípios centrais da teoria filosófica do uno de prove-
niência neoplatônica que foram fortalecidos e ampliados pela
teologia de Dionísio [...]” inspiram e determinam essencialmen- 102
te Nicolau de Cusa. Essa é uma “referência histórica e objetiva”,
garante Beierwaltes (2005, p. 56), que se pode demonstrar em
seus aspectos concretos e “[...] não somente como uma vaga
analogia”. Não obstante, é necessário destacar para aclaramen-
to das questões que estamos colocando, que a apropriação da
tradição neoplatônica (Proclo e Dionísio) e “platônica” (Santo
Agostinho e Boécio), como afirma Beierwaltes (2005, p. 56), é
[...] o complexo fundamento para a própria determinação
posterior de Nicolau de Cusa de um pensamento do uno,
que cunha essencialmente sua concepção cristã de um Deus
trinitário, apesar da sua diferença com relação às origens
genuinamente filosóficas.
Beierwaltes sugere ainda que, ao pensar a unidade trini-
tária partindo da tríade “unitas-aequalitas-conexio”, Nicolau
de Cusa “pensa produtivamente”, ou seja, não apenas repete
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
o que “[...] Mario Vitorino, Santo Agostinho e os Platônicos
de Chartres elaboram em complexas reflexões” (2005, p. 57).
E posteriormente, na mesma página, o autor complementa que
Pensar trinitariamente o uno ou a unidade ou como coincidên-
cia dos opostos ou contraditórios, [...], ou como ser subtraído
de todo o finito, que é ao mesmo tempo autorreflexão abso-
luta, guarda certamente uma determinada diferença com
as origens neoplatônicas desta teoria cristã da unidade. À
margem de Porfírio, as filosofias do pensamento neoplatô-
nico determinantes para a história – as de Plotino e Proclo
– pensaram formas da unidade de modo diverso, que Nicolau
de Cusa (e antes dele, por exemplo, Mario Vitorino, Santo
Agostinho e Mestre Eckhart) concebem como uma unidade
em si mesma diferenciada.
Por último, chamamos a atenção para o fato de que, para
Beierwaltes (2005, p. 58), as duas formas do uno neoplatônico, o
uno/bem e o intelecto (nous), constituiriam 103
[...] no pensamento cristão uma unidade absoluta que,
enquanto referência reflexiva e enquanto ser que se pensa a
si mesmo, constitui a si mesmo como o primeiro princípio e
como o Deus único.
Além disso, Beierwaltes salienta que não se poderia
pensar “[...] a concepção cusana do ser-uno da divina Trindade
[...] sem o fundamento determinante do modelo de reflexão
primeiramente ‘platônico’”179.
Já em Identidade e diferença, Beierwaltes (1989) mostrou
que os dois aspectos do Uno neoplatônico, a sua absoluta
transcendência e a sua absoluta imanência, estão reunidos nos
termos non-aliud, idem e possest que são “três nomes cusanos
de Deus, ou melhor, as três caracterizações enigmáticas da
origem divina [...]”. Esses termos indicam que a transcendência
e a imanência devem ser pensadas de “[...] modo paradoxal,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
ou seja, contemporaneamente” (1989, p. 153). Por outro lado,
ele também sustenta que Nicolau de Cusa se distingue da
concepção neoplatônica não somente por determinar a origem
divina “[...] como origem trinitária que reflete a si mesma
(conceptus absolutus)”, mas pelo fato de que Nicolau de Cusa,
[...] guiado por uma reflexão filosófica sobre o dogma teoló-
gico da criação e da encarnação, considera de modo mais
fecundo a imanência do princípio no ente posto pelo próprio,
justamente pela valorização deste ente (1989, p. 153).
Além desse aspecto, ou seja, desses termos servirem
como nomes enigmáticos para o absoluto e para o seu operar no
mundo da diferença e da alteridade, Beierwaltes (1989, p. 166)
também considera que o que se exprime nesses nomes
[...] têm em comum com a concepção neoplatônica do Uno
absoluto o fato que esse esclarece, a partir de um ponto de
vista sempre diverso, a autoidentidade que não se exaure,
apesar do seu ser no-outro (1989, p. 165). 104
Entretanto, a admissão do dogma trinitário em sede espe-
culativa obrigará a uma reconsideração dessa autoidentidade e
também do conceito de diferença e de unidade.
Como vimos, um dos aspectos do Uno neoplatônico,
ou seja, a “autoidentidade”, continua presente na concepção
cusana que transparece pelo menos nos três nomes enig-
máticos apontados anteriormenteacima. Entretanto, essa
autoidentidade é, para Nicolau de Cusa, a “[...] autoidentidade
trinitária, ou seja, em si relacional [...]” que, segundo Beierwaltes
(1989, p. 166), é “motivada teologicamente, mas pensada na
sua estrutura de um modo totalmente filosófico, [...]”. É nesse
contexto que a “diferença” deve ser repensada, pois a autoiden-
tidade trinitária é em si mesma “diferenciada” ou “distinta”,
mas não “[...] no sentido de uma multiplicidade numérica e,
portanto, de uma alteridade que se exclui reciprocamente”.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
E é nesse sentido que deve ser interpretado o texto de A douta
ignorância: “Pois onde a distinção é indistinção, a trindade é
unidade. E vice-versa, onde a indistinção é distinção, a unidade
é trindade”.180 Portanto, conclui Beierwaltes (1989, p. 166),
como essa trindade não é numérica, ela deve ser “[...] somente
como unidade dos três antes do número três, como princípio
deste”. Isso faz com que Beierwaltes (1989, p. 167) conclua que,
enquanto unidade absoluta, a Trindade é incompreensível e
também inominável. No entanto, por ser “[...] complicada-
mente tudo o que pode ser no tempo [...]”, é a partir dela que
surge a diferenciação no “finito e determinado”. Além disso,
ele também conclui que, enquanto tal, a Trindade está acima
de tudo, “[...] mas o seu rastro é rastreável181 no ente, do qual
é fundamento criador e conservador”. Por último, Beierwaltes
(1989, p. 167) faz notar que o diferenciar-se interno da unitri-
nidade será entendido por Nicolau ao mesmo tempo como uma
“[...] autoabertura do princípio à igualdade consigo mesmo e
como retorno a si mesmo”. Esse “processo”, para o qual não são 105
pertinentes as categorias de “antes” e “depois”, será fixado por
Nicolau no movimento ternário: “unitas–aequalitas–connexio”182.
Respeitando a tese do mútuo entrelaçamento entre filoso-
fia e teologia e de que a fé põe o viajante a caminho183, seguimos
a lição de Beierwaltes (2005, p. 26) de que são diversos os textos
nos quais Nicolau faz uma “reflexão filosófica sobre enunciados
das Escrituras” e de que, no caso da Trindade, a especulação
cusana toma como ponto de partida “o predicado de unidade
como um princípio transentitativo, isto é, subtraído da distinção
real e ao mesmo tempo entitativo em um sentido eminente”
(2005, p. 27). Ainda segundo Beierwaltes (2005, p. 28), Nicolau
pensa a Trindade revelada em um consenso com as concep-
ções trinitárias amadurecidas na história da teologia cristã:
“[...] como uma tri-unidade em si mesma relacional, reflexiva,
que se constitui a si mesma em sua autopenetração”. Mas o que
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
há de filosófico na especulação sobre a Trindade?184 Responde
Beierwaltes (2005, p. 28):
O filosófico nesta especulação são trinômios, que se nutrem
ocasionalmente do desenvolvimento posterior de conceitos
neoplatônicos de unidade e ontodialética, tais como ‘ser-vi-
ver-pensar’, ‘unidade-igualdade-nexo’, ‘princípio-meio-[...]
fim’. O pensamento, teologicamente instrutivo, de uma tri-u-
nidade que se constitui a si mesma por reflexividade ou nexo
amoroso (connexio como amor Dei in se ipsum), convence por
sua estrutura filosófica e por sua fundamentação da unidade
na Trindade.185
As teses anteriormente expostas, portanto, apontam
para uma diferença entre o modo segundo o qual Nicolau de
Cusa compreende a unidade absoluta e o modo como a tradi-
ção neoplatônica compreende o Uno. Como vimos, Santinello
(1958) afirma que a dificuldade fundamental do platonismo e
do neoplatonismo era explicar como a relação e a multiplici-
dade poderiam ser geradas a partir de uma unidade irrelata, 106
e que, por sua vez, Nicolau de Cusa encontraria um modo de
superar essa dificuldade ao afirmar uma unidade em si mesma
relacional. Esse último aspecto da doutrina cusana também
seria confirmado pela posição que Beierwaltes (2005; 1989)
assume ao defender que, para a especulação cusana, a unidade
é em si mesma diferenciada, relacional, reflexiva e que a autoi-
dentidade do uno neoplatônico será reconsiderada a partir do
dogma trinitário. Porém, Beierwaltes também esclarece que a
“unidade da trindade” pensada por Nicolau de Cusa não pode
ser compreendida se não se considera o uno neoplatônico.
Portanto, se, por um lado, Nicolau de Cusa pensa a unidade
a partir do uno neoplatônico, por outro, coloca a relação e a
distinção, mas não a alteridade no seio dessa unidade a partir
do mistério cristão da Trindade divina.
É possível determinar a partir de alguma obra cusana
essa diferença? Podemos tomar o De principio como parâmetro
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
para pensarmos a diferença e a relação entre Nicolau de Cusa
e o neoplatonismo, por exemplo, o procliano. Tomemos como
ponto de partida algumas afirmações cusanas, que se encontram
na parte central dessa obra. A crítica que Nicolau faz a Proclo
é muito específica e consiste em mostrar que Proclo havia se
equivocado em um aspecto determinante da sua concepção
do Uno. Ao mesmo tempo, porém, Nicolau também aponta os
acertos de algumas das teses proclianas. Proclo teria acerta-
do ao afirmar a anterioridade e a superioridade do Uno com
relação a todas as coisas: por exemplo, quando nega que o Uno,
enquanto causa de todas as coisas, seja subsistente por si, pois
o Uno é anterior e superior a tudo que subsiste por si; também
diz que o Uno não é, pois o Uno é anterior a tudo que é e que o
Uno não está nem em um lugar nem no tempo, mas é anterior
a tudo que é espacial e temporal. E o mesmo diz de todas as
outras coisas, pois o Uno é anterior a toda afirmação e negação:
“Neste sentido, reconhece Nicolau, Proclo fala corretamente, já
que o Uno é anterior e melhor do que todas as coisas das quais 107
se podem formular proposições afirmativas e negativas”187.
Porém, Proclo teria se equivocado ao afirmar que
muitas coisas seriam coeternas e teria sustentado que o nome
autohypostaton convém somente ao “Primeiro” enquanto causa
das coisas que subsistem por si e, portanto, daquilo que enquan-
to subsistente por si é eterno. A essa causa Proclo chama o Uno,
o rei de todas as coisas e o deus dos deuses. Podemos dizer que
o foco central da crítica cusana à concepção procliana encon-
tra-se nas seguintes palavras: aquilo que Proclo determina
como eterno e subsistente por si, como as espécies, encontrar-
se-ia complicado no “Primeiro”, como em sua causa e fonte,
e explicado na eternidade. Assim, como essas coisas eternas
e subsistentes por si estariam de modo temporal e sensível
no mundo sensível, elas estariam também de modo eterno e
intelectual no mundo eterno188. Porém, segundo a perspectiva
cusana, na eternidade, ou seja, no princípio eterno, somente
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as três hipóstases, as três pessoas da divina Trindade, seriam
eternas, pois o eterno é idêntico à eternidade e a eternidade
não pode multiplicar-se, da mesma forma que também o uno
não o pode fazê-lo. O uno é imparticipável e não pode ser um
uno diminuído nem multiplicável189.
Se, por outro lado, partirmos do início do De principio,
veremos a marcha do pensamento cusano se movimentar da
consideração do uno neoplatônico, a partir do Comentário ao
Parmênides de Proclo, para uma consideração da unidade trina,
a partir de uma concepção intelectual do princípio primeiro
fundada na doutrina trinitária. O texto inicia com um versículo
do Evangelho de João (8, 25): “Tu quis es? Respondit eis Iesus:
Principium, qui et loquor vobis”190. A questão central a ser desta-
cada é o fato de Jesus referir-se a si mesmo como o “Princípio”
que, enquanto tal, “fala”. Esse versículo inicial dá a pensar tanto
a conotação trinitária do princípio primeiro quanto a ideia de
que o princípio se mostra e se exterioriza pela palavra, isto
é, também de um modo sensível191. O caminho inicial, contu- 108
do, que se percorre quando se busca investigar se existe um
Princípio, será determinado pelo Comentário ao Parmênides de
Proclo: segundo esse texto, Platão teria afirmado que o mundo
avança [para o ser] a partir de uma causa anterior, já que o
divisível não pode subsistir por si, pois o que subsiste por si é o
que pode ser. Ora, como o divisível, enquanto pode ser dividido,
pode não ser, então não é subsistente por si ou autohypostaton192.
Nos parágrafos seguintes, portanto, Nicolau enfatizará esse
primeiro aspecto, reafirmando que o “subsistente por si” ou
autohypostaton é indivisível, invisível, imóvel enquanto causa de
todo movimento, infinito, eterno e anterior à potência e ao ato.
Além disso, fazendo concordar a “doutrina de Cristo” com a de
Proclo, Parmênides, Platão e a Sagrada Escritura, Nicolau insiste
na ideia de que existe somente uma causa de todas as coisas e
conclui que Deus é a unidade ou “uno absoluto”, o autounum
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
ou o Uno per se, se bem que é melhor do que todas as coisas
nomeáveis e do que a autohypostaton193.
Como sugerimos tanto a partir do De venatione sapientiae
e sustentados também nas posições de Santinello (1990; 1958),
Beierwaltes (2005; 1989), João Maria André (1997), Claudia
D’Amico (2010; 2009; 2007; 2003) e Machetta (2004), as posi-
ções assumidas por Nicolau de Cusa, no que diz respeito ao
pensamento da unidade, encontram-se fundadas na concepção
neoplatônica do Uno, mas iluminadas e repensadas a partir
da doutrina trinitária cristã. Assim, no De principio, o caminho
inicialmente percorrido pela via das concepções proclianas
encontrará o seu plus194 na afirmação de que o Deus-Uno se
entende a si mesmo, já que entender a si mesmo é melhor.195
A partir dessa colocação, o que se segue é uma concepção
intelectualista e trinitária do Princípio-Uno. Na sequência,
Nicolau já aponta para essa compreensão ao afirmar que o
princípio que se conhece a si mesmo gera de si mesmo a razão
de si, sua definição ou logos. A razão, definição e logos indicam 109
o autorreferir-se interno do princípio a si mesmo e, ao mesmo
tempo, o modo como as coisas são vistas quando pensadas a
partir da sua unidade fundante. Além disso, essa relação ad intra
é pensada primeiramente como a relação entre a “definição”
ou “razão” com o “uno necessário” e depois identificada com
a relação entre o logos ou Verbo consubstancial e, portanto, o
Filho com o Pai, numa clara referência à doutrina trinitária que
se completa com a ideia de que o Pai, enquanto tem em si a vida,
concedeu que também o Filho a tivesse em si. Porém, ter e ser se
identificam in divinis. Por isso, a vida vivicante do Filho é como a
do Pai, ou seja, é da mesma natureza e essência.196
Para compreendermos em que sentido Nicolau afirma
que o “Filho é princípio”, devemos estar atentos ao conceito
de eternidade que Nicolau de Cusa utiliza no De principio.
Segundo esse conceito, a eternidade não deve ser considera-
da como uma “duração estendida”, mas como uma essência
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
inteiramente simultânea. Essa concepção de eternidade lhe
permitirá afirmar que o eterno e a eternidade são o mesmo.
Assim, se o princípio enquanto princípio é eterno, então o
princípio e tudo o que é eterno é a própria eternidade. Apesar
dessa coincidência ou como fruto dela mesma, Nicolau poderá
distinguir um princípio na eternidade e um principiado na
eternidade, afirmando que
não pode haver um princípio na eternidade sem um principiado
na eternidade. Porém, ver o principiado na eternidade é ver-lhe
no princípio. Daí que o principiado é o princípio principiado197.
A coincidência na eternidade entre princípio e princi-
piado, eterno e eternidade levará Nicolau à conclusão de que
na eternidade se vê “o princípio sem princípio e o princípio a
partir do princípio”198.
Na eternidade, portanto, contempla-se o princípio, que é
ao mesmo tempo, princípio sem princípio e princípio a partir do 110
princípio. Além disso, pode-se também ver o princípio princi-
piado [a partir] deles. Assim, vendo a eternidade como princípio,
contempla-se que o “princípio, o princípio principiado e o prin-
cipiado de ambos são a essência una da eternidade, a qual Platão
chama Uno”. A relação entre paternidade, filiação e o nexo de
amor procedente de ambos conduzirá a uma compreensão dessa
determinação filosófica da essência una da eternidade na trin-
dade do princípio. Porém, o exemplo paradigmático só funciona,
ao se assumir que o tempo é imagem da eternidade e que as
coisas temporais são semelhantes às eternas. Portanto, a relação
trina na única essência do princípio não parecerá inacreditável
e nela, não sem razão, pode-se de fato acreditar, pois a paterni-
dade é, no tempo, “um princípio sem princípio”, a filiação é um
“princípio principiado” e o nexo de amor que de ambos procede
é “um princípio procedente de ambos”199.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Portanto, o alcançado por meio da reflexão filosófica
coincide com a Trindade na qual acreditam os cristãos200.
Nos parágrafos seguintes, Nicolau oportunamente esclarecerá
a sua doutrina do Verbo como princípio, buscando antecipar
algumas possíveis objeções às suas especulações. Assim, reafir-
ma a sua concepção de que o Verbo é princípio mesmo quando
esse se declara que é Filho201. Além disso, sugere também que
o nome autohypostaton convém também ao Verbo202. Porém,
do ponto de vista mais estritamente filosófico, Nicolau deve-
rá mostrar que a sua posição não é contrária à posição que
afirma a impossibilidade do regresso ao infinito na busca pela
causa ou pelo princípio primeiro. Pelo contrário, frente a essa
possível objeção, Nicolau reafirma que não seria discordante
afirmar, na eternidade, “um princípio do princípio”. Por um
lado, o fundamento das posições cusanas é a afirmação, como
já vimos, de que, na eternidade, “o eterno e a eternidade e o
princípio e o principiado” coincidem. Por outro lado, Nicolau
também sustenta que suas afirmações não significam proce- 111
der ao infinito, pois elas dizem respeito a algo que ocorreria no
“infinito em ato”. Essa ideia encontraria o seu sentido naquela
noção de eternidade já apresentada anteriormente: a eterni-
dade pensada não como uma “duração estendida”, mas como
uma essência totalmente simultânea. Assim, apenas se daria
um regresso ao infinito ali onde o “contraído não é idêntico ao
absoluto”. Nesse caso, não se poderia dizer que existe um limite
do limite ou uma humanidade da humanidade, pois nunca se
chegaria a um princípio de tudo, pois o infinito, pensado a partir
da contração, não pode ser completamente atravessado203.
A nossa insistência em buscar determinar e compreender
a especulação cusana sobre a unidade trina justifica-se por acre-
ditarmos que essa especulação faz ver, por um lado, a filiação
cusana ao neoplatonismo e, por outro lado, essa mesma espe-
culação aponta para a superação da concepção neoplatônica
do uno tendo em vista a importância que a doutrina trinitária
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
assume no pensamento cusano. Esperamos ter evidenciado a
relação inconteste entre o pensamento cusano e o neoplato-
nismo, quando oportunamente mostramos que o conceito de
unidade utilizado por Nicolau não pode ser compreendido sem
essa vinculação. Da mesma forma, consideramos também ter
evidenciado que o pensamento cusano avança da concepção
neoplatônica do uno para uma compreensão trinitária do
Princípio-Uno. Buscamos mostrar a partir do De principio que
a marcha do pensamento cusano sobre o “Princípio” funda-se
na concepção neoplatônica do Uno/autoUno/Uno per se, mas a
atravessa se afundando na relacionalidade do princípio pensa-
do a partir da coincidência na eternidade entre princípio sem
princípio, o princípio a partir do princípio e o princípio que
procede de ambos. Na eternidade, não é possível a pluralidade
de eternos e a crítica de Nicolau a Proclo se sustentava no fato
de este último ter afirmado a coeternidade de muitas coisas.
Somente a doutrina trinitária coloca a distinção na unidade
eterna sem, contudo, colocar a alteridade e a diversidade que 112
fracionaria a própria unidade.
Retomemos o nosso caminho, assumindo o De venatione
sapientiae e, especialmente, os capítulos sobre o nexus como
um “repetir resumindo”204 o já pensado sobre o nexus e, natu-
ralmente, sobre a Trindade. Pretendemos perseguir a ideia de
que o mundo e o homem, enquanto são o que são a partir da
Trindade, imita-a e, para isso, seguiremos as indicações do De
docta ignorantia e do Idiota. De mente.
3.3 DE DOCTA IGNORANTIA: O MÁXIMO
É NECESSARIAMENTE TRINO
O De docta ignorantia é apresentado pelo próprio Nicolau
de Cusa como contento suas “ideias bárbaras e frívolas” e como
“certo modo de raciocinar sobre as coisas divinas”. Nicolau
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
admite certa “novidade” no título, mas também reconhece
que ali não se encontrará algo de “desconhecido antes” e o que
chamará a atenção do Cardeal Cesarini, a quem a obra é envia-
da, é a audácia com que Nicolau trata a douta ignorância205. Ao
tentar determinar em que sentido saber é ignorar, o Cardeal
de Cusa parte do pressuposto de que o ato de conhecer para o
homem pretende ser a realização de um “desejo natural” que o
faz alcançar o “repouso da sua natureza” no objeto amado, ou
seja, na verdade que “o intelecto são e livre conhece”, “insacia-
velmente deseja atingir” e “a apreende num amplexo amoroso”.
Mas a relação entre o intelecto finito e a verdade infinita, objeto
de seu desejo e no qual encontra repouso, poderia terminar
numa oposição que coloca o intelecto de um lado e a verdade
de outro, pois a verdade mostra-se incompreensível e indizí-
vel. Porém, como o desejo não é em vão, o intelecto vai à caça
insaciavelmente, “explorando todas as coisas com um processo
discursivo que lhe é inerente”206. Percebamos que essa discussão
se liga diretamente ao texto anterior do De venatione sapientiae 113
sobre o nexo amoroso no qual o intelecto vive feliz e que, como
esse desejo é natural para o intelecto, ele o faz buscar incansa-
velmente a verdade.
Mas toda “investigação” é comparativa, pois “todos os
que investigam julgam o incerto, comparando-o em termos
proporcionais, com pressupostos certos”207. Daí Nicolau concluir
não somente que “o infinito como infinito, porque escapa a
qualquer proporção, é desconhecido”, mas também que “a
proporção, exprimindo simultaneamente acordo por um lado
e alteridade por outro, não pode ser entendida sem o núme-
ro”208. Além disso, como “a precisão na combinação das coisas
corpóreas e a adaptação exata do conhecido ao desconhecido”
estão além da capacidade da razão humana, Nicolau toma como
testemunhas Sócrates, Salomão e o próprio Aristóteles para
concluir que, “se o nosso desejo [de conhecer] não é em vão, o
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
que desejamos é saber que ignoramos”209. A douta ignorância é
justamente a posse plena desse saber, mas também a posse de
um saber que nos instrui sobre nossa incapacidade de conhecer
o infinito em si e sobre a impossibilidade de conhecermos com
precisão o reino das coisas finitas e as suas relações.
Após esclarecer o plano de sua obra dividida em três
livros e tendo o conceito de máximo como guia, Nicolau adver-
te que, para se compreender o que vai dizer, é necessário elevar
“o intelecto para lá da força das palavras” e utilizar os exemplos
como “guias, de modo transcendente, abandonando as coisas
sensíveis”, para que se possa elevar “facilmente ao simples
plano intelectual”210. Também, ao final do quarto capítulo,
encontra-se uma advertência, ousamos dizer, de tipo meto-
dológico e que, de certa forma, completa essa anterior. Nesse
capítulo, Nicolau especula que alcançamos o máximo, enquan-
to “verdade infinita”, incompreensivelmente211, e que “sendo
tudo aquilo que pode ser”212, coincide com o mínimo213. Além
disso, por estar acima de toda “oposição”, também as nossas 114
afirmações ou negações não o atingem e assim ao dizer que
“é”, devemos conceber que “não o é mais do que não é’ e ao
dizer que “não é” devemos conceber que “não é mais do que
é. Mas é isto de um modo tal que é tudo e é tudo de um modo
tal que é nada. E é isto maximamente de um modo tal que o é
minimamente”214. É para esse horizonte que escapa ao entendi-
mento e à linguagem que Nicolau pretende direcionar o olhar
dos que lerem o seu texto. Tendo em vista esse objetivo, o autor
do De docta ignorantia justamente adverte que tudo isso “trans-
cende todo o nosso intelecto”, na medida em que ao intelecto é
impossível, pela via da razão, fazer coincidir os contraditórios.
Resta ao intelecto, abandonada a via da razão, ver “incom-
preensivelmente” que “a maximidade absoluta é infinita, que
nada se lhe opõe, e que com ela coincide o mínimo”. Porém, a
advertência não se restringe apenas ao nosso modo de conce-
ber, é também dirigida ao nosso modo de dizer, pois Nicolau
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
adverte que os termos “máximo e mínimo” não são tomados na
sua acepção usual, ou seja, estando ligados à quantidade. O seu
significado não é relativo “à massa ou à força”, mas “são termos
transcendentes, com um significado absoluto”215. Só podemos
dirigir o olhar para o que a especulação cusana quer mostrar,
se transcendermos o significado das palavras e se tomarmos os
exemplos naquilo que de fato são: guias para o que transcende o
nosso modo de conhecer e de dizer. Por isso, ao iniciar o quinto
capítulo, Nicolau esboça uma pequena conclusão do que havia
afirmado nos capítulos anteriores: “[...] do que foi dito resulta
claramente que o máximo em sentido absoluto é inteligível de
maneira incompreensível e ao mesmo tempo nominável de
maneira inominável”216.
A incompreensibilidade e a inominabilidade se confi-
guram, portanto, como o modo segundo o qual o nosso inte-
lecto alcança o máximo absoluto enquanto verdade infinita.
A desproporção entre o finito e o infinito é sinal de que o máximo
simples não pode ser alcançado “onde for possível encontrar um 115
excedente e excedido [...], pois tanto o que excede como o que é
excedido são finitos, mas o máximo como tal é necessariamente
infinito”217. A partir dessa dialética entre o finito e o infinito,
Nicolau introduz, em dois momentos diferentes, a discussão
sobre a igualdade que na especulação trinitária encontrará o
seu justo desenvolvimento. No horizonte do finito, explicita
Nicolau, é sempre possível que se dê algo maior ou, como no caso
da igualdade, é impossível encontrar duas ou mais coisas tão
iguais que também não sejam possíveis outras mais iguais ainda
“num processo infinito”218. Essa mesma ideia será repetida no
contexto do quarto capítulo. O que os nossos sentidos, razão e
intelecto podem atingir distingue-se pela diferença: “[...] difere
de tal maneira em si mesmas e umas em relação às outras que
nenhuma igualdade precisa há entre elas”219. A diferença intra se
deve ser entendida por contraposição à igualdade absoluta ou
máxima do princípio220. Novamente, Nicolau retoma a asserção
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
de que a igualdade precisa não se dá no finito. No entanto, em
relação ao capítulo anterior existe um dado novo, ou seja, a
afirmação de que “[...] a igualdade máxima, que não é diferente
ou outra em relação a nada, excede todo o nosso intelecto”221.
Vejamos, em seu duplo sentido, essas afirmações sobre a igual-
dade, pois somente no âmbito da interpretação trinitária é que
elas encontrarão o seu sentido.
Para precisar em que sentido a unidade infinita convém
ao Máximo absoluto, Nicolau propõe uma comparação entre
o número, a unidade não numérica, a pluralidade das coisas
e a unidade infinita. Se o número pressupõe a unidade não
numérica como seu princípio, também “[...] a pluralidade das
coisas que deriva desta unidade infinita está para ela de modo
que sem ela não pode existir”222. Como nos números, também na
pluralidade dos entes é impossível o recurso ao infinito, daí ser
necessário se postular, tanto no número como na pluralidade
dos entes, uma unidade da qual todas as coisas derivem. A partir
desse exemplo, Nicolau pode especular que 116
[...] a unidade absoluta convém mais propriamente a Deus
inominável e que Deus é uno de modo tal que é em acto tudo
aquilo que é possível. Por isso, tal unidade não é suscetível
de mais nem de menos, nem é multiplicável. A divindade é,
assim, unidade infinita223.
O intelecto alcança na perlustração do mundo que a
pluralidade é o modo de ser das coisas e vê que a unidade infini-
ta é a sua entitas, ou seja, vê que a unidade precede a pluralidade
do mesmo modo que na matemática a unidade não numérica
precede, como princípio e fim, todo número. Portanto, se
tomarmos uma coisa, entre as que possuem nome, descobri-
remos que, em relação a ela, dar-se-á sempre algo maior ou
menor, um excedente e um excedido proporcionalmente224.
Por outro lado, a compreensão sobre o Máximo como
necessidade absoluta assenta-se na especulação sobre a
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contingência dos entes finitos que exigem um princípio para que
possam existir.225 Pode-se ver também contraindo o máximo ao
ser e à verdade, afirmando que o ser máximo e a verdade máxi-
ma são o próprio máximo absoluto. Assim, nada pode ser, nem
ser entendido ou dito algo verdadeiro que seja sem o máximo.226
Portanto, se tomarmos por base a necessidade de se retroceder
da pluralidade dos números à unidade não numérica para que se
possa explicar os números e da pluralidade das coisas à unidade
infinita, como vimos anteriormente, igualmente podemos
dizer que essa unidade infinita é também necessidade absoluta
sendo, em relação às coisas finitas e limitadas, o seu princípio e
o seu fim. Pois, como não se poderia buscar infinitamente nas
coisas finitas o que as limita, como princípio e como fim, já que
não se pode dar em ato, “nas coisas que admitem excedente e
excedido”, uma progressão ao infinito, será “[...] necessário que
o máximo em ato seja o princípio e o fim das coisas finitas”227.
O Máximo, enquanto escapa à proporção que só é possível
entre as coisas que admitem “um excedente e um excedido”, é 117
infinito, coincide com o mínimo e é ao mesmo tempo incom-
preensível e inominável. A coincidência dos opostos, pensada
a partir da coincidência de máximo e mínimo, a afirmação de
que o Máximo está acima de toda oposição e de toda proporção
comparativa, sendo unidade infinita e, por último, a afirmação
de que o Máximo é princípio e fim de tudo aquilo que é, sendo
necessidade absoluta, indica a transcendência do Máximo infi-
nito. As últimas linhas do sexto capítulo funcionam como uma
conclusão para o pensado nos dois capítulos anteriores, mas
também funcionam como uma abertura para o que será pensa-
do nos capítulos seguintes. Reafirma-se a necessária existência
do Máximo (necessidade absoluta), mas também que, enquanto
simples, isto é, anterior a qualquer oposição, o Máximo é uno.
“Por isso, conclui Nicolau, é sumamente verdadeiro que o uno é
o máximo”228. Nos capítulos seguintes, a unidade será pensada
como trina e una a partir do conceito de eternidade. Recordamos
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
que a unidade absoluta e infinita alcançada especulativamente
é reconhecida como o “Deus bendito” e, assim, Nicolau reprova
os que afirmam a existência de vários deuses. Agora se abre
a possiblidade de especular a partir da doutrina trinitária.
Talvez, mais do que em outros campos, aqui se mostre como
a relação dialética entre a filosofia e a teologia funde, anima e
mantém a especulação cusana.
Por exemplo, já nos esclarecimentos preliminares ao De
docta ignorantia, ao determinar em que sentido o “máximo”
deve ser entendido como “aquilo relativamente ao qual nada
pode ser maior” e ao esclarecer que o máximo é o uno absoluto,
que coincide com o mínimo, que é “em acto todo o ser possível”,
Nicolau identifica o “máximo” com Deus, “[...] que na fé de todos
os povos se crê”229. Isso porque “[...] nenhum povo houve que
não tenha adorado Deus e que não tenha acreditado que fosse o
máximo em sentido absoluto”; e ele, segue a autoridade de Marco
Varrão quando referiu que “[...] os Sissêénios adoravam a unida-
de como o máximo”. Mas, com relação à Trindade, não nos deve 118
causar espanto o fato de Nicolau citar primeiramente Pitágoras,
“homem de grande fama e de autoridade indiscutível”, segundo
o qual “aquela unidade é trina” e não a autoridade da tradição
cristã. Já afirmamos que a doutrina trinitária não se introduz
no pensamento filosófico cusano apenas como uma exigência
externa a esse mesmo pensamento. O fato de que o máximo
seja em si mesmo relacional e, por isso mesmo, trinitário exige
a estrutura da metafísica cusana quando compreende o mundo
e o homem como imagem do próprio princípio ou fundamento.
Assim, a multiplicidade ou alteridade, a desigualdade, a divisão
e a relação proporcional que encontramos entre as coisas do
mundo encontram sua explicação na compreensão do princípio
que em si mesmo é já relação entre a unidade, a igualdade e
o nexo. Esse aspecto também indica aquela dialética entre
filosofia e teologia própria ao pensamento cusano que também
já apontamos. Porém, o que segue é não somente um exame
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
da “verdade” da afirmação de Pitágoras, mas também uma
elevação do espírito para além dela230.
O recurso à autoridade de Varrão e à autoridade de
Pitágoras visa mostrar a validade da fé cristã em um Deus que
é uno e também trino. Porém, Nicolau reconhece que os nomes
Pai, Filho e Espírito Santo são tomados não considerando o
próprio máximo, mas considerando as criaturas: “Mas, se os
nossos santíssimos doutores chamaram à unidade Pai, à igual-
dade Filho, e à conexão Espírito Santo, fizeram-no por causa de
uma certa semelhança com as coisas perecíveis” e, posterior-
mente, “com base nesta semelhança, ainda que muito remota,
a unidade é chamada Pai, a igualdade Filho e a conexão amor
ou Espírito Santo, mas só tendo em consideração as criaturas,
[...]”231. Portanto, pode-se considerar a Trindade “tendo em
consideração as criaturas” ou tendo em vista a “semelhança com
as coisas perecíveis” e, portanto, especular sobre a Trindade a
partir do vínculo ou da relação entre o pai e o filho. Todavia,
também se pode considerar a Trindade partindo da trindade 119
pitagórica, mas superando-a por uma elevação do espírito, ao se
compreender incompreensivelmente que nem a unidade nem a
trindade são números. Por sua vez, a especulação cusana sobre
a Trindade, a partir do trinômio unidade-igualdade-conexão,
parece abarcar tanto uma consideração segundo a criatura como
também uma consideração matemática da trindade. Em primei-
ro lugar, porque se parte do mundo cujos traços característicos
são a multiplicidade, a desigualdade e a divisão e busca-se alcan-
çar o fundamento na unidade, igualdade e conexão eternas.
Em segundo lugar, porque a igualdade, por exemplo, é pensada
por meio da operação matemática na qual a unidade é multi-
plicada por ela mesma. Entretanto, parece-nos que é próprio
da posição cusana superar tanto uma consideração segundo a
criatura como também segundo o aspecto matemático-pitagó-
rico, pois os exemplos matemáticos devem ser tomados como
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
paradigmas ou exemplos enigmáticos que direcionam o olhar
daquele que especula para o incompreensível e o indizível.
O caminho que o intelecto percorre para a determina-
ção da Trindade na unidade ou para a unidade na Trindade
é o mesmo já indicado anteriormente: “[...] explorando todas
as coisas com um processo discursivo que lhe é inerente”232.
Assim, como a partir da oposição, da pluralidade e da contin-
gência dos entes finitos, alcançou-se o Máximo simples, como
uno e necessário, também a partir da alteridade ou mutabili-
dade, da desigualdade e da divisão se atinge a unidade eterna,
a igualdade eterna e a conexão eterna que, enquanto eternas,
não são três, mas uma. Na base de uma dialética de “unidade” e
“dualidade”, na qual a unidade precede e antecede a dualidade
sendo, por isso, eterna, Nicolau determina a alteridade, a
desigualdade e a divisão como o modo de ser das coisas.
A alteridade, a desigualdade e a divisão são simultâ-
neas por natureza, pois a dualidade é a primeira alteridade,
a primeira desigualdade e a primeira divisão. Por exemplo, a 120
alteridade ou mutabilidade inclui a “dualidade”, pois “consta
de uma coisa e de outra”; também a desigualdade inclui a
“dualidade” enquanto “consta de algo que é igual e de algo
que o excede” e, por último, a “dualidade é divisão ou causa da
divisão”233. Assim, ao se determinar em que sentido a unidade
precede a alteridade ou a mutabilidade sendo imutável e eterna,
também se determina em que sentido a igualdade e a conexão
são eternas enquanto precedem a desigualdade e a divisão que
são simultâneas à alteridade. Assim como a unidade, também
a igualdade e a conexão precedem a alteridade e, portanto, são
eternas. Todavia, embora simultâneas, a alteridade, a desigual-
dade e a divisão são três determinações incluídas na “dualidade”.
Na eternidade, porém, a unidade, a igualdade e a conexão não
são três, pois “não pode haver várias coisas eternas” e daí
Nicolau concluirá que, enquanto eternas, “são uma só coisa”234.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
No quinto capítulo do primeiro livro do De docta
ignorantia, vimos Nicolau, seguindo a tradição neopla-
tônica, determinar em que sentido o Máximo é uno.
Será necessário, então, compreender como a unidade, a
igualdade e a conexão é a mesma unidade na eternidade.
A unidade absoluta não é em si mesma irrelata e inconexa, pois
a igualdade e a conexão não são ‘dois’ momentos exteriores ao
uno. O encontro entre tradição neoplatônica e cristã determi-
nará de que modo Nicolau compreenderá o movimento eterno
no seio do uno. Os capítulos oitavo e nono buscam pensar
o movimento eterno intratrinitário por meio de termos da
tradição teológico-trinitária como “geração” e “processão”.
Não será exagerado repetir que nesses capítulos se mostram de
modo claro e inequívoco a presença do platonismo de Chartres.
Nesse movimento, a unidade eternamente gera a sua igualdade
e a conexão procede eternamente desse mesmo movimento.
Entretanto, o movimento no seio da Trindade não pode ser
entendido a partir da dialética da complicatio-explicatio, útil para 121
conceber a relação entre Deus e o mundo, tendo em vista que a
igualdade não é explicatio da unidade235.
A igualdade de ser é “[...] aquilo que nas coisas não é
susceptível de mais nem de menos, de nada superior e de
nada inferior. Pois se fosse demais, a coisa seria monstruosa.
Se fosse de menos, não seria”236. Assim, como a unidade é pensada
como sendo a entidade ou a forma de ser das coisas, também a
igualdade da unidade será determinada como sendo a igualdade
da entidade, a igualdade de ser e de existir237. A relação entre
a unidade e a sua igualdade, como dissemos, é determinada a
partir do termo teológico “geração”. A tradição teológica pensou
a relação entre a primeira e a segunda pessoa da Trindade divina
tomando como exemplo a relação de geração entre pai e filho.
Um modo menos inapropriado seria pensar a geração a partir de
uma simples operação matemática, pela qual a unidade é repe-
tida uma única vez238. No caso da relação entre o pai e o filho,
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
“[...] a geração é a repetição da unidade ou a multiplicação da
mesma natureza, que procede do pai para o filho”. Nas coisas
perecíveis, essa multiplicação acontecerá diversas vezes, geran-
do, assim, a multiplicidade. O mesmo não ocorrerá na “geração
da unidade pela unidade”, pois aqui o que se dá é “uma única
repetição, ou seja, é a unidade uma vez”, pois se multiplicada
duas, três ou mais vezes geraria multiplicidade, ou seja, algo
diferente de si como a dualidade, triplicidade ou outro número.
“Mas a unidade repetida uma só vez gera a igualdade da unida-
de; e com isto não se pode entender senão que a unidade gera a
unidade. E esta geração é eterna”239.
O terceiro elemento ou a conexão da unidade e da igual-
dade da unidade é determinado a partir do termo processão,
que Nicolau define como uma “certa extensão de uma coisa
para a outra”. No movimento intratrinitário, a processão é a
“unidade da repetição da unidade”. Isso significa, portanto, que
a unidade repetida uma vez, isto é, a unidade e a sua igualdade
estão unidas e ligadas [coniungat et connectat] eternamente 122
como se de uma para outra algo se estendesse [extenditur].
Como a conexão não é “unidade de uma só coisa”, a unidade
enquanto conexão procede da unidade para a igualdade da
unidade e a igualdade da unidade procede para a unidade.
Nesse sentido, a conexão procede de ambas “porque é como se
se estendesse de uma para a outra”. A conexão é o movimento
eterno pelo qual a unidade se estende ou avança para a sua
igualdade e reciprocamente240. Por fim, Nicolau considera que
é esta, “na sequência da investigação de Pitágoras [...], a mais
clara investigação sobre a Trindade na unidade e sobre a unida-
de que sempre deve ser adorada na Trindade”241.
Fizemos algumas indicações nas notas do Tractatus de
Thierry de Chartres, procurando iluminar, seguindo as indica-
ções do Duhem (1909), a concepção cusana da Trindade divina
determinada a partir do trinômio unitas-aequalitas-conexio.
Como sabemos, aquele texto conclui-se apenas indicando que
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se tratará da conexio, mas de fato não o faz. Entretanto, seria
possível indicar uma determinada compreensão da terceira
pessoa trinitária ainda a partir desse texto. Quando Thierry,
logo no início do Tractatus, discute as causas da existência do
mundo, ele afirma, seguindo o modelo aristotélico, que são
quatro, e identifica, a eficiente, a formal e a final com as três
pessoas da Trindade e a material com os quatro elementos,
ou seja, a eficiente é Deus, a formal é a sabedoria divina, a
final é a sua bondade e a material são os quatro elementos.
Segundo o chartrense, é necessário que as coisas mutáveis
tenham um autor e que, por terem sido dispostas segundo uma
ordem racional e bela, é também necessário que tenham sido
criadas por uma sabedoria. Por último, tendo em vista que o
Criador não necessita de nada, convém que as coisas tenham
sido criadas pela sua bondade e por seu amor para participar
a sua felicidade por meio desse seu amor242. Thierry, portanto,
faz com que toda a Trindade atue na matéria, isto é, nos quatro
elementos: cria a matéria enquanto causa eficiente, informa-a 123
e a dispõe enquanto causa formal e enquanto causa final a ama
e governa. Por fim, Thierry afirma que o Pai é a causa eficiente,
o Filho, a causa formal, o Espírito Santo, a causa final243. A quem
Deus participa a sua própria felicidade? Certamente àqueles
que conseguem conhecê-lo por meio das coisas criadas. Assim,
o Espírito é o que proporciona, enquanto causa final, a união do
homem com o divino na qual aquele encontrará a sua felicidade.
Na expositio littere, Thierry interpreta, na frase “et spiritus
Domini ferebatur super aquas”, o termo “aquas” referindo-se à
matéria informe e, portanto, aos quatro elementos; o termo
“spiritus” não indica o ar, ou seja, um dos quatro elementos, mas,
segundo Thierry, Moisés quer indicar, depois de delimitada a
matéria na informidade dos quatro elementos, que a potência
do artífice ou a potência operadora do artífice precede à matéria
e a domina para informá-la e ordená-la a um fim, pois, como a
matéria é por si mesma informe, só poderia alcançar sua forma
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
por essa potência operadora244. Por último, Thierry sublinha que
os filósofos deram nomes diversos a essa potência. Mercúrio a
chamou “espírito”; Platão “alma do mundo”; Virgílio “espírito”
que do interior faz viver todas as coisas; os hebreus falam de um
“espírito operador” e a esse mesmo os cristãos chamam Espírito
Santo245. Tendo concluído, na expositio littere, a interpretação
dos dois primeiros versículos, Thierry de Chartres anuncia a
primeira parte do terceiro: “Et dixit Deus: fiat lux” e afirma que,
depois de Moisés mostrar a matéria e a potência operadora
como os dois primeiros princípios da criação, quer em seguida
mostrar a maneira e a ordem segundo a qual o “Spiritus Domini”
age sobre a matéria de acordo com o modo dito e determinado
ab aeterno pela sabedoria do criador. O próximo passo da expositio
seria dizer algo sobre a divindade e são duas as questões que
precisariam ser aclaradas: o que é o dizer de Deus e por que
o texto bíblico do Gênesis mencionou primeiro o Espírito do
que o Verbo246. Como já sabemos, em continuação, determina-
se em que sentido Deus é unidade e que o “dizer de Deus” é 124
o seu Verbo, a sua sabedoria na qual estão contidas as noções
das coisas, ou seja, a igualdade da unidade. Porém, o texto se
conclui apenas indicando que se tratará do terceiro elemento247.
Portanto, a partir dessas indicações do Tractatus, podemos
concluir que são pelo menos três os aspectos segundo os quais a
terceira pessoa é pensada: causa final, virtute artificis operatrice e
conexio aequalitatis et unitatis ab utraque earum procedat.
Da mesma forma, se tomarmos os comentários ao De
trinitate de Boécio, encontraremos uma compreensão da conexio
e do seu papel, por assim dizer, no interior da Trindade e na
criação. Examinemos, por exemplo, o texto da Glossa V, 17-20:
em primeiro lugar, como antes já acenamos, Thierry destaca
que Agostinho é o único que considera a Trindade segundo a
doutrina matemática: unidade, igualdade da unidade e conexão.
A conexio é pensada como um nexus et amor que eternamente e
sem princípio vai da unidade para a sua igualdade e reflui da
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
igualdade para a unidade. Sem esse nexus et amor, unidade e igual-
dade não permaneceriam infinitas (sine fine) e, portanto, cairiam
na sucessão da mudança. Portanto, a conexio é união amorosa de
unidade e igualdade para que as mesmas permaneçam, pois sem
a unidade a igualdade não seria e sem a igualdade a unidade se
dividiria deixando de ser. Em seguida, a unitas, aequalitas e conexio
são referidas às três pessoas da Trindade248.
A partir do exposto, podemos afirmar que é possível
certo conhecimento intelectual da unidade na trindade que
deve ser pensada como uma intelecção simples. Isso significa,
no contexto do De docta ignorantia, o abandono e a rejeição de
tudo o que se conhece por meio dos sentidos, da imaginação e
da razão. Alcança-se esse tipo de conhecimento quando pensa-
mos segundo a lógica da coincidência dos opostos, pois, tendo
em vista que o máximo “está acima de todas as coisas”, deve-se
atingir uma intelecção simples
[...] em que todas as coisas são uma só, em que a linha é triân- 125
gulo, círculo e esfera, em que a unidade é trindade e vice-ver-
sa, em que o acidente é substância, em que o corpo é espírito,
o movimento repouso e assim sucessivamente.
Aqui devemos assumir que o uno é tudo e que tudo é uno;
que a unidade máxima é necessariamente trina249.
O princípio da coincidência nos envia para além do campo
da alteridade e da mutabilidade para alcançar a simplicidade da
unidade trina. Daí que a intelecção simples ultrapassa “[...] as
diferenças, as diversidades e todas as figuras matemáticas, uma
vez que [...] no máximo a linha é superfície, círculo e esfera”250.
Tendo em vista o carácter insólito de um conhecimento que
assim se mostra, Nicolau então propõe, a manuductio matemática
e a investigação por meio dos símbolos e afirma que “as coisas
espirituais, em si por nós inatingíveis” podem “ser investigadas
simbolicamente”, partindo-se do fato de que “as coisas visíveis
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
são verdadeiramente imagens do invisível”251. Entretanto, deve-
-se fazer a seguinte ressalva: “Quando se faz uma investigação
por meio da imagem, é necessário que nenhuma dúvida haja
acerca da imagem em cuja proporção transsumptiva se investiga
aquilo que é desconhecido”252.
Atento a essa cláusula restritiva, deve-se considerar que
somente os entes matemáticos permanecerão como os melho-
res elementos de comparação para se investigar as coisas divi-
nas e disto é testemunha, principalmente Boécio, mas também
Pitágoras, Aristóteles e Agostinho. Portanto, conclui Nicolau
que, seguindo os antigos, deve-se dizer que somente “é possível
ter acesso às coisas divinas” pela via dos símbolos, ou seja, deve-
-se “[...] então recorrer aos signos matemáticos como os mais
convenientes por causa da sua incorruptível certeza”.253 Mas de
que modo deve-se proceder nesta investigação? O procedimento
é tríplice254: a) considerar as figuras matemáticas finitas com as
suas paixões e razões; b) transferir correspondentemente estas
razões para as figuras infinitas, e c) transpor as próprias razões 126
das figuras infinitas para o infinito simples. Nicolau, partindo
das figuras geométricas como a linha, o triângulo, o círculo e a
esfera, mostrará como se dá esse caminho nos capítulos XIII –
XXIII do De docta ignorantia255.
Conclusivamente, gostaríamos de retomar uma afirmação
do De docta ignorância e os exemplos que Nicolau aduz para expli-
cá-la. Segundo essa afirmação, “as coisas máximas nunca podem,
pois, ser correctamente entendidas, se se não se entendem como
trinas”256. Nicolau propõe três exemplos: o primeiro refere-se
à unidade do intelecto, o segundo ao fato de que a unidade
“exprime indivisão, diferenciação e conexão”257 e, por último, a
partir da afirmação “a unidade é máxima”, determina-se que,
enquanto unidade, é “princípio sem princípio”; enquanto máxi-
ma, é “princípio a partir do princípio” e o verbo “é” une e liga,
exprimindo, assim, “a processão de um e de outro”. Para Nicolau
de Cusa, esses são exemplos adequados ou convenientes 258.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Retomaremos apenas o primeiro exemplo, pois esse
nos oferece uma determinada compreensão da Trindade e do
nexo que depois será repensada no contexto do De visione dei.259
A trindade da unidade máxima é pensada a partir da unidade
trina do intelecto finito, que é visto como “inteligente, inteligí-
vel e entender”. Operando uma transposição da intelecção fini-
ta para o máximo, devemos dizer não somente que é o máximo
inteligente, mas também que é “o maximamente inteligível
e o entender máximo” para que possamos fazer uma correta
concepção “da unidade máxima e mais perfeita”. A intelecção
máxima só pode ser intelecção e ser a “máxima e mais perfeita”
intelecção, se for correlação desses “três elementos”. O terceiro
elemento será, por isso, pensado como conexão ou nexo do
inteligente máximo com o máximo inteligível260 e, por isso,
como o ato de entender máximo.
Devemos lembrar que qualquer exemplo ou manuductio
só funciona se pressupusermos, como o faz Nicolau no início
do De visione dei, que o que aparece verdadeiro no finito é 127
mais verdadeiro ainda no próprio máximo261. Se o intelecto
finito se mostra como unidade trina de inteligente, inteligível
e entender mais verdadeiro, ainda é a unidade na trindade da
intelecção máxima. Em dois capítulos do De visione dei, Nicolau
especula sobre a Trindade divina agora também sustentado na
metáfora do “muro do paraíso”, cuja correta compreensão veta
que o princípio divino seja identificado com o alcançado inte-
lectualmente. A partir do trinômio amor amans, amor amabilis e
amoris amantis et amabilis nexus no capítulo XVII, “Deus não pode
ser visto perfeitamente a não ser como unitrino”: o nexo é visto
como “nexo infinito do amor entre o amante infinito e o infinito
amável”. E como o infinito não é multiplicável, então, Deus, que
é amor, é o amor amante, amor amável e nexo de ambos 262.
Da mesma forma que no “amor contraído” se experiencia que o
nexo do amante e do amável é “da essência do amor perfeito”,
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com mais verdade ainda se deve afirmar que em Deus, amor
absoluto, perfeito e simples, “o nexo da coincidência é o nexo
essencial”263. Determina-se, assim, que a essência divina, una e
simples, é trina. A dificuldade é justamente conceber como essa
necessidade, Deus ser uno e trino, seja possível. Como pensar
que, embora trino e, portanto, distinto em si mesmo, não se
possa concluir em Deus uma pluralidade numérica? Como é
impossível pela via da razão que um seja três e vice-versa, o que
se mostra é a impossibilidade de que a pluralidade de três “seja
uma pluralidade sem número”. Isso se mostra no “muro da coin-
cidência”, ali onde a pluralidade coincide com a singularidade, a
alteridade com a identidade e com a unidade. No entanto, Deus
habita “muito além e extremamente longínquo”264. Portanto,
essa mesma metáfora é pensada como uma barreira que deli-
mita “a potência de todo o intelecto” e, apesar de se poder ver
por sobre o muro o “Paraíso”, não se pode, contudo, “dizer nem
entender” aquilo que se vê265.
No capítulo XVIII, “Se Deus não fosse trino, não haveria 128
felicidade”, a especulação trinitária continua sendo pensada não
somente a partir da relação trina entre o amante, o amável e o
amor, mas também a partir da concepção de Deus que é intelecto
e, por ser absoluto e perfeito, é simultaneamente “intelecto
inteligente, o intelecto inteligível e o nexo de ambos”266.
Deus que é amor “não pode odiar ninguém”, mas ama “tudo o
que é amável” e liga-se a tudo se unindo por um nexo de amor
que ele próprio estende a todas as coisas amáveis. A nobreza
de Deus267, porém, está no fato de que, mesmo amando todas as
coisas, Ele pode não ser amado pelo homem. A possibilidade do
amor livre e, portanto, da liberdade humana funda-se na distin-
ção essencial interna à Trindade divina, pois o amor amante e o
amor amável, no qual todas as coisas são amadas, são distintos.
Por isso, mesmo que o nexo de amor que na Trindade provêm
do amor amante e do amor amável seja o nexo de amor entre
Deus amante e todas as coisas amáveis, pois Deus estende o seu
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amor a todas elas, não segue daí necessariamente que o Deus
amante seja amado. Mais ainda, embora Deus esteja unido
“a todas as coisas pelo nexo do amor” que Ele estende a cada
coisa que Ele ama, “nem todo espírito racional está unido a
ele”, mas pode amar e se unir a outra coisa. Por outro lado,
como entre o amor amante e o amor amável também se dá o
nexo essencial e eterno, o homem pode se unir livremente ao
princípio unitrino para alcançar a felicidade. Ou seja, como a
alma humana poderia amar o “Deus amante” se Ele não fosse
o “Deus amável”? Amando o “amável”, a alma humana pode
“atingir o nexo e a união da suprema felicidade”. Assim, não se
pode negar o Deus trino, pois se Ele não fosse “trino e uno” não
seria “um Deus nobre, natural e perfeito”, não poderia existir
“o espírito do livre arbítrio” nem a alma humana poderia alcan-
çar o próprio fim, a sua felicidade 268.
Poder-se-ia dizer o mesmo com relação ao conhecimen-
to de Deus. Como se dá uma distinção entre o inteligente, o
inteligível e o nexo, o homem não conhece necessariamente a 129
Deus. Porém, se do inteligente e do inteligível procede um nexo
essencial, o homem pode conhecer a Deus conhecendo o Deus
inteligível e, portanto, atingir a união com Deus e a felicidade.
A natureza racional atinge a união com Deus enquanto é amável
e inteligível e não enquanto amante e inteligente, pois o objeto
da vontade e do intelecto da natureza humana não é o Deus
amor amans ou intellectus intelligens, mas o amável é objeto do
amante e o inteligível é objeto do intelecto. E, tendo em vista
que a verdade é objeto do intelecto e Deus é “a verdade inteli-
gível”, assim o intelecto criado pode se unir a Ele269. A natureza
racional humana se une, portanto, “ao inteligível e ao amável”
da natureza divina e o “homem que capta” a Deus como “Deus
receptível passa no nexo”. Tendo em vista a “estreiteza” dessa
relação, o nexo pode receber o nome de filiação, e, se for perfei-
ta, é “a filiação que complica toda a filiação possível, pela qual
todos os filhos alcançam a última felicidade e perfeição”270.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Por último, no capítulo XIX no qual se mostra que “Jesus
é a união de Deus e do Homem”, Nicolau esclarece que só é
possível entender (intelligere) Deus como pai no filho “que é
o inteligível e o mediador” e que entender a Deus é unir-se a
Ele. Ainda nesse mesmo capítulo, o nexo é novamente defini-
do como o que procede do Deus amante e do Deus amável e,
portanto, é ato que os une como “o ato de amar une o amante
e o amável no amor”. Contudo, embora não se possa de fato
dizer que na Trindade a igualdade da unidade é a explicação
da unidade, os termos complicatio e explicatio, retomados no
contexto desse capítulo, servem para indicar a distinção entre
a segunda e a terceira pessoa à luz da doutrina da criação.
Tudo está complicado na segunda pessoa, teologicamente o
filho, que é a causa ou razão de ser, o conceito ou o modelo
de todas as coisas criáveis por ser o conceito (conceptu tuo) do
Deus amante. Tudo está explicado na terceira pessoa, teologi-
camente o Espírito Santo, enquanto é ato, operação, espírito ou
movimento que “[...] efetiva o conceito da razão, assim como 130
experienciamos que a arca na mente do artista se efectiva
através da força motriz que existe nas suas mãos”271.
A partir do exposto, podemos tentar determinar
conclusivamente os fundamentos para a compreensão cusa-
na do nexu/conexio. De modo geral, devemos lembrar que
essa compreensão se mostra na interpretação do trinômio
unitas-aequalitas-conexio que Nicolau recebeu certamente da
Escola de Chartres e que é utilizado para pensar a Trindade da
unidade divina. Esse caso revela que a especulação cusana se
determina a partir de um ativo diálogo com a tradição filosó-
fico-teológica que a precede, principalmente a neoplatônica.
Além disso, podemos também afirmar que o nexo se mostra
como uma preocupação que transparece em diversos períodos
e em diversas obras da especulação cusana e culmina com a
determinação do nexus ou conexio como um campo de caça da
sabedoria no De venatione sapientiae.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
A reconhecida influência do neoplatonismo cristão, prin-
cipalmente o da Escola de Chartres, obrigou-nos a uma rápida
apresentação de alguns textos de Thierry. Partimos do Tractatus
de sex dierum operibus, pois, como havia indicado o Duhem (1909),
é evidente a influência desse texto sobre a doutrina trinitária
cusana. Como sabemos, o Tractatus termina sem apresentar uma
discussão sobre a conexio. Entretanto, pareceu-nos possível, a
partir da especulação sobre o Espírito Santo, recuperar algumas
indicações que pudessem nos guiar numa compreensão prévia
da conexio no chartrense. Em primeiro lugar, na determinação
das causas da criação, o espírito ou a bondade divina, são a causa
final, pois, como o Criador não necessita de nada, convém que
as coisas tenham sido criadas por sua bondade e por seu amor
para participar a sua felicidade àqueles que o podem conhecer.
Com outra indicação, também carregada de significado filosó-
fico, Thierry o denomina de “a potência do artífice” (virtutem
artificis) ou “a potência operadora do artífice” (virtute artificis
operatrice) que precede os quatro elementos, a causa material. 131
Uma última indicação que pudemos ainda recuperar do Tractatus
é a intenção do autor de mostrar, a partir do relato da criação,
a relação entre a segunda e a terceira pessoa. Segundo Thierry,
depois de mostrar a matéria e a potência operadora como os dois
primeiros princípios da criação, Moisés narraria, na expressão
“Et dixit Deus: fiat lux”, a maneira e a ordem segundo a qual o
“Spiritus Domini” age sobre a matéria de acordo com o modo dito
e determinado ab aeterno pela sabedoria do criador. Por outro
lado, nos comentários ao De trinitate de Boécio, encontraremos
uma clara reflexão sobre a conexio. Na sequência de Agostinho,
a conexio é pensada como um nexus et amor que eternamente e
sem princípio (sine principio semper) vai da unidade para a sua
igualdade e reflui da igualdade para a unidade.
De modo geral, mas não como mera repetição, essa
concepção chartriana repercute e é aprofundada nas principais
obras de Nicolau de Cusa. A união eterna e infinita no cerne do
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
divino manifesta-se no mundo como universo, na relação entre
alma e corpo e, principalmente, na relação entre a natureza
intelectual humana e a sabedoria eterna. Esses aspectos são
evidenciados no De venatione sapientae em que o nexus figura
como um dos campos em que a sabedoria pode ser caçada.
Nessa obra, como anteriormente já vimos, a conexio é a eterna
indivisibilidade de unidade e igualdade do princípio fundante
e delas procede. Em relação às coisas é o nexus amorosus, a
amorosa conexio ou o invisível espírito de conexão que une o que
no poder-ser-feito de todas as coisas permaneceria confuso,
possibilitando a beleza de tudo que vem a ser; é também o que
mantém as coisas naquilo que elas são, conservando-as para
que elas sejam e conectando-as com a totalidade do mundo; é o
que une a alma ao corpo vivificando-os e não somente mantêm
e conserva a natureza intelectual, mas a adapta para que ela
possa se unir àquilo que ela naturalmente ama, ou seja, à sabe-
doria eterna. Por fim, como o entender do intelecto vive dessa
eterna sabedoria, o nexo entre o inteligente e o inteligível do 132
intelecto não se expira jamais.
Entender a Deus é unir-se a Ele, destacávamos anterior-
mente a partir do De visione dei. Dois aspectos foram consi-
derados: em primeiro lugar, a união com Deus é livremente
escolhida pelo homem e não necessariamente imposta. Assim,
do mesmo modo que Deus cria as coisas não por necessidade,
mas para participar a sua felicidade àqueles que o podem
conhecer, também a união da natureza humana com a divina
se dá na liberdade e a perfeição divina se mostra no fato de que
essa união pode ser livremente escolhida. Nicolau coloca na
distinção interna à trindade o fundamento dessa possibilidade,
pois, como o amante e o amável permanecem distintos, pode-se
conjecturar que o homem não ame necessariamente a Deus pelo
fato de Deus amar todas as coisas. Todas as coisas são amadas
no “Deus amável”, mas não segue daí que a natureza humana
ame e se una necessariamente a ela. Por outro lado, tendo em
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
vista o nexo essencial do amante e do amável, o homem pode,
amando o amável da natureza divina, amar o Deus amante.
Da mesma forma, também podemos afirmar que, embora Deus
conheça todas as coisas no seu Verbo inteligível, não se segue
daí que o homem o conheça necessariamente. Deve-se manter
a distinção entre o inteligente e o inteligível. Porém, como um
nexo essencial procede do inteligente e do inteligível, o homem
pode conhecer a Deus conhecendo o Deus inteligível e, portanto,
atingir a união com Deus e a felicidade. O nexo alcançado entre
a natureza humana e o amável e inteligível da natureza divina
é a filiação que só é atingida pela mediação do único mediador
entre Deus e a natureza humana, ou seja, o Deus filho “que é o
inteligível e o mediador”.
Parece também que não erraríamos, se acrescentássemos
que, no Verbo eterno, podemos nomear o Deus inominável. O
fundamento da nossa afirmação se encontra na doutrina da
criação e na doutrina trinitária, pois, por um lado, Deus nomeia
todas as coisas no seu Verbo ao criá-las e, assim, por meio das 133
coisas visíveis, enquanto manifestações da Palavra de Deus,
poderíamos alcançar o Deus invisível272. Por outro lado, trini-
tariamente falando, o Verbo é a segunda pessoa da Trindade.
Assim, fundados na relação que se mostra entre o amante, o
amável e o nexo de ambos, o inteleginte, o inteligível e o nexo de
ambos, poderíamos, então, pensar na relação entre o “princípio
inominável”, o “princípio nominável” e o nexo de ambos. Além
disso, o Verbo é aquele que também falou de si mesmo em Cristo.
Portanto, no Verbo que fala no tempo por meio da criação e
que fala de si mesmo temporalmente, podemos humanamente
nomear o princípio inominável, pois entre o “princípio sem
princípio” e o “princípio principiado” se dá um nexo eterno273.
Um dos aspectos da metáfora do “muro do paraíso”
no De visione dei é justamente o de lembrar que não podemos
identificar o alcançado pelo intelecto com Deus em sua
natureza simples. Não se nega, porém, que a natureza racional
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
possa atingir a união com Deus, pois o amável é o objeto
da vontade e o inteligível e nomeável da natureza divina é o
objeto do intelecto da natureza humana. A união do homem
com o Deus amável, inteligível e nomeável recebe o nome de
nexus ou filiação. Por isso, Nicolau afirma que “passa no nexo”
captar a Deus como deum receptibilem. O Deus amável, inteligível
e nomeável é a Palavra que se encarna e é também o logos ou
razão de todas as coisas na unidade eterna que se explica e se
mostra na criação. Por sua vez, o nexus é o que permite que,
por meio do Cristo, palavra encarnada, ou por meio da criação,
se possa “recuperar” o Deus que se esconde nessa exterioriza-
ção. O nexus, portanto, abre a possibilidade para que o homem
possa começar a ver em que sentido a trindade na unidade não
implica alteridade numérica, pois a união eterna e infinita entre
unidade eterna e igualdade eterna faz com que os três sejam
uno. O nexus também indica a possibilidade da natureza huma-
na amar, entender, nomear e se unir à sabedoria eterna, pois o
nexus é conexão essencial do amor amante e do amor amável, 134
do inteligente e do inteligível, do princípio inominável e do
princípio nominável e do princípio sem princípio e do princípio
principiado. Por último, o nexus permite que se possa captar e
dizer o sentido divino “recuperável” no mundo, no homem e
também em nossas palavras.
3.4 O UNIVERSO IMITA A TRINDADE
Anteriormente já destacamos que o caráter unitário dos
três livros do De docta ignorancia se sustenta no conceito de
“máximo”. Como sabemos, o segundo livro é uma especulação
sobre o universo ou sobre o máximo contraído e, portanto,
poderíamos falar de uma ontologia da criação a partir da qual se
busca pensar o universo desde a sua origem, ou seja, o Máximo
infinito274. De modo geral, além do Prólogo, poderíamos dividir
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
esse segundo livro em três momentos: um primeiro momento
(capítulos I-VI), no qual Nicolau se preocuparia em determinar
a unidade do universo; um segundo (capítulos VII-X), no qual
discute sobre a trindade do universo e um terceiro e último
momento (capítulos XI-XIII), no qual vamos encontrar a cosmo-
logia cusana. Tendo em vista o objetivo da nossa pesquisa, o
segundo momento é fundamental. Buscaremos, então, especi-
ficar os termos segundo os quais o universo imita a Trindade
e, principalmente, especular sobre a noção de nexus agora
também pensada a partir do universo. Todavia, será também
necessário aclarar o sentido dos termos “universo” e contractio
que aparecem nos primeiros capítulos do segundo livro do
De docta ignorantia, já que, em relação ao Máximo absoluto, o
universo se mostraria como máximo contraído275.
No Prólogo do segundo livro, Nicolau afirma que “[...] é
difícil atingir a natureza da contracção desconhecido o exem-
plar absoluto”. É essa uma conclusão estabelecida por Nicolau
ao argumentar que, como todo causado não tem nada a partir 135
de si mesmo, mas da sua causa, então, o causado acompanha-
ria “[...] a origem e a razão pela qual é o que é do modo mais
próximo e semelhante que pode”. Isso não significa somente
que o causado seja semelhante à causa, mas também que não
poderemos conhecer a natureza da “contração”, tendo em vista
não ser possível captar “a precisão da verdade” em relação ao
“exemplar absoluto”. Porém, é preciso que essa ignorância nos
ensine e que sejamos conduzidos a ver que a verdade existe,
embora agora não a possamos compreender277. No primeiro
capítulo, o Cardeal de Cusa retoma o princípio já estabelecido
no primeiro livro do De docta ignorantia de que, quando se
dá excedente e excedido, não se chega ao máximo simples.
Daí que, se a “igualdade precisa” convém somente a Deus, tudo
o que se dá “para além dele, comporta diferença” e, assim, a
medida e o medido necessariamente diferem278. Esse princípio
é transferido ou adaptado para as disciplinas do quadrivium
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
(astronomia, matemática, música e aritmética) e também para
as artes (medicina, alquimia, magia), para mostrar que em
nenhuma delas podemos alcançar a precisão no conhecimento
de qualquer coisa e, por último, no conhecimento do univer-
so279. Merece também atenção a afirmação cusana de que o
universo é infinito. Para que possamos compreendê-la e para
que possamos apreender em que sentido, mesmo sendo infinito,
o universo não é Deus, será necessário determinar a diferença
entre o “infinito negativamente” e o “infinito privativamente”.
Nicolau argumenta que, enquanto a Deus convém ser “infinito
negativamente”, pois “só ele é aquilo que pode ser com toda a
potência”, ao universo corresponde ser “infinito privativamen-
te”. O universo poderia ser maior, tendo em vista a potência
divina que não tem limites, mas não tendo em vista “a possibili-
dade ou a matéria” que “não se estende para além de si própria”
ou “que não é extensível até ao infinito em acto”. Ser “infinito
privativamente” significa que o universo “é sem termo”, pois
não é possível que se dê em ato nada maior do que o universo. 136
Claro que não absolutamente, mas contraidamente, pois esse é
em ato, mas de modo contraído. Tudo isso significa apenas que
o universo é “[...] uma criatura, que é necessariamente pelo ser
divino absoluto e simples280”.
Ainda tendo em vista a relação entre a causa e o causado,
Nicolau recorda no segundo capítulo que somente o Máximo
simples é a partir de si mesmo e que o que não é a partir de
si mesmo tem o ser “devido ao ser eterno”281. Entretanto,
como o Máximo “está longe de qualquer inveja”, ele não pode
comunicar o ser de maneira diminuída, ou seja, Deus, ao
comunicar o seu próprio ser, comunica-o de maneira total.
No entanto, o problema coloca-se quanto àquele que recebe. Se
algo recebesse de modo tão perfeito e total o ser de Deus como
Ele o comunica, aquele seria Deus282. Claro que isso seria impos-
sível, tendo em vista a impossibilidade de se pensar dois ou mais
infinitos, perfeitos e eternos. Assim, a criatura, embora seja um
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
“ser-dependente, não tem tudo aquilo que é” do máximo, pois
a corruptibilidade, a divisibilidade, a imperfeição, a diversida-
de, a pluralidade, que marcam o seu modo de ser, não os têm
“[...] do máximo, eterno, indivisível, perfeitíssimo, indistinto,
uno nem de alguma causa positiva”282.
No parágrafo seguinte, Nicolau utiliza a manuductio da
linha infinita que é causa do ser linha. Se, por um lado, a linha
curva tem da linha infinita o fato de ser linha, por outro lado, tem
o fato de ser curva da própria finitude, já que “se fosse máxima
não seria curva”. A partir deste exemplo Nicolau conclui que
“[...] o mesmo acontece com as coisas, porque não podem ser o
máximo, já que são diminuídas, outras, distintas etc.” Por fim,
com uma linguagem “trinitária”, Nicolau recorda que a criatura
recebe de Deus o fato de ser “una, discreta e conexa com o
universo”284. Porém, a criatura não recebe d’Ele, nem de uma
causa positiva, mas de uma contingente o fato de que “[...] a
sua unidade esteja na pluralidade, a discreção285 na confusão, e a
conexão na discordância”286. Quando buscamos pensar o ser da 137
criatura, descobrimos que ela é pelo ser do Máximo. Mas, embo-
ra saibamos que é assim, entretanto, é ininteligível o modo, na
medida em que a criatura é a partir da “necessidade absoluta”,
mas também não é sem a “contingência”287. Da mesma forma,
a dialética da complicatio-explicatio que busca responder ao
problema da relação entre o criador e a criatura, entre a unida-
de e a pluralidade ou multiplicidade também recebe a marca do
“ininteligível”. Como afirma Nicolau, “o modo da complicação e
da explicação excede a nossa mente”288.
Depois de determinarmos o sentido geral do termo cria-
tura na sua relação com o Máximo absoluto, consideraremos, a
partir do quarto capítulo do segundo livro, a especulação cusa-
na sobre a unidade do universo e sobre a sua relação de imagem
com o absoluto. Comecemos, porém, por especular sobre o
sentido do termo universo: do ponto de vista do emprego do
termo, “universo significa universalidade, ou seja, unidade de
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muitas coisas”289; e, com relação ao Máximo absoluto, o univer-
so ou mundo é o “máximo contraído” e “contração significa,
relativamente a uma coisa, o ser isto ou aquilo”290, ou seja, ser
algo determinado, concreto etc. Parece, então, que só podería-
mos compreender o “universo” estando atentos à sua relação
com o absoluto e à sua relação com as coisas singulares explici-
tadas por meio da contractio. Se, por um lado, o universo não é
Deus, mas é uma criatura, por outro lado, o universo não pode
ser pensado como um “superente” dentro do qual caberiam
todas as coisas. Por isso, se o universo não pode ser pensado
sem as coisas singulares, também as coisas não perdem a sua
singularidade em uma totalidade que as absorva. O universo é
máximo, mas não é absoluto, tendo em vista que a sua unidade
não poderá ser pensada sem considerarmos a pluralidade, a
diversidade e a alteridade das coisas. O universo é uno, mas não
é absoluto, pois a sua unidade está contraída na pluralidade.
Além disso, não podemos esquecer que pluralidade e diver-
sidade implicam simultaneamente divisão. Ora, pensar um 138
mundo como uma unidade de muitos, que, por isso, não exclui
a pluralidade e a diversidade das coisas singulares, é tentar
conceber um universo em que qualquer coisa está conectada e
relacionada com qualquer coisa, ou seja, é ver um todo no qual a
pluralidade, a confusão, a discordância ou divisão são superadas
em uma totalidade ou unidade na qual qualquer coisa é, antes
de tudo, relação. Quiçá somente assim poderemos ver no único
universo a unidade absoluta da qual tudo tem o que é.
Como princípio geral, Nicolau estabelece que o que convi-
nha maximamente, no primeiro livro do De docta ignorantia,
ao máximo absoluto convirá de modo contraído ao mundo ou
universo enquanto máximo contraído291. Esse princípio faz com
que ele elabore um quadro sinótico no qual estabelece, de um
lado, o que convém ao máximo absoluto e, de outro lado, o que
conviria ao contraído292. No entanto, é preciso considerar “reta-
mente a contração” para que a linguagem paradoxal utilizada
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
anteriormente possa ser aclarada. Por exemplo, como é possível
que se dê “infinitude contraída”; que o universo ou mundo possa
ser “de modo contraído o infinito” ou que, no universo, “todas as
coisas sem pluralidade” sejam o próprio máximo contraído, se o
mesmo universo não está desligado da pluralidade? O modo como
o mundo é contração da unidade infinita absoluta é denominado
como uma descida infinita ou como uma queda sem proporção293.
Assim, o mundo que é uno, infinito, simples, indistinto, eterno
de forma contraída desce ou cai daquela unidade e eternidade
absoluta. A descida marca uma diferença entre o universo e o seu
princípio que aparece, em primeiro lugar, na referência à plura-
lidade. A contração atinge e determina o universo de modo que
a sua unidade, infinitude, simplicidade, eternidade e necessidade
são contraídas pela pluralidade, finitude, composição, sucessão e
possibilidade. É “como se a necessidade absoluta se comunicasse
sem mistura e terminasse de modo contraído no seu oposto”,
conclui Nicolau294. Logo, é nesse sentido que o universo contraído
se determina “descendo” do absoluto. 139
A marca do universo é a contração e, como vimos, a
“contração significa, relativamente a uma coisa, o ser isto ou
aquilo”. O que se pode deduzir da relação e da diferença entre
o Máximo absoluto e o máximo contraído? Em que sentido
o máximo contraído pode ser “isto ou aquilo”? Que tipo de
relação é possível entre qualquer coisa e o absoluto, qualquer
coisa e o universo e, portanto, qualquer coisa e qualquer coisa?
Mirando às coisas singulares será possível justificar a diferença
entre os dois máximos e determinar o sentido de “universo”
enquanto “unidade de muitas coisas”. Em primeiro lugar, pare-
ce que devemos evitar uma linguagem que não distinga Deus e
as coisas e o universo e as coisas. Deve-se negar, portanto, que
“Deus, sendo imenso” seja no sol e na lua. Da mesma forma,
também se negará do universo. Considerando a infinitude de
Deus e a do universo, não se pode conceber que esses sejam
como uma coisa em outra coisa. Qualquer coisa não pode
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
conter ou delimitar o máximo absoluto e nada em ato pode
definir o máximo contraído. Por isso, Deus e o universo devem
ser considerados, pelo menos em um primeiro momento, como
transcendentes com relação às coisas singulares. Porém, em
um segundo momento, a imanência de Deus e a do universo se
mostram, pois Deus é o que cada coisa é, mas “de modo absolu-
to” e o universo é o que cada coisa é, mas “de modo contraído”.
Dessa forma, Deus e universo são o que qualquer coisa é segun-
do o modo absoluto ou contraído295.
Daí decorre um discurso sobre a quididade dos entes
singulares, no qual se esclarece a presença de Deus e a do
universo em cada coisa singular por meio da diferença entre
“quididade absoluta” e “quididade contraída”. Essa diferença
também permitirá desvelar o sentido da unidade divina e o
sentido da unidade do universo. Esclarece-se, primeiramente,
que a quididade absoluta de qualquer coisa é a mesma, porém
não é a própria coisa, mas a quididade contraída de qualquer
coisa é diferente da quididade contraída de outra coisa 140
qualquer, embora não seja diferente da própria coisa. Ou seja,
enquanto a quididade absoluta do sol e da lua é a mesma, a
quididade contraída do sol é diferente da quididade contraída
da lua. Assim, no primeiro caso, temos uma diferença entre o
absoluto e qualquer coisa. Todavia, como a quididade absoluta
é a mesma para qualquer coisa, então essa diferença desapa-
rece no absoluto: em Deus qualquer coisa é Deus. Falamos de
uma unidade absoluta que exclui, então, pluralidade e diver-
sidade. No segundo caso, devemos considerar que não existe
diferença entre o universo, enquanto quididade contraída, e
qualquer coisa, já que a quididade contraída de uma coisa não
é diferente dela própria. Porém, como a quididade contraída de
qualquer coisa é diferente da de outra coisa qualquer, então a
“não-diferença” entre universo e as coisas singulares não se
conclui em uma unidade absoluta, mas em uma unidade na qual
pluralidade e diversidade são sempre exigidas. Portanto, falamos
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
de uma unidade que não exclui a pluralidade e a diversidade.
Como seria possível pensar tal unidade? Em conclusão, se
a quididade absoluta de uma coisa é diferente da própria
coisa, então não é “sol no sol” e “lua na lua”296. Mas, enquanto
absoluta, devemos afirmar que ela “é aquilo que é o sol e a lua
sem pluralidade e diversidade”. Por outro lado, a pluralidade
e a diversidade não podem ser excluídas da compreensão da
unidade e da identidade do universo, pois, enquanto quididade
contraída, “é contraída de um modo no sol e de outro modo
na lua” e não é diferente do sol e da lua. Dessa maneira, a sua
unidade é afirmada na pluralidade das coisas e a sua identidade
é reconhecida na diversidade dos singulares, ou seja, embora o
universo não seja “nem sol nem lua”, é, porém “sol no sol e lua na
lua”. Nicolau, então, determina que “Universo significa univer-
salidade, ou seja, unidade de muitas coisas”. A ideia de máximo
contraído nos permitiria pensar um todo no qual diferença,
multiplicidade e diversidade não são excluídas, pois o universo
é uno na pluralidade e idêntico na diversidade. Com o exemplo 141
da relação entre a “humanidade” e um determinado indivíduo
humano, Nicolau conclui o parágrafo: “Por isso, assim como a
humanidade não é nem Sócrates, nem Platão, mas Sócrates em
Sócrates e Platão em Platão, assim é o universo em relação a
todas as coisas”297, ou seja, o universo não é “isto” nem “aquilo”
ou alguma coisa entre as outras coisas, mas está totalmente de
um modo contraído em uma coisa e totalmente de outro modo
contraído em outra coisa. A humanidade não é Sócrates, mas
em Sócrates é aquilo que Sócrates é. O universo não é o sol, mas
no sol é aquilo que o sol é.
O universo, portanto, enquanto quididade contraída
de todas as coisas, não é diferente de qualquer coisa, pois a
quididade contraída de uma coisa qualquer não é diferente dessa
mesma coisa. Porém, como a quididade contraída de qualquer
coisa não é a mesma de outra coisa qualquer, então o universo
se contrai de um modo em uma e de outro em outra. Buscando
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
mostrar ainda por meio de exemplos essa relação entre o
universo e as coisas singulares, Nicolau se serve no parágrafo
121 do quinto capítulo, no qual interpreta a frase de Anaxágoras
“qualquer coisa é em qualquer coisa”, da relação entre o corpo
humano e o seus membros. Logo no parágrafo anterior, Nicolau
havia afirmado que “todas as coisas são em graus diversos”298 e,
assim, o n. 121 se abre com a seguinte afirmação: “Repousam,
pois, todas as coisas em qualquer coisa, porque um grau não
pode ser sem outro, como nos membros do corpo um é útil ao
outro e todos se satisfazem em todos”. Reafirmam-se as ideias de
pluralidade e diversidade, pois um membro não é o outro e cada
um se contenta em ser o que é. Entretanto, embora pluralidade
e diversidade impliquem divisão, o que se mostra é um organis-
mo ordenado de modo que todos “se ajudam mutuamente para
que qualquer um seja, do melhor modo que pode, aquilo que
é”. Assim, como só “mutuamente” qualquer membro pode ser o
que é, então, cada um é no outro, mas não como si mesmo e sim
como o outro: “E não são mão nem pé no olho, mas no olho são 142
olho, enquanto o próprio olho é de modo imediato no homem”.
Portanto, qualquer coisa é em qualquer coisa e por meio de
qualquer coisa é no todo. Da mesma forma como qualquer coisa
é de modo imediato no todo, então o todo por meio de qual-
quer coisa é em qualquer coisa299. No último parágrafo desse
mesmo quinto capítulo, Nicolau expõe de que modo a relação
entre Deus, o universo e as coisas singulares deve ser pensada.
O exemplo consta dos seguintes termos: humanidade absoluta
que simboliza Deus e a humanidade contraída ou homem que
simboliza o universo. Considerando que a humanidade abso-
luta é antes e prioritariamente na humanidade contraída ou
homem e “depois em qualquer membro”, deveríamos afirmar,
por isso, que Deus, Máximo absoluto, é primeiramente no
universo, máximo contraído, e só depois em qualquer coisa.
Por outro lado, o homem ou humanidade contraída “é olho no
olho e coração no coração etc., e, deste modo, é contraidamente
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
qualquer coisa em qualquer coisa”. Isso significa que o universo
é em qualquer coisa. Devemos, portanto, concluir que Deus é
em qualquer coisa como que mediante o universo e este é em
qualquer coisa como que mediante qualquer coisa. Mas também
que qualquer coisa é em Deus como que mediante o universo300.
Do exposto anteriormente, portanto, fica determinado
em que sentido o universo é uno e é semelhante ou imagem do
Máximo absoluto. Porém, é ainda necessário estabelecer em que
sentido o universo é primeiro em relação a qualquer coisa e, por
último, em que sentido pode ser pensado como sendo quase um
mediador entre a unidade absoluta e a pluralidade das coisas.
Retomemos o conceito de contractio que permitirá a Nicolau de
Cusa postular que Deus, enquanto é uno, “é no universo uno.
Mas o universo é contraidamente em todas as coisas”, ou seja,
Deus, existindo “no universo uno”, é “[...] em todas as coisas,
e a pluralidade das coisas é, mediante o universo, em Deus”301.
Por meio da contractio pareceria, assim, justificada a relação entre
a unidade absoluta e a pluralidade das coisas, pois o Máximo 143
absoluto estaria no máximo contraído “[...] para em seguida
estar em todas as coisas particulares, porque ele é de modo
absoluto naquilo que é tudo contraidamente”. Assim, enquanto
Deus seria a “quididade absoluta do mundo ou universo”, este
seria a “própria quididade contraída”, como já distinguimos302.
Falar de um mediador ou de um intermediário entre Deus
uno e a pluralidade das coisas em um contexto criacionista
requer alguns cuidados. Recordemos que o conceito de criação
exige que Deus tenha criado do nada e sem mediação alguma,
ou seja, sem que nada preexistisse à própria criação. Talvez por
isso, Nicolau cuide em considerar o universo, como vimos ante-
riormente, como uma criatura e, dessa forma, o universo não
poderia ser considerado como um princípio divino e anterior
à pluralidade das coisas. Mas também já determinamos que
o universo não é uma coisa entre as outras coisas. Assim, não
poderíamos separar o universo de um lado e as coisas de outro.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
O universo é enquanto é unidade de muitos. Por isso, Nicolau
afirma que “[...] todos os entes, [...], vieram simultaneamente ao
ser com o universo, e não primeiro a inteligência, depois a alma
nobre, a seguir a natureza, como quiseram Avicena e outros
filósofos”. Essa simultaneidade é explicada por meio de um
exemplo cujo conceito de intentio é importante, embora aqui
não seja explorado nas suas últimas consequências. De fato,
aqui as criaturas ainda são pensadas por meio do termo expli-
catio. Para Nicolau de Cusa, na “intenção do artífice” não estão
em primeiro lugar as paredes de uma casa, mas a casa como
um todo. Por isso, como “todas as coisas vieram da intenção
de Deus ao ser”, o universo teria vindo primeiro “[...] e todas
as coisas na sequência dele, e, sem elas, não poderia ser nem
universo, nem perfeito”303. Nicolau fala de uma prioridade de
natureza e não de uma prioridade temporal304 e, nesse contexto,
o termo “simultaneidade” pretende justamente assegurar que
não existe primeiro o universo e depois as coisas, pois sem
as coisas não existe universo. Outro aspecto que poderia ser 144
destacado, olhando agora para Deus, é que n’Ele não é diferente
pensar e criar. Se Ele pensou tudo, logo criou tudo. Assim, o
universo vem primeiro enquanto totalidade, mas, como é máxi-
mo contraído, não pode ser universo, uno, perfeito etc. sem as
coisas. Por isso, embora possamos dizer que qualquer coisa não
escape ao pensamento divino, entretanto Deus não as pensa
separadamente, mas as pensa conectadas umas às outras ou
pensa tudo ao mesmo tempo. De modo não tanto preciso, talvez
pudéssemos dizer que o universo se dá tendo em vista que Deus
não pode pensar a pluralidade, a diversidade e a divisão, já que
n’Ele a unidade é absoluta. Porém, como a unidade é também
trina, então a própria relacionalidade e conexão que se dão no
mundo é decaimento da relacionalidade e da conexão daquela
trindade absoluta. Nesse sentido o universo, máximo contraído,
é, então, “imagem do absoluto”.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Já antecipamos a partir do De venatione sapientiae que
todo existente por ser tudo o que é a partir da Trindade a imita
[imitari]. No caso do De docta ignorantia, Nicolau afirma que o
“máximo contraído ou concreto, tendo do absoluto tudo aquilo
que é, imita quanto pode” o máximo absoluto e, assim, conclui
que o afirmado no primeiro livro e que convém de modo
máximo ao máximo absoluto, convém “contraidamente ao
máximo contraído”305. Por isso, nos primeiros seis capítulos do
segundo livro do De docta ignorantia, Nicolau pretendeu pensar
sobre o tema da unidade do universo que não é absoluta, mas
contraída. Da mesma forma, também corresponderá pensar
sobre a trindade do universo, pois, se “a unidade absoluta é
necessariamente trina”, do mesmo modo “a unidade máxima
contraída, na medida em que é unidade, é trina”. Entretanto, é
indispensável sublinhar o modo como a unidade absoluta é trina
e o modo como a unidade contraída é trina. No primeiro caso,
“a unidade absoluta não é senão trindade” e, no segundo caso, a
unidade contraída não é trina absolutamente, “de maneira que 145
a trindade seja unidade, mas de modo contraído, de maneira
que a unidade não seja senão na trindade, como o todo é de
modo contraído nas partes”. Nicolau continua aprofundando
essa diferença ao insistir que, in divinis, “a própria unidade é
trindade”, ou seja, “[...] a unidade não é de modo contraído
na trindade, como o todo nas partes ou o universal nas coisas
particulares”, e, por isso, qualquer uma das três pessoas é
“a própria unidade”, mas ao mesmo tempo “uma pessoa não é a
outra”. Existe, por isso, uma identidade, mas não uma diferença
que implique alteridade. Nicolau é enfático ao insistir: Mas no
universo não pode ser assim306; ou como afirma no parágrafo
seguinte: “Não pode ser assim num [ser] contraído”307.
O que é de um modo no ser divino e absoluto e não pode
ser do mesmo modo no universo ou em um ser contraído diz
respeito às “correlações” (correlationes): ao final do parágrafo
127, Nicolau enfaticamente mostra que, no caso do universo,
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
as “[...] três correlações, que na divindade se chamam pessoas,
não têm o ser em ato senão em conjunto na unidade”308.
Essa distinção é tão essencial para se compreender a diferença
entre a Trindade divina e a trindade do universo que Nicolau, no
parágrafo seguinte, retoma a discussão sublinhando já de início
que “é necessário prestar muita atenção a isto”. Determinamos
a diferença, portanto, considerando que, na unidade absoluta,
a “unidade é trindade”, mas na unidade contraída a “unidade
é na trindade”, ou seja, a unidade é contraída na trindade.
No primeiro caso, isso significa que qualquer uma das pessoas
é “Deus em ato”, mas também que qualquer uma das pessoas é
as outras duas, ou seja, “o Filho e o Espírito Santo são em ato no
Pai, o Filho e o Pai no Espírito Santo, o Pai e o Espírito Santo no
Filho”. Entretanto, reafirma Nicolau que “não pode ser assim
num [ser] contraído. Pois as correlações não são subsistentes
por si a não ser em conjunto”309.
Comecemos recordando que, em relação à Trindade
divina, as “correlações” são as três pessoas: em linguagem bíbli- 146
co-teológica, essas correlações são pensadas a partir dos termos
Pai, Filho e Espírito Santo, mas a partir de uma especulação que
busca os traços da divindade no mundo (pluralidade, desigual-
dade e divisão) as mesmas correlações são ditas unidade, igual-
dade da unidade e conexão ou nexo entre a unidade e a igualdade
da unidade. E no caso da trindade do universo que é o máximo
contraído? Segundo Nicolau, “a contração não pode ser sem o
contraível, o contraente e o nexo que se perfaz no ato comum
a ambos”310. Dessa maneira, enquanto o universo é o máximo
contraído, será preciso determinar o que cada um desses três
aspectos significará em relação ao universo. Na tentativa de
encontrar os termos adequados e de interpretá-los também
a partir do horizonte cristão (criação ex nihilo e a doutrina da
Trindade) da sua especulação, Nicolau dialogará de modo ativo
tanto com a tradição dos “platônicos” quanto com a tradição
dos “peripatéticos”, interpretando-as e corrigindo-as a partir
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da regra da douta ignorância, como veremos. Assim, de modo
introdutório, no sétimo capítulo, Nicolau começa por fixar os
termos e o vocabulário com os quais impostará o problema.
Já vimos que o mundo ou universo, máximo contraído,
descende infinitamente ou cai sem proporção da unidade
infinita absoluta. O mesmo será afirmado de cada “correla-
ção” da trindade do universo, de modo que o “contraível” ou
a “contraibilidade” “procede descensivamente” da unidade
eterna311; o “contraente” da igualdade da unidade312 e o “nexo
procede descensivamente do Espírito Santo, que é o nexo
infinito”313. Além disso, Nicolau também já aponta para a diver-
sidade vocabular com a qual o contraível, o contraente e nexo
serão nomeados principalmente pelas duas tradições filosóficas
anteriormente citadas: “a contraibilidade significa certa possibi-
lidade”, “matéria” e “potência; o contraente também foi chama-
do de “forma ou alma do mundo e possibilidade à matéria”,
“destino na substância”, “necessidade da complexão” e “ato”; o
nexo “[...] que se perfaz em acto como uma espécie de espírito 147
de amor, uma espécie de movimento que une aquelas coisas”,
também foi chamado de “[...] possibilidade determinada, porque
o poder ser é determinado a ser isto ou aquilo em ato pela união
da sua forma determinante e da sua matéria determinável”314.
Acompanharemos nos capítulos seguintes de que modo Nicolau
pensará cada um desses elementos buscando enfatizar a
compreensão cusana do nexus com relação ao universo315.
A partir desses parágrafos introdutórios, Nicolau esta-
belece que a unidade do universo seja trina tendo em vista que
procede, em termos “platônicos”, “da possibilidade, da necessi-
dade da complexão e do nexo” ou, em termos “peripatéticos”, da
“potência, ato e nexo”. No De docta ignorantia, portanto, Nicolau
de Cusa parece encontrar nas doutrinas citadas a sua compreen-
são trina do universo316. Além disso, a partir dessa compreensão
trina da unidade do universo, Nicolau afirma que se pode dedu-
zir “quatro modos universais de ser”. Como sabemos, essa é uma
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doutrina típica de Thierry de Chartres, de acordo a qual as coisas
podem ser segundo quatro modos: o modo da necessidade abso-
luta, “[...] no qual todas as coisas em Deus são a própria neces-
sidade absoluta”; o modo da necessidade da complexão, “[...] na
qual as formas das coisas são em si verdadeiras com distinção
e segundo a ordem natural, como [são] na mente”; o modo da
possibilidade determinada, no qual as coisas são isto ou aquilo
em ato e o modo da possibilidade absoluta na medida em que as
coisas “podem ser”. Por último, ainda segundo Nicolau, o modo
da necessidade de complexão, da necessidade determinada e
da possibilidade absoluta “[...] existem numa só universalidade,
que é o máximo contraído. É por eles, acrescenta, que é o modo
universal de ser, porque nada sem eles pode ser”318.
Portanto, partindo da ideia de que a contração não pode
ser sem o contraível, o contraente e o nexo de ambos, Nicolau
concluiu que a unidade do universo procede dessa trindade, ou
seja, procede dessas três correlações e que as tradições filosó-
ficas as nomearam de modo diverso. Depois, ao retomar uma 148
doutrina do platonismo de Chartres, que deduz das três corre-
lações quatro modos universais de ser, dos quais três existem no
máximo contraído, Nicolau se prepara para analisar nos capítu-
los seguintes cada um desses modos de ser enquanto correlações
que fazem do universo uma unidade. Apesar de retomarmos
em análise os três capítulos, tendo em vista a unidade textual,
esperamos, porém, poder determinar de modo mais preciso a
concepção cusana do nexus que corresponderá a pensá-lo como
um movimento de conexão amorosa. De modo geral, nesses três
capítulos, Nicolau parte de uma afirmação geral e depois mostra,
principalmente, a posição dos “platônicos” e dos “peripatéticos”
e, por último, a sua própria posição, que corresponderá a ilumi-
nar a tradição a partir do princípio da douta ignorância.
Começando, então, pela “possibilidade” ou “matéria do
universo”, Nicolau afirma que os “antigos” já falaram muito
sobre ela ao admitirem que “[...] de nada nada pode ser feito.
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E, por isso, afirmaram uma certa possibilidade de ser tudo e
[consideraram-na] eterna na qual julgavam complicadas como
possíveis todas as coisas”319. Não pretendemos aqui discutir as
especificidades das doutrinas que Nicolau aduz aos “platônicos”
e aos “peripatéticos”, mas tentar focar o ponto principal que
o autor do De docta ignorantia pretende iluminar. Nesse caso, a
questão principal a ser iluminada será o problema da “possi-
bilidade absoluta” que, enquanto modo de ser, como vimos
anteriormente, existiria no máximo contraído. Pela douta igno-
rância será necessário negar que a possibilidade seja absoluta,
tendo em vista que não se dá o máximo e o mínimo nas coisas
que são capazes de mais e menos. Desse modo, a possibilidade
entre as coisas possíveis não pode ser mínima, pois também
coincidiria com a máxima possibilidade, ou seja, com o ato
absoluto. Assim, a conclusão de Nicolau é que a possibilidade
absoluta em Deus é o próprio Deus e fora dele não é possível,
pois qualquer coisa que esteja “para além do primeiro” é neces-
sariamente contraída320. 149
Ser contraído significa que, se Deus criou qualquer coisa,
criou-a de modo determinado e, portanto, nem se pode dar
uma possibilidade que não seja contraída pelo ato nem um ato
que não seja contraído pela possibilidade. Em outras palavras,
não existe nem a pura matéria nem a forma pura e, portanto,
“a possibilidade de ser é de modo contingente”, ou seja, qual-
quer coisa que não seja o próprio Máximo absoluto, mas seja a
partir dele “[...] não pode ser completamente, simplesmente e
absolutamente em ato”, e, por isso, já é contraída pela potência,
matéria ou possibilidade321. Mais ainda, que a possibilidade seja
contraída e não absoluta é necessário para se mostrar que as
coisas possuem uma razão e não são por acaso, pois se a possi-
bilidade fosse absoluta, esse mundo ou qualquer coisa não teria
nenhuma razão para ser esse mundo ou para ser ou para não ser:
“Que este mundo derivasse de modo racional da possibilidade,
isso deve-se necessariamente ao fato de a possibilidade ter tido
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aptidão para ser apensas este mundo”. Da mesma forma, qual-
quer um dos elementos do mundo, a terra, o sol, ou qualquer
coisa, “[...] se não estivessem ocultas na matéria segundo uma
certa possibilidade contraída, não haveria maior razão para
se tornarem ato do que para se não tornarem”322. Ou como
Nicolau afirma no parágrafo seguinte: “[...] o universo tem uma
causa racional e necessária da [sua] contracção, de modo que o
mundo, [...], não seja [derivado] contingentemente de Deus, que
é a maximidade absoluta”. Essa causa racional é a possibilidade
contraída que é contraída pelo ato e este pelo ato máximo ou
Deus. Por último, que a possibilidade seja contraída é também
necessário para que se possa explicar a finitude do mundo. Deus
poderia, enquanto infinito, “criar um mundo infinito”, mas,
[...] porque a possibilidade foi necessariamente contraída
e não totalmente absoluta ou uma aptidão infinita – então,
segundo a possibilidade de ser, o mundo não pôde ser infinito
em acto, maior ou de outro modo323. 150
Portanto, Nicolau não nega a possibilidade enquanto
princípio explicativo do mundo, mas no diálogo com a tradição
e sustentado na regra da douta ignorância mostra que ela não
pode ser entendida como absoluta, mas sim como contraída.
Segundo a perspectiva adotada por Nicolau, podemos olhar
o mundo considerando-o a partir da possibilidade absoluta
que é Deus e, assim, afirmar que o mundo “é como é em Deus
e é a própria eternidade”. Por outro lado, podemos também
considerá-lo a partir da possibilidade contraída e, então, “a
possibilidade apenas precede o mundo por natureza”. Essa
possibilidade, que não é absoluta, mas contraída, não pode,
portanto, ser “[...] a eternidade, nem coeterna a Deus, mas decai
dela, como o contraído do absoluto que distam infinitamente
entre si”324. Nicolau, portanto, não nega a possibilidade, mas
pretende que ela não seja absoluta nem seja um intermediário
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entre o absoluto e todas as coisas. O mundo possui uma causa
racional e necessária da sua contração e não é fruto do acaso,
mas da possibilidade contraída que decai infinitamente da
possibilidade absoluta, ou seja, da unidade eterna.
O segundo modo de ser ou correlação na trindade do
universo ou máximo contraído é o contraente. No nono capítulo,
sobre “a alma ou a forma do universo”, Nicolau de Cusa parte
de uma dúplice aceitação universal: em primeiro lugar, “o poder
ser não pode ser levado a ato senão por um ser em ato” e, em
segundo lugar, a possibilidade é levada ao ato não por acaso,
mas “por uma ordenação racional”, tendo em vista que “o que
faz com que a possibilidade seja em ato [...] o faz intencional-
mente”.325 Como vimos, diversos nomes foram dados a “esta
excelsa natureza”: mente, inteligência, alma do mundo, destino
na substância, necessidade da complexão. Novamente será colo-
cada em confronto a posição dos “platônicos” e a posição dos
“peripatéticos”. De modo geral, podemos resumir a diferença
entre as duas posições, segundo as observações de Cusano, no 151
fato de os primeiros estabelecerem uma alma do mundo, na
qual estariam os exemplares de todas as coisas, e no fato de os
segundos não admitirem tal posição tendo em vista que “[...]
as formas não têm outro ser senão na matéria e que [são] no
intelecto por abstração a qual, como é evidente, vem depois das
coisas”326. Por outro lado, completará posteriormente Nicolau
que, embora os “peripatéticos” não admitissem os exemplares
platônicos, reconheciam que “a natureza é obra da inteligência”
e que esses falhariam se não entendessem que essa inteligên-
cia é Deus. Nicolau parece supor certa dificuldade na posição
defendida pelos “peripatéticos”, pois, se aceitam e reconhecem
a inteligência como causa da natureza, não poderiam negar nela
certo conhecimento segundo o qual ela se move. Pergunta-se,
então, o Cardeal de Cusa:
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Com efeito, se não há um conhecimento na inteligência, como
ela se move segundo um propósito? E se existe um conheci-
mento da coisa que há-de ser explicada temporalmente, o qual
é a razão do movimento, esse [conhecimento] não pode ser
abstraído da coisa que ainda não é temporalmente.
Portanto, se existe um conhecimento segundo o qual as
coisas são e que, por isso, não é derivado delas, afirma Nicolau,
então é desse tipo de conhecimento de que falam os “platônicos”.327
A teoria da alma do mundo e a concepção de que nela os
exemplares são múltiplos e distintos buscava dar uma resposta
ao problema da relação entre a unidade e a pluralidade, pois era
preciso explicar como de uma unidade que não se multiplicava
e que permanecia inalterável e imparticipável poderia derivar
a pluralidade das coisas. Daí a necessidade de se colocar entre a
unidade primeira e infinita um intermediário que dela derivasse
e que pudesse conter os exemplares de todas as coisas, já que na
razão infinita “todos são um só”, ou seja, a alma do mundo seria
“[...] a explicação da mente divina de modo que todas as coisas, 152
que, em Deus, são um só exemplar sejam, na alma do mundo,
muitas e distintas coisas”328. E é justamente por esse aspecto
que “muitos de entre os cristãos concordaram com esta via
platônica”. Pois, como cada coisa possui a sua a razão própria
e, portanto, uma difere da outra de modo que a razão da pedra
não é a razão do homem; e como em Deus não se dá diferença,
então consideraram necessário que as razões, segundo as quais
as coisas são distintas umas das outras
[...] fossem depois de Deus e antes das coisas, uma vez que a
razão precede a coisa, que o fossem na inteligência que rege
os orbes e que tais razões distintas fossem noções distintas das
coisas, sempre indeléveis, na própria alma do mundo329.
A posição assumida por Nicolau reconhece que há
um conhecimento segundo o qual a coisa é, ou seja, antes da
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contração e, portanto, antes da abstração. Assim, a especulação
cusana parece se aproximar mais da posição dos “platônicos” do
que da posição dos “peripatéticos”. De fato, segundo Nicolau, os
primeiros falaram de modo “bastante agudo e racional” e foram
“[...] repreendidos talvez sem razão por Aristóteles, que se
esforçou por refutá-los mais na superfície das palavras do que
no núcleo central da sua doutrina”. Contudo, no caso do pensa-
mento cusano, isso dificilmente significará uma mera repetição
da tradição da qual é mais próximo. O que se estabelece é
sempre um diálogo aberto e produtivo que lhe permitirá ilumi-
nar a tradição à qual se vincula, deixando à vista os seus limites
conceituais. Assim, por meio do princípio da douta ignorância,
Nicolau pretende “[...] explicar o que é mais verdadeiro”.330
Já sabemos pela douta ignorância que não é possível,
quando se dá excedente e excedido, chegar ao máximo simples.
Daí ser necessário negar, em relação ao mundo ou máximo
contraído, tanto a possibilidade absoluta como a forma ou o ato
absoluto. Somente Deus é a possibilidade absoluta e o ato abso- 153
luto e qualquer coisa “para além de Deus” é sempre contraída.
Portanto, é preciso saber olhar para as coisas enquanto são no
Máximo absoluto e para as mesmas coisas enquanto são no
máximo contraído. Assim, as formas das coisas, enquanto são
de modo contraído, são distintas uma das outras e, enquanto
são de modo absoluto, são uma só e indistintas. Além disso, não
podemos também esquecer o papel que a concepção trinitária
cusana desempenha em toda a sua especulação. Por isso, as
formas enquanto são de modo absoluto e, portanto, enquanto
uma única e indistinta forma, serão identificadas com “[...] o
verbo na divindade”331. De modo mais explícito ainda e agora se
referindo diretamente aos “platônicos”, Nicolau reafirma essa
identificação ao declarar que
[...] a necessidade da complexão não é, como estabeleceram
os Platônicos, uma mente menor do que o [princípio] gerador,
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mas é o verbo, o Filho igual ao Pai na divindade e chama-se
logos ou razão porque é a razão de todas as coisas332.
E, posteriormente, reconhece que o insuficiente conhe-
cimento ou instrução “sobre o verbo e o máximo absoluto” foi
o que levou a que tais filósofos considerassem “[...] a mente,
a alma e a necessidade numa certa explicação da necessidade
absoluta, sem contração”333.
Essa correção ou releitura da posição dos “platônicos”,
segundo os princípios da sua própria especulação, permitirá
a Nicolau mostrar o modo verdadeiro segundo o qual se deve
compreender a alma do mundo: “[...] não é como uma mente
separada ou separável das coisas”, pois somente é contraída
pela possibilidade334; “[...] não há nada daquilo que os Platônicos
disseram acerca das imagens das formas, porque não há senão
uma só infinita forma das formas, da qual todas as formas são
imagens”335; por último, e retomando uma posição assumida
anteriormente sobre o universo como um todo, Nicolau afirma
que se deve buscar entender com profundidade estas coisas 154
[...] porque a alma do mundo deve ser considerada como uma
certa forma universal que complica em si todas as formas,
mas não existindo em ato senão contraidamente nas coisas, e
numa qualquer coisa é a forma contraída da coisa336.
O terceiro elemento ou a correlação na trindade do
universo, máximo contraído, é o nexo. Anteriormente já aludi-
mos à perspectiva, segundo a qual Nicolau se coloca ao tentar
determinar o nexo em relação às outras duas correlações: o
nexo “[...] se perfaz em ato como uma espécie de espírito de
amor, uma espécie de movimento que une [...]” o contraente
e o contraível, ou a matéria e a forma ou a possibilidade e a
necessidade de complexão. Nicolau, usando termos próprios do
platonismo de Chartres, lembra também que o nexo foi deno-
minado “possibilidade determinada”, na medida em que “[...] o
poder ser é determinado a ser isto ou aquilo em ato pela união
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da sua forma determinante e da sua matéria determinável”.
Nesse sentido, a possibilidade determinada é o modo de ser das
coisas segundo o qual elas são “[...] isto ou aquilo em ato”337.
Igualmente, se retomarmos os capítulos anteriores sobre
a possibilidade e sobre a alma do mundo, então encontraremos
esboçadas algumas ideias sobre o movimento. Em primeiro
lugar, expondo a doutrina dos “platônicos”, segundo a qual
a “informidade é como que uma forma da possibilidade” ou
“a matéria das formas”, Nicolau recorda que, para esses mesmos
“platônicos”, a alma do mundo ligar-se-ia à matéria por meio
do que chamaram “raiz vegetal”. Assim como a alma do mundo
se misturaria com a possibilidade, “[...] aquela vegetabilidade
informe é levada a ser em ato alma vegetativa pelo movimento
que desce da alma do mundo e pela mobilidade da possibilidade
ou da vegetabilidade”338. Depois, Nicolau também recorda que
diziam que a necessidade de complexão enquanto possui a
forma das coisas “[...] moveria, segundo a ordem da natureza, o
céu, para, pelo movimento como instrumento, conduzir a possi- 155
bilidade ao ato e [ser] igual, o mais possível, ao conceito inteli-
gível da verdade”339. Por último, expondo a mesma doutrina dos
“platônicos”, considera que, para esses, existe uma precedência
natural de Deus em relação à necessidade da complexão e da
alma do mundo em relação ao movimento,
[...] o qual, como instrumento, precede a explicação temporal
das coisas, de modo que as coisas que são de modo verdadeiro
na alma e de modo possível na matéria, sejam explicadas
temporalmente pelo movimento340.
Além disso, também “julgaram que todo o movimento
derivava descensivamente desta alma do mundo [...]”341. O que se
mostra a partir dos textos citados é que, na concepção “platôni-
ca”, a ideia de movimento não se desvincula da ideia de alma do
mundo. Como vimos, o movimento é como que “instrumento”
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da alma do mundo pelo qual aquilo que é possível na matéria
passa a ser em ato.
Vimos anteriormente Nicolau rejeitar a doutrina dos
“platônicos” segundo a qual a alma do mundo ou a necessidade
da complexão seria uma mente inferior ao princípio simples.
Não obstante, Nicolau a identifica com o Verbo, filho de Deus
Pai. Por outro lado, enquanto modo de ser ou correlação no
universo, essa mesma alma do mundo não pode ser de modo
absoluto, mas será sempre contraída pela possibilidade.
Portanto, existirá nas coisas de modo contraído e em qualquer
coisa será sempre a sua forma contraída como o universo é a
forma contraída de qualquer coisa. Tendo em vista que Nicolau
reinterpreta tanto a possibilidade quanto a alma do mundo
segundo a sua doutrina trinitária, veremos em continuação que
o mesmo ocorrerá com a interpretação do movimento enquan-
to nexo que une a possibilidade e a forma.
A ideia de movimento será retomada em todo o décimo
capítulo e, como o próprio título do capítulo indica, está também 156
ligada à noção de espírito, tal como Nicolau havia feito anterior-
mente ao falar do nexo como “espírito de amor”. Diferentemente
dos capítulos anteriores sobre a possibilidade e sobre a alma do
mundo, Nicolau aqui não mencionará explicitamente nem os
“platônicos” nem os “peripatéticos”. Porém, o vínculo com as
doutrinas do platonismo de Chartres são inequívocos342. Segundo
Nicolau, alguns pensaram que
o movimento, pelo qual se dá a conexão da matéria e da forma,
[...] fosse um certo espírito, como algo de intermédio entre a
forma e a matéria e consideram-no difuso na esfera das estre-
las fixas, nos planetas e nas coisas da terra343.
É o mesmo espírito que se difunde em tudo, tendo em
vista que o movimento das coisas terrestres é uma espécie
de evolução do movimento dos planetas e o movimento dos
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planetas é uma evolução do primeiro movimento, ou seja, do
movimento das estrelas fixas e, por isso, “[...] disseram, afirma
Nicolau, que as coisas que são complicadas na alma do mundo
como se estivessem num novelo se explicam e estendem por tal
movimento”. Isto é, por meio daquele movimento que conecta a
esfera das estrelas fixas, os planetas e as coisas na terra. Assim,
retorna a concepção de que o movimento é o instrumento, por
meio do qual a alma do mundo ou a mente explica na matéria
os exemplares das coisas que trazem em si da mesma forma
que o artista esculpe na pedra, por meio dos “instrumentos que
movimenta”, a ideia da estátua que traz em si. E assim os sábios
também “[...] disseram que este movimento estava difundido por
todas as coisas como a alma do mundo”. Por último, retomando
termos “platônicos” anteriormente referidos, Nicolau afirma
que disseram também que esse movimento ou espírito das estre-
las fixas, dos planetas e das coisas terrenas é “[...] a explicação
do destino [existente] na substância, porque a coisa em ato é
determinada a ser assim por esse movimento ou espírito”344. 157
Portanto, com a noção de movimento ou espírito preten-
de-se explicar ou justificar a união da forma com a matéria, do
ato com a potência, da necessidade de complexão com a possi-
bilidade. Por diversas vezes sublinhamos a doutrina, segundo
a qual o movimento é quase como um instrumento por meio
do qual a alma do mundo atualiza o que é meramente possível
na matéria ou que a alma do mundo “explica na matéria” o
que nela está complicado por meio do movimento. Além do
mais, ainda destacamos que a alma do mundo precede natu-
ralmente o movimento e que esse procede descensivamente
dela. Entretanto, se o movimento deve ser pensado como um
“espírito de conexão”, será necessário não apenas acentuar
que ele procede da alma do mundo, mas também que procede
da possibilidade. A ideia de este mútuo originar-se Nicolau
parece também encontrar na tradição, à qual vem fazendo
referência neste décimo capítulo: “Disseram que este espírito
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de conexão procedia de ambas, ou seja, da possibilidade e da
alma do mundo”. Nicolau deixa ver que a mútua procedência
se dá tendo em vista que a matéria apetece ou possui uma
“aptidão” que é sua “para receber a forma”. Por essa “aptidão”,
então, a possibilidade ascenderia “em direção ao ser em ato”.
Por outro lado, também a forma quer chegar ao ato ou “deseja
ser em ato”, mas, como não pode ser de modo absoluto, pois
“[...] não é o seu ser e não é Deus, então desce a fim de ser de
modo contraído na possibilidade”. Desse modo, enquanto a
possibilidade ascende para ser em ato e a forma desce para
acabar, perfazer e terminar a possibilidade, isto é, da subida de
um e da descida do outro,
[...] surge o movimento que liga ambas. Este movimento
é o meio de conexão da potência e do ato, porque da possi-
bilidade do móvel e do motor formal surge o movimento
enquanto intermediário345.
Acreditamos que essas ideias do platonismo de Chartres, 158
que recuperamos a partir das indicações do texto do De docta
ignorantia, são fundamentais para a interpretação da ideia
de nexus na especulação cusana. Entretanto, será necessário
compreender de que modo Nicolau de Cusa se apropriará das
mesmas tendo em vista os fundamentos da própria especulação.
É certo que, assim como reinterpretou tanto a ideia de possibili-
dade absoluta quanto a ideia de forma ou alma do mundo partin-
do da regra da douta ignorância e as introduziu em um contexto
trinitário, Nicolau fará o mesmo com a ideia de movimento, de
espírito ou de nexo. Para o Cardeal de Cusa, “este espírito está
difuso e contraído por todo o universo e por cada uma das suas
partes e chama-se natureza” e “[...] este movimento ou espírito
provém descensivamente do espírito divino[...]”346; é “espírito
criado”347 e, por último, o movimento não pode ser absoluto,
pois coincidiria com o repouso, isto é, com Deus348.
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Apesar de este espírito não poder ser dito absoluto,
enquanto é contraído como a possibilidade e a forma, Nicolau
o chama de “natureza”, tendo em vista que “[...] está difuso e
contraído por todo o universo e por cada uma das suas partes”.
Retomando a dialética da complicatio/explicatio afirma ainda que
“[...] a natureza é, de algum modo, a complicação de todas as
coisas que acontecem através do movimento”. Daí podemos
também concluir que o que existe na ordem temporal é expli-
cação da “natureza”. Por isso, será preciso que Nicolau especule
“[...] como este movimento se contrai a partir do universal até o
particular [...]”. Além disso, tendo em vista o contexto criacio-
nista e trinitário da sua especulação, será necessário mostrar
que “[...] este movimento ou espírito provém descensivamente
do espírito divino [...]” e que, por isso, não é um espírito abso-
luto que está difuso por toda parte como a alma do mundo. Um
mesmo exemplo servirá para conduzir a especulação: a pronun-
ciação de uma proposição qualquer. Quando pronunciamos,
afirma Nicolau, a proposição “Deus é”, ela 159
[...] progride num certo movimento, mas com uma tal ordem
que primeiro pronuncio as letras, depois as sílabas, depois
as palavras e por último a proposição, embora o ouvido não
distinga esta ordem na sua gradação.
Talvez pudéssemos dizer que o ouvido escuta apenas o
sentido contraído na proposição, mas não percebe o movimento
da pronunciação por meio do qual a proposição se dá. Assim,
Nicolau chama a atenção para o fato de que no movimento
do universal ou do universo ao particular se dá uma gradação
ordenada, mas nos damos conta de fato apenas do particular
contraído: “[...] o movimento desce gradualmente do universo
ao particular e contrai-se aí na ordem temporal ou natural”.
Não percebemos o movimento, mas apenas o “aí” (ibi) no qual o
movimento se contrai. Esse mesmo movimento que se contrai na
ordem temporal “provém descensivamente do espírito divino” e
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é por meio dele que Deus “move todas as coisas”. Para fazer ver de
que modo Deus move tudo por meio desse movimento, Nicolau
recupera, no exemplo citado, a ideia de que há naquele que fala
um espírito que dele procede e que “se contrai na proposição”.
Dessa forma, sendo Deus espírito, Ele é, então, “[...] aquele de
que procede descensivamente todo o movimento”. Por fim, para
corroborar essa ideia, Nicolau cita um versículo do evangelho de
Mateus (“Não sois vós que falais, mas o espírito do vosso pai que
fala em vós.” Mt 10,20) e conclui que o mesmo deve ser dito “[...]
de todos os outros movimentos e operações”349.
O sentido mais profundo da especulação cusana sobre
“o espírito do universo” se mostra quando Nicolau articula
essa noção com a ideia de conexão350. Devemos recordar que,
enquanto o espírito “procede descensivamente” do espírito
divino, é “espírito criado” e, por isso, não é absoluto, mas
sempre contraído. É, portanto, esse mesmo espírito que
mantém qualquer coisa na sua unidade e, sem ele, nada pode
subsistir. Decerto, é por meio desse mesmo espírito que o “[...] 160
mundo e todas as coisas, que nele são, são [naturalmente] em
conexão o que são”. Se tudo aquilo que é não pode ser senão por
meio desse espírito, então é por meio dele ou por seu intermé-
dio que a potência e o ato se unem. A esse movimento Nicolau
chamará de “[...] movimento da conexão amorosa de todas as
coisas para a unidade, de modo que de todas as coisas surja um
universo uno”. O movimento de todas as coisas para a unidade
é ao mesmo tempo movimento para ser o que se é do melhor
modo possível e também movimento para se conservar em si
mesmo ou na espécie. No primeiro caso, “[...] todas as coisas
se movem na sua singularidade, a fim de serem o que são do
melhor modo e nenhuma igual a outra”. Por isso, é o mesmo
movimento que faz uma coisa mover-se para ser do melhor
modo que possa ser e que a faz, consequentemente, diferente
das outras. Assim, qualquer coisa é do melhor modo que pode,
ou seja, move-se para ser idêntica a si mesma e ao mesmo tempo
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
diferenciando-se de todas as outras. A diferença em relação às
outras é o que faz com que cada coisa possa ser o que é, ou seja,
idêntica a si mesma. Daí que o movimento para a unidade não é
um movimento para a uniformidade, para uma unidade univer-
sal na qual as coisas particulares terminassem por perder a sua
identidade e a sua singularidade. Mas o universo uno resulta de
um movimento pelo qual uma coisa, para ser o que é, contrai
todas as outras. Assim, qualquer coisa é de modo “imediato” no
universo e também de modo “mediato” por meio de qualquer
coisa. É, portanto, o mesmo movimento ou espírito que leva
todas as coisas a serem o que são e as conserva no que são.
Em linguagem teológica, isto significa que Deus cria por meio
do seu espírito, impele para que cada coisa seja do melhor modo
possível e mantém ou conserva a sua criação.351
Por último, como já havíamos antecipado, assim como
Nicolau considerou como inadequadas ou pelo menos equi-
vocadas as reflexões sobre a possibilidade absoluta e sobre a
alma do mundo, mas se apropriou da tradição, adequando-a aos 161
princípios da sua própria especulação, do mesmo modo o fará
com o movimento. De modo especial, Nicolau pretendeu negar
tanto uma possibilidade absoluta quanto uma alma do mundo
ou mente não contraída que, procedendo da unidade, conteria
em si a diversidade dos exemplares das coisas. Com relação ao
movimento, Nicolau também negará que qualquer movimento
que possa ser dito movimento do mundo possa ser, de modo
simples, o máximo, pois o movimento máximo coincidirá com
o repouso. Assim, “nenhum movimento é absoluto, porque o
movimento absoluto é repouso e é Deus. Ele complica todo o
movimento”. Por fim, havendo considerado as correlações na
trindade do universo, Nicolau pode, então, concluir e mostrar
que elas procedem da Trindade divina:
Pois, assim como toda a possibilidade é na possibilidade abso-
luta, que é Deus eterno, e toda a forma e ato na forma absoluta
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
que é o verbo do pai e o filho na divindade, todo o movimento
de conexão bem como a proporção e a harmonia que une são
na conexão absoluta do espírito divino. E isso de modo que
haja um só princípio de todas as coisas, Deus, no qual todas
as coisas e pelo qual todas as coisas são numa certa unidade
da trindade, contraídas, de modo semelhante segundo o mais
e o menos, entre o máximo e o mínimo, de modo simples
consoante os seus graus, de maneira que um seja o grau da
potência, do ato e da conexão do movimento nas inteligências,
onde entender é mover, e outro o da matéria, da forma e do
nexo nas coisas corporais, onde ser é mover, [...].352
O que Nicolau predente ao reconduzir a unidade e a
pluralidade do universo à unidade e à Trindade divina é mostrar
que para todas as coisas é necessário apenas um único princípio
e que esse princípio deverá, por isso mesmo, ser pensado como
unitrino. Portanto, Nicolau considera que o causado possui tudo
da causa, mas que não é idêntico a ela, pois embora a causa se
comunique totalmente, o causado a recebe de modo diminuído.
Assim, o que convém ao máximo absoluto absolutamente deve
também convir ao universo, ou máximo contraído, contraida- 162
mente: a unidade e a trindade que in divinis é tomada absolu-
tamente, no universo será tomada contraídamente. A unidade
do universo é uma unidade de muitas coisas e, por isso, é uma
unidade contraída na pluralidade. Por outro lado, também a
sua trindade não é absoluta, mas contraída. Nicolau de Cusa,
ao buscar determinar o sentido da trindade do universo, dialo-
ga com a tradição “platônica” e “aristotélica”, mas aponta,
por meio do princípio da douta ignorância, os limites dessa
mesma tradição. De modo especial, aquilo que corresponderia
à trindade do universo, ou seja, os modos de ser, não poderão
ser pensados como absoluto e eterno, mas como contraídos: o
contraente, que procede descensivamente da unidade eterna,
o contraível, que procede da igualdade eterna, e o nexo, que
procede do nexo infinito, serão sempre tomados contraidamen-
te. É por isso que, com relação ao máximo contraído, não se dá
uma possibilidade absoluta, pois apenas Deus é a possibilidade
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
absoluta enquanto é o que pode ser. Da mesma forma, a neces-
sidade da complexão ou forma não deve ser pensada como uma
alma do mundo ou espírito do universo absoluto, que conteria
os exemplares de todas as coisas. Por último, o nexo da matéria
e da forma ou movimento não pode ser também um movi-
mento absoluto, pois o movimento absoluto coincidiria com o
repouso absoluto e isso só seria pensável no princípio simples.
Portanto, contraidamente na sua unidade e na sua trindade, o
máximo contraído imita o seu princípio simples e absoluto.
3.5 A MENS, VIS ASSIMILATIVA, IMITA A TRINDADE
O Idiota. De mente pode ser considerado por diversos
aspectos um marco na vida, no pensamento e na especulação
cusana353. O referido texto em forma de diálogo entre o orador
romano, já personagem dos dois livros sobre a sabedoria,
um filósofo e o Idiota encontra-se situado em um conjunto 163
de quatro diálogos cujo personagem central é justamente o
Idiota355: Idiota. De Sapientia (Livro I e II), Idiota. De Mente e Idiota.
De Staticis Experimentis, textos que foram escritos em 1450356.
O nosso interesse específico ao tomarmos o Idiota. De mente
como guia é pensar de que modo o homem imita a Trindade
divina e, portanto, como aparece em relação à mens humana a
ideia de nexus.357
A especulação sobre a mente humana, a sua constitui-
ção e o seu modo de operar, não é estranha ou alheia, afirma
D’Amico, aos escritos do Cardeal alemão anteriores ao Idiota.
De mente (2005, p. 21). Segundo a autora, já a partir dos seus
primeiros sermões Nicolau de Cusa oferece uma herme-
nêutica do versículo 26 do primeiro capítulo do Gênesis,
“Faciamus hominem ad imaginem”358. Além disso, ela também
sugere que a interpretação cusana é muitas vezes agostiniana,
por exemplo, quando Nicolau considera que, na configuração
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
da alma humana (memória, entendimento e vontade), reluz a
Trindade criadora. O que, entretanto, merece destaque nesta
pequena introdução de D’Amico ao Idiota. De mente é a ideia
de que o “caráter dinâmico da mente” transparece já, de modo
explícito ou não, no De docta ignorantia e no De coniecturis e
também em um sermão (Sermo XXII) contemporâneo à reda-
ção dessas obras como uma doutrina genuinamente cusana.
Assim, para ela, a trindade da mente, que em um primeiro
momento aparecia como “um traço da constituição da mente
[...], tornar-se cada vez mais um modo de operar”. Essa concep-
ção dinâmica da mente permitirá à autora sustentar que se dá
aqui um deslocamento de uma consideração substancialista da
mente para uma consideração na qual o que deve ser chamado
natureza da mente “não é mais do que seu operar trinitário:
uma mente que gera seu próprio verbo ou conceito, de ambos
procedendo, como nexo imprescindível desse operar, a vontade
ou amor” (2005, p. 24)359. Assim, o deslocamento anteriormente
referido de uma consideração substancialista para uma conside- 164
ração dinâmica e relacional da mente impõe que se deva pensar
a ideia da mens como imago dei justamente a partir do seu próprio
operar trinitário, ou seja, a mens por seu operar é imago trinitatis.
A relação entre o operar da mens e o do princípio unitrino
já aparece, por exemplo, no De coniecturis como tentativa de
mostrar em que sentido a mente é princípio das conjecturas.
Algumas das ideias que aqui surgem serão retomadas e apro-
fundadas no Idiota. De mente. Por exemplo, Nicolau afirma que
as conjecturas vêm da nossa mente assim como o mundo real
vem da mente divina e que os entes racionais são semelhanças
dos entes reais que a mente, alta dei similitudo, tira de si mesma,
enquanto imagem da forma onipotente. Por isso, assim como
a mente divina é forma daquele mundo real, também a mente
humana é “forma do mundo conjectural” e a unidade da mente
constitui a entitas das suas próprias conjecturas. A semelhança
entre o operar divino e aquele da mente humana não termina
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
sem antes Nicolau se perguntar pelos motivos de tal operar.
Ora, Deus opera tendo em vista a si mesmo, ou seja, para ser
ao mesmo tempo princípio e fim inteligível de todas as coisas.
A obra de Deus diz respeito à sua própria manifestação ou ao
seu próprio mostrar-se inteligivelmente na sua criação360.
Da mesma forma, a mente complica (complicatio) um mundo
racional e a explicação (explicatio) desse mundo se dá tendo
em vista a própria mente que o fabrica. Daí que quanto mais a
mente humana se contempla no mundo que ela explica a partir
de si mesma, mais ela se torna fecundíssima e produtiva em si
mesma, pois o seu fim é a razão infinita, medida para todos os
entes racionais, na qual a mente intuirá a si mesma, ou seja,
somente na razão infinita a mente se verá como de fato é361.
Assim, quanto mais aprofundarmos a nossa mente, mais ela se
aproximará da semelhança com a mente infinita que é o seu
único centro vital362. A partir dessa perspectiva, Nicolau pode
mais uma vez interpretar o motivo aristotélico de que o homem
deseja por natureza conhecer.363 165
Havendo, portando, indicado em que sentido a mente é
origem das conjecturas enquanto é imagem de Deus, Nicolau,
então, propõe-se a conduzir o seu leitor364 a compreender o seu
pensamento e como a mente pode ser princípio das conjectu-
ras. Para isso, retoma a sua doutrina trinitária pensada a partir
dos termos unitas-aequalitas-conexio já apresentada no De docta
ignorantia. É necessário que o princípio de tudo seja unitrino365
para que esse possa ser o princípio único da multiplicidade, da
desigualdade e da divisão que encontramos nas coisas: a unida-
de absoluta é o princípio da multiplicidade, a sua igualdade é
o da desigualdade ou diversidade e o princípio da divisão é a
conexão da unidade com a sua igualdade. Da mesma forma, a
mente se faz o princípio unitrino da sua própria construção
racional, pois, de fato, a razão é a medida da multiplicidade, da
grandeza e da composição366. Nicolau usa os mesmos termos
com os quais especula sobre a trindade do princípio primeiro e
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
afirma que a unidade da mente complica toda multiplicidade,
a sua igualdade complica toda grandeza e a sua conexão toda
composição. Determinado, assim, em que sentido a mente
complica a multiplicidade, a grandeza e a composição, é preci-
so mostrar em que sentido, enquanto princípio unitrino, ela
também explica o seu próprio mundo: a partir da força compli-
cativa da sua unidade, a mente explica a multiplicidade que
é geradora de desigualdade e grandeza. Assim, a partir dessa
multiplicidade, que Nicolau chama de primordiali multitudine, a
mente procura as grandezas diversas e desiguais ou as perfei-
ções de cada coisa na sua inteireza ou totalidade. Em seguida, a
partir da multiplicidade e da grandeza, a mente progride para
a composição. Nicolau pode concluir, então, que a mente é
princípio de distinção, proporção e composição.367
Para dar continuidade à nossa exposição, poderíamos
retomar aqui alguns aspectos da já citada “introdução” de
Claudia D’Amico ao Idiota. De mente. Gostaríamos de destacar
dois aspectos: o primeiro diz respeito às obras que estão 166
entre o De docta ignorantia e De coniecturis e o Idiota. De mente. A
autora chama a atenção para o De filiatione dei (1445), no qual a
compreensão do intelecto humano como um “espelho vivo” “[...]
que espelha não passiva, mas criativamente o divino engendra-
mento de todas as coisas no ‘espelho primeiro da Verdade’, o
Verbo ou Filho na Trindade” preanunciaria os temas do Idiota.
De mente (D’AMICO, 2005, p. 24). O segundo aspecto diz respeito à
unidade dos quatro diálogos do Idiota, à qual já fizemos referên-
cia. No primeiro diálogo, apresenta-se o homem como aquele
que incessantemente busca a sabedoria divina na qual encontra
a sua própria vida e a sua imortalidade. No segundo diálogo, ao
se discutir sobre a dificuldade humana de conceber um conceito
do absoluto, afirma-se que Deus é o conceito de todos os concei-
tos. Assim, caracteriza-se a sabedoria divina como Verbo, igual-
dade da unidade e segunda pessoa da Trindade, e como conceito
absoluto gerado pela mente absoluta. Aqui se encontra, segundo
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
a autora, a peça que torna os diálogos inseparáveis, pois, assim
como a mente absoluta gera seu próprio Verbo que se explica na
criação, da mesma forma a mente humana, enquanto imagem
da mente absoluta, mostra-se a si mesma na explicação do seu
próprio mundo criativo medindo todas as coisas (D’AMICO,
2005,p. 25). Retomamos esses dois aspectos para mostrar que
o discurso sobre a mens na especulação cusana é indissociável
da sua doutrina trinitária e para apontar para a relação entre a
mens e a segunda pessoa da Trindade ou “primeiro espelho da
Verdade”368.
O De sapientia I antecipa em relação ao Idiota. De mente a
ideia de que a mente é viva imago dei e, ao identificar a sabedoria
com o Verbo, retoma a especulação trinitária a partir dos termos
unitas-aequalitas-conexio. No que se refere à primeira questão, o
Idiota está respondendo à solicitação do orador que lhe pergun-
ta como poderia se elevar a certo sabor da sabedoria eterna369.
À solicitação do orador precede a sua compreensão de que a
sabedoria é saboreada de modo in-saboreável e compreendida 167
de modo incompreensível370. Portanto, como não é possível
alcançar a sabedoria como ela é em si mesma, então, segundo o
Idiota, ela será saboreada em tudo aquilo que é saboreável; ela é
o deleite em toda coisa deleitável; é a beleza em toda coisa bela
e o mesmo se pode dizer de todas as coisas desejáveis. Não seria
feliz uma vida vivida segundo os próprios desejos? Pergunta o
Idiota. Mas o desejo e a vida feliz que desejamos não existem
senão na sabedoria eterna e, desse modo, “em todo desejo da
vida intelectual o que se deseja é somente a sabedoria eterna”.
Por isso, embora não possamos saboreá-la em si mesma, se o
desejo de uma vida imortal e feliz nos agrada, então em nós já
experimentamos antecipadamente a sabedoria eterna.370
Podemos ainda destacar dois outros princípios citados
pelo Idiota que nos ajudam a compreender de que modo,
para Nicolau de Cusa, desejamos a sabedoria eterna e dela
nos nutrimos. Em primeiro lugar, o Idiota recorda que não
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
desejamos nada que nos seja completamente desconhecido372
e que nos nutrimos daquilo que nos faz existir. Assim como
para vivermos precisamos de alimentos e quando sentimos
fome é para o alimento que nos movemos, da mesma forma o
intelecto, que tem a própria vida a partir da sabedoria eterna e
dela possui certa experiência antecipada, em qualquer alimento
que lhe é necessário não se move senão para a sabedoria eterna.
O movimento do espírito intelectual para a sabedoria eterna
é comparado ao movimento do ferro para o ímã e, portanto,
como um ser arrebatado ou atraído para e pela sabedoria373.
A esse movimento próprio do espírito que não se debilita jamais
e que não encontra repouso senão na própria sabedoria Nicolau
chamará de assimilatio, que deverá ser entendida com um
“tornar-se semelhante” ou um infinito aproximar-se à sabedo-
ria eterna e infinita. É nesse contexto específico, portanto, que
Nicolau sugerirá que a assimilatio é quase como uma imagem
viva da própria sabedoria, pois a imagem não encontra repouso
senão naquilo do que é imagem. Se o exemplar é eterno e a 168
imagem move-se para esse e como esse movimento encontra
repouso somente na vida infinita e na sabedoria eterna, então
o movimento da nossa mente não pode interromper-se jamais,
pois não alcançará jamais a vida infinita374.
O segundo aspecto que gostaríamos de chamar a atenção
em De sapientiai I seria a reafirmação da doutrina trinitária cusa-
na. O texto reapresenta uma especulação que se distingue pela
riqueza vocabular, o que permite a Nicolau articular elemen-
tos da fé cristã e elementos da tradição que já tivemos tantas
vezes oportunidade de mostrar. O que aqui está em questão é
a identificação da sabedoria eterna com o Verbo. Segundo o
Idiota, não é diferente afirmar que Deus, princípio de tudo, fez
todas as coisas por meio da sua sabedoria ou que criou todas
as coisas por meio do seu Verbo. Assim, a discussão sobre a
sabedoria é introduzida no contexto da doutrina trinitária.
Como sempre, Nicolau parte da consideração ou da observação
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
do mundo ou daquilo que existe e, dessa forma, também se
pressupõe a doutrina da criação: qualquer coisa que existe,
pôde existir assim como é e de fato existe. Deus, enquanto
onipotente, desde si mesmo dá a atualidade de ser por meio
da qual as coisas puderam ser produzidas do não-ser ao ser.
Nesse sentido, é Deus Pai e Ele também pode ser chamado
unidade ou entidade, pois por sua onipotência obriga a ser o
que era nada. O segundo aspecto diz respeito ao fato de uma
coisa não somente ser, mas ser isto ou aquilo. É Deus também
que concede que o céu seja céu e não outra coisa, que o céu
seja céu e não seja nem mais nem menos. Nesse sentido, é Deus
Filho, o Verbo ou a sabedoria e Ele pode ser chamado igualdade
da unidade. Por último, para que uma coisa seja, é preciso a
união de ser e de ser de um determinado modo. Essa conexão
ou união que conecta todas as coisas é também a partir de Deus
e é o Espírito Santo que une e conecta todas as coisas em nós
e no universo. Assim, o Idiota conclui que todas as coisas, para
que tenham ser e tal ser, no qual é, precisam de um princípio 169
unitrino, isto é, Deus trino e uno375.
No Idiota. De mente, Nicolau de Cusa pretende que a sua
conjectura sobre a mente humana apresente certa novidade
em relação àquilo que anteriormente já se havia escrito sobre
a mente. De fato, o filósofo, que junto com o orador romano
é o interlocutor de Nicolau de Cusa nesse diálogo, reconhece
que ainda não havia lido que alguém tivesse sustentado entre
as várias derivações da palavra aquela que o Idiota reconhece376.
O filósofo refere-se à conjectura, segundo a qual a “mente”
se diz a partir de “medir” e que afirma que a mente é aquilo
a partir do que deriva o termo e a medida de todas as coisas.
Além disso, não podemos esquecer que o traço fundamental do
Idiota. De mente é encontrado na ideia de que a mente é imagem
de Deus. Essa ideia repercute em todo o diálogo desde o seu
primeiro capítulo, no qual o Idiota distingue entre a mente que
subsiste no corpo e a mente que subsiste por si, que é ou infinita
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
ou imagem do infinito. A mente humana, enquanto não é máxi-
ma ou absoluta, seria imagem do infinito; por ofício, porém, ou
seja, enquanto anima o corpo, também é alma377.
No contexto do terceiro capítulo, ou seja, após a discus-
são sobre a nomeação (segundo capítulo) e sobre o Verbo como
precisão do nome divino (terceiro capítulo), o filósofo propõe
que o Idiota retome a discussão sobre a mente378. O princípio que
guia Nicolau é o seguinte: “o que convém à mente divina enquan-
to verdade infinita convém à nossa mente como sua imagem
próxima”. A partir desse princípio, Nicolau poderá pensar a
relação entre a mente divina e a mente humana nos seguintes
termos: se a simplicidade divina complica todas as coisas, a
mente humana seria a imagem da simplicidade complicante; se
a mente infinita é a “universalidade da verdade das coisas”, a
mente finita é a “universalidade da assimilação das coisas” e,
portanto, “universalidade das noções”; enquanto a concepção
da mente divina é “produção das coisas” ou criação dos entes, a
produção da mente humana é noção das coisas ou assimilação 170
dos entes. Por isso, se tudo está na mente divina como em sua
verdade, tudo está em nossa mente como na imagem ou seme-
lhança da própria verdade, isto é, nocionalmente. Tudo está em
Deus e tudo está na mente. Está em Deus como os exemplares
das coisas, está em nossa mente como a semelhança das coisas379.
Porém, a mente não é somente a imagem de Deus, mas “imagem
que é a complicação de todas as imagens”. Para Nicolau, isso
significa que a mente é imagem de Deus e é “exemplar de todas
as imagens de Deus que são depois d’Ele”. A concepção que se
encontra por trás dessas ideias é a de que a dei notitia seu facies
descende somente na natureza mental, “cujo objeto é a verdade
e não vai além senão por meio da mente”. Isso significa que a
mente por si é imagem de Deus, mas o que é depois da mente só
o é por meio da mente380.
No quarto capítulo, a ideia de que a mente é imago dei
é ainda mais acentuada por meio da diferença entre imago e
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
explicatio. Recordemos que, com a dialética da complicatio-expli-
catio, Nicolau busca pensar a relação entre a unidade e a plura-
lidade. Assim, o que é depois da mente é explicação da divina
complicatio, mas a mente seria imagem da divina complicação.
O que pretende, então, Nicolau ao retirar da mente humana o
caráter da explicatio e, portanto, da pluralidade? O Cardeal de
Cusa mesmo compreende que o que pretende dizer não pode
ser convenientemente expresso e daí a necessidade de multi-
plicar as palavras. Ao afastar a mente do espaço da explicatio,
Nicolau a aproxima do espaço da complicatio: a mente humana
é imagem simplíssima e primeira da divina complicação. Para
conduzir seus interlocutores à compreensão do que pretende
ensinar, o Idiota toma a relação entre a unidade, a igualdade
e a pluralidade pensada a partir da diferença entre imago e
explicatio: enquanto “a igualdade é a imagem da unidade, pois da
unidade nasce a igualdade uma vez”, a explicação da unidade é
a pluralidade. Daí conclui que a igualdade da unidade é imagem
da complicação e não a sua explicação381 171
Nicolau continua o seu esforço de lançar luz sobre a
ideia de que a mente é imago dei. Para isso, assume que se dê
uma precedência da imagem em relação à pluralidade e que a
pluralidade é a explicação da divina complicação. Portanto,
antes da pluralidade dá-se a imagem que, no caso da mente
humana, é complicação nocional de todas as explicações e,
consequentemente, imagem da complicação divina. Nicolau
se utiliza de diversos exemplos para mostrar em que sentido
a pluralidade é a explicação da complicação: por exemplo, o
número não é imagem da unidade, mas a sua explicação, e, da
mesma forma, o movimento em relação à quietude, o tempo em
relação à eternidade, a composição em relação à simplicidade,
o tempo em relação à presença, a magnitude em relação ao
ponto, a desigualdade em relação à igualdade, a diversidade em
relação à identidade e assim por diante. Portanto, cada coisa
tomada particularmente é a explicatio de uma complicatio, Deus é
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
a complicação das complicações e a mente é imagem da compli-
cação das complicações.
Para compreender a relação entre a mente humana e o seu
princípio, Nicolau emprega os mesmos termos utilizados para
entender a relação intratrinitária entre o primeiro e o segundo
elemento, ou seja, entre o princípio e o seu verbo ou entre a
unidade e a igualdade da unidade. Entretanto, não existe aqui
nenhuma identificação entre a mente humana e o logos divino e
nenhuma confusão entre a relação da mente humana com o seu
princípio e do princípio com o seu logos ou verbo. Em primeiro
lugar, porque no interior da Trindade o Filho é imagem perfeita
do Pai e,por isso, embora se possa postular uma distinção entre
as pessoas, não existe, contudo, alteridade nenhuma. Além
disso, podemos também recordar que, como vimos anterior-
mente na interpretação do Idiota. De sapientia I, Nicolau chama o
movimento do espírito intelectual para a sabedoria de assimilatio
e entende-a quase como uma imagem viva da própria sabedoria,
pois a imagem não encontra repouso senão naquilo do que é 172
imagem. Portanto, a mente mantém uma relação de imagem
com a sabedoria divina, ou seja, o logos, verbo ou razão, e, além
disso, entre a mente humana e a sabedoria eterna permanecerá
sempre a diferença entre a imagem e o exemplar.
Por fim, o que Nicolau pretende ao utilizar o exemplo
da relação entre a unidade e a sua igualdade para pensar a
relação entre a mente infinita e a mente humana é lançar luz
sobre a força complicativa da mente que, enquanto imagem
da complicação absoluta, pode assimilar-se a toda explica-
ção, pois a força da mente está em poder complicar “a força
assimilativa da complicação” do ponto, da unidade, do agora,
da quietude, da identidade, da igualdade e do nexo por meio
da qual ela encontra em si a potência com a qual se assimila
à magnitude, à multiplicidade, ao tempo, à composição, à
diversidade, à desigualdade e a disjunção382. Um último aspecto
sobre a força da mente é a discussão proposta pelo Filósofo,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
personagem do Idiota. De mente, sobre o problema das noções
inatas (notionem concreatam) que é rejeitada por Aristóteles, mas
aceita por Platão. Contrariamente a Platão, o Idiota aponta para
a conveniência e a para necessidade do corpo para que a força
inata (vis concreata) da mente, que é força “compreensiva das
coisas e força nocional”, possa, excitada pelo sensível, chegar
ao ato. Assim, com Aristóteles, nega que com a mente tenham
sido criadas noções. Entretanto, considera que, se a mente não
possuísse nenhum juízo, não poderia progredir, razão pela
qual considera que a mente “possui um juízo inato” ou uma
“força judicativa” (vis iudiciaria) inata; e, se Platão chamou a
essa força “noções inatas”, não errou totalmente.383
Determinado, portanto, em que sentido a mente humana
é imago dei, busquemos agora pensar a relação entre a Trindade
divina e a da mente humana. No capítulo XI, o Filósofo propõe
retomar uma afirmação que o Idiota havia anteriormente
anunciado no sexto capítulo, quando se discutiu sobre o núme-
ro como princípio das coisas e no qual o Idiota termina por 173
concluir que a pluralidade das coisas é um modo de entender da
mente divina e que o número é o primeiro exemplar das coisas
na mente do criador. Prova disso é o prazer e a beleza que está
em todas as coisas e que consiste na proporção, assim como
a proporção, por sua vez, consiste no número. Dessa forma,
conclui o Idiota, que o número é o rastro principal que conduz à
sabedoria385. Ao que o Filósofo complementa que isso disseram
primeiramente os pitagóricos, depois os platônicos seguidos
também por Boécio386.
No início do sexto capítulo, o Idiota havia recusado para
si não somente o rótulo de pitagórico, mas qualquer outro.
Contudo, o Idiota reconhece o valor da filosofia dos pitagóricos.
Mas não porque acredite que os pitagóricos falaram de um
número matemático e que procede da nossa mente, mas porque
falaram simbólica e racionalmente do número que procede
da mente divina, do qual o número matemático é imagem387.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Por meio da relação de imagem que se estabelece entre a nossa
mente e a mente divina e entre o número da nossa mente e
aquele da mente divina, Nicolau, pela boca do Idiota, proporá
que também “o exemplar da nossa mente é o número, pois
sem número nada pode ser feito”. Ou seja, sem número não
existe assimilação, noção, discernimento e medição e, portanto,
sem o número nada pode ser entendido. Portanto, o número
da nossa mente, imagem do número divino, é o exemplar das
noções, pois o número divino é o exemplar de todas as coisas.
É neste contexto que o Idiota insere a doutrina trinitária e
afirma também que, na nossa mente, existe uma imagem dessa
Trindade. Tanto o ponto de partida como os termos utilizados
são os mesmos que já conhecemos e, da mesma forma, também
a relação entre unidade e pluralidade será pensada por meio da
dialética da complicatio-explicatio. Entretanto, o acento aqui não
recai exclusivamente sobre a relação interna à Trindade, mas na
relação da Trindade com a pluralidade das coisas. Nesse sentido, é
possível perceber que o termo unitas, que em alguns contextos 174
pode significar tanto a unidade do primeiro princípio quanto
o primeiro elemento trinitário, quando Nicolau utiliza o trinô-
mio unitas-aequalitas-conexio, aqui indicará a unidade que une
(unitas uniens), que é a mente incriada na qual tudo é uno. Por
outro lado, reafirma-se o princípio de que a unidade precede
a pluralidade, mas agora a pluralidade será pensada como a
explicação da força da unidade. A partir dessa perspectiva é
que se aponta qual seja a trinitas benedicta: a força da unidade
é a entidade das coisas, a igualdade de ser e a conexão da enti-
dade e da igualdade. A imagem dessa Trindade divina estaria
na nossa mente, pois, de modo semelhante à unidade da mente
divina que é unidade que une, a nossa mente também é unidade
que une antes de toda a pluralidade concebível por ela mesma.
Portanto, a pluralidade, imagem da pluralidade das coisas, vem
depois da unidade da mente da mesma forma que a nossa mente
é imagem da mente divina. Por último, a força da unidade da
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
mente explica a pluralidade e tal força é imagem da entidade, da
igualdade e da conexão388.
Como já antecipamos, a especulação sobre a relação entre
a Trindade divina e a trindade da mente é retomada no décimo
primeiro capítulo a pedido do Filósofo. Poderíamos novamen-
te advertir que o diálogo não diz respeito a uma tentativa de
compreender em que sentido Deus é uno e trino, ou seja, a
discussão não pretende esclarecer o dogma trinitário, mas o
que interessa ao Filósofo primeiramente é compreender como
as coisas são trinitariamente em Deus e de modo semelhante
na nossa mente389. Para isso, Nicolau retoma, pela boca do
Idiota, a sua doutrina trinitária pensada por meio do trinômio
unitas-aequalitas-conexio. O ponto de partida mais uma vez são
as coisas do mundo que, enquanto estão em ato, estão divididas.
Porém, podemos considerá-las à maneira dos filósofos e afirmar
que elas estão unidas pelos dez gêneros generalíssimos, os quais
abraçam todas as coisas. O que o Idiota sugere é que o Filósofo
dê um passo mais atrás e considere as coisas antes do começo 175
de ser para ver que aí veríamos as coisas sem divisão, unidas e
conexas, pois, como esclarece o Idiota, a conexão se dá antes de
toda divisão. A conexio, anterior à divisão, será identificada com
a eternidade simples e, portanto, com Deus que, sendo perfeito,
não exclui de si nada, pois perfeito é aquele ao qual nada falta e,
portanto, não se poderia negar que a universalidade das coisas
esteja na perfeição, isto é, em Deus. Entretanto, se a universali-
dade das coisas exige a pluralidade, a alteridade, a diversidade e
a divisão, por outro lado, a perfeição divina as exclui de si e, por
isso, todas as coisas em Deus são no uno390.
Partindo da divisão que reina entre as coisas, alcançou-se
que, em Deus, todas as coisas, desde a eternidade, são Deus
no sentido de que a perfeição divina exclui qualquer divisão,
alteridade e diversidade. Quando pensamos que a especulação
seguirá determinando em que sentido a unidade eterna alcan-
çada é também trina, Nicolau nos remete novamente para a
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
universalidade das coisas na sua temporaneidade. O ponto de
partida é sempre o factual e, nesse contexto, o que se pretende
entender é também o factual. Como o impossível não pode ser
feito, então se deve considerar, segundo o Idiota, que a universa-
lidade pôde ser feita ab aeterno.391
A partir da ideia de posse, o que segue é uma concepção
dinâmica tanto da Trindade divina quanto da trindade da mente
humana, tendo em vista a análise do posse como posse fieri, posse
facere e nexus; e em relação à mente humana como posse assimilari,
posse assimilare e nexus. Como sabemos, o conceito de posse será
fecundíssimo nas obras do último período que culminará com
o posse ipsum como último nome divino na especulação cusana.
Seguindo a linha de argumentação do Idiota, teríamos que, como
as coisas puderam ser feitas desde toda eternidade, poderíamos
ver mentalmente no posse fieri todas as coisas. Da mesma forma,
antes que as coisas fossem feitas deveria necessariamente haver
o posse facere e, assim, antes da universalidade temporânea das
coisas, podemos vê-las no posse facere. Entretanto, assegura o 176
Idiota, para que a universalidade das coisas, vista mentalmente
no absoluto posse fieri e no absoluto posse facere, viesse a existir,
era necessário o nexus ipisus utriusque, pois, de outra forma,
aquele que pode fazer nunca teria feito o que pôde ser feito. O
que se vê, então, antes da existência temporânea das coisas, as
mesmas coisas são no nexus que procede do posse fieri absoluto e
do posse facere absoluto. Porém, enquanto absolutos, os três são a
simples eternidade antes de todo tempo e, portanto, na eterni-
dade simples, contemplamos todas as coisas trinitariamente. A
especulação do Idiota sobre a Trindade divina termina por consi-
derar que o absoluto posse fieri, o absoluto posse facere e o absoluto
nexus de ambos são um só absoluto infinito e uma só deidade e
que, tendo em vista que o posse fieri vem primeiro do que o posse
facere, assim, ao primeiro se atribui a unidade, a qual compete
o preceder, ao segundo se atribui a igualdade, que pressupõe a
unidade, dos quais procede o nexo. Apesar de determinado em
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
que sentido Deus é uno e trino, falta mostrar se Deus também
entende as coisas enquanto é trino e uno.392 Para o Idiota, deve-se
considerar que, se o entender de Deus é a sua essência, então
Deus não entende como nós em uma sucessão, mas entende todas
as coisas na unidade, na igualdade e no nexo393.
Da consideração da mente divina, o diálogo passa à espe-
culação sobre a mente humana. Interessa ao Filósofo saber se,
à sua maneira, ocorre algo parecido na nossa mente, ou seja,
se também a mente humana entende de modo uno e trino.
O Idiota retoma uma afirmação que já vimos anteriormente
referida à relação entre o mundo ou universo e o máximo
absoluto. Segundo o Idiota, todas as coisas principiadas possuem
em si certa semelhança com o seu princípio e, desse modo, em
todas as coisas encontra-se a trindade na unidade da substância
semelhantemente à verdadeira Trindade e à unidade da subs-
tância do princípio eterno. Portanto, nas coisas principiadas
encontra-se o poder ser feito (posse fieri), o poder fazer (posse
facere) e o nexo de ambos, mas não de modo absoluto. O poder 177
ser feito das coisas principiadas procede descensivamente da
virtude infinita da unidade ou entidade absoluta; o poder fazer
das coisas principiadas procede descensivamente da virtude da
absoluta igualdade e a composição de ambos procede descensi-
vamente do nexo absoluto.394
Com relação à mente humana, reafirma-se que ela,
enquanto imagem da mente eterna, busca nessa mesma mente,
como a semelhança na verdade, a sua própria medida. E a nossa
mente, enquanto é semelhança da mente divina, deve ser consi-
derada como uma força profunda na qual o poder ser assimilado
(posse assimilari), o poder assimilar (posse assimilare) e o nexo
de ambos (et nexus utriusque) são essencialmente uma única e
mesma coisa. Assim, o Idiota poderá concluir que a mente, da
mesma forma que a mente divina, só pode entender qualquer
coisa, se ela for una na trindade. Entretanto, enquanto na mente
divina, eterna e absoluta não existe movimento nem sucessão,
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o mesmo não acontece na mente humana que “entende na
sucessão enquanto está unida ao corpo, o qual está submetido
à sucessão”. O movimento e a sucessão no ato de entender da
mente humana são descritos pelo Idiota do seguinte modo:
quando se move para entender antepõe algo na semelhança do
poder ser feito ou matéria, algo ao que acrescenta outra coisa
na semelhança do poder fazer ou forma e, então, entende na
semelhança do composto por ambos.
Nesse movimento ou sucessão, a mente entende na
semelhança da mente eterna, a qual entende simultaneamen-
te todas as coisas sem sucessão e segundo todos os modos de
entender. Todavia, a sucessão é uma descida da eternidade, da
qual é imagem ou semelhança. A mente entende na sucessão
enquanto está unida ao corpo, pois o corpo está submetido à
sucessão. Entretanto, é preciso considerar atentamente que
todas as coisas, enquanto estão em nossa mente, estão de
maneira semelhante na matéria, na forma e no composto.395 178
Gostaríamos de concluir a nossa análise sobre a trindade
da mente com a intenção do Idiota de explicar de que maneira o
que está em nossa mente está de modo semelhante na matéria,
na forma e no composto. O Idiota toma como exemplo a natu-
reza animal. A mente a compreende como gênero enquanto
considera a natureza animal como algo confuso e informe como
uma matéria; compreende como forma, quando significa por
meio do nome “animalidade”; em outro momento, considera ao
modo do composto do gênero e da diferença que lhe advém.
Aqui nos parece que Nicolau diz algo interessante pela boca do
Idiota: “enquanto está na mente, diz-se que está em conexão”.
Isso significa que “aquela semelhança da matéria e aquela seme-
lhança da forma e aquilo ao modo do composto sejam conside-
rados uma e a mesma noção, uma e a mesma substância”396.
A relação de imagem entre a mente humana e a mente
divina será tema também do capítulo XIII, quando tal relação
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
será pensada por meio da arte criativa absoluta que, em sua
essência, possui onipotência, sabedoria e nexo da onipotência e
da sabedoria. Portanto, a concepção trinitária da mente divina
e da mente humana, enquanto sua imagem, será novamente
considerada. Recordamos também que as ideias de “alma do
mundo” e “natureza” já foram anteriormente discutidas no
contexto da trindade do universo. Naquele contexto, Nicolau
mostrou que, em relação ao universo, a “alma do mundo” e a
“natureza” não poderiam ser consideradas como absolutas.
No universo, não existe nada que não seja contraído e, assim, a
necessidade de complexão ou forma será sempre contraída pela
possibilidade ou matéria, da mesma forma que um movimento
mínimo também seria impossível. Assim, Nicolau mostrou que
“a possibilidade absoluta em Deus é Deus, mas fora dele não
é possível”; a necessidade da complexão ou forma “é o verbo,
o Filho igual ao Pai na divindade e chama-se logos ou razão
porque é a razão de todas as coisas”; o movimento, por sua vez,
enquanto “movimento de conexão, bem como a proporção e a 179
harmonia que une, é na conexão absoluta do espírito divino”. No
Idiota. De mente, o Idiota é instigado pela pergunta do Filósofo:
“Quid ais de anima mundi?”. Primeiramente, o Idiota aproxima
a noção platônica de “alma do mundo” da noção aristotélica
de “natureza”, e, a partir daí, conjectura que uma e outra não
são senão “Deus que opera tudo em tudo e que chamamos de
espírito do universo”. O que aqui estaria em jogo não seria a
ideia de que é o espírito que opera tudo em tudo, como antes
já mostramos em relação a um texto de Thierry de Chartres e
também a um texto do De visione dei? O que é certo é que a ideia
de movimento, de espírito e de nexo serão aqui retomadas pelo
Idiota para poder mostrar que não existe intermediário entre a
vontade onipotente de Deus e as coisas que Ele cria.
O Filósofo chama a atenção para o fato de que a “alma do
mundo” de Platão contém os exemplares de todas as coisas e
move tudo e de que a “natureza” de Aristóteles é sábia e move
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
todas as coisas. O Idiota concilia as duas posições ao afirmar
que, para Platão, a “alma do mundo” talvez seja como a alma
de um servo que, conhecendo a mente do seu senhor, executa a
sua vontade. A essa ciência, por outro lado, chamou noções ou
exemplares que não podem ser esquecidas para que não falte à
divina providência a execução. Ao que Platão chamou ciência
da alma do mundo, Aristóteles chamou sagacidade da natureza
que leva a termo o império de Deus. Assim, o Idiota conclui que,
“[...] por isso, atribuíram àquela alma ou natureza a necessidade
de complexão, porque está obrigada a agir de uma determinada
maneira em acordo com a necessidade absoluta”. A interpreta-
ção do Idiota chama a atenção para o fato de que está implícito
na doutrina da “alma do mundo” e da “natureza” a ideia de algo
que se move para realizar ou executar a vontade imperiosa de
Deus. Porém, segundo Idiota, trata-se apenas de um modo de
entender, ou seja, é como se concebêssemos a Deus como uma
“arte arquitetônica”, à qual está submetida uma “arte execu-
tória” para que o conceito divino venha a ser. Porém, segundo 180
o Idiota, essas interpretações errariam ao colocar entre Deus
e as coisas um intermediário. Daí que, para o Idiota, a vontade
divina não necessita de outro executor, pois todas as coisas lhe
obedecem necessariamente, ou seja, na onipotência o querer
coincide com o executar. Para explicar em que sentido querer
e executar coincidem em Deus, o Idiota se utiliza da arte do
vidreiro (vitrificator): o vidreiro insufla o espírito que executa a
sua vontade e, no espírito, está a sua palavra ou o seu conceito,
pois se a potência e o conceito do vidreiro não estivessem no
espírito que esse emite, aquele objeto específico não surgiria da
pasta vítrea398.
O exemplo do vidreiro não é importante somente por
tentar mostrar que Deus não necessita de um executor das
suas obras que seja diferente d’Ele. A importância do exemplo
se mostra pela dimensão trinitária que esse assume. Somente
um princípio unitrino poderá adequadamente dar conta da
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
multiplicidade das coisas, sem necessidade de multiplicar o
próprio princípio primeiro. É nesse contexto que o Idiota chamará
a atenção para o espírito ou nexo e, assim, sugere que o Filósofo
conceba uma arte criativa absoluta e por si mesma subsistente
de modo que a arte seja o artista e a mestria o mestre. A essência
dessa arte absoluta seria necessariamente trina, na medida em
que ela possui a onipotência, a fim de que nada a possa resistir,
a sabedoria para que ela saiba o que faz e o nexo da onipotência
com a sabedoria para que seja feito aquilo que ela quer. O Idiota
busca explicar, então, de modo mais preciso o que compreende
por esse nexus: o nexo é espírito, vontade ou desejo, pois das
coisas impossíveis e daquilo que se ignora completamente não
existe nem vontade nem desejo. O ato criador, para o Idiota, é
o ato de uma vontade perfeitíssima e, nesse sentido, Deus cria
não necessariamente, mas por um ato de vontade. O que o
Idiota está tentando iluminar é essa vontade criadora por meio
da ideia de espírito, pois não existe movimento sem espírito.
Daí que, segundo o Idiota, chamemos “espírito” àquilo que, 181
no vento, produz movimento e, da mesma forma, também os
artesões, por meio do movimento, produzem o que querem.
Preparado assim o terreno, o Idiota passa a considerar como
Deus, que é arte absoluta e infinita, “[...] produz todas as coisas
no espírito ou vontade na qual está a sabedoria do Filho e a
onipotência do Pai para que a sua obra seja obra de uma trinda-
de indivisa”. Como a discussão girava em torno da ideia platô-
nica de “alma do mundo” e da ideia aristotélica de “natureza”,
o Idiota mostra a força da sua especulação ao julgar que nem
os “platônicos” nem os “peripatéticos” conheceram este nexo,
espírito ou vontade. Os primeiros o consideraram algo princi-
piado por Deus e consideraram a alma que anima o mundo como
nossa alma intelectiva anima nosso corpo. Os “peripatéticos”,
por outro lado, estabeleceram que este espírito seria uma força
natural imersa nas coisas, da qual sai o movimento e o repouso.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
Mas, sem dúvida, afirma o Idiota, este nexo, espírito ou vontade é
o Deus absoluto que é bendito em todos os séculos399.
Na sequência deste capítulo XIII, vamos encontrar,
talvez, o mais belo exemplo que nos faz de fato compreender
mais profundamente em que sentido a mente é uma imagem
viva de Deus. O Idiota reafirma que a mente é uma força e que
possui a imagem da arte divina. Assim, o que de modo absoluto
se encontra na arte divina está em nossa mente como imagem.
Um enigma que outras vezes fora utilizado para pensar a cria-
ção do mundo como automanifestação do próprio criador é
aqui utilizado para pensar a relação de imagem entre a mente
humana e a arte criadora: a mente, segundo o Idiota, teria sido
criada pela arte criadora como se essa quisesse criar a si mesma.
É como se um pintor desejasse pintar a si mesmo. Assim, pintaria
a sua própria imagem400. Como a arte infinita e o próprio Deus
não são multiplicáveis, então, pintando a si mesmo, surge a sua
imagem . Em seguida, o Idiota buscará diferenciar uma imagem
de uma imagem viva. A diferença não é difícil de compreender 182
e se baseia na diferença entre dois tipos de imagens: a primei-
ra, embora perfeita, não pode ser mais perfeita ainda e mais
conforme ao seu exemplar; a segunda, menos perfeita do que
a primeira, mas que possui o poder de ser mais perfeita e mais
conforme ao exemplar do qual é imagem. Assim, a primeira
será menos perfeita do que qualquer imagem imperfeita.
Todavia, há a potência de se conformar sempre mais e sem
limitação ao exemplar inacessível, pois nisto imita a infinitude
no modo em que é possível a uma imagem. É essa a ideia da
imagem viva: a imagem que possui a potência de ser sempre
mais conforme ao exemplar. Aqui o Idiota retoma novamente
o exemplo do pintor: se um pintor fizesse duas imagens, uma
morta e mais semelhante a si em ato e a outra viva, menos seme-
lhante; e se essa imagem menos semelhante, impelida pelo seu
exemplar, se fizesse sempre mais conforme ao pintor, ninguém
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
poderia negar que essa segunda é mais perfeita enquanto imita
mais que a outra a arte do pintor401.
Apresentado, portanto, o exemplo, o Idiota passa a utilizá-
-lo em relação à mente humana: toda mente, também a nossa,
mesmo que tenha sido criada a um nível inferior às outras, possui
a partir de Deus, segundo o modo que pode, o fato de ser imagem
viva e perfeita da arte infinita. Por isso, enfatiza o Idiota, a nossa
mente é una e trina enquanto possui potência, sabedoria e o nexo
de ambas, e, assim, estimulada, pode conformar-se sempre mais
ao exemplar. A nossa mente, no princípio da criação, não possui
o esplendor atual da arte criadora na trindade e na unidade, mas
possui uma força conata que, estimulada, pode fazer-se sempre
mais conforme a atualidade da arte divina. Por isso, na unidade
da sua essência está a potência, a sabedoria e a vontade. E na
essência coincidem o mestre e a mestria, como na imagem viva
da arte infinita que, estimulada, pode tornar-se sempre mais
conforme a atualidade divina, mesmo que a precisão da arte
infinita lhe permaneça sempre inacessível402. 183
Não é a constituição da mente o que primeiro caracteriza
a ideia da mente como imagem de Deus, mas o seu caráter dinâ-
mico e relacional. É o operar da mente que é necessariamente
trinitário. Como vimos e, como recordou D’Amico (2005), esse
aspecto já aparece no De docta ignorantia e no De coniecturis.
Por exemplo, Nicolau de Cusa afirma no De coniecturis que tanto
a mente humana quanto Deus operam tendo em vista a própria
manifestação e que somente um princípio unitrino poderia
ser o princípio único da multiplicidade, da desigualdade e da
divisão. O caráter dinâmico da mente se mostra também no
movimento do espírito intelectual para a sabedoria eterna.
Esse processo é determinado como uma assimilatio que não se
debilita e que só encontra termo e repouso na sabedoria eterna,
pois a mente enquanto imagem busca aproximar-se cada vez
mais do seu exemplar. No Idiota. De mente, isso significa que
a mente, enquanto imagem da complicação absoluta, pode
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
assimilar-se a toda explicação, pois a mente é a unidade que une
antes de toda a pluralidade concebível por ela mesma.
Portanto, a mente tem o poder de assimilar-se a todas
as coisas e, assim, também se assimila à complicação absolu-
ta. À semelhança da mente divina que se mostra unitrina a
partir das criaturas, pois o posse facere, o posse fieri e o nexo de
ambos se mostrou necessário para se pensar a criação, a mente
humana vê a si mesma como um princípio unitrino no seu posse
assimilare, posse assimilari e nexus de ambos. A unitrinidade do
princípio primeiro também se mostra quando olhamos para a
arte divina como uma arte absoluta, na qual a onipotência e a
sabedoria estão sempre unidas. A ideia de um nexo absoluto
e eterno entre a onipotência e a sabedoria busca negar, como
já mostramos em outras ocasiões, que se dê um intermediário
entre o princípio simples e a multiplicidade do mundo. O nexo,
por isso, será pensado como sendo a vontade daquele que
possui poder e sabedoria e, assim, aquilo que pode e sabe esse
mesmo executa. O enigma da arte do vidreiro (vitrificator) busca 184
justamente mostrar que poder, sabedoria e vontade são um
único princípio unitrino, pois no sopro ou espírito insuflado e
que executa a vontade do vidreiro está a sua potência e a pala-
vra ou o seu conceito, de modo que aquilo que o vidreiro quer
surja da pasta vítrea. A importância desse enigma encontra-se,
como sublinhamos anteriormente, na dimensão trinitária que
esse assume. Assim, esse nexus é o espírito, a vontade ou o
desejo, pois Deus cria não necessariamente, mas por um ato de
vontade. Segundo o Idiota, nem os “platônicos” nem os “peripa-
téticos” conheceram esse nexo que é o espírito ou vontade do
Deus absoluto que é bendito em todos os séculos.
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CONJECTURAS SOBRE A UNIDADE DA TRINIDADE DO PRINCÍPIO
185
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4 OS NOMES DIVINOS COMO ENIGMAS CONDUZEM À UNITRINIDADE DO PRINCÍPIO
4.1 RAZÃO E NOMEAÇÃO
A questão relativa à possibilidade de nomear o primeiro prin-
cípio é considerada por alguns comentadores de Nicolau de
Cusa o centro ou o lugar a partir do qual se pode compreender
toda a sua filosofia. Angel Leyra (1994, p. 12)404, na introdução à
tradução espanhola do De principio, argumenta que a preocupa-
ção principal cusana era a viabilidade do conhecimento sobre o
que Deus é e, de modo mais preciso, a possibilidade de nomeá-lo
adequadamente. Para Luis González (2005, p. 5)405, a teoria filo-
sófica geral cusana poderia ser entendida como “uma doutrina
sobre os nomes de Deus, uma investigação das possíveis fórmu-
las de designação do absoluto”. Do mesmo modo, afirma André
(2008, p. XXI) na Introdução à edição portuguesa do De docta
ignorantia que essa obra é “o primeiro passo de uma hermenêu-
tica dos nomes divinos, profundamente influenciada pela obra
do Pseudo-Dionísio [...], que só terminará com a última obra, o
De apice theoriae”.406 Santinello (1987, p. 124) será mais enfático
ao considerar que, se a filosofia de Nicolau de Cusa pudesse
ser vista como um sistema consequente da busca de uma
formulação conceitual e nominal do princípio (de divinis nomi-
nibus), então se poderia concluir que as obras dos últimos anos
(1459-1464) ofereciam também as últimas denominações com
as quais Nicolau buscava exprimir o objeto de seu procurar e
as últimas perspectivas nas quais se articulava o seu sistema407.
Já nos capítulos iniciais do primeiro livro do De docta igno-
rantia, vamos encontrar um primeiro indicativo do problema
OS NOMES DIVINOS COMO ENIGMAS CONDUZEM À UNITRINIDADE
DO PRINCÍPIO
relacionado à possibilidade de se nomear o “máximo absoluto”.
Após, primeiramente, mostrar em que sentido saber é ignorar
e esclarecer o plano de sua obra Nicolau afirma que o intelecto
finito, que não é a verdade, não alcança a verdade das coisas
com exatidão mediante a semelhança, pois não existe propor-
ção entre o finito e o infinito408. Negar que o nosso intelecto
possa conhecer com exatidão a verdade ou quididade das coisas
não é afirmar a impossibilidade de qualquer tipo de conheci-
mento. A perspectiva segundo a qual o conhecimento humano
se inscreve, segundo Nicolau, é o da busca ou procura constan-
te por uma verdade que, de antemão, já sabemos inalcançável.
É nesse sentido que o nosso conhecimento se instaura no solo
da douta ignorância, ou seja, no fato de que o que sabemos do
verdadeiro é que, “tal como é, é incompreensível”409.
A incompreensibilidade, portanto, é o sinal de que o atin-
gindo por nosso entendimento é maior do que o que por nós
pode ser compreendido ou “está acima de tudo aquilo que pode
ser concebido por nós”410. As coisas que podemos apreender 187
pelos sentidos, pela razão ou pelo intelecto se encontram no
horizonte da diferença, pois diferem “em si mesmas e umas em
relação às outras”, de tal modo que entre elas não se daria a
igualdade precisa. Daí que a “igualdade máxima, que não é dife-
rente ou outra em relação a nada, excede todo o intelecto”411.
Assim, como o máximo está acima de qualquer oposição, pois
as oposições convêm ao que admite excedente e excedido e,
portanto, ao que se encontra no horizonte da diferença, e como
o máximo, ao qual nada pode ser maior coincide com o mínimo,
ao qual nada pode ser menor, “transcende todo o nosso intelec-
to, que não pode combinar os contraditórios no seu princípio
pela via da razão” e, portanto, se encontra “acima de todo o
discurso da razão”, é possível ver de modo incompreensível que
o máximo absoluto é infinito e que coincide com o mínimo412.
A partir dessas primeiras indicações sobre a possibilidade de
se conhecer e sobre a impossibilidade de qualquer discurso
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OS NOMES DIVINOS COMO ENIGMAS CONDUZEM À UNITRINIDADE
DO PRINCÍPIO
racional sobre o máximo, Nicolau concluirá que “o máximo em
sentido absoluto é inteligível de maneira incompreensível e ao
mesmo tempo nominável de maneira inominável”413.
Mas em que sentido o princípio é inominável? A inomi-
nabilidade do princípio será pensada a partir da relação entre a
razão e o nome, doutrina que aparecerá já no De docta ignorantia,
mas que também será reafirmada em outras obras. A tarefa da
razão é nomear, mas ela atribui nomes “às coisas que admitem,
em alguma proporção, um excedente ou um excedido”415.
Essa mesma ideia será repetida no contexto dos últimos três
capítulos do primeiro livro do De docta ignorantia e que são
pensados como um dirigir a investigação “para o nome do
máximo”416. Para Santinello (1987, p. 39), é uma questão tradi-
cional e quase que obrigatória para uma posição especulativa
inspirada no neoplatonismo.
Nestes últimos capítulos, duas ideias norteiam o discurso
sobre a metafísica dos nomes divinos. A primeira refere-se ao
fato já lembrado anteriormente de que os nomes são impostos 188
pela razão “em virtude da qual se faz a distinção entre uma
coisa e outra”417. O papel da razão, portanto, ao nomear, é distin-
guir as coisas entre si. Por isso, só se impõem nomes àquelas
coisas que admitem a diferença, a distinção, o mais e o menos,
ou seja, o nome é imposto às coisas que se dão na pluralidade
com a finalidade de se distinguir uma das outras. Sendo assim,
nenhum nome pode convir ao máximo que é simples e no qual
todas as coisas são uma só. Um pouco mais à frente, essa ideia
será repetida. Reafirma-se que os nomes são impostos pela
razão para a distinção das coisas, mas também se afirma que a
razão é inferior ao intelecto e, enquanto “não pode passar para
além dos contraditórios, não há nenhum nome a que não se
oponha outro, de acordo com o movimento da razão”. 418
Estabelecido, então, que o ato de nomear diz respeito à
razão que opera no âmbito da oposição dos opostos, será neces-
sário se perguntar sobre a possibilidade de um discurso sobre
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Deus que, no De docta ignorantia, será pensado intelectualmente
como coincidentia oppositorum. A segunda questão que indicamos
nesses últimos capítulos é a avaliação das teologias afirmativa e
negativa: a possibilidade de um discurso afirmativo sobre Deus
(teologia afirmativa) e a necessidade da teologia negativa.
No âmbito da teologia afirmativa, os nomes afirmativos
atribuídos a Deus fundamentam-se em algo que se encontra nas
criaturas419 e eles convêm a Deus “em termos infinitamente dimi-
nutos”, pois qualquer nome particular sempre terá algo que lhe
seja oposto. Nesse sentido, Nicolau pode concluir com Dionísio
que as afirmações em relação a Deus não são adequadas420.
Porém, que um nome afirmativo convenha a Deus somente em
relação às criaturas não significa que “as criaturas sejam a causa
pela qual lhe convêm, pois o máximo nada pode ter [vindo] das
criaturas, mas convêm-lhe a partir da infinita potência que tem
em relação às criaturas”. Nicolau toma como exemplo o nome
“criador” que convém a Deus em relação às criaturas, mas
também lhe convém desde sempre, ou seja, eternamente tendo 189
em vista que Deus sempre “pôde criar, porque, se não pudesse,
não teria sido a suma potência”. Da mesma forma, também os
outros nomes afirmativos que atribuímos a Deus, tomando
como referência as criaturas, desde a eternidade, estavam
“complicados na sua suma perfeição e no seu nome infinito”421.
O mesmo valeria para os nomes de Trindade e para os
nomes Pai, Filho e Espírito Santo, que seriam também impostos
com relação às criaturas. O discurso cusano sobre a Trindade
divina será elaborado nesse contexto, intercambiando os termos
da Escritura e da tradição teológica com os termos do neopla-
tonismo chartriano: unidade, igualdade da unidade e nexo.
Enquanto é unidade, Deus gera e é pai; enquanto é igualdade,
é gerado e é filho e, enquanto é conexão de ambos, é o Espírito
Santo. A consideração da Trindade divina a partir das criaturas,
seguindo as ideias do parágrafo anterior, significa olhar para
a potência criadora que eternamente pôde criar. Assim, Deus
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eternamente é filho enquanto é “igualdade de ser” e “igualda-
de da entidade” das coisas que Deus podia criar. Por isso, dizer
que “o pai gera o filho significa o mesmo que dizer que Ele
cria tudo no Verbo”; e, por isso, tomando em consideração as
criaturas, Agostinho afirmará que “o Verbo é arte ou ideia”422.
Portanto, considerando as criaturas, Deus é pai enquanto gera
a igualdade da unidade e é Espírito Santo por ser o amor que
de ambos procede. A consideração da Trindade segundo a
criatura significa que
a criatura começa a ser pelo fato de Deus ser pai; realiza-se
pelo fato de Deus ser filho; concorda com a ordem universal
das coisas pelo fato de Deus ser Espírito Santo. E estes são, em
cada coisa, os vestígios da Trindade.423
Uma exceção a essa regra da teologia afirmativa é o nome
inefável do tetragramaton, que conviria a Deus não “por qual-
quer propriedade das criaturas, mas pela sua própria essência”.
Considerar que qualquer nome é inapropriado para nomear a 190
Deus não diz primeiramente respeito aos limites da nossa razão
em nomear o princípio que lhe é superior, pois nenhum nome
lhe é apropriado tendo em vista que é “a totalidade de todas
as coisas”. Por isso, Nicolau concorda com Hermes Trismegisto
que seria necessário nomear a Deus com todos os nomes das
criaturas ou chamar todas as coisas com o nome de Deus, pois
“ele complica na sua simplicidade a totalidade de todas as
coisas”. A partir dessa perspectiva, então, Nicolau conclui que,
“segundo o seu próprio nome” que é inefável e que é tetragra-
maton, “Ele deva ser interpretado como ‘uno e tudo’, ou melhor,
‘tudo dum modo uno’.”424 Com isso abre-se a possibilidade de se
retomar o discurso sobre a unidade máxima já anteriormente
explicitada no contexto do quinto capítulo do primeiro livro,
quando se afirmou que a unidade que se refere a Deus não pode
ser um número, mas é o princípio do número. No contexto
desses últimos capítulos, então, concluir-se-á que “unidade”
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seria um nome mais apropriado e mais conveniente do que
“tudo dum modo uno” e isso também pode ser confirmado com
textos da escritura.425 Porém, logo em seguida, Nicolau explica-
rá que “unidade” enquanto nome de Deus não pode ser tomado
segundo o “modo pelo qual denominamos ou compreendemos
a unidade”. Como os nomes são impostos pela razão para dar
conta da distinção das coisas e como em Deus não se dá distin-
ção nem oposição, então a “unidade” só poderia convir adequa-
damente a Deus se não se opusesse à alteridade, pluralidade ou
multiplicidade. O “nome máximo” complicaria na sua unidade
simples todas as coisas e é um nome inefável que está acima de
toda compreensão426.
Não seria possível compreender uma “unidade infinita”
que é “infinitamente anterior a qualquer oposição” e na qual
todas as coisas são complicadas na sua simplicidade. Aqui não
se dá composição, o outro e o diferente, o homem e o leão, o céu
e a terra. Na unidade simples, portanto, nenhuma coisa difere
da outra, mas, ao mesmo tempo, todas as coisas são de modo 191
próprio o que são. Entretanto, “não segundo a sua finitude,
mas [enquanto é] de um modo complicado a própria unidade
máxima”427. Assim, se essa unidade, que sendo una é tudo e
sendo mínima é máxima, pudesse ser entendida ou nomeada,
então se “atingiria o nome de Deus”. Mas, como “o nome de
Deus é Deus, o seu nome não é conhecido senão pelo intelecto
que é o próprio máximo e o nome máximo”. O que, portanto,
ensina-nos a douta ignorância é que, “embora a unidade pareça
o nome mais aproximado do máximo, dista ainda infinitamente
do verdadeiro nome do máximo, que é o próprio máximo”428.
Por outro lado, quanto à teologia negativa, para o Cardeal
de Cusa, ela é tão necessária que, sem ela, Deus não seria
adorado como infinito, mas como criatura429. Não se nega aqui
a validade da via afirmativa, pois é ela que funda o culto a Deus.
Por meio da teologia afirmativa, Deus é adorado “como uno
e trino, como sapientíssimo, piíssimo, ‘luz inacessível’, vida,
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verdade etc”. Porém, a douta ignorância alerta que Deus é uno
de um modo que é todas as coisas, é luz inacessível, mas não
é uma luz sensível que se opõe às trevas, ou seja, Deus é “luz
simplicíssima e infinita em que as trevas são a luz infinita”. É luz
que resplandece nas trevas da nossa ignorância, mas as trevas
não o podem compreender430. Portanto, o princípio da douta
ignorância impõe que qualquer compreensão de Deus não seja
possível, ou melhor, que só o possamos compreender de modo
incompreensível como coincidentia oppositorum. Da mesma
forma, também a douta ignorância ensina que “Deus é inefável;
e isto porque é infinitamente maior do que tudo o que se possa
nomear”. A partir daí, então, Nicolau considerará com Dionísio
que de Deus poderíamos falar “de modo mais verdadeiro por
remoção e negação”. Portanto, a partir dessa consideração
negativa, devemos negar de Deus qualquer coisa que se possa
“exprimir com palavras”: Deus não é “nem verdade, nem inte-
lecto, nem luz, [...], não é Pai, nem Filho, nem Espírito Santo,
mas apenas infinito”. Evidentemente que aqui não se trata 192
de negar a Trindade divina, mas o que se mostra a partir da
teologia negativa é que os nossos discursos são limitados para
expressar a inefabilidade de Deus.
Em seguida, Nicolau retoma os dois modos de discurso
da teologia afirmativa e da negativa. Em primeiro lugar, reafir-
ma-se a relação entre a eternidade e a infinidade. Não obstante,
enquanto a eternidade é atribuída somente ao Pai, a infinidade
é atribuída a todas as pessoas. Assim, considerando a própria
infinidade em relação à unidade, à igualdade da unidade e
ao nexo, afirma-se que ela é Pai, Filho e Espírito Santo e que
infinidade e eternidade são atribuíveis a qualquer uma das três
pessoas e qualquer uma das três pessoas é eternidade e infini-
dade. Porém, em uma simples consideração, a infinidade não
é nem Pai, nem Filho nem Espírito Santo; Deus não é nem uno
nem múltiplo. Portanto, “segundo a teologia negativa, não se
encontra em Deus mais que infinidade”431.
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No De coniectuirs, Nicolau avalia a consideração de Deus
enquanto coincidentia oppositorum. No De docta ignorantia falou-se
de Deus intelectualmente por meio da união dos contraditórios
na unidade simples, mas no De coniecturis Deus será visto como
o princípio que antecede a própria coincidentia oppositorum.432
Essa “novidade” se fundamenta na ideia de origem neoplatôni-
ca das quatro unidades ou regiões conjecturais da mente: Deus,
intelecto, alma ou razão e corpo ou sentidos. Assim, a primeira
unidade está para além da coincidência dos opostos, ou seja, a
unidade divina simples e absoluta; depois uma segunda unida-
de, não simplíssima, mas composta de maneira intelectiva,
portanto, região da coincidência dos opostos; além dessas duas,
Nicolau postula ainda uma terceira e uma quarta unidades: a
terceira corresponde à alma ou razão, região na qual não se dá a
coincidência dos opostos e a quarta corresponde aos sentidos433.
No que diz respeito à intuição da unidade divina, primei-
ra unidade, Nicolau destaca sua anterioridade em relação à
multiplicidade, diversidade, alteridade, oposição, desigualdade, 193
divisão e outros aspectos que estão ligados à multiplicidade.
Além disso, também recorda que ela é unidade de toda plura-
lidade, medida de todas as medidas, igualdade de todas as
coisas iguais e desiguais e conexão de todas as coisas unidas
e separadas, retomando, assim, aquele trinômio utilizado
para referir-se à Trindade divina434. Por último, reafirma a sua
inefabilidade, pois, enquanto unidade absoluta, não poderia
ter um nome muito mais que outro. Assim, enquanto unidade
simplíssima, não poderíamos dizer que ela é simples muito
mais do que não simples ou una muito mais do que não una435.
Estaria Nicolau reavaliando tanto a via afirmativa quanto a
negativa e, nesse sentido, apontando a insuficiência de uma
e de outra para um discurso fundado na primeira unidade?
Da mesma forma, também o discurso fundado na coincidentia
oppositorum se mostraria superado?
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Ainda no âmbito das discussões sobre a primeira unidade,
Nicolau de Cusa chama a atenção do Cardeal Cesarini, a quem o
De coniecturis é dirigido, para que observe que a teologia inex-
primível em palavras é clara e breve, pois a qualquer pergunta
sobre Deus se pode responder que nenhuma pergunta lhe é
adequada. Em primeiro lugar, portanto, Nicolau mostrará que
as perguntas feitas no âmbito da razão discursiva e que aceitam
apenas uma entre duas soluções opostas não são válidas para
a unidade absoluta. Nem a resposta afirmativa, a qual se opõe
uma negação, nem a resposta negativa, a qual se opõe uma
afirmação. Essas conjecturas não seriam nem precisas nem
verdadeiras e, por isso, mais absoluto seria o conceito da verdade
que rejeita ambos os opostos disjuntos ou unidos. Dessa forma,
não se poderia responder de modo mais apropriado ao sentido
infinito da pergunta “se Deus é” senão respondendo que “nem
é, nem não é” e que “nem é e não é”. Por fim, Nicolau considera
que esta é a única, a mais alta, a mais simples e a resposta mais
conforme a toda questão sobre a primeira, simplíssima e inefá- 194
vel entidade.436 Posteriormente, ao tratar da segunda unidade
e sobre o fato de que no De coniecturis a primeira unidade será
pensada como princípio da coincidentia oppositorum e, portanto,
como estando aquém ou além dela, Nicolau afirmará que muito
mais simples é a negação dos opostos, disjuntos e unidos, do
que a conjunção dos opostos437.
A cada unidade conjecturada pela mente corresponderia
o uso de termos adequados. Por exemplo, os termos racionais,
enquanto opostos uns aos outros, não poderiam ser aplicados
à segunda unidade, pois ela não admite nenhuma oposição
que resulte em incompatibilidades. Por outro lado, os termos
intelectuais seriam a raiz dos termos racionais do mesmo modo
que o intelecto é raiz da razão438. No caso da unidade intelectual,
ser raiz significa que ela não resulta dos opostos e, portanto,
que esses não a precedem. Assim, na unidade intelectual, os
opostos estariam complicados, e, na unidade racional, estariam
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explicados. Aquilo que é incompatível no nível da razão não se
opõe no nível do intelecto439.
Por fim, pensando a relação entre as quatro unidades a
partir da dialética entre afirmação e negação, o De coniecturis
assim distingue: na última região dos sensíveis não se dá nega-
ção e não-ser; na primeira unidade simples desaparece toda
afirmação. Nas unidades intermediárias se dão tanto afirmações
quanto negações. No intelecto, as afirmações e as negações estão
complicadas e na razão explicadas.440 A mesma ideia é pensada
em relação aos tempos verbais. Na unidade ínfima dos sentidos
estão todos os verbos no tempo presente; na unidade simples,
os verbos encontram-se sem tempo; no intelecto encontram-se
de modo complicado, verbos no presente e no não-presente que
na razão encontram-se de modo explicado. Consequentemente,
Nicolau concluirá pela necessidade de se postular para cada
unidade o uso de termos e de uma linguagem adequada441.
O De coniecturis, ao indicar que a unidade divina, infinita
e primeira está além ou aquém da coincidentia oppositorum e ao 195
postular para cada unidade o uso de uma linguagem adequa-
da, traz consigo algumas dificuldades de interpretação e de
compreensão do pensamento cusano442. Santinello, em uma
nota explicativa a De coniecturis, afirma que parece superada a
teologia da coincidência dos opostos, ou seja, a linguagem da
coincidência presente no De docta ignorantia443. Por outro lado,
André, interpretando a mesma questão, fala de uma “teoria
regional do discurso em Nicolau de Cusa numa correspondên-
cia à gnoseologia regional que é explorada no De coniecturis”
(1993, p. 387), quando só ultrapassando uma etapa (corres-
pondente à unidade racional, intelectiva e divina) se chega à
etapa sucessiva. Assim, o nível discursivo da razão, configurado
segundo o princípio de não-contradição, deve ser ultrapassado
por ser insuficiente para exprimir a unidade divina. No nível
discursivo do intelecto, é o princípio da coincidência a confi-
gurar o discurso sendo o nível mais elevado da linguagem
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humana. Por último, ultrapassando tanto a razão quanto o
intelecto, pode-se, ainda segundo André, “intuir” outro nível
do discurso que se situaria “no limite da linguagem” e no qual
se operaria uma negação dos opostos, tanto disjuntiva quanto
copulativamente; a esse nível da linguagem corresponderia,
então, um falar divinamente das coisas divinas (1993, p. 398)444.
A interpretação de Santinello sugere que a “intuição” de
outro nível da linguagem, superior à coincidencial, suporia a
superação do De coniecturis em relação ao De docta ingnorantia
no que concerne à teologia da coincidência. A dimensão aberta
pelo De coniecturis corresponderia, segundo González Ríos
(2010), a uma linguagem divinal (divinaliter) que, entretanto, é
“impraticável”. De fato, ela deveria corresponder a uma intuição
da “unidade divina” na sua absoluta simplicidade complicante
e, portanto, como complicação ou princípio da coincidentia
oppositorum. No discurso divinaliter, não se negaria somente a
oposição dos opostos (rationaliter), mas também a conjunção
dos opostos (intellectualiter). Nesse sentido, a possibilidade de 196
uma linguagem divinal (divine loqui) seria “somente admiti-
da, mas não praticável” (2010, p. 92). Assim, é possível intuir
uma unidade divina e uma linguagem que a ela corresponda.
Bem, mas qual a importância dessa intuição no interior da
especulação cusana? Podemos nos aproximar, como o faz
González Ríos (2010), de uma possível resposta avizinhando a
máxima doutrina da ignorância e a proposta do De coniecturis como
uma tentativa de “pensar mais além” ou como o envio do olhar
daquele que especula para lá da ratio e do intellectus. No primeiro
caso, a doutrina da docta ignorantia poderia ser concebida
como uma guia que orienta o olhar daquele que especula em
torno da verdade para lá da região na qual se explica a ratio,
isto é, para lá do âmbito da proporção comparativa ou da
oposição dos opostos (2010, p. 171).
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No segundo caso, a contribuição do De coniecturis, do
ponto de vista doutrinal, talvez “não seja tanto a de conceber
o divino como uma unidade anterior à coincidência dos opostos,
mas a de enviar o olhar intelectual daquele que especula para
lá da coincidência dos opostos, para, com isso, não identificar o
divino em seu sentido absoluto com a coincidência dos opostos”
(2010, p. 197). Assim, enquanto o nome enigmático maximum et
minimum absolutum guia o olhar daquele que especula para uma
concepção do divino como coincidentia oppositorum os nomes
enigmáticos conjecturados à luz do De coniecturis enviam o
olhar para lá da coincidência: idem absolutum conjectura o divi-
no como o “princípio absoluto da identidade e da diferença”;
possest conjectura o divino como o “princípio da coincidência
de potência e ato no absoluto”; posse ipsum conjectura o divino
como “poder absoluto” e, por último, o non aliud conjectura o
divino como “a definição que se define a si mesma e a tudo”.
Não podemos negar que o De coniecturis avence novas
possiblidades, quando se trata de conceber o divino. De modo 197
especial, tal como no De visione dei, a nova postura adotada
naquela obra impede que Deus possa ser identificado com o
alcançado intellectualiter. Porém, aquilo que se vê para além
da coincidentia oppositorum não é mais passível de discurso445.
Dessa maneira, o falar divinamente das coisas divinas permane-
cerá como o limite reconhecível da linguagem humana, como
seu princípio e a unidade da qual procede e para a qual tende.
Ocorre que o intelecto, ao olhar para a unidade primeira, postula
a prioridade de um modo de dizer divino as coisas divinas; mas
esse modo, justamente por ser divino, não está disponível ao
homem446. Assim, em De conicturis, Nicolau afirma que, seguindo
a via da razão, o princípio primeiro de todas as coisas é uno e
trino, mas o intelecto abandona e ultrapassa os significados dos
termos utilizados pela razão, pois adverte a sua deficiência e
concebe a Deus como o princípio que os complica. Entretanto, o
mesmo intelecto vê, na luz da divindade, que os seus conceitos
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também não são precisos e, por isso, adverte que a divindade
deve ser concebida para além da complicação e da explicação e
que em si mesma não pode ser entendida.447
A relação entre nome e razão e a consequente inomi-
nabilidade do princípio primeiro será reafirmada em outras
obras e em contextos diversos. Dentre essas, podemos destacar
como as mais importantes o segundo livro do Idiota. De mente
e o capítulo 33 do De venatione sapientiae. Embora pertençam a
períodos distintos, ambos os textos estão muitos próximos por
reafirmarem a relação entre a razão e a nomeação, mas também
por indagarem sobre a “força da palavra”448, por reconhecerem
pelo menos dois modos de investigação, um primeiro que se
fundaria na “força do nome” e seria muito agradável ao homem
enquanto é conforme a sua natureza ou enquanto é uma
investigação que se realiza com um movimento da razão449; um
segundo modo de investigação, que não se deteria na “força da
palavra”, mas buscaria os exemplares das coisas450. No Idiota.
De mente Nicolau reconhece que essas duas formas de investigar 198
facilmente se resolvem e concordam quando a mente se eleva à
infinitude451. Além disso, ambos os textos também reconhecem
que não se pode alcançar o nome preciso452.
O segundo capítulo do Idiota. De mente é sem dúvida
um dos textos mais comentados de Nicolau de Cusa sobre o
problema da nomeação. O Idiota considera a mente como uma
força que complica nocionalmente os exemplares de todas as
coisas e que só impropriamente recebe o nome de “mente”,
pois assim como a razão humana não alcança a quididade das
obras divinas, da mesma forma também não alcança o nome
preciso de nenhuma delas. Entretanto, para o Idiota, a questão
da nomeação não deve se resumir ao problema da imprecisão
do nome que é atribuído às coisas, mas é necessário enten-
dê-la de modo mais profundo. Isso significa reconhecer não
somente que a imposição dos nomes é livre, mas também que
os nomes não provêm da imposição, mas da eternidade, uma
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vez que é a forma que traz consigo o nome. Porém, o nome que
livremente se impõe, mesmo não sendo o nome preciso, é um
nome conveniente ou adequado453.
Para conduzir o Filósofo ao entendimento dessas relações,
o Idiota utilizará a sua arte de fazer colheres como um exemplo
simbólico. Em primeiro lugar, deve-se considerar, segundo o
Idiota, que nenhuma arte humana tenha alcançado a perfeição
e, enquanto finita, provém da arte infinita que é o exemplar de
todas as artes454. Em segundo lugar, o Idiota afirma que a sua arte
de fazer colheres não é “imitadora”, mas “realizadora”, pois, ao
fazer as colheres, não imita qualquer coisa que se encontra na
natureza, já que as colheres são apenas artefatos da arte huma-
na455. Com essas premissas começa, então, a explicar a sua arte
de fazer colheres: por meio do movimento dos instrumentos, o
que se pretende é fazer com que a forma da colher, presente na
mente do artesão, possa convenientemente resplandecer em um
pedaço de madeira. Entretanto, tendo em vista o caráter finito
da arte humana, deve-se reconhecer que aquilo que é próprio a 199
uma colher, a sua verdade e precisão, reluz na madeira, mas não
de modo perfeito. Portanto, o que aparece em todas as colheres
sensíveis é a forma simples da colher, mas em nenhuma delas
de modo preciso456.
Somente com o advento da forma à matéria é que o pedaço
de madeira receberia o nome de “colher”. Dessa maneira, reco-
nhece-se a relação entre o nome e a forma. Para o Idiota, porém,
a imposição dos nomes ainda deve ser pensada como livre, tendo
em vista que se poderia impor outro nome. Como resolver a
aparente tensão entre o nome carregado pela forma e o nome
imposto livremente pela razão? A forma carrega o nome, mas
o nome que livremente se impõe com o advento da forma não é
totalmente outro e diferente do “nome natural”. Pelo contrário,
o “nome natural”, depois do advento da forma, brilha em todos
os nomes que de modo variado são impostos por qualquer língua
e por qualquer nação457.
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Porém, o fundamento último dos nomes impostos pela
razão não é o “nome natural”, mas na busca pelo nome preci-
so avança ou volta-se para o verbo inefável. Poderíamos nos
aproximar dessa perspectiva recordando que o “nome natural”
de cada coisa estaria unido à forma daquela coisa particular.
Assim, o “nome natural” da colher está unido à “colheridade”.
O nome “colher”, enquanto nome imposto pela razão, não é o
nome preciso, pois a razão, não conhecendo a quididade das
coisas, só as pode nomear de modo impreciso. Não obstante, o
nome natural resplandece na diversidade dos nomes impostos.
Contundo, a forma infinita é una e simplicíssima, mas resplan-
dece em tudo como o exemplar adequado de tudo e de cada
coisa que pode ter forma. Porém, enquanto infinita, nenhuma
razão a pode atingir e também não a pode nomear. Assim, a
forma infinita é também uma forma inefável e não pode ser
compreendida por nenhum nome imposto pelo movimento da
razão. Daí decorre que as coisas, enquanto possuem um nome,
são a imagem do seu próprio e adequado exemplar inefável. 200
Aqui se dá a volta para o fundamento último das coisas enquan-
to caem sob um nome imposto pela razão458:
Um só é, pois, o verbo inefável que é o nome preciso de todas
as coisas como elas caem sob o nome com o movimento da
razão. E este nome inefável resplandece em todos os nomes
a seu modo e é a infinita nominabilidade de todos os nomes
e a infinita vocabilidade de tudo aquilo que se pode exprimir
através da voz, a fim de que, assim, qualquer nome seja a
imagem do nome preciso.459
Portanto, pode-se estabelecer uma relação entre a
forma infinita e indizível de todas as coisas e o verbo inefável,
por um lado, e, por outro lado, a relação entre a forma de cada
coisa e o nome natural, e, por último, o nome imposto pela
razão quando do advento da forma à matéria que, embora não
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seja o nome preciso, não é, contudo, outro nem totalmente
diverso do nome natural.
Do exposto até o presente momento conclui-se que o De
docta ignorantia apresenta as perspectivas a partir das quais se
pode elaborar uma metafísica do inominável: o princípio da
douta ignorância impõe que se compreenda de modo incom-
preensível e se nomeie de modo inominável o princípio primei-
ro e absoluto. Algumas indicações mais precisas são oferecidas
por Nicolau de Cusa quando, por exemplo, ele afirma que,
para se alcançar o sentido do que vai dizer, é necessário elevar
“o intelecto para além da força das palavras” e utilizar os exem-
plos como “guias, de modo transcendente, abandonando as
coisas sensíveis”, para que se possa elevar “facilmente ao simples
plano intelectual”460. Ao final do quarto capítulo, encontra-se
também uma advertência, ousamos dizer, de tipo metodológico
e que, de certa forma, completa essa anterior. Abandonada a via
da razão, resta ao intelecto ver “incompreensivelmente” que
“a maximidade absoluta é infinita, que nada se lhe opõe, e que 201
com ela coincide o mínimo”. Todavia, Nicolau também adverte
que os termos “máximo e mínimo” não são tomados na sua
acepção usual, ou seja, estando ligados à quantidade, e que o seu
significado não é relativo “à massa ou à força”, mas “são termos
transcendentes, com um significado absoluto”461. Por último, ao
começar a introduzir a manuductio matemática, Nicolau aponta
para a “investigação simbólica” das coisas invisíveis, pois
todos os nossos doutores mais sábios e divinos estiveram de
acordo em que as coisas visíveis são verdadeiramente imagens
do invisível e que, assim, o criador pode ser cognoscitivamente
visto pelas criaturas como que num espelho e por enigmas462.
A investigação simbólica considera que o mundo, o
homem e também os nomes manifestam, enquanto enigmas,
o princípio unitrino de todas as coisas. Só podemos dirigir o
olhar para o que Nicolau quer mostrar se transcendermos o
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
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DO PRINCÍPIO
significado das palavras e se tomarmos os exemplos naquilo
que de fato são: guias para o que transcende o nosso modo de
conhecer e de dizer.
No De coniecturis, o Cardeal, de modo mais preciso, deter-
minará as quatro unidades (Deus, intelecto, razão e sentidos) e
afirmará que para cada uma delas existe uma linguagem e um
uso de termos adequados. Mas se cada unidade é ultrapassada
tendo em vista o acesso a uma unidade posterior até a “intuição”
da unidade primeira, para além da coincidência dos opostos,
então permanecerá que a linguagem mais próxima para dizer o
indizível é a linguagem da coincidência pela relação de imagem
que a mente ou intelecto guarda com a mente infinita, embora
se possa “intuir” um modo divino de falar das coisas divinas. Por
último, o Idiota. De mente aponta para a insuficiência dos nossos
termos, mas também para a sua força quando buscamos nomear
as coisas. Assim, embora não alcancemos o nome preciso de cada
uma delas, uma vez que não conhecemos a quididade das coisas,
o nome imposto pela razão é um nome conveniente em que, por 202
sua vez, resplandece aquele nome inefável que é o Verbo divino.
4.2 OS NOMES DIVINOS E A UNIDADE
DA TRINDADE DO PRINCÍPIO
A ideia de que podemos ascender ao conhecimento das
coisas divinas, eternas e invisíveis, por meio das coisas visí-
veis, enquanto imagens verdadeiras do invisível, aparece no
De docta ignorantia, como vimos anteriormente, mas é também
um tema recorrente na grande maioria das obras de Nicolau
de Cusa. Essa é a investigação simbólica por meio das coisas
visíveis, cujo conhecimento alcançado é um conhecimento per
speculum in aenigmate. O fundamento da investigação simbólica
ou do conhecimento por meio de enigmas é uma ontologia que
compreende as coisas do mundo como signos enigmáticos do
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divino e que, portanto, acaba por diferenciar a verdade deste
mundo da verdade em si. Consequentemente, o homem será
aquele que habita o mundo dos enigmas, mas cuja intenção,
enquanto desejo último, é ultrapassar o enigma463.
Depois do De docta ignorantia, a ideia de um conhecimen-
to per speculum in aenigmate será repetida em outras obras464.
Somente no De beryllo, contudo, texto de 1458, é que Nicolau irá
abordar de maneira mais sistemática o que ele próprio chama
de aenigmatica scientia. A sua intenção nesse texto é expor ao
leitor, de modo mais claro e por meio do enigma do beryllo, a
compreensão do seu pensamento, cujo princípio fundamental
é a coincidentia oppositorum. Já nas palavras iniciais desse texto,
Nicolau reconhece que os seus leitores verão que frequente-
mente se ocupou em seus escritos da coincidência dos opostos
e que buscou tirar conclusões a partir de uma visão intelectual
que supera a força da razão465. Posteriormente, também afirma
que é coisa importante saber fixar-se firmemente na conjunção
dos opostos de modo a poder ver mais claramente o princípio 203
indivisível. Porém, segundo Nicolau, muitos daqueles que viram
os seus escritos não possuíram o berilo e, portanto, tropeça-
ram na consideração do princípio da coincidentia opposituorum.
Assim, quando consideram a doutrina de Dionísio da conjunção
dos opostos, interpretam-na de modo a disjungir os próprios
opostos. Mesmo reconhecendo a necessidade de se manter
ligado à coincidentia, por outro lado, Nicolau reconhece que facil-
mente nos volvemos da consideração intelectual para o discurso
da razão e, assim, tropeçamos, quando buscamos oferecer razões
para uma visão certíssima e que se encontra além de toda razão.
Daí que, das coisas divinas, caímos para as coisas humanas e as
razões que oferecemos são fracas e ineficazes466.
O berilo é uma pedra límpida, branca e transparente
a qual se dá tanto a forma côncava quanto a convexa, de
modo que, ao se olhar através dele, pode-se ver o que antes
era invisível. Assim, aplicando-se aos olhos do intelecto um
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berilo intelectual que tenha ao mesmo tempo a forma máxima
e mínima, poderíamos alcançar mais facilmente o princípio
indivisível de todas as coisas467. A aenigmatica scientia corres-
ponderia, então, a medir a verdade por meio de uma imagem,
de tal forma que o homem mediria tanto o próprio intelecto
por meio da potência das suas obras quanto o intelecto divino.
Porém, a partir de uma visão mais penetrante, o homem vê
que o enigma é enigma da verdade e sabe que a verdade não é
afigurada em nenhum enigma468.
É necessário, contudo, retomarmos as quatro premissas
iniciais do De beryllo para que possamos nos aproximar da ideia
da aenigmatica scientia. A quarta premissa retoma a sentença
de Hermes Trismegisto de que o homem é um segundo deus469.
Nicolau explica essa afirmação a partir da ideia de que o
intelecto humano, enquanto cria, é semelhante ao intelecto
divino. Porém, se este último cria por um lado os entes reais e
as formas naturais, o intelecto humano cria, por outro lado, os
entes racionais e as formas artificiais que seriam imagens das 204
imagens do intelecto divino470. A partir da semelhança entre o
intelecto humano e o divino por meio do ato criador, Nicolau
poderá concluir, então, que, se o homem mede o seu próprio
intelecto por meio da potência que transparece das suas obras,
da mesma forma também mediria o intelecto divino.
O fundamento, porém, dessa quarta premissa é a afir-
mação de Protágoras de que o homem é a medida das coisas471.
Assim, ele mede as coisas sensíveis com os sentidos tanto
quanto com o intelecto mede as inteligíveis. Ao mesmo tempo,
superando o intelecto, alcança as que o excedem. O homem o faz
enquanto sabe pela potência sensitiva que as coisas sensíveis
podem ser sentidas, as inteligíveis entendidas e as que superam
o intelecto são de tal modo que excedem o intelecto. É por isso
que o homem encontra em si mesmo todas as coisas criadas
como na razão que as mede.
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Tendo em vista a concepção intelectualista tanto da mente
humana quanto do princípio primeiro, a segunda premissa irá
determinar como sendo somente o que é verdadeiro ou veros-
símil. Além disso, Nicolau também determina nessa segunda
premissa a diferença entre o que é em si, enquanto é no seu ser
verdadeiro, e o que é em outro, enquanto é no seu ser verossí-
mil472. O fundamento, porém, das três premissas que anuncia-
mos e da própria aenigmatica scientia é a concepção intelectual
e expressionista do princípio primeiro. Para Nicolau de Cusa,
uno é o princípio primeiro e, segundo Anaxágoras, chama-se
intelecto. Todas as coisas dele procedem para manifestá-lo, pois
o intelecto ama mostrar e comunicar a luz da sua inteligência473.
Consequentemente, tendo em vista que o intelecto criador se
coloca a si mesmo como fim das suas próprias obras para mani-
festar a sua glória, ele cria as substâncias cognoscitivas com a
capacidade de verem a sua verdade e se oferece a elas visível no
modo com o qual essas são capazes de compreendê-lo474.
A concepção expressionista do princípio primeiro será 205
retomada nos capítulos finais do De beryllo. A partir do parágra-
fo 48, Nicolau começa a apresentar o que pensa sobre o ente e
sobre a substância. O ponto de partida é a discussão aristotélica
sobre o quid erat esse475 de cada coisa e que Nicolau determinará
como sendo uma pergunta sobre a razão de ser de cada coisa:
não existe nenhuma razão sobre por que o céu seja céu, a terra,
terra e o homem, homem senão que assim quis aquele que
assim o fez. Portanto, é a vontade do criador que é a razão de
ser última de todas as coisas e, em Deus, que é intelecto, razão
e vontade coincidem476. É a partir desses pressupostos que o
Cardeal de Cusa reafirmará que as criaturas são a intenção do
criador e é nessa intenção que se encontra a sua verdadeira
quididade. A intenção do criador é semelhante à intenção
daquele que fala, pois quando alguém nos fala e conseguimos
alcançar a quididade do seu discurso, então o que atingimos é
a sua intenção. Portanto, o sensível é como o verbo do criador,
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no qual está contida a sua intenção, ou seja, a quididade das
coisas. É nesse contexto que Nicolau aponta para a sua concep-
ção expressionista da criação, ao afirmar que a manifestação
acontece por causa da intenção e que o intelecto “falante” ou
criador entende, dessa forma, manifestar-se477.
Por outro lado, se nos perguntarmos como no De beryllo
Nicolau retoma a sua concepção trinitária do princípio primei-
ro, vamos encontrar que a primeira aplicação do enigma do
berilo tem como resultado que o princípio é visto por meio
do enigma como indivisível e trino. Assim, quando se aplica o
berilo aos olhos da mente e olha-se através do máximo, do qual
nada pode ser maior, e do mínimo, do qual nada pode ser menor,
então o que se vê é o princípio anterior a qualquer grandeza e
pequenez, simples e indivisível com relação a qualquer modo de
divisão, segundo o qual as coisas grandes e pequenas podem ser
divididas. E se, por meio do berilo, se olha para a desigualdade,
o objeto do olhar intelectual será a igualdade indivisível e, por
meio de uma imagem absoluta, vê-se o princípio indivisível com 206
relação a qualquer modo de divisão por meio do qual a imagem
pode ser dividida. Da mesma forma, se por meio do berilo se vê a
divisão, o objeto do olhar intelectual será a conexão indivisível478.
Posteriormente, a partir do parágrafo 33, Nicolau trata
especificamente de como o princípio pode ser visto como unitri-
no. Primeiramente se repete a ideia de que o princípio primeiro
é indivisível e é a indivisibilidade perfeitíssima e simplíssima.
Nicolau vê, contudo, na essência dessa indivisibilidade perfeita,
a unidade, a igualdade e o nexo. A unidade é a fonte da indivisi-
bilidade, a igualdade é a indivisibilidade da unidade e o nexo é
a indivisibilidade da unidade e da igualdade479. O princípio trino
é, portanto, a fonte de onde emana a unidade que une todas as
coisas, a igualdade que as forma e o nexo e a conservação de
todas as coisas unidas e formadas.
Segundo Nicolau, também os filósofos, por meio de uma
ascensão do causado para a causa, consideram a trindade que
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viram no princípio. De modo especial, Nicolau fará referência
a Platão e a Aristóteles que, seguindo Anaxágoras, conside-
raram o princípio intelectual480. Porém, na análise cusana,
ambas as considerações são limitadas. Em primeiro lugar, a
relação entre o uno e o múltiplo, pensada por meio da ideia
de participação, teria levado Platão a recorrer à existência de
um intelecto criador e de uma alma do mundo universal que
seriam intermediários entre o primeiro Deus, absoluto, simples,
indivisível e incomunicável, e as outras inteligências ou deuses
e almas. Contudo, Nicolau considera que para todos os modos
de ser é mais do que suficiente o princípio primeiro unitrino
que, enquanto princípio absoluto e superexaltado, não é um
princípio contraído como a natureza que age por necessidade.
O princípio unitrino é o princípio da própria natureza e é super-
natural, livre e cria tudo por sua própria vontade. No princípio,
não existe diferença entre aquilo que o princípio é e aquilo que
o princípio quer. O que esse cria por sua própria vontade encon-
tra a sua forma na intenção daquele que ordena. Assim, toda 207
criatura é intenção da vontade do onipotente.481 Em segundo
lugar, e como a causa justamente desse erro, Nicolau considera
que nem Platão nem Aristóteles compreenderam que, no prin-
cípio primeiro, a intenção e a vontade não são diferentes dele
mesmo. O fundamento desse erro se encontraria no fato de que
Aristóteles e também Platão acreditavam que o intelecto cria-
dor teria feito todas as coisas por necessidade de sua natureza.
Porém, argumenta Nicolau, mesmo que seja lícito afirmar que
o intelecto criador não age por acidente, mas por sua essência,
nem por isso se deve afirmar que age como uma natureza ou um
instrumento exigido por um comando superior, mas agiria por
meio da sua vontade que é também a sua essência.482
Entretanto, apesar de julgar que a especulação de
Aristóteles e Platão sobre o princípio primeiro é limitada tendo
em vista a compreensão da sua trindade, Nicolau reconhece
que o que aqueles pensaram sobre o princípio unitrino os
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aproxima da especulação da teologia cristã. Recordamos aqui,
por exemplo, que, para o Cardeal de Cusa, os “nossos teólogos”
dizem o que Aristóteles afirmou do princípio primeiro como
um intelecto completamente em ato, que entende a si mesmo,
e, a partir daí, tira um máximo prazer483.
Porém, é possível ter do princípio unitrino “toda a ciên-
cia possível”, considerando no principiado aquilo “pelo que” o
principiado é, o “o que” o princinpiado é e o nexo de ambos.
Assim, aplicando o berilo ao principiado, vê-lo-emos como o
principiado máximo e ao mesmo tempo mínimo. Olhando,
portanto, com esse berilo o princípio de todos os principiados,
então veremos que o princípio simples de tudo é trino. Portanto,
no conceito do principiado se pode ver a trindade da unidade da
essência por meio daquilo “pelo que” algo é, “o que” é e o nexo
de ambos e que é a matéria, a forma e o composto e, no homem,
a alma, o corpo e o nexo.484
A ideia de um terceiro princípio485 necessário para se
pensar a constituição das coisas e, a partir daí, também ver a 208
trindade do princípio simples, segundo Nicolau, não foi atingi-
da nem por Aristóteles nem por outros filósofos. Eles falharam
ao considerarem que os princípios inerentes à substância são
contrários entre si e, dado que os contrários não coincidem,
então Aristóteles e os outros filósofos não conseguiram chegar
a uma correta compreensão de um terceiro princípio certamen-
te necessário. A partir do princípio lógico, segundo o qual se
nega que os contraditórios sejam ao mesmo tempo verdadeiros,
Aristóteles demonstrou que também os contrários não pode-
riam ser simultaneamente verdadeiros.486 O berilo, entretanto,
mostraria os opostos antes da sua dualidade, no princípio
conectivo, ou seja, antes de esses se tornarem dois contraditó-
rios; e seria como se pudéssemos ver os contrários coincidirem
no seu grau mínimo: o mínimo calor e o frio mínimo; a mínima
lentidão e a velocidade mínima; o mínimo arco e a mínima
corda; ângulo minimamente agudo e o ângulo minimamente
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obtuso etc., de modo que essas coisas constituiriam um único
princípio que seria anterior à dualidade de ambos os contrários.
Assim, no princípio da conexão também coincidiria, na simpli-
cidade, os graus mínimos dos contrários.487
No caso de Aristóteles488, mesmo se esse postulava que
os princípios inerentes à substância eram três, não alcançava,
contudo, o terceiro princípio ou o nexus como princípio neces-
sário. Ao conceber a matéria, a forma e a privação como prin-
cípios da substância, não concebeu, porém, a privação como o
princípio que põe a coincidência dos contrários, pois o receio
de reconhecer que os contrários são inerentes simultanea-
mente à mesma coisa privou-o da verdade daquele princípio.
Porém, enquanto viu que era necessário um terceiro princípio
e que este deveria ser a privação, colocou como princípio uma
privação sem posição. E, assim, não conseguindo resolver
a dificuldade, colocou na matéria certo início das formas.
Nicolau reconhece nessa ideia aquilo que chama de “nexo”, mas
também reconhece que nem Aristóteles entende assim, nem o 209
chama com esse nome. Por último, a “fidelidade” ao princípio
da lógica não permitiu que os filósofos chegassem ao terceiro
princípio necessário e, por isso, “todos os filósofos não soube-
ram chegar ao Espírito, que é o princípio da conexão e é, em
Deus, a terceira pessoa, segundo a nossa teologia perfeita”.489
No De beryllo, Nicolau reafirma também a inominabilida-
de do princípio. Pelos menos em duas ocasiões o tema é reto-
mado de modo claro. Em primeiro lugar, a partir do enigma da
coincidência entre o ângulo máximo e o ângulo mínimo, Nicolau
considera que o “Primeiro” é a “medida de todas as coisas”, pois
é de forma complicada todas as coisas que podem ser. O ângulo
simples, ao mesmo tempo máximo e mínimo, complica em si
todos os ângulos que podem ser formados. Portanto, enquanto
é máximo e mínimo, não é nem maior nem menor que qualquer
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ângulo que possa ser dado e, por isso, não lhe convém mais o
nome de um ângulo que de outro490. Em segundo lugar, Nicolau
analisa o fato de que o nome unum poderia convir a Deus mais
do que qualquer outro nome. Parmênides e Anaxágoras esta-
riam de acordo com essa concepção. Entretanto, Nicolau recor-
da que aqui não se trata do uno matemático, mas do uno que
é indivisível e que deve ser entendido sem dualidade alguma.
Por outro lado, todas as coisas que são segundo esse uno não
podem ser entendidas sem dualidade. Assim, Nicolau distin-
guirá entre o unum absolutum e o unum cum addito e afirma
que somente o uno superexaltato pode ser concebido de modo
simples. Por isso, deve-se concluir a partir do enigma da coin-
cidência dos ângulos máximo e mínimo que uno superexaltato
deve ser nomeado com os nomes de todas as coisas [enquanto
é todos os ângulos] e com nenhum deles [enquanto não é
nenhum ângulo que possa ser dado]491.
Afirmamos no início que a questão referente à inominabi-
lidade do princípio ou do nome divino menos inadequado reper- 210
cutia em toda obra de Cusano e podia servir para compreender
os elementos centrais da sua filosofia. Principalmente, a sua
gnosiologia e a sua antropologia, mas também a sua cosmologia
podem ser interpretadas a partir desta busca. Busquemos, então,
determinar em que sentido os nomes são enigmas que indicam
o princípio unitrino. Para “significar” a sua compreensão do
princípio primeiro, nas obras do chamado “período tardio”,
Nicolau utiliza três nomes: possest, non aliud e posse ipsum.492
O primeiro termo é claramente trinitário, mas também a partir
do segundo pode-se mostrar como o Cardeal de Cusa pensa o
princípio trinitariamente. Além disso, a concepção do princípio
como “poder”, concepção essa que atravessa toda a obra cusa-
na, encontrará a sua formulação mais adequada e definitiva em
seus últimos textos por meio dos termos possest e posse ipsum493.
Por último, devemos ainda recordar que a dialética entre a
busca por um nome menos inadequado para nomear o princípio
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e o reconhecimento da sua inominabilidade permanece como
uma posição fundamental também nas obras do último período.
Assim, no que se segue, buscaremos evidenciar em que sentido
o nome é enigma, como a compreensão do princípio primeiro
como unitrino transparece em alguns nomes enigmáticos e
como a dialética do desejo de nomear e o reconhecimento da
inominabilidade aparecem em textos do “período tardio”.
O problema da inominabilidade do princípio também
reaparece no De aequalitate. Nicolau considerava que qualquer
nome nomeável, enquanto era imposto para distinguir uma
coisa de outra, não podia convir ao primeiro princípio que
antecede toda alteridade. Porém, o termo “igualdade” poderia
ser considerado um nome adequado, se concebêssemos essa
igualdade como “o absoluto inalterável”, ou seja, como uma
igualdade que é anterior e “que precede toda alteridade no ser
e no poder”. Assim, deveríamos afirmar dessa igualdade que
nem é, nem pode ser outra, não pode receber qualquer tipo
de mudança, pois “tudo aquilo que pode ser dito, nomeado ou 211
pensado está depois dela”494.
O princípio ou igualdade absoluta, eterna e inalterável
é também trino. A determinação da trindade da igualdade se
sustenta, como no De beryllo e no De principio, na ideia de que o
princípio primeiro é intelectual. Essa concepção, entretanto, é
muito mais uma ajuda para a nossa frágil capacidade, quando se
trata de conceber o princípio primeiro, do que uma afirmação
que vise a determinar a essência desse mesmo princípio. Assim,
se, por um lado, o concebemos como intelectual, por outro,
devemos também assumir que o princípio é infinitamente mais
que intelectual. Entretanto, dizer que a igualdade, enquanto
princípio, é uma igualdade intelectual direciona o pensamento
para a compreensão da sua trindade, pois a partir daí podere-
mos dizer que o princípio, ou seja, a igualdade, entende a si
mesma e entende as obras que realiza da mesma forma que um
construtor de uma casa se sabe construtor e sabe o que faz495.
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A determinação trinitária da igualdade inalterável se
conclui com a identificação entre a igualdade e o criador.
A doutrina da criação, portanto, teria como fundamento último
a doutrina trinitária, pois somente um Deus trino poderia criar
do nada. O criador sabe de si mesmo e sabe tudo aquilo que faz.
Ao mesmo tempo, esse saber é o “verbo do seu conhecimento”
que não é diferente dele mesmo, mas é a sua própria igualdade,
pois, como afirma Nicolau, “a igualdade não pode formar outro
verbo ou conceito de si mesma que não seja aquele de igual-
dade”. Dizer que, na igualdade, não se dá algo diferente dela
mesma é o que Nicolau de Cusa pretende alcançar por meio
do termo “inalterável” e essa é a “razão da igualdade”, a sua
“definição ou figura da sua substância”. Portanto, como não
se dá diferença entre a igualdade e a sua razão ou definição,
deve-se concluir que “uma é a igualdade, que é igualdade e
igualdade da igualdade”. O contexto trinitário se conclui com
a afirmação de que a igualdade gera de si mesma o verbo, a
sua igualdade, e de que o nexo, espírito de caridade ou amor, 212
que também é igualdade, procede de ambas. Por fim, como
não podem existir três igualdades, já que se uma fosse uma e
a outra fosse outra, essa não seria antes da alteridade, ali onde
somente a igualdade pode ser496. Portanto, não se dá alteri-
dade, tendo em vista que a trindade é anterior à pluralidade.
Mas como entender a distinção que se instaura no seio da
trindade? Devemos afirmar, por um lado, que a igualdade que
gera não é a igualdade gerada nem a igualdade que procede de
ambas; e, por outro lado, devemos também assumir que a igual-
dade que gera não é distinta da igualdade gerada e da igualdade
que procede de ambas. É necessário, por isso, conceber que,
na trindade, se dê uma distinção indistinta e uma indistinção
distinta, na medida em que essa trindade é anterior à alteridade.
Seria possível começar a ver essa distinção indistinta conceben-
do o “três anterior ao três”, ou seja, concebendo o número em
si e anterior às coisas numeradas. No entanto, como nas coisas
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numeradas não vemos o número sem alteridade, Nicolau afirma
que não podemos entender o número com o qual numeramos a
unitrinidade da igualdade497.
Como foi apresentado anteriormente, seguindo Santinello
(1987, p. 124), o opúsculo De principio (1459) abre, por assim dizer,
a última fase do pensamento de Nicolau de Cusa. Nesse texto, o
Cardeal de Cusa reafirmará a inefabilidade de Deus e a impossi-
bilidade de ser nominado. Recordemos como exemplo que, no
De principio, o autor afirma que sobre o uno não existe discurso,
pois é indeterminável e, citando Platão, afirma que tanto as afir-
mações quanto as negações sobre o uno são errôneas. Por isso,
conclui que o uno é incompreensível para os sentidos, razão,
opinião e ciência, e inaferrável por qualquer nome498. A questão
da inominabilidade é introduzida no De principio a partir da
identificação do Verbo que falava aos Judeus com o “princípio
do princípio”. Segundo Nicolau de Cusa, o Verbo ou “princípio do
princípio” não recebeu o nome de princípio a partir do mundo
criado, mas o Verbo é princípio desde a eternidade e, portanto, 213
antes mesmo que o mundo fosse feito. O Verbo é princípio na
eternidade e depois da criação do mundo falou no tempo499.
Falar no tempo é falar sensivelmente e isso significa, do ponto
de vista de uma teologia da criação, que “a eterna razão de
ser” fala naquelas coisas que existem por essa mesma razão.
Nicolau sugere ainda que “falar é revelar ou manifestar” e, no
caso do Verbo criador, a sua fala, a sua palavra é revelação e
manifestação de si mesmo500.
Porém, o Verbo não fala de si mesmo somente por meio
da criação, mas, acima de tudo, fala em Cristo, pois em Cristo o
logos não falava como em outro, mas na pureza do princípio501.
Ora, mas o que o Verbo diz de si mesmo? De si mesmo, o Verbo
diz: tunc scietis quia ego sum. Para Nicolau, somente o que subsiste
por si pode dizer verdadeiramente ego sum. Nesse sentido, a
autohyspostaton, que segundo Proclo conviria ao Uno, convém
também ao Verbo. Assim, embora se reconheça que os discursos
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humanos não são adequados para o âmbito do divino, deve-se
também reconhecer que as expressões evangélicas, ditas ao
modo humano, sejam as mais adequadas, pois o Verbo fala de
si em Cristo e Cristo fala humanamente do divino502. A inade-
quação dos discursos humanos para falar do divino também foi
reconhecida por Platão que teria visto “o uno em si e absoluto”,
separando e tirando tudo do uno: teria visto que um é o ente,
uma a potência de ser, um o céu, uma a terra vendo, por assim
dizer, o uno passivo, contraído e alterado em todas as coisas.
Separando e tirando tudo do uno, porém, teria visto o uno abso-
luto que, visto dessa maneira, não é nem ente, nem não ente,
nem é, nem subsiste, nem é subsistente, nem é subsistente por
si, nem princípio nem mesmo uno. Nem a proposição “o uno
é uno” ou “o uno uno” seria apropriada, pois, tendo em vista
que as proposições não são proferidas sem dualidade, nenhuma
delas conviria ao uno503.
Portanto, o princípio de todas as coisas que possuem
nome, enquanto não é nenhum dos principiados, é inomi- 214
nável, não podendo nem mesmo ser chamado de princípio.
Não obstante, ele é o princípio inominável do princípio nominá-
vel e, enquanto é melhor, antecede qualquer coisa nominável.
Deve-se, assim, compreender que os contraditórios se negam
dele, de modo que nem é, nem não é, nem é e não é, nem é ou
não é, porém todas estas expressões não o afetam, pois antecede
a todo o exprimível504.
A conclusão será que também ao princípio não convém
subsistir por si, pois não se entende subsistir por si sem
dualidade e divisão, mas o uno é anterior a toda alteridade.
Contudo, a quem conviria “subsistir por si” senão àquele que é
a causa de tudo que subsiste, já que, com relação a si, nenhum
dos causados subsiste por si ou é alguma coisa que subsista por
si mesmo?505. Da mesma forma, também Nicolau recorda que,
ao subsistente por si que é inominável, indizível e inefável, não
convém nenhum nome, nem mesmo pode convir propriamente
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o nome de “uno”. Porém, tendo em vista que não podem existir
muitos subsistentes por si, então o concebemos e o nomeamos,
segundo o nosso conceito, uno506. O último aspecto que ainda
aqui indicamos diz respeito à diferença entre o nomear as
coisas e nomear a Deus. Segundo Nicolau, não chamamos a
Deus de “uno” como se o conhecêssemos, mas porque o uno é
desejável antes de todo conhecimento. Assim, não compreende-
mos a Deus como compreendemos as coisas as quais impomos
nomes quando conhecidas. A relação do intelecto com o divino
enquanto “objeto” de conhecimento parece que se deve dar de
forma indireta. Daí a ideia de que o intelecto quase que desco-
bre ou advinha as suas hipóstases, ou seja, sua essência e seu
princípio, “a partir do desejo incessante que todos têm do uno”
e, assim, “desejando aquilo que não conhece e que não pode
compreender, coloca o nome de uno”507.
No De li non aliud, obra na qual Nicolau buscou expor uma
denominação negativa para nomear o absoluto, vamos encon-
trar de modo bastante claro a ideia de que o nome é enigma 215
e de que o nome divino manifesta a trindade do princípio.
O Não-outro, como nome do absoluto que indica ao mesmo
tempo a transcendência e a imanência do princípio fundante,
aparece a partir de uma teoria da definição. Isso pode ser perce-
bido já no início do diálogo em questão, quando Nicolau apre-
senta o Não-outro como a definição que se define a si mesma e
todas as coisas508. Também o De li non aliud mantém a dialética
fundamental entre a busca por um nome para o princípio e o
reconhecimento da sua inominabilidade. No entanto, Nicolau
encontrará também um modo para tentar superar o paradoxo
entre o desejo de encontrar um termo menos inadequado para
o princípio e a consciência de que nenhum nome lhe é adequa-
do, ao conceber o Não-outro como um caminho que conduz
o que especula à visão do princípio procurado. Portanto, será
o verbo dūcere (conduzir)509 a indicar a justa compreensão do
nome divino como enigma e do sentido mais próprio do nome
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DO PRINCÍPIO
divino como uma guia para aquele que especula. Somente assim
poderemos, ao mesmo tempo, dizer que qualquer nome não é o
nome do princípio e que um nome pode melhor do que outro
conduzir a uma compreensão menos inadequada do princípio.
As primeiras palavras de Nicolau no início do diálogo parecem
já apontar para essa determinação. O Abade, um dos dialogantes,
pergunta se Nicolau não teria uma formulação mais clara e sinté-
tica para tratar os temas que são abordados por Platão, Proclo,
Aristóteles e Dionísio. Ao tentar responder ao Abade, Nicolau de
Cusa reconhece que juntamente com o próprio Abade já tratou
de mistérios profundos e que os autores lidos explicariam melhor
que qualquer outro tais temas. Porém, e esse é o ponto que quere-
mos destacar, Nicolau reconhece que talvez tenha transcurado
aquilo que o podia conduzir mais proximamente do buscado510.
Aquilo que se transcurou, o que foi esquecido, deixado
de lado e descuidado no percurso da caça foi justamente o
Não-outro. Na prática, Nicolau mostra que facilmente se
passa por cima ou ao largo, descuidando-se do non-aliud. 216
Prova disso é que Fernando, um dos dialogantes, não cuidou
do Não-outro quando Nicolau perguntou se a definição que
define tudo é Não-outro que definido. O Não-outro, portanto,
enquanto definição que se define a si mesma e a todas as coisas,
é o descuidado em toda busca, mas é também o que pode nos
conduzir o mais próximo possível daquilo que buscamos511.
Após concluir que não restam dúvidas de que esse modo de
considerar o Não-outro como definição que define tudo e que
define a si mesmo é o mais preciso e o mais verdadeiro, o que
segue é um atento insistir no Não-outro e um encontrar o que
humanamente se pode conhecer512.
A passagem do Não-outro que aparece na determinação
da definição como sendo Não-outro que definido ao Não-outro
enquanto nome que “significa” Deus começa a ser tematizada
já no segundo capítulo. Uns chamam a Deus primeiro princípio,
afirma Fernando. Porém, o primeiro é o que define a si mesmo e
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a todas as outras coisas, pois é anterior e absoluto em relação a
tudo e nada o antecede. O primeiro, então, não é definido senão
por si mesmo e é a razão de ser e a definição de tudo o que é
principiado. Daí que se possa significar o princípio primeiro com
o Não-outro. Por outro lado, embora muitos nomes já tenham
sido atribuídos ao princípio, devemos manter o princípio da
sua inominabilidade e, portanto, Nicolau de Cusa afirma que
nenhum nome é adequado, pois o princípio é não somente o
princípio de todas as coisas, mas o princípio de todos os nomes.
Além disso, Nicolau também reconhece que um determinado
modo de significar pode ser mais preciso que outro, mas
alerta que ainda não encontrou um significado humano que
tenha dirigido a mente para o princípio com maior precisão.
A questão diz respeito ao limite ou termo do significado que é
ou alguma coisa outra ou o próprio outro. Assim, como todas
as outras coisas são a partir do próprio Não-outro, a conclusão
a que Nicolau chega é a de que nenhum significado pode com
precisão dirigir a mente ao princípio513. 217
Assim, a ideia de que se deva buscar um significado
que conduza ou dirija de um modo mais preciso a mente ao
princípio primeiro não deve ser separada do fato de que todo
significado é limitado para significar o princípio. Portanto,
embora se reconheça que o Não-outro é o que foi descui-
dado e deixado de lado na busca pelo princípio e que esse
poderia significar de modo mais preciso o princípio, não se
pode esquecer que qualquer nome não será o nome de Deus.
Porém, essa limitação não termina em um calar, em um não
dizer ou emudecer. Nicolau reconhece a limitação dos nossos
significados, mas também reconhece que não existe outra
forma pela qual possamos manifestar o que vemos senão por
meio do significado das palavras. Daí que o Não-outro surge
como o mais preciso, mesmo não sendo o nome de Deus, pois
Deus é anterior a qualquer nome que se possa nomear no céu ou
na terra. A saída para esse paradoxo será pensar o nome divino
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não mais como o nome de Deus, ou seja, como se nomeássemos
alguma coisa, mas como um caminho que conduz a Deus da
mesma forma que o caminho que leva à cidade não é o nome
da cidade514. Assim, quando digo Não-outro, não digo o nome
de Deus como se nomeasse alguma coisa, mas percorro um
caminho que conduz à compreensão mais precisa do princípio.
Não-outro ou qualquer outro nome apenas indica, conduz e leva
ao que se busca. Mas alguns caminhos nos conduzem de modo
mais fácil, mais rápido, de modo mais seguro e preciso à cidade.
Assim, para Nicolau, o significado de Não-outro não apenas serve
como caminho para o princípio, mas exprime mais de perto o
nome inominável de Deus e, assim, neste nome, como em um
enigma preciso, Deus reluz para aqueles que o procuram515.
O paradoxo até aqui apresentado, entre o desejo de
conhecer e nomear o princípio incompreensível e inomina-
do e o reconhecimento de que isto não é possível de modo
preciso, pode ser interpretado também seguindo o texto do
De li no aliud, IX, 33 quando o Cardeal, partindo da teoria das 218
formas, afirma que, como a forma dá o ser e o conhecer, assim
o que não possui forma (Deus, a matéria, o nada e coisas desse
tipo) não é compreendido. Nicolau afirma que se pode “ver”517,
com os “olhos da mente”, além ou aquém da compreensão, a
este não-compreendido. A questão agora diz respeito à possi-
bilidade de comunicar essa “visão”, pois como não se pode
fazê-lo sem palavras não se pode comunicar “o que não é sem
recorrer ao termo ‘ser’”. Conclui, portanto, que estas “visões
da mente”, da mesma forma que estão além da compreensão,
estão além da expressão; as afirmações sobre elas são impró-
prias e carentes de precisão518.
Portanto, a consideração do nome mais apropriado
para o inominado encontra-se também, como qualquer busca
humana, sobre o signo da conjetura519. Com isso, assim como
não se pode compreender o incompreensível com precisão, mas
deve-se buscar sempre compreendê-lo melhor520, da mesma
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forma não se consegue nomeá-lo de maneira adequada e
sempre se deve buscar um nome que o nomeie de modo mais
preciso. Essa “incompletude” do conhecimento e da linguagem
humana desvelada pela douta ignorância não se deve a alguma
deficiência, mas se dá antes “em virtude daquilo que em toda
investigação se dá por suposto: o inominado de todo nome”
(BAUCHWITZ, 2006, p. 41).
Gostaríamos de recordar que o Não-outro como defini-
ção que define a si mesma e a todas as coisas também dirige a
especulação para a compreensão do princípio como trindade.
A trindade do princípio primeiro significado por Não-outro se
mostra quando intenasamente fixamos a atenção no fato de
que o Não-outro define a si mesmo. O definir-se a si mesmo
implica um movimento pelo qual o Não-outro sai de si mesmo
e retorna a si mesmo, mas sem nenhuma exteriorização e sem
necessidade de nada outro para se definir. À pergunta “o que é o
Não-outro?” não podemos responder que é outro, mas somente
que é Não-outro. Assim, o Não-outro define a si mesmo e, nesse 219
autodefinir-se, o Não-outro se mostra como trino. Diz Fernando:
vejo que o Não-outro é não outro que Não-outro521.
De modo mais claro ainda, essa temática será retomada
como a primeira dúvida apresentada por Fernando. A questão
refere-se a como compreender que Não-outro possa significar
o Deus trino e uno já que Não-outro antecede todo o número522.
Para esclarecer essa primeira dúvida, Nicolau retoma o ponto
de partida e a ideia central do diálogo: o princípio significado
por Não-outro se define a si mesmo. Na definição explicada
do Não-outro como “Não-outro é Não-outro que Não-outro”
vemos o mesmo repetir-se três vezes. Se essa é a definição
do primeiro, então o primeiro é o mesmo unitrino porque se
define a si mesmo e não seria primeiro se não se definisse a
si mesmo. Portanto, enquanto se define, se mostra trino.
O segundo momento da resposta cusana corresponde a mostrar
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que a trindade do princípio não pode ser pensada como uma
trindade numérica, pois, como a trindade surge da perfeição
do princípio e essa perfeição é antes da alteridade, ou seja, antes
de qualquer outro, não podemos numerá-la nem dizer que ela
é número. No princípio anterior à alteridade, “a trindade não é
outro que unidade e a unidade não é outro que trindade, já que
tanto a trindade como a unidade não são outro que o princípio
simples significado por Não-outro”523
O terceiro momento da resposta cusana corresponderá a
mostrar que, embora o mistério da Trindade supere e prece-
da todos os sentidos, a compreensão alcançada por meio do
Não-outro é mais precisa do que aquela alcançada por meio
de outros termos. Assim, primeiramente, Nicolau considera
que quem nomeia a Trindade com os termos “Pai”, “Filho” e
“Espírito Santo”, embora a nomeie de acordo com a Escritura,
aproxima-se com menor precisão do mistério trinitário. Em
segundo lugar, Nicolau avalia o uso dos termos unitas-aequalitas-
-nexus. Em relação aos termos “Pai”, “Filho” e “Espírito Santo”, 220
Nicolau considera que quem nomeia a Trindade com os termos
“unidade”, “igualdade” e “nexo” se aproxima mais propriamen-
te, caso esses termos sejam encontrados inseridos nas Sagradas
Escrituras. De modo mais simples, claro e preciso, contudo, os
termos hoc, id e idem imitam o Não-outro, mas são termos menos
usados. Segundo o Cardeal, embora não tenha sido jamais usado,
é evidente que, na repetição trina do Não-outro, Não-outro e
Não-outro, o princípio unitrino se mostra de modo mais claro,
porém além da nossa apreensão e da nossa capacidade. No
movimento de autodefinição, por meio do qual o primeiro prin-
cípio significado por “Não-outro” se define a si mesmo, nasce o
Não-outro, e, a partir do Não-outro e do Não-outro originado,
a definição se conclui no Não-outro.524 A “posição triádica” que
o Não-outro assume nessa definição trina implicaria, segundo
André, “uma expressividade interna ou relacionalidade interna
no conceito do próprio Não-outro”, que é definido em termos
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de movimento, pois o Não-outro “implica um dinamismo inter-
no de si para si” que é também “um dinamismo de posição e de
retorno” ou de “saída” e de “regresso” (1997, p. 249).
Como podemos apreciar a avaliação positiva da tríplice
repetição do termo Não-outro na definição, que se define a
si mesma e na qual brilha a Trindade em relação ao trinômio
unitas-aequalitas-nexus, tendo em vista a importância que o
mesmo assume em nossa pesquisa? Recordamos que não nos
preocupamos em nossa pesquisa, primeiramente, em determi-
nar o termo ou os termos mais adequados com os quais Nicolau
de Cusa nomeia o princípio, mas nos voltamos para a visão de
que a ideia de nexus, e, portanto, a concepção de um princípio
em si mesmo relacional permitem a Nicolau de Cusa postular a
possibilidade de que a mente humana possa entender e nomear,
ainda que sempre inadequadamente, o princípio primeiro.
Assim, quando sugerimos o trinômio agostiniano e chartriano
como ponto de partida da investigação nas obras cusanas,
visamos a alcançar a ideia de nexus e a compreensão cusana do 221
princípio trino. Por outro lado, também insistimos que à mani-
festação do princípio a si mesmo corresponderia também uma
manifestação do princípio fora de si. Assim, o mundo e também
a mente humana manifestariam a unitrinidade do princípio,
pois dele recebem tudo o que possuem. Por último, sublinhamos
que os nomes divinos deveriam manifestar, enquanto enigmas
do princípio primeiro, essa mesma relacionalidade e trindade
do princípio que inadequadamente buscam nomear. É nesse
contexto que a nossa análise se volta para o termo nexus e para
aquele nome que em si mesmo indica o nexus e a trindade do
princípio: possest.
Assim, em primeiro lugar, não pretendemos que o trinô-
mio agostiniano e também chartriano seja o único modo ou
o modo mais preciso de se nomear o mistério da Trindade e,
portanto, de se pensar a relacionalidade e o dinamismo interno
ao princípio primeiro. Contudo, nesses termos conseguimos
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pensar a concepção cusana da trindade do princípio e, mais
ainda, a sua concepção de nexus. Além disso, é necessário
termos presente que qualquer nome ou termo que busque
nomear o princípio será sempre uma conjectura tendo em vista
a imprecisão da nossa linguagem. Até mesmo o posse ipsum, últi-
mo nome que aparece no De apice theoriae, última obra cusana,
não pode ser uma exceção a essa regra. Em segundo lugar, no
De li non aliud, Nicolau não rejeita nenhum modo com o qual
ele mesmo já havia nomeado a trindade do princípio, porém os
avalia tendo em vista o termo “Não-outro”. Assim, segundo ele,
no trinômio unitas-aequalitas-nexus, o Não-outro resplandece
de modo mais claro em relação aos termos Pai, Filho e Espírito
Santo. Por exemplo, na unidade que diz indistinção em relação a
si e distinção em relação ao outro, segundo Nicolau, certamente
se discerne o Não-outro. Da mesma forma, o Não-outro também
se manifesta na igualdade e no nexo a quem os considera
atentamente. Em terceiro lugar, é necessário também recordar
que, no De venatione sapientiae, tanto o possest, nome divino que 222
em si mesmo mostra o nexus e, por isso mesmo, a trindade do
princípio, quanto a unidade, a igualdade e a conexão ou nexo
são reafirmados ao lado, por exemplo, da douta ignorância e do
próprio Não-outro como campos válidos para a caça da sabe-
doria. Queremos com isso indicar que a avaliação dos termos
usados para significar a Trindade antes do De li non aliud não
significa um abandono de tais termos e da compreensão do
princípio trino que enigmaticamente eles mostram.
Contudo, recordamos que, a partir do De possest, com
exceção do De li non aliud, a dinamicidade e produtividade do
princípio serão pensadas por meio do termo posse até a aparição
do termo posse ipsum. No “Memorial” do De apice theoriae, Nicolau
afirma que a mente vê de modo certo que o posse ipsum se mostra
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No poder fazer do que faz, no poder ser feito do factível e no
poder da conexão de ambos. Não são três poderes, mas é o mesmo
poder daquele que faz, do factível, e o da conexão dos dois525.
Assim, para Nicolau, o princípio se mostra na sua dina-
micidade e no seu movimento, mas a mente deve ver nessa
aparição que o princípio é o único e o próprio poder. Aqui,
termos como unitas e aequalitas são substituídos pelos termos
posse facere e posse fieri, indicando, assim, que o princípio
será pensado na sua produtividade e dinamicidade por meio
do termo posse, mas que Nicolau mantém o termo conexio
para indicar a relacionalidade interna do princípio unitrino.
Por isso, se na repetição triádica da definição que define tudo e
a si mesma o Não-outro, enquanto princípio unitrino, se mostra
de modo mais claro que nos outros termos, isso, contudo, não
poderá significar que o caminho percorrido será abandonado
por Nicolau de Cusa. Pelo contrário, a ideia de posse para 223
significar o princípio primeiro que surge desde os tempos do
De docta ignorantia será retomada no De possest e reafirmada no
De venatione sapientiae, para ser finalmente compreendida em
sua plenitude no Compendium e no De apice theorie.
4.3 O POSSEST: NOME DIVINO QUE EM SI MESMO
INDICA O NEXUS
O nosso percurso se encerra com a reflexão cusana
sobre o “possest” como nome divino526. O caminho percorrido
nos conduziu à compreensão do princípio como unitrino e nos
indicou que, sobre o fundamento da concepção trinitária, se
pode ver o princípio que se conhece a si mesmo por meio do
seu Verbo e que, por meio desse mesmo Verbo, se exterioriza
na criação. Contudo, o movimento do princípio sem princípio
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para o princípio a partir do princípio é o nexus entre ambos.
Esse mesmo nexus possibilita que o amante possa ser amado no
amável, que o inteligente possa ser entendido no inteligível e
que o princípio inominável seja nomeado no princípio nomi-
nável, pois o objeto da vontade é o amor amável e do intelecto
é o inteligível e o nominável. Assim, como todo o principiado
ou causado tem tudo o que é do princípio e da sua causa,
portanto, de algum modo, imita o quanto pode o seu princípio
simples. Vimos que o universo, enquanto máximo contraído,
imita contraidamente a unidade e a trindade do princípio
unitrino. Além disso, também consideramos que a mente,
enquanto imagem de Deus, imita a trindade do princípio no
seu dinâmico operar que se mostra no posse assimilare, no posse
assimilari e no nexus de ambos. É por isso que ser imagem não
significa que a mente já é uma “cópia” perfeita do seu prin-
cípio. Ao contrário, a mente é imagem viva enquanto busca
assimilar-se cada vez mais ao seu exemplar. Como o princípio
é eterno e absoluto, o movimento da assimilatio não pode 224
terminar, pois a imagem somente encontra repouso naquilo do
que é imagem. Da mesma forma, enquanto imagem da divina
complicação, a mente pode assimilar a explicação de todas
as coisas sendo, assim, antecipadamente a unidade de tudo
aquilo que ela mesma concebe. Esperamos, portanto, alcançar
com o possest aquele nome que, como os outros nomes divinos,
conduzem à compreensão do princípio. Nesse caso, de modo
mais específico, acreditamos que o possest indica, enquanto
enigma, a trindade do princípio e, mais ainda, conduz o que
especula ao nexus que se mostrou como princípio fundamental
para a compreensão dessa mesma unitrinidade.
Dentre todas as obras cusanas, o termo “possest” apare-
cerá apenas em três textos do chamado “período tardio”527.
As duas últimas aparições do termo em questão se dão no De
apice theoriae, provavelmente a última obra escrita por Nicolau
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de Cusa. O contexto no qual o termo “possest” aparece indica,
ao mesmo tempo, a sua substituição por aquele que é o último
termo que significa o nome divino na especulação cusana: posse
ipsum. O caminho percorrido até o De apice theoriae levou Nicolau
à compreensão de que a quididade de todas as coisas “não era
diferente nos distintos entes, mas a mesma hipóstase de todos”.
O próximo passo, certamente consequência das diversas refle-
xões sobre o “poder”, será o de compreender que “a hipóstase
ou subsistência pode ser. E já que pode ser, certamente não pode
ser sem o próprio poder”. Assim, Nicolau alcança com o posse
ipsum aquele “quid” ou a própria quididade sem a qual “nada
pode ser”528. Apesar de Pedro de Ercklentz, com quem Nicolau
dialoga nesse texto, reconhecer a verdade da conclusão cusana,
ele questiona se não seriam suficientes o que o Cardeal já havia
afirmado sobre o possest e que está exposto no triálogo que leva
o mesmo nome. O posse ipsum é, segundo o Cardeal, com relação
ao possest ou a qualquer outro termo, “mais apto para nomear
aquele sem o qual nada poder ser, viver e entender” e que “não 225
existe outro nome mais claro, mais verdadeiro, mais fácil”.
Por sua vez, no De venatione sapientiae, o possest será consi-
derado o segundo campo, logo após o da douta ignorância e
antes do non aliud, no qual se dá a caça da sabedoria. A respeito
desse campo, Nicolau considera que, nele, se pode caçar um
alimento mais do que suficiente, que Deus não deve ser caçado
fora dele e que nele a caça é muito agradável531. O campo do
possest será determinado como aquele no qual o poder é ato ou
a possibilidade é atualidade. A coincidência entre a possibili-
dade e atualidade só pode ser pensada em Deus que, porém, é
anterior a tudo que pode ser nomeado e é anterior a qualquer
coisa e a nada, à efabilidade e à inefabilidade e é antes mesmo
do poder ser feito e do feito. Portanto, na eternidade, nada há
de possível, ou melhor, todo o possível no eterno é atual. Assim,
tudo aquilo que é depois do poder ser feito pode ser feito de
modo diverso do que é. Somente Deus, enquanto é em ato o
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que pode ser, é o possest533. Deus não pode ser nada daquilo que
pode ser de outro modo e isso significa que Ele não pode ser
pequeno, pois o pequeno pode ser maior; não pode ser grande,
pois o grande pode ser menor. Pensar Deus por meio do possest
é ver a sua anterioridade com relação a tudo o que pode ser de
outro modo e a todo tipo de diferença. Ele é, por isso, anterior
à diferença entre o ato e a potência, anterior a diferença entre
o poder ser feito e o poder fazer, entre a luz e as trevas, entre
ser e não ser, entre algo e nada. É até mesmo anterior à dife-
rença entre o diferente e o indiferente, entre a desigualdade e
a igualdade. Sendo anterior a qualquer tipo de diferença, não
é, portanto, mais uma coisa do que outra, não é maior do que
uma coisa e menor do que outra, não é mais igual a uma coisa e
menos igual à outra534. Um último aspecto importante vale ser
lembrado no contexto desse capítulo XIII do De venatione sapien-
tiae: aqueles que limitam a caça de Deus ao âmbito do princípio
“qualquer coisa é ou não é” não puderam buscar Deus dentro
do campo do possest no qual coincide o poder ser e o ser em 226
ato. Assim, ao se pressupor que toda busca se limite ao princípio
de não contradição e que não se pode buscar nada aquém da
diferença dos opostos não se busca, portanto, a Deus que é mais
antigo do que esse princípio e supera o seu campo535.
Esses aspectos resumidamente retomados no De venatione
sapientiae foram profundamente abordados no De possest que se
constitui como um “triálogo” entre Nicolau de Cusa, Bernardo
de Krayburg, chanceler do Arcebispo de Salzburgo, e João
André Vigévio, secretário do Cardeal e depois bispo de Aleria536.
O “triálogo” se inicia com uma dúvida levantada por João a
respeito da interpretação de um texto da Carta de São Paulo
aos Romanos. Segundo o texto de Paulo, as perfeições invisíveis
de Deus, sua força eterna e sua divindade, tornaram-se inteligí-
veis, desde a criação do mundo, por meio das criaturas. É esse
o modo como Deus manifesta aos homens o que esses sabem
sobre Ele537. Roga-se, então, ao Cardeal que possa elucidar esse
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modo de visão538. A partir desse versículo, duas dúvidas também
serão levantadas por Bernardo: em que sentido as coisas invi-
síveis podem ser vistas e como se alcança esse tipo de visão a
partir das coisas visíveis539.
Em primeiro lugar, Nicolau explica Paulo a partir dele
mesmo e, para isso, usa o texto da Segunda Carta aos Coríntios,
no qual o apóstolo afirma que as coisas invisíveis são eternas540.
Também acrescenta uma doutrina, que já acenamos anterior-
mente, de que “as coisas temporais são imagens das coisas
eternas” e, assim, o Cardeal poderá concluir que, se as coisas
criadas, temporais e visíveis são entendidas, também é visto o
que é eterno e invisível de Deus, como a sua eternidade, a sua
força criadora e a sua divindade. Daí que justamente Paulo possa
afirmar que a manifestação de Deus se dê a partir da criação do
mundo541. Em segundo lugar, ver de modo invisível significa, para
Nicolau de Cusa, ver mentalmente. O exemplo da leitura conduz
a compreensão dessa afirmação, pois, quando se entende o que
se ler, vê-se de modo invisível a verdade escondida por trás das 227
letras542. Em terceiro lugar, tendo em vista que o sensível não
existe por si mesmo, deve-se buscar a sua causa. Pode-se, então,
compreender a afirmação do Apóstolo, pois a partir do mundo
visível enquanto criatura se eleva ao Criador. Considerando,
portanto, que o mundo sensível e finito procede de uma força
maior do que o próprio mundo, deve-se considerar que a força a
partir da qual procede esse mundo visível e temporal não pode
ser senão a força criativa eterna e invisível543. Por fim, isso que
Paulo ensina, ou seja, que a partir de qualquer criatura visível
possamos ascender ao princípio invisível de cada uma delas,
não é de pouca monta544.
Aceito, portanto, que o caminho para ver o invisível
passa pelas criaturas visíveis e temporais, o próximo passo será
pensar a constituição ou o modo de ser das criaturas para assim
poder ver o modo absoluto e eterno do princípio fundante.
A ideia é alcançar em Deus, de maneira invisível, o que se vê
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na criação. Não podemos negar que as coisas existam em ato e
também não podemos negar que, se elas existem, elas também
podem ser, pois o que não pode ser, por isso mesmo não é545.
A partir da consideração do poder ser e do ser em ato das criatu-
ras se conclui, então, que tudo o que é, enquanto é em ato, pode
ser e que o que não pode ser também não é; em segundo lugar,
que o não ser não é criatura, pois se o fosse certamente seria.
Assim, quando se pensa a partir das criaturas em sua constitui-
ção fundamental, pode-se ver que somente o ato e a potência
são e que o não ser, que não é de modo algum algo criado, não é.
Se essa é a constituição fundamental das criaturas e
se a partir delas se pode ver o invisível, então o que se vê é a
atualidade absoluta, por meio da qual as coisas são o que são e a
possibilidade absoluta, por meio da qual aquelas coisas que são
em ato podem ser em ato. Essa possibilidade absoluta, por sua
vez, nem precede nem segue a atualidade absoluta, pois não se
pode dar atualidade sem possibilidade, ou seja, se a atualidade
absoluta existe em ato, também pode ser, pois o que é impossí- 228
vel não existe. Daí que, enquanto nas criaturas potência e ato se
distinguem realmente, pois, de fato, pode-se ver as criaturas no
seu poder ser feito antes de serem em ato, embora não se possa
dar nenhuma criatura sem que potência e ato estejam unidas,
na eternidade a atualidade absoluta e a possiblidade absoluta
estão sempre unidas. Assim, a potência absoluta, o ato absoluto
e o nexo de ambos são coeternos, mas, como não se podem dar
muitos eternos, então são de tal maneira eternos que são a
única eternidade546.
A consideração sobre a unitrinidade do criador a
partir das criaturas será retomada posteriormente por João.
Após Nicolau de Cusa haver considerado que a matemática pode
ser, por sua precisão, um enigma adequado para nos conduzir ao
princípio simples e que esse mesmo princípio pode ser visto na
sua unitrinidade no enigma e no espelho da matemática, João
retoma a discussão sobre a consideração da unitrinidade do
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
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DO PRINCÍPIO
Criador a partir da criatura, embora reconheça que o Criador
permanece em si mesmo inefável com relação a qualquer modo
de dizer. Nicolau afirma que a potência, o ato e o nexo de ambos
constituem a estrutura ou a essência de tudo aquilo que é, pois,
se a uma coisa lhe faltasse qualquer um desses três, a coisa não
existiria: como algo seria se não pudesse existir? Como seria
se não fosse em ato? E se pudesse ser e não fosse, como seria?
Essas questões leva-o à seguinte conclusão: é necessário para
que algo que pode ser de fato seja que exista o nexo entre o
poder ser e o ser em ato. Além disso, Nicolau também afirma
que o ato, a potência e o nexo de ambos não são diferentes
entre si, mas são da mesma essência, já que constituem uma
única e mesma coisa. O exemplo da rosa ilumina o que o Cardeal
pretende afirmar: a rosa em potência, a rosa em ato e a rosa em
potência e ato são a mesma rosa e não são diferentes uma da
outra, embora o poder, o ato e o nexo de ambos não se verifi-
quem um do outro como na rosa547.
O exemplo da rosa é também confirmado por Bernardo, 229
para quem “a existência atual” da rosa procede do poder e do
ser e, assim, pode-se ver que “a rosa unitrina procede de um
princípio unitrino” e nela brilha o princípio de todas as coisas,
“pois tudo o que é principiado é unitrino”. Porém, é necessário
estabelecer a diferença entre o princípio e o principiado, pois,
embora todas as coisas estejam no princípio como em sua causa
ou razão, o principiado não é nada do princípio. Dessa forma,
mesmo quando se afirma que a criatura é unitrina e procede
de um princípio unitrino, não se segue daí que a trindade do
princípio seja a mesma trindade do principiado. A trindade nas
coisas criadas é principiada e, portanto, pode-se dizer que, de
fato, a potência, o ato e o nexo são diferentes no principiado e são
numericamente três. Entretanto, como no princípio não se pode
dar nada de principiado, nele a trindade é absoluta e, por isso,
a própria trindade é o princípio de todas as coisas unitrinas548.
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O que se alcança partindo do enigma da matemática e
da consideração da criatura é que a trindade do princípio não
é uma trindade numérica, pois a Trindade divina é eterna e
absoluta. Portanto, deve-se concluir por uma distinção no seio
da Trindade que não implique a alteridade. A indistinção na
Trindade é vista quando se reconhece que é o mesmo o Deus
pelo qual a rosa é em potência, é em ato e é no nexo de ambos,
pois não são três rosas, mas a mesma rosa que é unitrina.
Porém, será necessário pensar como essa indistinção se coadu-
na com a distinção entre as pessoas, pois, como lembra João, os
cristãos afirmam que uma é a pessoa do próprio poder absoluto,
outra a do próprio ser e outra a do nexo de ambos. A primeira é
o Pai onipotente, a segunda, enquanto deriva do próprio poder,
é o Filho do Pai e a terceira, que é amor natural e nexo espiritual
do Pai e do Filho, é o Espírito. João solicita, por isso, que Nicolau
mostre como enigmaticamente se pode ver a distinção entre as
pessoas na Trindade549.
O desafio é pensar a distinção entre as pessoas e, ao 230
mesmo tempo, a indistinção na Trindade divina ou, filoso-
ficamente falando, pensar em um princípio simples que em
si mesmo é relação. Já tivemos oportunidade de ver como na
Trindade a distinção não pode ser pensada a partir da alterida-
de, pois a Trindade transcende a alteridade. Segundo Nicolau,
ao mesmo tempo em que se afirma que o Pai não é outro em
relação ao Filho, pois são o mesmo tendo em vista a identidade
de essência e de natureza, também se deve afirmar que o Pai não
é o Filho, tendo em vista a distinção entre as pessoas. Porém, a
causa da diferença não é o não-ser, pois a Trindade é anterior
ao não-ser. A diferença será pensada tomando como enigma a
relação entre o poder, o ser e o nexo de ambos. Ou seja, a distin-
ção na Trindade não se funda na diferença entre ser e não-ser.
A distinção entre Pai e Filho será pensada tomando como
enigma a ideia de que o ser pressupõe o poder, pois nada é
sem que possa ser. Por outro lado, o poder não pressupõe
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nada, pois, segundo Nicolau de Cusa, o poder é a eternidade.
Assim, a partir do enigma da relação entre o poder, o ser e o
nexo de ambos, o Cardeal conclui que se pode ver Deus que
não pressupõe o princípio de si mesmo, que se pode ver Deus
que pressupõe um princípio de si mesmo e Deus que procede
de ambos. Porém, não se veem três deuses, mas a unidade da
deidade na Trindade. Assim, se vê uma distinção na deidade
que é indistinta. Contudo, o princípio da douta ignorância aler-
ta que se deve acreditar que o visto no enigma é, contudo, mais
verdadeiro e perfeito na própria deidade. Assim, mesmo que o
alcançado no enigma não seja tão sutil quanto a visão que os
santos tiveram, é suficiente reconhecer que, se a perfeição do
princípio exige que o princípio seja uno, também exige que seja
trino.550 A unidade só seria perfeita se tivesse em si tudo o que
é necessário a um princípio perfeitíssimo e o termo “trindade”
busca expressar tudo aquilo que é necessário ao princípio
perfeito. Por outro lado, também a Trindade não seria perfeita
se não fosse una, tendo em vista que se deve reconhecer, como 231
o faz Nicolau pela boca de Bernardo, que a unidade é o prin-
cípio de toda multiplicidade551. Por último, Nicolau insiste em
reafirmar que a unidade e a trindade que se afirmam de Deus
não são nem a unidade nem a trindade matemática. Ser “vida”
ou possuir em si mesmo a própria “vida” é o que distingue a
unidade e a trindade que predicamos de Deus daquelas da
matemática. A unidade é “verdadeira e viva” e complica em si
todas as coisas e a trindade é uma correlação vital. O fruto da
vida trinitária é a eterna alegria e suprema perfeição e, assim,
enquanto vida perfeita e eterna, pertence à vida ser unitrina de
modo que o poder viver seja onipotente, gere a partir de si a sua
própria vida e do poder viver onipotente e da vida procedam o
espírito de amor e a alegria sempiterna552.
O que se vê, portanto, a partir das criaturas é que o prin-
cípio fundante é atualidade absoluta, potência absoluta e nexo
absoluto. Porém, por serem eternos, ato, potência e nexo são a
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única eternidade. O que vemos é a determinação especulativa
da trindade do princípio fundante a partir das coisas temporais
e finitas. Somente depois é que as determinações alcançadas
serão pensadas com relação a Deus. Assim, considerando que a
eternidade é o Deus glorioso, pode-se afirmar que Ele é o prin-
cípio simples do mundo, é anterior à atualidade que se distin-
gue da potência e anterior à possibilidade que se distingue do
ato. Daí que, como a potência e o ato coincidem no princípio,
é preciso concluir que somente Deus é o que pode ser e que o
mesmo não acontece nas criaturas, pois, nessas, potência e ato,
distinguem-se553. Isso significa que as criaturas, por exemplo, o
sol, embora sejam o que são em ato, não são tudo o que podem
ser já que poderiam ser de outro modo de como são em ato554.
Nas palavras de Bernardo, isso aconteceria tendo em vista que
a potência criadora de Deus não se esgota na sua criação555.
O alcançado, portanto, a partir dessas considerações é
que somente o princípio fundante ou Deus é o que pode ser e,
por ser absoluto e eterno, n’Ele a possibilidade coincide com a 232
atualidade. A ideia de que somente Deus é o que pode ser já
aparecia no contexto do De docta ignorantia. No primeiro livro
Nicolau afirma que o máximo, sendo tudo aquilo que pode ser,
coincide com o mínimo556. No segundo livro, ao buscar explicar
a diferença entre o universo e Deus, Nicolau argumenta que
enquanto a Deus convém ser “infinito negativamente”, pois
“só ele é aquilo que pode ser com toda a potência”, ao universo
corresponde ser “infinito privativamente”. O universo poderia
ser maior tendo em vista a potência divina que não tem limites,
mas não tendo em vista “a possibilidade ou a matéria” que
“não se estende para além de si própria” ou “que não é extensí-
vel até ao infinito em ato”.557
A aproximação do De possest com o De docta ignorantia
também se dá a partir da ideia da coincidentia oppositorum que
é pensada, tanto no De docta ignorantia quanto no De possest,
por meio da relação dialética da complicatio/explicatio. Sendo
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Deus a potência absoluta, o ato absoluto e o nexo de ambos é
em ato todo ser possível e é complicadamente todas as coisas.
Assim, tudo aquilo que é ou pode ser estaria complicado no
princípio, ou seja, no princípio simples do mundo. Por sua vez,
tudo aquilo que foi ou será criado é uma explicação daquele
mesmo princípio simples no qual se encontram complicada-
mente558. O contexto coincidencial e a relação com o De docta
ignorantia fica a ainda mais claro com a conclusão alcançada por
Bernardo e reconhecida por Nicolau. Se em Deus todas as coisas
estão complicadas e, portanto, pode-se adequadamente afirmar
que Deus é grande tendo, contudo, o cuidado de se afirmar que
Ele é a própria grandeza, por ser tudo aquilo que é, e não uma
grandeza que pode ser maior ou uma grandeza que pode ser
menor, então se pode concluir, como o faz Bernardo, que Deus
é, ao mesmo tempo, a máxima e a mínima grandeza559.
Poderíamos dizer que os elementos centrais da compreen-
são cusana do princípio pensado a partir da ideia de que o princí-
pio simples é o que pode ser e, portanto, nele coincide a potência 233
absoluta e o ato absoluto já foram abordados. Ou seja, a sua ante-
rioridade em relação a todas as coisas, nas quais potência e ato
não coincidem, a coincidência no princípio de ato e potência e
sua trindade pensada a partir do nexo entre a potência absoluta
e o ato absoluto já estão postas. Porém, ainda não apareceu o
termo que busca nomear o princípio assim entendido e que, ao
mesmo tempo, conduz a uma compreensão mais simples desse
mesmo princípio. Da mesma forma, ainda não se discutiu sobre
a questão da inominabilidade do princípio fundante.
O problema da inominabilidade começa a ser introduzido
no momento em que a ideia de grandeza é atribuída a Deus.
Como vimos anteriormente, em Deus coincide a máxima e a
mínima grandeza e, portanto, pode-se dizer que Deus é grande,
mas com a ressalva de que Ele é a própria grandeza enquanto
é tudo o que pode ser. Daí Bernardo poder concluir que, tendo
em vista a infinita diferença entre Deus e as coisas criadas, não
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se pode predicar adequadamente de Deus o que se predica da
grandeza ou de qualquer outra coisa criada. Essa impossibili-
dade, reconhecida também pelo apóstolo Paulo, funda-se no
princípio, já afirmado desde os tempos do De docta ignorantia,
de que não existe proporção entre o infinito e o finito, entre o
invisível e o visível ou entre o temporal e o eterno560. Porém, por
sua vez, João está disposto a conceder que termos como beleza,
bem, vida e movimento poderiam ser adequadamente predica-
dos de Deus segundo a regra explicada, mas acredita que não
se poderia afirmar adequadamente que Deus é sol, céu, homem
ou outra coisa parecida561. A resposta de Nicolau corresponderá
a reafirmar a regra geral para os nomes que se predicam das
coisas criadas. Daí que se pode dizer que Deus é sol, céu ou
outra coisa parecida desde que se entenda corretamente que,
neste caso, não se trata de um sol ou de um céu sensível, mas de
um sol que é em ato tudo o que pode ser e, assim, poderíamos
nomear a Deus com qualquer nome desde que transferíssemos
intelectualmente o termo ao poder ser. Nesse sentido, Nicolau 234
sublinha que não se deve parar nas palavras e, poderíamos,
concluir: não se deve fixar-se nas palavras, mas olhar para a
força ou o significado que os termos guardam e escondem562.
O momento que antecede o aparecimento do termo
“possest” dentro do “triálogo” se conclui com as seguintes afir-
mações de João que consegue, segundo as palavras do próprio
Cusano, captar a raiz do que foi exposto563: Deus é tudo, de
modo que não pode ser outro; Deus está em todas as partes, de
modo que não pode estar em um lugar outro; é a medida mais
adequada de todas as coisas, de modo que não pode ser mais
igual. Sendo assim, João, então, conclui que se pode ver por
essa via que Deus está livre de toda oposição, que as coisas que
parecem ser opostas nele são idênticas e que a negação não se
opõe à afirmação564.
A contemplação de tudo isso, segundo Nicolau de Cusa,
porém, que não é explicável em muitos discursos, estaria
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complicada em uma brevíssima palavra. O que o Cardeal está
buscando é um termo que possa significar, de modo simples, a
expressão complexa “posse est”, ou seja, que possa significar que
o próprio poder é565. Como já vimos, no De possest, a concepção
do princípio fundante que se alcança por meio da consideração
das coisas criadas está marcada pela reflexão sobre o ato e a
potência. Assim, quando essa relação é pensada no princípio,
já não pode mais haver diferença e o nome simples que preten-
da nomear o princípio simples deve levar em conta essa relação.
Que o próprio poder seja significa que o poder é em ato, ou seja,
poder ser é poder ser em ato. Dessa forma, o nome que se busca
para nomear o princípio deve também indicar essa coincidência
e o nexo entre o poder ser e o ser em ato. O possest, nexo de posse
e est, de potência e atualidade, seria o nome suficientemente
apropriado para Deus segundo o conceito que temos d’Ele.
Para que esse seja um nome adequado, deve complicar todas as
coisas, complicar todos os nomes, ser um nome igual a todos os
nomes e ao mesmo tempo distinto de todos os nomes566. 235
O possest, nome divino, possui as mesmas características
que outros nomes divinos567. Assim, o possest deve conduzir
aquele que especula por cima dos sentidos, da razão e do inte-
lecto à visão do princípio. No De possest, o nome divino conduz
aquele que busca a verdade à visão mística na qual, terminada
a ascensão das forças cognitivas, começa a revelação do Deus
desconhecido. A ascensão para além das coisas, para além das
nossas capacidades cognitivas e de nós mesmos nos revela que
não existe mais nenhum modo de aproximação a esse Deus que
permanece invisível. Aqui existe uma tênue, mas clara separa-
ção entre o que alcançamos com as nossas próprias forças e o
que desejamos que de fato ocorra. Terminado todo o caminho
aproximativo, o que nos resta é esperar que o Deus desconhe-
cido e invisível se revele e apareça destruindo as trevas que o
escondem, de tal modo que possamos ver o invisível no modo
como pode se manifestar568.
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Porém, não é simples e fácil ver aquilo que o possest
pretende fazer ver. Talvez, por isso, no De apice theoriae, Nicolau
de Cusa tenha apontado o posse ipsum como um nome mais fácil
e mais claro. Assim, depois do Cardeal expor o que pretendia
indicar com o nome divino possest, os dois interlocutores apre-
sentam aquelas que seriam as principais dificuldades quando
se pretende pensar o princípio simples: em que sentido todas
as coisas estão complicadas no possest;569 em que sentido aquele
que busca compreender o princípio deve se elevar acima de si
mesmo e de suas forças cognoscitivas570 e, por último, o desejo
expresso por Bernardo de que, por meio de um simbolismo ou
de um exemplo, Nicolau os possa guiar a compreender em que
sentido o eterno é todas as coisas ao mesmo tempo e está em
um agora presente revela a dificuldade de se intuir aquilo que o
possest quer mostrar571.
Para conduzir os seus interlocutores a compreenderem
como o ser eterno pode ser todas as coisas ao mesmo tempo,
Nicolau utiliza o exemplo do jogo de pião que considera adequado 236
tendo em vista ser um jogo também praticado por seus interlo-
cutores572. Entretanto, existe um problema que nos toca mais de
perto e ao qual Nicolau de Cusa dedica, para poder explicitá-lo,
o enigma da linha. Referimo-nos à questão da inominabilidade
do princípio. Já acenamos anteriormente para o fato de que o De
possest sugere que qualquer nome tomado a partir das criaturas
poderia convir ao princípio, contanto que o termo fosse trans-
ferido ao possest. Da mesma forma, o enigma da linha mostra
que, ao se aplicar o possest a qualquer coisa que possua nome,
poderemos alcançar, enigmaticamente, o inominável.
Assim, aplicando o possest à linha, pode-se ver que o
possest linear é em ato tudo o que a linha pode ser e é tudo aquilo
que a linha pode vir a ser. Conclui-se, portanto, que a linha é ao
mesmo tempo máxima e mínima. Por um lado, enquanto o possest
linear é o que pode ser, não é maior e, por isso, é linha máxima.
Nem é menor, e, portanto, é linha mínima. Por outro lado,
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enquanto o possest linear é o que a linha pode vir a ser, então é
o termo de todas as superfícies: do triângulo, do quadrângulo,
de todos os polígonos, de todos os círculos e de todas as figuras
figuradas a partir da linha reta ou curva. Além disso, pode-se ver
também que a linha é modelo adequado e verdadeiro de todas as
figuras e é a igualdade que contém em si todas as figuras e que
figura todas as coisas. O possest linear é, portanto, uma única
figura para tudo o que é figurado linearmente e é a única razão
e causa das diferentes figuras573.
O possest possui, portanto, uma virtualidade e uma força
que, se aplicado a qualquer coisa que possui nome, transforma
essa mesma coisa em um enigma adequado que conduz o que
especula ao que é inominável. Assim, ao aplicar-se o possest à
linha, se alcançou a linha indivisível que existe acima dos opos-
tos e que é todas as coisas e nenhuma de todas as coisas que são
lineares. O que se alcança, portanto, quando se aplica o possest
à linha, como a qualquer outra coisa que possui nome, é que já
não é linha o que chamamos de linha, mas algo que está acima 237
de todas as coisas que possuem lineabilidade. Assim, a linha,
o sol, o céu ou qualquer coisa que possui nome, por meio do
possest, conduz o que especula ao sem nome. Porém, o próprio
possest, considerado em si mesmo e sem nenhuma aplicação
a algo que possua nome, também conduz enigmaticamente
ao onipotente. No onipotente, vemos que todas as coisas que
podem ser e podem vir a ser estão acima de qualquer nome com
o qual podemos nomear o que pode ser e estão acima do ser e
do não ser. Como o não ser, elas podem ser pela força do onipo-
tente, são em ato, pois o poder absoluto é em ato no onipotente.
Assim, tudo aquilo que pode ser, passando do não ser ao ser, está
ali onde o poder é ser, ou seja, no possest.574
O enigma do possest, portanto, conduz enigmaticamente
o que especula a ver, acima do ser e do não-ser, de modo inefá-
vel, que todas as coisas provêm do não-ser ao ser por meio do
ser em ato que é todas as coisas. Porém, quando atingimos essa
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visão, aí não encontramos nome, verdadeira e distintamente,
nominável por nós. Isso porque ao princípio simples que se
deixa ver enigmaticamente no possest não convém nem o nome
de unidade ou singularidade, nem o nome de pluralidade ou
multiplicidade, nem qualquer outro nome nomeável ou inteli-
gível para nós, pois ali o ser e o não-ser não se contradizem,
da mesma forma que também não se contradizem qualquer dos
opostos que afirmem ou neguem uma distinção. Seu nome é o
nome de todos os nomes; não é mais um nome singular para
coisas singulares que um nome universal ao mesmo tempo para
tudo e para nada575.
Recordemos algumas conclusões que Bernardo e João vão
apresentando. Em primeiro lugar, segundo Bernardo, Nicolau
pretende com o possest alcançar, segundo o conceito humano,
um significado simples que conduz aquele que busca, por meio
de um enigma, a uma asserção positiva de Deus. Esse significa-
do simples se alcança a partir do momento em que se concebe
o poder absoluto como aquele que complica todo o poder acima 238
da ação e da paixão, do poder fazer e do poder ser feito e se
entende o próprio poder como ser em ato. Além disso, o poder
que é em ato é o poder de todo poder e, portanto, absoluto.
Assim, segundo Bernardo, o Cardeal pretenderia mostrar que
onde todo poder é em ato, ali se chegaria ao primeiro princípio
onipotente576. Em segundo lugar, partindo do fato de que somen-
te o princípio, enquanto é o próprio possest, não pode não ser o
que é, João conclui que o princípio é necessidade absoluta577. Em
terceiro lugar, João e Nicolau distinguem “matéria” e “possibi-
lidade não criada” que, no possest, seria o próprio possest. Em
quarto lugar, João e Nicolau destacam que o intelecto humano
que não é o próprio possest578 não pode entendê-lo, mesmo que
o possa vislumbrar de longe579. Em quinto lugar, João conclui
que todas as coisas devem ser negadas do possest, pois nada
do que pode ter um nome é o possest, tendo em vista que todo
o nominável pode ser o que não é580. Por último, gostaríamos
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de chamar a atenção para um questionamento de João e a
resposta cusana: como pode ser visto aquele que permanece
sempre invisível? O Deus invisível não pode ser visto natural-
mente por nenhum modo de ascensão, nem mesmo o mais alto,
exceto através de um enigma, no qual se alcança muito mais
uma possibilidade de ver que uma visão, e o que busca chega a
uma sombria escuridão. Assim, Nicolau considera que somente
poderia ser visto se a possibilidade de ser visto fosse atualizada
por aquele que é a atualidade de toda potência por meio de uma
manifestação de si mesmo. Tal automanifestação ocorreria em
Cristo que é o único revelador e que em si mesmo revela o Pai581.
É hora de se fazer um resumo daquilo que foi apresenta-
do e de mostrar o quanto se logrou da caminhada percorrida.
João e Bernardo o farão tanto retomando a discussão sobre o
possest como também apresentando os seus próprios enigmas.
Para João, o possest “é a forma mais verdadeira e mais adequada
de todas as coisas formáveis”, pois tudo aquilo que é somente é
enquanto pode ser. Olhando para tudo aquilo que é, portanto, 239
pode-se ver o poder, o ser e o nexo de ambos. O princípio trino,
que se vê em tudo aquilo que é, é necessário não somente para
que todas as coisas existam, mas também para que as coisas
sejam do melhor modo que possam ser. Se pudéssemos ver as
coisas ali onde elas são tão perfeitas a ponto de não poderem
ser mais perfeitas ainda, então veríamos o princípio unitrino
de todas as coisas, ou seja, o possest que é tudo aquilo que pode
ser582. Por sua vez, Bernardo busca interpretar o nexo a partir
do enigma do movimento. Assim, do poder e do ato procede
o movimento que, enquanto pode ser concebido e nomeado,
não é o movimento que é tudo o que pode ser, pois se poderia
dar um movimento mais rápido ou um movimento mais lento.
Porém, no movimento que é tudo o que pode ser deve coincidir
o poder e o ato de modo que esse movimento é em ato o que
pode ser. Contudo, tal movimento não pode ser nem concebido
nem nominado. Somente abandonando o movimento que pode
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ser concebido e nominado, assegura Bernardo, é que a mente
poderá se converter e, assim, contemplar o movimento que não
pode ser concebido. O caminho a ser percorrido para essa visão,
deixado já o que pode ser nominado, conceituado e conhecido
do movimento, não passa mais pelo nome, pelo conceito e pela
ciência, mas pela ignorância de tudo aquilo que se conhece
do movimento. A mente, portanto, ao ascender ao não-ser do
movimento, se aproxima mais do procurado, pois aqui se ofere-
ce o que está por cima do ser e do não-ser do movimento583.
O que se mostra é ignorado, pois está acima de todo nome.
Aqui a ignorância é ciência: onde o não-ser é necessidade de ser
e o nome de todas as coisas nomináveis é inefável.584 O caminho
que se deve percorrer, por isso, para ver o princípio invisível
e escondido passa pela consideração das coisas principiadas.
Porém, mesmo quando vemos necessariamente que no prin-
cípio unitrino perfeitíssimo o próprio poder é o ser e o nexo
de poder e ser e que o nexo perfeito seja o poder e o ser, não
compreendemos como isso acontece585. 240
João reconhece que são muitos os enigmas que nos podem
conduzir ao Deus desconhecido. No entanto, por considerar que
nas coisas mínimas o princípio reluz de modo máximo, toma
como enigma a palavra IN586. Demarca-se já inicialmente o cará-
ter trinitário de IN que “se compõe de três linhas iguais” e que
I e N “estão ligadas por um espírito de conexão”. Portanto, em
IN teríamos o I, depois o N e o nexo de ambas. Além disso, João
também considera que todas as letras seriam principiadas no I
que, enquanto princípio simples, é o princípio de todas as letras.
A relação entre a letra N e a letra simples I se fundaria no fato de
que N procede de I e, portanto, é a explicação de I. Assim, o nexo
de ambas parece ser muito natural e transparece até mesmo no
som, pois segundo João se a letra I é acrescentada a N não se
obteria outro som, pois a força do N já estava no I. Além disso,
o I seria o princípio e a N seria a sua primeira manifestação.587
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Apresentado o enigma é hora de provar a sua força.
Aplicado às coisas que possuem nome deve-se dizer que todas
as coisas que podem ser nomeadas não possuem nada que não
seja o IN e, assim, se IN não existisse elas não possuiriam nada
e seriam vazias. Assim, em todas as coisas nomeadas pode-se
contemplar o IN: na substância o IN substanciado, no céu
o IN celestial e assim por diante. Por isso, afirma João, o IN
está terminado no termo, é finito no fim e em outro é outro.
Por outro lado, quando se busca ver o IN antes de tudo aquilo
que possui nome, então se ver que o IN não é terminado, nem
é finito nem uma coisa de entre todas as coisas que podem ser
nominadas. Assim, qualquer coisa que é considerada no IN
entrou na inefabilidade. Por exemplo, o termo e o fim conside-
rados no IN já não são mais termo e fim, mas mudaram o nome
no seu oposto: o termo é in-termo ou não-termo. Porém, não
se deve buscar ver aqui a oposição entre termo e não-termo ou
entre finito e in-finito como uma oposição entre a afirmação e
a negação, pois o IN é mais que limite ou termo, ou seja, no IN o 241
limite não deixa de ser limite, o fim não deixa de ser fim nem o
termo deixa de ser termo, mas tudo aquilo que é no IN é de modo
mais elevado e, por isso, já não se chama com qualquer nome,
pois não é terminado por nenhum termo nem definido com qual-
quer palavra. Portanto, o IN complica em si mesmo a afirmação e
a negação, como se I fosse o sim e o N fosse o não588.
Por sua vez, Bernardo pretende apresentar um enigma
que se encontra no próprio possest e que indicaria a unidade
trina do princípio e mostraria tanto o poder, quanto o ser e
o nexo de ambos. No nome possest, Bernardo dirige a atenção
para a simples vogal E e a considera unitrina, pois a vogal E é
“a vogal do podEr, do sEr e do nExo de ambos”. Para que a vogal
simples E seja um enigma adequado da unitrinidade do prin-
cípio, ela deve fazer ver a distinção indistinta que configura a
mesma unitrindade fundante. Assim, Bernardo considera que,
enquanto E é a vogal do podEr, ela não se refere nem ao ser
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
OS NOMES DIVINOS COMO ENIGMAS CONDUZEM À UNITRINIDADE
DO PRINCÍPIO
nem ao nexo; enquanto é a vogal do sEr, não se refere nem ao
poder nem ao nexo, e, enquanto é a vogal do nExo, não se refere
nem ao poder nem ao ser. Porém, deve-se considerar que essas
relações que a consideração da vogal E mostra não se confudem
nela mesma e que cada uma é por si mesma perfeita e verda-
deira. Portanto, na relação vista por meio da vogal simples E,
não se vê três vogais ou três vocalidades diferentes, mas uma
simplicíssima e indivível vocalidade. O enigma da simples vogal
E, que é imprescindível para que o possest possa ser uma expres-
são significativa, mostra o modo como Deus, princípio unitrino,
está no mundo: o mundo que não é por si mesmo tem tudo o
que pode ser, o que é e o nexo de ambos do princípio unitrino589.
Um texto que em si mesmo mostra toda a força da scientia
aenigmatica não poderia se concluir também sem uma avaliação
do próprio uso do enigma590. Nicolau reconhece o enigma IN,
apresentado por João, como um enigma fecundo enquanto
conduz no espírito e enquanto é um enigma do espírito que
a tudo perscruta. Porém, apesar da sutileza do enigma, não 242
se deve esquecer que aquele que busca ver a Deus por meio
do enigma do IN é sufocado pela glória divina. Assim, o IN ou
qualquer nome que se observa e se compreende não é a luz que
ilumina a manifestação da incompreensibilidade da própria
deidade absoluta em si mesma. Para Nicolau de Cusa, o que qual-
quer nome que se atribui à infinitude diniva pretende mostrar
é a sua incompreensibilidade per supereminentiam.591 Por outro
lado, o enigma da simples vogal E apresentdo por Bernado é,
segundo Nicolau, um enigma apto para o propósito das discus-
sões que vêm sendo apresentadas. Porém, o Cardeal também
reconhece que não existe nenhum fim para os enigmas, pois,
como o enigma propõe mostrar a visão do infinito e absoluto
princípio, sempre poderá existir um enigma mais aproximado.
Nenhum enigma é o que pode ser592, nenhuma palavra humana
diz tudo o que pode ser dito do inefável e nenhum nome nomeia
o inominável. Assim, qualquer parte do percurso percorrido ou
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
OS NOMES DIVINOS COMO ENIGMAS CONDUZEM À UNITRINIDADE
DO PRINCÍPIO
qualquer parte do caminho trilhado em diereção ao infinito
permanecerá sempre muito aquém daquele que em si mesmo
é o que pode ser593.
243
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O caminho percorrido na “metafísica do inominável” indicou-
-nos que era a ideia de nexus e a concepção trinitária, relacio-
nal e dinâmica do princípio que fundavam a possibilidade de
compreendermos e de nomearmos o princípio inominável.
Contudo, isso não significava negar a transcendência e a distân-
cia do princípio com relação aos nossos modos de conhecer e de
dizer. Pelo contrário, a distância permanecia e era mantida pela
ideia de que a riqueza e a plenitude do princípio se mantinham
sempre além daquilo que podíamos saber e daquilo podíamos
dizer. Assim, aquele que em si mesmo funda toda possibilidade
de conhecer e de dizer é, por isso mesmo, incompreensível e
inominável para qualquer modo de dizer e de conhecer.
Por isso, recordávamos a partir do De coniecturis e, prin-
cipalmente a partir da metáfora do “muro do paraíso” no De
visione dei, que não podíamos identificar o alcançado pelo inte-
lecto com Deus em sua natureza simples. No entanto, a partir
dos capítulos XVII e XVIII do De visione dei, também indicávamos
que não se negava que a natureza racional pudesse conhecer e,
portanto, se unir a Deus, pois nesses capítulos Nicolau afirmava
que o amável e o inteligível da natureza divina eram o objeto da
vontade e do intelecto da natureza humana. Nicolau determina-
va com a ideia de “filiação” o nexo alcançado entre a natureza
humana e o amável e inteligível da natureza divina e também
mostrava que a filiação só podia ser alcançada pela mediação do
único mediador entre Deus e a natureza humana, ou seja, o Deus
filho “que é o inteligível e o mediador”. Daí Nicolau afirmar que
“passa no nexo” captar a Deus como deum receptibilem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Deus amável, inteligível e nomeável eram para Nicolau
a Palavra que se encarnava e também o logos ou razão de todas
as coisas na unidade eterna que se explicava e se mostrava
na criação. Assim, terminávamos por deduzir que o nexus era
o que permitia que, por meio do Cristo, Palavra encarnada, e
por meio da criação, que era concebida como a manifestação,
a aparição ou a revelação dessa mesma Palavra, se pudesse
“recuperar” o Deus que se esconde nessa exteriorização.
A nosso ver, portanto, o nexus abria a possibilidade para que
o homem pudesse começar a ver em que sentido a trindade
na unidade não implicava alteridade numérica, pois a união
eterna e infinita entre a unidade eterna e a igualdade eterna
fazia com que os três fossem uma única coisa. O nexus também
indicava a possibilidade da natureza humana amar, entender,
nomear e se unir à sabedoria eterna, pois essa era entendida
como a conexão essencial do amor amante e do amor amável,
do inteligente e do inteligível e, no De principio, como o nexo do
princípio inominável e do princípio nominável e do princípio 245
sem princípio e do princípio principiado. Assim, o nexus nos
indicava e nos conduzia à ideia de que podíamos captar e dizer
o sentido divino “recuperável” no mundo, no homem e também
em nossas palavras.
Entretanto, acreditávamos que essas ideias principais
da “metafísica do inominável” não encontrariam o seu pleno
sentido se previamente não estabelecêssemos o espaço inter-
pretativo a partir do qual precisaríamos considerá-las. Por isso,
nos dois primeiros capítulos de nosso trabalho, estabelecemos,
em primeiro lugar, o contexto geral de questionamento no qual
determinamos a relação de Nicolau de Cusa com o seu tempo
e com a tradição filosófico-teológica da qual era herdeiro;
em segundo lugar, questionamos se o nexus pensado como a
conexão eterna entre “o que é significado pelo nome e o nome
que significa”, que in divinis é um e o mesmo, não deveria ser
levado em consideração como fundamento da “metafísica do
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
inominável”. Por último, também determinamos, a partir da
relação entre a fé e o intelecto, pensada por meio da relação
dialética entre a complicatio e a explicatio, que filosofia e teologia
conformavam dialeticamente a especulação cusana.
Nos dois últimos capítulos, buscamos aprofundar,
primeiramente, a ideia de que, para Nicolau de Cusa, o prin-
cípio primeiro devia ser pensado como unitrino e que esse
mesmo princípio se mostrava trino no mundo e no homem.
Depois, consideramos que os nomes divinos, enquanto enigmas
do princípio, também mostravam como o mundo e como o
homem aquele mesmo princípio trino. Assim, inicialmente no
terceiro capítulo, mostramos que, para corresponder à ideia de
um princípio trino, a especulação cusana se nutriu do trinômio
unitas-aequalitas-conexio que Nicolau recebeu do neoplatonismo
cristão da Escola de Chartres. Em segundo lugar, para tentar
interpretar a concepção cusana de nexus, partimos do De
venatione sapientiae (1462). Retomar a discussão sobre o nexus
a partir desse texto se mostrou importante, tendo em vista 246
que o próprio Nicolau retomava a ideia de nexus ou conexio e a
considerava como um campo de caça ao lado de outros campos
como, por exemplo, a douta ignorância, o possest, o non-aliud.
Além disso, antes de tratar da conexio, o Cardeal trata nos
campos sexto e sétimo da unitas e da aequalitas, mostrando,
assim, que considerava o trinômio chartriano imprescindível
dentro da sua especulação anterior e como campo em que se
podia caçar a sabedoria eterna. Por último, recordávamos ainda
que Nicolau reconhecia que poucos filósofos conheceram o
princípio da conexão e afirmava ter dito e escrito muitas coisas
sobre o nexus e inclusive em vários sermões.
Tomamos em nossa pesquisa essas indicações do De
venatione sapientiae, especialmente, dos capítulos sobre o conexio
como um “repetir resumindo” o anteriormente conjecturado
sobre o nexus e, naturalmente, sobre a Trindade. Por isso, em
terceiro lugar, mostramos no terceiro capítulo que, para a
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
especulação cusana, o Máximo era necessariamente trino.
Partimos do primeiro livro do De docta ignorantia e, assim, acen-
tuamos que, para Nicolau de Cusa, o Máximo, enquanto escapava
à proporção que só era possível entre as coisas que admitiam
“um excedente e um excedido”, era infinito, coincidia com o
mínimo e era ao mesmo tempo incompreensível e inominável.
Além disso, a coincidência dos opostos, a afirmação do Máximo
como unidade infinita e necessidade absoluta, indicava a sua
transcendência com relação a tudo aquilo que se encontrava no
âmbito da oposição, ou seja, àquilo que era principiado e finito.
Havendo, pois, mostrado em que sentido o Máximo era uno e
necessário, era também imprescindível mostrar que ainda no
primeiro livro do De docta ignorantia, Nicolau pensava a unidade
como trina e una, a partir do conceito de eternidade, por meio
do trinômio chartriano unitas-aequalitas-conexio.
Por fim, retomamos a ideia, já afirmada com base no
De venatione sapientiae, de que todo existente imita a Trindade
enquanto dela recebe tudo quanto possui. Assim, em quarto 247
lugar, discutimos a partir do segundo livro do De docta ignorantia
a ideia cusana de universo. Nesse contexto, apontávamos que o
universo, enquanto, máximo contraído, imitava o quanto podia
o absoluto, pois recebia do Máximo absoluto tudo aquilo que
era. Esse princípio geral levou Nicolau de Cusa a concluir que o
afirmado no primeiro livro do De docta ignorantia e que convinha
de modo absoluto ao Máximo, conviria também ao máximo
contraído, mas contraidamente. Assim, a unidade e a trindade
que se afirmavam absolutamente do Máximo absoluto deveria
também convir ao universo, mas de modo contraído.
Em quinto lugar, a partir de uma introdução de Claudia
D’Amico ao Idiota. De mente, terminamos por considerar a
trindade da mente humana a partir do seu modo de operar.
Assim, recordávamos inicialmente que a relação entre o operar
da mens e o do princípio unitrino já aparecia, por exemplo,
no De coniecturis como tentativa de mostrar em que sentido
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
CONSIDERAÇÕES FINAIS
a mente era princípio das conjecturas. Além disso, também
lembrávamos que o Idiota. De sapientia I antecipava, em relação
ao Idiota. De mente, a ideia da mente como viva imago dei e que,
ao identificar a sabedoria com o Verbo, retomava a especulação
trinitária a partir dos termos unitas-aequalitas-conexio.
Como indicávamos, o nexus permitia que o homem
pudesse captar e dizer o sentido divino “recuperável” no
mundo, no homem e também em nossas palavras. Após indicar
como o máximo contraído e a mens imitavam a trindade do
princípio, passamos a considerar, então, no quarto e último
capítulo, a ideia de que os nomes divinos, enquanto enigmas,
também manifestavam o princípio unitrino. Começamos por
indicar que o De docta ignorantia apresentava as perspectivas a
partir das quais podíamos pensar a “metafísica do inominável”,
pois o princípio da douta ignorância impunha que podíamos
compreender de modo incompreensível e nomear de modo
inominável o princípio primeiro e absoluto. Por outro lado,
também recordávamos que Nicolau oferecia algumas indica- 248
ções mais precisas ao afirmar que, para se alcançar o sentido
do que dizia, era necessário elevar “o intelecto para lá da força
das palavras” e utilizar os exemplos como “guias, de modo
transcendente, abandonando as coisas sensíveis”, para que
se pudesse elevar “facilmente ao simples plano intelectual”.
Também, segundo o Cardeal, abandonada a via da razão, resta-
va ao intelecto ver “incompreensivelmente” que o Máximo
absoluto coincidiria com o mínimo. Porém, também advertia
que os termos “máximo e mínimo” não deveriam ser tomados
na sua acepção usual, mas como “termos transcendentes, com
um significado absoluto”. Por último, ao começar introduzir a
manuductio matemática, Nicolau apontava para a “investigação
simbólica” das coisas invisíveis, pois “todos os nossos doutores”
concordavam que “as coisas visíveis” eram “imagens do invi-
sível”. A partir daí, o Cardeal podia concluir que o criador de
todas as coisas podia ser visto como que “num espelho e por
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
enigmas”. Destacávamos, por isso, que a investigação simbó-
lica considerava que o mundo, o homem e também os nomes
manifestavam, enquanto enigmas, o princípio unitrino de todas
as coisas e que só podíamos dirigir o olhar para o que Nicolau
queria mostrar, se transcendêssemos o significado das palavras
e se tomássemos os exemplos naquilo que de fato são: guias
para o que transcende o nosso modo de conhecer e de dizer.
A ideia de que poderíamos ascender ao conhecimento das
coisas divinas, eternas e invisíveis por meio das coisas visíveis,
enquanto imagens verdadeiras do invisível, já aparecia no De
docta ignorantia, como vimos acima, mas também era um tema
recorrente na grande maioria das obras de Nicolau de Cusa.
Considerávamos essa busca por meio das coisas visíveis, cujo
conhecimento alcançado era um conhecimento per speculum
in aenigmate, como uma investigação simbólica ou enigmática.
Depois do De docta ignorantia, essa temática será repetida em
outras obras. Somente no De beryllo, porém, texto de 1458, é que
Nicolau iria abordar de maneira mais sistemática o que chama 249
de aenigmatica scientia. A intenção de Nicolau de Cusa nesse texto
era a de expor ao leitor a compreensão do seu pensamento, cujo
princípio fundamental é a coincidentia oppositorum, por meio de
um berilo intelectual.
A aenigmatica scientia corresponderia a medir a verdade
por meio de uma imagem, de tal forma que o homem poderia
medir o próprio intelecto por meio da potência das suas
obras e da mesma forma também mediria o intelecto divino.
Porém, a partir de uma visão mais penetrante, o homem via
que o enigma era enigma da verdade e sabia que a verdade não
era afigurada em nenhum enigma. O fundamento da aenig-
matica scientia era a concepção intelectual e expressionista do
princípio primeiro. Para Nicolau, uno era o princípio primeiro
e, segundo Anaxágoras, chamava-se intelecto e todas as coisas
dele procediam para manifestá-lo. Consequentemente, tendo
em vista que o intelecto criador se colocava a si mesmo como
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
fim das suas próprias obras para manifestar a sua glória, esse
criava as substâncias cognoscitivas com a capacidade de verem
a sua verdade e também a essas se oferecia visível no modo com
o qual essas seriam capazes de compreendê-lo.
Depois do De beryllo, recordamos que o problema da
inominabilidade e também da trindade do princípio divino foi
retomado e apreciado por Nicolau de Cusa tanto no De aequa-
litate quanto no De principio. Contudo, antes de pensarmos
em que sentido o possest era o nome divino que em si mesmo
indicava tanto o nexus quanto a trindade daquele mesmo
princípio, pareceu-nos significativo mostrar como também
no De li non aliud a ideia de trindade e de enigma transparecia
na concepção cusana do princípio como Não-outro. Assim,
recordamos que o Não-outro como definição que define a
si mesma e a todas as coisas também dirigia a especulação
para a compreensão do princípio como trindade. A trindade
do princípio primeiro significado por Não-outro se mostrava
quando intensamente fixávamos a atenção no fato de que o 250
Não-outro define a si mesmo. O definir-se a si mesmo impli-
cava um movimento pelo qual o Não-outro sai de si mesmo e
retorna a si mesmo, mas sem nenhuma exteriorização e sem
necessidade de nada outro para se definir.
O caminho percorrido nos conduziu à compreensão do
princípio como unitrino e nos indicou que sobre o fundamento
da trindade poderíamos ver o princípio que se conhece a si
mesmo por meio do seu Verbo e que, por meio desse mesmo
Verbo, se exterioriza na criação. Contudo, o movimento do
princípio sem princípio para o princípio a partir do princípio
foi determinado como o nexus entre ambos. Esse mesmo nexus
possibilitava que o amante pudesse ser amado no amável, que
o inteligente pudesse ser entendido no inteligível e que o prin-
cípio inominável pudesse ser nomeado no princípio nominável,
pois sugeríamos com Nicolau, que o objeto da vontade era
o amor amável e do intelecto era o inteligível e o nominável.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim, como todo o principiado ou causado tem tudo o que é
do princípio e da sua causa, de algum modo imita, portanto,
o quanto pode o seu princípio simples. Vimos que o universo,
enquanto máximo contraído, imitava contraidamente a unidade
e a trindade do princípio unitrino. Além disso, também consi-
derávamos que a mente, enquanto imagem de Deus, imitava a
trindade do princípio no seu dinâmico operar que se mostrava
no seu posse assimilare, no posse assimilari e no nexus de ambos.
Esperamos, portanto, ter alcançado com o possest aquele nome
que, como os outros nomes divinos, conduzem à compreensão
do princípio. Nesse caso, de modo mais específico, acreditamos
que o possest, enquanto enigma, mostra em si mesmo o nexus e
conduz o que especula à trindade do princípio.
A ideia de nexus pensada por meio da concepção trina
e, portanto, relacional do princípio conduz a uma visão dinâ-
mica do princípio, do universo e do homem. Na eternidade
simples, a conexio ou o nexus eram entendidos como a eterna
indivisibilidade de unidade e igualdade do princípio fundante 251
que delas procedia. Também para o Cardeal de Cusa, porém, a
conexio era o nexus amorosus do poder que une o que no poder
ser feito de todas as coisas permaneceria confuso, possibili-
tando a beleza de tudo que vem a ser. Por isso, todo existente,
enquanto possui tudo o que é da Trindade divina, imita essa
mesma Trindade. Assim, visto nos entes finitos, o nexo era
conjecturado como o algo que mantinha as coisas no seu ser,
conservando-as para que elas pudessem ser e não deixassem
de ser, mas também as conectava com a totalidade do mundo.
Portanto, sem o nexo que une não teríamos um universo,
mas um caos de multiplicidade, alteridade, desigualdade e,
portanto, de divisão. Também recordávamos que, para Nicolau
de Cusa, era esse mesmo espírito de conexão que unia a alma
ao corpo vivificando-os; e, no caso da natureza intelectual, o
nexo não somente a mantinha e a conservava, mas a adaptava
para que ela pudesse se unir àquilo que ela naturalmente
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
amava, ou seja, a sabedoria eterna. Dessa forma, como para
o Cardeal o entender do intelecto finito vivia da sabedoria
eterna, por conseguinte também concluía que o nexo entre o
inteligente e o inteligível do intelecto não se expirava jamais.
Assim sendo, igualmente podíamos concluir que, sem o nexo,
não teríamos o entender do intelecto, pois o inteligente estaria
sempre separado e afastado do inteligível. Sem o nexo, não
teríamos o amar, mas o amante e o amado estariam sempre
afastados. Sem o nexo, não teríamos o desejar, mas o que
deseja e o desejado estariam sempre afastados. Sem o nexo,
não teríamos o nomear, pois o que é significado pelo nome e o
nome que significa estariam sempre afastados.
252
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
1 De beryllo, h. XI1, n. 42, p. 48-49.
2 GADAMER, H-G. Nicolás de Cusa y la Filosofía del Presente, in: Folia
humanística 2 (1964), p. 929-937 (tradução nossa). Para André, se essas
palavras de Gadamer “exprimem bem o esquecimento a que o autor foi
votado ao longo de quatro séculos, não podem deixar de nos remeter,
simultaneamente, para a presença de Nicolau de Cusa entre os seus
contemporêneos.” (1997, p. 22).
3 André (Ibid., p. 21) aponta “como balanços críticos mais importantes
das interpretações de Nicolau de Cusa” os seguintes trabalhos: J. RITTER,
“Die Stellung des Nicolaus Von Cues in der Philosophiegeschichte.
Grundsätzliche Probleme der neueren Cusanus-Forschung”, Blätter für
Deutsche Philosophie, XIII (1939), 111-155; K. JAKOBI, Die Methode der
cusanischen Philosophie, München, Karl Alber, 1960, 35-129. Por outro
lado, o texto mais importante que recolhe o repertório bibliográfico do que
havia sido publicado até a segunda década do século XX é sem dúvida o
trabalho de Vansteenberghe (Paris, 1920/ Frankfurt am Maim, Minerva,
1963); considere-se de modo especial e essencial as diversas publicações
do Cusanus-Bibliographie nos Mitteilungen und Forschungsbeiträge der Cusanus-
Gesellschaft: H. KLEIN. e R. DANZER. “Cusanus-Bilbiographie (1920-1961)”,
Mitteilungen und Forschungsbeiträge der Cusanus-Gesellschaft, 1
(1961), p. 95-126; R. DANZER. “Cusanus-Bilbiographie, Fortsetzung (1961-
1964) und Nachträge”, Mitteilungen und Forschungsbeiträge der
Cusanus-Gesellschaft, 3 (1963), p. 223-237; W. TRAUT. e M. ZACHER.
“Cusanus-Bilbiographie, 2. Fortsetzung (1964-1967) und Nachträge”,
Mitteilungen und Forschungsbeiträge der Cusanus-Gesellschaft, 6
(1967), p. 178-202; M. VASQUEZ. “Cusanus-Bilbiographie, 3. Fortsetzung
(1967-1963) mit Ergänzungen”, Mitteilungen und Forschungsbeiträge
der Cusanus-Gesellschaft, 10 (1973), p. 207-234; A. KAISER. “Cusanus-
Bilbiographie, 4. Fortsetzung (1972-1982) mit Ergänzungen”, Mitteilungen
und Forschungsbeiträge der Cusanus-Gesellschaft, 15 1982), p. 121-147.
Não podemos esquecer os repertórios bibliográficos disponíveis em diversos
sítios. Entre os principais destacamos: “Cusanus-Bibliographie” disponível
na página ; e o “Supplementary
Cusanus-Bibliography” disponívle em: .
NOTAS
4 A história da interpretação do pensamento de Nicolau de Cusa é articulada
por André (Ibid., p. 22-44) em dois momentos: 1. O esquecimento de um
pensador; 2. A recuperação de um pensador. No que se refere especificamente
ao segundo momento, o autor falará de quatro etapas: “A primeira etapa,
[...], corresponde à redescoberta deste autor e à renovação do interesse
pelos estudos cusanos a partir do movimento neotomista do século passado
[leia-se século XIX]” (Ibid., p. 31); “A segunda etapa tem início com a
descoberta de Nicolau de Cusa pelos neokantianos no princípio deste século
[leia-se século XX]. Referimo-nos nomeadamente às interpretações de E.
Cassirer e do seu discípulo J. Ritter. A eles se deve, por um lado, o mérito de
resgatar o pensamento de Nicolau de Cusa da polêmica teísmo-panteísmo
e transcendência-imanência divinas e, por outro lado, a abertura do seu
pensamento para a filosofia moderna, com o intuito de nele detectar traços
prefiguradores dessa mesma filosofia” (Ibid., p. 34-35); a terceira etapa é
“o início da publicação da edição crítica das suas [de Nicolau de Cusa]
obras no âmbito da Academia de Heidelberg, em 1932, com a apresentação
do De docta ignorantia sob o cuidado de E. Hoffmann e R. Klibansky” (Ibid.,
p. 36); a quarta etapa “[...] é marcada por dois acontecimentos extremamente
decisivos para a investigação da sua obra. O primeiro foi a fundação da
‘Gesellschaft für Cusanusforschung’ em agosto de 1960 [...]. Complemento
importante da fundação desta sociedade foi a criação do ‘Institut für
Cusanusforschung’, no primeiro ano da sua existência, na Universidade de
Mainz, posteriormente transferido para Trier, onde ainda hoje funciona em
ligação com a Faculdade de Teologia Católica. O segundo acontecimento foi a 254
comemoração do quinto centenário da morte do Cardeal, em 1964, com dois
momentos altamente significativos: os congressos realizados nesse mesmo
ano, o primeiro em Bernkastel-Kues, de 8 a 12 de Agosto, e o segundo em
Bressanone, de 6 a 10 de Setembro” (Ibid., p. 40).
5 CASSIRER, Ernst. Nicolás de Cusa. In: ______. El problema del
conocimiento en la filosofía y en las ciencias modernas. I, Trad. Esp.,
Buenos Aires, Fondo de Cultura Económica, 1953, cap. I, p. 65-97. Muitos
são os intérpretes da filosofia cusana que consideram Cassirer e a escola
neokantiana como os principais promotores do surgimento do interesse por
Nicolau de Cusa no século XX. Cf. LONGO, Mario. “Presagio” di modernità:
August Heinrich Ritter interprete di Niccolò Cusano. In: PIAIA, Gregorio (a
cura di). Concordia Discors: studi su Niccolò Cusano e l’umanesimo europeo
offerti a Giovanni Santinello. Padova: Editrice Antenore, 1993, p. 309-330:
ele afirma que “fino alla metà dell’Ottocento il Cusano è appena ricordato
dagli storici della filosofia o talvolta del tutto dimenticato. Successivamente,
soprattuto in seguito all’interesse che si è sviluppato all’interno della
scuola neokatiana, da Hermann Cohen a Ernest Cassirer, il filosofo di Cues è
venuto occupando uno spazio sempre maggiore nel contexto della filosofia
moderna, fino ad assumere il ruolo di uno dei suoi principali promotori”.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Ainda segundo Longo, “All’inizio di questo processo di rivalutazione si
trova la Geschichte der Philosophie di August Heinrich Ritter, la quale, alla
metà del secolo scorso [1850], modificò radicalmente il quadro storiografico
relativo alla formazione del pensiero moderno, inserendo come precursore
e ‘presagio’ di esso la figura del Cusano” (p. 310-311).
6 Cassirer (2001, p. 16-17) esclarecerá que “[...] o conceito e a imagem geral
de universo escalonado” e, portanto, dividido entre inferior e superior,
entre sensível e inteligível, que se negam mutuamente, ao mesmo tempo
em que exigem uma “mediação” nunca foi contestada por Nicolau de Cusa.
Entretanto, ele afirma que “[...], as primeiras considerações do De docta
ignorantia deixam entrever um pensamento que aponta para uma orientação
intelectual inteiramente nova. Também neste caso, o ponto de partida é a
oposição entre o ser do absoluto e o do empiricamente condicionado, do
infinito e do finito. Tal oposição, contudo, não mais é colocada de forma
simplesmente dogmática, mas deve ser compreendida em toda a sua
profundidade, deve ser entendida a partir das condições do conhecimento
humano. Esta atitude diante do problema do conhecimento caracteriza Nicolau
de Cusa como o primeiro pensador moderno. Seu primeiro trabalho consiste
em um questionamento que ele faz não apenas sobre Deus, mas também
sobre a possibilidade de se conhecer Deus” (Ibid., p. 18).
7 De visione Dei. h. VI. cap. XVI, n. 67, p. 55-56, linhas 10-15: Multo enim
maiori gaudio perfunditur ille, qui reperit thesaurum talem, quem scit penitus
innumerabilem et infinitum, quam qui reperit numerabilem et finitum. Hinc 255
haec sacratissima ignorantia magnitudinis tuae est pascentia intellectus mei
desiderabilissima, maxime quando talem reperio thesaurum in meo agro, ita quod
thesaurus sit meus. (A visão de Deus. cap. XVI, p. 194).
8 Cf. CASSIRER, op. cit., p. 69: “Nicolau de Cusa postula um sujeito concreto
como ponto central e de partida para toda a atividade verdadeiramente
criadora. E esse sujeito não pode se manifestar senão no espírito do homem. É
só desse ponto de vista que resulta uma nova virada na teoria do conhecimento”.
9 A moderna teoria do conhecimento, que teria início com Descartes e
encontrará em Kant a sua formulação mais exata.
10 Cf. Volkmann-Schluck (1993, p. 25): “[...] dal pensiero che si volge al di
fuori all’assere come unità infinita risulta per contraccolpo um ritorno
dell’uomo su se stesso, che diventa la fine del pensiero medievale e prepara
indirettamente Il modo di pensare moderno”. Este evento continuará,
dentro do âmbito histórico moderno, com Descartes, Kant até a viragem da
metafísica contra ela mesma feito por Nietzsche.
11 SANTINELLO, Gionvanni. Prefazione. In: VOLKMANN-SCHLUCK, Karl-
Heinz. Nicolò Cusano: la filosofia nel trapasso dal medioevo all’età
moderna. A cura di Giovanni Santinello. Trad. Umberto Proch. Brescia:
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Editrice Morcelliana, 1993, p. 7-15.
12 As ideias fundamentais do Renascimento são assim resumidas por
Volkmann-Schluck (Ibid., p. 220): “La collocazione centrale dell’uomo nel
mondo, la trasformazione del sapere e del conoscere nell’agire dell’uomo
che costituisce l’unità, il predominio dell’ars e la trasformazione dell’opera
d’arte in quella figurativa si compenetrano neel’unico processo metafisico
di fondo”. Ele também afirma que tanto o sentido da palavra Renascimento
como a nova posição de fundo do homem expressas nele, estão expressas
tanto na Oratio de hominis dignitate de Pico della Mirandola que o autor
aproxima da discussão Cusana do homem como medida de todas as coisas
presentes no De beryllo.
13 Nas páginas que se seguem, o autor procurará determinar com exatidão
a ideia de mathesis universalis em Descartes (Ibid., p. 227-235). No último
capítulo (Ibid., p. 248-261) desta quinta parte, o autor irá apontar “il
cambiamento della aenigmatica scientia in mathesis universalis” e recorda
traços fundamentais da história da metafísica. Desde Platão, segundo o
autor, “il pensiero cerca e trova l’essere in un fondamento incondizionato”
(Ibid., p. 248). A história da metafísica segue com a metafísica cristã de
Agostinho e no seu termo está Nicolau de Cusa. O próximo passo dessa
história é dado por Descartes com a certeza fundada no cogito ergo sum e
a consequente mathesis universalis. Depois aparecerá o giro transcendental
do pensamento operado por Kant e lhe segue o idealismo alemão de Fichte,
Schelling e Hegel. 256
14 Cf. VOLKMANN-SCHLUCK, Karl-Heinz. La filosofía de Nicolás de Cusa: Una
forma previa de la metafísica moderna. In: Revista de Filosofía, 17 (1958),
Madrid, p. 437-458.
15 João Maria André, na “Introdução” ao De docta ignorantia, afirma que no
primeiro livro dessa obra, “a pretexto do saber de Deus, se opera uma inflexão
para o saber do próprio saber” e daí que o pensamento de Nicolau de Cusa
foi considerado “uma forma prévia da metafísica moderna”. Entretanto, ele
acredita que “a leitura de um autor, quando demasiado condicionada pelo
pensamento de outros autores posteriores, poderá sacrificar elementos que
constituem verdadeiramente a sua especificidade, a sua originalidade e a
sua radicalidade” (“Introdução”, 2008, p. XIII).
16 Cf. ANDRÉ, João Maria. Nicolau de Cusa e a Crise de Sentido do Discurso
Filosófico. In: Tradição e Crise I. Faculdade de Letras. Coimbra, 1986, p. 367-413.
17 Como veremos mais abaixo, essa posição o levará a apontar o fato de que
a filosofia da linguagem sobredetermina toda a filosofia cusana.
18 Contrariamente a essa posição deve-se citar o seguinte texto: MEUTHEN,
Erich. Nikolaus von Kues 1401-1464: Skizze einer Biographie. 7ª ed.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Münster: Aschendorff, 1992.
19 Cf. ANDRÉ, João Maria. O problema da linguagem no pensamento
filosófico-teológico de Nicolau de Cusa. In: Revista Filosófica de Coimbra
– n. 4 – v. 2, 1993, p. 369-402. André afirma que “os séculos XIV e XV,
enquanto momentos de transição da Idade Média para o Renascimento e
para a Idade Moderna, têm sido caracterizados, pela visão historiográfico-
filosófica clássica, como período de crise: neles se terá desmoronado e
fragmentado a “Weltanschauung” medieval e se terão aberto as portas para
uma nova visão do mundo mais secular, emancipada e, consequentemente,
mais genuinamente filosófica no enfrentamento de problemas cuja
solução anterior dificilmente se libertava dos contornos teológicos
que configuravam toda a reflexão medieval. Não afirmamos que tal
caracterização seja totalmente desprovida de sentido. [...]. Isso não impede,
no entanto, que em tais momentos de crise floresçam intuições filosóficas
profundamente inovadoras e especulativamente fecundas que superam a
vacuidade conceitual do seu tempo em sínteses que cruzam as heranças
do passado com lampejos de um futuro fulgurantemente adivinhando em
veredas tantas vezes perdidas no labirinto da história e do tempo” (p. 369).
Cf. também: ARIAS MUÑOZ, J. Adolfo. La Razón y su sentido en Nicolás de
Cusa (Reflexiones en torno a la distinción cusana entre la Ratio-Grund y la
Ratio-Mensura y su significado en la caracterización de la nueva “Dignitas
Hominis”). In: Anales del Seminario de Hist. de la Filosofía, vol. III. Ed.
Univ. Compl. Madrid, 1982-83, p. 95-123: “El cardenal de Cusa, filósofo de la 257
modernidad, no deja de ser un pensador medieval, al menos en el marco de
su problemática filosófica. De ahí que parezca razonable la caracterización
de Nicolás de Cusa como un ‘pensador de la Crisis’ y de ningún modo un
‘filósofo de la ruptura’. La problemática medieval es asumida por Cusa
como una ‘tradición’, en el sentido que Heidegger y Gadamer otorgan a
este término, pero la aborda con una nueva metodología que tendrá una
relevante importancia no sólo en el marco renacentistas en estricto sentido,
sino también en los períodos racionalistas y románticos de la metafísica
occidental” (p. 96).
20 D’AMICO, Claudia. Indentidad en la alteridad. La doctrina de la esencia
única en De docta ignorantia de Nicolás de Cusa. In: Scintilla. Revista de
Filosofia e mística medieval. vol. 4 – nº1 – jan./jun. 2007; p. 23-39.
21 CUOZZO, Gianluca. Mystice videre: esperienza religiosa e pensiero
speculativo in Cusano. Torino/Itália: Trauben Edizione, 2002. Centro Studi
Luigi Pareyson – Biblioteca di Filosofia.
22 BEIERWALTES, Werner. Cusanus. Reflexión metafísica y espiritualidad.
Traducción de Alberto Ciria. Pamplona: Eunsa, 2005.
23 Como conclusão deste percurso, no qual se pensa a inovação da
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
especulação cusana em relação à tradição, por exemplo, a partir da ideia
do uno e rejeitando as “metáforas” que visam a modernizar o pensamento
cusano Beierwaltes (Ibid., p. 66) conclui: “El Cusano no representa un
‘otoño de la Edad Media’ que muera en un invierno que rechaza de sí su
pensamiento, pero tampoco una primavera de la modernidad que irrumpa
súbitamente. Más bien, como sobre todo tiene que parecernos a nosotros,
considerándolo retrospectivamente, representa un productivo ‘interludio
de las épocas’, que reflexiona cuidadosamente sobre la tradición y que al
mismo tiempo la prosigue determinando, una irrupción, que se realiza
desde raíces profundas en lo antiguo pensado críticamente hasta el fondo
y asimilado aprobatoriamente, hacia nuevos campos y modos de proceder
de un pensamiento que se hace cada vez más consciente de sí mismo como
nuevo y distinto”.
24 Cf. GONZÁLEZ RÍOS, José. Metafísica de la palabra. El problema del
lenguaje en el pensamiento de Nicolás de Cusa (1401 – 1464). Directora:
Profa. Dra. Claudia D’Amico; Co-director: Prof. Dr. Klaus Reinhardt. Buenos
Aires: Universidad de Buenos Aires – Facultad de Filosofía y Letras, Febrero
de 2010 (Tese de doutorado). Para González Ríos (p. 46) tanto os sermões
quanto os outros escritos do Cusano dão “un continuo testimonio del fecundo
diálogo abierto por el Cusano con las tradiciones filosóficas y teológicas
que convergen y concuerdan en su pensamiento, sus marginalia ponen de
manifiesto la asimilación productiva de aquéllas, toda vez que se trata de las
anotaciones que Nicolás de Cusa realizó con su propia mano a muchos de los 258
textos que leyó y estudió. Entre ellos, cabe hacer mención de los marginalia
a la Respublica de Platón, a la Metaphysica de Aristóteles en la traducción de
Bessarion, a la Theologia Platonis, a la Elementatio Theologica y a la Expositio
in Parmenidem Platonis de Proclo, al Comentario de Alberto Magno al corpus
dionysiacum en la traducción de Sarraceno, al Libro Primero del Periphyseon,
a varias de las obras y comentarios del Maestro Eckhart y a diversas obras
de Raimundo Lullio contenidas en el Codex Cusanus 83”. Conferir também:
ANDRÉ, João Maria. Conocer es dialogar. Las metáforas del conocimiento y su
dimensión dialógica en el pensamiento de Nicolás de Cusa. In: MACHETTA,
Jorge M. D’AMICO, Claudia. (Editores). El problema del conocimiento en
Nicolás de Cusa: genealogía y proyección. Buenos Aires: Biblos, 2005, p.
15-38. No contexto da relação de Nicolau de Cusa com a tradição, o autor
reconhece que “Su inspiración más evidente es la del platonismo y del
neoplatonismo, pero sería una reducción classificarlo historiográficamente
sólo como un esponente del neoplatonismo renascentista”. Justifica a sua
posição argumentando que, na obra cusana, vamos encontrar “un cruce”
de inspirações (platônicas e aristotélicas) e de escolas (Escola de Chartres,
tomismo, Pseudo-Dioníso, hermetismo) diversas (p. 17).
25 Retomaremos posteriormente essa discussão.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
26 Cf. PEREIRA, Miguel Baptista. Prefácio. In: NICOLAU DE CUSA. A visão
de Deus. Tradução e introdução de João Maria André; prefácio de Miguel
Baptista Pereira. 3ª ed. Lisboa/Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian,
2010, 1-78: “Desenraizado da tradição neoplatônica e do legado teológico
cristão, Nicolau de Cusa torna-se presa indefesa de uma redução apressada
à Metafísica da Subjetividade Moderna em que a razão, demitindo-se de
transcender a própria Metafísica, seculariza a diferença da criação e o
diferir trinitário e termina na produção sartriana do olhar da objetivação
total só possível no Niilismo europeu. Pensando após a distinção entre
filosofia e teologia defendida por Tomás de Aquino e a teologia mística de
Mestre Eckhart, Nicolau de Cusa constrói uma filosofia na Teologia, em que
o modelo da razão é extático, circular e dialético e sempre aberto sobre o
mistério do Inefável e do Indizível, [...]” (2010, p. 66-67). Cf. também: André
(1997, p. 65-76). Por exemplo, na página 66 ele afirma que em Nicolau de
Cusa “a filosofia é um caminho para o saber de Deus e o saber de Deus um
caminho para a filosofia”.
27 González Ríos (Op. cit., p. 13) reconhece que existe um consenso estabelecido
entre os diversos especialistas do pensamento cusano que se debruçaram
sobre o problema da linguagem. Segundo ele, Donald Duclow, Hans-Georg
Senger, João Maria André y Jan Bernd Elpert, entre outros, afirmam, que
“[…] en la teología especulativa de Nicolás de Cusa no se encuentra
una filosofía del lenguaje en sentido sistemático.” João Maria André
(1997: 585) afirma que “aquilo que encontramos nos seus textos são 259
referências relativamente marginais, ora articuladas com o desenvolvimento
da Teologia do Verbo, ora integradas numa reflexão sobre a criação, ora
dependentes de uma reflexão sobre o conhecimento e seus limites. É, todavia,
incontestável a importância que a linguagem assume no contexto de todo o
seu pensamento, nomeadamente na metafísica da mente sobredeterminada
por uma metafísica do sentido”. E, embora reconheça a dificuldade para
justificar tal ausência, apresenta três motivos: por a linguagem ser concebida
a partir da inefabilidade do Verbo; pelo carácter simbólico da linguagem e,
por último, não seria fácil articular os traços gerais da sua concepção de
linguagem com as teorias linguísticas mais desenvolvidas no seu tempo, por
exemplo, o nominalismo (Ibid., p. 586).
28 Cf. González Ríos (2010, p. 65-67) para as fontes cusanas da doutrina do
Verbo antes de 1440.
29 Cf. Ibid., p. 89: “Claros ejemplos de estos términos intelectuales constituyen
los nombres divinos enigmáticos propuestos por el Cusano: “idem absolutum”,
“possest”, “non aliud” y “posse ipsum”, entre otros.
30 Cf. Ibid., p. 79: “Pero aun cuando el principio de la docta ignorantia, según
el cual se busca abrazar lo incomprensible, esto es, la máxima y mínima
igualdad o Verbo divino, de modo incomprensible, es decir, de modo
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
intelectual [intellectualiter] a la luz de la coincidentia oppositorum, es sostenido
y expresado de modo variado e incesante por el Cusano en las obras y
sermones ulteriores, no puede dejar de señalarse, en este punto, el decisivo
aporte y el desafío que ofrece a la doctrina cusana el De coniecturis. Pues allí,
en el contexto de la exposición de la metafísica del conocimiento humano
a través de la mente, presenta la tentativa de concebir al Verbo divino más
allá de la coincidencia de los opuestos, i.e. como el principio de la relación de los
opuestos en lo absoluto”. Posteriormente ele retoma essa posição: “[…] los
distintos nombres divinos o enigmáticos ofrecidos por el Cusano en sus varias
obras posteriores a De coniecturis para significar de modo conjectural aquella
primera negación pura proceden de la unidad del intelecto y se despliegan,
explicitan, en el ámbito de la tercera unidad, es decir, en la razón, pues
todo nombre, como tantas veces lo ha repetido el Cusano procede de un
movimiento de la razón. Pero los nombres enigmáticos, en los que toda
oposición busca ser suprimida, tienden a abrazar inalcanzablemente
lo inalcanzable, esto es, aquel inexpresable lenguaje divinal en el que se
alcanzaría no sólo el principio de la oposición de los opuestos sino también
el principio simple de la coincidencia de los opuestos” (Ibid., 189).
31 CASARELLA, Peter J. Nicholas of Cusa’s Theology of the Word. 465 p.;
Tese (Doutorado em Filosofia) – Faculty of the Graduate School of Yale
University, 1992.
32 Casarella (Op. cit., p. 213, nota 5) refere-se aqui a Idiota. De sapientia.
h. V. Liber secudus, n. 29, p. 60, linha 18: IDIOTA: “Omnis quaestio de deo 260
praesupponit quaesitum” (para o texto latino cf.: NICOLAI DE CUSA. Idiota.
De sapientia. In: Opera omnia. Iussu et auctoritate Academiae Litterarum
Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. V. Hamburg: Felix Meiner,
1983, p. 2-80). O Compendium, obra escrita em 1464, é o último texto visitado
por Casarella. A controvérsia que inspira os comentadores dessa obra gira
em torno da relação de Nicolau de Cusa com o nominalismo. A posição de
Casarella (1992) é a de que, com a sua teoria dos signos, Nicolau de Cusa se
move não somente para além do realismo, mas também do nominalismo
e da coincidência de ambos. Segundo ele, o Compendium não oferece bases
para se afirmar nem um nominalismo estrito nem também um realismo
que Heymericus, adversário Tomista, defendia em Colônia. Entretanto,
ele também reconhece que, quando comparamos o Compendium com os
primeiros sermões, Nicolau de Cusa parece impregnado de nominalismo.
Ele cita uma máxima aristotélica que teria sido anotada pelo Cusano quando
preparava o Sermão XX em 1439 ou 1440: “As palavras são sinais das coisas
que existem na alma”. Já no Compendium, a relação natural entre as palavras
e os signos parece, pelo menos, provisoriamente rompida. Casarella chama
a atenção para os signa signorum, ou seja, os signos que residiriam na
imaginação e que seriam signos dos signos sensíveis. Assim, introduzindo
um reino intermediário de signos, o Compendium romperia aquela unidade
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
hilemórfica entre nome e coisa exposta no Idiota. De mente.
33 Além dos diversos aspectos sobre a filosofia da linguagem no pensamento
cusano retomados por João Maria André em seu Sentido, simbolismo e
interpretação no discurso filosófico de Nicolau de Cusa (1997), ele dedica
dois artigos ao problema específico da linguagem em Nicolau de Cusa: o
já citado “O problema da linguagem no pensamento filosófico-teológico
de Nicolau de Cusa” (1993) e “Nicolau de Cusa e a força da palavra” (In:
Revista Filosófica de Coimbra – nº 29 (2006a); p. 3-32). Neste último artigo,
o autor esclarece que “o que está em causa [neste artigo] é efetivamente o
problema da linguagem no pensamento de Nicolau de Cusa e a consciência
da sua importância para a concepção do próprio homem não apenas numa
perspectiva horizontal, mas também numa perspectiva vertical, cruzando
assim o plano da transcendência com o plano da imanência e obrigando
a aprofundar, no plano da imanência, tanto a relação das palavras com
o pensamento, como a relação das palavras com as coisas, como ainda,
e sobretudo, a relação dos homens entre si através das palavras. Mas ao
designarmos este conjunto de reflexões com a expressão ‘força da palavra’,
pretendemos chamar a atenção para o que entendemos ser específico do
pensamento desse autor e não propriamente para uma eventual ‘filosofia
da linguagem’ cujos traços essenciais alguns conseguem descobrir no seu
discurso, que outros considerarão verdadeiramente antecipador de futuras
teorias da linguagem, mas que não poucos recusam ver já aí sistematicamente
formulada. Mais do que registar no seu texto a constituição do que mais 261
tarde se poderá designar com essa expressão e sem negarmos a possibilidade
e a legitimidade de, com Nicolau de Cusa e a partir dele, se pensar para além
dele, preferimos neste caso mover-nos exclusivamente no âmbito do seu
discurso, ou, dobrando significativamente o título desta lição, respeitar e
assimilar a força das suas palavras” (p. 4).
34 Cf. BEIERWALTES, Werner. Identità e Differenza. Traduzione di Salvatore
Saini; Introduzione di Adriano Bausola. Milano/Itália: Vita e Pensiero, 1989.
Beierwaltes reconhece, por sua vez, que não ajuda muito identificar a
metafísica cusana como uma metafísica da unidade ou como uma metafísica
do ser, tendo em vista que “[...] l’unità trinitaria è l’unico nesso di tutti i
diversi aspetti del principio che si manisfestano nei diversi nomi, appare
di poco aiuto voler determinare il pensiero di Cusano come ‘metafisica
dell’unità’ (‘metafisica dall’alto’) a differenza di una ‘metafísica dell’essere’
(‘metafisica dal basso). Nonostante il legame con l’interpretazione
neoplatonica del Parmenide, il concetto cusaniano di unità è identico a quello
di essere assoluto. L’essere assoluto dell’Uno trinitario realizza il postulato
neoplatonico, secondo il quale il principio deve essere sopra l’essere: come
essere assoluto, esso è proprio sopra o prima della differenza di essere e non-
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
essere” (p. 167).
35 Por outro lado, ele reconhece que essa ideia não é totalmente nova, mas,
embora já tenha sido anteriormente intuída por Cassirer, não havia ainda
sido desenvolvida por nenhum intérprete do pensamento cusano. Segundo
João Maria André (1997, p. 126), Cassirer, no artigo “Die Bedeutung des
Sprachproblems für die Entstehung der neuren Philosophie” (O significado
do problema da linguagem para o surgimento da filosofia moderna) de 1927,
“adianta uma intuição, plena de fecundidade”, com a qual ele concorda
inteiramente, mas “que permanecerá esquecida durante décadas: a de que
a filosofia da linguagem sobredetermina todo o sistema do pensamento
cusano”. Conferir também Casarella (op. cit., p. 20); conferir ainda González
Ríos (op. cit., p. 51-61) que, mais recentemente, chamou a atenção em sua
tese de doutoramento para importância do mesmo artigo de Cassirer. Cf.
Primeira Parte. Capítulo Primeiro. Parágrafo 1. e La idiosincrasia del
lenguaje de Nicolás de Cusa.
36 Cf. André (1997, p. 389-402): aqui ele apresenta algumas considerações
sobre o simbolismo cusano. Parte da ideia de que “A relação entre
o infinito pressuposto e as suas diferentes expressões constitui o
fundamento para o que se poderia chamar o mundo dos símbolos no
pensamento cusano” (p. 389), interpretando em seguida “o simbolismo
como uma perspectiva de abordagem do real” que não está ausente
da Idade Média e que reconhece duas grandes fontes de inspiração: a
augustiniana e dionisiana. (p. 390). Segundo o mesmo autor, é patente 262
a recepção medieval dessas duas fontes na escola de Chartres, com
Hugo de S. Vítor, e em João Escoto Eriúgena. Entretanto, segundo ele,
“é em Nicolau de Cusa que acaba por se cruzar tanto uma como outra herança,
de tal modo que este pensador, sem ter escrito especificamente nenhuma
teologia simbólica, é o seu mais genuíno representante na transição da Idade
Média para o Renascimento” (p. 393). Por outro lado, André está convencido
de que a concepção cusana do símbolo ultrapassa a concepção moderna
(cartesiana, positivista, kantiana e também a neokantiana de Cassirer)
e “está bem perto de algumas perspectivas contemporâneas, como a de
P. Ricoeur” (p. 401).
37 Conferir também outros artigos do mesmo autor: DUCLOW, Donald F.
Pseudo-Dionysius, John Scotus Eriugena, Nicholas of Cusa: An Approach
to the Hermeneutic of the Divine Names. International Philosophical
Quarterly, vol. 12 (1972), p. 260-278; DUCLOW, Donald F. The Dynamics of
Analogy in Nicholas of Cusa. International Philosophical Quarterly. Vol.
XXI, nº 3. Issue nº 83 September 1981, p. 285- 301; DUCLOW, Donald F. The
Analogy of the Word: Nicholas of Cusa’s Theory of Language. In: Bijdragen,
38, 1977, 282-99.
38 Para a posição de Duclow sobre a distância entre a interpretação
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
dionisiana e agostiniana do simbolismo acima apresentada: Cf. CHENU,
Marie Dominique. La teologia nel XII secolo. A cura di Paolo Vian.
Introduzione di Inos Biffi. Seconda ristampa. Milano: Jaca Book, 1999. Chenu
aponta Agostinho e Dionísio como os inspiradores e como fontes para a
mentalidade simbólica do século XII. Porém, reconhece uma distância entre
o “signo” agostiniano e o “símbolo” dionisiano, embora ambos dependam
da mesma inspiração neoplatônica. Essa distância é apresentada da seguinte
forma: “Il segno agostiniano è concepito al livello e secondo le risorse
della psicologia della conoscenza, come lo strumento di un’esperienza
spirituale che copre tutto il campo del linguaggio, ma anche i diversi modi
di espressioni figurativi” (p. 197-198); “In Dionigi, invece, non è il soggetto
credente a conferire senso ai segni, sono preliminarmente gli stessi elementi
che, per natura, sono rappresentazioni, ‘analogie’. Il simbolo è la vera
espressione della realtà; anzi, per il suo tramite questa realtà si compie”
(p. 198). Anteriormente Chenu havia afirmado que “Il simbolo [dionisiano]
è la via d’accesso omogenea al mistero, e non un semplice segno
epistemologico, più o meno convenzionale”. E, no parágrafo seguinte,
ele afirma: “Proprio per questo, l’anagogia è una necessità radicale per
l’intelligenza vera delle cose; perché le cose non sono vere, nel loro essere,
che per il loro riferimento ontologico a Dio” (p. 196).
39 Para a configuração agostiniana da filosofia da linguagem cusana: André
(1997: 576-585).
40 THERUVATHU, Prasad Joseph Nellivilathekkathil. Ineffabilis in the 263
Thought of Nicolas of Cusa. Münster: Aschendorff Verlag, 2010. De modo
especial as páginas 190-197 (Chapter 7: Expressing ineffabilis through ‘words’).
41 Cf. BONETTI, Aldo. La ricerca metafisica nel pensiero di Nicolò
Cusano. Brescia: Padeia, 1973. Segundo o autor a análise da concepção
cusana da realidade no De docta ignorantia confirma o caráter cristão
da sua especulação: “la filosofia cusaniana si svolge, senza avvertire
alcun conttrasto, sul fondamento del dato della fede. Non solamente la
concezione teistica e creazionistica del reale, ma anche la dottrina della
Trinità e dell’Incarnazione sono a fondamento della metafisica del De docta
ignorantia o sono chiamate a risolverne le aporie. Si pensi alla concezione
trinitaria di Dio e dell’universo, alla funzione della dottrina del Verbo
incarnato nel tentativo di risolvere il problema del passaggio dell’unità
assoluta alla molteplicità del creato” (1973, p. 58). No último capítulo, o
autor aponta como primeira conclusão a mesma questão ao afirmar que
“La concezione cristiana della realtà, così come essa è data dalla fede nella
Rivelazione, costituisce, agostinianamente, il punto di partenza e di arrivo
della ricerca metafísica del Cusano. Si tratta di comprendere e di svolgere
il patrimonio della fede e non già di costruire in assoluta autonomia e
senza alcun presupposto una visione della realtà” (Ibid., 177). Cf. também:
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
MANNARINO, Lia. Visione Intellettuale di Dio e fede universale: cusano
lettore di Eckhart. Firenze: Leo S. Olschki Editore, 1988.
42 Cf. BEIERWALTES (2005, p. 11): Nesse contexto, ele afirma que “El Cusano
trabaja más bien en el conocimiento y en el desarrollo del mismo problema
con el que – mutatis mutandis – los teólogos cristianos se comprometieron
una y otra vez, abierta o solapadamente y con una intensidad diversa,
desde la entrada del cristianismo en la historia”. Assim, o autor pode
também concluir que Nicolau de Cusa “no representa sin embargo ningún
caso especial” (2005, p. 11). Cf. ainda: REINHARDT, Klaus. Concordancia
entre exégesis bíblica y especulación filosófica en Nicolás de Cusa. In:
ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano; ANDRÉ, João Maria. Coincidencia de Opuestos
y Concordia: Los Caminos del Pensamiento en Nicolás de Cusa. Actas del
Congreso Internacional celebrado en Coimbra y Salamanca los días 5 a 9
de noviembre de 2001. Tomo II. Salamanca: Sociedad Castellano-Leonesa
de Filosofía, 2002, p. 135-148: a partir da coincidência ou concordância
entre o “pregador” e o “filósofo” em Nicolau de Cusa, Reinhardt considera
que a distinção entre os dois modos de proceder, “[...] elaborada con toda
claridad en la época escolástica, no se puede aplicar sin más al pensamiento
cusano. Sin negar la diferencia de los dos procedimientos, Nicolás de Cusa
no ve contradicción alguna entre ambos; al contrario, para él, las dos vías se
cruzan, se penetran y se condicionan, una a la otra.” (2002, p. 136).
43 Cf. Casarella (op. cit., p. 24-25). Também ele se liga diretamente ao mesmo
artigo de Haubst, ao afirmar que a questão da “linguagem” no pensamento 264
cusano aponta para uma relação positiva entre pensamento especulativo e
doutrina Cristã, pois a noção cusana de linguagem não está baseada somente
em postulados epistemológicos, mas também se origina da sua teologia da
Palavra divina. Os casos específicos de convergência e divergência que serão
investigados por Casarella em sua tese mostram, segundo ele, que a relação de
mútuo condicionamento da “teologia na filosofia” e da “filosofia na teologia”
(de acordo com os termos utilizados por Haubst) não envolve uma identidade
imediata entre duas disciplinas formalmente distintas, nem uma divisão de
dois reinos materialmente separados. No pensamento cusano, a convergência
de filosofia e teologia se daria na teologia do Verbo, pois a Palavra divina se
torna fonte para a especulação filosófica, por exemplo, quando Nicolau de
Cusa identifica o Verbo divino com a igualdade absoluta. A pergunta, portanto,
é que tipo de linguagem Nicolau usa realmente para expressar a relação
formal entre linguagem e teologia? Será no Idiota que se poderá encontrar
um exemplo simples e claro, pois, para o Idiota, a teologia especulativa tem
a sua origem em uma teologia que é ao mesmo tempo sermocinalis, isto é,
linguística (linguistic) e facilis (readily accessible). Nas palavras de Casarella,
isso significaria que a teologia do Idiota consistiria em uma reflexão de fácil
acesso sobre a linguagem e a experiência humana que nos levaria a participar
da Palavra divina. Com um vocabulário mais atual, isso significaria que uma
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
compreensão adequada da Palavra divina exigiria uma reflexão hermenêutica
sobre a linguagem. A theologia sermocinalis cusana, portanto, seria uma
investigação essencialmente pré-teológica e hermenêutica sobre o sentido da
Palavra divina, conclui Casarella (Ibid., 27-28).
44 HOPKINS, Jasper. Glaube und Vernunft im Denken des Nikolaus
von Kues. Prolegomena zu einem Umriß seiner Auffassung. Trier:
Paulinus-Verlag, 1996a. Trierer Cusanus Lecture. Heft 3. (Tradução
para o inglês: Prolegomena to Nicholas of Cusa’s conception of the
relationship of faith to reason, 1996b). Os textos estão disponíveis em:
.
45 Cf. BEIERWALTES, W. Das Verhältnis von Philosophie und Theologie
bei Nicolaus Cusanus. In: Mitteilungen und Forschungsbeiträge der
Cusanus-Gesellschaft (28) Nikolaus von Kues (1401-2001). Akten des
Symposions in Bernkastel-Kues vom 23, bis 26. Mai 2001. Cusanus-Institut
Trier: Paulinus, 2003, p. 65-102 (tradução nossa): “Denkformen oder
Formen des Wissens” (2003, p. 67-68).
46 Tendo em vista a importância que envolve cada termo utilizado por
Beierwaltes, apresentamos também o original em língua alemã: “Beide
[Philosophie und Theologie] Denkformen oder Formen des Wissens können
jedoch durch andere zentrale Begriffe aufschlußreich erfaßt und bestimmt
werden, die unmittelbar zu Philosophie und Theologie gehören, so v. a. duch
in Reflexion auf das Verhältnis von Vernunft (ratio, intellectus), Einsicht 265
(Intelligere, videre), Begreifen (comprehendere), Wissen (scire) zu Glauben
(credere, fides) als einem Sich-Öffnen gegenüber einer als Offenbarung
vermittelten Wahrheit” (Ibid., p. 67-68).
47 MACHETTA, Jorge M. Intellectus explicatio fidei o Intellectus explicatio
Christi: la dimensión cristológica de la verdad. Reflexiones en torno a la
verdad, la unidad y Cristo. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia
(Editores). Nicolás de Cusa: identidad y alteridad. Pensamiento y diálogo.
Buenos Aires: Biblos, 2010, p. 447- 462 (tradução nossa).
48 Sobre a cristologia do terceiro livro do De docta ignorantia: CASARELLA,
Peter J. His name is Jesus: Negative theology and christology in two writings
of Nicholas of Cusa from 1440. In: CHRISTIANSON, Gerald and IZBICKI,
Thomas M. (eds.). Nicholas of Cusa on Christ and the church. Essays in
memory of Chandler McCuskey Brooks, Leiden 1996, p. 281-307. CUOZZO,
Gianluca. Il tema del “pecatto originale” nella teoria della conoscenza
di Cusano. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia. (Editores). El
problema del conocimiento en Nicolás de Cusa: genealogía y proyección.
Buenos Aires: Biblos, 2005, p. 121-139. O autor chama a atenção para duas
concepções de pecado em Nicolau de Cusa, o que poderia esclarecer ainda
mais o nosso texto. Em Cribatio Alkorani (1460-1461), o pecado seria definido
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
por Cusano como “divisio, come separazione dell’uomo da Dio: ‘Il peccato
porta divisione tra Dio e l’uomo”. Segundo Cuozzo, o homem possuiria um
“intelletto soltanto potenziale” e daí a necessidade da graça divina. Já
no sermão Remittuntur ei peccata multa (1445) Nicolau de Cusa definiria o
pecado como “l’offesa arrecata dall’uomo, al lume dell’intelligenza” (2005,
p. 121-124). Sobre o caráter cristocêntrico da antropologia cusana: MORRA,
Gianfranco. Cusano: una antropologia cristocentrica. In: ______. (a cura di).
Nicolò Cusano. La vita e la morte. Forli: Edizioni di Ethica, 1966, p. 5-17.
O autor reconhece a Incarnação como um “evento-essenziale” nestes termos:
“È, infatti, con l’Incarnazione che il Deus absconditus diviene Deus revelatus
in Cristo. Il riferimento a questo evento-essenziale è imprescindibile
per uma genuína considerazione sul destino dell’uomo: l’antropologia è
cristocentrica”. E nas linhas finais do parágrafo afirma: “Non si deve pensare
che questo cristocentrismo sia estrinseco e provvisorio in Cusano: tutto il
terzo libro della sua opera principale mostra il contrario” (1966, p. 13).
49 Cf. De docta ignorantia. w. L. I, cap. II, n. 5-7, p. 10-12 (A douta ignorância.
L. II, cap. II, n. 5-7, p. 5-6).
50 Cf. GILBERT, Paul. La richezza dela scolastica. In: Per uma lettura
dell’Enciclica fides et ratio. L’Osservatore Romano: Città del Vaticano,
1999, p. 92-102. Como orientação prévia podemos assumir a diferença
proposta por ele entre ratio e intellectus: “La scolastica non è [...] sorpassata.
È costituita da tutti gli sforzi della ragione che sa riconoscere la dignità
dell’uomo alla luce della fede. La fede non ignora la ragione. Occorre 266
tuttavia distinguere, come nel Medioevo, la ratio e l’intellectus, o il Verstand e
la Vernunft di Kant. Non è la ratio calcolatrice a poter cogliere ciò che unifica
le nostre vite, ma l’intellectus che, fatto per la verità, accompagna la fede. Si
definisce classicamente la verità come adaequatio rei et intellectus; l’intellectus
(da intelligere che significa ‘leggere interiormente’) è qui più penetrante che
analitico: quanto alla res, essa non è una ‘cosa’ sensibile (anche se si traduce
con ‘cosa’), ma una ‘realtà intellegibile’ di vita. L’intellectus conosce la res e la
inserisce in un discorso metafisico che sposa il desiderio e l’attenzione della
fede” (1999, p. 96-97). Pensando a escolástica a partir da relação entre fé e
razão, teríamos, ainda segundo Gilbert, que a primeira escolástica do século
XIII buscava uma síntese, mas nesse mesmo século encontramos não só o
reconhecimento da autonomia, mas da independência da razão em relação
à fé e, portanto, a proclamação da possibilidade de uma dúplice verdade.
É nesse sentido que “L’armonia fra la fede e la ragione appare allora come
un’esigenza difficile da attuare. Il XIII secolo sperimenta già che lo sforzo
intellettuale è teso fra la natura e la grazia, la logica e la realtà, che una
sintesi non è immediatamente realizzabile, che l’intelligenza della fede
non è una mera ripetizione fastidiosa, inutile e irresponsabile di formule
preesistenti” (Ibid., p. 98).
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
51 Cf. Bonetti (op. cit., p. 16-17, nota 4).
52 “Die Einsicht [oder die Erkenntnis durch Vernunft]“ (BEIERWALTES, op.
cit., p. 79).
53 Neste caso específico, distanciamo-nos da tradução para a língua espanhola
do texto de Beierwaltes que viemos seguindo, já que o termo Erfahrung foi
traduzido por reflexión. Por isso, citamos aqui o original em língua alemã e a
correspondente tradução: “Anfang dieses Kapitels deshalb ganz, weil er den
Anfang der Reflexion auf ‚fides‘ in natürlichen Bereich der Erfahrung und
des Denkens setzt und dessen Übergang in die ihn, den Glauben, vollendende
Einsicht in die absolute Wahrheit zeigt” (BEIERWALTES, 2003, p. 78);
“Cito por completo el inicio de este capítulo porque pone el comienzo de la
reflexión sobre la ‘fides’ en el ámbito de la reflexión y del pensamiento, y
muestra su transición a la visión de la verdad absoluta que perfecciona la
fe” (BEIERWALTES, 2005, p. 22).
54 De docta ignorantia. w. L. III, cap. XI, n. 244, p. 74, linhas 1-16: Maiores nostri
omnes concordanter asserunt fidem initium esse intellectus. In omni enim facultate
quaedam praesupponuntur ut principia prima, quae sola fide apprehenduntur, ex
quibus intelligentia tractandorum elicitur. Omnem enim ascendere volentem ad
doctrinam credere necesse est his, sine quibus ascendere nequit. Ait enim Isaias:
‘Nisi credideritis, non intelligetis.’ Fides igitur est in se complicans omne intelligibile.
Intellectus autem est fidei explicatio. Dirigitur igitur intellectus per fidem, et fides
per intellectum extenditur. Ubi igitur non est sana fides, nullus est verus intellectus. 267
Error principiorum et fundamenti debilitas qualem conclusionem subinferant,
manifestum est. Nulla autem perfectior fides quam ipsamet veritas, quae Iesus est.
(A douta ignorância. L. III, cap. XI, n. 244, p. 171-172).
55 Salientamos inicialmente que, para ele, a diferença entre ratio e intellectus
não é importante nesse contexto. Entretanto, chamamos a atenção para
alguns aspectos: no texto em língua alemã, o autor fala de uma concepção
cusana sobre a fé e a razão e o termo utilizado para “reason” é “Vernunft” [die
cusanischen Lehre über Glaube und Vernunft – Nicholas’s conception of faith
and reason). Mas, quando está traduzindo a expressão latina fides et ratio,
o termo utilizado para ratio é “reason” e “Verstand” [“Zum Ausgangspunkt
seiner Überlegungen macht Cusanus die wichtige Erkenntnis, daß die
Begriffe ‘Glaube’ (fides) und ‘Verstand’ (ratio) zweideutig sind” (1996a:
17) – “Since the four preliminary objections to descrying and describing
Nicholas’s conception of faith and reason do not succeed in establishing the
impossibility of the task, we may proceed to show that the task is altogether
possible (1996b, p. 9)]”. Assim, se a ratio e o intellectus (Verstand e Vernunft)
guardam uma diferença entre eles, não seria razoável perguntarmo-nos
por essa diferença no contexto da relação com a fides, mesmo pressupondo
que ratio e intellectus são modos de uma mesma racionalidade da mente
humana (rational – Rationalität)? O que se quer sugerir quando se afirma que
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
na especulação cusana se dá uma relação entre fé e razão (entendida como
Vernunft e não Verstand)?
56 “Likewise, in the expression “faith and reason” different senses of
“reason” must be distinguished” (1996b, p. 10); “In der Verbindung “Glaube
und Verstand” (fides et ratio) hat auch das Wort ratio mehrere Bedeutungen:
Einmal meint es ein geistiges Erkenntnisvermögen” (1996a, p. 19).
57 “First Thesis: Belief in the existence of God is not subject to formal
philosophical proof; informally, however, there are many rationales
that support this belief and that exhibit its reasonableness”
(HOPKINS, 1996b, p. 11).
58 Não se dá nenhuma evolução nesse ponto no pensamento cusano: “Es
gibt in diesem Punkt keine Entwicklung bei ihm, so daß man von einem
früheren oder späteren Cusanus sprechen müßte” (HOPKINS, 1996a, p. 20).
59 “Eighth Thesis: The relationship between faith and reason just is the
relationship between faith and understanding” (HOPKINS, 1996b, p.
15). “These acht lautet: Das Verhältnis zwischen Glaube und Verstand
(ratio) entspricht genau dem Verhältnis zwischen Glaube und Vernunft
(intellectus)” (HOPKINS, 1996a, p. 26).
60 “Nikolaus verwendet beide Begriffe in diesem Zusammenhang synonym,
ohne ihren sonst wichtigen Unterschied im rein erkenntnistheoretischen
Bereich zu beachten” (HOPKINS, 1996a, P. 26). 268
61 De docta ignorantia. w. L. III, cap. VI, n. 215, p. 41: Digressionem parvam ad
expressionem intenti antemitti convenit, ut mysterium crucis clarius attingamus.
Non dubium hominem ex sensu et intellectu atque ratione media, quae utrumque
nectit, existere. Ordo autem submittit sensum rationi, rationem vero intellectui.
Intellectus de tempore et mundo non est, sed absolutus ab hiis; sensus de mundo sub
tempore motibus subiectus existit; ratio quasi in horizonte est quoad intellectum,
sed in auge quoad sensum, ut in ipsa coincidant, quae sunt infra et supra tempus.
(A douta ignorância, L. III, cap. VI, n. 215, p. 151). Escolhemos este capítulo
VI do III Livro por está mais próximo, do ponto de vista do contéudo, das
discussões que estamos elaborando. Porém, também poderíamos afirmar
que, já no contexto do Livro I, está tematizada a diferença entre ratio e
intellectus quando, por exemplo, o Máximo absoluto “[...] está acima de
tudo aquilo que pode ser concebido por nós. Pois todas as coisas que podem
ser aprrendidas pelos sentidos, pela razão ou pelo intelecto diferem de tal
maneira em si mesmas e umas em relação às outras que nenhuma igualdade
precisa há entre elas”. (Idem. Livro I, cap. IV, p. 8-9).
62 Ibid., w. L. III, cap. VI, n. 217, p. 42, linhas 4-18: Nam cum homo ex semine
Adam in carnalibus voluptatibus sit genitus, in quo ipsa animalitas secundum
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
propagationem vincit spiritualitatem, tunc ipsa natura in radice originis carnalibus
deliciis immersa, per quas homo in esse a patre prodiit, penitus impotens remanet
ad transcendendum temporalia pro amplexu spiritualium. Quapropter, si pondus
delectationum carnalium attrahit deorsum rationem et intellectum, ut consentiant
illis motibus non resistendo, clarum est hominem ita deorsum tractum a Deo aversum
fruitione optimi boni, quod est intellectualiter sursum et aeternum, penitus privari.
Si vero ratio dominatur sensui, adhuc opus est, ut intellectus dominetur rationi, ut
supra rationem fide formata mediatori adhaereat, ut sic per Deum Patrem attrahi
possit ad gloriam. (Ibid., L. III, cap. VI, n. 217, p. 152-153).
63 Cf. PAREDES MARTÍN, María del Carmen. El conocimiento intelectual
de la ‘coincidencia de opuestos’. In: ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano; ANDRÉ,
João Maria. Coincidencia de Opuestos y Concordia: Los Caminos del
Pensamiento en Nicolás de Cusa. Actas del Congreso Internacional celebrado
en Coimbra y Salamanca los días 5 a 9 de noviembre de 2001. Tomo II.
Salamanca: Sociedad Castellano-Leonesa de Filosofía, 2002, p. 63-83. Nesse
artigo, apesar de a autora reconhecer que o “desarrollo sistemático” da
diferença entre ratio e intellectus de fato só aconteça no De coniecturis, ela
considera que Nicolau de Cusa “[…] la maneja desde su primera obra para la
doctrina de la coincidencia” (2002, p. 75).
64 NICOLAI DE CUSA. De coniecturis. In: Opera omnia. Iussu et auctoritate
Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. III.
Hamburg: Feliz Meiner, 1972 (sigla h.). Cf. Ainda: NICOLÒ CUSANO. Le
congetture. In: ______. La dotta ignoranza; Le congetture. A cura di 269
Giovanni Santinello. Rusconi: Milano, 1988, 239-358. Cf. De coniecturis. h.
III, Pars prima, Cap. VI, n. 23, p. 30, linhas 6-9: Unde intellectualis illa unitas
radix quaedam complicativa oppositorum in eius explicatione incompatibilium
exsisit. Ea enim opposita, quae in explicata eius rationalis unitatis quadratura
incompatibilia sunt, in ipsa complicantur (tradução nossa).
65 Cf. Em nota à sua tradução do De docta ignorantia, Santinello afirma (1988,
p. 254, nota 1) que “as quatro unidades são mentais”, contrariamente à
“interpretazione realistica” das quatro unidades postuladas por Koch-
Bormann (NICOLAI DE CUSA. De coniecturis. In: Opera omnia. Iussu et
auctoritate Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem
edita. Vol. III. Hamburg: Felix Meiner, 1972, Annotationes, 12, p. 194-
195). Cf. TONELLI, Malena. Lo máximo contracto y la mente humana. In:
MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia (Editores). Nicolás de Cusa,
identidad y alteridad: Pensamiento y diálogo. Buenos Aires: Biblos,
2010, 233-240: conferir, por exemplo, a discussão entre Malena Tonelli,
João Maria André, Claudia D’Amico e Jorge M. Machetta sobre o correto
modo de interpretar as quatro unidades tendo em vista a diferença entre
o nível ontológico e um nível gnoseológico do discurso cusano (p. 239-
240). Cf. também: André (1993, p. 397 e seguintes). Ele sugere aí que se
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
possa falar de “uma teoria regional do discurso em Nicolau de Cusa numa
correspondência à gnoselogia regional que é explorada no De coniecturis”.
Cf. do mesmo autor: A metáfora do “muro do paraíso” e a cartografia do
conhecimento em Nicolau de Cusa. In: PACHECO M.C. – MEIRINHOS J.F.;
Intellect et imagination dans la Philosophie Médiévale / Intellect
and Imagination in Medieval Philosophy / Intelecto e imaginação
na Filosofia Medieval. Actes di XIº Congès International de Philosophie
Médiévale de la Société Internationale pour l’Étude de la Philosophie
Médiévale (S.I.E.P.M.), Porto, Du 26 au 31 août 2002, (Rencontres de
philosophie médiévale, 11) Brepols Publishers, Turnhout 2006; vol. III,
pp. 1639-1650). Cf. ainda: González Ríos (op. cit., 77-96).
66 De coniecturis. h. III. Pars prima, cap. VI, n. 25, p. 32, linha 10: “Unde
verbum intellectuale ratio est, in quo ut in imagine relucet”.
67 Ibid., h. III. Pars prima, cap. VII, n. 27, p. 34, linhas 5-15: unitas enim
intelligentiae numeratur in anima, dum multipliciter contrahitur. Quoniam autem
in ipsa anima unitas intelligentiae explicatur, in anima resplendet ipsa ut in propria
imagine. Deus lumen est intelligentiae, quia eius est unitas; ita quidem intelligentia
animae lumen, quia eius unitas. Hoc attentius animadverte, quoniam sic et
corporalis forma unitatis animae numerus exsistit, animae virtutem seu unitatem
non in se, sed eius corporali explicatione sensibiliter intuemur. Sic et intelligentiam
non in se, sed in anima, nec primam simplicissimam absolutissimamque unitatem
in se uti est, sed in ipsa intuemur intelligentia ut in numero et signaculo. 270
68 Ibid., h. III. Pars secunda, cap. I, n. 76, p. 75, linhas 9-11: Quapropter haec
est radix omnium rationabilium assertionum, scilicet non esse oppositorum
coincidentiam attingibilem.
69 Ibid., h. III. Pars secunda, cap. I, n. 78, p. 76, linhas 2-4: Hinc discurrit a complicatione
ad explicationem logice seu rationabiliter inquirendo idem in diversitate.
70 Ibid., h. III. Pars secunda, cap. I, n. 78, p. 76-77, linhas 7-15: In ratione igitur
vis complicativa est, quia unitas sensibilium alteritatum, similiter et vis explicativa,
quia alteritas intellectualis unitatis pariter et unitas sensibilium. Coincidentiam
igitur complicationis et explicationis rationale caelum ambit. Quare illa rationalis
complicatio explicatioque non sunt de his oppositis, quae solum in intellectuali
unitate coincidunt. In divina enim complicatione omnia absque differentia
coincidunt, in intellectuali contradictoria se compatiuntur, in rationali contraria,
ut oppositae differentiae in genere.
71 Ibid., h. III. Pars secunda, cap. I, n. 79, p. 77, linhas 6-9: In ratione igitur
oppositorum quaedam coincidentia est, quae in sensibilibus attingi nequit. Ad hanc
autem contrariorum coincidentiam et rationis praecisionem cum sensus attingere
nequeat, omnia sensibiliter, uti sunt, subsistunt. A aparente contradição entre
afirmar que a razão não “pode atingir a coincidência dos opostos” e que na
razão há “uma certa coincidência dos opostos” pode ser desfeita quando
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
pensamos o movimento que se estabelece entre as unidades da mente:
enquanto o intelecto complica o que a razão explica, a razão, por sua vez,
complica o que nos sentidos se encontra explicado. Contrariamente ao
intelecto, a razão não pode ser dita raiz da coincidência, pois nela coincide
o que nos sentidos se percebe como contrários: no gênero coincidiriam
as diferenças que são opostas entre si. O intelecto, por sua vez, é raiz da
coincidência dos contraditórios e também dos opostos que na razão
encontram-se separados.
72 Para o texto latino, seguimos a edição italiana de G. Santinello: NICOLÒ
CUSANO. Apologia Doctae Ignorantiae discipuli ad discipulum / Difesa della
dotta ignoranza di un discepolo ad un altro discepolo. In: Scritti filosofici.
Traduzione di G. Santinello. Vol. II com texto latino a fronte. Bolonha/
Itália: Zanichelli, 1980, p. 203-257 (sigla s.). Também consultaremos a edição
on-line do Cusanus-Portal: . O texto também foi traduzido por Graziella Vescovini: Apologia
della dotta ignoranza di un discepolo a un discepolo. In: Opere filosofiche
di Nicolò Cusano. A cura di Graziella Federici-Vescovini. UTET, 1972,
p. 399-434. A versão para a língua portuguesa é de nossa responsabilidade.
73 HOPKINS, Jasper. Nicholas of Cusa’s debate with Jonh Wenk. A
Translation and an Appraisal of De Ignota Litteratura and Apologia Doctae
Ignorantiae. Third edition, Mineapolis: The Arthur J. Banning Press,
1988: Segundo Hopkins (1988, p. 4), uma primeira impressão do texto foi
publicada em 1910 por E. Vansteenberge (Le ‘De ignota Litteratura’ de Jean 271
Wenck de Herrenberg contre Nicolas de Cues, Beiträge zür Geschichte der
Philosophie und Theologie des Mittellalters VIII 6, Münster, 1910). Mas
Hopkins aponta duas razões para uma nova edição: “But for two reasons
a completely new edition is here presented: (1) Vansteenberge’s text is
based upon only one of the two extant manuscripts; and (2) when his text
is compared with the one manuscript he used, it is seen to be riddled with
errors. Vansteenbergue worked too hastily and with too much disregard
for critical apparatus”. Conferir também a tradução para a língua española:
NICOLÁS DE CUSA. Apología de la Docta Ignorantia. JUAN WENCK. La ignorada
sabiduría. Introducción, traducción y notas de Santiago Sanz. Cuadernos de
Anuario Filosófico, 24. Pamplona/España: Servicio de Publicaciones de la
Universidad de Navarra. S.A., 1995.
74 Para o texto latino seguiremos a edição de Jasper Hopkins. JOHN WENCK. De
ignota literatura. In: HOPKINS, Jasper. Nicholas of Cusa’s debate with Jonh
Wenk. A Translation and an Appraisal of De Ignota Litteratura and Apologia
Doctae Ignorantiae. Third edition, Mineapolis: The Arthur J. Banning Press,
1988, 97-118. Appendix. (sigla jh.): Armis autem spiritualis Doctae Ignorantiae
quaedam dicta impugnaturus veluti fidei nostrae dissona, piarum mentium offensiva,
necnon ab obsequio divino vaniter abductiva. (n. 19, p. 97, linhas 19-21).
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
75 Ibid., jh. n. 20, linhas 33-34 e n. 21, linhas 1-3, p. 98: de quorum numero forsan
extat vir iste doctae ignorantiae, callide sub specie religionis decipiens eos qui nondum
exercitatos habent sensus. Nam ex quo spiritu haec docta procedat ignorantia, dudum
iam Waldensica, Eckhardica, atque Wiclefica paremonstraverunt doctrinationis.
76 Ibid.,. jh. n. 21, p. 99, linhas 11-15: Repugnat namque in hac vita, ubi secundum
Boetium ‘omne quod recepitur secundum modum recipientis,’ aliter hominem
comprehendere quam comprehensibiliter et in imagine, cum, ex IIIº De Anima, hoc
in phantasma ad intelectum quod est color ad visum.
77 Ibid., jh. n. 21, linhas 28-34 e n. 22, linhas 1-2, p. 99: Et si praefatus doctae
ignorantiae omnem sic praevenire vult oppositionem, tunc nulla erit ibidem
contradictio. Et quis eum redarguet?, cum tunc nulla possit fundari consequencia,
deficiente repugnantia oppositi consequentis ad antecedens. Ubi tunc erunt
consequentiae prophetarum Salvatoris, evangelistarum, ac apostolorum, quibus
dinoscitur fides non modicum roborata contra perfidos? Affert etiam de medio
talismodi eius assertio semen omnis doctrinae, videlicet illud: Idem esse et non
esse impossibile, IVº Metaphysicae. Para uma introdução ao problema da
coincidentia oppositorum e o princípio de não contradição de Aristóteles
nos primeiros capítulos do primeiro livro do De docta ignorantia conferir
seguinte texto: BERTI, Enrico. Coincidentia oppositorum e contraddizione nel
De docta ignorantia. In: PIAIA, Gregório (a cura di). Concordia Discors: studi
su Niccolò Cusano e l’umanesimo europeo offerti a Giovanni Santinello.
Padova: Editrice Antenore, 1993, p. 107-127. 272
78 Apologia doctae ignorantiae. s. n. 20, p. 222-224, linhas 12-23: Sed quando
ait semen scientiae, quod in illo principio ‘quodlibet est vel non est’ complicatur, et
omnem discursum tolli, non sane concipit. Non enim advertit doctam ignorantiam
versari circa mentis oculum et intellectibilitatem; et hinc cessat ab omni
ratiocinatione, qui ducitur ad visionem, et testimonium eius est de visu. “Quod enim
vidit, attestatur”, uti Iohannes Baptista de Christo et Paulus de raptu suo loquitur.
Opus autem habet discursu, qui per testimonium de auditu veritatem venatur, –
sicuti communius ducimur per fidem, quae ex auditu est. Unde, si quis diceret: “Tu
cum dicas testimonium de visu esse certius, quod sine omni argumento et discursu
ostendit, igitur negas aliud esse testimonium de auditu et omnem ratiocinationem”,
nequaquam bene diceret. Repete novamente no n. 43, p. 244, linhas 6-10: “Nec
sequitur ex coincidentia etiam oppositorum in Maximo hoc ‘nenenum erroris et
perfidiae’, scilicet destructio seminis scientiarum, primi principii, ut impugnator
elicit. Nam illud principium est quod rationem discurrentem primum, sed
nequaquam quoad intellectum videntem, - ut supra de hoc.
79 Ibid., s. n. 21, p. 224, linhas 18-20: [...] uti in libellis De coniecturis videre
potuisti, ubi etim super coincidentiam contradictoriorum Deus esse declaravi, cum
sit oppositorum oppositio secundum Dionysium.
80 VERD, Gabriel María. Dios transcendente e inmanente en Nicolás de
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NOTAS
Cusa. In: Miscelanea Comillas. vol. 28, nº 53 (1970), 163-195. Universidad
Pontificia Comillas – Madrid (tradução nossa).
81 Cf. FLASCH, Kurt. Nicolás de Cusa. Traducción de Constantino Ruiz-
Garrido. Espanha: Herder, 2003 (tradução nossa): partindo de um texto
do De beryllo (cap. 1), no qual Nicolau afirma que os que lerem o que ele
escreveu em seus vários livros verão que ele frequentemente se ocupou da
coincidência dos opostos e que ele se esforçou frequentemente por tirar
conclusões, com base em uma visão intelectual que supera os poderes da
razão, Flasch afirma que, nesse texto, cada palavra é importante: “él ha
sacado conclusiones no según el entendimiento, ratio, sino con arreglo a la
visión intelectual, intellectualis visio. La distinción entre ratio e intellectus, es
decir, entre entendimiento e razón, Nicolás de Cusa no la había efectuado
aún en De docta ignorantia; esta distinción pertenece a una segunda etapa
de desarrollo de la doctrina de la coincidencia, desde la obra De coniecturis
(hacia el año 1442). Nicolás de Cusa exige así, en la introducción, que se
conciba la obra De docta ignorantia y la doctrina de la coincidencia a la luz
de su distinción aducida posteriormente”. Ainda segundo Flasch esse uso
deriva de Platão. “Según esta terminología, la ratio es el procedimiento
discursivo que, mediante muchas proposiciones distintas, llega a su
resultado. El intellectus era la intuición sencilla de los presupuestos que todo
procedimiento lógico efectúa” (2003, p. 35).
82 De docta ignorantia. w. L. II, cap. III, n. 107, p. 24, linhas 11-12: Deus ergo
est omnia complicans in hoc, quod omnia in eo. Est omnia explicans in hoc, quod ipse 273
in omnibus. (A douta ignorância. L. II, cap. III, n. 107, p. 77).
83 Sobre o versículo de Isaías comenta Duclow (1974, p. 20, nota 33):
“The passage in question is based on the Septuagint reading of Isaiah 7,
9; following the Hebrew more closely, the Vulgate reads, ‘Nisi credideritis,
non permanebitis’. Augustine was aware of the variant readings, and
argued for their ‘similarity in one area of meaning (On Christian Doctrine,
II, xii, 17); in the De trinitate (XV, ii, 2) he constructs an elaborate dialectic
of ‘seeking’ and ‘finding’ upon this passage”. Conferir também A Bíblia de
Jerusalém, tradução brasileira: “Se não o crerdes, não vos mantereis firmes”.
Beierwaltes (2005, p. 15) reconhece a importância do versículo bíblico
para a fundamentação da relação entre filosofia e teologia ao afirmar
que “La necesidad y la finalidad de tal autoacercioramiento de la fe se ha
fundamentado y desarrollado, al menos desde San Agustín, siguiendo el hilo
conductor de la frase de Isaías 7, 9, de múltiples modos en un sentido análogo,
y así también el Cusano”. Nas páginas (p. 15-18) seguintes, o autor descreve
de modo rápido a história da interpretação desse versículo passando por
Santo Agostinho, Santo Anselmo, Mestre Eckhart, Eriúgena e Cusano.
84 Esse último aspecto existencial é reconhecido também por André (1997).
Depois de lembrar que fé e intelecto, embora se articulem, devem ser
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NOTAS
vistos como duas instâncias diferentes de conhecimento; que a fé como
“complicação” põe o intelecto em movimento e o intelecto como “explicação”
é um complemento necessário para a fé e, por último, que a identificação
entre Jesus e a verdade desempenha um lugar central no pensamento
cusano entendido como “discurso do sentido”, pois Jesus é também o Verbo,
segunda pessoa da Trindade, portanto discurso do Pai, André (1997, p. 70-
71) reconhece que um aspecto pode passar despercebido ao acentuarmos
demasiadamente a “articulação entre a filosofia e a teologia, entre a razão
e o intelecto”. Segundo ele, essa articulação não se inscreve e o seu alcance
não se limita apenas ao âmbito teórico-reflexivo, pois, ao introduzirmos
uma separação entre os domínios da fé e do intelecto, estaríamos falseando
“o sentido do pensamento cusano”; da mesma forma, esquecer a “dimensão
experiencial que postula e é postulada pela sua articulação seria esquecer
o sentido da sua vida”. Neste sentido, Deus não é somente a verdade que
“polariza os esforços intelectuais humanos”, mas é o fim a que todo homem
busca na sua existência.
85 De docta ignorantia. w. L. III, cap. XI, n. 245, p. 76, linhas 1-3: Potest
autem Christi sanissima fides, in simplicitate constanter firmata, gradibus
ascensionum extendi et explicari secundum datam ignorantiae doctrinam.
(A douta ignorância. L. III, cap. XI, n. 245, p.172).
86 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 245, p. 76, linhas 8-20: Nam est Verbum et potentia, per
quam Deus fecit et saecula, super omnia, quae in caelo et in terra sunt, potestatem
habens solus altissimus. Qui cum in hoc mundo non sit cognoscibilis, ubi ratione ac 274
opinione aut doctrina ducimur in symbolis per notiora ad incognitum, ibi tantum
apprehenditur, ubi cessant persuasiones et accedit fides; per quam in simplicitate
rapimur, ut supra omnem rationem et intelligentiam in tertio caelo simplicissimae
intellectualitatis ipsum in corpore incorporaliter, quia in spiritu, et in mundo non
mundialiter, sed caelestialiter contemplemur incomprehensibiliter, ut et hoc videatur,
ipsum scilicet comprehendi non posse propter excellentiae suae immensitatem.
(Ibid., L. III, cap. XI, n. 245, p.172-173).
87 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 247, p. 78, linhas 1-2 e 6-8: Deinde ardentiori
desiderio fideles continuo ascendentes ad intellectualitatem simplicem rapiuntur,
[...]. Nam si dici deberent ibi revelata, tunc non dicibilia dicerentur, non audibilia
audirentur, sicut invisibile ibi videtur. (Ibid., L. III, cap. XI, n. 247, p.174).
88 Para todo este parágrafo conferir: Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 247, p. 78-80,
linhas 8-22: Iesus enim in saecula benedictus, finis omnis intellectionis, quia veritas,
et omnis sensus, quia vita, omnis denique esse finis, quia entitas, ac omnis creaturae
perfectio, quia Deus et homo, ibi ut terminus omnis vocis incomprehensibiliter
auditur. De ipso enim omnis vox prodiit et ad ipsum terminatur; quidquid veri
in voce est, ab ipso est. Omnis vox ad doctrinam est; ad ipsum est igitur, qui ipsa
sapientia est. ‘Omnia quaecumque scripta sunt, ad nostram doctrinam scripta sunt.’
Voces in scripturis figurantur. ‘Verbo Domini caeli firmati sunt’; omnia igitur creata
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NOTAS
signa sunt Verbi Dei. Omnis vox corporalis verbi mentalis signum. Omnis mentalis
verbi corruptibilis causa est Verbum incorruptibile, quod est ratio. Christus est ipsa
incarnata ratio omnium rationum, quia Verbum caro factum est. Iesus igitur finis
est omnium. (Ibid., L. III, cap. XI, n. 247, p.174-175).
89 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 248, p. 80, linhas 9-12: Oportet autem perfectam
Christi fidem esse purissimam, maximam, formatam caritate, quanto hoc fieri
potest efficacius. Non enim patitur quidquam sibi commisceri, quoniam est fides
purissimae veritatis potentis ad omnia. (Ibid., L. III, cap. XI, n. 248, p.175).
90 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 251, p. 82, linhas 1-5: Nec potest fides magna esse sine spe
sancta fruitionis ipsius Iesu. Quomodo enim quis fidem certam haberet, si promissa sibi
a Christo non speraret? Si non credit se habiturum aeternam vitam a Christo fidelibus
promissam, quomodo credit Christo?. (Ibid., L. III, cap. XI, n. 251, p. 177).
91 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 252, p. 84, linhas 1-6: Magna est profecto fidei vis,
quae hominem Christiformem efficit, ut linquat sensibilia, exspoliet se contagiis
carnis, ambulet in viis Dei cum timore, sequatur vestigia Christi cum laetitia et
crucem voluntarie acceptet cum exultatione, ut sit in carne quasi spiritus, cui hic
mundus propter Christum mors est et ab eo tolli, ut sit cum Christo, vita est.. (Ibid.,
L. III, cap. XI, n. 252, p. 177).
92 Segundo Bonetti (op.cit., p. 17), Nicolau de Cusa indica em Jesus a
perfeição da fé no sentido da fides qua creditur e da fides quae creditur e assim
explica esta diferença: “la fede di Gesù infatti come fede perfetta si risolve
nella visione di Dio, mentre il Verbo divino è la stessa verità che è oggetto 275
della fede e dello sviluppo del dato della fede nella sacra dottrina”. Cremos
que seja necessário ressaltar ainda mais este problema com uma pregunta
feita por Peter Casarella a Mario Machetta (2010, p. 461): “Peter Casarella: –
Una pregunta muy breve sobre la fides Christi. Pareciera que, dada la unión
hipostática, no es posible hablar de la Fe de Cristo como virtud. Entonces
sería bueno aclarar en qué sentido el Cusano habla de fides Christi. Respuesta:
- El tema no es sencillo y de hecho Tomás de Aquino no acepta que se pueda
hablar de fides Christi en cuanto virtud de Cristo. La cuestión ha sido tratada
primero por R. Haubst en su Die Christologie des N von Kues, y luego, retomado
por Lentzen Deis en su Den Glauben Christi teilen, donde explícitamente este
último propone que ha de entenderse por fides Christi en sentido subjetivo,
porque sólo así es posible comprender cómo Cristo es la fuente de la fe de
los creyentes en Él. En consecuencia Cristo, en cuanto hombre es fuente de
todas las virtudes por tanto de la fe que se participa a todos los hombres”.
93 De docta ignorantia. w. L. III, cap. XI, n. 248, p. 80, linhas 12-21: Saepissime
in antehabitis replicatum reperitur minimum maximo coincidere. Ita quidem et in
fide, quae simpliciter maxima in esse et posse; non potest in viatore esse, qui non
sit et comprehensor simul, qualis Iesus fuit. Viatorem autem tantum etiam, quoad
se, actu maximam Christi fidem habere volentem necesse est, ut fides apud ipsum
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NOTAS
ad tantum certitudinis indubitabilis gradum elevata sit, ut etiam minime sit fides,
sed umma certitudo absque omni haesitatione in aliquo quocumque. (A douta
ignorância. L. III, cap. XI, n. 248, p.175).
94 Ibid., w. L. III, cap. XI, n. 249, p. 80-82, linhas 1-11: Haec est potens fides,
quae ita est maxima quod et minima, ut omnia complectatur credibilia in eo, qui
est veritas. Et si forte fides unius hominis ad gradum alterius non attingit propter
impossibilitatem aequalitatis, sicut unum visibile in aequali gradu a pluribus videri
nequit, hoc tamen necesse est, ut quisque, quantum in se est, actu maxime credat. Et
tunc is, qui in comparatione aliorum vix ut granum sinapis fidem sortiretur, adhuc
immensae virtutis illius fides est, ut etiam in montibus oboedientiam reperiret,
cum ipse in virtute Verbi Dei, cum quo – quantum in se est – maxime per fidem
unitur, imperet; cui nihil resistere potest. (Ibid., L. III, cap. XI, n. 249, p.175-
176). Sobre a doutrina da complicatio-explicatio: Cf. GANDILLAC, Maurice
de. Explicatio-Compicatio chez Nicolas de Cues. In: PIAIA, Gregório (a cura
di). Concordia Discors: studi su Niccolò Cusano e l’umanesimo europeo
offerti a Giovanni Santinello. Padova: Editrice Antenore, 1993, p. 77-106;
Cf. VANSTEENBERG, Edmond. Le Cardinal Nicolas de Cues (1401-1464):
L’action – La Pensée. Paris, 1920 – Minerva GMBH – Frankfurt Am Main:
Unveränderter Nachdruck 1963: ‘Complication’ et ‘explication’, voilà donc
les deux termes qui, dans la philosophie cusienne, expriment le rapport de
Dieu et du monde’ (p. 311) ; Cf. GANDILLAC, Maurice de. La philosophie
de Nicolas de Cues. Aubier, 1941. : o autor afirma que “Bien avant d’être
appliqué systématiquement à la relation entre l’Unité originelle et la 276
pluralité indéfinie qui en émane, le schéma du l’ ‘enveloppement’ et du
‘développement’ (complicatio-explicatio), emprunté sans doute à Thierry
de Chartres, semble implicite dès 1430 dans le premier sermon conservé
de Nicolas” (p. 26). Cf. ainda: COUNET, Jean-Michel. Mathématiques et
dialectique chez Nicolas de Cuse. Paris: Vrin, 2000 : “Cette catégorie de la
complication (complicatio) ainsi que son corollaire, l’explication (explicatio),
est empruntée par Nicolas de Cues à l’école de Chartres. Chez Thierry de
Chartres, nous rencontrons fréquemment l’idée que Dieu est la complication
de toutes choses (complicatio universitatis rerum), c’est-à-dire qu’en lui les
choses son dans une parfaite simplicité. Il s’agit là d’une modalité d’être des
choses différente de la modalité de l’existence empirique, qui est désignée
par le terme d’explication. Dieu est la complication de toutes les choses
mais les choses en revanche sont l’explication de Dieu” (p. 80-81). Também
para Volkmann-Schluck (1993: 92-93), o par complicatio-explicatio serve
para Nicolau de Cusa pensar a relação da multiplicidade dos entes com a
unidade divina do ser. Ver também Bonetti (op. cit., p. 43-45); SANTINELLO,
Giovanni. Introduzione a Niccolò Cusano. 2ª Edizione con aggiornamento
bibliografico. Roma-Bari/Italia: Laterza, 1987 (p. 41-46); VESCOVINI (op.
cit., p. 29-33 e 78-80).
95 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XXII, n. 68, p. 88-90, linhas 10-13: Ita
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
licet eveniret, quod numquam eveniet, nihil tamen adderetur providentiae divinae,
quoniam ipsa complicat tam ea, quae eveniunt, quam quae non eveniunt, sed evenire
possunt”(A douta ignorância. L. I, cap. XII, n. 68, p. 50). E posteriormente ele
afirma: Ibid., w. L. I, cap. XXII, n. 69, p. 92, linhas 15-18: Et ita patet quomodo
per premissa, quae nos docent maximum omnem anteire oppositionem, quoniam
omnia qualitercumque complectitur et complicat, quid de providentia dei et aliis
consimilibus verum sitt, apprehendimus (Ibid., L. I, cap. XXII, n. 69, p. 51).
96 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 75, p. 96, linhas 1-5: Unde recte ait Hermes
Trismegistus: Quoniam deus est universitas rerum, tunc nullum nomen proprium est
eius, quoniam aut necesse esset omni nomine deum aut omnia eius nomine nuncupari,
cum ipse in sua simplicitate complicet omnium rerum universitatem. (Ibid., L. I, cap.
XXIV, n. 75, p. 55). Ibid., w. L. I, cap. XXV, n. 84, p. 106, linhas 1-11: Templa
etiam, Pacis scilicet et Aeternitatis ac Concordiae, Pantheon, in quo erat altare Termini
infiniti, cuius non est terminus, in medio sub divo, et consimilia nos instruunt paganos
deum secundum respectum ad creaturas varie nominasse. Quae quidem omnia
nomina unius ineffabilis nominis complicationem sunt explicantia. Et secundum quod
nomen proprium est infinitum, ita infinita nomina talia particularium perfectionum
complicat. Quare et explicantia possent esse multa et numquam tot et tanta, quin
possent esse plura. Quorum quodlibet se habet ad proprium et ineffabile, ut finitum
ad infinitum. (Ibid., L. I, cap. XXV, n. 84, p. 60-61).
97 Ibid., w. L. II, cap. III, n. 107, p. 24, linhas 1-5: Una est ergo omnium complicatio,
et non est alia substantiae, alia qualitas aut quantitas et ita de reliquis complicatio,
quoniam non est nisi unum maximum, cum quo coincidit minimum, ubi diversitas 277
explicata identitati complicanti non opponitur. (Ibid., L. II, cap.III, n. 107, p. 76).
98 Ibid., w. L. II, cap. III, n. 107, p. 24, linhas 11-12: Deus ergo est omnia complicans
in hoc, quod omnia in eo. Est omnia explicans in hoc, quod ipse in omnibus. (Ibid.,
L. II, cap. III, n. 107, p. 77). Cf. RICCATI, Carlo. “Processio” et “Explicatio”.
La doctrine de la création chez Jean Scot et Nicolas de Cues. Napoli,
Bibliopolis, 1983.
99 De docta ignorantia. w. L. II, cap. III, n. 105, p. 22, linhas 14-16: Et sicut
in numero explicante unitatem non reperitur nisi unitas, ita in omnibus quae sunt
non nisi maximum reperitur. (A douta ignorância. L. II, cap. III, n. 105, p. 76).
100 Ibid., w. L. II, cap. III, n. 108, p. 24-26, linhas 1-15: Et ut in numeris intentionem
declaremus: Numerus est explicatio unitatis. Numerus autem rationem dicit. Ratio
autem ex mente est; propterea bruta, quae mentem non habent, numerare nequeunt.
Sicut igitur ex nostra mente, per hoc quod circa unum commune multa singulariter
intelligimus, numerus exoritur: ita rerum pluralitas ex divina mente, in qua sunt
plura sine pluralitate quia in unitate complicante. Per hoc enim, quod res non possunt
ipsam aequalitatem essendi aequaliter participare, deus in aeternitate unam sic,
aliam sic intellexit, ex quo pluralitas, quae in ipso est unitas, exorta est. Non habet
autem pluralitas sive numerus aliud esse quam ut est ab ipsa unitate. Unitas igitur,
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sine qua numerus non esset numerus, est in pluralitate; et hoc quidem est unitatem
explicare, omnia scilicet in pluralitate esse. (Ibid., L. II, cap. III, n. 108, p. 77).
101 Ibid., w. L. II, cap. III, n. 106, p. 24, linhas 10-13: Ita quidem quies est unitas
motum complicans, qui est quies seriatim ordinata, si subtiliter advertis. Motus
igitur est explicatio quietis. Ita nunc sive praesentia complicat tempus. Praeteritum
fuit praesens, futurum erit praesens; nihil ergo reperitur in tempore nisi praesentia
ordinata. Praeteritum igitur et futurum est explicatio praesentis; praesens est
omnium praesentium temporum complicatio, et praesentia tempora illius seriatim
sunt explicatio, et non reperitur in ipsis nisi praesens. Una est ergo praesentia omnium
temporum complicatio. Et illa quidem praesentia est ipsa unitas. Ita identitas est
diversitatis complicatio, aequalitas inaequalitatis, et simplicitas divisionum sive
discretionum. (Ibid., L. II, cap. III, n. 106, p. 76). André (1997, p. 190-191) afirma
que “Não é por acaso que estes três conceitos [identidade como complicação
da diversidade; igualdade como complicação da desigualdade e simplicidade
como complicação da divisão] surgem aqui: eles exprimem precisamente
a Trindade e, sendo abordados depois das referências ao movimento e ao
tempo, antecedem imediatamente a referência à unidade, (em sentido
matemático e em sentido metafísico) que na multiplicidade dos entes
(em sentido metafísico) se explica”.
102 Deve-se entender a ideia de um “pressuposto último” primeiramente
em sentido ontológico e é esse sentido que fundamenta o sentido lógico ou
gnosiológico. Deus é o pressuposto último em relação a todas as coisas e em
qualquer sentido. Idiota. De sapientia. h. V. Liber Secundus. n. 30, p. 61, linhas 278
5-12: Idiota: Cum ergo a te quaesitum fuerit, an sit deus, hoc quod praesupponitur
dicito, scilicet eum esse, quia est entitas in quaestione praesupposita. Sic si quis
quaesiverit quid est deus, cum haecquaestio praesupponat quiditatem esse,
respondebis deum esse ipsam quiditatem absolutam. Ita quidem in omnibus. Neque
in hoc cadit haesitatio. Nam deus est ipsa absoluta praesuppositio omnium, quae
qualitercumque praesupponuntur, sicut in omni effectu praesupponitur causa.
Vide igitur, orator, quam facilis est theologica difficultas.
103 De filiatione dei. h. IV Opuscula I. I, n. 51, p. 39, linhas 11-13: Nihil enim
in intimis etiam remansit prae cordiis, quod non illis ipsis mandaverim litteris meas
generales qualescumque exprimentibus coniecturas.
104 Ibid., h. IV Opuscula I. III, n. 71, p. 52, linhas 7-12: Et hoc sit huius temporis
de theosi qualiscumque, licet remota valde, coniectura, in qua, quae esse possit
altissimae profunditatis eius descriptio, super rationem omnem ascendendum esse
ad altius aliquid supra id, quod signis quibuscum que explicabile est, in puritate
simplici, ut potes, conicias. Haec sic de hoc dicta sint.
105 De venatione sapientiae. h. XII. cap. VII, n. 16, p. 17, linhas 3-4: Id
in quo meae quiescunt venationum coniecturae, hoc est, quod non est nisi una
omnium causa creatrix posse fieri omnium et quod illa omne posse fieri praecedat
sitque ipsius terminus;
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NOTAS
106 Cf. GONZÁLES RÍOS, op. cit., p. 77-96.
107 De coniecturis. h. III, Pars prima, Prologus, n. 2-4, p. 4-6.
108 De docta ignorantia. w. L. I, n. 1, p. 4, linhas 26-29: et ex Germano in rebus
divinis talem ratiocinandi modum suscipe, quem mihi labor ingens admodum
gratissimum fecit. (A douta ignorância. L. I, n. 1, p. 2). O De docta ignorantia
remete diversas vezes para o De coniecturis. Pelo menos uma vez o termo aparece
naquela concepção posteriormente desenvolvida no De coniecturis. Pois tendo
em vista a discussão sobre o movimento, sobre o centro e os polos do universo
e da terra ele assim afirma: Poli igitur sphaerarum coincidunt cum centro, ut non
sit aliud centrum quam polus, quia Deus benedictus. Et quoniam nos motum non nisi
comparatione ad fixum, scilicet polos aut centra, deprehendere possumus et illa in
mensuris motuum praesupponimus: hinc in coniecturis ambulantes in omnibus nos
errare comperimus et admiramur, quando secundum regulas antiquorum stellas in
situ non reperimus concordare, quia eos recte de centris et polis et mensuris credimus
concepisse. (De docta ignorantia. w. L. II, cap. XI, n. 159, p. 90, linhas 1-9; A
douta ignorância. L. II, cap. XI, n. 159, p. 114).
109 De coniecturis. h. III, Pars prima, Prologus, n. 2, p. 4, linhas 2-6: Quoniam
autem in prioribus Doctae ignorantiae libellis multo quidem altius limpidiusque
quam ego ipse nisu meo praecisionem veritatis inattingibilem intuitus es,
consequens est omnem humanam veri positivam assertionem esse coniecturam.
Non enim exhauribilis est adauctio apprehensionis veri.
1101 Ibid., h. III, Pars prima, Prologus, n. 3, p. 4-5, linhas 1-6: Quoniam autem 279
creata intelligentia finitae actualitatis in alio non nisi aliter exsistit, ita ut omnium
coniecturantium differentia remaneat, non poterit nisi certissimum manere
diversorum diversas eiusdem inapprehensibilis veri graduales, improportionabiles
tamen ad invicem esse coniecturas, ita quidem, ut unius sensum, quamvis unus
forte alio propinquius, nullus umquam indefectibiliter concipiat. Sobre a dimensão
vertical e horizontal das conjecturas no pensamento cusano e sobre como
estas dimensões permitem pensar a relação com o divino e dos homens entre
si como uma “relação dialógica”, remetemos para: ANDRÉ (2005, p. 24-27).
111 De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. XI, n. 57, p. 58, linhas 11-17:
Quemadmodum vero sensus in unitate rationis suam alteritatem experitur et
assertiones sensibiles ab unitate praecisionis absolvendo coniecturas facit, ita ratio
in radicali unitate sua, in ipso scilicet intelligentiae lumine, suam alteritatem et
casum a praecisione in coniecturam invenit, sic et intelligentia ipsa, ut propinqua
potentia, in unitate divina se suo quidem clarissimo modo gaudet coniectari.
112 Ibid., h. III. Pars prima, cap. I, n. 5, p. 7, linhas 3-8: Coniecturas a mente nostra,
uti realis mundus a divina infinita ratione, prodire oportet. Dum enim humana
mens, alta dei similitudo, fecunditatem creatricis naturae, ut potest, participat, ex
se ipsa, ut imagine omnipotentis formae, in realium entium similitudine rationalia
exserit. Coniecturalis itaque mundi humana mens forma exstitit uti realis divina.
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NOTAS
113 Ibid., h. III. Pars prima, cap. XI, n. 54, p. 55-56: Quoniam unitatem unitatem
esse est ipsam praecise atque, uti est, esse, satis tibi atque clarissime constat
unitatem esse ipsam identitatem incommunicabilem, inexplicabilem atque, uti
est, inattingibilem. Sicut enim omne ens in propria sua entitate est, uti est, ita in
alia aliter. Hoc facile, si advertis, apprehendes. Circulus enim, ut ens rationis est,
in sua propria rationali entitate, uti est, attingitur. Dum enim concipis figuram,
a cuius centro ad circumferentiam omnes lineae sunt aequales, in hac quidem
ratione circulum, uti ens est rationis, attingis, sed extra ipsam rationem propriam,
uti sensibilis est, sicut in alio est, ita et aliter est. Non est igitur possibile circulum,
uti in ratione est, extra rationem esse. Sensibilis igitur circulus in alteritate
unitatem rationalis circuli participat. Quapropter praecisio illa, uti circulus est,
incommunicabilis remanet. Nam non nisi in alteritate multiplicatur. Non est enim
dabilis sensibilis circulus, ubi a centro lineae ad circumferentiam ductae praecise
sint aequales, immo nulla alteri per omnia, uti est, aequalis dari poterit. Non est
ergo circulus, qui videtur, adeo praecisus, quin praecisior eo semper esse posset. Et
quamvis, uti est, non se aliter quam uti est, communicet, in alio tamen non potest
nisi aliter participari. Non est igitur, uti est, imparticipabile suo defectu, sed quia in
alio participatur, hinc et aliter.
114 Ibid., h. III. Pars prima, cap. XI, n. 55, p. 56-57, linhas 1-9; 11-12; 15-19: Assis
hic totus, ut ad coniecturarum varietatem subintres. Nullum enim intelligibile, uti
est, te intelligere posse conspicis, si intellectum tuum aliam quandam rem esse
admittis quam in telligibile ipsum; solum enim intelligibile ipsum in proprio suo
intellectu, cuius ens exsistit, uti est, intelligitur, in aliis autem omnibus aliter. 280
Non igitur attingitur aliquid, uti est, nisi in propria veritate, per quam est. In solo
igitur divino intellectu, per quem omne ens exsistit, veritas rerum omnium, uti est,
attingitur, in aliis intellectibus aliter atque varie. [...]. Identitas igitur inexplicabilis
varie differenter in alteritate explicatur, atque ipsa varietas concordanter in
unitate identitatis complicatur. [...]. Et quoniam divina ipsa mens omnium est
absolutissima praecisio, ipsam omnes creatae mentes in alteritate variationis
differenter participare contingit illa ipsa ineffabili mente imparticipabili
perdurante, condicione participantium hoc agente.
115 Ibid., h. III. Pars prima, cap. XI, n. 56, p. 57, linhas 10-16: Potius igitur omnis
nostra intelligentia ex participatione actualitatis divinae in potentiali varietate consistit.
Posse enim intelligere actu veritatem ipsam, uti est, ita creatis convenit mentibus, sicut
deo nostro proprium est actum illum esse varie in creatis ipsis mentibus in potentia
participatum. Quanto igitur intelligentia deiformior, tanto eius potentia actui, uti est,
propinquior; quanto vero ipsa fuerit obscurior, tanto distantior.
116 Ibid., h. III. Pars prima, cap. XI, n. 57, p. 58, linhas 10-11: Coniectura igitur
est positiva assertio, in alteritate veritatem, uti est, participans.
117 Cf. Beierwaltes (2005, p. 271-272). É nos seguintes termos que ele se refere
aí ao carácter especulativo da mística cusana: “Ver lo infinito o la infinitud
como rasgo fundamental en todos los nomina divina o imágenes conceptuales
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
de Dios, percibir y pensar en este ver – como su condición necesaria – las
implicaciones conceptuales y las consecuencias que exceden el concepto, se
puede entender, en el sentido del Cusano, como el momento ‘intelectual’ de la
‘mística’ o de la teología mística. A partir de él, la teoría cusaniana del mystice
videre puede valer como una mística especulativa […]. La caracterización de
la mística cusaniana como ‘especulativa’ se podría fundamentar con más
precisión en su conexión con speculum, tanto en lo lingüístico como en lo
temático, a partir del empleo cusaniano de speculatio y speculari […]: el espíritu
es intellectuale vivum speculum, un reflejo finito activo del absoluto ‘espejo
de la verdad’, es decir, de Dios, qui est ipsa speculatio: el verse a sí mismo en
sí como en el espejo absoluto”. Com respeito à posição cusana em relação
à polêmica sobre a interpretação (affectus/intellectus) da Teologia Mística do
Pseudo-Dionísio: D’AMICO, Claudia. Nicolás de Cusa ante la polémica acerca
de la interpretación de la Teología Mística de Dionisio Areopagita. In: DE BONI,
Luis A.; PICH, Roberto Hofmeister (Orgs.). A recepção do pensamento greco-
romano, árabe e judaico pelo Ocidente Medieval. Porto Alegre, PUCRS,
2004, p. 731-743; conferir também: LUDUEÑA, Ezequiel. Teología Mística y
cristología. El Pseudo-Dionisio y Nicolás de Cusa. In: MACHETTA, Jorge M.
D’AMICO, Claudia. (Editores). El problema del conocimiento en Nicolás de
Cusa: genealogía y proyección. Buenos Aires: Biblos, 2005, p. 109-117. Não
poderíamos também deixar de citar o já clássico texto: VANSTEENBERGHE,
Edmond. Autour de la docte ignorance – une controverse sur la théologie
mystique au XVe siècle. Münster, 1915. 281
118 Cf. BEIERWALTES (2005, p. 110-111): “Finalmente, todavía el espejo
(‘speculum’: ‘speculari’, ‘speculatio’): el Dios en sí mismo incognoscible
se muestra al mundo en el espejo y en la imagen enigmática, se hace
cognoscible en él ‘en semejanza y alteridad’. El mundo es, por tanto,
imagen y espejo del modelo primordial, de modo que en él y mediante él
– en el intelecto del hombre como la ‘viva imago Dei’ llevada al concepto
–, su fundamento creador se hace presente de modo indirecto, figurativo,
diferente en sí mismo y al mismo tiempo semejante, se hace accesible
en cierta medida y de modo respectivamente diverso en el medio de la
alteridad. Pero frente al pensamiento de que el espejo que refleja su origen
creador en sí mismo no es nada, el Cusano le atribuye también una alta
relevancia propia acrecentando la fuerza metafórica del espejo intelectual
hasta el punto de que el ‘espejo de la verdad’ absoluto (‘speculum veritatis)
se refleja activamente en él, y haciéndole alcanzar precisamente mediante
ello la ‘filiación’ (‘filiatio’) inmediatamente vinculada con aquél. […]. Es
decir, el espejo finito como punto de arranque de la ‘reflexión’ se vincula
con el espejo absoluto a causa de la fuerza de éste último como modelo
primigenio que se refleja a sí mismo en lo otro. Merced a su propio
reflejamiento (‘speculatio’) comprensivo, el hombre, en tanto que un
espejo ‘viviente’ racional, se hace consciente de su propio fundamento
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NOTAS
como el posibilitamiento del pensamiento y del conocimiento”.
119 De filiatione dei. h. IV Opuscula I. III, n. 67, p. 49, linhas 1-10: Quando
igitur aliquod intellectuale vivum speculum translatum fuerit ad speculum primum
veritatis rectum, in quo veraciter omnia uti sunt absque defectu resplendent, tunc
speculum ipsum veritatis cum omni receptione omnium speculorum se transfundit
in intellectuale vivum speculum, et ipsum tale intellectuale in se recipit specularem
illum radium speculi veritatis in se habentis omnium speculorum veritatem.
Recipit autem suo modo in eodem vero momento aeternitatis vivum illud speculum
quasi oculus vivus, cum receptione luminis resplendentiae primi speculi in eodem
veritatis speculo se uti est intuetur et in se omnia suo quidem modo. Conferir
também: SCHWAETZER, Harald. L’importance d’Eckhart dans la genèse
du concept cuséen de filiatio Dei. In : La naissance de Dieu dans l’âme
chez Eckhart et Nicolas de Cues. Paris : Les Éditions du CERF, 2006, p.
101-120 : La métaphore du miroir a, bien entendu, une longue histoire dans
l’anthropologie, notamment depuis de dialogue L’Alcibiade majeur de Platon.
En ce qui concerne Nicolas de Cues, il faut tenir compte de Bonaventure
qui connaît la notion de miroir accompli (Opera omnia V, Breviloquium,
prologus, lin. 60) et qui désigne la ratio cognoscendi comme un speculum
(ibid., p. 1, c. 8, lin. 21). Le miroir sans tache est le médiateur entre Dieu
et l’intellect humain, voir Collationes de septem donis spiritus sancti, coll. 9 §
5 (Opera omnia, V). Par ailleurs, l’âme (anima-animus) est désignée comme
un speculum pulcherrimum, voir entre autres Collationes in Hexaemeron, Visio
prima, coll. 2 § 25 (Opera omnia VIII). L’image du miroir – y compris celle 282
du miroir intellectuel, qui est assez inhabituelle (ibid. Visio secunda, coll. 4
§ 5) – est mise en oeuvre souvent chez Bonaventure mais elle est reprise
sans être construite systématiquement pour l’anthropologie. Par ailleurs, il
faut narellement se reporter au texte-clé de la tradition néoplatonicienne
chrétienne avec Augustin : De Trinitate XV, 8, 14. Avec ce texte, la métaphore
du miroir est établie comme le modèle de toutes les spéculations des siècles
futurs sur la parenté étymologique supposée entre speculum et speculatio :
‘Hoc erego facere conati sumus ut her hanc imaginem quod nos sumus videremus
utcumque a quo facti sumus tamqum per speculum’. Le miroir et le voir ont paru
ensemble sur les devants de la scène à la Renaissance, notamment avec a
découverte de la perspective centrale ; les réflexions sur l’échelle, l’angle
de vue, la lumière et l’ombre sont courantes, voir par exemple De pictura de
Leon Battista Alberti (éd. par O. Bätschmann et Chr. Schäublin, Darmstadt,
2000). Par la suite, la métaphore du miroir joue un rôle avec l’autoportrait
de Descartes, ‘- et réponses’ (5. – et réponses) ; plus loin encore, Spinoza
critique Bacon qui compare l’intellect à un miroir inégal. Finalement le
‘miroir vivant’ trouve une expression chez Leibniz pour la monade, qui
reflète, de sonpoint de vue, l’ordre global du monde. Après une phase de
dévalorisation de la métaphore du miroir, notamment chez Shaftesbury,
elle revient comme pertinente chez Hegel et Goethe” (108-109, nota 3).
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NOTAS
120 O verbo conduzir deve ser lido a partir da manuductio cusana. Para
esclarecimentos citamos um texto de Beierwaltes (2005, p. 107): “La
convicción, que es común a Dionisio y a Eriúgena, de que el mundo es
‘teofanía’ o manifestación luminosa, un mostrarse de Dios, es el motivo
primario para que el pensamiento se vuelva desde los signos y las
imágenes de este mundo teofánico a su fundamento no manifesto, que
permanece oculto también en las negaciones. En base a su intención de
acercioramiento universal, una reflexión abarcante del hombre sobre las
manifestaciones sensibles de lo inteligible y absoluto no sólo es legítima,
sino incluso objetivamente necesaria –como comienzo– para el ascenso
interior. De este modo el Cusano, como pocos antes y después de él,
practicó el ‘symbolice investigare’ como ejercitación en el concepto sin
imagen y en el trans-ser de Dios que aún lo transciende. La investigación
‘simbólica’, ‘transsumptiva’ y ‘experimentadora’ de la realidad y de su
fundamento se atiene al proyecto no realizado de una ‘teología simbólica’
de Dionisio, que entiende como ‘prestar una ayuda’ o ‘tender la mano’
(ceiragwria, manuductio) que arranca de lo sensible pero que lo reconduce a
lo inteligible. Se basa en la confianza en la fuerza mostrativa, descifradora
de conceptos y de cosas, de una estructura teofánica del mundo; emplea
lo dado sensiblemente, pero también los conceptos y las estructuras de
nuestro pensamiento, como signo, rastro, renitencia, imagen, parábola,
analogía y metáfora para la comprensión del correspondiente fundamento
constitutivo y para el tránsito desde la aproximación afirmativa a la
‘theologia negativa’.” 283
121 D’AMICO, Claudia. El Principio Uno-Intelecto en Nicolás de Cusa. Una
lectura de De Beryllo e De Principio. In: Nicolaus Cusanus. Perspektiven
seiner Geistphilosophie. Regensburg: Roderer Verlag, 2003, p. 15-25.
122 Somente para recordar: a importância dessa questão não se limitou a
determinar o lugar de Nicolau de Cusa no contexto da medievalidade. Todas
as reflexões cusanas estão, reconhece Beierwaltes (2005, p. 11), determinadas
por essa questão e “[...] especialmente suas tentativas de aproximar-se de
um conceito o mais preciso possível de Deus [...]”. Por outro lado, Casarella
(1992) encontra na questão da “linguagem” a possibilidade de pensar
uma relação positiva entre pensamento especulativo e doutrina Cristã
e Duclow (1974), ao interpretar a hermenêutica dos nomes divinos como
uma tarefa filosófico-teológica, situa Nicolau de Cusa, Eriúgena e Dionísio
na orientação geral do pensamento religioso medieval, apontando para
uma convergência de religião e filosofia no platonismo cristão medieval.
Por último, segundo André (1997), são exemplos dessa intrínseca unidade
entre filosofia e teologia tanto a estrutura unitária do De docta ignorantia
sustentada em pressupostos teológicos quanto os nomes divinos non-aliud
e possest, dois conceitos filosóficos, mas que são também uma possível
expressão intelectual para Deus entendido como “Máximo absoluto”.
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NOTAS
123 MARTÍNEZ GÓMEZ, Luis S. J. El hombre ‘mensura rerum’ en Nicolás de
Cusa. In: Pensamiento, vol. 21, Bs. As., 1965, pp. 41-64. O autor consegue
mostrar de forma concisa como os temas da criação e da antropologia se
fundam na concepção trinitária do divino em Nicolau de Cusa: “No es el
hombre meramente el ‘primum’ teleológico, sino tambíen el ‘primum’
gnoseológico. Detrás está toda la concepción neoplatónico-cristiana de la
creación como una revelación de Dios. Todo es revelación; a nivel natural
y a nivel sobrenatural; antes de la gracia, la naturaleza. Lo primero en la
intención creadora es manifestarse, manifestarse a alguien fuera de sí,
porque ‘ad intra’ esa comunicación reveladora tiene lugar en el Verbo,
imagen o revelación substancial del Padre. Justamente esta manifestación
inmanente dentro de la divindad es mirada como tipo de la otra
manifestación extensiva, fuera de Dios en el ámbito de lo creado” (p. 50).
124 ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano. Añoranza e conocimiento de Dios. In: ______.
Pensamiento del ser y espera de Dios. Salamanca: Sigueme, 2004, p. 67-
101 (indicamos especialmente o tópico 5. La naturaleza intelectual ante el
ser inaccesible, p. 80 e seguintes).
125 Cf. BEIERWALTES (2005, p. 89-127): “Conocía, poseía y empleaba [o Cusano]
traducciones latinas de Dionisio, de las que había toda una seria, desde las
del Abad Hilduin de St. Denis (832-34/35): eso lo testimonian los Códices 43,
44 y 45 en su biblioteca de Bernkastel-Kues; otras como la traducción de
Juan Scoto Eriúgena y la de Juan Saraceno (de mediados del siglo XIII), llegó
a conocerlas por vía indirecta, a través de su estudio de los comentadores de 284
Dionisio: la de Hugo de San Víctor, la de Roberto Grosseteste, la de Tomás de
Aquino y la que, para nosotros, es especialmente clara, la de Alberto Magno.
El Cusano proveyó los comentarios de éste a todos los escritos de Dionisio
(excepto a la ‘Ecclesiastica Hierarchia’) con notas al margen que, en parte,
son extensas y aleccionadoras. Se nos han conservado en el Codex Cusanus
96. […]. El Cusano conocía también muy bien la traducción de Dionisio de
su contemporáneo Ambrosio – ‘Camaldulensium generalis’ – del año 1436.
De ella procede, entre otras cosas, la antología de citas de Dionisio en el
capítulo 14 de De non aliud […]”.
126 Cf. Ibid., p. 68: “El Cusano leyó continuamente y a fondo las obras
principales de Proclo: la Elementatio theologica, en la traducción, que Tomás
inició, de Guillermo de Moerbeke (1268), conservada en el Codex Cusanus
195 del Nilolaus-Hospital en Bernkastel-Kues; el comentario al Parménides
de Platón, traducido igualmente por Guillermo de Moerbeke (1280), en
el Codex Cusanus 186; la Theologia Platonis, en la traducción de 1462 que el
propio Cusano encargó a Petrus Balbus Pisanus, en el Codex Cusanus 185”.
Para uma visão mais ampla da presença de Proclo em toda obra cusana:
D’AMICO, Claudia. La recepción del pensamiento de Proclo en la obra de
Nicolás de Cusa. In: Anales del Seminario de Historia de la Filosofía.
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NOTAS
Vol. 26 (2009): 107-134. Cf. ainda: RICCATTI, Carlo. La presenza di Proclo tra
neoplatonismo arabizzante e tradizione dionisiana (Bertoldo di Moosburg
e Niccolò Cusano). In: PIAIA, Gregório (a cura di). Concordia Discors: studi
su Niccolò Cusano e l’umanesimo europeo offerti a Giovanni Santinello.
Padova: Editrice Antenore, 1993, p. 23-38 (especialmente as páginas 23-27).
127 Cf. MACHETTA, M. J. Notas complementarias – 3. Lo máximo y la trinidad.
In: NICOLÁS DE CUSA. Acerca de la docta ignorancia. Libro I: Lo máximo
absoluto (edición bilíngüe). Introducción, traducción y notas de Jorge M.
Machetta y Claudia D’Amico. Buenos Aires: Biblos, 2003, p. 147-159: “Nicolás
encuentra en una determinada tradición teológica la denominación
trinitaria más afín con su precedente especulación acerca de lo máximo
[nos primeiros capítulos do De docta ignorantia]: los términos de unidad,
igualdad y conexión son vigentes en la tradición teológica de la escuela de
Chartres que avalan su propuesta con ocasión de sus comentarios al texto
boeciano apelando a un texto de San Agustín” (2003, p. 149).
128 Cf. BEIERWALTES (2005, p. 32, nota 17): ele sugere que o nome de Duhem
deveria aparecer nas notas explicativas ao De docta ignorantia na edição
crítica de Heidelberg de 1932. Sobre a concepção trinitária do platonismo
de Chartres e a influência sobre Nicolau de Cusa destacamos: “La unión,
de motivación cristiana, de ‘unitas’ y ‘trinitas’ en la ‘sanctissima tri-
unitas’, es un tema que acompaña al Cusano toda su vida. En el contexto
que aquí tenemos especialmente a la vista en De venatione sapientiae, eso
se muestra, entre otras cosas, en que el Cusano continúa inmediatamente 285
sus reflexiones sobre la unidad, o diciéndolo metafóricamente, su caza
de la unidad, en los dos ‘campos’ de la ‘igualdad’ (aequalitas) y del ‘enlace’
(nexus, conexio). No están yuxtapuestas ni se suceden en gradaciones, sino
que se juntan en una tri-unidad abierta en ella misma y para sí misma. La
unidad engendra (fecunda unitas) desde sí misma su ‘Palabra’ como igualdad
que le es esencial, de modo que la igualdad que procede sin tiempo de la
unidad y que se expresa inmediatamente es ‘no otro’ que ella misma.
Esta igualdad con la unidad se realiza como ‘amorosus nexus’ o ‘amorosa
conexio’, como la autorreferencia amorosamente unificante de ambos:
unidad como apertura interna a sí misma y al mismo tiempo como regreso a
sí misma. El ‘enlace’, constitutivo para la unidad tri-una, puede entenderse
‘emocionalmente’ en metáforas como ‘amor’ o como ‘intelectual’, en el
sentido de la speculatio en De non aliud, como movimiento que se autodefine
y que comienza en ella misma y que termina con ella misma, como
realización de una autorreflexión en el concepto que se concibe a sí mismo:
conceptus absolutus. En su teoría de la unidad trinitaria de ‘unitas-aequalitas-
conexio’, el Cusano piensa productivamente, y llevándolos a un alcance
universal, los rasgos de pensamiento que Mario Victorino, San Agustín y
los platónicos de Chartres elaboraron en complejas reflexiones (2005, p. 56-
57). Cf. também: Idem. 1989, p. 187-188: “Sin dagli inizi Cusano ha cercato
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NOTAS
di concepire questa triunitas mediante la triade di unitas-aequalitas-connexio
come l’unità originaria, la quale ‘diviene’ uguale a se stessa nel tertimoniare
del Figlio, della Parola, o produce la propria uguaglianza, ma che ha unito
anche la sua uguaglianza con se stessa all’assoluta uguglianza con se stessa
(aequalitas absoluta). Dunque la processione è già un movimento di ritorno
a sé. Se la processione dell’inizio sino alla sua propria uguaglianza non può
essere pensata come un diventar-altro-da-se-stesso, allora anche l’unione è
identica all’uguaglianza: l’uguaglianza sorta dalla processione proceduta è
il suo proprio movimento di ritorno; oppure: uguaglianza e unione soono
allo stesso modo il compimento dell’unità senza tempo. Poiché l’unità viene
rivendicata per questa triade, le tre fasi della processio senza tempo non
possono essere viste sotto l’aspetto del numero. Come l’Uno non è numero,
ma principio di questo, così anche l’assoluta unità che si apre deve essere
pensata libera dal numero e, quindi, dall’alterità (nel senso di una reciproca
esclusione). Numerare enim est unum ‘alterare’, sed unum et idem triniter
replicare est plurificare sine numero. Nonostante l’unità, deve essere, tuttavia,
accettata una distinzione, che l’unità invero schiude, ma le cui ‘fasi’ non
esclude reciprocamente. Di conseguenza si deve accettare l’accertazione
verbale mediante negazione e paradosso: l’unità trinitaria è alteritas sine
alteritate, quia este alteritas quae identitas”.
129 DUHEM, Pierre. op. cit.
130 Segundo Duhem, poderia parecer que a doutrina sobre o amor, teoria
fundamental nos escritos de Nicolau de Cusa, teria sido copiada (avait éte 286
empruntée) da Teologia de Aristóteles (1909, p. 1). Essa suposição seria também
confirmada no que diz respeito ao termo nexo (connexio – lien) que Nicolau
entende como o Espírito Santo. Pois, como se encontra nos textos de Thierry
de Chartres que Duhem analisara, ele acredita que provavelmente o Cardial
Alemão não estaria mais se inspirando no mestre de Chartres, mas em outras
fontes e a Teologia de Aristóteles pareceria ser uma dessas fontes (1909, p. 5).
Sobre a Teologia de Aristóteles conferir: PSEUDO-ARISTÓTELES. A teologia de
Aristóteles. Tradução do árabe, introdução e notas por Catarina Belo. Obras
Completas de Aristóteles, Volume XIII, Tomo II (Coordenação de Antônio
Pedro Mesquita), Lisboa: Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa. Ed.
INCM (Imprensa Nacional-Casa da Moeda), 2010: na “Introdução” lemos que
“A Teologia de Aristóteles apresenta um caso possivelmente sem paralelo
de um texto de atribuição errônea que teve um impacto decisivo no curso da
história da filosofia, especificamente na filosofia medieval islâmica” (2010,
p. 14). Posteriormente, afirma-se que a obra “é produto do famoso círculo
de tradutores que trabalhavam sob a égide de al-Kindi (m. c. 866) .— em
Bagdade, capital do Califado Abássida .— apelidado ‘o filósofo dos árabes’,
devido à origem árabe da sua família. Al-Kindi é também considerado o
primeiro filósofo muçulmano a ter desenvolvido a sua própria filosofia”
(2010, p. 15). Por fim, na mesma página, indica-se que “a obra consiste na
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NOTAS
tradução, ou adaptação, de excertos das Enéadas de Plotino, especificamente
partes dos livros IV, V e VI, os últimos da obra”. Cf. também TER REEGEN,
Jan G. J. A Metafísica da Teologia do Pseudo-Aristóteles. In: Anales del
Seminario de Historia de la Filosofía. vol. 23 (2006): 59-74. Disponível
em: . Acesso em: 07 de Junho de 2011: “A assim chamada Teologia de
Aristóteles é um documento que surgiu no mundo árabe ao redor dos anos
800 e que se caracteriza basicamente como uma espécie de paráfrase dos
últimos três tratados das Enéadas de Plotino, acrescentadas por trechos
explicativos ou que apresentam algum aspecto novo. Estes tratados
tratam, respectivamente, da Alma, da Inteligência e do Ser Último, também
chamado o Bem ou o Uno”.
131 Tractatus. nh. n.47, p. 200: Hactenus de equalitate unitatis. Nunc quomodo
connexio equalitatis et unitatis ab utraque earum procedat explicandum est
secundum disciplinas propositas. Cf. Também : COUNET, op. cit., p. 86 : “A la fin
du Tractatus de sex dierum operibus, nous voyons qu’il est fait mention d’une
troisième modalité de l’unité, la connexion de l’unité et de l’égalité, mais
le texte que nous possédons s’achève avant que ce dernier point ait été
développé. Il y a néanmoins moyen d’acquérir à ce propos de plus amples
renseignements en recourant aux écrits d’autres membres de l’école,
comme Clarembaud d’Arras qui a été disciple de Thierry et qui reprend
ses conceptions fondamentales. L’unité et l’egalité sont liées l’une à l’autre
par un désir mutuel : l’egalité tend vers l’unité comme vers le terme de la 287
relation qu’elle est en ellemême ; de même l’unité incline à rester ce qu’elle
est, c’est-à-dire à l’égalité avec soi-même. Ce lien de l’amour mutuel porte
le nom de connexion : comme son nom l’indique il relie l’unité et l’égalité,
parachève et consacre la substance unique. Cette connexion est elle-même
antérieure à toute et à ce titre-là, elle est éternelle et ne forme qu’un seul
être avec l’unité et l’égalité”.
132 REINHARDT, Elisabeth. Estudio preliminar. In: THIERRY DE CHARTRES.
Tratado de la obra de los seis días (Tractatus de sex dierum operibus). Estudio
preliminar de Elisabeth Reinhardt. Preámbulo filológico, traducción y
comentario de Maria Pilar García Ruiz. Pamplona/España: EUNSA-Ediciones
Universidad de Navarra, S.A., 2007, p. 13-75. Colección de Pensamiento
Medieval y Renacentista, n. 92.
133 Cf. BEIERWALTES (2005): o autor amplia a visão sobre as fontes cusanas
para a especulação sobre a Trindade e, a partir daí, conclui que existe
“[...] un enlace aún más estrecho, al menos indirecto, de la Edad Media y
el Renacimiento con la Antigüedad griega” (2005, p. 140). Os traços desse
vínculo seriam: Nicolau de Cusa, Platonismo de Chartres, Boécio, Santo
Agostinho e Nicômaco de Gerasa (século II d. C). Acompanhemos os aspectos
principais desse percurso: a) “En el Platonismo de Chartres, sobre todo en la
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NOTAS
figura central, Thierry de Chartres, pero también en su discípulo Clarembald
de Arras, en Juan de Salisbury, en el autor del escrito De septem septenis, y
en Alanus de Insulis, el concepto de ‘aequalitas’, no en último término a
causa de su procedencia aritmológica pitagorizante, alcanzó un significado
eminente para la especulación sobre la Trinidad y para la fundamentación
conceptual de la estructura de orden del cosmos” (2005, p. 130). Em seguida
Beierwaltes cita algumas frases que surgiram de “una interpretación del
De Trinitate de Boecio”. b) Depois, Beierwaltes (2005, p. 138) aponta como
“una de las posibles fuentes de la concepción de la Trinidad de Thierry y,
por tanto, también de la del Cusano, la comprensión de la tríada por parte
de San Agustín, que ostensiblemente él mismo acuñó por vez primera para
la Trinidad: ‘unitas-aequalitas-concordia’ [De doctrina christiana, I, 5,5]”.
c) Por outro lado, ele lembra também que “no menos importante como
precedente histórico y objetivo, y como permanente punto de referencia
de autoridad para el platonismo de Chartres, pero también para el Cusano,
es Boecio” (2005, p. 139). d) Por último, segundo Beierwaltes (2005, p. 140)
tanto Agostinho quanto Boécio “se encuentran en el ámbito de influencia
de la tradición neopitagórica, que trató de radicalizar lo ‘pitagórico’ en el
platonismo. Es seguro que de ella proceden impulsos esenciales para el
significado específico de los conceptos de unitas y de aequalitas, también
para el pensamiento de la unidad que se genera a sí misma. Si se piensa
que, aparte de a otros textos, San Agustín y Boecio tenían acceso a un texto
capital de esta tradición, la Introducción a las matemáticas del pitagórico
platonizante Nicómaco de Gerasa (siglo II p. C.) – que Yamblich, Teo de 288
Smirna y Juan Filopono interpretaron, y que Apuleyo tradujo al latín –,
entonces se amplía la mirada a las fuentes de los chartrianos y del Cusano”.
Pode ser sugestivo, ainda para esclarecer a relação entre Nicolau de Cusa,
Thierry de Chartres e Santo Agostinho e o pitagorismo, sobre a temática da
Trindade as afirmações de Counet (op. cit., p. 87): “[...] ces termes d’unité,
d’égalité, de connexion pour la Trinité sont empruntés par les Chartrains
entre autres à Saint Augustin pour lequel dans le Père est l’unité, dans le
Fils est l’égalité, dans l’Esprit-Saint la concorde de l’unitè et de l’égalitè [De
doctrina christiana, I, 5, PL 34,21]. La connexion sera naturellement associée
à la concorde car le texte d’Augustin contient le terme immédiatement
après”. No parágrafo sucessivo, entretanto, Counet afirma que “Chez
l’évêque de Hippone, cette affirmation dogmatique n’a pas tout le sens
mathématique précis que Thierry et ses successeurs voudront y trouver.
Augustin connaît les spéculations pythagoriciennes sur l’unité mais ne les
applique pas au mystère de la Trinité. L’image par excellence du mystère
de la vie divine, qui nous permet d’en pressentir quelque chose quasi in
speculo et in aenigmate, c’est bien entendu pour Augustin l’âme humaine
avec ses facultés de mémoire et de volonté ; de façon significative la
formule du De Doctrina christiana ne donne pas lieu dans le De Trintate à un
développement thématique”.
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
134 Essa acusação é feita no contexto da primeira conclusão [Omnia cum
Deo coincidunt] do De ignota litteratura (jh. n. 24, p. 102, linhas 19-25).
Lembramos que, em seu texto, Wenck vincula essa conclusão a um contexto
“herético”: Mestre Eckhart e Begardos e Beguinas (jh. n. 24, linhas 26-30;
n. 25, linhas 1-21; p. 102-103). Sobre a Trindade ele afirma (Idem., jh, n.
24, p 103, linhas 22-35): Nec valet probatio conclusionis adductae, quia illa cum
conclusione tolleret penitus benedictam Trinitatem, ex quo in illo maximo absoluto,
quod Deus est, secundum ipsum scribam doctae ignorantiae, nulla est discretio nec
relationis oppositio. Et sic personae in divinis proprietatibus non differrent; et per
consequens in hac docta ignorantia nedum divinarum personarum esset confusio
sed etiam universitatis rerum cum Deo esset essentialis unio. Quod nedum constat
esse contra fidem orthodosam, verum etiam contra semetipsum, qui postea in suo
libro benedictam Trinitatem nititur similitudinibus astruere, qua tamen sua docta
ignorantia praescidit et reliquit. Et si sic est universorum praecisio a Deo ut ipse
asserit in aspectu simplicissimae entitatis essantiae omnium doctissimae ignorantiae,
quomodo ipsemet in hac prima conclusione connectit Deo omnia coincidenter.
135 Apologia doctae ignorantiae. s. n. 35, p. 236, linhas 4-12: Et ego: ‘Quia
nusquam reperitur, dicere non potuit. Legi enim ego quam diligenter et non memini
umquam repperisse, quod omnia cum Deo coincidunt. Repperi bene in secundo
Doctae ignorantiae creaturam non esse Deum nec nihil; neque capio, quid velit
adversarius dicere, neque forte ipse se intelligit. Nam omnia attributa divina
coincidere in Deo et totam theologiam esse in circulo positam, sic quod iustitia in
Deo est bonitas et e converso – ita de reliquis –, necessarium comperi et ita legi; et 289
in hoc concordant omnes sancti, qui ad infinitam Dei simplicitatem respexerunt’.
136 Cf. SANTINELLO, Giovanni. Il pensiero di Niccolò Cusano nella sua
prospettiva estetica. Padova: Liviana, 1958: ao discutir o significado
metafísico-teológico do conceito de harmonia, Santinello (p. 205-211) parte
da seguinte questão: “In che senso si può dire che Dio sia il modello di ogni
armonia? Se l’armonia ha la sua ratio nella composizione e nel numero, sia
pure il numero ontologico, la semplicità divina no esclude per ciò stesso
l’armonia? L’armonia sembra esser proprietà tipica del finito, là dove l’unità
non può esprimersi che nell’alterità e nella composizione” (p. 205). Este
problema se encontrava na tradição neoplatônica (Plotino e Dionísio) e,
segundo Santinello (p. 206), Nicolau o reencontra no comentário ao De divinis
nominibus de Alberto. Entretanto, a resposta de Nicolau a esse problema
é mais radical do que a de Alberto. Vejamos em que termos Santinello (p.
207-208) expõe a radicalidade da resposta cusana: “Dio può dirsi armonia
perché unità che complica tutti i numeri, e quindi tutte le proporzioni
sulle quali l’armonia riposa. Ma, meglio ancora, Dio è armonia perchè
non è unità irrelata, ma unità che si rapporta a se medesima generando
l’eguaglianza dell’unità. Questa relazione assoluta, che è la proporzione
di eguaglianza, è come il modello ideale di ogni proporzione, ed è quindi
costitutiva di una armonia assolutamente perfetta, di cui le armonie create,
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NOTAS
non potendo fondarsi su una proporzione di assoluta eguaglianza, sono
soltanto partecipazioni imperfette. Soluzione questa che s’avvcina, in certo
qual modo, a quella di Alberto, il quale aveva voluto trovare nella semplicità
divina una qualche radice della molteplicità proporzionata. Ma è anche più
radicale, perchè, mentre Alberto guardava agli attributi di Dio che, in certo
qual modo, sono meno essenziali a Dio, in quanto risultano in lui distinti solo
rispetto alle creature, il Cusano guarda all’essenza stessa di Dio, che è unità
nella trinità delle persone, che è semplicità nell’eguaglianza delle relazioni”.
137 Apologia doctae ignorantiae. s. n. 36, p. 236-238: Cum hoc tamen stat
superbenedicta Trinitas. Infinita enim simplicitas admittit ita Deum unum esse
quod est trinus, ita trinum quod est unus, sicut clarius illud in libellis Doctae
ignorantiae explicatur. Legitur consimiliter Coelestinum Papam in professione
fidei sic dixisse: “Profitemur nos credere indivisibilem sanctam Trinitatem, hoc
est Patrem et Filium et Spiritum sanctum, ita unum ut trinum et ita trinum ut
unum.” Ecce, quomodo penitus nullum habet intellectum in theologicis, qui ad
coincidentiam unitatis et trinitatis non respicit; nec ex hoc sequitur Patrem esse
Filium vel Spiritum sanctum. Et non potest hoc pervenire ad hominem durae
cervicis, quomodo scilicet in coincidentia summae simplicitatis et indivisibilitatis
atque unitatis et trinitatis alia sit persona Patris, alia Filii, alia Spiritus sancti; et
obsunt ei vocabula, quorum significata theologiae non conveniunt.
138 Segundo Hopkins, para R. Klibansky, estas palavras não se encontram
nos textos de Agostinho. Porém, afirma ele, o significado corresponde a
De Trinitate VI, 7; VI, 10 e VIII, 1 (1988, p. 92, nota 81). Sobre a identidade 290
desse “commentator Boethii De Trinitate”: Santinello (1980, p. 238, nota 66)
refere-se ao Pseudo-Beda (Commentarium in Boethii de trinitate, PL, XCV, 404
b); Hopkins (1988, p. 92, nota 82), refere-se ao Commentarius in Librum Boethii
de Trinitate de Thierry de Chartres (PL 95: 404). Por outro lado, Counet (op.
cit., p. 85), após considerar que a afinidade entre Nicolau de Cusa e a Escola
de Chartres não se restringe à doutrina da complicatio e explicatio e que ela
pode ser ainda maior afirma que “la doctrine trinitaire de Nicolas remonte
elle aussi pour l’essentiel à cette même école”. No parágrafo seguinte, ele
afirma ainda que “Il [o Cusano] a lu avec profit des Commentaires sur le De
Trinitate de Boèce mais aussi le De opere sex dierum libellus, au point que
Duhem avait accusé en son temps l’autur de la Docte Ignorance de plagier
son illustre prédécesseur pour la doctrine trinitaire”. Para justificar a sua
afirmação de que Nicolau teria lido os comentários sobre o De Trinitate
de Boécio, Counet (2000, p. 85, nota 1) afirma que “E. Jeauneau voit une
allusion à cette dette intellectuelle dans l’Apologie de la Docte Ignorance, où
Nicolas parle de façon élogiuese d’un commentateur du De Trinitate de Boèce
qu’il a lu (‘vir facile omnium quos legerim ingenio clarissimus’) et il le cite
comme autorité pour le fait qu’il n’y a pas d’alterité séparée et distincte
de l’unité dans la Trinté. Pour Jeauneau, le commentateur en question est
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NOTAS
Thierry. [...]. Mais F. Bertin, dans sa traduction de l’ouvrage [...] l’identifie
plutôt avec pseudo-Bède”. González Ríos (op. cit., p. 36-46), ao apresentar
a dimensão dialógica da obra de Nicolau de Cusa e, especificamente, ao
mostrar o diálogo com a tradição, afirma que o próprio Cusano oferece, com
relação às fontes da tradição com as quais ele dialoga, múltiplas referências
em suas obras. Porém, no Apologia doctae ignorantiae ele faz uma ampla
memória das suas influências. Particularmente ao tratar sobre a Trindade,
Nicolau evocaria o Commentarium in Librum Boethii de Trinitate de Thierry de
Chartres e mencionaria diversas vezes Santo Agostinho sobre esse e outros
temas (p. 45-46).
139 De docta ignorantia. w. L. I, cap. V, n. 13, p. 20, linhas 8-9: [...] cum nomina
his attributa sint rationis motu, quae quadam proportione excedens admittunt aut
excessum. (A douta ignorância. L. I, cap. V, n. 13, p. 11).
140 Apologia doctae ignorantiae. s. n. 37, p. 238, linhas 1-23: Cum enim
dicitur Patrem unam esse personam et Filium alteram et Spiritum sanctum tertiam,
non potest alteritas significatum suum tenere, cum sit haec dictio imposita, ut
significet alteritatem ab unitate divisam et distinctam; et ita non est alteritas sine
numero. Talis autem alteritas nequaquam indivisibili Trinitati convenire potest.
Unde ait commentator Boethii De Trinitate, vir facile omnium, quos legerim,
ingenio clarissimus: ‘Ex quo in divinis non est numerus, ubi trinitas est unitas –
ubi, ut Augustinus ait, si incipis numerare, incipis errare –, tunc proprie non est
differentia in divinis.’ Dicit ‘proprie’ secundum impositionem vocabuli; et hoc
melius intelligitur quam dici possit, licet numquam adeo perfecte intelligatur, 291
quin perfectius sit intelligibile. Necesse est, ut se elevet quisque supra omnes
modos imaginabiles et intelligibiles, qui ad divinum modum scandere cupit. Nam
ille modus, qui est omnis modi modus, non attingitur nisi supra omnem modum,
cum nihil simile ei cadere possit in mentem nostram, ut Paulus Actuum XVII.
elegantissime dixit. Quis enim modum concipere possit discretum indiscrete, ut
ait Athanasius, ‘neque confundentes personas neque substantiam separantes’?
Sunt enim omnes similitudines, quas sancti ponunt, etiam divinissimus Dionysius,
penitus improportionales et omnibus non habentibus doctam ignorantiam – huius
scilicet scientiam, quod sunt penitus improportionales, – potius inutiles quam utiles.
141 Referimo-nos de modo especial ao Apologia doctae ignorantiae e ao De
venatione sapientiae.
142 De venatione sapientiae. h. XII, Prefacio: Itaque librum De venatione
sapientaie scriptum esse autumno anni 1462 vel Chianciani vel Castro Plebis
concludimus. (p. XIII). Sobre as razões que levaram os editores a determinarem
esta data, ver as páginas X-XIII.
143 FLASCH, Kurt. Nikolaus von Kues: Geschichte einer Entwicklung.
Vorlesungen zur Einführung in seine Philosophie. Frankfurt 1998: “Um die
Jahreswende 1462/1463 schrieb Cusanus sein philosophisches Testament.
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Er nannte es: Die Jagd nach der Weisheit. Er meinte damit seine lebenslange
Suche nach Wahrheit. In diesem Buch wollte er seine Jagdbeute kenntlich
machen für die, die nach ihm kämen. Er will jetzt festhalten, was er gefunden
hat” (p. 603); cf. também: ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano. Concordancia en la
diferencia según Nicolás de Cusa. In: ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano; ANDRÉ,
João Maria. Coincidencia de Opuestos y Concordia: Los Caminos del
Pensamiento en Nicolás de Cusa. Actas del Congreso Internacional
celebrado en Coimbra y Salamanca los días 5 a 9 de noviembre de 2001.
Tomo II. Salamanca: Sociedad Castellano-Leonesa de Filosofía, 2002, p.
17-36: ele também considera o De venatione sapientiae como o “testamento
filosófico” de Nicolau de Cusa (2002, p. 18).
144 De venatione sapientiae. h. XII. Prologus libri de venatione sapientiae. n.
1, p. 3-4.
145 Ibid., h. XII. cap. XI, n. 30, p. 30, linhas 7-10: De tribus regionibus et decem
campis sapientiae: “Decem vero puto campos venationi sapientiae plurimum
aptos: Primum nomino doctam ignorantiam, secundum possest, tertium non aliud,
quartum lucis, quintum laudis, sextum unitatis, septimum aequalitatis, octavum
conexionis, nonum termini, decimum ordinis.
146 Cf. REINHARDT, Klaus. L’action de l’Esprit Saint dans l’Église d’après
Nicolas de Cues. In : VANNIER, Marie-Anne (sous la direction de). La
prédication et l’Église chez Eckhart et Nicolaus de Cues. Paris : Les
Éditions du CERF, 2008, p. 215-226 : segundo o autor, é um procedimento 292
tipicamente cusano conciliar duas maneiras de ver, a saber, a maneira bíblica
e a maneira especulativa: “Typiquement dans sa façon de faire, il concilie
l’une avec l’autre deux manières de voir, à savoir, la manière biblique, qui
désigne l’Esprit Saint comme le Paraclet envoyé par le Christ, et la manière
spéculative, qui part des traces du Dieu Trine dans la création” (2008, p. 217).
147 De venatione sapientiae. h. XII. cap. VIII, n. 22, p. 23-24 linhas 12-22: Sed
divini nostri theologi revelatione superna didicerunt primam causam, cum omnium
assertione sit tricausalis, scilicet efficiens, formalis et finalis, quae per Platonem
unum et bonum, per Aristotelem intellectus et ens entium nominatur, esse sic unam
quod trina et ita trinam quod una. Quae cum sit causa efficiens, vocatur iuxta
Platonem unitas, et sit causa formalis, iuxta Aristotelem entitas, et sit causa finalis,
iuxta utrosque bonitas. Verum quomodo haec sacratissima trinitas in unitate,
quae intelligibile omne omnemque quantitatem continuam et discretam, numerum
omnem et alteritatem antecedit, hic in aenigmate per fidelem videri possit, inferius,
ut deus dederit, adnotabo. Ainda sobre a tricausalidade da causa primeira ver
também: a) De venatione sapientiae. h. XII. cap. VII, n. 18, p. 19 linhas 10-
19; b) De aequalitate. h. X. Opuscula II. Fasciculus 1. n. 18, p. 24-25, linhas 15-
20; c) De docta ignorantia. w. L. II, cap. IX, n. 150, p. 76; d) De beryllo. h.XI1.
n. 17, p. 20-21. Para o texto latino do De aequalitate cf.: NICOLAI DE CUSA.
De aequalitate. Opera omnia. Iussu et auctoritate Academiae Litterarum
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NOTAS
Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. X, Opuscula II, Fasciculus 1,
Hamburg: Felix Meiner, 2001; cf. também: NICOLÁS DE CUSA. La igualdad.
In: Anuário Filosófico, 1995 (28) p. 755-781. Disponível em: . Acesso em: 08 de Outubro de 2009.
148 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XXI, n. 59, p. 56, linhas 3-5: Aurelius
Augustinus dum sapientiam venari niteretur, in libello De ordine scribit omnium
philosophorum considerationem circa unum versari.
149 Em nota os editores da edição crítica do De venatione sapientiae comentam:
In libris De Trinitate Augustinus appropriatione ternaria unitatis fecundae,
aequalitatis generantis, amoris conectentis non usus est; attamen filium
aequalitatem aeternitatis [...], spiritum sanctum caritatem [...] nominavit (n. 63,
19sq., p. 60). Os editores remetem para os termos unitas, aequalitas, concordia
que se encontram no De doctrina christiana e também para os comentários de
Thierry de Chartres ao De trinitate de Boécio.
150 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XXI, n. 63, p. 60-61, linhas 18-23:
Venationes igitur in hoc unitatis campo sapidas facit, qui – ut fecit Augustinus in
libro De trinitate – unitatem fecundam de se aequalitatem generantem et amorem
conectentem ab unitate ‘et’ aequalitate procedentem videt sic in aeternitate, quod
sunt ipsa simplicissima aeternitas.
151 Ibid., h. XII. Prologus, n. 1, p. 4, linhas 18-19: Sollicitamur appetitu naturae
nostrae indito ad non solum scientiam, sed sapientiam seu sapidam scientiam 293
[negrito nosso] habendum.
152 Ibid., h. XII. cap. XI, n. 30, p. 4, linhas 3-6: [...] tres sunt regiones sapientiae:
Prima, in qua ipsa reperitur, uti est aeternaliter. Secunda, in qua reperitur in
perpetua similitudine. Tertia, in qua in temporali fluxu similitudinis lucet a remotis.
153 Ibid., h. XII. cap. XXIII, n. 70, p. 67, linhas 7-9: Nam aequalitas est verbum
illud ipsius non aliud, scilicet dei creatoris se et omnia dicentis et diffinientis.
154 Ibid., h. XII. cap. XXIII, n. 70, p. 68, linhas 10-15: Omnia igitur inter se
inaequalia aequalitatem quasi cuiuslibet essendi formam participant, et in hoc
aequalia sunt; et quia illam inaequaliter participant, inaequalia sunt. Concordant
igitur pariter et differunt omnia. Quaecumque species, sicut est unitas uniens
in se omnia suae speciei, ita et aequalitas aequaliter unita formans; similiter et
omnium nexus.
155 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 68-69, linhas 7-8: Sicut enim divisio procedit
a pluralitate et inaequalitate, sic amorosus nexus ab unitate et aequalitate.
156 Ibid., h. XII. cap. XXVI, n. 74, p. 71-72, linhas 3-6: Nunc vero subiciam
manuductionem unam mathematicam, ut videas trinitatem praemissam, cum
sit unitas, id esse quod esse potest, licet omnem intellectum antecedat et non nisi
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NOTAS
incomprehensibiliter comprehendatur per omnem humanam mentem;
157 Ibid., h. XII. cap. XXVI, n. 76, p. 74, linhas 14-19: Sic quilibet est aequalis
alteri et aequalis aliis duobus et aequalis omnibus tribus; essetque
omnium figurarum figurabilium complicatio, ut principium, et resolutio, ut finis
atque mensura praecisissima. Constat igitur, si posse fieri sic perficeretur, quod
penitus ad actu esse deduceretur ut foret possest, illa sic necessario evenirent. E
após reconhecer que o possest é anterior a tudo que é sensível, inteligível e
finito ele conclui que In omnibus enim illis, quae concipi possunt, non reperitur
trinitas, quae unitas, sive unitas, quae trinitas (Ibid., h. XII. cap. XXVI, n. 77,
p. 75, linhas 15-16).
158 “Poder ser feito” pretende ser a tradução de “posse fieri”. Como esse
termo cusano aparecerá em outros contextos da nossa pesquisa, pareceu-
nos importante recordar que o próprio Nicolau, no De venatione sapientiae
(h. XII, cap. VI, n. 14, linhas 3-7), adverte sobre a dificuldade de se formar
um conceito do posse fieri: Erit, qui haec legerit, non dubium occupatus, ut posse
fieri concipiat. Et hoc ideo difficile, quoniam posse fieri non terminatur nisi in suo
principio. Quomodo igitur formari posset conceptus de eo quod interminabile? Ne
tamen penitus aberres, rudi quodam exemplo succurram. Cf. ANDRÉ (2010, p. 32-
33): Nessa conferência, André busca mostrar que o “caminho” percorrido por
Nicolau de Cusa na “caça” dos nomes divinos, que o leva até o “posse ipsum”,
parece ser o caminho “del pasaje progresivo de la hermenéutica de la finitud
a la metafísica de lo posible” (p. 16). A orientação para a “metafísica do
possível”, que é também uma “metafísica do poder”, mostrar-se-á “con toda 294
claridad cuando el autor centre su reflexión en estas tres expresiones (posse
facere, posse fieri, posse factum) y en el concepto que, de hecho, las sostiene,
que es el concepto de posse” (p. 33). Segundo André no De venatione sapientiae,
“lo que constituyen la base de indagación venatoria y de la respectiva
reflexión hermenéutica es el mundo de la finitud, no exactamente en tanto
finitud, sino en su tensión hacia lo que la funda y hacia su principio. Esa base
es dada por la expresión que el autor encuentra en la frase de Aristóteles “lo
que es imposible de ser hecho, no es hecho” [Aristóteles, Physica, VIII, 265
a 19; Nicolás de Cusa, De venatione sapientiae, cap. 2, n. 6]. Es así que el poder
se hecho, el posse fieri, pasa aquí a primer plano no como nombre de Dios,
sino como punto de partida para transitar desde la posibilidad que se oculta
por detrás de las cosas visibles hacia el poder que hace pasar al posse factum.
El posse fieri es el descubrimiento del campo del poder desde lo que no es
un poder absoluto, como el posse facere, ni un poder ya concreado, como el
posse factum y, por eso, no es eterno como el primero, ni contraídamente
temporal como el segundo, sino perpetuo, es decir situado en una especie
de ‘entretiempo’ o di ‘entreespacio’. Así, desde las criaturas, Nicolás de Cusa
investiga las condiciones de su posibilidad. Esas condiciones de posibilidad
las encuentra, para las criaturas en el concepto de posse fieri, y para el que
actúa como principio de ese posse fieri, en el posse facere, que asume en esta
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NOTAS
obra el papel de sustituir a los anteriores nombres divinos, a tal punto de
dar de él la misma definición, que, en el De possest y en el De docta ignorantia,
era dada a lo Máximo: ‘El poder hacer, siendo anterior al poder ser hecho,
no es ni hecho, ni puede ser hecho de modo diferente. Él es, pues, todo lo
que puede ser’ [De venatione sapientiae, cap. 39, n. 115]”. Cf. também: Nota
de Hopkins a sua tradução do De venatione sapientiae: “Where Nicholas uses
“posse-fieri” as a noun, without an ensuing predicate, I prefer to hyphenate
both it and its English translation. I here (viz., in VS [De venatione sapientiae])
render the expression, almost always, as “the possibility-of-being-made”
because this rendering better befits the context of God’s creating all things
from posse-fieri. […]. The English word “possibility,” therefore, must (in the
context of VS, where “posse-fieri” is not a name for God) be construed by the
reader as conveying the idea of power and of passive potency. Furthermore,
the translation “the possibility-of-being-made” corresponds better to the
translation of “posse-facere” as “the possibility-of-making”; posse-facere
ontologically precedes posse-fieri, Nicholas states in VS 39 (115:8). As the
ultimate Causal Beginning of everything, God is posse-facere; and He is possest
(Actualized-possibility), says Nicholas [VS 13 (35:13-14)]. Accordingly, He is
all that He can be – in the sense that He is eternal and cannot be other than
He is. But He is also all that can be – in the sense that no finite being can
exist unless, ultimately considered, it is derived from Him as Creator and
unless it is at every moment sustained in existence by Him as Ground-of-
being. VS 28 (83:13-14). In DM [Idiota. De mente] 11 (131) Nicholas uses “posse
fieri” to refer to the first member of the Trinity. In that context posse fieri 295
is said to be prior to (though not ontologically or chronologically prior to)
posse facere (the second member of the Trinity) (1988, nota 19, p. 1358).
159 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 69, linhas 12-14: Aeterna
enim unitas, aeterna ipsius aequalitas aeternusque utriusque nexus non sunt plura
divisa aeterna, sed ipsa aeternitas implurificabilis et penitus indivisibilis et inalterabilis.
160 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 69, linhas 12-14: Et licet unitas generans
non sit aequalitas ab ea genita nec nexus ab eo procedens, tamen non est aliud
unitas, aliud aequalitas, aliud nexus, cum sint non aliud, quod aliud antecedit.
Sicut igitur aeterna unitas, quae id est quod esse potest, uniter in se omnia
complicat et aequalitas omnia aequaliter, ita et nexus utriusque omnia in se nectit.
Anteriormente no campo non aliud Nicolau recordava que neste campo se
pode colher aquele que é uno e trino: Vides nunc aeternum illud antiquissimum
in eo campo dulcissima venatione quaeri posse. Nam cum sit sui ipsius et omnium
aliorum diffinitio, non reperitur in alio aliquo clarius quam in li non aliud. Attingis
enim in eo campo antiquissimum trinum et unum, qui et sui ipsius diffinitio. Nam
non aliud est non aliud quam non aliud. Miratur de hoc secreto intellectus, quando
attente advertit trinitatem, sine qua deus se ipsum non diffinit, esse unitatem, quia
diffinitio diffinitum. Deus igitur trinus et unus est diffinitio se et omnia diffiniens.
Reperit igitur intellectus deum non esse aliud ab alio, quia ipsum aliud diffinit.
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NOTAS
Sublato enim li non aliud non manet li aliud. Oportet enim aliud, si esse debet, esse
non aliud quam aliud; alias esset aliud quam aliud, et ita non esset. Non aliud igitur
cum sit ante aliud, non potest fieri aliud et est actu omne, quod simpliciter esse
potest (Ibid., h. XII. cap. XIV, n. 40, p. 39-40, linhas 8-21).
161 Ibid., h. XII. cap. XXI, n. 63, p. 60, linhas 1-6: Videntur philosophi venatores
in omni eorum discursu ex hoc sensibili mundo et his quae illi necessaria sunt, ut id
sit quod est, meliori modo quo hoc fieri potest, de deo, de diis, de caelo et eius motu
et fato, intelligentiis, spiritibus et ideis atque ipsa natura inquirere, [...].
162 Ibid., h. XII. cap. XXI, n. 59, p. 57, linha 10: [...] ante enim omnem
multitudinem unitas.
163 Ibid., h. XII. cap. XXIII, n. 68, p. 66, linhas 3-6: Aequalitas enim, quae id est quod
esse potest, cum sit ante aliud et inaequale, non reperitur nisi in regione aeternitatis.
164 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 68, linhas 3-5: Nunc in campo nexus
venationem facientes attendimus ante omnem divisionem nexum constitui.
165 Glossa Super Librum Boethii de S. Trinitate. nh. V, 29, p. 323 : [...] quia
est unitas et sui aequalitas atque amor quidam et connexio, [...].
166 Ibid., nh. v, 17, p. 319-320 : Hanc Trinitatem in rebus singulis investigat
Augustinus in libro De Trinitate et secundum physicam doctrinam invenit
pondus, mensuram et numerum trinitatem in rebus singulis. Quod evidenter docet
Claudianus Mamertus in eo capitulo in quo de numero et pondere et mensura
animae et Dei agit. Unde huc quia transferre doctrinam potes, quomodo hoc sit 296
praetermitto. Tractatur autem tripliciter de Trinitade praeter hunc modum:
theologice, mathematice, ethice. Ethica autem consideratio fidem, spem, caritatem
pro trinitate attendit, cuius et theologice studiosi sunt investigatores theologi.
Mathematicam super hanc rem doctrinam non addit nisi Augustinus dicens
unitatem esse in Patre et eiusdem unitatis aequalitatem in Filio atque unitatis
aequalitatisque connexionem et amorem in Spiritu sancto. (V, 17, p. 319-320).
Cf. também Lectiones in Boethii librum De Trinitate. nh. VII, 5, p. 222 :
Tribus enim modis de Trinitate loquimur : theologice scilicet, mathematice et
ethice. Et Augustinus quidem mathematice dicit quod in Patre est unitas, in
Filio aequalitas, in Spiritu sancto unitatis aequalitatisque conexio. Cf. De
doctrina christiana, 1, 5, 5: In Patre unitas, in Filio aequalitas, in Spiritu Sancto
unitatis aequalitatisque concordia. Et tria haec unum omnia propter Patrem,
aequalia omnia propter Filium, connexa omnia propter Spiritum Sanctum. Cf. De
trinitate V, 10, 12: “Haec igitur omnia quae arte divina facta sunt et unitatem
quamdam in se ostendunt et speciem et ordinem. [...]. Oportet igitur ut Creatorem
per ea quae facta sunt intellecta conspicientes Trinitatem intellegamus, cuius
in creatura quomodo dignum est apparet vestigium”.
167 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 68-69, linhas 7-8:
Sicut enim divisio procedit a pluralitate et inaequalitate, sic amorosus nexus ab
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NOTAS
unitate et aequalitate.
168 Ibid., h. XII. cap. XXV, n. 73, p. 71, linhas 24-28: Hoc pauci philosophi
cognoverunt. Principium enim conexionis, sine quo nihil subsistit et omnis
intellectualis natura felicitate careret, non reperitur eos cognovisse. Sed quia in illo
defecerunt, veram sapientiam non attigerunt. Alibi multa de hoc, in variis etiam
sermonibus, dixi et scripsi, quae sic recapitulasse sufficit. A edição crítica indica
em notas os Sermões CIX, CLXV, CCLXXVI, CCLXXX.
1691 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 71, p. 68-69: Nunc in campo nexus venationem
facientes attendimus ante omnem divisionem nexum constitui. Hunc igitur
indivisibilem videmus aeternitatem id esse, quod esse potest, posse fieri
praecedentem, rectissime ab aeterna unitate et eius aequalitate procedentem.
Sicut enim divisio procedit a pluralitate et inaequalitate, sic amorosus nexus ab
unitate et aequalitate. Quae cum sint ante pluralitatem in indivisibili simplicissima
aeternitate, erit similiter et ipsorum nexus aeternus. Sunt igitur unitas et ab ipsa
genita aequalitas atque utriusque nexus ante posse fieri et pluralitatem divisivam
simplex aeternitas. Aeterna enim unitas, aeterna ipsius aequalitas aeternusque
utriusque nexus non sunt plura divisa aeterna, sed ipsa aeternitas implurificabilis
et penitus indivisibilis et inalterabilis. Et licet unitas generans non sit aequalitas ab
ea genita nec nexus ab eo procedens, tamen non est aliud unitas, aliud aequalitas,
aliud nexus, cum sint non aliud, quod aliud antecedit. Sicut igitur aeterna unitas,
quae id est quod esse potest, uniter in se omnia complicat et aequalitas omnia
aequaliter, ita et nexus utriusque omnia in se nectit. 297
170 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 72, p. 69-70, linhas 1-4; 7-15: Omnia igitur quae
sunt, quia ab hac aeterna trinitate – quae sic nominatur, licet minus proprie
– id sunt quod sunt, video trinitatem imitari. In quolibet enim video unitatem,
entitatem et utriusque nexum, ut sit actu id quod est: [...] . Non est igitur aliud
omne exsistens nisi unitas et eius aequalitas, quae et entitas, et utriusque nexus.
Unitas est fluxibilitatis constrictio, aequalitas uniti et constricti formatio, nexus
utriusque amorosa conexio. Posse fieri, nisi ab uniente a sua confusa fluxibilitate
constringeretur, non esset capax pulchritudinis sive speciei aut formae. Et quia
constringitur per unitatem omnia ad finem operantem, ideo generatur forma ab
ipsa unitate, quam talis constrictio requirit seu meretur. Quare ex his procedit
utriusque nexus amorosus.
171 Ibid., h. XII. cap. XXIV, n. 73, p. 70, linhas 3-6: Iam vides amorem, qui
nexus est unitatis et entitatis, naturalissimum esse. Procedit enim ex unitate et
aequalitate, quae sunt eius principium naturalissimum. Ab illis enim spiratur
nexus, in quo desideriosissime conectuntur.
172 Ibid., h. XII. cap. XXV, n. 73, p. 70, linhas 6-10: Nihil igitur illius amoris expers,
sine quo nec quicquam persisteret. Omnia igitur penetrat invisibilis conexionis spiritus.
Omnes mundi partes intra se hoc spiritu conservantur et toti mundo conectuntur. Hic
est spiritus animam corpori conectens, quo exspirato cessat vivificatio.
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NOTAS
173 Cf. NICOLAI DE CUSA. Idiota. De sapientia. In: Opera omnia. Iussu et
auctoritate Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita.
vol. V. Hamburg: Felix Meiner, 1983, p. 2-80. Nesse texto, encontraremos
nesses números a relação entre a sabedoria e sabor (Sapientia est, quae sapit,
qua nihil dulcius intellectui) e também a ideia de que o intelecto é incitado a
mover-se para a sabedoria por meio das coisas nas quais ela resplandece.
Assim, por meio de uma pregustação, o intelecto move-se para a sabedoria
como para sua própria vida (ad eam ut ad propriam vitam suam movetur)
(Idiota de Sapientia. h.V. Liber Primus, n. 10-11, p. 17-22.)
174 Apresentemos algumas divergências quanto à tradução e compreensão
dessa parte do parágrafo 73: a frase em latim diz: Intellectualis natura
numquam privabitur spiritu tali conexionis, cum ipsa sit spiritualis naturae (De
venatione sapientiae h. XII. cap. XXV, n. 73, p. 70, linhas 11-12). Hopkins
(Chapter Twenty-five, n. 73, p. 1324) traduz: “The intellectual nature will
never be deprived of such a spirit-of-union, since that union is [the union] of
an immaterial nature”. E justifica em nota (nota 213, p. 1371) a sua tradução:
“Here at 73:12 I take “ipsa” to refer to “conexio” rather than to “natura”. The
expression “ipsa … spiritualis naturae” (73:12) parallels the expression “nexus …
intellectualis naturae” (73:15-16). Nicholas uses “nexus,” “unio,” and “conexio”
interchangeably. Cf. DI I, 10 (28:14 and 19), where he twice writes “unio sive
conexio.” In DI II, 7 (130:8) the Holy Spirit is referred to as nexus infinitus. In
DI I, 9 (26:2-3) the Holy Spirit is referred to as conexio. Similarly, whereas VS
25 (73:7-8) speaks of an invisible conexionis spiritus that binds together the 298
parts of the world, DI II, 12 (174:11-12) speaks of a spiritus unionis which unites
the essential parts of the world”. Em alemão teríamos: “Die Vernunftnatur
wird niemals eines solchen Geistes der Vereinigung entbehren, da sie selbst
geistiger Natur ist” (n. 73, p. 107). Vescovini assim traduz para o italiano:
“La natura intellettuale non è mai priva di questo spirito di connessione, in
quanto è essa stessa natura spirituale” (cap. XXV, p. 981).
175 A mesma ideia encontra-se também formulada no Idiota de Sapientia
(h. V. Liber Primus, n. 18, p. 37-41) no qual Nicolau antecipa a ideia viva imago
que será amplamente explicitada no Idiota. De mente: Haec enim eius assimilatio,
quae spiritui nostro naturaliter inest, per quam non quietatur nisi in ipsa sapientia,
est quasi viva imago eius. Non enim quietatur imago nisi in eo, cuius est imago, a quo
habet principium, medium et finem. Viva autem imago per vitam ex se motum exserit
ad exemplar, in quo solum quiescit. Vita enim imaginis non potest in se quiescere,
cum sit vita vitae veritatis et non sua. Hinc movetur ad exemplar ut ad veritatem sui
esse. Si igitur exemplar est aeternum et imago habet vitam, in qua praegustat suum
exemplar et sic desideriose ad ipsum movetur, et cum motus ille vitalis non possit
quiescere nisi in infinita vita, quae est aeterna sapientia, hinc non potest cessare
spiritualis ille motus, qui numquam infinitam vitam infinite attingit. Semper enim
gaudiosissimo desiderio movetur, ut attingat quod numquam de delectabilitate
attactus fastiditur. Est enim sapientia cibus saporosissimus, qui satiando desiderium
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NOTAS
sumendi non diminuit, ut in aeterna cibatione numquam cesset delectari.
176 Iluminador para este contexto seria o De filiatione dei.
177 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XXV, n. 73, p. 70-71, linhas 11-
23: Intellectualis natura numquam privabitur spiritu tali conexionis, cum ipsa
sit spiritualis naturae. Unitas enim et entitas intellectualis naturae intellectuales
cum sint, intellectuali nexu constringuntur. Nexus vero amoris intellectualis non
potest deficere nec exspirare, cum intelligere pascatur immortali sapientia. Nexus
igitur naturalis intellectualis naturae ad sapientiam inclinatae ipsam naturam
intellectualem non solum, ut sit, conservat, sed ad id, quod naturaliter amat, ut
illi conectatur, adaptat. Spiritus igitur sapientiae in spiritum intellectus, ut
desideratum in desiderans, secundum fervorem desiderii descendit et convertit
spiritum intelligentiae ad se, qui ei amore nectitur, – ‘ignis instar’, ut ait Dionysius,
quae ‘sibi unita iuxta singulorum aptitudinem’ assimilat. Et in hoc amoris
nexu felicitatur intellectus et vivit feliciter.” Sobre a dialética entre desejo e
conhecimento: Cf. ANDRÉ (1997, p. 85ss): nesse contexto, o autor interpreta
(nota 36) “desiderium’ como uma espécie de “saudade de Deus” a partir do
termo “añoranza” de origem catalã utilizado por Mariano Álvarez Gomez.
Recorda também que “Volkmann-Schluck, por seu lado, vê nesse mesmo
‘desiderium’, que traduz por ‘Sehnsucht’, aquilo que determina a situação a
partir da qual Nicolau de Cusa pensa a essência do ser”. A mesma ideia será
repetida por ele (ANDRÉ, 2005, p. 38). Cf. também: BAUCHWITZ (2006, p. 27):
“Como pensa Martinez-Gómez, primeiro vem o desejo de saber deus, depois
o meio para melhor sabê-lo, com toda a ambiguidade que nossa língua e o 299
latim mesmo carregam (sapere, saborear) (MARTINEZ GÓMEZ, 1965, p. 82).
Sem nenhum anelo metódico, e nem sequer com alguma dramaticidade
existencialista, como desarraigo ou nihilismo, a tendência natural para
deus, esse desejo de sabê-lo, vem provocada, como sugere Alvarez-Gómez,
por uma espécie de ‘saudade’ (añoranza), um sentimento e uma vontade de
saber daquele que se quer”.
178 Cf. BEIERWALTES (2005, p. 67-88); D’AMICO, Claudia. Unum neque idem
neque alterum: novedad y tradición en las nociones cusanas de identidad y
alteridad. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia (Editores). Nicolás de
Cusa: identidad y alteridad. Pensamiento y diálogo. Buenos Aires: Biblos,
2010, p. 249-260; D’AMICO (2009, p. 107-134; 2003, p. 15-25); MACHETTA,
Jorge M. La noción de Principio en Nicolás de Cusa a partir del comentario
al Parménides de Proclo. In: DE BONO, Luis A.; PICH, Roberto Hofmeister
(Orgs.). A recepção do pensamento greco-romano, árabe e judaico pelo
Ocidente Medieval. Porto Alegre, PUCRS, 2004, p. 689-704.
179 SANTINELLO, Giovanni. L’uomo “ad imaginem et similitudinem”
nel Cusano. Estrato da Doctor Seraphicus. Nº XXXVII, Marzo 1990, p.
85-97 – Bollettino d’informazioni del Centro di studi Bonaventuriani –
Bognoregio (Viterbo).
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NOTAS
180 Cf. também: BEIERWALTES (2005, p. 86-87): aqui ele esclarece a
diferença entre o Uno de Proclo e o non-aliud de Nicolau de Cusa da
seguinte forma: “A pesar de los impulsos que le llegan al Cusano de la
teoría de lo uno de Proclo, a pesar de la afinidad conceptual del Cusano
con el pensamiento neoplatónico, mediante la cual su identificación del
origen divino (principium) con la unidad absoluta se fortaleció y quedó
apremiosamente determinada en múltiplos sentidos específicos, queda
la diferencia fundamental […] entre lo uno primero de Proclo: el contexto
cristiano, sobre todo la necesidad de reflexionar sobre la Trinidad (también
en la conceptualidad filosófica), exige el concepto de relacionalidad. Este es
constitutivo para el engendramiento interno de lo primero en lo segundo
igual a él y en el enlace de ambos como autopensamiento sin tiempo (que se
fundamenta a sí mismo) y como amor unificante: Padre-Hijo-Espíritu Santo
como unidad de ‘unitas-aequalitas-nexus o conexio’. Frente a la exclusión
procliana del pensamiento y, por tanto, también del pensarse a sí mismo
de lo uno mismo –el Cusano era muy consciente de este supuesto –, está
el ‘non aliud’ trinitario como ‘concepto absoluto, ‘conceptus absolutus’. La
‘triunitas’ divina se evidencia para el Cusano (conforme a la máxima de su
Directio speculantis) como la autofundamentación que se ‘define’ a sí misma
y que en esta autodefinición (pensada ontológicamente) se mueve hacia sí
misma –con el pensamiento y con el amor–. En ella el autodespliegue es
‘no otro’ que la autounificación con el ‘comienzo’ proprio del movimiento.
Ciertamente, la auto-‘diferenciación’ que se realiza en este movimiento
no hay que entenderla –como en un uno no pensante– como una alteridad 300
‘adicional’ que se separa realmente, que perturba y que destruye la
unidad, sino como la autoapertura, que no permite en absoluto la escisión
ni el opuesto, del no-otro primero en el no-otro (segundo) no distinto de
aquél, merced a la mediación del no-otro tercero que los fusiona a ambos
en la trinunidad absoluta. Así, la frase que ‘repite tres veces lo mismo’
(‘idem triniter repetitum) se corresponde exactamente con el proceso
del autodespliegue trinitario y del ser que ‘consiste’ en él o mediante él:
como una forma lingüística captable ya inmediatamente de modo sensible,
que conduce como símbolo al pensamiento supremo que se muestra en
ella: ‘non aliud est non aliud quam non aliud’: en la fundamentación aquí
indicada, todo menos una tautología vacía” (p. 86-87). Por sua vez, Claudia
D’Amico, no momento da “discusión” logo após a sua conferência durante o
“II Congreso Internacional Cusano de Latinoamérica” realizado em Buenos
Aires em 2008, afirma: “La diferencia entre la noción de Trinidad Cristiana
sobre el principio uno simplísimo, es la posibilidad de concebir una relación
sin alteridad y que a la vez resulte explicativa. Porque no solamente es
principio de la indistinción de los seres, de su no-otredad, sino que también
es principio de su distinción de su otredad. Entonces me parece que lo
que quise mostrar […] es una sola idea: la inspiración es neoplatónica en
cuanto se concibe un principio Uno más allá de los opuestos, etc. del cual
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NOTAS
procede la pluralidad como mostración de la unidad en la pluralidad o en la
alteridad, pero esto es completado con la noción de Trindad cristiana que le
resulta muchísimo más explicativa que el principio Uno del neoplatonismo”
(2010, p. 260). No mesmo Congresso Internacional, mas agora no momento
da “discusión” ao final da apresentação de Victoria Arroche (El tema de la
Trinidad en el De pace fidei de Nicolás de Cusa. In: MACHETTA, Jorge M.;
D’AMICO, Claudia (Editores). Nicolás de Cusa: identidad y alteridad.
Pensamiento y diálogo. Buenos Aires: Biblos, 2010, p. 405-416) a Prof. Claudia
D’Amico insiste: “La diversidad es un hecho, no hay que pensar si existe o
no existe. El mundo se nos presenta como idéntico y otro al mismo tiempo;
en ese sentido la trinidad es un principio explicativo de ambos aspectos
porque la trinidad es principio de la indistinción de los seres y principio
de su distinción. Las críticas a la noción de lo uno neoplatónica, tiene que
ver con esto. La noción de trinidad es más explicativa de la diversidad que
la de unidad” (p. 415). Cf. também: D’AMICO, Claudia. Nicolás de Cusa:
tempo, participación y alteridad. In: REEGEN, Jan G. J. ter; DE BONI, Luis A.;
COSTA, Marcos Roberto N. (Org.) Tempo e Eternidade na Idade Média.
Porto Alegre: EST Edições, 2007, p. 125-130: nesse artigo, a autora discute
a questão da relação entre tempo e eternidade no pensamento cusano por
meio dos conceitos de participação e de alteridade. Reconhece que a noção
de alteridade não é alheia à tradição platônica e neoplatônica: desde o Sofista
de Platão, passando pela reelaboração de Plotino e de Proclo, ela alcança o
neoplatonismo cristão. Porém, para Plotino e Proclo, “el nous, posterior a
lo uno, es el ámbito de la identidad-alteridad, precisamente por tratarse de 301
la unidad vuelta hacia sí misma como un ‘otro’. El neoplatonismo cristiano
ha subsumido el nous neoplatónico en la Trindad, sin embargo cabe señalar
que ha expulsado la alteridad fuera de la mente divina. Sólo la mente divina
resulta el principio o forma de ser de todo y la alteridad se encuentra del
lado de la mutabilidad, la materia, la potencia”. No parágrafo seguinte,
ela afirma que “en este peculiar neoplatonismo cristiano debe inscribirse
el pensamiento cusano en este punto: para Nicolás de Cusa, el principio
eterno excluye de sí toda alteridad” (p. 126). Cf. ainda: ANDRÉ (1997, p.
165-166): “Não há duvida de que na abordagem do Máximo como Uno estão
profundamente os motivos de inspiração neoplatônica do seu pensamento:
o uno parece ter um primado sobre o ser. Ao reconhecer esse primado,
Nicolau de Cusa filia-se claramente na tradição plotiniana, procliana e
dionisiana. Todavia, enquanto o uno de Plotino é um uno sem conteúdo
que o possa configurar, e deve ser compreendido de um modo inteiramente
negativo, o Uno cusano, pensado a partir da coincidência dos opostos,
embora seja inconceptualizável, é incompreensivelmente comprendido
como unidade supra-coincidencial que, devido a esse facto, é uma unidade
que não se opõe à multiplicidade nem sequer à distinção entre a unidade e
a multiplicidade, na medida em que é uma unidade que, na sua simplicidade
absoluta, abraça a própria multiplicidade numa total plenitude de sentido”.
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NOTAS
181 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XIX, n. 57, p. 76, linhas 18-20: Nam
ubi distinctio est indistinctio, trinitas est unitas; et e converso, ubi indistinctio est
distinctio, unitas est trinitas. (A douta ignorância. L. I, cap. XIX, n. 57, p. 43).
182 Para manter o italiano: “ma la sua traccia è rintracciabile”.
183 Conferir também o tópico “Ver absoluto como unidade trinitária” (1989,
p. 182-192), no qual Beierwaltes reafirma a distinção entre o conceito
cusano de unidade absoluta e o conceito neoplatônico de Uno. Enquanto
esse exclui qualquer tipo de multiplicidade e diferença, a “unidade que
se compreende por reflexão” e também “compreende o que dela surge”
é em certo sentido “unità in o nonostante la differenza”. Essa modificação
no conceito de unidade é consequência da transformação do conceito de
princípio e de Uno neoplatônico, em parte devido à teologia cristã (p. 183).
Beierwaltes (p. 183 e seguintes) tenta uma aproximação a essa gama de
problemas que se desdobra na especulação cusana através do De principio
e do De visione dei. No primeiro, teríamos um conceito de unidade que se
estabelece a partir de um “intenso estudo de Proclo” e, no segundo texto,
um conceito de unidade reflexiva cuja estrutura é trinitária. Embora no De
visione dei, o princípio, “mesmo sem uma ligação direta com o pensamento
neoplatônico, particularmente o procliano”, seja concebido como “o Uno
(necessário)”, como “o fundamento que não pode ser determinado”, “o
nada de tudo e ao mesmo tempo o ser em sentido eminente e absoluto” ou
também como “pura unidade ou como absoluta simplicidade”, mas a sua
unidade não se constitui de um modo tal que exclua a “relazionalità”, como 302
no contexto procliano; “pelo contrário, é e vive justamente desta” (p. 185).
184 De filiatione dei. h. IV Opuscula I. I, n. 53, p. 40, linhas 8-15: Et haec est
sufficientia ipsa, quam ex deo habet virtus nostra intellectualis, quae ponitur per
excitationem divini verbi in actu apud credentes. Qui enim non credit, nequaquam
ascendet, sed se ipsum iudicavit ascendere non posse sibi ipsi viam praecludendo.
Nihil enim sine fide attingitur, quae primo in itinere viatorem collocat. In tantum
igitur nostra vis animae potest sursum ad perfectionem intellectus scandere, quantum
ipsa credit. Non est igitur usque ad dei filiationem ascensus prohibitus, si fides adest.
185 André (1997, p. 169) considera que é por uma “determinação interna” do
sistema filosófico cusano, e não por uma “exigência de natureza externa”,
que a “[...] dimensão trinitária é incluída na natureza do próprio Máximo”.
Assim, segundo ele, “é por isso que o De docta ignorantia, após ter tematizado
a coincidência, a unidade e a necessidade como características do Máximo,
passa de imediato à abordagem da sua dimensão trinitária, no seu modo de ser
para-si, configurando-o primeiro filosoficamente como unidade, igualdade
e nexo, para só mais tarde operar a identificação desta configuração com a
tradicional nomenclatura teológica de Pai, Filho e Espírito Santo”.
186 O princípio de que o uno se exterioriza no mundo, mas permanece
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NOTAS
em si mesmo inalcançável no sentido de que essa exteriorização não
suprime sua plenitude e sua unidade “determina, segundo Beierwaltes,
fundamentalmente toda a teologia filosófica ou filosofia teológica do
Cusano, é a forma fundamental da compreensão global neoplatônica, e, a
partir dela, também a de Dionísio”. Porém, frente a esse “neoplatonismo
genuíno” se pode articular a “intenção cristã”: “de modo limitado, pero
también determinado por su forma conceptual, el concepto de creación;
ciertamente de modo más decisivo, el pensamiento relacionalmente
estructurado de la Trinidad; y de modo incomparable la excepcional verdad
de la Encarnación de Cristo” (2005, p. 115).
187 A generalidade da posição de Santinello (1958), que compreende a
unidade platônica e neoplatônica como uma “unidade irrelata e inconexa”,
necessitaria ser averiguada com mais precisão. Porém, esse trabalho
excederia os objetivos mais específicos da nossa pesquisa. Por outro lado,
é necessário compreendermos que a posição do autor italiano não se
contrapõe a ideia de que todas as coisas provenham da superabundância
do Uno. Pois, a exteriorização do Uno no mundo e, ao mesmo tempo, a sua
inalcançabilidade, tendo em vista a sua transcendência, não serão negadas
pelo Cusano, mas assumida. A ‘novidade’ da especulação cusana frente àquela
neoplatônica, sugerida por Santinello (1990, 1958), Beierwaltes (2005, 1989)
e D’Amico (2009, 2003), limitar-se-ia ao fato de Nicolau pensar o próprio Uno
como uma unidade em si mesma relacional a partir do dogma trinitário.
Para a diferença entre o Uno plotiniano e o Uno cusaniano: Cf. André (1997, 303
p. 165-166). O mesmo autor também insiste na diferença entre a concepção
de Deus “como princípio autorreflexivo de todas as coisas” e a concepção
plotiniana do Uno: no primeiro caso, “o ‘ser divino’, com uma inspiração
simultaneamente bíblica e aristotélica, entendido como pensamento, deve
necessariamente ser ‘pensamento de pensamento’, ou seja, autorreflexão
absoluta. O pensamento não existe senão como atividade pensante e, como
atividade pensante, implica sempre a correlação a algo que, numa unidade
principal, não pode ser senão ele próprio: Deus pensa-se a si próprio,
é o seu próprio pensamento, ou seja, é pensamento de pensamento”. No
segundo caso, “o neoplatonismo plotiniano, na busca de uma unidade
absolutamente anterior a qualquer multiplicidade, desdobra este princípio
em duas realidades ontológicas: o Uno e Nou/j radicando na segunda
instância a dinâmica diferenciadora do primeiro princípio aristotélico. O
Uno seria assim plena identidade e o Nou/j comportaria uma identidade na
diferença ou uma identidade apesar da diferença. Nicolau de Cusa, todavia,
sob a influência do nominalismo da escola okchamiana, não pode aceitar a
existência de instâncias intermédias entre o princípio fundante de todas as
coisas e a multiplicidade que as caracteriza, não podendo simultaneamente
aceitar uma pluralidade de exemplares ou ideias, a partir das quais essa
multiplicidade teria sido constituída. O pressuposto cristão da ‘creatio ex
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nihilo’ a isso o determina. No entanto, encontra na radicalidade filosófica
subjacente à teoria da Trindade, que antes dele havia sido formulada por
Mário Vitorino, e na tematização de Agostinho e de Escoto Eriúgena da
criação profundamente configurada por tais pressupostos trinitários,
a possibilidade de cruzar a unidade desdobrada do primeiro princípio
aristotélico com a multiplicidade platónica das ideias e com a produtividade
diferenciadora do Nou/j plotiniano, numa teoria do Logos ou do Verbo divino
que se repercute no que poderíamos chamar uma concepção intelectualista
da Trindade, [...]” (1997, p. 171-172). Por último, gostaríamos de fazer
referência à ideia da superabundância do Uno plotiniano. Cf. PIGLER, Agnès.
La surabondance de l’Un puissance de toutes choses chez Plotin. In: Laval
théologique et philosophique, vol. 59, n 2, 2003, p. 257-277. Disponível
em: . Agnès Pigler afirma que
a natureza dessa superabundância coloca ao exegeta “un redoutable
problème”: “À la source de la procession il y a, en effet, d’une part, une
discontinuité entre le Premier et les hypostases dérivées, puisque l’Un n’est
rien de ce qu’il donne, puisqu’il est au-delà de ses dons, en tant qu’absolue
transcendance, absolue altérité, et en tant qu’il reste en lui-même dans sa
vénérable immobilité. Et il y a, d’autre part, une continuité du Principe à
ses engendrés, dans la mesure où son énergie dérivée est comme son image,
comme une trace assurant le processus dynamique-érotique qui se transmet
aux êtres inférieurs moyennant la conversion de ceux-ci vers le supérieur.
Affronter le problème de cette dualité apparemment irréconciliable,
c’est rechercher pourquoi l’Un surabonde, quelle est la nature de cette 304
surabondance et comment cette surabondance peut être au fondement de
la procession.” (2003, p. 257). Para mostrar o quanto a posição cusana de
uma unidade em si mesma relacional se distancia da concepção plotiniana
do Uno, poderíamos recordar o que Pigle (2003, p. 275) chama de “principe
métaphysique qui régit la procession des hypostases”, um princípio segundo
o qual “ce qui vient après quelque chose est toujours inférieur eu égard à ce
dont il procède. La vie de l’Âme, bien que venant du, est donc inférieure à la
vie de celui-ci, ce qui signifie qu’elle a moins d’unité que cette vie, laquelle
est elle-même sans commune mesure avec la Vie intime de l’Un. En acte
donc, la vie de l’Âme a moins d’unité que la vie de l’Intelligence, dans la
mesure même où la vie de la seconde hypostase est coïncidence de l’être
et de la pensée, et est donc unité. La vie de l’Âme, quant à elle, est unité
et multiplicité, car elle ne parvient jamais tout à fait à réaliser sous l’unité
la multiplicité qui est en elle”. Tal grau de inferioridade e, portanto, de
alteridade não seria pensável na unitrinidade divina. Portanto, o problema
não se concentra na ideia de superabundância do Uno e na sua relação de
transcendência e imanência com a multiplicidade. Mas, no modo como
Nicolau de Cusa, embora pensando a unidade neoplatonicamente, a pensa
como uma unidade trina.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
188 Cf. NICOLAI DE CUSA. Tu qui es “De pincipio”. Opera omnia. Iussu et
auctoritate Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita.
Vol. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. Hamburg: Felix Meiner, 1983: Et sicut negat
unum, quod asserit omnia ut omnium causa, non subsistere per se, sed esse melius
et ante omne per se subsistens, sic etiam de omnibus; nam sic ait unum non esse, sed
esse ante omnia, quae sunt, et non esse in loco vel tempore, sed ante omnia localia
et temporalia; ita de omnibus, quoniam ante omnem affirmationem et negationem.
Et in hoc recte dicit, quia ante et melius omnibus, de quibus fieri possunt locutiones
affirmativae vel negativae. (n. 24, p. 34-35, linhas 7-14).
189 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 24, p. 33-34, linhas 1-7: Proclus
autem dicit primo hoc nomen authypostaton convenire tantum ut causae per se
subsistentium, ut hominis per se subsistentis, quia aeternus. Causam dicit ipsum
unum, regem scilicet omnium sive deum deorum; species enim et alia, quae
ponit aeterna et ideo per se subsistere, in primo ut in causa et fonte complicari et
explicata in aeternitate asserit, uti in mundo sensibili temporaliter et sensibiliter,
ita in aeternali aeternaliter et intellectualiter.
190 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 25, p. 35-36, linhas 1-4: Sed quod
plura possint esse sibi coaeterna tribus suis hypostasibus exceptis non bene dixit,
cum idem sit aeternum et aeternitas, quae plurificari nequit sicut nec unum; ideo
uti unum imparticipabile, ne sit minus unum et multiplicabile. Cf. D’Amico (2009,
p. 125): “Sin embargo, el Cusano establece una objeción al sistema de Proclo:
la multiplicación de instancias en la eternidad. Considero que esta objeción
se propone enfatizar que, a diferencia de lo que sostiene Proclo, la eternidad 305
implica unicidad y que la Trinidad cristiana no pone en riesgo tal unicidad”.
191 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. p. 3. Nicolau está seguindo
o texto da Vulgata cuja tradução é contestada. Se tomarmos a tradução da
Bíblia de Jerusalém, então, teríamos: “Diziam-lhe então: ‘Quem és tu?’ Jesus
lhes disse: ‘O que vos digo, desde o começo”. Segundo os editores da Bíblia
de Jerusalém, “a tradução da Vulgata: ‘(Eu sou) o Princípio, eu que vos falo’ é,
gramaticalmente insustentável” (nota f, p. 2007).
192 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 16, p. 19-20, linhas 1-8:
Unde si advertis haec verba evangelii, ubi ait Iesus: ‘principium qui et loquor vobis’,
sunt ipsa lux intelligentiae; loquitur enim verbum caro factum, hoc scilicet verbum,
quod et deus, qui principium, loquitur sensibiliter. Et non est difficile hoc capere,
scilicet quod aeterna essendi ratio in his, quae ipsum sunt sensibiliter, loquatur
sensibiliter. Loqui est revelare seu manifestare. Omne igitur subsistens, cum sit, ab
eo est, quod per se subsistit, quod est ratio substantiae eius, et locutio est sui ipsius
revelatio sive manifestatio.
193 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 2, p. 3: Primum igitur investigemus,
si est principium. Plato, prout Proclus in commentariis Parmenidis scribit, asseruit
hunc mundum ex seniori causa in esse prodiisse, nam partibile non potest per se
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NOTAS
subsistere; quod enim per se subsistit, hoc est quod esse potest. Partibile autem, cum
possit partiri, potest non esse. Unde cum, quantum est de se, possit partiri et non
esse, patet quod non est per se subsistens sive authypostaton.
194 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 8, p. 9, linhas 18-22: Hoc unum
necessarium vocatur deus, ut dicebatur Israeli: ‘Audi Israel, deus tuus unus est’, et
est pater Iesu, ut ipse ait ad Iudaeos: ‘Pater meus, quem vos deum dicitis’. De quo
actuum 4. Ille est ipsa unitas, quae et autounum, per se scilicet unum, licet melius
sit omni nominabili et authypostato, ut infra dicetur. No que diz respeito a este
último aspecto, podem citar outros textos a partir do próprio De principio
dentre os quais destacamos dois: Deum autem dicimus unum, quo melius
cogitari nequit, et non intrat in nostram cogitationem aliquid melius esse eo, quod
ab omnibus nobis desideratur. Hinc unum et bonum ipsum deum dicimus; nec illa
sunt in ipso diversa, sed sunt ipsum unum, quod autounum Proclus nominat. (n. 26,
p. 39, linhas 16-20); Non multa igitur omnium principium omnia complicat, sicut
negativa praegnans dicitur affirmationis, scilicet ut non esse dicit sic non esse, ut
per esse significatur, sed melius esse. (n. 34, p. 49, linhas 24-26).
195 Cf. D’AMICO (2003, p. 24): “[…] puede establecerse claramente en qué
medida en Nicolás de Cusa la metafísica del Uno-Intelecto de raigambre
neoplatónica sólo debe ser entendida en relación con su concepción
filosófico-teológica de la Trinidad y su visión Cristocéntrica. He aquí el
plus que añade Nicolás al neoplatonismo: el Principio es uno, es intelecto,
es unitrino, y se ha revelado en Jesuscristo. Sólo desde esta perspectiva
profundizada del neoplatonismo cristiano pueden ser entendidos 306
incomprensiblemente Dios, el hombre y el mundo”.
196 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 9, p. 10, linhas 1-2: Et
non possumus negare, quin se intelligat, cum melius sit se intelligente. Machetta
(2004, p. 697) sugere que é neste ponto que se pode mostrar a diferença
entre a reflexão procliana e a proposta cusana, “[...] para quien el principio
no puede no ser intelectual”. Além disso, o autor considera que, para Proclo,
o uno é “princípio de conhecimento”, mas esta afirmação não implica que
o uno seja cognoscente, mas deve ser entendida a partir do fato de que o
uno é “causa do intelecto”. Para Machetta, o texto acima citado deve ser
traduzido como segue: “Dado que el entenderse a sí mismo es mejor, no
podemos negar que él se entiende a sí mismo”. Em nota, ele afirma que a sua
tradução se distancia da tradução proposta pela edição alemã que citaremos
em seguida: “Para ellos la proposición cusana debe ser leída en la misma
línea del pensamiento de Proclo. Por lo cual el principio, porque trasciende
el conocerse a sí mismo, no se conoce a sí mismo: ‘Wir müssen auch
verneinen, dass es sich erkennt, weil er das sich Erkennende traszendiert’,
dice la traducción propuesta. Pero en nota remite a las explicaciones dadas
en la Introducción, donde arguye que el imperfecto conocimiento del
latín por parte de Nicolás le llevo a escribir lo contrario de lo que quería
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
expresar y entonces lee: ‘Wir können auch nicht verneinen, dass es sich
nicht erkennt, weil es das Erkennende traszendiert, que es, evidentemente,
una formulación contrapuesta a la aducida en la traducción. Por nuestra
parte fundamos la traducción en tres argumentos. Primero, ‘se intelligente’
lo entendemos como ablativo absoluto que expresa la acción verbal sin
diferencias y el melius no rige por tanto al ‘se intelligente’ sino que indica
un nivel ontológico mejor, como en los textos inmediatamente siguiente
este mismo término es entendido. Tampoco comprendemos porque se
traduce ‘melius’ por ‘trascender’. Por otra parte el contexto inmediatamente
siguiente a esta proposición que encabeza la reflexión cusana está dedicado
el carácter intelectual del principio: ‘et ideo rationem sui seu diffinitionem
seu logon de se generat’, todo ello dicho en un nivel trinitario de igualdad
de la esencia como veremos. Si insistimos en esto no es porque se carece
de otros textos elocuentes, los hay y en abundancia, sino porque desde esta
proposición inicial se inaugura la consideración del principio intelectual que
abre camino a la explicación trinitaria y a la legitimidad del nombre principio
para Cristo” (nota 38, p. 697). Parece-nos convincente a opção de tradução
de Machetta, pois coloca a afirmação cusana dentro do contexto que engloba
os parágrafos nono ao vigésimo terceiro. Vejamos outras propostas de
tradução: NIKOLAUS VON KUES. Tu qui es ‘De principio’. In : Philosophisch-
Theologische Werke. Band III. Felix Meiner Verlag: Hamburg, 2002, p.
1-74: “Wir müssen auch verneinen, dass es sich erkennt, weil er das sich
Erkennende traszendiert” (n. 9, p. 9); NICHOLAS OF CUSA. De principio (On
the Beginning). In: Nicholas of Cusa: Metaphysical speculations. Six Latin 307
Texts Translated into English By Jasper Hopkins. The Arthur J. Banning
Press: Minneapolis, 1998, p. 878-911. Disponível em: : “Moreover, we cannot deny that God
understands Himself, since He is better than one who understands himself”.
(n. 9, p. 882). Em nota Hopkins justifica a sua posição: “God is not less
perfect than is a mind that understands itself. So Nicholas does not refuse
to ascribe understanding to God. But he ascribes it (metaphorically) per
viam eminentiae, while claiming that we cannot conceive positively of what
God’s understanding is like, because it is not like anything in our possible
experience or imagination (nota 28, p. 904); NICOLÁS DE CUSA. El Principio.
Introducción, traducción y notas de Miguel Angel Leyra. Navarra: Eurograf.
S.L., 1994 (Cuadernos de Anuario Filosófico): “No podemos negar que se
conozca a sí mismo, aunque sea superior al autoconocimiento”. NICOLAS
DE CUES. Le Principe (1459). In : Trois traités sur la docte ignorance et la
coïncidence des opposés. Introduction, traduction, notes et commentaires
par Francis Bertin. Paris : Les éditions du CERF, 2007, p. 131-182. Sagesses
chrétiennes : “Nous ne pouvons pas non plus nier qu’il se connaisse lui-
même, quoiqu’il transcende l’auto-conneissance”. (n. 9, p. 137); NICOLÒ
CUSANO. Il principio. In: Opere filosofiche di Nicolò Cusano. A cura di
Graziella Federici-Vescovini. U.T.E.T : Torino/Italia, 1972, p. 719-744:
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
“Non possiamo negare che egli conosca se stesso, perché è meglio essere
intelligente di sé” (n. 9, p. 725).
197 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 9, p. 10, linhas 2-10: Et
ideo rationem sui seu diffinitionem seu logon de se generat. Quae diffinitio est ratio,
in qua se unum necessarium intelligit et omnia, quae unitate constringuntur et fieri
possunt. Et logon est consubstantiale verbum seu ratio diffiniti patris se diffinientis,
in se omne diffinibile complicans, cum nihil sine ratione unius necessarii diffiniri
possit. Sicut igitur Christus aiebat patrem in se vitam habere, ita dedit et filio in
se vitam habere. Habere autem in divinis est esse. Est igitur filius vita vivificans
sicut pater, eiusdem scilicet naturae et essentiae. Cf. De aequalitate. h. X,
Opuscula II, Fasciculus 1, n. 7, p. 10-11: Ac si intellectuale praesuppositum seu
principium de se generaret suiipsius verbum, rationem seu notionem. Notitia enim
illa foret consubstantialis similitudo eius, quia foret ratio intellectualis naturae
sicut intellectuale praesuppositum, in qua ‘figura substantiae’ sive principium
seu praesuppositum clarificatur. Alias sine ratione tali remaneret sibi et omnibus
praesuppositum incognitum. Ex quibus procedit utriusque amor seu voluntas. Nam
amor sequitur cognitionem et cognitum – nihil enim incognitum amatur – et relucet
in opere eius rationali, scilicet syllogistico, et maxime in primo modo primae figurae.
198 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 10, p. 11-12, linhas
1-8:“Et ne haesites filium esse principium, adverte principium esse aeternum,
cum sit principium, et quod omnia, quae videntur in aeternitate, sunt aeternitas.
Tunc vides quod non potest esse principium in aeternitate sine principiato in
aeternitate. Videre autem principiatum in aeternitate est videre ipsum in principio. 308
Unde principiatum est principium principiatum. Et scias quod aeternitas non est
consideranda quasi quaedam extensa duratio, sed uti tota simul essentia, quae
et principium. O conceito de eternidade assumido nesse parágrafo será
retomado no contexto da crítica a posição de Proclo de haver afirmado que
muitas coisas podiam ser coeternas. Para Nicolau, muitos erraram por terem
considerado a eternidade como uma duração sucessiva, ainda que infinita:
Unde circa aeternitatem, quam quidem durationem successivam licet infinitam
putarunt, videntur plures errasse. Sed qui principium considerat aeternitatem et in
ipso ut principio et causa esse omnia ipsum unum principium, ille videt, ubi veritas
[...]. (n. 25, p. 36, linhas 4-8).
199 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 10, p. 13, linhas 15-16: Vides igitur
principium sine principio et principium de principio.
200 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 11, p. 13-15, linhas 3-16: Et ita vides
principium et principiatum principium et principiatum principii utriusque esse
unam aeternitatis essentiam, quam Plato vocat unum. Nec videtur hoc incredibile;
nam videmus in natura temporali principium sine principio, scilicet paternitatem,
et principiatum principium filiationem et principiatum utriusque, scilicet nexum
amoris a principio utriusque procedentem, et quod, sicut principium generationis
sine principio est temporale, sic et principium de principio est temporale. Similiter
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NOTAS
est temporalis primus amoris nexus ab utroque procedens; prima enim amicitia
seu primus naturalis amoris nexus est patris et filii. Sicut igitur ista in tempore
videmus, ita et verissime in aeternitate esse non immerito credimus, cum tempus se
habet ad aeternitatem sicut imago ad exemplar et ea, quae in tempore, similiter se
habent ad ea, quae in aeternitate.
201 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 14, p. 16-17: Hanc trinitatem,
quam Christiani credunt, utique Platonici fatentur, qui plures ponunt trinitates
et ideo ante omnes unam aeternam, sicut ante omne temporale aeternum, ut ante
hominem temporalem aeternum. Dicunt autem et Peripatetici idem de prima causa,
quam tricausalem fatentur. Sic Iudaei deo aeterno tribuunt unum, intellectum et
spiritum, et Sarraceni similiter aeterno deo tribuunt unum, intellectum et animam,
ut patet ex libris eorum, de quibus alias dictum est.
202 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 17, p. 21, linhas 1-3: Diceres: cum
statim Christus de patre suo loquatur, ut habet evangelium, mirum est quomodo se
dicat principium, qui fatetur se filium.
203 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 18, p. 22, linhas 1-3: Adhuc forte
cogitas, an authypostaton conveniat verbo; et videtur quod sic; sequitur enim in
evangelio: ‘tunc scietis quia ego sum’. Solum per se subsistens veraciter dicere
potest: ego sum.
204 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 13, p. 15-16, linhas 1-5; 7-15:
Diceres: turbat audientem, quando dicis principii esse principium; hoc enim
nullus philosophorum admittit, ne procedatur sic in infinitum et sublata sit omnis 309
veritatis inquisitio, quando ad primum principium pertingi non posset. Dico non
esse inconveniens principii esse principium in aeternitate; [...]; in aeternitate
autem sic est, quod aeternum est aeternitas et principiatum principium. Ideo non
plus inconvenienter dicitur principium principii quam principium principiati,
neque transire in infinitum hoc impedit, cum hoc sit in infinito actu; aeternitas
enim, quae est tota simul, non est nisi infinitas actu. Sed ubi contractum non est
idem cum absoluto, ibi verum est id, quod philosophi dicunt, scilicet quod termini
non sit terminus, ut humanitatis non sit humanitas, quia numquam deveniretur
ad principium, cum infinitum nequeat pertransiri. Também no De aequalitate,
Nicolau enfrenta a mesma objeção: Cf. De aequalitate. h. X, Opuscula II,
Fasciculus I, n. 21, p. 28, linhas 8-17: Diceres: Nonne verbum se intelligit? Et
si sic: In verbo igitur seu logo de se genito se intelligit. Ita erit verbum verbum
generans in infinitum. Dico: Sicut memoria se intelligit in verbo suo, sic et verbum
se intelligit in memoria, non quod memoria sit verbum verbi, sicut cum filius se in
patre filium intelligit, non ut a se genito, sed ut in suo principio. Memoria igitur
se et omnia intelligit in verbo a se genito. Verbum vero se et omnia intelligit, quia
verbum seu ratio intellectualis genita in se omnia complicans, sicut pater in filio suo
se noscit patrem et filius in patre suo se noscit filium.
205 De venatione sapientiae. h. XII. cap. XV, n. 73, p. 71, linhas 27-28: Alibi
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NOTAS
multa de hoc, in variis etiam sermonibus, dixi et scripsi, quae sic recapitulasse sufficit.
206 De docta ignorantia. w. L. I, n. 1, p. 2-4, linhas 6-8; 11-18; 25-29:
Admirabitur et recte maximum tuum et iam probatissimum ingenium, quid sibi
hoc velit quod, dum meas barbaras ineptias incautius pandere attempto, [...] et
post omnium Latinorum scriptorum, qui hactenus claruerunt, supremam notitiam
et nunc Graecorum etiam ad meum istum fortassis ineptissimum conceptum tituli
novitate trahi possis, qui tibi, qualis ingenio sim, iam dudum notissimus existo.
Sed haec admiratio, non quod prius incognitum hic insertum putes, sed potius qua
audacia ad de docta ignorantia tractandum ductus sim, animum tuum sciendi
peravidum spero visendum alliciet. [...]. Quam ob rem, praeceptorum unice, pro
tua humanitate aliquid digni hic latitare existimes, et ex Germano in rebus divinis
talem qualem ratiocinandi modum suscipe, quem mihi labor ingens admodum
gratissimum fecit. (A douta ignorância. L. I, n. 1, p. 1-2).
207 Ibid., w. L. I, cap. I, n. 2, p. 6, linhas 3-15: Divino munere omnibus in
rebus naturale quoddam desiderium inesse conspicimus, ut sint meliori quidem
modo, quo hoc cuiusque naturae patitur conditio, atque ad hunc finem operari
instrumentaque habere opportuna, quibus iudicium connatum est conveniens
proposito cognoscendi, ne sit frustra appetitus et in amato pondere propriae
naturae quietem attingere possit. Quod si fortassis secus contingat, hoc ex accidenti
evenire necesse est, ut dum infirmitas gustum aut opinio rationem seducit. Quam ob
rem sanum liberum intellectum verum, quod insatiabiliter indito discursu cuncta
perlustrando attingere cupit, apprehensum amoroso amplexu cognoscere dicimus
non dubitantes verissimum illud esse, cui omnis sana mens nequit dissentire. (Ibid., 310
L. I, cap. I, n. 2, p. 3).
208 Ibid., w. L. I, cap. I, n. 2, p. 6, linhas 16-18: Omnes autem investigantes in
comparatione praesuppositi certi proportionabiliter incertum iudicant; comparativa
igitur est omnis inquisitio, medio proportionis utens. (Ibid., L. I, cap. I, n. 2, p. 3).
209 Ibid., w. L. I, cap. I, n. 3, p. 6-7: Omnis igitur inquisitio in comparativa
proportione facili vel difficili existit; propter quod infinitum ut infinitum, cum
omnem proportionem aufugiat, ignotum est. Proportio vero cum convenientiam
in aliquo uno simul et alteritatem dicat, absque numero intelligi nequit. Numerus
ergo omnia proportionabilia includit. Non est igitur numerus in quantitate tantum,
qui proportionem efficit, sed in omnibus, quae quovismodo substantialiter aut
accidentaliter convenire possunt ac differre. Hinc forte omnia Pythagoras per
numerorum vim constitui et intelligi iudicabat. (Ibid., L. I, cap. I, n. 3, p. 4).
210 Ibid., w. L. I, cap. I, n. 4, p. 8, linhas 1-3; 7-13: Praecisio vero combinationum
in rebus corporalibus ac adaptatio congrua noti ad ignotum humanam rationem
supergreditur, [...]. Si igitur hoc est, ut etiam profundissimus Aristoteles in prima
philosophia affirmat in natura manifestissimis talem nobis difficultatem accidere
ut nocticoraci solem videre attemptanti, profecto, cum appetitus in nobis frustra
non sit, desideramus scire nos ignorare. Hoc si ad plenum assequi poterimus,
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NOTAS
doctam ignorantiam assequemur. (Ibid., L. I, cap. I, n. 4, p. 4-5).
211 Ibid., w. L. I, cap. II, n. 8, p. 12, linhas 1-7: Oportet autem attingere sensum
volentem potius supra verborum vim intellectum efferre quam proprietatibus
vocabulorum insistere, quae tantis intellectualibus mysteriis proprie adaptari non
possunt. Exemplaribus etiam manuductionibus necesse est transcendenter uti,
linquendo sensibilia, ut ad intellectualitatem simplicem expedite lector ascendat.
(Ibid., L. I, cap. II, n. 8, p. 6).
212 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 4-7: Maximum, quo maius esse nequit,
simpliciter et absolute cum maius sit, quam comprehendi per nos possit, quia est
veritas infinita, non aliter quam incomprehensibiliter attingimus. (Ibid., L. I, cap.
IV, n. 11, p. 8).
213 Segundo André (A douta ignorância, p. 9, nota 10), “a tradução de omne id,
quod esse possit tem oferecido algumas dificuldades. Há autores que entendem
que se deve traduzir “tudo aquilo que ele pode ser” e outros que optam pela
versão mais abrangente da natureza do máximo “tudo aquilo que [em geral]
pode ser”, cobrindo, neste caso, a atualidade do máximo não só a sua plena
possibilidade, mas a absoluta possibilidade de todas as coisas. Consoante à
tradução desta frase, assim se entenderão as frases seguintes: maior (maius)
e menor (minus) poderão ser nomes predicativos do sujeito (que seria o
máximo) no primeiro caso (e como ele não pode ser maior), ou sujeitos
no segundo caso (e como maior não pode haver). Optamos pela segunda
hipótese por nos parecer mais correta tanto sob o ponto de vista filológico, 311
como sob uma perspectiva intertextual”. Conferir também a discussão sobre
essa questão em André (1997, p. 150-155); conferir ainda: Beierwaltes (1989,
p. 150): “poiché è tutto ciò che può essere e tutto ciò che esso può essere
in realtà”. E na nota 26 (p. 150-151), citando o referido texto do De docta
ignorantia e o De venatione sapientiae, 35, n. 105 que ele indica como “elogio
del possest” ele justifica sua dúplice tradução: “Quand’anche per i testi citati
fosse valida solo la traduzione ‘ciò che esso può essere’ [...], tuttavia con la
traduzione ‘ciò che può essere e ciò che esso può essere’ verrebbe chiarita la
totalità della concezione di Cusano. Punto di vista unico: ‘esso è tutto ciò che
può essere’ viene spiegato nel termine complicatio come essere del divino
principio creatore [...]”. Cf. ainda: HOPKINS, Jasper. A concise introduction
to the philosophy of Nicholas of Cusa – Includes English and Latin versions
of Nicholas’ Trialogus de possest, 1978: ele traduz De possest, 7, linha 8, p. 68
“ut solus deus id sit quod esse potest” por “And hence God alone is what (He) is
able to be” e em na nota 12 (p. 173-174) comenta: “(1) Sometimes Nicholas
says that God is everything which is able to be; (2) sometimes he suggests
that God is everything which He is able to be; and (3) sometimes –as in the
present passage– what he says may be construed either way, since neither
the text nor the context eliminates the ambiguity” (p. 173-174). Confrontar
também com: BERT, Enrico. Coincidentia oppositorum e contraddizione nel De
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
docta ignorantia. In: PIAIA, Gregório (a cura di). Concordia Discors: studi su
Niccolò Cusano e l’umanesimo europeo offerti a Giovanni Santinello. Padova:
Editrice Antenore, 1993, p. 107-127 (principalmente as páginas 118-120). Cf.
também: NICOLAI DE CUSA. Trialogus de possest. Opera omnia. Iussu et
auctoritate Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita.
Vol. XI2. Hamburg: Felix Meiner, 1973: Nicolau revela a Bernardo em que
sentido Deus é o que pode ser: BERNARDUS: Siste, pater, parumper et dubium
declara. Quomodo dicis deum id esse quod esse potest? Videtur enim hoc de sole
et luna et terra et alio quolibet pariformiter dici posse. / CARDINALIS: Loquor in
absolutis et generalissimis terminis, quasi dicerem: Cum potentia et actus sint idem
in deo, tunc deus omne id est actu, de quo posse esse potest verificari. Nihil enim
esse potest, quod deus actu non sit. Hoc facile videt quisque attendens absolutam
potentiam coincidere cum actu. Secus de sole. Nam licet sol sit actu id quod est,
non tamen id quod esse potest. Aliter enim esse potest quam actu sit. (n. 8, p. 8-9,
linhas 1-10). Quando analisarmos esse texto cusano, também consultaremos
as seguintes edições: Cf. NICHOLAS OF CUSA. Trialogus de possest/On
actualized-possibility. In: HOPKINS, Jasper. A concise introduction to the
philosophy of Nicholas of Cusa. Includes English and Latin versions of
Nicholas’ Trialogus de possest. University of Minnesota Press: Minneapolis/
Minnesota, 1978; NICOLÒ CUSANO. De possest. In: Scritti filosofici. A cura
di Giovanni Santinello. Vol. I com texto latino a fronte. Bolonha/Itália:
Zanichelli, 1980, p. 237-313; NICOLÁS DE CUSA. El possest. Introducción,
traducción y notas de Ángel Luis González. 2 ed. Navarra/Espanha: EUNSA/
Ediciones Universidad de Navarra, S.A., 1998 (Cuadernos de Anuario 312
Filosófico nº 4 – Serie Universitaria).
214 De docta ignorantia. w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 13-18: Quare
maximum absolute cum sit omne id, quod esse potest, est penitus in actu; et sicut
non potest esse maius, eadem ratione nec minus, cum sit omne id, quod esse
potest. Minimum autem est, quo minus esse non potest. Et quoniam maximum est
huiusmodi, manifestum est minimum maximo coincidere. (A douta ignorância.
L. I, cap. IV, n. 11, p. 9).
215 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 12, p. 18, linhas 1-11: Oppositiones igitur hiis
tantum, quae excedens admittunt et excessum, et hiis differenter conveniunt;
maximo absolute nequaquam, quoniam supra omnem oppositionem est. Quia igitur
maximum absolute est omnia absolute actu, quae esse possunt, taliter absque
quacumque oppositione, ut in maximo minimum coincidat, tunc super omnem
affirmationem est pariter et negationem. Et omne id, quod concipitur esse, non
magis est quam non est; et omne id, quod concipitur non esse, non magis non est
quam est. Sed ita est hoc, quod est omnia, et ita omnia, quod est nullum; et ita
maxime hoc, quod est minime ipsum. (Ibid., L. I, cap. IV, n. 12, p. 10).
216 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 12, p. 18, linhas 18-29: Hoc autem omnem nostrum
intellectum transcendit, qui nequit contradictoria in suo principio combinare
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NOTAS
via rationis, quoniam per ea, quae nobis a natura manifesta fiunt, ambulamus;
quae longe ab hac infinita virtute cadens ipsa contradictoria per infinitum
distantia connectere simul nequit. Supra omnem igitur rationis discursum
incomprehensibiliter absolutam maximitatem videmus infinitam esse, cui nihil
opponitur, cum qua minimum coincidit. Maximum autem et minimum, ut in hoc
libello sumuntur, transcendentes absolute significationis termini existunt, ut
supra omnem contractionem ad quantitatem molis aut virtutis in sua simplicitate
absoluta omnia complectantur.” (Ibid., L. I, Cap. IV, n. 12, p. 10).
217 Ibid., w. L. I, cap. V, n. 13, p. 20, linhas 3-6: Ex hiis clarissime constat maximum
absolute incomprehensibiliter intelligibile pariter et innominabiliter nominabile esse, uti
de hoc manifestiorem doctrinam inferius pandemus. (Ibid.,. L. I, cap. V, n. 13, p. 11).
218 Ibid., w. L. I, cap. III, n. 9, p. 12-14, linhas 4-8: Quoniam ex se manifestum
est infiniti ad finitum proportionem non esse, est et ex hoc clarissimum, quod, ubi
est reperire excedens et excessum, non deveniri ad maximum simpliciter, cum
excedentia et excessa finita sint. Maximum vero tale necessario est infinitum.
(Ibid., L. I, cap. III, n. 9, p. 7).
219 Ibid., w. L. I, cap. III, n. 9, p.14, linhas 8-17: Dato igitur quocumque,
quod non sit ipsum maximum simpliciter, dabile maius esse manifestum est. Et
quoniam aequalitatem reperimus gradualem, ut unum aequalius uni sit quam
alteri secundum convenientiam et differentiam genericam, specificam, localem,
influentialem et temporalem cum similibus: patet non posse aut duo aut plura
adeo similia et aequalia reperiri, quin adhuc in infinitum similiora esse possint. 313
Hinc mensura et mensuratum, quantumcumque aequalia, semper differentia
remanebunt. (Ibid., L. I, Cap. III, n. 9, p. 7).
220 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 9-12: [...] omnia enim, quaecumque
sensu, ratione aut intellectu apprehenduntur, intra se et ad invicem taliter differunt,
quod nulla est aequalitas praecisa inter illa. (Ibid., L. I, Cap. VI, n. 11, p. 9).
2212 Deve-se entender como se a todas as coisas faltasse ainda algo. Já vimos
anteriormente como no De venatione sapientiae que o nexus mantém as coisas
unidas intra se e com as outras na totalidade do mundo.
222 De docta ignorantia. w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 12-13: Excedit
igitur maxima aequalitas, quae a nullo est alia aut diversa, omnem intellectum.
(A douta ignorância. L. I, Cap. IV, n. 11, p. 9).
223 Ibid., w. L. I, cap. V, n. 14, p. 22, linhas 18-24: Nam uti numerus, qui ens rationis
est fabricatum per nostram comparativam discretionem, praesupponit necessario
unitatem pro tali numeri principio, ut sine eo impossibile sit numerum esse: ita rerum
pluralitates ab hac infinita unitate descendentes ad ipsam se habent, ut sine ipsa esse
nequeant; quomodo enim essent sine esse? (Ibid., L. I, cap. V, n. 14, p. 12).
224 Ibid., w. L. I, cap. V, n. 14, p. 22, linhas 9-14: Vide per numerum ad hoc nos
deductos, ut intelligamus innominabili Deo unitatem absolutam propius convenire
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NOTAS
quodque Deus ita est unus, ut sit actu omne id, quod possibile est. Quapropter non
recipit ipsa unitas magis nec minus, nec est multiplicabilis. Deitas itaque est unitas
infinita.” (Ibid., L. I, cap. V, n. 14, p. 12).
225 Ibid., w. L. I, cap. V, n. 13, p. 20, linhas 7-9: Nihil est nominabile, quo non possit
maius aut minus dari, cum nomina hiis attributa sint rationis motu, quae quadam
proportione excedens admittunt aut excessum. (Ibid., L. I, cap. V, n. 13, p. 11).
226 Ibid., w. L. I, cap. VI, n. 15, p. 24, linhas 12-14: Praeterea, nihil esse posset,
si maximum simpliciter non esset. Nam cum omne non-maximum sit finitum, est et
principiatum; erit autem necessarium, quod ab alio.” (Ibid., L. I, cap. VI, n. 15, p. 13).
227 Ibid., w. L. I, cap. VI, n. 16, p. 24-26: Praeterea, contrahamus maximum
ad esse et dicamus: Maximo esse nihil opponitur; quare nec non esse nec minime
esse. Quomodo igitur intelligi potest maximum non esse posse, cum minime esse
sit maxime esse? Neque quidquam intelligi potest esse sine esse. Absolutum autem
esse non potest esse aliud quam maximum absolute. Nihil igitur potest intelligi esse
sine maximo. Praeterea, veritas maxima est maximum absolute. Maxime igitur
verum est ipsum maximum simpliciter esse vel non esse, vel esse et non esse, vel
nec esse nec non esse; et plura nec dici nec cogitari possunt. Qualecumque horum
dixeris maxime verum, habeo propositum; nam habeo veritatem maximam, quae
est maximum simpliciter. (Ibid., L. I, cap. VI, n. 16, p. 1314).
228 Ibid., w. L. I, cap. VI, n. 15, p. 24, linhas 5-11: Finitum vero et terminatum
habet, a quo incipit et ad quod terminatur. Et quia non potest dici, quod illud sit
maius dato finito et finitum, ita semper in infinitum progrediendo, quoniam 314
in excedentibus et excessis progressio in infinitum actu fieri non potest – alias
maximum esset de natura finitorum –: igitur necessario est maximum actu omnium
finitorum principium et finis. (Ibid., L. I, cap. VI, n. 15, p. 13).
229 Ibid., w. L. I, cap. VI, n. 17, p. 26, linhas 8-10: Est autem ostensum non posse
nisi unum esse maximum simpliciter. Quare unum esse maximum est verissimum.
(Ibid., L. I, cap. VI, n. 17, p. 13).
230 Ibid., w. L. I, cap. II, n. 5, p. 10: Tractaturus de maxima ignorantiae doctrina
ipsius maximitatis naturam aggredi necesse habeo. Maximum autem hoc dico,
quo nihil maius esse potest. Habundantia vero uni convenit. Coincidit itaque
maximitati unitas, quae est et entitas; quod si ipsa talis unitas ab omni respectu
et contractione universaliter est absoluta, nihil sibi opponi manifestum est, cum
sit maximitas absoluta. Maximum itaque absolutum unum est, quod est omnia;
in quo omnia, quia maximum. Et quoniam nihil sibi opponitur, secum simul
coincidit minimum; quare et in omnibus; et quia absolutum, tunc est actu omne
possibile esse, nihil a rebus contrahens, a quo omnia. Hoc maximum, quod et Deus
omnium nationum fide indubie creditur, primo libello supra humanam rationem
incomprehensibiliter inquirere eo duce, qui solus lucem inhabitat inaccessibilem,
laborabo. (Ibid., L. I, cap. II, n. 5, p. 5).
231 Ibid., w. L. I, cap. VII, n. 18, p. 26, linhas 3-10: Nulla umquam natio fuit, quae
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NOTAS
Deum non coleret et quem maximum absolute non crederet. Reperimus Marcum
Varronem in libris Antiquitatum annotasse Sissennios unitatem pro maximo
adorasse. Pythagoras autem, vir suo aevo auctoritate irrefragabili clarissimus,
unitatem illam trinam astruebat. Huius veritatem investigantes, altius ingenium
elevantes dicamus iuxta praemissa: Id quod omnem alteritatem praecedit, aeternum
esse nemo dubitat”. (Ibid., L. I, cap. VII, n. 18, p. 14-15). Sobre este parágrafo
gostaríamos de recordar algumas informações: em primeiro lugar,
recordamos que “a fonte de Nicolau de Cusa terá confundido Antiquitates
de VARRÃO com Antiquitates Iudaicae (XV, 371-379) de J. FLAVIUS e daí
a troca de Essénios por Sissénios” (Ibid., p. 14, n. 13); em segundo lugar,
lembramos que a fonte cusana direta não é o próprio Pitágoras, mas o De
septem septenis de João de Salisbúria (Cf. Ibid., p. 15, n. 14); na tradução
italiana Santinello refere: Haec est illa trium unitas: quam solam adorandam
esse docuit Pithagoras (La dotta ignoranza, 1988: 79, nota 2). Por último, o
termo “espírito” pretende ser uma tradução do termo latino ingenium, ii
(capacidades intelectuais, inteligência, talento, gênio). Segundo Hopkins
(1985, p. 56) “and elevate our intellects”; em alemão (2002, p. 27) “unseren
Geist”; em espanhol (2003, p. 55) “elevamos el ingenio más alto”; em italiano “ed
elevando la nostra mente” (SANTINELLO, 1988, p. 79; VESCOVINI, 1998, p. 70).
232 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XI, n. 26, p. 34-36, linhas 1-4 e 11-18:
Quod autem sanctissimi nostri doctores unitatem vocaverunt Patrem, aequalitatem
Filium, et connexionem Spiritum sanctum, hoc propter quandam similitudinem ad
ista caduca fecerunt; [...]. Ex tali quidem licet distantissima similitudine Pater dicta 315
est unitas, Filius aequalitas, connexio vero amor sive Spiritus sanctus, creaturarum
respectu tantum, prout infra etiam suo loco clarius ostendemus. Et haec est meo
arbitratu iuxta Pythagoricam inquisitionem trinitatis in unitate et unitatis in
trinitate semper adorandae manifestissima inquisitio. (A douta ignorância.
L. I, cap. XI, n. 26, p. 19-20). Santinello explica que “I nostri dottori, cioè i
cristiani, per esempio Agostino, De doctrina christiana I 5 (CCSL 32, p. 9). Il
Cusano preferisce i termini astratti rispetto a quelli foggiati con similitudini
dalle creature, come i tradizionali nomi della trinità: Padre – Figlio – Spirito
Santo” (La dotta ignoranza, 1988, p. 83, nota 2). Cf. também Santinello
(1958, p. 137): “Ma sono i doctores che adoperano questi termini o è la Sacra
Scrittura stessa? C’è qui un problema teologico contro cui minaccia di
urtare l’arditezza speculativa del Cusano”.
233 De docta ignorantia. w. L. I, cap. I, n. 2, p. 6, linhas 11-13: Quam ob rem
sanum liberum intellectum verum, quod insatiabiliter indito discursu cuncta
perlustrando attingere cupit, [...]. (A douta ignorância. L. I, cap. I, n. 2, p. 3).
234 Ibid., w. L. I, cap. VII, n. 18, p. 26, linhas 10-14: Alteritas namque idem est
quod mutabilitas; sed omne, quod mutabilitatem naturaliter praecedit, immutabile
est; quare aeternum. Alteritas vero constat ex uno et altero; quare alteritas sicut
numerus posterior est unitate. (Ibid., L. I, cap. VII, n. 18, p. 15); Ibid., w. L. I, cap.
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NOTAS
VII, n. 19, p. 28, linhas 9-18: Aequalitas ergo naturaliter praecedit inaequalitatem.
Sed inaequalitas et alteritas simul sunt natura; ubi enim inaequalitas, ibidem
necessario alteritas, et e converso. Inter duo namque ad minus erit alteritas. Illa
vero ad unum illorum duplicitatem facient; quare erit inaequalitas. Alteritas
ergo et inaequalitas simul erunt natura, praesertim cum binarius prima sit
alteritas et prima inaequalitas. Sed probatum est aequalitatem praecedere natura
inaequalitatem, quare et alteritatem; aequalitas ergo aeterna. (Ibid., L. I, cap. VII,
n. 19, p. 15); Ibid., w. L. I, cap. VII, n. 20, p. 28-30, linhas 3-10: Sed unitas vel est
connexio vel est causa connexionis; inde enim aliqua connexa dicuntur, quia simul
unita sunt. Binarius quoque vel divisio est vel causa divisionis; binarius enim prima
est divisio. Si ergo unitas causa connexionis est, binarius vero divisionis: ergo, sicut
unitas est prior natura binario, ita connexio prior natura divisione. Sed divisio et
alteritas simul sunt natura; quare et connexio sicut unitas est aeterna, cum prior sit
alteritate. (Ibid., L. I, cap. VII, n. 20, p. 16).
235 Ibid., w. L. I, cap. VIII, n. 21, p. 30, linhas 1-5: Quoniam unitas aeterna
est, aequalitas aeterna, similiter et connexio aeterna. Sed plura aeterna esse non
possunt. Si enim plura essent aeterna, tunc, quoniam omnem pluralitatem praecedit
unitas, esset aliquid prius natura aeternitate; quod est impossibile. (Ibid., L. I, cap.
VIII, n. 21, p. 16). Podemos tomar um parágrafo do Tractatus de Thierry
para iluminar essa relação entre unidade, alteridade e dualidade: Omnem
alteritatem unitas precedit quoniam unitas precedit binarium qui est principium
omnis alteritatis. ‘Alterum’ enim semper de duobus dicitur. Omnem igitur
mutabilitatem pre acedit [sic.] unitas, siquidem omnis mutabilitas substantiam 316
ex binario sortitur. Nihil enim aptum est mutari sive moveri, nisi etiam aptum sit
ut prius se habeat uno modo deinde alio. Hanc igitur modorum alteritatem unitas
praecedit, quare et mutabilitatem. (Tractatus. nh. n. 30, p. 194-195).
236 NICOLAI DE CUSA. Idiota. De mente. In: Opera omnia. Iussu et auctoritate
Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita. vol. V.
Hamburg: Felix Meiner, 1983, p. 81-218: PHILOSOPHUS: Videtur, quod sola
mens sit dei imago. / IDIOTA: Proprie ita est, quoniam omnia, quae post mentem sunt,
non sunt dei imago nisi inquantum in ipsis mens ipsa relucet, sicut plus relucet in
perfectis animalibus quam imperfectis et plus in sensibilibus quam vegetabilibus et
plus in vegetabilibus quam mineralibus. Unde creaturae mente carentes sunt potius
divinae simplicitatis explicationes quam imagines, licet secundum relucentiam
mentalis imaginis in explicando de imagine varie participent. (cap. IV, n. 76, p.
116). Cf. também: NICOLÁS DE CUSA. Un ignorante discurre acerca de la
mente. Introducción de Jorge M. Machetta y Claudia D’Amico. Traducción
de Jorge M. Machetta. Buenos Aires: Biblos, 2005.
237 De docta ignorantia. w. L. I, cap. VIII, n. 22, p. 30-32, linhas 10-13:
Aequalitas vero essendi est, quod in re neque plus neque minus est, nihil ultra, nihil
infra. Si enim in re magis est, monstruosum est. Si minus est, nec est. (A douta
ignorância, VIII, cap. VIII, n. 22, p. 17).
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NOTAS
238 A expressão forma essendi, conforme indica André (A douta ignorância,
p. 17, nota 17) provém de Boécio. Além disso, ele indica também Thierry
de Chartres como fonte. Citemos algumas expressões Tractatus de Thierry
(nh. n. 31, p. 195 e n. 44; 45, p. 199): At divinitas singulis rebus forma essendi est;
Immo universaliter affirmandum est ipsam unitatis equalitatem esse singulis rebus
essendi formam; non est dubium quin ipsa unitatis aequalitas sit rebus omnibus
forma essendi eterna ac formalis cuasa secundum quam artifex eternus modum
existendi omnibus rebus constituit.
239 Também podemos encontrar no Tractatus de Thierry a fonte desse modo
“matemático” de se pensar a igualdade da unidade. Segundo o Tractatus
podem se dar dois modos de geração com relação à unidade: multiplicada
por ela mesma a unidade gera a sua igualdade, ou seja, ela mesma e
multiplicada por qualquer outro número ela gera todos os outros números.
Da mesma forma que a unidade precede o número e é eterna, também a
sua igualdade. Daí Thierry concluirá que como não podem existir diversos
eternos, a unidade e a igualdade da unidade são um (Unitas igitur et eaqualitas
unitatis unum sunt). (Cf. Tractatus, n.h. n. 38-40, p. 197).
240 De docta ignorantia. w. L. I, cap. VIII, n. 23, p. 32, linhas 5-11: Generatio
autem unitatis ab unitate est una unitatis repetitio, id est unitas semel; quod, si
bisvel ter vel deinceps unitatem multiplicavero, iam unitas ex se aliud procreabit,
ut binarium vel ternarium vel alium numerum. Unitas vero semel repetita solum
gignit unitatis aequalitatem; quod nihil aliud intelligi potest quam quod unitas
gignat unitatem. Et haec quidem generatio aeterna est. (A douta ignorância. L. 317
I, cap. VIII, n. 23, p. 17-18).
241 Ibid., w. L. I, cap. IX, n. 24, p. 32-34. Quemadmodum generatio unitatis ab
unitate est una unitatis repetitio, ita processio ab utroque est repetitionis illius
unitatis, sive mavis dicere unitatis et aequalitatis unitatis ipsius unitas. Dicitur
autem processio quasi quaedam ab altero in alterum extensio; quemadmodum cum
duo sunt aequalia, tunc quaedam ab uno in alterum quasi extenditur aequalitas,
quae illa coniungat quodammodo et connectat. Merito ergo dicitur ab unitate et
ab aequalitate unitatis connexio procedere; neque enim connexio unius tantum
est, sed ab unitate in aequalitatem unitas procedit, et ab unitatis aequalitate in
unitatem. Merito igitur ab utroque procedere dicitur eo, quod ab altero in alterum
quasi extenditur. (Ibid., L. I, cap. IX, n. 24, p. 18).
242 Ibid., w. L. I, cap. IX, n. 26, p. 36, linhas 15-18: Et haec est meo arbitratu
iuxta Pythagoricam inquisitionem trinitatis in unitate et unitatis in trinitate
semper adorandae manifestissima inquisitio. (Ibid., L. I, cap. IX, n. 26, p. 20). Essa
afirmação cusana deve ser interpretada a partir do fato, já anteriormente
lembrado, de que o recurso à autoridade de Pitágoras permite a Nicolau
instalar a sua própria especulação sobre a trindade no solo do enigma
matemático. Porém, Nicolau de Cusa parece se afastar dos pitagóricos, ao
compreender o número e as operações matemáticas como um símbolo que
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NOTAS
indica o incompreensível. Assim, pode-se compreender em que sentido
a unidade absoluta não é um número ou não é a unidade matemática. O
fundamento de todas as coisas é a unidade absoluta e a unidade matemática
é um símbolo que indica e direciona o olhar daquele que especula para
aquela unidade primeira. Nicolau não concebe os números e os tentes
matemáticos como substâncias ou princípios das coisas sensíveis. Cf. De
beryllo. h. XI1, n. 56, p. 64, linhas 16-26: Ideo Plato non videtur bene considerasse,
quando mathematicalia, quae a sensibilibus abstrahuntur, vidit veriora in mente,
quod propterea illa adhuc haberent aliud esse verius supra intellectum. Sed bene
potuisset dixisse Plato quod, sicut formae artis humanae sunt veriores in suo
principio, scilicet in mente humana, quam sint in materia, sic formae principii
naturae, quae sunt naturales, sunt veriores in suo principio quam extra. Et si sic
considerassent Pythagorici et quicumque alii, clare vidissent mathematicalia et
numeros, qui ex nostra mente procedunt et sunt modo quo nos concipimus, non esse
substantias aut principia rerum sensibilium, sed tantum entium rationis, quarum
nos sumus conditores.
243 Tractatus. nh. n. 2, p. 184-185: Mundanae igitur subsistentiae causae sunt
quattuor: efficiens ut Deus, formalis ut Dei Sapientiae, finalis ut ejusdem Benignitas,
materialis quattuor elementa. Necesse est enim, quia mutabilia et caduca sunt
mundana, eadem habere autorem. Quia vero rationabiliter et quodam ordine
pulcherrimo disposita sunt, secundum sapientiam illa esse creata necesse est.
Quoniam autem ipse Creator juxta veram rationem nullo indiget sed in semetipso
summum bonum et sufficientiam habet, oportet ut ea, quae creat, ex sola benignitate 318
et caritae creet, ut scilicet habeat quibus beatitudinem suam more caritatis
participet. Quia vero omnis ordinatio inordinatis adhibetur, oportuit aliquid
inordinatum praecedere, ut eidem ordo secundum sapientiam adhiberetur ac, sic
disponendo inordinata, Sapientia Creatoris vel parum scientibus appareret. Si quis
igitur subtiliter consideret mundi fabricam, efficientem ipsius causam Deum esse
cognoscet, formalem vero Dei Sapientiam, finalem ejusdem Benignitatem, materialem
vero quattuor elementa quae et ipse Creator in principio de nihilo creavit.
244 Ibid., nh. n. 3, p. 185: In materia igitur, quae est quattuor elementa, operatur
summa Trinitas ipsam materiam creando, in hoc quod est efficiens causa; creatam
informando et disponendo, in eo quod est formalis cuasa; informatam et dispositam
diligendo et gubernando, in eo quod est finalis causa. Nam pater est efficiens causa,
Filius formalis, Spiritus sanctus finalis, quattuor vero elementa materialis. Ex
quibus quattuor causis universa corporea substantia habet subsistere.
245 Ibid., nh. n. 25, p. 193: Et spiritus Domini ferebatur super aquas. Designata
materia, subsequenter virtutem artificis, quam ‘spiritum Domini’ appellat, dicit
praeesse materiae atque dominari ut eam informet atque ordinet. Praeclare post
materiam subjungit de virtute artificis operatrice. Nam illa virtute in materiam
operante, omnia quae sunt vel videntur in caelo vel in terra habent consistere. Cum
enim ipsa materia ex se sit informis, non potest ullo modo formam adipisei nisi ex
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NOTAS
virtute artificis operante atque ipsam ordinate. Hanc virtutem philosophi diversis
nominibus appellaverunt.
246 Ibid., nh. n. 26 e 27, p. 193: Et Mercurius quidem in eo libro qui inscribitur
Trismegistus hanc virtutem ‘spiritum’ vocat his verbis: Fuit Deus et hyle quem
Graece credimus mundum. Et mundo comitabuatur spiritus vel mundo inerat
spiritus”; “Plato vero in Timaeo eundem spiritum ‘mundi animam’ vocat. Virgilius
vero de illo spiritu ita dicit: Principio maria ac terras celumque profundum
|| lucentemque globum lunae tytaniaque astra || spiritus intus alit. Hebraei
vero ita de spiritu operatore loquuntur: Moyses quidem ita: Et spiritus Domini
ferebatur super aquas; David vero sic: Verbo Domini caeli firmati sunt, etc.
Salomon quoque de spiritu sic dicit: Spiritus Domini replevit orbem terrarum.
Christiani vero illud idem ‘Spiritum santum’ appellant.
247 Ibid., nh. n. 29, p. 194: Et dixit Deus: Fiat lux. Ostensis duobus primordiis
creaturae, materia scilicet et virtute operatrice, competenti ordine vult demonstrare
quomodo et quo ordine Spiritus Domini in materiam operatur secundum modum,
in sapientia Creatoris ab aeterno dictum atque praefinitum. Sed in hoc loco justa
modum expositionis de divinitate pauca dicenda sunt, ut appareat quid sit dicere
Dei, et cur prius facerit mentionem Spiritus quam Verbi.
248 Cf. Ibid., nh. n. 30-47, p. 194-200. No final do n. 47 Thierry anuncia: Hactenus
de aequalitate unitatis. Nunc quomodo connexio aequalitatis et unitatis ab utroque
earum procedat explicandum est secundum disciplinas propositas (n. 47, p. 200).
249 Cf. THEODERICI CARNOTENSIS. Commentum super Boethium de 319
Trinitatis. Ed. N. Haring. Archives D’Histoire Doctrinale et Littéraire
du Moyen Age. Paris: Librairie Philosophique J. Vrin, 1960, p. 80-134: Est
autem quaedam aequalitatis essendi ad unitatem conexio. Aequalitatem namque
unitas, unitatem semper diligit aequalitas. Quod per contrarium perpendi potest.
Unitas enim divisionem refugit. [...]. Concludatur itaque ut, quoniam divisionem
refugit et unitatem aequalitas diligit et unitas aequalitatem. Amor igitur quidam
est et conexio aequalitatis ad unitatem et unitatis ad essendi aequalitatem (nh. II,
n. 37, p. 102). No parágrafo seguinte (n. 38), o termo utilizado para falar da
relação na Trindade é o termo teológico prōcēdĕre. Por último, na reflexão sobre
a Trindade e a criação, o espírito é denominado ‘motus substantialis’: Dictum autem
est quoniam unitas secundum hoc, quod amor est et conexio, spiritum creat. Motus
namque substantialis ei est. [...]. Motus namque substantialis spiritui est, qui ex
amore quodam movetur i.e. naturaliter tendit ad esse, ut dictum est (II, n. 42, p. 103).
Cf. ainda Lectiones in Boethii Librum de Trinitate. nh. V, n. 16, p. 215; VII,
n. 7, p. 222-223: Sed aequalitas appetit unitatem et unitas econverso aequalitatem.
Hic itaque amor, quo aequalitas appetit unitatem et unitas aequalitatem, amborum
conexio est. Istud ‘amborum’ relativum est ad proprietates has quas dixi aequalitatem
et unitatem, non ad res discretas. Non enim est nisi una sola unitas, trina tamen in
proprietate. Conexio enim unitas est. Nam in uno penitus pluralitas non est. Tamen
non concedimus quod conexio aequalitas sit, propter personales proprietates. Unitas
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NOTAS
autem numerum facit, aequalitas vero proportionem, conexio proportionalitatem.
250 De docta ignorantia. w. L. I, cap. X, n. 27, p. 36, linhas 11-21: Sed ipsum
super omnia illa est, ita quod illa, quae aut per sensum aut imaginationem aut
rationem cum materialibus appendiciis attinguntur, necessario evomere oporteat, ut
ad simplicissimam et abstractissimam intelligentiam perveniamus, ubi omnia sunt
unum; ubi linea sit triangulus, circulus et sphaera; ubi unitas sit trinitas et e converso;
ubi accidens sit substantia; ubi corpus sit spiritus, motus sit quies et cetera huiusmodi.
Et tunc intelligitur, quando quodlibet in ipso uno intelligitur, unum; et ipsum unum
omnia; et per consequens quodlibet in ipso omnia. (A douta ignorância. L. I, cap.
X, n. 27, p. 20-21). Já vimos anteriormente como se articula esse princípio com
a proposta do De coniecturis, ou seja, não podemos confundir a coincidência,
princípio da lógica do intelecto, com o próprio divino.
251 Ibid., w. L. I, cap. X, n. 29, p. 38-40, linhas 12-16: Admiraris autem de hiis, quae
diximus, quomodo volentem maximum simplici intellectione apprehendere necesse
sit rerum differentias et diversitates ac omnes mathematicas figuras transilire,
quoniam lineam diximus in maximo superficiem et circulum et sphaeram. (Ibid., L.
I, cap. X, n. 29, p. 22).
252 Ibid., w. L. I, cap. XI, n. 30, p. 40, linhas 4-8: Consensere omnes sapientissimi
nostri et divinissimi doctoris visibilia invisibilium imagines esse atque creatorem
ita cognoscibiliter a creaturis videri posse quasi in speculo et in aenigmate. Hoc
autem, quod spiritualia per se a nobis inattingibilia symbolice investigentur [...].
(Ibid., L. I, cap. XI, n. 30, p. 22-23). Cf. 4.2 Os nOmes divinOs cOmO enigmas e O 320
princípiO unitrinO do presente livro.
253 Ibid., w. L. I, cap. XI, n. 31, p. 42, linhas 1-4: Quando autem ex imagine
inquisitio fit, necesse est nihil dubii apud imaginem esse, in cuius transsumptiva
proportione incognitum investigatur, cum via ad incerta non nisi per praesupposita
et certa esse possit. (Ibid., L. I, cap. XI, n. 31, p. 23).
254 Ibid., w. L. I, cap. XI, n. 32, p. 44, linhas 25-29: Hac veterum via incedentes cum
ipsis concurrentes dicimus, cum ad divina non nisi per symbolica accedendi nobis
via pateat, quod tunc mathematicalibus signis propter ipsorum incorruptibilem
certitudinem convenientius uti poterimus. (Ibid., L. I, cap. XI, n. 32, p. 25).
255 Ibid., w. L. I, cap. XII, n. 33, p. 44-46: Verum quoniam ex antehabitis constat
maximum simpliciter nihil horum esse posse, quae per nos sciuntur aut concipiuntur,
hinc cum ipsum symbolice investigare proponimus, simplicem similitudinem transilire
necesse est. Nam cum omnia mathematicalia sint finita et aliter etiam imaginari
nequeant, si finitis uti pro exemplo voluerimus ad maximum simpliciter ascendendi,
primo necesse est figuras matematicas finitas considerare cum suis passionibus et
rationibus, et ipsas rationes correspondenter ad infinitas tales figuras transferre,
post haec tertio adhuc altius ipsas rationes infinitarum figurarum transumere ad
infinitum simplex absolutissimum etiam ab omni figura. Et tunc nostra ignorantia
incomprehensibiliter docebitur, quomodo de altissimo rectius et verius sit nobis in
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
aenigmate laborantibus sentiendum. (Ibid., L. I, cap. XII, n. 33, p. 25-26).
256 Alguns trabalhos tratam os temas e os problemas que envolvem todo
este primeiro livro do De docta ignorantia no que se refere à possibilidade do
conhecimento do primeiro princípio, como por exemplo, o próprio tema da
docta ignorantia e o da coincidentia oppositorum: ANDRÉ, João Maria & ÁLVAREZ
GÓMEZ, Mariano (Coord). Coincidência dos opostos e concórdia: Caminhos
do Pensamento em Nicolau de Cusa. Actas do Congresso Internacional
realizado em Coimbra e Salamanca nos dias 5 a 9 de Novembro de 2001.
Tomo I. Coimbra: Faculdade de Letras, 2002. Nesse volume, destacamos a
conferência de André (2001) que trata sobre a transsumptio e o transcensus
como um movimento realizado na alteridade e na diferença, mas que não
abandona propriamente essa mesma diferença (principalmente as páginas
217-231). ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano & ANDRÉ, João Maria. Coincidencia de
Opuestos y Concordia: Los Caminos del Pensamiento en Nicolás de Cusa.
Actas del Congreso Internacional celebrado en Coimbra y Salamanca los días
5 a 9 de noviembre de 2001. Tomo II. Salamanca: Sociedad Castellano-Leonesa
de Filosofia, 2002. MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia (Editores). El
problema del conocimiento en Nicolás de Cusa: genealogía e proyección.
Primer Congreso Internacional Cusano de Latinoamérica. Buenos Aires, 1-4
de junio de 2004. Buenos Aires: Biblos, 2005. SCINTILLA: Revista de filosofia e
mística medieval. Curitiba: Faculdade de Filosofia São Boaventura, Sociedade
Brasileira de Filosofia Medieva, vol. 4, n. 1, jan./jun. 2007.
257 De docta ignorantia. w. L. I, cap. X, n. 27, p. 36, linhas 23-24: Maxima enim 321
nequaquam recte intelligi poterit, si non intelligatur trina. (A douta ignorância.
L. I, cap. X, n. 27, p. 21).
258 Ibid., w. L. I, cap. X, n. 28, p. 36-38, linhas 1-3 ; 12-20: Ut exemplis ad
hoc utamur convenientibus: videmus unitatem intellectus non aliud esse quam
intelligens, intelligibile et intelligere. [...]. Unitas enim non nisi trinitas est; nam
dicit indivisionem, discretionem et connexionem. Indivisio quidem ab unitate
est, similiter discretio, similiter et unio sive connexio. Maxima igitur unitas non
aliud est quam indivisio, discretio et connexio. Et quoniam indivisio est, tunc est
aeternitas sive absque principio, sicut aeternum a nullo divisum. Quoniam discretio
est, ab aeternitate immutabili est. Et quoniam connexio sive unio est, ab utroque
procedit. (Ibid., L. I, cap. X, n. 28, p. 21).
259 Ibid., w. L. I, cap. X, n. 29 linhas 1-11, p. 38. Adhuc, cum dico: ‘Unitas est
maxima’, trinitatem dico. Nam cum dico unitas, dico principium sine principio; cum
dico maxima, dico principium a principio; cum illa per verbum est copulo et unio,
dico processionem ab utroque. Si igitur ex superioribus manifestissime probatum
est unum esse maximum, quoniam minimum, maximum et connexio unum sunt, ita
quod ipsa unitas est et minima et maxima et unio: hinc constat, quomodo evomere
omnia imaginabilia et rationabilia necesse est Philosophiam, quae unitatem
maximam non nisi trinam simplicissima intellectione voluerit comprehendere.
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
(Ibid., L. I, cap. X, n. 29, p. 21-22).
260 Cf. NICOLAU DE CUSA. A Paz da Fé, seguida de Carta a João de Segóvia.
Tradução e Introdução de João Maria André, Coimbra: Minerva Coimbra
(Colecção Hermes 2), 2002. Entre o De docta ignorantia e o De visione dei, a
questão sobre a Trindade divina aparecerá também do De pace fidei. O Índio
considera que “[...] será muito difícil que se chegue em toda parte à concórdia
sobre o Deus trino. Pois a todos parece que a trindade não pode conceber-se
sem três”, ou seja, a trindade parece introduzir a pluralidade na divindade
absoluta (A paz na fé, Cap. VII, n. 20, p. 37). A resposta do Verbo consistirá
em mostrar em que sentido se deve entender que a divindade é trina, mas
sem pluralidade, pois na divindade não há uma distinção de essência nem
numérica. O discurso do Verbo começa por esclarecer que considerando
“Deus, enquanto criador, é trino e uno; enquanto infinito, nem trino, nem
uno, nem nada daquilo que se possa dizer”. Portanto, o discurso não o alcança
ut infinitus, pois Ele é inefável e está acima de todos os nomes. Qualquer
discurso, mesmo o discurso fundado na lógica da coincidência, estará sempre
aquém da sua infinidade e com ela não se confunde. Limitamo-nos a essa
consideração geral, tendo em vista que o discurso do Verbo se constrói na
base dos mesmos fundamentos que encontramos no De docta ignorantia que
estamos analisando: a evidência de que no universo se dê multiplicidade,
desigualdade e divisão e que a unidade eterna, a igualdade eterna e a conexão
eterna são os seus princípios eternos. O Verbo conclui afirmando que “[...] o
princípio simplicíssimo do universo é unitrino, porque o principiado deve ser 322
complicado no princípio, e todo o principiado se diz ser complicado no seu
princípio e em todo o principiado se encontra essa distinção trina na unidade
da essência. Por isso, o princípio simplicíssimo de todas as coisas será trino
e uno.” (A paz na fé, Cap. VII, n. 21, p. 38-39). Sobre a questão da trindade no
De pace fidei: D’AMICO, Claudia. Ignorancia y conjetura en la propuesta de
concordancia de Nicolás de Cusa. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia.
(Editores). El problema del conocimiento en Nicolás de Cusa: genealogía
y proyección. Buenos Aires: Biblos, 2005, p. 267-279; Cf. ARROCHE (2010, p.
405-416. De modo especial os esclarecimentos de João Maria André, Claudia
D’Amico e Jorge M. Machetta na “Discusión”).
261 De docta ignorantia. w. L. I, cap. X, n. 28, p. 36-38, linhas 1-11: Ut exemplis
ad hoc utamur convenientibus: videmus unitatem intellectus non aliud esse quam
intelligens, intelligibile et intelligere. Si igitur ab eo, quod est intelligens, velis te
ad maximum transferre et dicere maximum esse maxime intelligens et non adicias
ipsum etiam esse maxime intelligibile et maximum intelligere, non recte de unitate
maxima et perfectissima concipis. Si enim unitas est maxima et perfectissima
intellectio, quae sine istis correlationibus tribus nec intellectio nec perfectissima
intellectio esse poterit, non recte unitatem concipit, qui ipsius unitatis trinitatem
non attingit. (A douta ignorância. L. I, cap. X, n. 28, p. 21).
262 De visione dei. h. VI. cap. I, n. 5, p. 10, linhas 3-6: Primo loco praesupponendum
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NOTAS
esse censeo nihil posse apparere circa visum eiconae dei, quin verius sit in vero visu
dei. Deus etenim, qui est summitas ipsa omnis perfectionis et maior quam cogitari
possit, theos ob hoc dicitur, quia omnia intuetur. (A visão de Deus, cap. I, p. 138).
2632 Ibid., h. VI. cap. XVII, n. 71, p. 58: Ostendisti, domine, te mihi adeo amabilem,
quod magis amabilis esse nequis; es enim infinite amabilis, deus meus. Numquam
igitur poteris a quoquam amari, sicut amabilis es, nisi ab infinitoamante. Nisi enim
esset infinite amans, non esses infinite amabilis. Amabilitas enim tua, quae est posse
in infinitum amari, est, quia est posse in infinitum amare. A posse in infinitum amare
et posse in infinitum amari oritur amoris nexus infinitus ipsius infiniti amantis et
infiniti amabilis. Non est autem infinitum multiplicabile. Tu igitur, deus meus, qui
es amor, es amor amans et amor amabilis et amoris amantis et amabilis nexus.
Video in te deo meo amorem amantem, et ex eo, quia video in te amorem amantem,
video in te amorem amabilem, et quia in te video amorem amantem et amorem
amabilem, video utriusque amoris nexum. Et hoc non est aliud quam illud, quod
video in absoluta unitate tua, in qua video unitatem unientem, unitatem unibilem
et utriusque unionem. (Ibid., cap. XVII, p. 197-198).
264 Ibid., h. VI. cap. XVII, n. 72, p. 59, linhas 5-17: Quod enim amor sit amans et
amabilis et nexus utriusque, experior in contracto amore esse de essentia perfecti
amoris. Id autem, quod est de essentia perfecti amoris contracti, non potest deesse
absoluto amori, a quo habet contractus amor, quidquid perfectionis habet. Quanto
autem amor simplicior, tanto perfectior. Tu autem, deus meus, es amor perfectissimus
et simplicissimus. Tu igitur es ipsa essentia perfectissima et simplicissima et
naturalissima amoris. Hinc in te amore non est aliud amans et aliud amabile et aliud 323
utriusque nexus, sed idem tu ipse, deus meus. Quia igitur in te coincidit amabile cum
amante et amari cum amare, tunc nexus coincidentiae est nexus essentialis; nihil
enim in te est, quod non sit ipsa essentia tua. (Ibid., cap. XVII, p. 198).
265 Ibid., h. VI. cap. XVII, n. 74, p. 60, linhas 1-8 O admirabilissimus deus, qui
neque es numeri singularis neque numeri pluralis, sed supra omnem pluralitatem
et singularitatem unitrinus et triunus. Video igitur in muro paradisi, ubi es, deus
meus, pluralitatem coincidere cum singularitate et te ultra habitare quam remote.
Doce me, domine, quomodo possim concipere id possibile, quod video necessarium.
Occurrit enim mihi impossibilitas, quod trium pluralitas, sine quibus concipere
te nequeo perfectum et naturalem amorem, sit pluralitas sine numero, [...].
(Ibid., cap. XVII, p. 199).
266 Ibid., h. VI. cap. XVII, n. 75, p. 61, linhas 7-14: Unde distinctio illa, quae est
intra murum coincidentiae, ubi distinctum et indistinctum coincidunt, praevenit
omnem alteritatem et diversitatem, quae intelligi potest. Claudit enim murus
potentiam omnis intellectus, licet oculus ultra in paradisum respiciat, id autem,
quod videt, nec dicere nec intelligere potest. Est enim amor secretus suus et thesaurus
absconditus, qui inventus manet absconditus. Reperitur enim intra murum
coincidentiae absconditi et manifesti. (Ibid., cap. XVII, p. 200). Cf. Epistula ad
Nicolaum Bononiensem. cp. n. 45: Sic si respicio in amorem, in ipso reperio
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NOTAS
amorem amantem, amorem amabilem et amorem qui est amare utriusque. Si ad
essentiam amoris dei unitrini respicio ante quantitatem et omne accidens, quid me
impedit fateri amorem amantem patrem, amorem amabilem filium, et utriusque
amare spiritum sanctum? Nonne videmus quod amor amans de se generat
amabilitatem, sicut amor paternus generat amabilitatem filii, ex quibus procedit
amoris nexus utriusque?. Sobre os limites da compreensão e da linguagem
humana para falar sobre a Trindade: n. 44: Religio vestra Montisoliveti vocatur,
et ipsum unitrinum montem figuratis. In unitate igitur montis est trinitas et in
trinitate unitas. Sed inter istam trinitatem et divinam est differentia, quia divina
trinitas est ante omne accidens et quantitatem continuam et discretam. Ideo non
est pater in uno loco et filius in alio et spiritus sanctus in tertio, cum illa trinitas sit
ante locum et quantitatem. Montes autem, cum sint post quantitatem et locum, non
possunt nisi distincti esse in quantitate continua et discreta atque loco. Et quia ante
quantitatem et locum est essentia sine qua nihil est, si in ipsam essentiam unitrini
montis intueor per intellectum, nihil miror de divina; n. 47: Sed haec omnia, quae
aut ego aut alius maioris ingenii in his cogi tamus, etiam si ad hominem loquendo
aliquid similitudinis in divinis praestent, nihil tamen ad auctoritatem addunt
evangelii, quae cunctis quae cogitari et dici possunt incomparabiliter praefertur.
Ideo, fili mi, ad illius lectionem totum studium convertas. Ille, qui nobis ipsum
legendum dimisit, utique in ipso ut vivum dei verbum se manifestavit et mira
dulcedine importunam zelosamque animam tuam in temporis successu pascet et
fe cundabit (disponível em: ). 324
267 De visione dei. h. VI. cap. XVIII, n. 81, p. 64, linhas 4-5 : [...] es intellectus
intelligens et intellectus intelligibilis et utriusque nexus, [...]. (A visão de Deus.
cap. XVIII, p. 205).
268 À nobreza de Deus também corresponderia uma nobreza do homem que
deve ser justamente pensada a partir do conceito de liberdade. Por exemplo,
na sua conferência sobre a concordância entre exegese bíblica e especulação
filosófica, já citada, em Nicolau de Cusa, Reinhardt (2002, p. 140) aponta para
esta possibilidade ao afirmar: “Es cierto que los hombres para el Cusano no
son socios iguales de Dios, pero tampoco son siervos y esclavos; son, para
aplicar la metáfora del rey, nobles y libres. ‘Nuestro rey nobilísimo quiere
tener en su consejo nobles y voluntarios, y muchos, dice Nicolás de Cusa.
Otros escritos explican con más claridad la nobleza del hombre y presentan
una antropología de una audacia singular. Basta recordar sólo sus ideas de
la filiación divina de los hombres, de la mente como imagen viva de Dios,
del hombre como segundo dios y medida de todas las cosas y, no por último,
su idea de la fuerza creadora de la libertad humana”. Cf. CASARELLA, Peter.
Sacra Ignorantia: sobre la doxología filosófica del Cusano. In: ANDRÉ, João
Maria; ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano (Coord). Coincidência dos opostos
e concórdia: Caminhos do Pensamento em Nicolau de Cusa. Actas do
Congresso Internacional realizado em Coimbra e Salamanca nos dias 5
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NOTAS
a 9 de Novembro de 2001. Tomo I. Coimbra: Faculdade de Letras, 2001. p.
51-65: a ideia de uma “nobreza de Deus” e de uma “nobreza do homem”
também pode ser articulada, em certos aspectos, com a ideia de ser “digno
de louvor” exposta por Casarella (p. 61): “Los laudabilia [enquanto princípios
da scientia laudis] son principios que revelan el origen metafísico del hombre
para que él pueda alabar a Dios como la alabanza de Dios mismo. En cierto
modo el hombre es tanto objeto como sujeto de alabanza. Por su puesto Dios
es reconocido como digno de alabanza y glorioso en los siglos de los siglos.
Sin embargo, el hombre se reconoce asimismo como digno de la misma
alabanza porque es en su principio partícipe de la creatividad divina”.
269 De visione dei. h. VI. cap. XVIII, n. 80, p. 63-64; n. 81, p. 64, linhas 1-4:
Utinam, domine, aperirent oculos mentis omnes, qui eos tuo dono sunt assecuti, et
mecum viderent, quomodo tu, deus zelotes, quia amor amans, nihil odire potes! In te
enim deo amabili omnia amabilia complicanti omne amabile amas, ut sic viderent
mecum, quo foedere aut nexu sis omnibus unitus. Diligis tu, deus amans, ita omnia
quod singula; expandis amorem tuum ad omnes. Multi autem te non diligunt, qui
tibi praeferunt aliud a te. Si autem amor amabilis non esset distinctus ab amore
amante, esses omnibus adeo amabilis, quod nihil praeter te amare possent et omnes
rationales spiritus necessitarentur ad tui amorem. Sed tam nobilis es, deus meus,
ut velis in libertate esse rationalium animarum te diligere vel non. Quapropter ad
amare tuum non sequitur, quod ameris. Tu igitur, deus meus, amoris nexu omnibus
unitus es, quia expandis amorem tuum super omnem creaturam tuam; sed non omnis
rationalis spiritus est unitus tibi, quia amorem suum non in tuam amabilitatem 325
proicit, sed in aliud, cui unitur et nectitur. Desponsasti omnem animam rationalem
amore tuo amante, sed non omnis sponsa te sponsum amat, sed saepissime alium, cui
adhaeret. Sed quomodo posset attingere finem suum sponsa tua, deus meus, anima
humana, nisi tu fores diligibilis, ut sic te diligibilem diligendo ad nexum ac unionem
felicissimam pertingere posset? / Quis igitur negare potest te deum trinum, quando
videt, quod neque tu nobilis neque naturalis et perfectus deus esses nec spiritus liberi
arbitrii esse nec ipse ad tui fruitionem et felicitatem suam pertingere posset, si non
fores trinus et unus.” (A visão de Deus. cap. XVIII, p. 204-205).
270 Ibid., h. VI. cap. XVIII, n. 81, p. 64-65, linhas 4-18: Nam quia es intellectus
intelligens et intellectus intelligibilis et utriusque nexus, tunc intellectus creatus in
te deo suo intelligibili unionem tui et felicitatem assequi potest. Sic cum sis amor
amabilis, potest creata voluntas amans in te deo suo amabili unionem et felicitatem
assequi. Qui enim recipit te deum lucem receptibilem rationalem, ad talem usque
tui unionem pervenire poterit, ut sit tibi unitus ut filius patri. Video, domine, te
illustrante naturam rationalem non posse unionem tui assequi, nisi quia amabilis
et intelligibilis. Unde natura humana non est unibilis tibi deo amanti, sic enim non
es obiectum eius, sed est tibi unibilis ut deo suo amabili, cum amabile sit amantis
obiectum. Sic pariformiter intelligibile est obiectum intellectus; dicimus autem hoc
veritatem quod obiectum. Quare tu, deus meus, quoniam es veritas intelligibilis, tibi
uniri potest intellectus creatus. (Ibid., cap. XVIII, p. 205-206).
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
271 Ibid., h. VI. cap. XVIII, n. 82, p. 65: Et sic video humanam rationalem naturam
tuae divinae naturae intelligibili et amabili tantum unibilem et quod homo te deum
receptibilem capiens transit in nexum, qui ob sui strictitudinem filiationis nomen
sortiri potest; nexu enim filiationis non cognoscimus strictiorem. Quod si hic nexus
unionis est maximus, quo maior esse nequit – hoc evenire necesse erit, quia tu, deus
amabilis, plus diligi non potes ab homine – tunc nexus ille usque ad perfectissimam
filiationem pervenit, ut filiatio illa sit perfectio complicans omnem possibilem
filiationem, per quam omnes filii ultimam felicitatem et perfectionem assequuntur.
In quo altissimo filio filiatio est ut ars in magistro aut lux in sole, in aliis vero ut ars
in discipulis aut lux in stellis. (Ibid., cap. XVIII, p. 206).
272 Ibid., h. VI. cap. XVIII, n. 83, p. 66, linhas 7-20: Tu enim deus volens seu
amans in te deo amabili complicas omnia. Omne enim, quod tu deus volens vis aut
concipis, est in te deo amabili complicatum. Non enim esse potest quidquam, nisi
illud velis esse. Omnia igitur in conceptu tuo amabili causam seu rationem habent
essendi, neque est alia rerum omnium causa, nisi quia sic tibi placet. Nihil placet
amanti ut amanti nisi amabile. Tu igitur deus amabilis es filius dei amantis patris.
In te enim est omnis complacentia patris. Ita omne esse creabile complicatur in te
deo amabili. Tu igitur deus amans, cum ex te sit amabilis deus uti filius a patre, in
hoc quod es deus pater amans dei amabilis filii tui, es pater omnium, quae sunt.
Nam conceptus tuus est filius, et omnia in ipso. Et unio tui et tui conceptus est
actus et operatio exsurgens, in qua est omnium actus et explicatio. Cf. também:
cap. XVIII, n. 84, p. 66-67 : Sicut igitur ex te deo amante generatur deus
amabilis, quae generatio est conceptio, ita procedit ex te deo amante et conceptu 326
tuo amabili a te genito actus tuus et tui conceptus, qui est nexus nectens et deus
uniens te et conceptum tuum, quemadmodum amare unit amantem et amabile
in amore. Et hic nexus spiritus nominatur. Spiritus enim est ut motus procedens
a movente et mobili. Unde motus est explicatio conceptus moventis. Explicantur
igitur omnia in te deo spiritu sancto, sicut concipiuntur in te deo filio. Video igitur,
quia tu, deus, sic me illustras, quomodo omnia in te deo filio dei patris sunt ut in
ratione, conceptu, causa seu exemplari, et quomodo filius est medium omnium,
quia ratio. Mediante enim ratione et sapientia tu deus pater omnia operaris. Et
spiritus seu motus ponit conceptum rationis in effectu, sicut experimur arcam
in mente artificis poni mediante virtute motiva, quae inest manibus, in effectu.
(Ibid., cap. XIX, p. 207-208).
273 Cf. 4.3 O possest: nOme divinO que em si mesmO indica O nexO do presente livro..
274 De principio. h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 11, p. 13-15, linhas
3-5: Et ita vides principium et principiatum principium et principiatum principii
utriusque esse unam aeternitatis essentiam, quam Plato vocat unum; Cf. ainda:
Ibid., n. 11, p. 26, linhas 12-13: sed esse principii nominabilis innominabile
principium omne qualitercumque nominabile antecedens sicut melius. Em nota os
editores reenviam para o Evanjelho de João 8, 25 que é o tema de reflexão
do De principio: Tu quis es? Respondit eis Jesus: Principium, qui et loquor vobis.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
Além disso, reeviam também para o final do De principio: Et hic est, de quo in
themate, scilicet principium, qui et loquiturm, cui data est omnis potestas, quae in
caelo et in terra, cui omnes illi dii creati, de quibus dicunt praedicti, sive virtutes
sive potestates subsunt, cum sit verbum dei vivi, per quod sunt omnia, in quo sunt
omnes thesauri scientiae absconditi, per quem solum, sicut in esse et saeculum
temporale pervenimus, ad intemporale esse et perpetuam vitam reduci poterimus
per viam, quam opere et sermone ostendit principium in omnibus principiatum
tenens Iesus Christus semper benedictus. (Ibid., n. 40, p. 58-59, linhas 21-29).
Essas ideias serão retomadas e aprofundadas posteriormente. (cf. 4.2 Os
nOmes divinOs cOmO enigmas e O princípiO unitrino do presente livro).
275 Para este tema, conferir: MACHETTA, Jorge M. La ontología de lo creado.
In: NICOLÁS DE CUSA. Acerca de la docta ignorancia. Libro II: Lo máximo
contracto o universo (edición bilíngüe). Introducción, traducción y notas de
Jorge M. Machetta, Claudia D’Amico y Silvia Manzo. Buenos Aires: Biblos,
2004 (Notas complementarias n. 2): “A medida que se avanza en la lectura de
estos primeros capítulos aparece con mayor nitidez cuál es el punto de vista
que adopta el Cusano para abordar la estructura del universo: descubrir su
esencia metafísica a partir de su origen desde Dios” (p. 121).
276A dialética da complicatio-explicatio que aparece nos capítulos iniciais
desse segundo livro e a partir da qual Nicolau se propõe pensar a relação
entre o criador e criatura já discutimos anteriormente. Entretanto, faltou-
nos refletir sobre o conceito de contractio que no segundo livro do De docta
ignorantia é utilizado para determinar a diferença entre o universo e o 327
Máximo absoluto.
277 De docta ignorantia. w. L.II, Prologus, n.90, p. 2, linhas 8-12: Cum autem
causatum sit penitus a causa et a se nihil et originem atque rationem, qua est id quod
est, quanto propinquius et similius potest, concomitetur: patet difficile contractionis
naturam attingi exemplari absoluto incognito. (A douta ignorância. L. II,
Prólogo, n. 90, p. 65). Cf. também: Idiota. De mente. h. V, cap. X, n. 127, p.
179-180, linhas 3-14: IDIOTA: Verum dicis. Nam non scitur pars nisi toto scito; totum
enim mensurat partem. Quando enim coclear per partes ex ligno exscindo, partem
adaptando ad totum respicio, ut coclear bene proportionatum eliciam. Sic totum
coclear, quod mente concepi, est exemplar, ad quod respicio, dum partem fingo. Et
tunc possum perfectum coclear efficere, quando quaelibet pars proportionem suam
in ordine ad totum reservat. Similiter pars ad partem comparata suam integritatem
debet observare. Unde necesse erit, ut ad scientiam unius praecedat scientia
totius et partium eius. Quare deus, qui est exemplar universitatis, si ignoratur,
nihil de universitate, et si universitas ignoratur, nihil de eius partibus sciri posse
manifestum. Ita scientiam cuiuslibet praecedit scientia dei et omnium.
278 De docta ignorantia. w. L. II. Prologus, n. 90, p. 89, linhas 12-16: Supra
igitur nostram apprehensionem in quadam ignorantia nos doctos esse convenit, ut
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NOTAS
– praecisionem veritatis uti est non capientes – ad hoc saltim ducamur, ut ipsam
esse videamus, quam nunc comprehendere non valemus. (A douta ignorância.
L. II, Prólogo, n. 90, p. 65). Parece que esse seria o sentido dos termos
inintelligibiliter no segundo e no terceiro capítulo desse segundo livro. Ou seja,
sabemos que o ser da criatura é a partir do ser do criador e de que o máximo
complica e explica todas as coisas, mas somente de modo ininteligível. De
fato, não compreendemos ou compreendemos incompreensivelmente. Cf.
também: D’AMICO, Claudia. Nicolás de Cusa, “De mente”: la profundización
de la doctrina del hombre-imagen. In: Patristica et Mediaevalia. Volumen
XII, Buenos Aires, 1991, p. 53-67: “[…] no podemos conocer lo múltiple si no
preconocemos lo Uno pues Dios es el Máximo absoluto, Medida suprema
del más y del menos en el que nos hallamos inmersos. Sin embargo,
establecido ya que esta suprema Medida es incognoscible, cabe sostener
que el conocimiento de lo mensurado, que se realiza en relación con un
ejemplar por definición racionalmente inabordable, carece asimismo de
precisión. Sólo podemos tener acerca de lo real una aprehensión progresiva,
permanentemente perfectible, pues la Exactitud absoluta siempre nos
resultará ajena. De modo que, al medir el cosmos, el hombre sólo realiza
una coniectura, modo humano de conocer la verdad en la alteridad” (p. 56).
279 De docta ignorantia. w. L. II, cap. I, n.91, p. 4, linhas 9-15: Habuimus
in radice dictorum in excessis et excedentibus ad maximum in esse et posse
non deveniri. Hinc in prioribus ostendimus praecisam aequalitatem solum Deo
convenire. Ex quo sequitur omnia dabilia praeter ipsum differre. Non potest igitur 328
unus motus cum alio aequalis esse nec unus alterius mensura, cum mensura a
mensurato necessario differat. (A douta ignorância. L. II, cap. I, n. 91, p. 66).
280 Cf. Ibid., w. L. II, cap. I, n.91-94, p. 4-8; (Ibid., L. II, cap. I, n. 91-94, p. 66-68).
281 Ibid., w. L. II, cap. I, n. 97, p. 12, linhas 1-8; 13-22: Solum igitur absolute
maximum est negative infinitum; quare solum illud est id, quod esse potest omni
potentia. Universum vero cum omnia complectatur, quae Deus non sunt, non potest
esse negative infinitum, licet sit sine termino et ita privative infinitum; et hac
consideratione nec finitum nec infinitum est. Non enim potest esse maius quam est;
hoc quidem ex defectu evenit; possibilitas enim sive materia ultra se non extendit.
[...]. Quare, licet in respectu infinitae Dei potentiae, quae est interminabilis,
universum posset esse maius: tamen resistente possibilitate essendi aut materia,
quae in infinitum non est actu extendibilis, universum maius esse nequit; et ita
interminatum, cum actu maius eo dabile non sit, ad quod terminetur; et sic privative
infinitum. Ipsum autem non est actu nisi contracte, ut sit meliori quidem modo, quo
suae naturae patitur conditio. Est enim creatura, quae necessario est ab esse divino
simpliciter absoluto, [...]. (Ibid., L. II, cap. I, n. 97, p. 69-70).
282 Ibid., w. L. II, cap. II, n. 98, p. 14, linhas 4-9: Docuit nos sacra ignorantia in
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NOTAS
prioribus nihil a se esse nisi maximum simpliciter, ubi a se, in se, per se et ad se
idem sunt: ipsum scilicet absolutum esse; necesseque esse omne, quod est, id quod
est – inquantum est –, ab ipso esse. Quomodo enim id, quod a se non est, aliter esse
posset quam ab aeterno esse?. (Ibid., L. II, cap. II, n. 98, p. 70-71). Ao afirmar
que o universo é criatura, Nicolau evita fazer dele um outro perfeito, eterno
e infinito, que seria um princípio da pluralidade das coisas. Entretanto, em
sua especulação não existe confusão entre uma coisa singular e o universo.
Nesse sentido, então, Nicolau pode dizer que “a criatura tem de Deus o ser
una, discreta e conexa com o universo” [cursivo nosso] e, por isso, distingue
a criatura e o universo ao qual ela está “conectada”. Porém, não podemos
esquecer que é a “conexão” que faz o universo uno, distinto e conexo mesmo
que a unidade seja na pluralidade, a distinção da diversidade e a conexão na
divisão. Assim, será preciso determinar de modo geral o ser da criatura e a
sua relação com o criador; posteriormente, o ser do universo na sua relação
com as coisas singulares, ou seja, em que sentido o universo é uma unidade
de muitas coisas e, por último, a trindade do universo. Anteriormente já
apresentamos a especulação cusana sobre a relação entre criador e criatura
e a sua consequente “ininteligibilidade”; e isso ao discutirmos a complicatio
e a explicatio. Assim, no que segue caberá aprofundar o sentido da unidade e
da trindade do universo.
283 Ibid., w. L. II, cap. II, n. 98, p. 14, linhas 9-12: Quoniam autem ipsum maximum
procul est ab omni invidia, non potest esse diminutum ut tale communicare. Non
habet igitur creatura, quae ab esse est, omne id quod est:. (Ibid., L. II, Cap. II, n. 98, 329
p. 71). Cf. ainda: Ibid., w. L. II, cap. II, n.104, p. 20-22, linhas 11-20: Communicat
enim piissimus Deus esse omnibus eo modo, quo percipi potest. Cum igitur Deus
absque diversitate et invidia communicet et recipiatur, ita quod aliter et alterius
contingentia recipi non sinat, quiescit omne esse creatum in sua perfectione, quam
habet ab esse divino liberaliter, nullum aliud creatum esse appetens tamquam
perfectius, sed ipsum, quod habet a maximo, praediligens quasi quoddam divinum
munus, hoc incorruptibiliter perfici et conservari optans. (Ibid., L. II, Cap. II, n.
104, p. 75).
284 Ibid., w. L. II, cap. II, n.98, p. 14, linhas 11-15: Non habet igitur creatura, quae ab esse
est, omne id quod est: corruptibilitatem, divisibilitatem, imperfectionem, diversitatem,
pluralitatem et cetera huiusmodi a maximo aeterno, indivisibili, perfectissimo, indistincto,
uno, neque ab aliqua causa positiva. (Ibid., L. II, cap. II, n. 98, p. 71).
285 Ver anteriormente a nossa análise sobre o nexus no De venatione sapientiae.
É o próprio nexus que penetra e atravessa todas as coisas, garantindo que
elas permaneçam firmes no que são e não se corrompam. Por outro lado,
além de manter as coisas individualmente no que são, conservando-as em
si [intra se conservantur], esse espírito de conexão também as conecta à
totalidade do mundo.
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NOTAS
286 “discreta” e “discreção” (A douta ignorância, L. II, cap. II, n. 99, p. 71)
traduzem os termos latinos discreta e discretio. Esse adjetivo e substantivo
derivam do verbo latino discernĕre: separar; distinguir, discernir; Machetta,
D’Amico e Manzo traduzem por “separada” e “separación” (Acerca de la docta
ignorância, L. II, Cap. II, n. 99, p. 29); tanto Santinello (La dotta ignoranza,
L. II, Cap. II, n. 99, p. 132) quanto Vescovini (La dotta ignoranza, L. II, Cap.
II, p. 114) traduzem por “distinta” e “distinzione”; Hopkins (On Learned
Ignorance, L. II, Chapter Two, n. 99, p. 91): “distinct” e “distinctness”.
287 De docta ignorantia. w. L.II, cap. II, n.99, p. 14-16, linhas 9-13: Habet igitur
creatura a Deo, ut sit una, discreta et connexa universo et, quanto magis una, tanto Deo
similior. Quod autem eius unitas est in pluralitate, discretio in confusione et connexio
in discordantia, a Deo non habet neque ab aliqua causa positiva, sed contingenter.
(A douta ignorância. L. II, cap. II, n. 99, p. 71).
288 Ibid., w. L. II, cap. II, n.100, p. 16, linhas 1-3: Quis igitur copulando simul
in creatura necessitatem absolutam, a qua est, et contingentiam, sine qua non est,
potest intelligere esse eius?. (Ibid., L. II, cap. II, n. 100, p. 71).
289 Ibid., w. L. II, cap. III, n.109, p. 26, linhas 1-2: Excedit autem mentem nostram
modus complicationis et explicationis. (Ibid., L. II, cap. III, n. 109, p. 77).
290 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.115, p. 34, linhas 16-17: Universum dicit
universalitatem, hoc est unitatem plurium; (Ibid., L. II, cap. IV, n. 115, p. 82).
291 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.116, p. 36, linhas 19-20: Contractio dicit ad aliquid, 330
ut ad essendum hoc vel illud. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 116, p. 83).
292 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.112, p. 30, linhas 11-14: Igitur quae in primo libro de
absoluto maximo nobis nota facta sunt, illa, ut absoluto absolute maxime conveniunt,
contracto contracte convenire affirmamus. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 112, p. 80).
293 Cf. Ibid., w. L. II, cap. IV, n.113, p. 30-32 (Ibid., L. II, cap. IV, n. 113, p. 80-81).
294 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.114, p. 32, linhas 1-6: Unde, quando recte
consideratur de contractione, omnia sunt clara. Nam infinitas contracta aut
simplicitas seu indistinctio per infinitum descendit in contractione ab eo, quod est
absolutum, ut infinitus et aeternus mundus cadat absque proportione ab absoluta
infinitate et aeternitate et unum ab unitate. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 114, p. 81). Cf.
também: Ibid., w. L. II, cap. IV, n.116, p. 34, linhas 1-4: Quoniam vero dictum
est universum esse principium contractum tantum atque in hoc maximum, patet,
quomodo per simplicem emanationem maximi contracti a maximo absoluto totum
universum prodiit in esse. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 116, p. 82).
295 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.114, p. 32, linhas 6-15: Unde unitas absoluta ab omni
pluralitate absoluta est. Sed contracta unitas, quae est unum universum, licet sit
unum maximum, cum sit contractum, non est a pluralitate absolutum, licet non
sit nisi unum maximum contractum. Quare quamvis sit maxime unum, est tamen
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NOTAS
illa eius unitas per pluralitatem contracta, sicut infinitas per finitatem, simplicitas
per compositionem, aeternitas per successionem, necessitas per possibilitatem et ita
de reliquis, quasi absoluta necessitas se communicet absque permixtione et in eius
opposito contracte terminetur. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 114, p. 81).
296 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.115, p. 34, linhas 1-4: Ex hiis multa investigator
elicere poterit. Nam sicut Deus, cum sit immensus, non est nec in sole nec in luna,
licet in illis sit id, quod sunt, absolute: ita universum non est in sole nec in luna, sed
in ipsis est id, quod sunt, contracte. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 115, p. 81).
297 Considerando que o primeiro termo significa a quididade contraída ou
forma específica de qualquer coisa e o segundo a própria coisa singular.
298 De docta ignorantia. w. L. II, cap. IV, n.115, p. 34, linhas 4-19: Et quia
quidditas solis absoluta non est aliud a quidditate absoluta lunae – quoniam est ipse
Deus, qui est entitas et quidditas absoluta omnium, – et quidditas contracta solis
est alia a quidditate contracta lunae – quia, ut quidditas absoluta rei non est res
ipsa, ita contracta non est aliud quam ipsa –: quare patet quod, cum universum sit
quidditas contracta, quae aliter est in sole contracta et aliter in luna, hinc identitas
universi est in diversitate sicut unitas in pluralitate. Unde universum, licet non sit
nec sol nec luna, est tamen in sole sol et in luna luna; Deus autem non est in sole sol
et in luna luna, sed id, quod est sol et luna, sine pluralitate et diversitate. Universum
dicit universalitatem, hoc est unitatem plurium; propter hoc, sicut humanitas non
est nec Socrates nec Plato, sed in Socrate est Socrates, in Platone Plato, ita universum
ad omnia. (A douta ignorância, L. II, cap. IV, n. 115, p. 81-82). 331
299 Ibid., w. L. II, cap. V, n.120, p. 40, linhas 10-11: [...], hoc fecit omnia in diversis
gradibus esse, [...]. (Ibid., L. II, cap. V, n. 120, p. 86).
300 Ibid., w. L.II, cap. V, n.121, p. 40-42: Quiescunt igitur omnia in quolibet,
quoniam non posset unus gradus esse sine alio, sicut in membris corporis quodlibet
confert cuilibet et omnia in omnibus contentantur. Postquam enim oculus non
potest esse manus et pedes et alia omnia actu, contentatur se esse oculum, et pes
pedem; et omnia membra sibi mutuo conferunt, ut quodlibet sit meliori modo, quo
potest, id quod est. Et non est manus nec pes in oculo, sed in oculo sunt oculus,
inquantum ipse oculus est immediate in homine; et ita omnia membra in pede,
inquantum pes immediate in homine, ut quodlibet membrum per quodlibet
immediate sit in homine et homo sive totum per quodlibet membrum sit in quolibet,
sicut totum in partibus est per quamlibet in qualibet. (Ibid., L. II, cap. V, n. 120,
p. 86). Cf. MARTINEZ GÓMEZ, 1965, p. 44: “En cada fragmento y desde cada
fragmento se insinúa la totalidad con un enfoque nuevo, siempre distinto.
Así el Cusano, así Leibniz y toda tradición que les une, verán ‘quodlibet
in quolibet’; cada punto, mónada, o porción del todo, será, en su escala
diversa, un espejo del todo; éste como una perspectiva total, síntesis de
todas las perspectivas particulares. Pues bien, esta relación transcendente
e inmanente del todo respecto de las partes la expresa el Cusano con su
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NOTAS
término técnico ‘mensura’: ‘totum… mensurat partem’ [De mente, c. 10]. Con
la consecuencia de interés de que es imposible conocer las partes sin conocer
antes el todo: ‘non scitur pars nisi toto scito’, de modo que al conocimiento
de una parte ha de preceder la ciencia del todo y de sus partes, es decir,
de su estructuración; ‘necesse est ut ad scientiam unius praecedat scientia
totius et partium eius’ [Ibid]”.
301 De docta ignorantia. w. L. II, cap. V, n.122, p. 42: Si igitur consideras
humanitatem quasi esse quid absolutum, impermiscibile et incontrahibile, et
hominem consideras, in quo est ipsa absoluta humanitas absolute et a quo est
ipsa contracta humanitas, quae est homo: est ipsa humanitas absoluta quasi Deus
et contracta quasi universum. Et sicut ipsa absoluta humanitas est in homine
principaliter seu prioriter et consequenter in quolibet membro aut qualibet parte,
et ipsa contracta humanitas est in oculo oculus, in corde cor et ita de reliquis,
et ita contracte in quolibet quodlibet: tunc secundum hanc quidem positionem
reperta est similitudo Dei et mundi et eorum omnium manuductio, quae in istis
duobus capitulis tacta sunt, cum aliis multis quae ex hoc sequuntur. (A douta
ignorância, L. II, cap. V, n. 122, p. 86-87). É essa “a admirável unidade das
coisas” e “conexão sumamente admirável” a qual Nicolau se refere e da
qual tanto a “diversidade” quando a “conexão” das coisas é resultado. Cf.
Ibid., w. L. II, cap. V, n.120, p. 40, linhas 1-11: Considera attentius et videbis,
quomodo quaelibet res actu existens ex eo quiescit, quia omnia in ipso sunt ipsum
et ipsum in Deo Deus. Mirabilem rerum unitatem, admirandam aequalitatem
et mirabilissimam vides connexionem, ut omnia sint in omnibus. Rerum etiam 332
diversitatem et connexionem in hoc exoriri intelligis. Nam cum quaelibet res actu
omnia esse non potuit – quia fuisset Deus, et propterea omnia in quolibet essent
eo modo, quo possent secundum id, quod est quodlibet, – nec potuit quodlibet esse
consimile per omnia alteri, ut patuit supra: hoc fecit omnia in diversis gradibus esse;
(Ibid., L. II, cap. V, n. 120, p. 85-86).
302 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.116, p. 36, linhas 20-25: Deus igitur, qui est unus, est
in uno universo; universum vero est in universis contracte. Et ita intelligi poterit,
quomodo Deus, qui est unitas simplicissima, existendo in uno universo est quasi
ex consequenti mediante universo in omnibus, et pluralitas rerum mediante uno
universo in Deo. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 116, p. 83).
303 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.116, p. 36, linhas 14-19: Unde, sicut abstractum est in
concreto, ita absolutum maximum in contracto maximo prioriter consideramus, ut
sit consequenter in omnibus particularibus, quia est absolute in eo, quod est omnia
contracte. Est enim Deus quidditas absoluta mundi seu universi; universum vero est
ipsa quidditas contracta. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 116, p. 82-83).
304 Ibid., w. L. II, cap. IV, n.116, p. 34-36, linhas 4-14: Omnia autem entia,
quae sunt partes universi, sine quibus universum – cum sit contractum – unum,
totum et perfectum esse non posset, simul cum universo in esse prodierunt, et non
prius intelligentia, deinde anima nobilis, deinde natura, ut voluit Avicenna et alii
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NOTAS
philosophi. Tamen, sicut in intentione artificis est prius totum, puta domus, quam
pars, puta paries, ita dicimus, quia ex intentione Dei omnia in esse prodierunt,
quod tunc universum prius prodiit et in eius consequentiam omnia, sine quibus
nec universum nec perfectum esse posset. (Ibid., L. II, cap. IV, n. 116, p. 82-83).
305 Ibid., w. L. II, cap. V, n.117, p. 36-38, linhas 9-11; 16-20: Universum enim
quasi ordine naturae ut perfectissimum praecessit omnia, ut quodlibet in quolibet
esse posset.; Non igitur omnia sunt plura, quoniam pluralitas non praecedit
quodlibet. Unde omnia sine pluralitate praecesserunt quodlibet ordine naturae. Non
sunt igitur plura in quolibet actu, sed omnia sine pluralitate sunt id ipsum. (Ibid.,
L. II, cap. V, n. 117, p. 83 e 84). Cf. também: Ibid., w. L.II, cap. VI, n.124, linhas
13-16 e 125, linhas 5-11, p. 42-46 (Ibid., L. II, cap. VI, n. 124-125, p. 88-89).
No sexto capítulo, Nicolau trata resumidamente dos graus de contração do
universo (n.123). A unidade universal é a explicação da primeira unidade
absoluta e complica a pluralidade de todas as coisas contraídas, sendo, assim,
“a raiz de todas as coisas”. Ao comparar o universo com a universalidade
dos dez gêneros sumos, Nicolau retoma a ideia de “ordem natural”: Est igitur
universum quasi decem generalissimorum universitas, et deinde genera, deinde
species. Et ita universalia sunt illa secundum gradus suos, quae ordine quodam
naturae gradatim ante rem, quae actu ipsa contrahit, existunt.; Habent tamen
universalia ordine naturae quoddam esse universale, contrahibile per singulare –
non quod sint actu ante contractionem aliter quam naturali ordine, ut universale
contrahibile in se non subsistens, sed in eo, quod actu est; sicut punctus, linea,
superficies ordine progressivo corpus, in quo actu tantum sunt, praecedunt. 333
306 De docta ignorantia. w. L. II, cap. IV, n.112, p. 30, linhas 9-14: Nam ipsum
contractum seu concretum cum ab absoluto omne id habeat, quod est, tunc illud,
quod est maximum, maxime absolutum quantum potest concomitatur. Igitur
quae in primo libro de absoluto maximo nobis nota facta sunt, illa, ut absoluto
absolute maxime conveniunt, contracto contracte convenire affirmamus. (A
douta ignorância. L. II, cap. IV, n. 112, p. 80). Posteriormente veremos que
o mesmo princípio vale também para a relação entre a mente humana e a
mente divina no que diz respeito à trindade. Cf. Idiota. De mente. h. V, n.
132, p. 186, linhas 10-15: IDIOTA: Omnia principiata in se similitudinem principii
habere atque ideo in omnibus trinitatem in unitate substantiae in similitudine verae
trinitatis et unitatis substantiae principii aeterni reperiri certum teneo. In omnibus
igitur, quae principiata sunt, posse fieri, quod descendit a virtute infinita unitatis
seu entitatis absolutae, posse facere, quod descendit a virtute absolutae aequalitatis,
et compositionem utriusque, quae descendit a nexu absoluto, reperiri necesse est.
307 De docta ignorantia. w. L. II, cap. VII, n.127, p. 48-50, linhas 3-4; 7-17:
Postquam unitas absoluta est necessario trina, non quidem contracte, sed absolute
– [...]–: ita quidem unitas maxima contracta, etiam ut est unitas, est trina; non
quidem absolute, ut trinitas sit unitas, sed contracte, ita quod unitas non sit nisi
in trinitate, sicut totum in partibus contracte. In divinis unitas non est contracte
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
in Trinitate, ut totum in partibus seu universale in particularibus, sed ipsa unitas
est Trinitas. Propterea quaelibet personarum est ipsa unitas; et quoniam unitas est
Trinitas, una persona non est alia. In universo vero non potest ita esse. Propter hoc
tres illae correlationes, quae in divinis personae vocantur, non habent esse actu
nisi in unitate simul. (A douta ignorância. L. II, cap. VII, n. 127, p. 90-91).
Quando no primeiro livro do De docta ignorantia Nicolau de Cusa especula
sobre a Trindade do princípio, ele parte da trindade do mundo, ou seja,
da multiplicidade, da desigualdade e da divisão. À multiplicidade precede
a unidade, à desigualdade, a igualdade e à divisão, a conexão. Unidade,
igualdade e conexão, enquanto eternas, são uma mesma e única unidade, ou
seja, uma trindade que é unidade. Agora, a compreensão do princípio como
trindade ilumina o conhecimento do próprio mundo, pois se no primeiro
livro se mostrou que a Trindade divina só pode ser conhecida por meio
do mundo, agora o próprio conhecimento do universo é iluminado pelo
conhecimento alcançado do seu princípio. Já nos referimos anteriormente
ao que Nicolau expõe no Prólogo do Segundo Livro: “vê-se que é difícil atingir
a natureza da contração desconhecido o exemplar absoluto”, pois o que o
causado é e possui é pela causa e não tem nada a partir de si mesmo.
308 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.128, p. 50, linhas 5-6: Ita quidem in contracto esse
nequit. (Ibid., L. II, cap. VII, n. 127, p. 91).
309 Cf. nota 321.
310 De docta ignorantia. w. L.II, cap. VII, n.128, p. 50, linhas 1-14: Oportet acute 334
ista advertere. Nam in divinis tanta est perfectio unitatis, quae est Trinitas, quod
Pater est actu Deus, Filius actu Deus, Spiritus sanctus actu Deus; Filius et Spiritus
sanctus actu in Patre, Filius et Pater in Spiritu sancto, Pater et Spiritus sanctus in
Filio. Ita quidem in contracto esse nequit. Nam correlationes non sunt subsistentes per
se nisi copulate; neque quaelibet propterea potest esse universum, sed simul omnes;
neque una est in aliis actu, sed sunt eo modo, quo hoc patitur conditio contractionis,
perfectissime ad invicem contractae, ut sit ex ipsis unum universum, quod sine illa
trinitate esse non posset unum. Non potest enim contractio esse sine contrahibili,
contrahente et nexu, qui per communem actum utriusque perficitur. Embora
estejamos utilizando preferencialmente a tradução portuguesa, será preciso
coteja-la com outras traduções, objetivando esclarecer uma diferença entre
essa e as traduções disponíveis. Vejamos a tradução portuguesa: “Não pode
ser assim num [ser] contraído. Pois as correlações não são subsistentes por
si a não ser em conjunto; nem uma qualquer coisa [cursivo nosso] pode, por
isso, ser universo, mas todas em conjunto; e uma não é em ato nas outras,
mas são de modo que lhes permite a condição da contração contraídas
reciprocamente tão perfeitissimamente que delas surge um universo uno
que não poderia ser uno sem essa trindade. A contração não pode ser sem
o contraível, o contraente e o nexo que se perfaz no ato comum a ambos (A
douta ignorância. L. II, cap. VII, n. 128, p. 91). Por outro lado, Machetta,
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NOTAS
D’Amico e Manzo traduzem: “De esta manera ciertamente no puede darse
en lo contracto. Pues las correlaciones no son subsistentes por sí sino
copulativamente. Ni por ello tampoco cualquier correlación [cursivo nosso]
puede ser el universo, sino todas simultáneamente. Ni tampoco una es en
acto en las otras, sino que son del modo como lo soporta la condición de la
contracción: recíprocamente contractas con toda perfección, a fin de que de
parte de ellas el universo sea uno, el cual sin esa trinidad no podría ser uno”.
(Acerca de la docta ignorância, L. II, Cap. VII, n. 128, p. 59). Chamamos
a atenção, portanto, para a tradução do pronome e adjetivo indefinido
quaelibet (quilibet, quaelibet, quidlibet). Tanto na tradução italiana de Santinello
quanto na tradução de Hopkins, vamos encontrar o termo quaelibet referido
a correlationes: “Infatti le correlazioni reciproche non sussistono per sé se
non congiunte insieme; ognuna di esse [ou seja, le correlazioni] non può
essere l’universo, ma lo sono prese tutte insieme” (La dotta ignoranza, L.
II, Cap. VII, n. 128, p. 151) e “for the mutual relationships exist per se only
conjointly. Therefore, it cannot be the case that each distinct relationship
is the universe; rather, all the mutual relationships [are] collectively [the
universe]” (On Learned Ignorance, L. II, Chapter Two, n. 128, p. 103). Diante
das traduções propostas, podemos colocar apenas alguns questionamentos:
as duas traduções são possíveis? As traduções implicariam também uma
interpretação diferente do mesmo texto? Seria possível afirmar, conforme
a especulação cusana, que “uma qualquer coisa” não pode “ser universo,
mas todas em conjunto” da mesma forma que o olho não pode ser o
corpo, mas todos os membros em conjunto formam um único organismo? 335
Da mesma forma, assim como o olho não é em ato na mão, também não
poderíamos dizer que “uma qualquer coisa” não é em ato nas outras coisas,
“mas são de modo que lhes permite a condição da contração contraídas
reciprocamente tão perfeitissimamente que delas surge um universo uno
que não poderia ser uno sem essa trindade”? Por outro lado, levando em
consideração que “correlação” na trindade divina é cada uma das pessoas
e em um ser contraído, ou seja, na contração é o contraente (possibilidade
ou matéria), o contraível (forma) e o nexo de ambos, então, também não
concluiríamos contra a especulação cusana se afirmássemos que “qualquer
correlação” não pode ser o universo, “sino todas simultáneamente”, já
que a matéria, a forma e o nexo não são subsistentes por si, mas somente
“em conjunto” em uma contração. Por exemplo, como as correlações não
são por si subsistentes, mas só em conjunto, assim qualquer “correlação”
(possibilidade ou matéria, forma e nexo) não pode ser o universo, mas
“todas simultaneamente”. E, posteriormente, uma correlação não é em ato
na outra: a matéria não é em ato na forma nem no nexo; a forma não é
em ato na matéria nem no nexo; o nexo não é em ato na matéria nem na
forma. Mas, “son del modo como lo soporta la condición de la contracción:
recíprocamente contractas con toda perfección, a fin de que de parte de
ellas el universo sea uno […]”. Assim, matéria, forma e nexo são segundo
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
o modo da contração e são reciprocamente contraídas de modo que da
possibilidade ou matéria, da forma e do nexo surja um universo uno. Caso
tenhamos interpretado bem as duas traduções, poderíamos afirmar que, na
primeira [João Maria André], o acento é colocado em cada coisa que, por
ser uma unidade contraída de matéria, forma e nexo, possui a sua própria
identidade, mas a contração não se dá como se cada coisa fosse isoladamente
contraída, mas são contraídas reciprocamente de modo tão perfeito que
de todas as coisas surge um universo uno. As coisas são unidades que se
“formam” pela correlação de três correlações, mas cada coisa está também
“correlata” às outras e somente sendo-com é que elas de fato são. A segunda
[Machetta, D’Amico e Manzo e também Santinello e Hopkins] parece seguir
o contexto de todo o capítulo VII e seguintes, tendo em vista que a trindade
do universo será pensada a partir das “correlações” que, na Trindade,
são as três pessoas. Portanto, parece-nos que a tradução portuguesa não
seria contrária às especulações cusanas sobre a relação entre as coisas
particulares e o universo, mas reconhecemos que as outras traduções são
mais coerentes com o contexto da especulação sobre a trindade do universo.
311 De docta ignorantia. w. L. II, cap. VII, n.128, p. 50, linhas 15-17: Non potest
enim contractio esse sine contrahibili, contrahente et nexu, qui per communem
actum utriusque perficitur. (A douta ignorância. L. II, cap. VII, n. 128, p. 91).
312 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.128, p. 50, linhas 12-14: Contrahibilitas vero dicit
quandam possibilitatem, et illa ab unitate gignente in divinis descendit, sicut
alteritas ab unitate. (Ibid., L. II, cap. VII, n. 128, p. 91-92). 336
313 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.129, p. 50, linhas 1-2: Ipsum autem contrahens, cum
terminet possibilitatem contrahibilis, ab aequalitate unitatis descendit. (Ibid., L. II,
cap. VII, n. 129, p. 92).
3143 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.130, p. 52, linhas 7-9: Hunc autem nexum a Spiritu
sancto, qui est nexus infinitus, descendere manifestum est. (Ibid., L. II, cap. VII,
n.1 30, p. 93).
315 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.130, p. 52, linhas 1-7: Est deinde nexus contrahentis et
contrahibilis sive materiae et formae aut possibilitatis et necessitatis complexionis,
qui actu perficitur quasi quodam spiritu amoris motu quodam illa unientis. Et
hic nexus determinata possibilitas a quibusdam nominari consuevit, quoniam
posse esse ad actu esse hoc vel illud determinatur ex unione ipsius determinantis
formae et determinabilis materiae. (Ibid., L. II, cap. VII, n. 130, p. 92-93). Para
a diversidade de termos utilizados para dizer o contraente, o contraível e o
nexo ver: Ibid., w. L. II, cap. VII, n.128-130, p. 50-52 (Ibid., L. II, cap. VII, n.
128-130, p. 91-93). Cf. Lectiones in Boethii Librum De Trinitate. nh. II, 9, p.
155: Et ea quidem universitas est in Necessitate Absoluta, in simplicitate et unione
quadam omnium rerum, quae Deus est. Est etiam in necessitate complexionis in
quodam ordine et progressione, immutabiliter tamen. Est in possibilitate absoluta,
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NOTAS
in possibilitate tamen sine actu omni. Est etima in determinata possibilitate,
possibiliter et actu; Glossa super Librum Boethii De S. Trinitate. nh. II, 22,
p. 285: Estque eadem rerum universitas possibilitas determinata utpote redacta
ad optimos actus ex coetu intelligentiae atque materiae.
316 Cf. REINHARDT (2008, p. 18): “Dans la structure ternaire recueille de la
contemplations de la création, l’Esprit Saint apparaît comme nexus, connexio,
amor, dilectio, unio ; il est le lien qui unit le Père et le Fils. En faveur d’une
telle désignation de l’Esprit Saint, le Cusain peut s’appuyer sur une large
tradition. Il lui imprime cependant de nouveaux accents. Plus clairement
que bien d’autres théologiens, il souligne que le nexus doit être compris
comme relation en mouvement. Il définit l’Esprit Saint précisément comme
motus, comme mouvement, qui unit dans la divinité le Père et le Fils. Sur
ce point, Cusanus a probablement été influencé para la conception de la
Trinité d’un Raymond Lulle. Ainsi, par exemple, à la suite d’Augustin, Lulle a
distingué trois aspects dans l’amour : le sujet, qui est l’aimant, l’objet, qui est
l’aimable, l’acte d’aimer, dans lequel aimant et aimé sont un, est attribué à
l’Esprit Saint. Ce n’est pas seulement en Dieu que, d’après le Cusain, l’Esprit
Saint est à l’oevre comme une force unissante, mais également dans toute
la création, quoique de moindre façon. Dans le sermon déjà cité [Sermon
XXXVII], le Cusain voit dans l’enseignement platonicien de l’âme du monde,
une allusion à l’Esprit Saint. Il est le motus universitatis, le mouvement qui
tient ensemble l’univers. Sa force se manifeste entre autres par le fait qu’il
assemble matière et forme en une seule substance. L’action de l’Esprit 337
sera précisément décrite comme attraction et amour. Dans le monde des
hommes, cette force trouve son déploiement le plus élevé lorsqu’elle attire
vers Dieu l’esprit humain. Nicolas de Cues souligne plusieurs fois que cette
action ne peut être attribuée en propre uniquement au Saint-Esprit en tant
que troisième Personne divine, mais qu’on peut l’attribuer en vérité à Dieu,
de farçon générale”.
317 É verdade que, posteriormente, ele fará algumas ponderações sobre o
conhecimento dos filósofos a respeito da doutrina do Logos encarnado e da
sua filiação divina, assim como negará que os filósofos tenham conhecido
o Espírito Santo. Cf. REINHARDT, p. 218-219): “Nicolas de Cues interprète
les affirmations bibliques sur l’Esprit Saint surtout à travers la doctrine
des traces du Dieu Trine dans la création. Il en résulte sa conseption
selon laquelle les philosophes païens comme Platon, Aristote et le
légendaire Hermès Trismégiste auraint pu eux aussi atteindre une certaine
connaissance de la Trinité divine et, par là également, de l’Esprit Saint. Il
restreint toutefois cette affirmation, spécialement dans ses derniers écrits.
Il y dit que les philosophes païens avaint certes connu le Logos, mais pas sa
personalité. Dans le texte De divisione Dei, il est d’avis que les philosophes
sont incapables de saisir l’Incarnation du Logos et l’union hypostatique de
la divinité et de l’humanité qui en découle. Pour notre thème, il est surtout
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important qu’il dénie aux philosophes païens, dans son écrit du De beryllo,
la connaissance de l’Esprit Saint”. Oportunamente retomaremos algumas
discussões sobre o De beryllo (Cf. 4.2 Os nOmes divinOs cOmO enigmas e O princípiO
unitrinO do presente livro).
318 De docta ignorantia. w. L. II, cap. VII, n. 130, p. 52-54, linhas 10-22: Est
igitur unitas universi trina, quoniam ex possibilitate, necessitate complexionis
et nexu, quae potentia, actus et nexus dici possunt. Et ex hoc quattuor modos
universales essendi collige. Nam est modus essendi, qui absoluta necessitas dicitur,
ut scilicet Deus est forma formarum, ens entium, rerum ratio sive quidditas; et in
hoc essendi modo omnia in Deo sunt ipsa necessitas absoluta. Alius modus est, ut
res sunt in necessitate complexionis, in qua sunt rerum formae in se verae cum
distinctione et ordine naturae, sicut in mente; an autem hoc ita sit, videbimus
infra. Alius modus essendi est, ut res sunt in possibilitate determinata actu hoc vel
illud. Et infimus modus essendi est, ut res possunt esse, et est possibilitas absoluta.
(A douta ignorância. L. II, cap. VII, n. 130, p. 93).
319 Ibid., w. L. II, cap. VII, n. 131, p. 54, linhas 1-3: Tres modi essendi ultimi sunt in
una universitate, quae est maximum contractum; ex quibus est unus universalis modus
essendi, quoniam nihil sine ipsis esse potest. (Ibid., L. II, cap. VII, n. 131, p. 93).
320 Ibid., w. L. II, cap. VIII, n. 132, p. 54, linhas 3-10: Ut summatim saltem ea,
quae nostram ignorantiam doctam efficere possunt, hic enarremus, iam dictos essendi
trinos modos aliquantulum discutiamus, a possibilitate inchoantes. De qua multa
quidem per veteres dicta sunt, quorum omnium sententia fuit ex nihilo nihil fieri; et 338
ideo quandam absolutam omnia essendi possibilitatem et illam aeternam affirmarunt,
in qua omnia possibiliter complicata credebant. (Ibid., L. II, cap. VIII, n. 132, p. 94).
321 Ibid., w. L. II, Cap. VIII, n. 136, p. 60: “Nos autem per doctam ignorantiam
reperimus impossibile fore possibilitatem absolutam esse. Nam cum inter possibilia
nihil minus esse possit quam possibilitas absoluta, quae est propinquissime circa
non-esse (secundum etiam positionem auctorum), hinc ad minimum deveniretur
atque ad maximum in recipientibus magis et minus, quod est impossibile. Quare
possibilitas absoluta in Deo est Deus, extra ipsum vero non est possibilis; numquam
enim est dabile aliquid, quod sit in potentia absoluta, cum omnia praeter primum
necessario sint contracta. Si enim reperiuntur diversa in mundo ita se habentia,
quod ex uno possunt plura esse quam ex alio, ad maximum et minimum simpliciter
et absolute non devenitur; sed quia ista reperiuntur, patet absolutam possibili tatem
non esse dabilem”. (Ibid., L. II, Cap. VIII, n. 136, p. 97). Para a posição dita dos
“platônicos” e dos “aristotélicos” ver: Ibid., w. L.II, Cap. VIII, n.133, p. 56-58
e n.135, p. 58-60 (Ibid., L. II, Cap. VIII, n. 133, p. 95-96 e n. 135, p. 96-97).
322 Ibid., w. L. II, Cap. VIII, n. 137, p.60, linhas 1-12: ‘Omnis igitur possibilitas
contracta est; per actum autem contrahitur. Quare non reperitur pura possibilitas,
penitus indeterminata per quemcumque actum; neque aptitudo possibilitatis potest
esse infinita et absoluta, omni carens contractione. Deus enim, cum sit actus infinitus,
non est nisi causa actus. Sed possibilitas essendi est contingenter. Si igitur possibilitas
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NOTAS
est absoluta, cui contingit? Contingit autem possibilitas per hoc, quod esse a primo
non potest esse penitus et simpliciter et absolute actus. Quare contrahitur actus per
possibilitatem, ut non sit absolute nisi in potentia; et potentia non est absolute, nisi
per actum sit contracta.” (Ibid., L. II, Cap. VIII, n. 137, p. 98).
323 Ibid., w. L. II, Cap. VIII, n. 138, p. 62: “Amplius, nisi possibilitas rerum
contracta esset, non posset ratio rerum haberi, sed casu omnia essent, ut voluit
falso Epicurus. Quod enim hic mundus prodiit rationabiliter ex possibilitate, ex eo
necessario fuit, quod possibilitas ad essendum mundum istum tantum aptitudinem
habuit. Contracta igitur et non absoluta fuit aptitudo possibilitatis. Ita de terra et
sole et ceteris, quae, nisi quadam contracta possibilitate latitassent in materia, non
maior ratio fuisset, cur ad actum potius quam non prodiissent.” (Ibid., L. II, Cap.
VIII, n. 138, p. 98).
324 Ibid., w. L. II, cap. VIII, n. 139, p. 62-64: Unde, quamvis Deus infinitus sit
et mundum secundum hoc infinitum creare potuisset, tamen – quia possibilitas
necessario contracta fuit, et non penitus absoluta nec infinita aptitudo – hinc
secundum possibilitatem essendi mundus actu infinitus aut maior vel aliter esse
non potuit. Contractio autem possibilitatis ex actu est, actus autem ab ipso maximo
actu est. Quare, cum contractio possibilitatis sit ex Deo et contractio actus ex
contingenti, hinc mundus necessario contractus ex contingenti finitus est. Unde ex
notitia possibilitatis videmus, quomodo maximitas contracta evenit ex possibilitate
necessario contracta; quae quidem contractio non est ex contingenti, quia per
actum. Et ita universum rationabilem et necessariam causam contractionis habet,
ut mundus, qui non est nisi esse contractum, non sit contingenter a Deo, qui est 339
maximitas absoluta. (Ibid., L. II, cap. VIII, n.139, p. 99).
325 Ibid., w. L. II, cap. VIII, n. 140, p. 64, linhas 1-8: Et hoc quidem singularius
considerandum. Unde, cum possibilitas absoluta sit Deus, si mundum
consideramus ut in ipsa est, tunc est ut in Deo et est ipsa aeternitas; si ut est in
possibilitate contracta consideramus, tunc possibilitas natura tantum mundum
praecedit, et non est illa possibilitas contracta nec aeternitas nec Deo coaeterna,
sed cadens ab ipsa, ut contractum ab absoluto, quae distant per infinitum. (Ibid.,
L. II, cap. VIII, n. 140, p. 99).
326 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 141, p. 64, linhas 3-9: Sapientes omnes in hoc
concordant, quod posse esse ad actu esse non potest nisi per actu esse deduci,
quoniam nihil seipsum ad actu esse producere potest, ne sit sui ipsius causa; esset
enim, antequam esset. Unde illud, quod possibilitatem actu esse facit, ex intentione
agere dixerunt, ut ordinatione rationabili possibilitas ad actu esse deveniret et non
casu. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 141, p. 100).
327 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 142, p. 64-66, linhas 1-7; 15-20: Hanc excelsam naturam
alii mentem, alii intelligentiam, alii animam mundi, alii fatum in substantia, alii – ut
Platonici – necessitatem complexionis nominarunt, qui aestimabant possibilitatem
necessitate per ipsam determinari, ut sit nunc actu, quod prius natura potuit. In
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NOTAS
illa enim mente formas rerum actu intelligibiliter esse aiebant sicut in materia
possibiliter [...]. Et ita aiebant Platonici non tempore, sed natura prius esse formas
veras in anima mundi quam in rebus. Quod Peripatetici non concedunt, quoniam
dicunt formas aliud esse non habere nisi in materia et per abstractionem in intellectu,
quae sequitur rem, ut patet. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 142, p. 100-101).
328 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 147, p. 72, linhas 1-9: Peripatetici vero quamvis
fateantur opus naturae esse opus intelligentiae, exemplaria tamen illa non
admittunt; quos certe, nisi per intelligentiam Deum intelligant, deficere puto. Nam
si non est notitia in intelligentia, quomodo movet secundum propositum? Si est
notitia rei explicandae temporaliter, quae est ratio motus, talis a re, quae nondum
est temporaliter, abstrahi non potuit. Si igitur est notitia sine abstractione, certe
tunc est illa, de qua loquuntur Platonici, quae non est a rebus, sed res secundum
eam. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 147, p. 104).
329 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 143, p. 66, linhas 1-8: Placuit autem Platonicis talia
distincta exemplaria in necessitate complexionis plura cum naturali ordine ab una
infinita ratione esse, in qua omnia sunt unum. Non tamen ab illa ista exemplaria
creata crediderunt, sed taliter descendere, quod numquam fuit verum dicere ‘Deus
est’, quin etiam esset verum ‘anima mundi est’; affirmantes eam esse explicationem
mentis divinae, ut omnia, quae in Deo sunt unum exemplar, sint in mundi anima
plura et distincta. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 143, p. 101).
330 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 146, p. 70, linhas 1-8: Multi Christianorum illi viae
Platonicae acquieverunt. Ex eo praesertim, cum alia sit ratio lapidis, alia hominis, et 340
in Deo non cadat distinctio et alietas, necessarium putabant has rationes distinctas,
secundum quas res distinctae sunt, post Deum et ante res esse, cum ratio rem
praecedat, et hoc in intelligentia rectrice orbium, quodque ipsae tales distinctae
rationes notiones sint rerum in ipsa anima mundi numquam delebiles. (Ibid., L. II,
cap. IX, n. 146, p. 103).
331 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 148, p. 72, linhas 1-5: Acute satis atque rationabiliter
locuti sunt Platonici, forte irrationabiliter per Aristotelem reprehensi, qui potius in
cortice verborum quam medullari intelligentia eos redarguere nisus est. Sed quid
sit verius, per doctam ignorantiam eliciemus. (Ibid., L. II, Cap. IX, n. 148, p. 105).
332 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 148, p. 72-74, linhas 5-12: Nam ostensum est non
perveniri ad maximum simpliciter, et ita non posse esse aut absolutam potentiam
aut absolutam formam sive actum, qui non sit Deus; et quod non sit ens praeter Deum
non contractum, et quod non est nisi una forma formarum et veritas veritatum, et
non est alia veritas maxima circuli quam quadranguli. Unde formae rerum non sunt
distinctae, nisi ut sunt contracte; ut sunt absolute, sunt una indistincta, quae est
Verbum in divinis. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 148, p. 105).
333 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 149, p. 76, linhas 16-20: Unde necessitas complexionis
non est, ut posuerunt Platonici, scilicet mens minor gignente, sed est Verbum et
Filius aequalis Patri in divinis, et dicitur logos seu ratio, quoniam est ratio omnium.
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(Ibid., L. II, cap. IX, n. 149, p. 106).
334 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 150, p. 78, linhas 16-19: Philosophi quidem de Verbo
divino et maximo absoluto sufficienter instructi non erant; ideo mentem et animam
ac necessitatem in quadam explicatione necessitatis absolutae sine contractione
considerarunt. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 150, p. 107).
335 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 148, p. 74, linhas 13-15: Anima igitur mundi non
habet esse nisi cum possibilitate, per quam contrahitur, et non est ut mens separata
a rebus aut separabilis. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 148, p. 105).
336 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 149, p. 76, linhas 20-23: Nihil est ergo illud, quod de
imaginibus formarum Platonici dixerunt, quoniam non est nisi una infinita forma
formarum, cuius omnes formae sunt imagines,. (Ibid., L.II, cap. IX, n. 149, p. 106).
337 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 150, p. 76, linhas 1-5: Oportet igitur acute intelligere
ista, quoniam anima mundi est Oportet igitur acute intelligere ista, quoniam anima
mundi est consideranda ut quaedam forma universalis in se complicans omnes
formas, non tamen existens actu nisi contracte in rebus, quae in qualibet re est
forma contracta rei,. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 150, p. 107).
338 Ibid., w. L. II, cap. VII, n.130, p. 52, linhas 1-9: Est deinde nexus contrahentis et
contrahibilis sive materiae et formae aut possibilitatis et necessitatis complexionis,
qui actu perficitur quasi quodam spiritu amoris motu quodam illa unientis. Et hic
nexus determinata possibilitas a quibusdam nominari consuevit, quoniam posse
esse ad actu esse hoc vel illud determinatur ex unione ipsius determinantis formae 341
et determinabilis materiae. Hunc autem nexum a Spiritu sancto, qui est nexus
infinitus, descendere manifestum est. (Ibid., L. II, cap. VII, n. 130, p. 92-93).
339 Ibid., w. L.II, cap. VIII, n. 133, p. 56-57, linhas 11-22: Ex eo enim, quod
formam non habet, quam habere potest, carere dicitur; ex quo carentia.
Informitas vero est quasi forma possibilitatis, quae, ut voluerunt Platonici,
est quasi materia formarum. Nam anima mundi materiae secundum ipsam
connectitur, quam stirpeam vegetabilem dixerunt, ita quod, cum anima mundi
possibilitati immiscetur, vegetabilitas illa informis in actu vegetativam animam
perducitur ex motu ab anima mundi descendente et ex mobilitate possibilitatis
sive vegetabilitatis. Ex quo affirmarunt ipsam informitatem quasi materiam
formarum, quae per sensitivam, rationalem et intellectualem formatur, ut sit actu.
(Ibid., L. II, cap. VIII, n. 133, p. 95-96).
340 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 142, p. 66, linhas 7-12: [...] et quod ipsa necessitas
complexionis in se veritatem habens formarum cum hiis, quae ipsas concomitantur,
secundum naturae ordinem moveret caelum, ut mediante motu tamquam
instrumento possibilitatem ad actum et, quanto conformius posset, conceptui
veritatis intelligibili aequale deduceret,. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 142, p. 100-101).
341 Ibid., w. L. II, cap. IX, n.143, p. 66, linhas 9-14: [...] addentes Deum naturaliter
praecedere hanc complexionis necessitatem, et ipsam animam mundi praecedere
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naturaliter motum, et instrumentum explicationem temporalem rerum, ita quod
illa, quae veraciter essent in anima, possibiliter in materia per motum temporaliter
explicarentur. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 143, p. 101).
342 Ibid., w. L. II, cap. IX, n. 145, p. 68, linhas 1-2: Ab hac mundi anima omnem
motum descendere putarunt,. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 145, p. 102).
343 Cf. MANZO, Silvia. 4. La estructura trinitaria del universo: materia,
forma y movimiento. In: NICOLÁS DE CUSA. Acerca de la docta ignorancia.
Libro II: Lo máximo contracto o universo (edición bilíngüe). Introducción,
traducción y notas de Jorge M. Machetta, Claudia D’Amico y Silvia Manzo.
Buenos Aires: Biblos, 2004, p. 137-143: segundo a autora “La idea de que
el movimiento es una especie de espíritu, término medio que conecta la
materia con la forma, proviene de la interpretación del Timeo propuesta
por Calcidio, más tarde adoptada por la escuela de Chartres” (p. 143). Não
é difícil destacarmos textualmente o momento em que Nicolau começa
expor a sua própria especulação sobre o movimento ou espírito de conexão.
Quando analisamos os parágrafos 151 e 152 percebemos que embora Nicolau
não cite, como acima afirmamos, textualmente nem os “platônicos” nem os
“peripatéticos” o texto, porém está permeado de verbos que indicam que
Nicolau está se referindo a outras pessoas (opinati sunt; considerarunt enim
sapientes; dixerunt etc.).
344 De docta ignorantia. w. L. II, cap. X, n. 151, p. 78, linhas 3-6: Motum, per
quem est connexio formae et materiae, spiritum quendam esse, quasi inter formam et 342
materiam medium, quidam opinati sunt et hunc in aplane, in planetis et rebus terrenis
diffusum considerarunt. (A douta ignorância. L. II, cap. X, n. 151, p. 108).
345 Ibid., w. L. II, cap. X, n. 151, p. 78-80, linhas 13-29: Motus planetarum est
ut evolutio primi motus, et motus temporalium et terrenorum est evolutio motus
planetarum. In rebus terrenis latent quaedam proventuum causae ut seges in semine;
unde dixerunt, quod ea, quae in anima mundi quasi in glomo sunt complicata, per
talem motum explicantur et extenduntur. Considerarunt enim sapientes, quasi,
sicut artifex vult statuam in lapide exsculpere, formam statuae in se habens quasi
ideam, per quaedam instrumenta, quae movet, ipsam formam statuae in figura
ideae et in eius imagine efficit, – ita putabant mentem sive animam mundi in se
gestare exemplaria rerum et per motum illa in materia explicare; et hunc motum
per omnia diffusum dixerunt sicut animam mundi. Quem in aplane, in planetis et
rebus terrenis – quasi fatum descendens actu et opere a fato in substantia – dixerunt
esse explicationem fati in substantia, quoniam res actu ad sic essendum per ipsum
talem motum seu spiritum determinatur. (Ibid., L. II, cap. IX, n. 151, p. 108-109).
346 Ibid., w. L. II, cap. X, n. 152, p. 80: Hunc spiritum connexionis procedere ab
utroque, scilicet possibilitate et anima mundi, dixerunt. Nam materia cum habeat
ex aptitudine sui recipiendi formam quendam appetitum, ut turpe appetit bonum et
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
privatio habitum, et cum forma desideret esse actu et non possit absolute subsistere,
cum non sit suum esse nec sit Deus, descendit, ut sit contracte in possibilitate;
hoc est, ascendente possibilitate versus actu esse descendit forma, ut sit finiens,
perficiens et terminans possibilitatem. Et ita ex ascensu et descensu motus exoritur
connectens utrumque; qui motus est medium connexionis potentiae et actus,
quoniam ex possibilitate mobili et motore formali oritur ipsum movere medium.
(Ibid., L. II, cap. IX, n. 152, p. 109). Todo este parágrafo é uma explicitação do
que Nicolau já havia afirmado no n. 130, ou seja, que o nexo “se perfaz em
acto como uma espécie de espírito de amor, uma espécie de movimento que
une” o contraente e o contraível, ou a matéria e a forma, ou a possibilidade
e a necessidade de complexão. De certa forma também se reafirma a ideia
chartriana do nexo como “possibilidade determinada” tendo em vista que “o
poder ser é determinado a ser isto ou aquilo em acto pela união da sua forma
determinante e da sua matéria determinável”. Para a posição dos “platônicos”
sobre o conceito de matéria como carência, aptidão e informidade ver: Ibid.,
w. L. II, cap. VIII, n. 133, p. 56-58 (Ibid., L. II, cap. VIII, n. 133, p. 95-96).
347 Ibid., w. L. II, cap. X, n. 153, p. 80-82, linhas 1-2; 12-13: Est igitur hic spiritus
per totum universum et singulas eius partes diffusus et contractus; qui natura
dicitur. [...]. Hic autem motus sive spiritus descendit a Spiritu divino, qui per ipsum
motum cuncta movet.” (Ibid., L. II, cap. X, n. 153, p. 109-110).
348 Ibid., w. L.II, cap. X, n.154, p. 82, linha 1: Hic igitur spiritus creatus [...].
(Ibid., L. II, cap. X, n. 154, p. 110). 343
349 Ibid., w. L .II, cap. X, n. 155, p. 84, linhas 1-4: Non est igitur aliquis motus
simpliciter maximus, quia ille cum quiete coincidit. Quare non est motus aliquis
absolutus, quoniam absolutus motus est quies et Deus; et ille complicat omnes
motus.” (Ibid., L. II, cap. X, n. 155, p. 111).
350 Ibid., w. L. II, cap. X, n. 153, p. 80-82: Est igitur hic spiritus per totum
universum et singulas eius partes diffusus et contractus; qui natura dicitur. Unde
natura est quasi complicatio omnium, quae per motum fiunt. Quomodo autem hic
motus ab universali contrahatur usque in particulare servato ordine per gradus
suos, hoc exemplo consideratur. Nam dum dico ‘Deus est’, quodam motu progreditur
haec oratio, sed ordine tali, ut primo proferam litteras, deinde syllabas, deinde
dictiones, deinde orationem ultimo, licet auditus hunc ordinem gradatim non
discernat. Ita quidem motus gradatim de universo in particulare descendit et ibi
contrahitur ordine temporali aut naturali. Hic autem motus sive spiritus descendit
a Spiritu divino, qui per ipsum motum cuncta movet. Unde, sicut in loquente est
quidam spiritus procedens ab eo, qui loquitur, qui contrahitur in orationem, ut
praefertur, ita Deus, qui est Spiritus, est a quo descendit omnis motus. Ait enim
Veritas: ‘Non vos estis, qui loquimini, sed Spiritus Patris vestri, qui loquitur in
vobis.’ Et ita de aliis omnibus motibus et operationibus. (Ibid., L. II, cap. X, n. 153,
p. 109-110). A conclusão que Nicolau retira do exemplo do “falante” que,
enquanto fala, um espírito “procede” dele, pode ser compreendida dentro
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NOTAS
do contexto trinitário no qual o Filho é a Palavra do Pai e o Espírito é o
que procede da pronunciação, ou seja, daquele que pronuncia e da palavra
pronunciada. Cf. De filiatione dei. h. IV. Opuscula I, cap. IV, n. 75, p. 55 e
n. 76, p. 56, linhas 1-5: “In tali quidem expressione doctrinae magistri resplendet
affectus magistri, qui relucet in pronuntiatione, et varie quidem secundum varios
exprimendi modos. Ut verbum fructificet, resplendet affectus magistri conceptus
in verborum significatione, resplendet et ipsum magisterium, unde emanat tam
fecundus atque tam magistralis. Et neque omnes modi pronuntiationis attingunt
affectum, cum tantus sit, quod sufficienter pronuntiari non possit, neque omnes
modi orationum attingunt conceptum, qui est inexpressibilis fecunditatis, cum
sit ars magisterii, neque oratio et pronuntiatio cum omnibus modis possibilibus
exprimere possunt magisterium ipsum intellectuale, quamquam non aliud in
omni oratione exsistat aut significetur quam sui ipsius manifestatio ad finem
transformationis in simile magisterium. / Tali quadam similitudine principium
nostrum unitrinum bonitate sua creavit sensibilem istum mundum ad finem
intellectualium spirituum, materiam eius quasi vocem, in qua mentale verbum
varie fecit resplendere, ut omnia sensibilia sint elocutionum variarum orationes a
deo patre per filium verbum in spiritu universorum explicatae [...].
351 Anteriormente, Nicolau havia salientado que “a diversidade das coisas
e a conexão” resulta do fato de que tudo está em tudo. Cf. De docta
ignorantia. w. L. II, cap. V, n. 120, p. 40, linhas 1-6: Considera attentius et
videbis, quomodo quaelibet res actu existens ex eo quiescit, quia omnia in ipso sunt
ipsum et ipsum in Deo Deus. Mirabilem rerum unitatem, admirandam aequalitatem 344
et mirabilissimam vides connexionem, ut omnia sint in omnibus. Rerum etiam
diversitatem et connexionem in hoc exoriri intelligis. (A douta ignorância. L. II,
cap. V, n. 120, p. 85).
352 Ibid., w. L. II, cap. X, n. 154, p. 82-84: Hic igitur spiritus creatus est spiritus, sine
quo nihil est unum aut subsistere potest, sed totus iste mundus et omnia, quae in eo
sunt, per ipsum spiritum, qui replet orbem terrarum, naturaliter id suntconnexive,
quod sunt, ut potentia per eius medium sit in actu et actus eius medio in potentia.
Et hic est motus amorosae connexionis omnium ad unitatem, ut sit omnium unum
universum. Nam dum omnia moventur singulariter, ut sint hoc, quod sunt, meliori
modo et nullum sicut aliud aequaliter, tamen motum cuiuslibet quodlibet suo modo
contrahit et participat mediate aut immediate – sicut motum caeli elementa et
elementata et motum cordis omnia membra –, ut sit unum universum. Et per hunc
motum sunt res meliori quidem modo, quo possunt. Et ad hoc moventur, ut in se
aut in specie conserventur per naturalem sexuum diversorum connexionem, qui in
natura complicante motum sunt uniti et divisive contracti in individuis. (Ibid., L.
II, cap. X, n. 154, p. 110-111).
353 Ibid., w. L. II, cap. X, n.155, p. 84, linhas 1-15: Non est igitur aliquis motus
simpliciter maximus, quia ille cum quiete coincidit. Quare non est motus aliquis
absolutus, quoniam absolutus motus est quies et Deus; et ille complicat omnes
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NOTAS
motus. Sicut igitur omnis possibilitas est in absoluta, quae est Deus aeternus, et
omnis forma et actus in absoluta forma, quae est Verbum Patris et Filius in divinis,
ita omnis motus connexionis et proportio ac harmonia uniens est in absoluta
connexione divini Spiritus, ut sit unum omnium principium Deus, in quo omnia
et per quem omnia sunt in quadam unitate Trinitatis, similitudinarie contracta
secundum magis et minus intra maximum et minimum simpliciter secundum gradus
suos, ut alius sit gradus potentiae, actus et connexionis motus in intelligentiis, ubi
intelligere est movere, et alius materiae, formae et nexus in corporalibus, ubi esse
est movere, [...]. (Ibid., L. II, cap. X, n. 155, p. 111).
354 Cf. MACHETTA, Jorge M. Introducción: del comentario al De anima a
los tratados acerca de la mente. In: NICOLÁS DE CUSA. Un ignorante
discurre acerca de la mente. Introducción de Jorge M. Machetta y Claudia
D’Amico. Traducción de Jorge M. Machetta. Buenos Aires: Biblos, 2005,
p. 9-20: segundo o autor nos diálogos Idiota. De sapientia (I e II) e Idiota. De
mente “se pone de manifiesto un hito decisivo en la concepción cusana de la
antropología” (p. 9). Cf. também: ÁLVAREZ GÓMEZ, Mariano. La mente como
imagen viva en Nicolas de Cusa. In: PAREDES MARTÍN, Maria del Carmen.
Mente, conciencia y conocimiento. Salamanca: Ediciones Universidad de
Salamanca, 2001, p. 11-28”: Álvarez Gómez, por outro lado, chama a atenção
para a importância do ano 1450 na vida Nicolau de Cusa: “La fecha tiene
su importancia. Ese año marca en cierto modo el punto culminante de su
trayectoria: como hombre de Iglesia en primer lugar”. E continua na página
seguinte: “Pero el año 1450 marca un hito también en la vida de Nicolás 345
de Cusa como hombre de estudio y de contemplación” (13-14). Cf. ainda:
CASARELLA (1992, p. 266-307): Sobre a importância do ano 1450 para o
problema da linguagem no pensamento cusano e sobre a relevância do livro
segundo do Idiota. De mente (De modo especial: Part 3, Chapter VI. The Craft
of Naming in Idiota de Mente (1450).
355 Cf. CASARELLA. Op. cit. p. 152 (sobre a importância do gênero dialógico
nos escritos do Idiota); Cf. também: GONZÁLEZ RÍOS (2010) acentua em sua
tese “La dimensión dialógica de la obra cusana”. Cf. ainda: MILLER, Clyde
Lee. Reading Cusanus: Metaphor and Dialectic in a Conjectural Universe.
Washington, D.C.: The Catholic University of America Press, 2002. Studies
in Philosophy and the History of Philosophy, Volume 37). O autor supõe
que o retorno de Nicolau de Cusa ao gênero dialógico deve-se ao fato de
que as formas de discursos da escolástica não eram mais adequadas ao
caráter conjectural da sua especulação: “As a literary form the dialogue was
well known to medieval thinkers and writers. Their masters, Augustine,
Eriugena, and Anselm, had all employed it effectively before the High
Middle Ages. When the Scholasticism of the universities came to dominate
philosophy and theology, most thinkers abandoned the dialogue form in
order to write commentaries on Aristotle or Peter Lombard or the Bible,
or to publish their own speculations in the form of disputed or quodlibetal
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
questions. The commentarium and the question reflected the methods of
instruction and disputation used in the universities. Along with the summae,
these became the standard literary forms for speculative thought and
theoretical ideas. Nicholas’ return to the dialogue form in the 144os may well
signal how the forms of discourse favored by the Scholastic thinkers became
unsuitable for the conjectural and suggestive character of his own ideas”.
O autor continua no parágrafo seguinte afirmando que “The Idiota dialogues
recall St. Augustine’s and St. Anselm’s dialogues, but with a particular twist.
Both earlier writers often characterized their interlocutors as ‘master’ and
‘disciple’, and left little doubt as to whom the master represented and who
would dominate the conversation. Nicholas of Cusa reverses this pattern
in the Idiota dialogues, making the humble layman the magister and the
principal speaker” (p. 111).
356 Sobre as fontes e o significado do Idiota cusano: KLIBANSKY, R. Ad
praefationem appendices. Appendix I: De memoria librorum idiotae. In:
NICOLAI DE CUSA. Idiota. De mente. In: Opera omnia. Iussu et auctoritate
Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. V.
Hamburg: Felix Meiner, 1983, p. LI-LXIV (5. De fontibus atque de notione idiotae,
p. LXI-LXII). Cf. também: D’AMICO (1991, p. 53-54). A autora considera que
o termo idiota possui nos quatro diálogos o significado de “ignorante”, mas
não se alude aqui “a una ignorancia que derive de la estulticia […] sino a
la ignorancia propia del iletrado. Pero, además, hace referencia al estado
laical como opuesto al del clérigo, considerando a este último único tipo 346
humano ilustrado de la época. Así pues, en el contexto de ese tiempo,
ambas significaciones convergen en la determinación del idiota como el
no-universitario. Por otra parte, sigue ello el cardenal una interpretación
tradicional entre autores cristianos. Empero, la valoración cusana del
profano es singular: este irónico personaje, por medio del cual habla el
mismo Nicolás, es un artesano que desdeña todo estudio sobre textos y
autoridades, a tal punto que opone como términos irreconciliables la scientia
huius mundi –aquella que intenta esclarecer racionalmente lo absoluto– y
la vera sapientia”. No parágrafo seguinte a autora mostra a especificidade
da perspectiva cusana: “El caráter central de esta perspectiva cusana –que,
como es obvio, implica un juicio de valor– se advierte en el hecho de que
el núcleo de los diálogos que anteceden al De mente es la justificación de
la vera sapientia como docta ignorantia, cuyo poseedor por excelencia es
el representado por el personaje principal de la obra, único que se sabe
ignorante en las cuestiones concernientes a lo absoluto”. Igualmente
González Ríos (Op. cit., p. 42-43) esclarece que a carga semântica do termo
latino idiota (como o simples, o iletrado, o leigo, o não universitário, o não-
clérigo) “si bien se concentra en el ignorante cusano, no es exclusiva de su
pensamiento”. O autor refere que esta “figura conceptual” está presente
em textos da Sagrada Escritura, em Santo Agostinho, em Francisco de Assis
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NOTAS
e “en diversas obras del neoplatónico florentino y anti-paduano Francesco
Petrarca, obras que el Cusano no sólo poseía sino que también había
estudiado y anotado”. Entretanto, chama a atenção para a “singularidad
del ignorante cusano” que se concentraría na sua humildade e na sua
ignorância. “De aquí que sea oportuna la traducción de este personaje
conceptual como ignorante, pues su idiosincrasia, en tanto ignorante,
hace una clara y explícita referencia a la doctrina que profesa: la máxima
doctrina de la ignorancia”. Ver também do mesmo autor: 1. Presentación de
los personajes. In: NICOLÁS DE CUSA. Un ignorante discurre acerca de la
mente. Introducción de Jorge M. Machetta y Claudia D’Amico. Traducción
de Jorge M. Machetta. Buenos Aires: Biblos, 2005, p. 149-155.
357 Sobre a unidade dos quatro diálogos. Cf. D’AMICO, Claudia. Introducción.
El diálogo Idiota. De mente: su lugar en la obra cusana. In: NICOLÁS DE CUSA.
Un ignorante discurre acerca de la mente. Introducción de Jorge M.
Machetta y Claudia D’Amico. Traducción de Jorge M. Machetta. Buenos
Aires: Biblos, 2005, p. 21-27): “[...] si se considera con una mirada superficial
la estructura interna de los diálogos del Idiota, podríamos creer que giran
en torno de tres temas diversos –la sabiduría (diálogos I-II), la mente
(diálogo III) y las experiencias con la balanza (diálogo IV)–, cuya unidad está
dada simplemente por la figura del personaje principal en todos ellos: el
ignorante. Sin embargo, si se leen con atención, puede advertirse que desde
el primero de los diálogos el centro de la atención cusana se halla en el
espíritu humano y su operar: el tratamiento temático de la sabiduría infinita 347
se orienta a mostrar que el intelecto humano tiene cierta pregustación de
tal infinitud, por la cual incesantemente la busca como quien asciende hacia
la vida que le es propia y en ello halla la inmortalidad. La profundización de
este tópico será ofrecido en el diálogo segundo a través de la identificación
de la sabiduría infinita con una de las personas de la Trinidad: nuevamente
el Verbo es presentado como eterno ejemplar del hombre quien ha de re-
asumir en sí el privilegio de ser la imagen de la Imagen eterna. Con todo, en
este diálogo que antecede al De mente se encuentra, desde mi punto de vista,
el gozne que vuelven a uno y otro diálogos inescindibles: la caracterización
de la Sabiduría eterna o Verbo de Dios como Concepto absoluto. En efecto,
a partir del tópico cusano que refiere la dificultad humana de ofrecer un
concepto acerca de lo absoluto, plantea Nicolás de Cusa que Dios mismo
es el concepto de todos los conceptos conceptuables. Esta aseveración
motiva la pregunta del orador, interlocutor del ignorante: ‘¿No es acaso la
mente la que concibe?’ (‘Nonne mens est quae concipit?’). A lo cual responde
taxativamente el ignorante: ‘Sin la mente no se realiza el concepto’ (‘Sine
mens non fit conceptus’). Se introduce inmediatamente la idea del arte de
la mente absoluta que engendra el Verbo, Igualdad de la unidad, Forma
de todo lo formable, Concepto absoluto. De esta manera, el tratamiento
del tema de la humana mens se introducirá en el diálogo, el De mente, en el
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NOTAS
marco de un paralelismo ya trazado: la mente absoluta que engendra en sí
misma el concepto absoluto, concepto de todo lo conceptuable, se explicita
‘artísticamente’ en sus creaturas; el conceptuar de la mente humana, imagen
de aquélla, se explicita a sí misma en el despliegue de su propio mundo
creativo ‘midiendo’ en sí, puesto que se define por ser ‘mensura’, todo lo que
la rodea. El cuarto diálogo, De staticis experimentis, no hará sino trasladar esa
noción metafísica de la mensura humana al terreno de lo experimentable”
(p. 25-26). Cf. também: ÁLVAREZ GÓMEZ (2001, p. 11-13): “Este libro [De
mente] forma una cierta unidad con otros tres: dos dedicados a la sabiduría
–de sapientia– y otro a ‘experimentos con la balanza’ –de staticis experimentis–.
Forman tal unidad, no tanto por los temas, ni porque los escribió en el mismo
año, sino por la perspectiva bajo la que los escribió. Los cuatro libros aparecen
como obra del idiota: Idiota de sapientia (I y II), Idiota de mente, Idiota de staticis
experimentis. Si ese término les da unidad es porque condiciona altamente
el contenido” (p. 11). Nas páginas seguintes, o autor busca traçar a figura
do Idiota cusano. Segundo ele, pode-se caracterizá-la pela convergência de
duas ideias: em primeiro lugar, segundo o autor, o termo Idiota poderia ser
traduzido de modo mais apropriado por “iletrado” e recorda que “El mismo
autor [Nicolás de Cusa] da explícitamente a ello al contraponer, por boca
del ‘idiota’, la actividad de éste a la de los litterati philosophi ([De mente] I,
55, 10-12)”. Recorda também que “Los términos idiotae et illiterati fueron
utilizados con frecuencia por escritores eclesiásticos para caracterizar a
seguidores de diferentes movimientos religiosos en el s. XII que pretendían
recuperar la práctica de la virtud de la pobreza y, en general, la forma de 348
vida de los primeros cristianos. Tal caracterización era a su modo despectiva
en cuanto que esas personas se contraponían a los docti o sapientes” (p. 12).
Em segundo lugar, Mariano Álvarez Gómez afirma que “En el caso de N. de
Cusa esta actitud se refuerza y concreta mediante la confluencia en él de la
devotio moderna que tiene en la Imitación de Cristo de Tomás de Kempis uno
de los escritos más significativos y que hace surgir dentro de ella misma
una corriente laica muy fuerte, de amplia difusión en Holanda y Alemania
sobre todo, los llamados ‘Hermanos de la vida en comunidad’ –Brüder vom
gemeinsamen Leben–. N. de Cusa recoge el impulso crítico que ese movimiento
representa y lo plasma en esa figura del ‘idiota’ o iletrado, que no se atiene
al saber que transmiten los libros ni tampoco a la autoridad de los sabios
reconocidos, sino que por el contrario se centra en el pensamiento de sí
mismo que se interroga acerca de sus propias condiciones de posibilidad,
y en lugar de dar por simplemente válidos estos o aquellos supuestos, sean
especulativos o históricos, se apoya exclusivamente en el docto no-saber, en
la paradoja de la ignorancia que es consciente de sí misma” (p. 13).
358 As temáticas gnosiológicas ou epistemológicas e a questão da nomeação
ou da imposição dos nomes destacadas por diversos interpretes não serão
aqui tomadas em consideração. Já vimos anteriormente como esse texto
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NOTAS
será importante nas interpretações de E. Cassirer, Volkmann-Schluck, D.
Duclow, P. Casarella, João Maria André e José González Ríos.
359 Machetta (2005, p. 9) considera que esse versículo do Gênesis, juntamente
com o Prólogo do Evangelho de João (“E o Verbo se fez carne e habitou no meio
de nós, Jo 1,14), é a fonte inspiradora para a pergunta “qué es el hombre” na
especulação cristã. Recordamos também que, curiosamente, em Gênesis 1, 26
os Padres da Igreja “viram insinuada a Trindade”, tendo em vista que o plural
“faciamus” também “exprime a majestade e a riqueza interior de Deus, cujo
nome comum em hebraico é de forma plural, Elohim” (A Bíblia de Jerusalém,
p. 32, n. l). Também o Cardeal alemão no sermão IV, citado por D’Amico,
interpretará assim: “Trinitas patet in Scripturis. Isaias: ‘Sanctus, sanctus, sanctus’,
et subiungitur ‘Dominus’ in singulari. In Genesi: ‘Faciamus hominem ad imaginem’
– singulariter. In Psalmo: ‘Benedicat nos Deus, Deus noster’ etc.”. (Sermo IV, n. 29,
linhas 16-21). Disponível em: .
360 D’Amico refere-se ao Sermo XXII na edição crítica de Heidelberg (h. xvI/4
n. 23): de mente, quo modo mens generat sibi suum verbum simile, conceptum
scilicet sui ipsius, et ex his procedit voluntas sive amor. (XXII, n. 23, linhas 6-8).
Disponível em: . Como sabemos, o De
coniecturis pensa a mente a partir das quatro unidades: a unidade divina, o
intelecto ou inteligência, a alma ou razão e, por último, a unidade corporal.
Segundo Duclow, essas quatro unidades devem ser pensadas a partir da
dialética neoplatônica de “saída” e “retorno”. De forma que essas unidades
não são consideradas estruturas estáticas ou faculdades, mas momentos 349
formativos dentro do dinamismo orgânico da mente (organic dynamism of
the mind). Por isso, segundo ele (1974, p. 56-57), também o conhecimento
passa a ser visto como um processo fundamentalmente relacional (relational
process) e, como no Compendium, o De coniecturis não somente utiliza o
simbolismo da palavra para expressar a estrutura da mente de modo que
a unidade racional se manifesta no discurso, mas a razão, por sua vez, é
a palavra do intelecto e este pode ser visto como a palavra expressiva da
primeira unidade, ligando também a linguagem à concepção da mente como
um todo, pois a cada unidade corresponde uma linguagem apropriada.
361 Cf. De beryllo. h. XI1, n. 4, p. 6-7: Oportet te primum attendere unum esse
primum principium, et id nominatur secundum Anaxagoram intellectus, a quo
omnia in esse prodeunt, ut se ipsum manifestet. Intellectus enim lucem suae
intelligentiae delectatur ostendere et communicare. Conditor igitur intellectus, quia
se finem facit suorum operum, ut scilicet gloria sua manifestetur, creat cognoscitivas
substantias, quae veritatem ipsius videre possint, et illis se praebet ipse conditor
modo quo capere possunt visibilem. Hoc scire est primum, in quo complicite omnia
dicenda continentur. Aqui no De beryllo, essa ideia se funda na concepção de
que o primeiro princípio é uno e, segundo Anaxágoras, é intelecto (Cf. 4.2 Os
nOmes divinOs cOmO enigmas e O princípiO unitrinO do presente livro).
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NOTAS
362 Cf. Idiota. De mente. h. V, cap. IX, n. 123, p. 176-177, linhas 3-9:
PHILOSOPHUS: Admiror, cum mens, ut ais, idiota, a mensura dicatur, cur ad rerum
mensuram tam avide feratur. / IDIOTA: Ut sui ipsius mensuram attingat. Nam mens
est viva mensura, quae mensurando alia sui capacitatem attingit. Omnia enim agit,
ut se cognoscat. Sed sui mensuram in omnibus quaerens non invenit, nisi ubi sunt
omnia unum. Ibi est veritas praecisionis eius, quia ibi exemplar suum adaequatum.
Cf. De aequalitate. h. X, Opuscula II, Fasciculus 1, n. 9, p. 12-13: Et ita habes,
quomodo anima pergit per se ad omnia alia et nihil reperit in omni varietate
intelligibile, nisi quod in se reperit, ut omnia sint sua similitudo. Et in se verius
omnia videt quam sint in aliis ad extra. Et quanto plus egreditur ad alia, ut ipsa
cognoscat, tanto plus in se ingreditur, ut se cognoscat. Et ita, dum per proprium
intelligibile alia intelligibilia mensurare et attingere satagit, per alia intelligibilia
suum proprium intelligibile sive seipsam mensurat. Anima igitur veritatem quam
videt in aliis per se videt. Et est notionalis ipsa veritas cognoscibilium, quoniam
anima intellectiva vera notio est. Visione intuitiva per se lustrat omnia et mensurat
et iudicat per notionalem veritatem veritatem in aliis. Et per eam, quam in aliis
comperit aliter, ad se revertitur, ut eam, quam in aliis aliter vidit, in se intueatur
sine alteritate veraciter et stabiliter, ut in se quasi in speculo veritatis notionaliter
omnia perspiciat et se rerum omnium notionem intelligat. O término desse
processo de aprofundamento das coisas para si mesma e de si mesma para
o próprio fundamento se concluirá com a alma reconhecendo-se ou vendo-
se no horizonte da eternidade: Videt igitur se super temporalia ‘in horizonte
aeternitatis’ temporaliter incorruptibilem, non tamen simpliciter sicut aeternitas
quae est simpliciter incorruptibilis, quia est incorruptibilitas omnem alteritatem 350
antecedens. Unde videt anima se coniunctam continuo et temporali. In hoc enim
sunt eius operationes successivae et temporales, quas per organa corruptibilia facit,
ut est sentire, ratiocinari, deliberare et similes. Et videt se absolutam a continuo in
opere intellectus ab organo separati, quia dum intelligit subito intelligit. Et ita inter
temporale et aeternum se reperit. (De aequalitate. h. X, Opuscula II, Fasciculus
1, n. 11, p. 15-16, linhas 11-20).
363 Sobre a dependência desse texto e da fórmula cusana unicum vitale
centrum em relação à expressão procliana κϵντρον της συμπάσς ζωης ver:
BEIERWALTES (2005, p. 73-82). A partir do texto que estamos analisando do
De coniecturis, Beierwaltes conclui que “Con la intención procliana de
acceder, en un autocercioramiento pensante de lo ‘uno en nosotros’ y
mediante éste, a lo uno mismo, se corresponde en el Cusano el pensamiento
de que el pensar viene por sí mismo a su fundamento inmanente, que al
mismo tiempo se funda en un absoluto transcendente a él, ciertamente, el
Cusano se diferencia del concepto procliano de lo uno en que –
fundamentándose en una tradición primariamente cristiana– pone la
‘unitas absoluta’ divina como idéntica al ser mismo y al pensar absoluto
(‘ratio infinita’; ‘conceptus absolutus’), y piensa la unidad simultáneamente
como tríada en sí misma relacional (Trinidad, ‘unitrinum principium’)” (p.
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NOTAS
81). Cf. também: D’AMICO (2009, p. 117): “Puede advertirse, pues, una
misma orientación en ambos pensadores [Proclo e Nicolau de Cusa]: la
realización del espíritu humano que en el despliegue de su propia fuerza o
virtud se conoce a sí mismo y a Dios en un movimiento de ascenso y
descenso del conocimiento. Sin embargo, a pesar de que ambos autores
coinciden en la necesidad del espíritu humano de volverse al centro de la
vida, como ha señalado ajustadamente Beierwaltes deben destacarse
diferencias particularmente en lo relativo a la identidad entre ser y pensar,
y a la cristiana concepción de la unitrinidad”. Cf. GAMARRA, Daniel. Mens
est viva mensura. Nicolás de Cusa y el acto intelectual. In: Anuario Filosófico,
1995 (28) p. 583-609 (especialmente as páginas 601-609). Cf. ainda: VON
BALTHASAR. “El nudo. Nicolás de Cusa”. In: ______. Gloria: una estética
teológica. 5. Metafísica. Edad Moderna. Traducción: Vicente Martín; Felipe
Hernández. Madrid: Ediciones Encuentro, 1988, Cap. 4, p. 195-232: “En el De
coniecturis, nuestro espíritu expulsa fuera de sí su ‘mundo de enigmas’ para
contemplarse más claramente a sí mismo en ese mundo que él ha generado
y del que se alimenta para comprenderse con más plenitud como imagen
de lo eterno; pues cuanto más escudriñemos (profundaverimus) nuestro
espíritu, más nos acercaremos a nuestro centro vital: Dios. Es la vieja senda,
prescrita tan a lo vivo sobre todo por Gregorio de Nisa, de un
autoconocimiento metafísico que hay que escudriñar cada vez más para
poder ver en una imagen, la imagen arquetípica actuada en cada sentido. El
Cusano añade solamente que esta actuación del espíritu ha de verificarse
mediante la explicación de este en el mundo, ya prescribiendo, ya 351
recibiendo. Si la imagen del hombre (como se lee en la Carta a Albergati) ‘se
conoce como imagen viviente de su creador, él ve a su creador cuando se
mira a sí mismo, pues el reflejo le conduce al modelo’” (p. 226). É importante
ainda destacar que o filósofo, um dos três personagens do Idiota. De mente,
afirma que, em sua busca, se aproximou dos sábios para compreender
sobre a imortalidade da mente, porém até agora não conseguiu encontrar
o que buscava de modo perfeito como as pessoas ignorantes (ignorans
populus) se encontraram com a fé. Mas destacamos nas palavras do filósofo
a sua interpretação do oráculo de Delfos: “cum apud Delphos praecepta sit
cognitio, ut ipsa mens cognoscat coniunctamque cum divina mente se sentiat”
(Idiota. De mente. h. V, cap. I, n. 52, p. 86-87). Quanto mais a mente se
conhecer, portanto, mais ela se une à mente divina.
364 Cf. De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. I, n. 5, p. 7-8: Coniecturas a
mente nostra, uti realis mundus a divina infinita ratione, prodire oportet. Dum
enim humana mens, alta dei similitudo, fecunditatem creatricis naturae, ut
potest, participat, ex se ipsa, ut imagine omnipotentis formae, in realium entium
similitudine rationalia exserit. Coniecturalis itaque mundi umana mens forma
exstitit uti realis divina. Quapropter ut absoluta illa divina entitas est omne id
quod est in quolibet quod est, ita et mentis humanae unitas est coniecturarum
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NOTAS
suarum entitas. Deus autem omnia propter se ipsum operatur, ut intellectuale
sit principium pariter et finis omnium; ita quidem rationalis mundi explicatio, a
nostra complicante mente progrediens, propter ipsam est fabricatricem. Quanto
enim ipsa se in explicato a se mundo subtilius contemplatur, tanto intra se ipsam
uberius fecundatur, cum finis ipsius ratio sit infinita, in qua tantum se, uti est,
intuebitur, quae sola est omnibus rationis mensura. Ad cuius assimilationem tanto
propinquius erigimur, quanto magis mentem nostram profundaverimus, cuius ipsa
unicum vitale centrum exsistit. Ob hanc causam naturali desiderio ad perficientes
scientias aspiramus.
365 No caso, o Cardeal Giuliano Cesarini a quem o texto é dedicado.
366 Cf. De docta ignorantia. w. L. II, cap. X, n. 155, p. 84 (Cf. nota 362 e 366).
Cf. também: De filiatione dei. h. IV, Opucula I, cap. IV, n. 76: Tali quadam
similitudine principium nostrum unitrinum bonitate sua creavit sensibilem istum
mundum ad finem intellectualium spirituum, materiam eius quasi vocem, in qua
mentale verbum varie fecit resplendere, ut omnia sensibilia sint elocutionum
variarum orationes a deo patre per filium verbum in spiritu universorum explicatae
in finem, ut per sensibilia signa doctrina summi magisterii in humanas mentes se
transfundat et ad simile magisterium perficienter transformet, ut sit totus iste
sensibilis mundus sic ob intellectualem et homo finis sensibilium creaturarum et
deus gloriosus principium, medium et finis omnis operationis suae.
367 Cf. GONZÁLEZ RÍOS (2010, p. 81-82).
368 De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. I, n. 6, p. 9-10: Ut autem ad 352
apprehensionem intenti inducaris et mentem coniecturarum principium recipias,
advertas quoniam, ut primum omnium rerum atque nostrae mentis principium
unitrinum ostensum est, ut multitudinis, inaequalitatis atque divisionis rerum
unum sit principium, a cuius unitate absoluta multitudo, aequalitate inaequalitas
et conexione divisio effluat, ita mens nostra, quae non nisi intellectualem naturam
creatricem concipit, se unitrinum facit principium rationalis suae fabricae.
Sola enim ratio multitudinis, magnitudinis ac compositionis mensura est, ita ut
ipsa sublata nihil horum subsistat, sicut entitate infinita negata omnium rerum
entitates pariter constat esse negatas. Quapropter unitas mentis in se omnem
complicat multitudinem eiusque aequalitas omnem magnitudinem, sicut et conexio
compositionem. Mens igitur unitrinum principium primo ex vi complicativae
unitatis ultitudinem explicat, multitudo vero inaequalitatis atque magnitudinis
generativa est. Quapropter in ipsa primordiali multitudine, ut in primo exemplari,
magnitudines seu perfectiones integritatum varias et inaequales venatur, deinde
ex utrisque ad compositionem progreditur. Est igitur mens nostra distinctivum,
proportionativum atque compositivum principium.
369 Cf. SATO, Naoko. Cusanus‘ Epistemology in Idiota de mente. In: YAMAKI,
Kazuhiko. Nicholas of Cusa. A Medieval Thinker for the Modern Age.
Richmond: Curzon Press, 2002, p. 76-84.
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NOTAS
370 Idiota. De sapientia. h. V, Liber Primus, n. 14, p. 30, linhas 1-2: ORATOR:
Pulchra atque rara narras. Nunc age, quaeso, quomodo elevari queam ad aliqualem
gustum aeternae sapientiae.
371 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 12, p. 22-24, linhas 1-7: ORATOR: Intelligo forte,
tu iudicabis. Nam haec videtur tua intentio, quod principium nostrum, per
quod, in quo et ex quo ‘sumus et movemur’, tunc gustatur a nobis ut principium,
medium et finis, quando eius vitalis suavitas ingustabiliter gustatur per affectum
et incomprehensibiliter comprehenditur per intellectum ac quod, qui ipsum
gustabiliter gustare et comprehensibiliter comprehendere nititur, ille penitus est
sine gustu et intellectu.
372 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 14, p. 30-31, linhas 3-8; n. 15, p. 31-32, linhas
1-8: IDIOTA: Aeterna sapientia in omni gustabili gustatur. Ipsa est delectatio in
omni delectabili. Ipsa est pulchritudo in omni pulchro. Ipsa est appetitio in omni
appetibili. Sic de cunctis desiderabilibus dicito. Quomodo tunc potest non gustari?
Nonne vita est tibi gaudiosa, quando est secundum desiderium tuum? / ORATOR:
Immo nihil plus. / IDIOTA: Cum ergo hoc desiderium tuum non sit nisi per aeternam
sapientiam, ex qua et in qua est, et haec vita felix, quam desideras, similiter non
sit nisi ab eadem aeterna sapientia, in qua est et extra quam esse nequit, hinc non
aliud in omni desiderio intellectualis vitae desideras quam sapientiam aeternam,
quae est desiderii tui complementum, principium, medium et finis. Si igitur est tibi
dulce hoc desiderium immortalis vitae, ut aeternaliter feliciter vivas, quandam in te
praegustationem experiris aeternae sapientiae. 353
373 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 15, p. 32, linhas 8-9: Nihil enim penitus
incognitum appetitur. Justifica-se, portanto, a interpretação já apresentada
anteriormente do desiderium dei como uma “saudade de Deus”.
374 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 16, p. 32, linhas 1-5; 10-18: Ex quibus enim
sumus, ex illis nutrimur. Sic intellectus habet vitam suam ab aeterna sapientia et
huius habet aliqualem praegustationem. Unde in omni pascentia, quae sibi ut vivat
necessaria est, non movetur, nisi ut inde pascatur, a quo habet hoc intellectuale
esse. [...]. Quasi ad ferrum et magnetem attendas: Habet enim ferrum in magnete
quoddam sui effluxus principium, et dum magnes per sui praesentiam excitat
ferrum grave et ponderosum, ferrum mirabili desiderio fertur etiam supra motum
naturae, quo secundum gravitatem deorsum tendere debet, et sursum movetur se
suo principio uniendo. Nisi enim ]in ferro esset quaedam praegustatio naturalis
ipsius magnetis, non moveretur plus ad magnetem quam ad alium lapidem. Et nisi
in lapide esset maior inclinatio ad ferrum quam ad cuprum, non esset illa attractio.
375 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 18, p. 37-41: Haec enim eius assimilatio, quae
spiritui nostro naturaliter inest, per quam non quietatur nisi in ipsa sapientia,
est quasi viva imago eius. Non enim quietatur imago nisi in eo, cuius est imago,
a quo habet principium, medium et finem. Viva autem imago per vitam ex se
motum exserit ad exemplar, in quo solum quiescit. Vita enim imaginis non
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NOTAS
potest in se quiescere, cum sit vita vitae veritatis et non sua. Hinc movetur ad
exemplar ut ad veritatem sui esse. Si igitur exemplar est aeternum et imago habet
vitam, in qua praegustat suum exemplar et sic desideriose ad ipsum movetur, et
cum motus ille vitalis non possit quiescere nisi in infinita vita, quae est aeterna
sapientia, hinc non potest cessare spiritualis ille motus, qui numquam infinitam
vitam infinite attingit. Semper enim gaudiosissimo desiderio movetur, ut attingat
quod numquam de delectabilitate attactus fastiditur. Est enim sapientia cibus
saporosissimus, qui satiando desiderium sumendi non diminuit, ut in aeterna
cibatione numquam cesset delectari. Cf. ainda: Ibid., h. V, Liber Primus, n. 26,
p. 53-55: Et hic gradus est altissimus, proxima scilicet sapientiae imago. Et hic
solus est gradus habens aptitudinem se ad sapientiae gustum elevandi, quia in illis
intellectualibus naturis imago sapientiae est viva vita intellectuali, cuius vitae vis
est ex se vitalem motum exserere. Qui motus est per intelligere ad proprium suum
obiectum, quod est veritas absoluta, quae est aeterna sapientia, pergere. Pergere
autem illud cum sit intelligere, tunc est et gustare intellectualiter. Apprehendere
enim per intellectum est quiditatem quadam degustatione gratissima modo quo
potest attingere. Sicut enim sensibili gustu, qui non pertingit ad rei quiditatem,
in extrinsecis a quiditate quaedam grata suavitas per sensum percipitur, sic
per intellectum intellectualis suavitas in quiditate degustatur, quae est imago
suavitatis sapientiae aeternae, quae est quiditatum quiditas, et est comparatio
suavitatis unius ad aliam improportionalis.
376 Ibid., h. V, Liber Primus, n. 22, p. 44-47: IDIOTA: Non est aliud dicere deum
omnia in sapientia fecisse quam deum omnia verbo creasse. Considera autem, 354
quomodo omne, quod est, potuit esse et potuit sic esse et est. Deus autem, qui tradit
sibi actualitatem essendi, est, apud quem est omnipotentia, per quam res de non-
esse ad esse potuit produci. Et est deus pater, qui dici potest unitas seu entitas, quia
necessitat esse, quod erat nihil, ex omnipotentia sua. Deus etiam tradit sibi tale esse,
ut sit hoc, puta caelum, et non aliud, neque plus neque minus. Et hic deus est verbum,
sapientia seu filius patris et potest dici unitatis seu entitatis aequalitas. Est deinde
esse et sic esse unitum, ut sit. Et hoc habet a deo, qui est conexio omnia conectens,
et est deus spiritus sanctus. Spiritus enim est uniens et nectens in nobis et universo
omnia. Unde sicut unitatem nihil gignit, sed estprimum principium nequaquam
principiatum, sic patrem nihil gignit, qui est aeternus. Aequalitas autem ab unitate
procedit, sic filius a patre. Et nexus procedit ab unitate et sua aequalitate. Unde
omnis res, ut habeat esse et tale esse, in quo est, opus habet unitrino principio, deo
scilicet trino et uno. De quo longior sermo fieri posset, si tempus concederet.
377 Idiota. De mente. h. V, Cap. II, n. 58, p. 92, linhas 6-8: PHILOSOPHUS: Aiebas
mentem a mensurando dici. Hanc partem neminem legi tenuisse inter varias verbi
derivationes. Primum oro, ut causam dicti aperias.
378 Ibid., h. V, cap. II, n. 57, p. 90-91: PHILOSOPHUS: Dic igitur, idiota – ita tu tibi
nomen esse ais –, si quam de mente habes coniecturam. / IDIOTA: Puto neminem
esse aut fuisse hominem perfectum, qui non de mente aliqualem saltem fecerit
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conceptum. Habeo quidem et ego: mentem esse, ex qua omnium rerum terminus et
mensura. Mentem quidem a mensurando dici conicio. / PHILOSOPHUS: Putasne aliud
mentem, aliud animam? / IDIOTA: Puto certe. Nam alia est mens in se subsistens, alia
in corpore. Mens in se subsistens aut infinita est aut infiniti imago. Harum autem,
quae sunt infiniti imago, cum non sint maximae et absolutae seu infinitae in se
subsistentes, posse aliquas animare humanum corpus admitto, atque tunc ex officio
easdem animas esse concedo. / PHILOSOPHUS: Concedis igitur eandem esse mentem et
hominis animam: mentem per se, animam ex officio? / IDIOTA: Concedo, uti una est
vis sensitiva et visiva oculi in animali.
379 Ibid., h. V, cap. III, n. 71, p. 108, linhas 7-9: PHILOSOPHUS: Amplius ad mentis
tractatum descende et dicito: Esto, quod ‘mens’ a ‘mensura’ dicatur, ut ratio
mensurationis sit causa nominis: quid mentem esse velis?
380 Ibid., h. V, cap. III, n. 72, p. 108-110: IDIOTA: Scis, quomodo simplicitas divina
omnium rerum est complicativa. Mens est huius complicantis simplicitatis imago.
Unde si hanc divinam simplicitatem infinitam mentem vocitaveris, erit ipsa nostrae
mentis exemplar. Si mentem divinam universitatem veritatis rerum dixeris,
nostram dices universitatem assimilationis rerum, ut sit notionum universitas.
Conceptio divinae mentis est rerum productio; conceptio nostrae mentis est rerum
notio. Si mens divina est absoluta entitas, tunc eius conceptio est entium creatio,
et nostrae mentis conceptio est entium assimilatio. Quae enim divinae menti ut
infinitae conveniunt veritati, nostrae conveniunt menti ut propinquae eius imagini.
Si omnia sunt in mente divina ut in sua praecisa et propria veritate, omnia sunt in
mente nostra ut in imagine seu similitudine propriae veritatis, hoc est notionaliter; 355
similitudine enim fit cognitio.
381 Ibid., h. V, cap. III, n. 73, p. 110-112: IDIOTA: Omnia in deo sunt, sed ibi rerum
exemplaria; omnia in nostra mente, sed ibi rerum similitudines. Sicut deus est
entitas absoluta, quae est omnium entium complicatio, sic mens nostra est illius
entitatis infinitae imago, quae est omnium imaginum complicatio, quasi ignoti
regis prima imago est omnium aliarum secundum ipsam depingibilium exemplar.
Nam dei notitia seu facies non nisi in natura mentali, cuius veritas est obiectum,
descendit, et non ulterius nisi per mentem, ut mens sit imago dei et omnium dei
imaginum post ipsum exemplar. Unde quantum omnes res post simplicem mentem
de mente participant, tantum et de dei imagine, ut mens sit per se dei imago et
omnia post mentem non nisi per mentem.
382 Ibid., h. V, cap. IV, n. 74, p. 113-114, linhas 10-25: IDIOTA: Volo quidem hoc
modo. Nam quod dicendum est, convenienter exprimi nequit. Hinc multiplicatio
sermonum perutilis est. Attende aliam esse imaginem, aliam explicationem. Nam
aequalitas est unitatis imago. Ex unitate enim semel oritur aequalitas, unde
unitatis imago est aequalitas. Et non est aequalitas unitatis explicatio, 15sed
pluralitas. Complicationis igitur unitatis aequalitas est imago, non explicatio. Sic
volo mentem esse imaginem divinae mentis simplicissimam inter omnes imagines
divinae complicationis. Et ita mens est imago complicationis divinae prima omnes
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imagines complicationis sua simplicitate et virtute complicantis. Sicut enim deus est
complicationum complicatio, sic mens, quae est dei imago, est imago complicationis
complicationum. Post imagines sunt pluralitates rerum divinam complicationem
explicantes, sicut numerus est explicativus unitatis et motus quietis et tempus
aeternitatis et compositio simplicitatis et tempus praesentiae et magnitudo puncti
et inaequalitas aequalitatis et diversitas identitatis et ita de singulis.
383 Ibid., h. V, cap. IV, n. 75, p. 114-115, linhas 10-25: IDIOTA: Ex hoc elice
admirandam mentis nostrae virtutem. Nam in vi eius complicatur vis assimilativa
complicationis puncti, per quam in se reperit potentiam, qua se omni magnitudini
assimilat. Sic etiam ob vim assimilativam complicationis unitatis habet
potentiam, qua se potest omni multitudini assimilare, et ita per vim assimilativam
complicationis nunc seu praesentiae omni tempori et quietis omni motui et
simplicitatis omni compositioni et identitatis omni diversitati et aequalitatis omni
inaequalitati et nexus omni disiunctioni. Et per imaginem absolutae complicationis,
quae est mens infinita, vim habet, qua se potest assimilare omni explicationi. Et
talia multa per te vides dici posse, quae mens nostra habet, quia est imago infinitae
simplicitatis omnia complicantis.
384 Ibid., h. V, cap. IV, n. 77, p. 116-119, linhas 1-4; 9-26: PHILOSOPHUS: Aiebat
Aristoteles menti seu animae nostrae nullam notionem fore concreatam, quia
eam tabulae rasae assimilavit. Plato vero aiebat notiones sibi concreatas, sed ob
corporis molem animam oblitam. Quid tu in hoc verum censes? / IDIOTA: Sicuti vis
visiva animae non potest in operationem suam, ut actu videat, nisi excitetur ab
obiecto, et non potest excitari nisi per obstaculum specierum multiplicatarum per 356
medium organi et sic opus habet oculo, sic vis mentis, quae est vis comprehensiva
rerum et notionalis, non potest in suas operationes, nisi excitetur a sensibilibus,
et non potest excitari nisi mediantibus phantasmatibus sensibilibus. Opus ergo
habet corpore organico, tali scilicet, sine quo excitatio fieri non posset. In hoc igitur
Aristoteles videtur bene opinari animae non esse notiones ab initio concreatas,
quas incorporando perdiderit. Verum quoniam non potest proficere, si omni caret
iudicio, sicut surdus numquam proficeret, ut fieret citharoedus, postquam nullum
de harmonia apud se iudicium haberet, per quod iudicare posset an profecerit,
quare mens nostra habet sibi concreatum iudicium, sine quo proficere nequiret.
Haec vis iudiciaria est menti naturaliter concreata, per quam iudicat per se de
rationibus, an sint debiles, fortes aut concludentes. Quam vim si Plato notionem
nominavit concreatam, non penitus erravit.
385 Ibid., h. V, cap. XI, n. 129, p. 181, linhas 5-7: PHILOSOPHUS: Tetigisti superius
de trinitate dei et trinitate mentis. Oro declares, quomodo omnia in deo sunt in
trinitate, similiter et in mente nostra.
386 Ibid., h. V, cap. VI, n. 94, p. 140, linhas 9-16: IDIOTA: Ex eo enim, quod mens
divina unum sic intelligit et aliud aliter, orta est rerum pluralitas. Unde si acute
respicis, reperies pluralitatem rerum non esse nisi modum intelligendi divinae
mentis. Sic irreprehensibiliter posse dici conicio primum rerum exemplar in animo
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conditoris numerum esse. Hoc ostendit delectatio et pulchritudo, quae omnibus
rebus inest, quae in proportione consistit, proportio vero in numero. Hinc numerus
praecipuum vestigium ducens in sapientiam.
387 Ibid., h. V, cap. VI, n. 95, p. 141, linhas 1-2: PHILOSOPHUS: Illud primo
Pythagorici, deinde Platonici dixerunt, quos et Severinus Boethius imitatur.
388 Ibid., h. V, cap. VI, n. 88, p. 132-133: PHILOSOPHUS: Apte applicasti. Et quando
‘unum’ dicis, intellectum aperis quomodo fit rerum productio ac quomodo proportio
est locus orbis seu regio formae et locus proportionis materia. Et videris multum
Pythagoricus, qui ex numero omnia esse asserunt. / IDIOTA: Nescio, an Pythagoricus
vel alius sim. Hoc scio, quod nullius auctoritas me ducit, etiamsi me movere
tentet. Arbitror autem viros Pythagoricos, qui ut ais per numerum de omnibus
philosophantur, graves et acutos. Non quod credam eos voluisse de numero loqui,
prout est mathematicus et ex nostra mente procedit – nam illum non esse alicuius
rei principium de se constat –, sed symbolice ac rationabiliter locuti sunt de numero,
qui ex divina mente procedit, cuius mathematicus est imago. Sicut enim mens nostra
se habet ad infinitam aeternam mentem, ita numerus nostrae mentis ad numerum
illum. Et damus illi numero nomen nostrum sicut menti illi nomen mentis nostrae,
et delectabiliter multum versamur in numero quasi in nostro proprio opere.
389 Ibid., h. V, cap. VI, n. 95, p. 141-142, linhas 3-21: IDIOTA: Pariformiter dico
exemplar conceptionum nostrae mentis numerum esse. Sine numero enim nihil
facere potest; neque assimilatio neque notio neque discretio neque mensuratio fieret
numero non exsistente. Res enim non possunt aliae et aliae et discretae sine numero 357
intelligi. Nam quod alia res est substantia et alia quantitas et ita de aliis, sine numero
non intelligitur. Unde cum numerus sit modus intelligendi, nihil sine eo intelligi
potest. Numerus enim nostrae mentis cum sit imago numeri divini, qui est rerum
exemplar, est exemplar notionum. Et sicut ante omnem pluralitatem est unitas, et
haec est unitas uniens mens increata, in qua omnia unum, post unum pluralitas,
explicatio virtutis illius unitatis, quae virtus est rerum entitas, essendi aequalitas
et entitatis aequalitatisque conexio et haec trinitas benedicta, sic in nostra mente
est illius trinitatis divinae imago. Nam mens nostra similiter est unitas uniens ante
omnem pluralitatem per mentem conceptibilem, et post illam unitatem unientem
omnem pluralitatem est pluralitas, quae est pluralitatis rerum imago sicut mens
nostra divinae mentis imago. Et explicat pluralitas virtutem unitatis mentis, quae
virtus est imago entitatis, aequalitatis et conexionis.
390 Entretanto, a fé na Trindade e a compreensão desse dogma não estão
ausentes nem do Idiota. De mente como um todo nem do décimo primeiro
capítulo. Recordamos, em primeiro lugar, que o motivo da admiração por
parte do filósofo é a fé da multidão que veio a Roma para o ano jubilar. Cf.
Ibid., h. V, cap. I, n. 51, p. 86, linhas 16-20: PHILOSOPHUS: Bene ais, amice. Nam
cum ex universis paene climatibus magna cum pressura innumerabiles populos
transire conspiciam, admiror omnium fidem unam in tanta corporum diversitate.
Cum enim nullus alteri similis esse possit, una tamen omnium fides est, quae eos
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tanta devotione de finibus orbis advexit. Em segundo lugar, lembramos que no
próprio contexto do capítulo onze o filósofo se interessa por compreender
alguns aspectos do dogma trinitário. Cf. Ibid., h. V, cap. XI, n. 138, p. 190,
linhas 9-13; n. 139, p. 191: PHILOSOPHUS: Adde verbum unum quaeso: Unde dicitur
trinitas individua una? / IDIOTA: In deo ab unitate uniente, quae est vera substantia,
in aliis ab unitate naturae, quae est quasi quaedam imago unitatis unientis, quae
proprie est substantia. // PHILOSOPHUS: Cum dicitur: unitas est una, aequalitas est
una, unde hoc? / IDIOTA: Ab unitate substantiae. / PHILOSOPHUS: Quando autem
nostri dicunt theologi unitatem pro patre et aequalitatem pro filio et nexum pro
spiritu sancto capientes, quomodo pater est unus, filius est unus, unde hoc? /
IDIOTA: A singularitate personae. Sunt enim tres singulares personae in una divina
substantia, ut alio tempore, quantum concedebatur, diligenter tractavimus.
391 Ibid., h. V, cap. XI, n. 129, p. 182-183, linhas 8-22: IDIOTA: Vos philosophi
asseritis decem genera generalissima omnia complecti. / PHILOSOPHUS: Ita est profecto.
/ IDIOTA: Nonne dum ea, ut actu sunt, consideras, divisa esse conspicis? / PHILOSOPHUS:
Immo. / IDIOTA: Sed dum ea ante incohationem essendi consideras sine divisione, quid
tunc aliud esse possunt quam aeternitas? Nam ante omnem divisionem conexio. Illa
igitur ante omnem divisionem unita et conexa esse necesse est. Conexio autem ante
omnem divisionem aeternitas est simplicissima, quae deus est. Adhuc dico: Cum deus
non possit negari perfectus et perfectum sit, cui nihil deest, hinc rerum universitas
in perfectione, quae deus est. Sed perfectio summa exigit, quod sit simplex et una
absque alteritate et diversitate; hinc omnia in deo unum.
392 Ibid., h. V, cap. XI, n. 130, p. 183-184, linhas 5-15: IDIOTA: Habes omnia ab 358
aeterno in deo deum esse. Considera igitur rerum universitatem in tempore. Et cum
impossibile non fiat, nonne vides eam ab aeterno fieri potuisse? / PHILOSOPHUS: Mens
assentit. / IDIOTA: Igitur omnia in posse fieri mentaliter vides. / PHILOSOPHUS: Recte
ais. / IDIOTA: Et si fieri potuerunt, erat necessario posse facere, antequam essent. /
PHILOSOPHUS: Ita erat. IDIOTA: Sic ante rerum universitatem temporalem vides omnia
in posse facere. PHILOSOPHUS: Video. Cf. De venatione sapientiae. h. XII, cap. II,
n. 6, p. 9, linhas 9-15: Cum ignotum per ignotius non possit sciri, capere me oportet
aliquid certissimum, ab omnibus venatoribus indubitatum et praesuppositum, et in
luce illius ignotum quaerere. Verum enim vero consonat. Cum haec sollicite intra
me avida mens quaereret, incidit philosophorum assertio, quam et Aristoteles in
Physicorum principio assumit, quae est quod impossibile fieri non fit. Et ad ipsam
conversus introspexi regiones sapientiae hoc qualicumque discursu”. Cf. também:
Ibid., h. XII, cap. III e cap. XXXVIII. Cf. ainda: NICOLAI DE CUSA. Trialogus
de possest. Opera omnia. Iussu et auctoritate Academiae Litterarum
Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. XI2. Hamburg: Felix Meiner,
1973: CARDINALIS: Arbitror quod multa valde etiam altissima et mihi abscondita.
Sed quae nunc conicio haec sunt: Docere nos voluit apostolus, quomodo in deo
illa invisibiliter apprehendere poterimus, quae in creatura videmus. Omnis enim
creatura actu exsistens utique esse potest. Quod enim esse non potest, non est. Unde
non-esse non est creatura. Si enim est creatura, utique est. Creare etiam cum sit
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
ex non-esse ad esse producere, utique clare ostendit ipsum non-esse nequaquam
creaturam. Neque hoc parvum est apprehendisse. (Trialogus de possest. h. XI2, n.
5, p. 6). Além da edição crítica também consultamos as seguintes traduções:
NICHOLAS OF CUSA. Trialogus de possest/On actualized-possibility. In:
HOPKINS, Jasper. A concise introduction to the philosophy of Nicholas
of Cusa. Includes English and Latin versions of Nicholas’ Trialogus de
possest. University of Minnesota Press: Minneapolis/Minnesota, 1978;
NICOLÒ CUSANO. De possest. In: Scritti filosofici. A cura di Giovanni
Santinello. Vol. I com texto latino a fronte. Bolonha/Itália: Zanichelli,
1980, p. 237-313; NICOLÁS DE CUSA. El possest. Introducción, traducción
y notas de Ángel Luis González. 2 Ed. Navarra/Espanha: EUNSA/Ediciones
Universidad de Navarra, S.A., 1998 (Cuadernos de Anuario Filosófico Nº 4 –
Serie Universitaria).
393 Idiota. De mente. h. V, cap. XI, n. 131, p. 184-185: IDIOTA: Nonne, ut in
esse prodiret rerum universitas, quam vides oculo mentis in absoluto posse fieri et
in absoluto posse facere, necesse erat nexus ipsius utriusque, scilicet posse fieri et
posse facere? Alias quod potuit fieri per potentem facere numquam fuisset factum.
/ PHILOSOPHUS: Optime ais. / IDIOTA: Vides igitur ante omnem rerum temporalem
exsistentiam omnia in nexu procedente de posse fieri absoluto et posse facere
absoluto. Sed illa tria absoluta sunt ante omne tempus simplex aeternitas. Hinc
omnia conspicis in simplici aeternitate triniter. / PHILOSOPHUS: Sufficientissime. /
IDIOTA: Attende igitur, quomodo absolutum posse fieri et absolutum posse facere
et absolutus nexus non sunt nisi unum infinite absolutum et una deitas. Et ordine 359
prius est posse fieri quam posse facere. Nam omne facere praesupponit fieri posse, et
posse facere id, quod habet, scilicet posse facere, habet de posse fieri. Et de utroque
nexus. Unde cum ordo dicat posse fieri praecedere, sibi attribuitur unitas, cui
inest praecedere, et posse facere attribuitur aequalitas unitatem praesupponens,
a quibus nexus. Et haec nunc, si placet, de hoc sufficiant. Cf. também: Trialogus
de possest. h. XI2, n. 6, p. 7-8, linhas 12-18: CARDINALIS: Possibilitas ergo
absoluta, de qua loquimur, per quam ea quae actu sunt actu esse possunt, non
praecedit actualitatem neque etiam sequitur. Quomodo enim actualitas esse
posset possibilitate non exsistente? Coaeterna ergo sunt absoluta potentia et actus
et utriusque nexus. Neque plura sunt aeterna, sed sic sunt aeterna quod ipsa
aeternitas. Videnturne vobis haec sic aut aliter se habere?
394 Idiota. De mente. h. V, cap. XI, n. 132, p. 185, linhas 1-7: PHILOSOPHUS:
Solum unum adice: si deus intelligit ut trinus et unus. / IDIOTA: Mens aeterna
omnia in unitate, unitatis aequalitate et utriusque nexu intelligit. Quomodo deus
intelligeret etiam in aeternitate sine omni successione absque entitate et entitatis
aequalitate atque nexu utriusque, quae sunt trinitas in unitate? Non quod deus
aliquid praemittat modo materiae et cum successione intelligat sicut nos, sed
intelligere eius cum sit eius essentia, est necessario in trinitate.
395 Ibid., h. V, cap. XI, n. 132, p. 186, linhas 8-15: PHILOSOPHUS: Si sic est suo modo
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
in nostra mente, subiungito. / IDIOTA: Omnia principiata in se similitudinem principii
habere atque ideo in omnibus trinitatem in unitate substantiae in similitudineverae
trinitatis et unitatis substantiae principii aeterni reperiri certum teneo. In omnibus
igitur, quae principiata sunt, posse fieri, quod descendit a virtute infinita unitatis
seu entitatis absolutae, posse facere, quod descendit a virtute absolutae aequalitatis,
et compositionem utriusque, quae descendit a nexu absoluto, reperiri necesse est.
396 Ibid., h. V, cap. XI, n. 133, p. 186-187: IDIOTA: Unde mens nostra, imago mentis
aeternae, in mente ipsa aeterna ut similitudo in veritate sui ipsius mensuram
venare contendit. Est enim ipsa mens nostra, ut est similitudo divinae, uti vis alta
consideranda, in qua posse assimilari et posse assimilare et nexus utriusque in
essentia unum sunt et idem. Unde non potest mens nostra, nisi sit una in trinitate,
quicquam intelligere, quemadmodum nec mens divina. Primo enim, dum se movet
ut intelligat, aliquid in similitudine posse fieri seu materiae praemittit, cui aliud
in similitudine posse facere seu formae adiungit, et tunc in similitudine compositi
ab utroque intelligit. Dum autem modo materiae comprehendit, genera facit, dum
modo formae comprehendit, facit differentias, dum modo compositi, species facit
vel individua. Sic etiam dum modo propriae passionis intelligit, facit propria, dum
modo advenientis intelligit, facit accidentia. Nihil autem intelligit, nisi praemisso
aliquo modo materiae et alio modo advenientis formae modo compositi illa nectat.
In hac autem successione, qua dixi aliqua praemitti modo materiae et formae, vides
mentem nostram in similitudine aeternae mentis intelligere. Aeterna enim mens
sine successione simul omnia et omni modo intelligendi intelligit. Sed successio
est descensus ab aeternitate, cuius est imago vel similitudo. Intelligit igitur in 360
successione, dum est unita corpori, quod successioni subicitur. Hoc etiam attente
considerandum, quod omnia, ut in mente nostra sunt, sunt similiter in materia,
sunt et in forma, sunt et in composito.
397 Ibid., h. V, cap. XI, n. 134, p. 187-188, linhas 3-11: IDIOTA: Idiota: Libenter.
Hanc naturam, quae est animal, inspicito. Nam eam mens comprehendit aliquando
ut genus est, tunc enim quasi confuse et informiter animalis naturam considerat
materiae modo; aliquando ut significatur per nomen ‘animalitas’, et tunc modo
formae; aliquando modo compositi ex illo genere et differentiis ei advenientibus,
et tunc, ut in mente est, dicitur esse in conexione, ita ut illa materia et illa forma
vel potius illa similitudo materiae et illa similitudo formae et illud modo compositi
consideratum sit una et eadem notio unaque et eadem substantia. Da mesma
forma, também aquilo que é está em conexão, pois o poder fazer e o poder
ser feito se unem para fazer uma única e mesma coisa. Do mesmo modo,
também na análise do capítulo sexto mostrou-se que aquilo que é pôde
ser feito, pôde ser feito de um determinado modo e é. Aquilo que é em
ato, portanto, é enquanto está conectado o poder ser e o poder ser de um
determinado modo.
398 Cf. 3.4 O universO imita a trindade do presente texto.
399 Idiota. De mente. h. V, cap. XIII, n. 145, p. 198, linhas 10-12; n. 146, p. 198-
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
200: PHILOSOPHUS: Plato dixit animam illam exemplaria rerum indelebiliter continere
et omnia movere, Aristoteles naturam aiebat sagacem omnia moventem. // IDIOTA:
Forte Plato voluit animam mundi esse ut animam servi scientis mentem domini sui
et exsequentem voluntatem eius. Et hanc scientiam vocavit notiones seu exemplaria,
quae nulla oblivione obmittuntur, ut divinae providentiae non deficeret exsecutio. Et
id, quod Plato scientiam animae mundi appellavit, Aristoteles sagacitatem naturae
esse voluit, quae habet sagacitatem exsequendi imperium dei. Ob hoc tribuerunt
necessitatem complexionis illi animae seu naturae, quia necessitatur determinate
sic agere, ut absoluta necessitas imperat. Sed non est nisi modus intelligendi,
quando scilicet mens nostra concipit deum quasi artem architectonicam, cui ars
alia exsecutorialis subsit, ut conceptus divinus in esse prodeat. Sed cum voluntati
omnipotenti omnia necessario oboediant, tunc voluntas dei alio exsecutore opus non
habet. Nam velle cum exsequi in omnipotentia coincidunt. Quasi ut dum vitrificator
vitrum facit. Nam insufflat spiritum, qui exsequitur voluntatem eius, in quo spiritu
est verbum seu conceptus et potentia; nisi enim potentia et conceptus vitrificatoris
forent in spiritu, quem emittit, non oriretur vitrum tale.” Sobre o conceito de
“necessitas complexionis. Cf. Glossa super Librum Boethii De S. Trinitate.
nh. II, 21, p. 284: Haec vero determinata dicitur necessitas vel necessitas
complexionis eo quod, cum aliquam eius materiam incurrimus, causarum
reliquarum seriatam conexionem vitare non possumus. Quam alii legen naturalem,
alii naturam, alii mundi animam, alii iustitiam naturalem, alii heimarmem
nuncupaverunt. At vero alii eam dixere fatum, alii Parcas, alii intelligentiam
Dei. Quod si nullam eius causam attigerimus, ei causarum connexioni minime
subiacemus. Et ideo determinata vel ordinis dicitur necessitas haec. Conferir 361
também: Lectiones in Boethii librum De Trinitate. nh. II, 9, p. 154: Cum
autem rerum universitas, ut dictum est, subiecta sit theologiae, mathematicae
et physicae secundum diversas considerationes, est tamen universitas rerum
quattuor modis. Et una et eadem universitas est in Absoluta Necessitate, est in
necessitate complexionis, est in absoluta possibilitate, est in determinata
possibilitate. Et hi sunt quattuor modi existendi universitatis omnium rerum. O
vidreiro, nesse caso, seria o “Soffiatore di Vetro” que soprando ar dentro
de pasta vítrea modela os objetos de vidro que desejar. O vidreiro insufflat
spiritum, qui exsequitur voluntatem eius. Parece ser importante na tradução
manter a palavra spiritum, tendo em vista toda a carga simbólica que ela
assume no capítulo XIII. O exemplo do vidreiro (vitrificator) aparece em
outros contextos das obras cusanas. A Edição Crítica de Heidelberg (p. 199)
indica: Sermo III n. 29, 19sq; De gen. 3 n. 163,3-22; Cribr. Alch. I 20 nn. 82sq.
400 Idiota. De mente. h. V, cap. XIII, n. 147, p. 200-202: IDIOTA: Concipe igitur
absolutam artem creativam per se subsistentem, ut ars sit artifex et magisterium
magister. Haec ars habet in sua essentia necessario omnipotentiam, ut ei nihil
resistere possit, sapientiam, ut sciat quid agat, et nexum omnipotentiae cum
sapientia, ut quid velit fiat. Nexus ille in se habens sapientiam et omnipotentiam
spiritus est quasi voluntas seu desiderium. Impossibilium enim et penitus ignotorum
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
non est voluntas seu desiderium. Sic in perfectissima voluntate inest sapientia et
omnipotentia et a similitudine quadam spiritus dicitur, eo quia motus sine spiritu
non est, adeo quod et id, quod in vento motionem facit et in omnibus aliis, spiritum
appellemus. Per motum autem omnes artifices efficiunt quod volunt. Quapropter
vis artis creativae, quae est ars absoluta et infinita seu deus benedictus, omnia
efficit in spiritu seu voluntate, in qua est sapientia filii et omnipotentia patris,
ut opus eius sit unius indivisae trinitatis. Hunc nexum, spiritum seu voluntatem
ignorarunt Platonici, qui hunc spiritum non viderunt deum, sed a deo principiatum
et animam mundum – ut anima nostra intellectiva nostrum corpus – animantem
putarunt. Neque eum spiritum viderunt Peripatetici, qui hanc vim naturam rebus
immersam, a qua est motus et quies, posuerunt, cum tamen sit deus absolutus in
saecula benedictus.
401 Ibid., h. V, cap. XIII, n. 148, p. 203, linha 5-11: IDIOTA: Nosti mentem nostram
vim quandam esse habens imaginem artis divinae iam dictae. Unde omnia, quae
absolutae arti verissime insunt, menti nostrae vere ut imagini insunt. Unde mens est
creata ab arte creatrice, quasi ars illa se ipsam creare vellet et, quia immultiplicabilis
est infinita ars, quod tunc eius surgat imago, sicut si pictor se ipsum depingere
vellet et, quia ipse non est multiplicabilis, tunc se depingendo oriretur eius imago. O
mesmo exemplo do pintor será utilizado para mostrar em que sentido Deus
“pinta” o mundo para que a natureza intelectual o possa conhecer. Mas,
como o uno não é multiplicável, então, multiplica-se na multiplicidade das
figuras. Cf. De visione dei. h. VI, cap. XXV, n. 116, linhas 9-15: Tu, domine,
qui omnia propter temet ipsum operaris, universum hunc mundum creasti propter 362
intellectualem naturam, quasi pictor, qui diversos temperat colores, ut demum se
ipsum depingere possit ad finem, ut habeat sui ipsius imaginem, in qua delicietur
et quiescat ars sua; cum ipse unus sit immultiplicabilis, saltem modo, quo fieri
potest, in propinquissima similitudine multiplicetur. Multas autem figuras facit,
quia virtutis suae infinitae similitudo non potest nisi in multis perfectiori modo
explicari. Et sunt omnes intellectuales spiritus cuilibet spiritui opportuni. Nam nisi
forent innumerabiles, non posses tu, deus infinitus, meliori modo cognosci.
402 Idiota. De mente. h. V, cap. XIII, n. 149, p. 203-204, linha 1-9: IDIOTA: Et
quia imago numquam quantumcumque perfecta, si perfectior et conformior esse
nequit exemplari, adeo perfecta est sicut quaecumque imperfecta imago, quae
potentiam habet se semper plus et plus sine limitatione inaccessibili exemplari
conformandi – in hoc enim infinitatem imaginis modo quo potest imitatur, quasi
si pictor duas imagines faceret, quarum una mortua videretur actu sibi similior,
alia autem minus similis viva, scilicet talis, quae se ipsam ex obiecto eius ad motum
incitata conformiorem semper facere posset, nemo haesitat secundam perfectiorem
quasi artem pictoris magis imitantem [...]. A Edição Crítica de Heidelberg (p.
203-204) faz referência ao seguinte texto da Carta de Nicolau de Cusa a
Nicolau Albergati (n. 8): Sicut si pictor sui ipsius visibilem imaginem dipingit,
illa manet ut facta est, sed si foret talis pictor, qui artis suae intellectualis pingendi
intellectualem et invisibilem imaginem facere posset, utique illa imago artis, si
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
perfecta foret imago intellectualis et vivae artis, se ipsam clariorem et similiorem
facere posset, quando se suo factori conformaret.
403 Ibid., h. V, cap. XIII, n. 149, p. 204-205, linha 10-22: IDIOTA: [...] – sic omnis
mens, etiam et nostra, quamvis infra omnes sit creata, a deo habet, ut modo quo
potest sit artis infinitae perfecta et viva imago. Quare est trina et una habens
potentiam, sapientiam et utriusque nexum modo tali, ut perfecta artis imago,
scilicet quod excitata possit se semper plus et plus exemplari conformare. Sic
mens nostra etsi in principio creationis non habeat actualem resplendentiam artis
creatricis in trinitate et unitate, habet tamen vim illam concreatam, per quam
excitata se actualitati divinae artis conformiorem facere potest. Unde in unitate
essentiae eius est potentia, sapientia et voluntas. Et coincidunt in essentia magister
et magisterium ut in imagine viva artis infinitae, quae excitata se actualitati
divinae semper sine termino conformiorem facere potest praecisione infinitae artis
inaccessibili semper remanente. Cf. Epistula ad Nicolaum Bononiensem. cp.,
n. 7: Cuncta vero creata in eo quod habent quiescunt, nihil ultra receptum, speciem
divinae similitudinis, appetentia, cum per illam id sint quod sunt, sine qua nihil
forent. Nostra autem intellectualis natura, cum se dei vivam imaginem intelligat,
potestatem habet continue clarior et deo conformatior fieri, licet, cum sit imago,
nunquam fiat exemplar aut creator.
404 ANGEL LEYRA, Miguel. Introducción. In. NICOLÁS DE CUSA. El Principio.
Introducción, traducción y notas de Miguel Angel Leyra. Pamplona/
España: Servicio de Publicaciones de la Universidad de Navarra. S.A., 1994
(Cuadernos de Anuario Filosófico). 363
405 LUIS GONZÁLEZ, Ángel. Introducción. In: NICOLÁS DE CUSA. El No-outro.
Traducción, introducción y notas de Angel Luis Gonzáles. Pamplona/España:
Servicio de Publicaciones de la Universidad de Navarra. S.A., 2005, p. 5-13.
406 Na mesma direção, Bauchwitz (2006, p. 39) considera com Duclow:
“Mais que um título de uma obra, a docta ignorantia é, como diz Duclow,
uma ‘metafísica compreensiva’ daquilo que emerge da hermenêutica dos
nomes divinos: deus, homem, mundo (1974, p. 79). É evidente que Nicolau
nunca abandonaria a perspectiva aberta pela douta ignorância e as suas
demais obras são, para utilizar uma expressão cusana, as suas explicações”.
A título de informação, poderíamos indicar dois capítulos da já citada obra
de THERUVATHU (2010). No oitavo capítulo (p. 211-233), o autor discute
sobre o que ele chama de “aporia or the irresolvable dilema” (p. 230) entre a
“impossibilidade” e a “necessidade” de se nomear. Por outro lado, no nono
capítulo (p. 235-273), o autor afirma que Nicolau de Cusa muito contribuiu
para a tradição dos “nomes divinos” tanto analisando os nomes tradicionais
quanto formulando neologismos para nomear a Deus (p. 235).
407 A questão sobre a especificidade dos textos do chamado “período
tardio” e, de modo especial, o problema de uma possível evolução ou
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
mudança significativa no pensamento de Nicolau de Cusa é ainda uma
questão que continua dividindo os estudiosos do pensamento cusano. A
perspectiva a partir da qual lemos as principais obras filosófico-teológicas
não se afasta daquela de Bauchwitz, anteriormente citada. Essa posição
é bastante próxima daquela assumida por João Maria André, ao afirmar
que “os temas desenvolvidos por Nicolau de Cusa na sua primeira grande
obra filosófica jamais serão abandonados ao longo de toda a sua pesquisa”
(1997, p. 213). Além disso, como também já recordou González Ríos (2010, p.
205), para André, por exemplo, “O De possest pode, assim, ser interpretado
simultaneamente como ponto de chegada das primeiras especulações
cusanas e como ponto de partida para o seu aprofundamento numa direção
ligeiramente inflectida, que encontrará o seu maior expoente no De apice
theorie” (1997, p. 261). O que se observaria a partir do De possest seria
uma consideração dinâmica do princípio tendo em vista a sua natureza
trinitária. Essa dinamicidade será expressa por meio do termo “posse”. A
posição assumida por João Maria André estaria, ainda segundo González
Ríos, “frente a la posición de Kurt Flasch y Giovanni Santinello” (2010, p.
205); o primeiro afirmaria uma evolução [Entwicklung] e o segundo “sostiene
que en este conjunto de obras no se encuentra una transformación
sustancial en cuanto al contenido de la filosofía de Nicolás de Cusa, sino
más bien novedosas búsquedas nominales para expresar lo divino” (2010,
p. 204). Portanto, é oportuno recordar que ao pensar a relação entre
os nomes divinos “possest” e “posse ipsum” André observa que “o ‘Posse
ipsum’ supera tanto o ‘Possest’ como qualquer outro nome” e que “esta 364
superação reassumptiva do ‘Possest’ através do ‘Posse ipsum’ [...] é a
libertação definitiva do esquema aristotélico-tomista que enclausurava, de
algum modo, o pensamento do autor” (1997, p. 287-288). Alguns anos mais
tarde, André reafirmará a sua posição, mas também reconhecerá que, pelo
menos no nível do discurso, existem sinais de uma mudança significativa
que Nicolau teria deixado explícita: “con este nombre [possest], más que
invertir la relación entre acto y potencia lo que el autor nos muestra es que
ha finalmente logrado liberarse de las categorías de acto y potencia para
expresarse, pues el posse más que la traducción de una potencia distinta del
acto: significa, al mismo tiempo, la posibilidad y el poder, una posibilidad
y un poder que sólo pueden ser considerados en la posición absoluta de su
simplicidad. En este sentido, no podemos dejar de concordar con la tesis [em
rodapé cita a Kurt Flasch] según la cual son visibles en el De apice theoriae,
por lo menos al nivel del discurso, las señales de un cambio significativo que
Nicolás de Cusa quiso dejar bien explícito […]” (2010, p. 34-35). Cf. ainda a
posição de González Ríos: “[...] en reiteradas oportunidades Nicolás de Cusa
consideró que con determinado nombre enigmático había alcanzado un modo
más claro o bien menos inadecuado de significar el dinamismo productivo
del Nombre absoluto o Verbo divino. Sin embargo, podemos afirmar ahora
que esa mayor adecuación guarda relación en cada caso con la particular
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
perspectiva bajo la cual Aquél es concebido intelectualmente. En virtud de
ello consideramos que no es lícito trazar una evolución [Entwicklung] en los
modos cusanos de significar al Nombre absoluto a través de los distintos
nombres enigmáticos, no sólo porque todos ellos son igualmente conjeturales
sino también porque cada uno de ellos resulta el más adecuado o el más
conveniente según la perspectiva que cada uno de ellos adopta” (2010, p.
264). Para a ideia de uma “periodização” do pensamento cusano: Cf. CRANZ,
F. Edward. The Late Works of Nicholas of Cusa. In: CHRISTIANSON, Gerald;
IZBICKI, Thomas M. (Ogs.). Nicholas of Cusa in search of God and Wisdom.
Essays in Honor of Morimichi Watanabe. American Cusanus Society XVI,
298 S. Leiden 1991 S. p. 141-160; Cf. também Casarella (1992, p. 308-328). Cf.
D’AMICO, Claudia. El Deus absconditus o acerca del nombre de Dios en Nicolás
de Cusa. In: Patristica et Mediaevalia. Volumen XVII, Buenos Aires, 1996,
p. 38-48: ao referir-se à ideia de “período” no pensamento cusano, a autora
afirma o seguinte: “Entrecomillamos el término ‘período’ por considerarlo
sólo un criterio instrumental que hace referencia más bien a una localización
temporal que a un cambio de problemática o de enfoque en el pensamiento
cusano. Si bien hay diferentes matices entre las obras que anteceden al Idiota
y las que la suceden, determinado por la inclusión de nuevas fuentes entre las
cuales la lectura atenta de Proclo será decisiva, el leitmotiv del pensamiento
de Nicolás permanece intacto” (1996, p. 40, nota 10).
408 De docta ignorantia. w. L. I, cap. III, n. 9, p. 12, linhas 4-5; n. 10, p. 14,
linhas 1-2: Quoniam ex se manifestum est infiniti ad finitum proportionem non 365
esse”; “Non potest igitur finitus intellectus rerum veritatem per similitudinem
praecise attingere. (A douta ignorância. L. I, cap. III, n. 9; n. 10, p. 7).
4094 Ibid., w. L. I, cap. III, n. 10, p. 14, linhas 14-15: Patet igitur de vero nos non
aliud scire quam quod ipsum praecise uit est scimus incomprehensibile [...]. (Ibid.,
L. I, cap. III, n. 10, p. 8).
410 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 4-7: Maximum, quo maius esse nequit,
simpliciter et absolute cum maius sit, quam comprehendi per nos possit, quia est
veritas infinita, non aliter quam incomprehensibiliter attingimus. (Ibid., L. I, cap. IV,
n. 11, p. 8). “¿Pero, qué significa ‘alcanzar’ en la ignorancia? En primer lugar,
nos libera del escepticismo: hay aquí algo que se puede alcanzar, aunque este
‘algo’ no es el objeto último de nuestro deseo de saber que, por definición, es
inalcanzable. Lo que es ‘alcanzable’ en este ‘alcanzar’ es la ignorancia como
máximo conocimiento de lo incognoscible. Así la ignorancia se convierte en
un modo de ‘alcanzar lo inalcanzable’, esto es, ‘inalcanzablemente’. Y solo en
este modo ‘máximo’ de saber es posible alcanzar la naturaleza de la misma
‘maximidad absoluta’.” (D’AMICO, 2007, p. 28).
411 De docta ignorantia. w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 9-13: Omnia
enim, quaecumque sensu, ratione aut intellectu apprehenduntur, intra se et ad
invicem taliter differunt, quod nulla est aequalitas praecisa inter illa. Excedit igitur
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
maxima aequalitas, quae a nullo est alia aut diversa, omnem intellectum. (A douta
ignorância. L. I, cap. IV, n. 11, p. 9).
412 Ibid., w. L. I, cap. IV, n. 12, p. 18, linhas 18-23: Hoc autem omnem nostrum
intellectum transcendit, qui nequit contradictoria in suo principio combinare via
rationis, quoniam per ea, quae nobis a natura manifesta fiunt, ambulamus, quae
longe ab hac infinita virtute cadens ipsa contradictoria per infinitum distantia
conectere simul nequit. (Ibid., L. I, cap. IV, n. 12, p. 10).
413 Ibid., w. L.I, cap. V, n.13, p. 20, linhas 3-5: Ex his clarissime constat maximum
absolute incomprehensibiliter intelligibile pariter et innominabiliter nominabile
esse. (Ibid., L. I, cap. V, n.13, p. 11).
414 Em seguida retomaremos a relação entre razão e nomeação no De
coniecturis e no Idiota. De mente. Vejamos duas afirmações de textos, que se
encontram entre uma e outra obra de Cusano. Cf.: NICOLAI DE CUSA. De deo
abscondito. In: Opera omnia. Iussu et auctoritate Academiae Litterarum
Heidelbergensis ad codicum fidem edita. vol. IV. Opuscula I. Hamburg: Felix
Meiner, 1959, p. 3-10: CHRISTIANUS: Nihil horum scis, sed te putas scire. Si enim te
interrogavero de quiditate eius, quod te putas scire, affirmabis quod ipsam veritatem
hominis aut lapidis exprimere non poteris. Sed quod scis hominem non esse lapidem,
hoc non evenit ex scientia, qua scis hominem et lapidem et differentiam, sed evenit
ex accidenti, ex diversitate operationum et figurarum, quae dum discernis, diversa
nomina imponis. Motus enim in ratione discretiva nomina imponit. (n. 4, p. 4,
linhas 3-9); De genesi. h. IV opuscula I, cap. IV, n. 172, linhas 1-6: NICOLAUS: 366
Unde tale quid conicio mundum, ubi vis divina configurata latet. Cuius etsi
diligenti investigatione per proportiones, differentias et concordantias et studiosum
discursum ad ‘quia est’ elementorum et combinationum deveniri possit, nullum
tamen nomen nec elementi nec vocalis nec combinationis proprium ex se inquisitor
inveniet, sed inventis ratio discernens nomen appropriat.
4154 De docta ignorantia. w. L. I, cap. V, n. 13, p. 20, linhas 7-9: Nihil est
nominabile, quo non possit maius aut minus dari, cum nomina his attributa sint
rationis motu, quae quadam proportione excedens admittunt aut excessum”.
(A douta ignorância. L. I, cap. V, n. 13, p. 11).
416 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 74, p. 96, linhas 3-6: Postquam nunc auxiliante
deo exemplo mathematico studuimos in mostra ignorantia circa primum maximum
peritiores fieri, adhuc pro completiore doctrina de nomine maximi investigemus.
(Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 74, p. 54).
417 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 74, p. 96, linhas 8-13: Nam manifestum est, cum
maximum sit ipsum maximum simpliciter, cui nihil opponitur, nullum nomen ei
proprie posse convenire. Omnia enim nomina ex quadam singularitate rationis, per
quam discretio fit unius ab alio, imposita sunt. Ubi vero omnia sunt unum, nullum
nomen proprium esse potest. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 74, p. 55).
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NOTAS
418 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n.76, p. 98, linhas 4-8: Nomina quidem per motum
rationis, quae intellectu multo inferior est, ad rerum discretionem imponuntur.
Quoniam autem ratio contradictoria transilire nequit, hinc non est nomen, cui aliud
non opponatur secundum motum rationis. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 76, p. 55-56).
419 Cf. Santinello (1987, p. 40): “La sfera della ragione è, per il Cusano, anche
quella della logica, dei generi e delle specie. Nella loro realtà concettuale essi
fanno tutt’uno con i nomi e sono enti di ragione, usati dalla ragione stessa
allo scopo strumentale di distinguere e unificare il mondo dell’esperienza.
Così impostata la questione, nessun nome appare attribuibile in modo
proprio a Dio; ogni nome gli viene attribuito creaturam respectu, cioè secondo
un significato che è tratto dal mondo dell’esperienza e della relazione di Dio
col mondo stesso”.
420 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XXIV, n. 78, p. 100, linhas 1-9: Est itaque ex
hoc manifestum nomina affirmativa, quae Deo attribuimus, per infinitum diminute
sibi convenire; nam talia secundum aliquid, quod in creaturis reperitur, sibi
attribuuntur. Cum igitur Deo nihil tale particulare, discretum, habens oppositum
sibi nisi diminutissime convenire possit, hinc affirmationes sunt incompactae, ut
ait Dionysius. Nam si dicis ipsum veritatem, occurrit falsitas; si dicis virtutem,
occurrit vitium; si dicis substantiam, occurrit accidens; et ita de reliquis. (A douta
ignorância. L. I, cap. XXIV, n. 78, p. 56-57).
421 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 79, p. 100-102: Et propterea nomina affirmativa, si
sibi conveniunt, non nisi in respectu ad creaturas conveniunt; non quod creaturae 367
sint causa, quod sibi conveniant, quoniam maximum a creaturis nihil habere potest,
sed sibi ex infinita potentia ad creaturas conveniunt. Nam ab aeterno Deus potuit
creare, quia, nisi potuisset,summa potentia non fuisset. Igitur hoc nomen ‘creator’,
quamvis sibi in respectu ad creaturas conveniat, tamen etiam convenit, antequam
creatura esset, quoniam ab aeterno creare potuit. Ita de iustitia et ceteris omnibus
nominibus affirmativis, quae nos translative a creaturis Deo attribuimus propter
quandam perfectionem per ipsa nomina significatam; licet illa omnia nomina ab
aeterno, ante etiam quam nos sibi illa attribuimus, fuissent veraciter in summa sua
perfectione et infinito nomine complicata, sicut et res omnes, quae per ipsa talia
nomina significantur et a quibus per nos in Deum transferuntur. (Ibid., L. I, cap.
XXIV, n. 79, p. 57).
422 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 80, p. 102: Et intantum hoc est verum de affirmativis
omnibus, quod etiam nomen Trinitatis et personarum, scilicet Patris et Filii et
Spiritus sancti, in habitudine creaturarum sibi imponuntur. Nam cum Deusex eo,
quod unitas est, sit gignens et Pater, ex eo, quod est aequalitas unitatis, genitus
sive Filius, ex eo, quod utriusque connexio, Spiritus sanctus: tunc clarum est Filium
nominari Filium ex eo, quod est unitatis sive entitatis aut essendi aequalitas. Unde
patet ex hoc, quod Deus ab aeterno potuit res creare, licet eas etiam non creasset,
respectu ipsarum rerum Filius dicitur. Ex hoc enim est Filius, quod est aequalitas
essendi res, ultra quam vel infra res esse non possent; ita videlicet quod est Filius
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NOTAS
ex eo, quod est aequalitas entitatis rerum, quas Deus facere poterat, licet eas etiam
facturus non esset; quas si facere non posset, nec Deus Pater vel Filius vel Spiritus
sanctus, immo nec Deus esset. Quare, si subtilius consideras, Patrem Filium gignere,
hoc fuit omnia in Verbo creare. Et ob hoc Augustinus Verbum etiam artem ac ideam
in respectu creaturarum affirmat. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 80, p. 58).
423 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 81, p. 102, linhas 3-7: Nam creatura ex eo, quod
Deus Pater est, esse incipit; ex eo, quod Filius, perficitur; ex eo, quod Spiritus sanctus
est, universali rerum ordini concordat. Et haec sunt in unaquaque re Trinitatis
vestigia. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 81, p. 58).
424 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 75, p. 96, linhas 5-11: Unde secundum ipsum
proprium nomen – quod ineffabile per nos dicitur et tetragrammaton sive quattuor
litterarum est et ex eo proprium, quia non convenit Deo secundum aliquam
habitudinem ad creaturas, sed secundum essentiam propriam – interpretari debet
‘unus et omnia’ sive ‘omnia uniter’, quod melius est. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n.
75, p. 55). Existem divergências quanto à tradução dessas linhas. Vejamos
algumas traduções: “Gema seinen eigentlichen Namen – [...] – müte man
ihn deuten als ‘Einer und Alles’ oder ‘Alles in Eins’, was noch besser ist’ (I,
cap. XXIV, n. 75, p. 97); “Hence, as regards His own name, […]: He ought to
be called ‘One-and-all,’ or better, ‘All-in-one’.” (On Learned Ignorance I,
cap. XXIV, n. 75, p. 80); “Il nome che gli è proprio, [...], tale nome deve essere
tradotto con l’espressione: ‘uno e tutte le cose, meglio, ‘tutte le cose in modo
uno’.” (La dotta ignoranza, I, cap. XXIV, n. 75, p. 116); “En consecuencia,
en consonancia con el mismo nombre proprio –[…]–, tal nombre ha de ser 368
interpretado ‘uno y todo’ o bien ‘todo unitariamente’, lo cual es mejor”
(Acerca de la docta ignorancia, Libro I, cap. XXIV, n. 75, p. 111).
425 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XXIV, n. 75, p. 96-98, linhas 11-17: Et
ita nos repperimus superius unitatem maximam, quae idem est quod omnia uniter;
immo adhuc videtur nomen propinquius et convenientius ‘unitas’ quam ‘omnia
uniter’. Et propter hoc dicit propheta, quomodo ‘in illa die erit Deus unus et nomen
eius unum.’ Et alibi: Audi Israel (id est Deum per intellectum videns), quoniam Deus
tuus unus est. (A douta ignorância. L. I, cap. XXIV, n. 75, p. 55).
426 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 76: Non est autem unitas nomen Dei eo modo,
quo nos aut nominamus aut intelligimus unitatem, quoniam, sicut supergreditur
Deus omnem intellectum, ita a fortiori omne nomen. Nomina quidem per motum
rationis, qui intellectu multo inferior est, ad rerum discretionem imponuntur.
Quoniam autem ratio contradictoria transilire nequit, hinc non est nomen, cui aliud
non opponatur secundum motum rationis; quare unitati pluralitas aut multitudo
secundum rationis motum opponitur. Hinc unitas Deo non convenit, sed unitas, cui
non opponitur aut alteritas aut pluralitas aut multitudo. Hoc est nomen maximum
omnia in sua simplicitate unitatis complicans, istud est nomen ineffabile et super
omnem intellectum. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 76, p. 55-56).
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NOTAS
427 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 77, p. 98, linhas 1-7: Quis enim intelligere possit
unitatem infinitam per infinitum omnem oppositionem antecedentem, ubi omnia
absque compositione sunt in simplicitate unitatis complicata, ubi non est aliud
vel diversum, ubi homo non differt a leone et caelum non differt a terra, et tamen
verissime ibi sunt ipsum, non secundum finitatem suam, sed complicite ipsamet
unitas maxima? (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 77, p. 56).
428 Ibid., w. L. I, cap. XXIV, n. 77, p. 98-100, linhas 7-15: Unde, si quis posset
intelligere aut nominare talem unitatem, quae cum sit unitas, est omnia, et cum
sit minimum, est maximum, ille nomen Dei attingeret. Sed cum nomen Dei sit Deus,
tunc eius nomen non est cognitum nisi per intellectum, qui est ipsum maximum
et nomen maximum. Quare in docta ignorantia attingimus: Licet ‘unitas’ videatur
propinquius nomen maximi, tamen adhuc a vero nomine maximi, quod est ipsum
maximum, distat per infinitum. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 77, p. 56). Existem
divergências quanto à tradução dessas linhas. Vejamos algumas traduções:
“Da jedoch der Name Gottes Gott ist, so ist sein Name nur durch die Vernunft
erkannt, die das Größte selbst und der größte Name selbst ist.” (I, cap. XXIV,
n. 77, p. 99); “But since the Name-of-God is God, His Name is known only by
[that] Understanding which is the Maximum and is the Maximum Name.”
(On Learned Ignorance I, cap. XXIV, n. 77, p. 41); “Ma poiché il nome di
Dio è Dio, il suo nome è inteso da quell’intelletto che è il massimo stesso ed
è nome massimo” (La dotta ignoranza, I, cap. XXIV, n. 77, p. 117); “Pero
como el nombre de Dios, es Dios, quien es lo máximo mismo y el nombre
máximo, por ello su nombre no es conocido sino por el intelecto”. (Acerca 369
de la docta ignorancia, Libro I, cap. XXIV, n. 77, p. 113). Cf. (GONZÁLEZ
RÍOS, 2010, p. 184).
429 Ibid., w. L. I, cap. XXVI, n. 86, p. 108-110, linhas 16-18: Et ita theologia
negationis adeo necessaria est quoad aliam affirmationis, ut sine illa deus non
coleretur ut deus infinitus, sed potius ut creatura. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 86,
p. 62). Nicolau reconhece que, quanto à adoração a Deus, existiria uma
diferença entre os homens: enquanto os Judeus e os Sissênios veneravam a
Deus “na sua unidade simplicíssima, como complicação de todas as coisas”,
os antigos pagãos o veneravam “nas coisas em que viam uma explicação
da divindade”. Portanto, todos adoravam, de um modo ou de outro, o
mesmo “Deus único e infinito”. Assim, em um primeiro momento, Nicolau
considera que o problema da idolatria era um problema do povo simples e
do vulgo, daqueles “que não usaram a explicação como uma imagem, mas
como verdade”. A maioria dos sábios, porém, acreditavam na unidade de
Deus. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 84, p. 61). Porém, Nicolau também reconhece
que alguns pagãos “adoraram deus nas criaturas, ainda que fundassem a
idolatria em argumentos racionais” (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 85, p. 61).
430 Ibid., w. L. I, cap. XXVI, n. 86, p. 108, linhas 3-16: Quoniam autem cultura
Dei, qui adorandus est in spiritu et veritate, necessario se fundat in positivis
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Deum affirmantibus, hinc omnis religio in sua cultura necessario per theologiam
affirmativam ascendit, Deum ut unum ac trinum, ut sapientissimum, piissimum,
lucem inaccessibilem, vitam, veritatem et ita de reliquis adorando, semper culturam
per fidem, quam per doctam ignorantiam verius attingit, dirigendo; credendo
scilicet hunc, quem adorat ut unum, esse uniter omnia; et quem ut inaccessibilem
lucem colit, non quidem esse lucem, ut est haec corporalis, cui tenebra opponitur, sed
simplicissimam et infinitam, in qua tenebrae sunt lux infinita; et quod ipsa infinita
lux semper lucet in tenebris nostrae ignorantiae, sed tenebrae eam comprehendere
nequeunt. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 86, p. 61)
431 Ibid., w. L. I, cap. XXVI, n. 88, p. 110-112, linhas 1-15: Nam quamvis
aeternitas sit infinitas, ita quod aeternitas non sit maior causa patris quam
infinitas, tamen secundum considerationis modum aeternitas patri attribuitur
et non filio nec spiritui sancto, infinitas vero non plus uni personae quam alteri;
quoniam ipsa infinitas secundum considerationem unitatis pater est, secundum
considerationem aequalitatis unitatis filius, secundum considerationem conexionis
spiritus sanctus, secundum simplicem considerationem infinitatis nec pater nec
filius nec spiritus sanctus; licet ipsa infinitas, sicut et aeternitas, quaelibet trium
personarum sit, et converso quaelibet persona infinitas et aeternitas: non tamen
secundum considerationem – ut praefertur -, quoniam secundum considerationem
infinitas deus nec unum est nec plura. (Ibid., L. I, cap. XXIV, n. 88, p. 63).
432 De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. VI, n. 24, p. 30, linhas 1-3: Acute
igitur, quantum vales, haec concipe. Nam in ante expositis ‘De docta ignorantia’
memor sum de deo me intellectualiter saepe locutum per contradictorium 370
copulationem in unitate simplici.
433 Ibid., h. III, Pars prima, cap. V, n. 17 – Cap. VIII, n. 36, p. 21-42.
434 Ibid., h. III, Pars prima, cap. V, n. 17, p. 21-23: Amplius te attentiorem faciat
dicendorum utilitas; magna enim atque occulta in lucem ducere temptabo. Primo illa
divina unitas, si numerus rerum fingitur exemplar, omnia praevenire complicareque
videtur. Ipsa enim, omnem praeveniens multitudinem, omnem etiam antevenit
diversitatem, alietatem, oppositionem, inaequalitatem, divisionem atque alia omnia,
quae multitudinem concomitantur. Unitas quidem nec binarius nec ternarius est
atque ita deinceps, quamvis omnia ea sit, quae sunt ternarius, quaternarius et reliqui
numeri. Si species rerum ut numeri distinguuntur, ipsa absoluta unitas nullius
speciei est, nullius nominis, nulliusque figurae, quamvis omnia sit in omnibus.
Ipsa est unitas omnis pluralitatis, unitas quidem pluralitatis generum, specierum,
substantiarum, accidentium universarumque creaturarum, mensura una omnium
mensurarum, aequalitas una omnium aequalium et inaequalium, conexio omnium
unitorum et segregatorum, quemadmodum unitas omnem tam parem quam
imparem numeros simplicitate sua complicat, explicat atque conectit.
435 Ibid., h. III, Pars prima, cap. V, n. 18, p. 24, linhas 10-18: Qui enim absolutam
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et ipsam tantum concipit unitatem, ineffabilem eam videt. Cuius enim respectu
potius unum quam aliud sortiretur nomen? Si cuncta alia separasti et ipsam
solam inspicis, si aliud numquam aut fuisse aut esse aut fieri posse intelligis, si
pluralitatem omnem abicis atque respectum et ipsam simplicissimam tantum
unitatem subintras, ita ut eam non potius simplicem quam non simplicem, non
potius unam quam non unam comprobes, arcana omnia penetrasti. Nulla ibi
dubietas, nullum impedimentum.
436 Ibid., h. III, Pars prima, cap. V, n. 20, p. 25-26, linhas 1-10; n. 21, p. 26-
28: Adverte igitur, Iuliane pater, quam clara atque brevis est theologia, sermone
inexplicabilis, quoniam ad omnem de deo formabilem quaestionem primum posse
respondere vides quaestionem omnem de ipso ineptam. Omnis enim quaestio de
quaesito oppositorum alterum tantum verificari posse admittit, aut quid aliud de
illo quaesito quam de aliis affirmandum negandumve exsistat. Haec quidem de
absoluta unitate credere absurdissimum est, de qua nec alterum oppositorum aut
potius unum quodcumque quam aliud affirmantur. Si vero affirmative quaesito
satisfacere optas, absolutum praesuppositum repetas, [...]. // Quoniam autem omnis
affirmatio negationi adversari creditur, haec iam dicta responsa praecisissima esse
non posse ex hoc advertis quod primum per infinitum omnem praeit oppositionem,
cui nihil convenire potest non ipsum. Non est igitur coniectura de ipso verissima,
quae admittit affirmationem, cui opponitur negatio, aut quae negationem quasi
veriorem affirmationi praefert. Quamvis verius videatur deum nihil omnium, quae
aut concipi aut dici possunt, exsistere quam aliquid eorum, non tamen praecisionem
attingit negatio, cui obviat affirmatio. Absolutior igitur veritatis exstitit conceptus, 371
qui ambo abicit opposita, disiunctive simul et copulative. Non poterit enim infinitius
responderi ‘an deus sit’ quam quod ipse nec est nec non est, atque quod ipse nec
est et non est. Haec est una ad omnem quaestionem altior, simplicior, absolutior
conformiorque responsio ad primam ipsam simplicissimam ineffabilem entitatem.
Haec quidem subtilissima coniecturalis responsio est ad omnia quaesita aequa.
Coniecturalis autem est, cum praecisissima ineffabilis inattingibilisque tam ratione
maneat quam intellectu.”
437 Ibid., h. III, Pars prima, cap. VI, n. 24, p. 30-31, linhas 1-9: Acute igitur,
quantum vales, haec concipe. Nam in ante expositis De docta ignorantia memor
sum de deo me intellectualiter saepe locutum per contradictoriorum copulationem
in unitate simplici. Iam autem in proxime praemissis divinaliter intentum explicavi.
Improportionabiliter simplicior est negatio oppositorum disiunctive ac copulative
quam eorum copulatio. Aliter autem divine secundum primae absolutae unitatis
conceptum de deo, aliter secundum hanc intellectualem unitatem dicendum
multoque adhuc bassius secundum rationem.
438 Ibid., h. III, Pars prima, cap. VI, n. 25, p. 32, linhas 1-5; 8-11: Quod si
ad intellectualem veritatem inquisitionem dirigere instituis, necesse est, ut
intellectualibus fruaris terminis, qui nullum incompatibile habent oppositum,
cum incompatibilitas de natura illius intellectualis unitatis esse nequeat. Unde
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usuales termini, qui rationis sunt entia, intelligentiam non attingunt. [...]. Sicut
enim intellectus radix est rationis, ita quidem termini intellectuales radices sunt
rationalium. Unde verbum intellectuale ratio est, in quo ut in imagine relucet. Radix
igitur vocalium terminorum sermo est intellectualis.
439 Ibid., h. III, Pars prima, cap. VI, n. 22, p. 28-29, linhas 6-12; n. 23, p. 30, linhas
6-9: Compositio vero ab uno et altero, hoc est ex oppositis, esse ratio dicit, nec tamen
haec unitas aliter ex oppositis est quam simplicem convenit esse radicem. Non igitur
ipsam opposita praeveniunt, ut sit ex ipsis quae praecesserunt, sed simul cum ipsis
exoritur, sicut intellectualiter numerum componi necesse est. Copulantur igitur
in eius simplicitate radicali opposita ipsa indivise atque irresolubiliter. Denaria
enim unitas absque radice est. // Unde intellectualis illa unitas radix quaedam
complicativa oppositorum in eius explicatione incompatibilium exsistit. Ea enim
opposita, quae in explicata eius rationalis unitatis quadratura incompatibilia sunt,
in ipsa complicantur.
440 Ibid., h. III, Pars prima, cap. VIII, n. 33, p. 38-39: Adverte itaque, Iuliane
pater, quomodo ab hac ipsa sensibilium regione omnis alienata est negatio atque
non esse; a regione vero supremae unitatis omnis affirmatio procul est eliminata; in
regionibus unitatum mediarum ambo permittuntur, complicative in ipsa secunda,
explicative in tertia. In hac infima unitate verba tantum praesentis sunttemporis,
in prima suprema nullius sunt temporis, in secunda vero complicative praesentis et
non praesentis, in tertia autem explicative praesentis vel non praesentis.
441 Ibid., h. III, Pars prima, cap. VIII, n. 34, p. 39-40, linhas 1-2; 8-10: Si igitur 372
terminos unitatibus, de quibus tibi inquirendi propositum est, adaptaveris, veriores
coniecturas efficies. E um pouco mais adiante no mesmo número pode-se ler: Sic
etiam si de unitate una quase de alia loqueris, adaptare ad hoc dicendi modum [...].
442 Cf. SANTINELLO (1987, p. 55): “Appare molto arduo il passaggio dal De
docta ignorantia al De coniecturis, la seconda opera filosofica, cui il Cusano
spesso rimanda nel corso della prima e che la tradizione dice composta nello
stesso anno 1440” (p. 55). Santinello não trata aqui da questão que estamos
discutindo, mas não deixa de ser instrutivo verificar as diversas hipóteses
ou tentativas que ele propõe para explicar as diferenças entre as duas obras
cusanas. Sobre a datação do De coniecturis, Santinello refere-se em nota (p.
55, nota 27): Koch sustenta que essa obra ainda não estava terminada em 20
de maio de 1442; Haubst coloca a data final em 1443 ou 1444 e, finalmente,
Wilpert estabelece a última redação da obra em 1445. Cf. Para González Ríos
o De coniecturis ofereceria para a doutrina cusana uma contribuição decisiva
e um desafio: “Pues allí, en el contexto de la exposición de la metafísica
del conocimiento humano a través de la mente, presenta la tentativa de
concebir al Verbo divino más allá de la coincidencia de los opuestos, i.e. como el
principio de la relación de los opuestos en lo absoluto” (2010, p. 79).
443 Cf. “La negazione della disgiunzione e della copulazione degli opposti
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potrebbe formularsi così: non (o è o non-è), non (è e non-è); [...]. Così sembra
superata la teologia della coincidenza degli opposti, che appariva in D.ign. I
c. 6§ 16, ove si ammetteva come momento supremo la coincidenza di essere
e non-essere, di massimo e minimo, e via dicendo” (Nota de Santinello a sua
tradução do De docta ignorantia. In: NICOLÒ CUSANO. La dotta ignoranza. In:
______. La dotta ignoranza; Le congetture. A cura di Giovanni Santinello.
Rusconi:Milano, 1988: nº 10, p. 259).
444 Ainda segundo André (1997, p. 614-615), esse tipo de discurso “não
corresponde já à nossa concepção de discurso, mas mais precisamente aos
seus últimos limites, ou seja, ao silêncio, que se situa ao nível da linguagem
divina”. Além disso, o autor sugere que Nicolau admitiria a possibilidade
desse discurso, “quando admite a possibilidade de uma negação dos opostos
tanto disjuntiva como copulativamente”. Essa admissão se daria tanto no De
coniecturia quanto o Idiota de sapientia, II. Por sua vez, González Ríos (2010, p.
90) reconhece a mesma possibilidade em um outro texto do De deo absconditus.
445 De visione dei. h. VI, cap. XVII, n. 75, p. 61, linhas 7-14: Unde distinctio
illa, quae est intra murum coincidentiae, ubi distinctum et indistinctum coincidunt,
praevenit omnem alteritatem et diversitatem, quae intelligi potest. Claudit enim
murus potentiam omnis intellectus, licet oculus ultra in paradisum respiciat, id
autem, quod videt, nec dicere nec intelligere potest. Est enim amor secretus suus
et thesaurus absconditus, qui inventus manet absconditus. Reperitur enim intra
murum coincidentiae absconditi et manifesti. (A visão de Deus, cap. XVII, p. 200). 373
446 Cf. GONZÁLEZ RÍOS (2010, p. 92): “De aquí que, la posibilidad de un lenguaje
divinal [divine loqui] en el que se supere tanto el discurso de la razón como
aquél que procede de su unidad (el intelecto), esto es, un lenguaje en el que
se niegue la oposición de los opuestos y la coincidencia de los opuestos, es,
como lo ha señalado ya Senger, sólo reconocible pero no practicable, puesto
que la estructura del intelecto y de los lenguajes racionales que encuentran
su principio en él no están a su disposición”.
447 De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. VIII, n. 35, p. 40-41, linhas 3-12:
Via igitur rationis principium omnium est unum et trinum, non ut unitas et
trinitas sunt plura, cum pluralitatis principium sit unitas, sed ut sunt unitas, quae
trinitas, intelligentia autem, vocabulorum rationalium ineptitudinem advertens,
hoc abicit terminos, deum supra eorum significata quase ipsorum complicans
concipit principium et, quia in ipso dinivitatis radio videt suum conceptum deficere,
affirmat ipsam super omnem complicationem et explicationem intelligit debere
ipsumque uti est concipi non posse. Ita pariformiter de intelligentia agimus, dum de
ipsa ratiocinando disputamus.
448 No Idiota. De mente da consideração sobre em que sentido “mente”
deriva de “medir” passa-se a uma consideração mais geral sobre a “força
da palavra”. Essa “força”, segundo o Idiota que se encontraria no próprio
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NOTAS
homem e complicaria nocionalmente os exemplares de tudo, pode ser
chamada de “mente”, porém esse não é o seu nome preciso, pois a razão
humana não conhecendo a quididade das coisas também não alcançaria o
seu nome preciso. Vejamos o diálogo inicial entre o filósofo e o Idiota: Cf.
Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 58, p. 92-93, linhas 6-13: PHILOSOPHUS: Aiebas
mentem a mensurando dici. Hanc partem neminem legi tenuisse inter varias verbi
derivationes. Primum oro, ut causam dicti aperias. A essa interrogação o Idiota
responde inicialmente da seguinte maneira: IDIOTA: Si de vi vocabuli diligentius
scrutandum est, arbitror vim illam, quae in nobis est, omnium rerum exemplaria
notionaliter complicantem, quam mentem appello, nequaquam proprie nominari.
Quemadmodum enim ratio humana quiditatem operum dei non attingit, sic nec
vocabulum. Já no De vanatione sapientiae é o próprio título do capítulo 33
a indicar a temática: De vi vocabuli (De venatione sapientiae. h. XII, cap.
XXXIII, n. 97-100, p. 93-95).
449 Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 65, p. 100-101, linhas 4-10: IDIOTA:
Quicumque igitur putat nihil in intellectu cadere posse, quod non cadat in ratione,
ille etiam putat nihil posse esse in intellectu, quod prius non fuit in sensu. Et hic
necessario dicere habet rem nihil esse nisi ut sub vocabulo cadit, et huius studium
est in omni inquisitione quid nominis profundare. Et haec inquisitio grata est homini,
quia motu rationis discurrit. Cf. também: De venatione sapientiae. h. XII, cap.
XXXIII, n. 98, p. 94, linhas 6-9: Credo haec in humana scientia sic se habere, quam
primo et excellenter primus Adam seu homo dictus habuisse creditur. Et ideo scientia,
quae in vi vocabuli solidatur, gratissima est homini quasi suae naturae conformis. 374
450 Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 66, p. 102-103, linhas 12-18: IDIOTA: Eo
enim modo, ut sub vocabulo cadit, de rebus fit logica et rationalis consideratio, quare
illam logice inquirunt, profundant et laudant. Sed ibi non quiescunt, quia ratio
seu logica circa imagines formarum tantum versatur, sed res ultra vim vocabuli
theologice intueri conantur et ad exemplaria et ideas se convertunt. Arbitror non
posse plures inquisitionum modos dari. Si tu, qui es philosophus, alias legisti, scire
potes. Ego sic conicio. Cf. também: De venatione sapientiae. h. XII, cap.
XXXIII, n. 100, p. 95, linhas 6-13: Sed haec nostra inquisitio ineffabilis sapientiae,
quae praecedit impositorem vocabulorum et omne nominabile, potius in silentio et
visu quam in loquacitate et auditu reperitur. Praesupponit vocabula illa humana,
quibus utitur, non esse praecisa nec angelica nec divina; sed ipsa sumit, cum aliter
non posset conceptum exprimere, praesupposito tamen, quod illa non velit aliquod
tale, propter quod imposita sunt, significare, sed talium causam, verbumque nullius
temporis esse, cum aeternitatem per ipsa velit figurare.
451 Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 67, p. 103, linhas 1-3: IDIOTA: Hae
omnes et quotquot cogitari possent modorum differentiae facillime resolvuntur et
concordantur, quando mens se ad infinitatem elevat.
452 Ibid., h. V, cap. II, n. 58, p. 93, linhas 16-18: IDIOTA: Ita video, quod, cum
proprietas vocabulorum recipiat magis et minus, vocabulum praecisum ignorari. Cf.
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NOTAS
também: De venatione sapientiae. h. XII, cap. XXXIII, n. 97, p. 93, linhas 5-7:
Sed quia vocabula sunt per primum hominem rebus imposita ex ratione, quam homo
concepit, non sunt vocabula praecisa, quin res possit praecisiori vocabulo nominari.
453 Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 59, p. 93-94, linhas 5-9: IDIOTA: Volo, ut me
profundius intelligas. Nam etsi fatear omne vocabulum eo ipso unitum, quo forma
materiae advenit, et verum sit formam adducere vocabulum, ut sic vocabula sint
non ex impositione,sed ab aeterno, et impositio sit libera, tamen non arbitror aliud
quam congruum nomen imponi, licet illud non sit praecisum.
454 Ibid., h. V, cap. II, n. 61, p. 95, linhas 10-12: IDIOTA: Omnis ergo ars finita ab arte
infinita. Sicque necesse erit infinitam artem omnium artium exemplar esse, principium,
medium, finem, metrum, mensuram, veritatem, praecisionem et perfectionem.
455 Ibid., h. V, cap. II, n. 62, p. 96, linhas 13-14: IDIOTA: Unde ars mea est magis
perfectoria quam imitatoria figurarum creatarum et in hoc infinitae arti similior.
456 Ibid., h. V, cap. II, n. 63, p. 97-98, linhas 5-15: IDIOTA: Unde materiam, puta
lignum, per instrumentorum meorum, quae applico, varium motum dolo et cavo,
quousque in eo proportio debita oriatur, in qua forma coclearitatis convenienter
resplendeat. Sic vides formam coclearitatis simplicem et insensibilem in figurali
proportione huius ligni quasi in imagine eius resplendere. Unde veritas et praecisio
coclearitatis, quae est immultiplicabilis et incommunicabilis, nequaquam potest per
quaecumque etiam instrumenta et quemcumque hominem perfecte sensibilis fieri,
et in omnibus coclearibus non nisi ipsa simplicissima forma varie relucet, magis in
uno et minus in alio et in nullo praecise. 375
457 Ibid., h. V, cap. II, n. 64, p. 98-100: IDIOTA: Et quamvis lignum recipiat nomen
ab adventu formae, ut orta proportione, in qua coclearitas resplendet, ‘coclear’
nominetur, ut sic nomen sit formae unitum, tamen impositio nominis fit ad
beneplacitum, cum aliud imponi posset. Sic etsi ad beneplacitum, tamen non aliud
et penitus diversum a naturali nomine formae unito; sed vocabulum naturale post
formae adventum in omnibus variis nominibus per quascumque nationes varie
impositis relucet. Impositio igitur vocabuli fit motu rationis. Nam motus rationis
est circa res, quae sub sensu cadunt, quarum discretionem, concordantiam et
differentiam ratio facit, ut nihil sit in ratione, quod prius non fuit in sensu. Sic igitur
vocabula imponit et movetur ratio ad dandum hoc nomen uni et aliud alteri rei.
Verum cum non reperiatur forma in sua veritate in his, circa quae ratio versatur,
hinc ratio in coniectura et opinione occumbit.
458 Ibid., h. V, cap. II, n. 67, p. 103-104: IDIOTA: Hae omnes et quotquot cogitari
possent modorum differentiae facillime resolvuntur et concordantur, quando mens
se ad infinitatem elevat. Nam sicut orator hic praesens tibi latius ex his, quae a me
habet, explanabit, tunc infinita forma est solum una et simplicissima, quae in omnibus
rebus resplendet tamquam omnium et singulorum formabilium adaequatissimum
exemplar. Unde verissimum erit non esse multa separata exemplaria ac multas
rerum ideas. Quam quidem infinitam formam nulla ratio attingere potest. Hinc per
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NOTAS
omnia vocabula rationis motu imposita ineffabilis non comprehenditur. Unde res,
ut sub vocabulo cadit, imago est ineffabilis exempli sui proprii et adaequati. Cf.
DUCLOW (1974, p. 62-63): “With a refined sense of paradox, Cusanus here sets
the dialectic of expression and ineffability within its most comprehensive
scope. As in the Compendium, language becomes the paradigmatic symbol
for creation, and the quest for the one precise name turns towards the
transcendence of the verbum Dei, so that ‘the word of God is the precision
of all namable names’. The ineffable word which is the infinite effability
of all that can be said, the ineffable name which is the infinite namability
of all names: here the absolute presupposition of language coincides with
the unconditional transcendence of the verbum Dei”. Cf. também: ANDRÉ
(2006, p. 13): no De mente “[…], a arte de traduzir em palavras o pensamento,
ou seja, a palavra interior que, já de si, é uma tradução do nome preciso e
indizível, é comparada à atividade artesanal do ‘Idiota’ que procura plasmar
materialmente nos pedaços de madeira que trabalha a forma da colher, a
coclearitas, que permanece oculta e concentrada na sua mente; [...]. Ora a
relação que existe entre as colheres concretas e a coclearitas é a mesma que
existe entre o nome natural e interior, a palavra precisa de qualquer coisa,
e a palavra com que as nossas línguas humanas e finitas a designam. Mas,
por outro lado, esse nome natural é já uma explicatio da força do nome uno
e inefável de que todos os nomes são expressão”. Cf. ainda: GONZÁLES RÍOS
(2010, p. 120-131).
459 Idiota. De mente. h. V, cap. II, n. 68, p. 104, linhas 1-6: IDIOTA: Unum est 376
igitur verbum ineffabile, quod est praecisum nomen omnium rerum, ut motu rationis
sub vocabulo cadunt. Quod quidem ineffabile nomen in omnibus nominibus suo
modo relucet, quia infinita nominabilitas omnium nominum et infinita vocabilitas
omnium voce expressibilium, ut sic omne nomen sit imago praecisi nominis.
460 De docta ignorantia. w. L. I, cap. II, n. 8, p. 12, linhas 1-4: Oportet autem
attingere sensum volentem potius supra verborum vim intellectum efferre quam
proprietatibus vocabulorum insistere, quae tantis intellectualibus mysteriis proprie
adaptari non possunt. (A douta ignorância. L. I, cap. II, n. 8, p. 6).
461 Ibid., w. L. I, Cap. IV, n. 12, p. 18, linhas 18-29: Hoc autem omnem nostrum
intellectum transcendit, qui nequit contradictoria in suo principio combinare
via rationis, quoniam per ea, quae nobis a natura manifesta fiunt, ambulamus;
quae longe ab hac infinita virtute cadens ipsa contradictoria per infinitum
distantia connectere simul nequit. Supra omnem igitur rationis discursum
incomprehensibiliter absolutam maximitatem videmus infinitam esse, cui nihil
opponitur, cum qua minimum coincidit. Maximum autem et minimum, ut in hoc
libello sumuntur, transcendentes absolute significationis termini existunt, ut
supra omnem contractionem ad quantitatem molis aut virtutis in sua simplicitate
absoluta omnia complectantur. (Ibid., L. I, cap. IV, n. 12, p. 10).
462 Ibid., w. L. I, cap. XI, n. 30, p. 40, linhas 4-7: Consensere omnes sapientissimi
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NOTAS
nostri et divinissimi doctores visibilia veraciter invisibilium imagines esse atque
creatorem ita cognoscibiliter a creaturis videri posse quasi in speculo et in aenigmate.
(Ibid., L. I, cap. XI, n.30, p. 22). O fundamento bíblico dessa concepção será
tanto a Carta de Paulo aos Romanos quanto a Carta aos Coríntios: Invisibilia
enim ipius a criatura mundi per ea, quae facta sunt, intellecta conspiciuntur ,
sempiterna eius et virtus et divinitas, ut sint inexcusabiles (Rm. 1, 20); “Videmus
enim nunc per speculum in aenigmate” (1Cor. 13, 12). Nas palavras finais do
De venatione sapientiae (h.XII, cap. XXXIX, p. 113, linhas 1-7), Nicolau louva
aqueles que souberam investigar as coisas invisíveis por meio das visíveis:
Laudant non immerito cuncti magnum Platonem, qui de sole ad sapientiam per
similitudinem ascendit. Ita et magnus Dionysius, qui de igne ad deum et de sole ad
creatorem per proprietatum similitudines quas enarrat ascendit. Ita et Gregorius
Theologus in Sermonibus theologicis contra Eunomianos faciendum suadet, quia in
speculo et aenigmate in hoc mundo, ut divinus Paulus refert, ascendi oportet, ubi
partim scimus et partim prophetamus.
463 De docta ignorantia. w. L. I, cap. XII, n.33, p. 46, linhas 17-18: [...] nobis
in aenigmate laborantibus [...] (A douta ignorância. L. I, cap. XII, n.33, p. 26).
Cf. também: Epistula ad Nicolaum Bononiensem. cp. n. 48: Primo autem, fili
mi, advertas nos in hoc mundo ambulare per similitudines et aenigmata, quoniam
spiritus veritatis non est de hoc mundo neque per ipsum capi potest, nisi parabolice et
per symbola nobis nota ad incognitum rapiamur. Cf. ainda: De docta ignorantia.
w. L. III, cap. X, n.241, p. 70, linhas 4-6: [...] et cum ultimo desiderio non aliud
desideret quam ipsam veritatem non in aenigmate aut signis sed certitudinaliter 377
facientus apprehendere, [...]. (A douta ignorância. L. III, cap. X, n.241, p. 169).
464 Entre as obras posteriores ao De docta ignorantia e anteriores ao De beryllo,
poderíamos destacar o De filiatione dei no qual a ideia de que o conhecimento
da verdade em si (filiatio ou theosis) só seria possível se fôssemos liberados
“da contração enigmática do mundo sensível”: [...], dum de hoc mundo
absoluti fuerimus, ab his etiam obumbrantibus modis relevatus, sic scilicet ut
felicitatem suam intellectus noster, ab his modis subtrahentibus liberatus, sua
intellectuali luce divinam vitam nanciscatur, in qua, licet absque sensibilis mundi
contractis aenigmatibus, ad intuitionem veritatis elevetur (De filiatione dei. h.
IV, Opuscula I, cap. I, n. 54, p. 41, linhas 11-16). Recordamos também que no
Apologia doctae ignorantiae Nicolau se defende contra a acusação de Iohannes
Wenck de que o texto da Carta aos Coríntios (13, 12) negaria o princípio da
douta ignorância, a compreensão incompreensível do incompreensível, pois
ela afirma justamente que conhecemos em espelho e em enigma (Apologia
doctae ignorantiae. s. n. 14-16, p. 219-221). O substantivo “aenigma,
aenigmatis” e suas formas declinadas aparecerão em diversas obras cusanas.
Também encontraremos o adjetivo “aenigmaticus, a, um” e, uma vez o verbo
“aenigmatizo, are, avi, atum” em De possest. Das 153 vezes que esses termos
aparecerão nas obras cusanas vamos encontrá-los, em sua maior parte, no
De beryllo (34 vezes), no De possest (32 vezes), no De non-aliud (9 vezes), De
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aequalitate (3 vezes) e nos Sermões (43 vezes) (Cf. ). Portanto, se excluirmos os Sermões,
então concluiremos que, apesar de já está presente nas obras anteriores ao
De beryllo, essa ideia encontrará o seu pleno desenvolvimento no De beryllo e
será imprescindível para a interpretação do nome enigmático possest.
465 De beryllo. h. XI1, n. 1, p. 3 linhas 2-5: Qui legerit ea, quae in variis scripsi
libellis, videbit me in oppositorum coincidentia crebrius versatum quodque nisus sum
frequenter iuxta intellectualem visionem, quae excedit rationis vigorem, concludere.
466 Ibid., h. XI1, n. 32, p. 35-36 linhas 1-11: Hi omnes et quotquot vidi scribentes
caruerunt beryllo. Et ideo arbitror, si constanti perseverantia secuti fuissent
magnum Dionysium, clarius vidissent omnium principium atque commentaria
fecissent in ipsum secundum ipsius scribentis intentionem. Sed quando ad
oppositorum coniunctionem perveniunt, textum magistri divini disiunctive
interpretantur. Magnum est posse se stabiliter in coniunctione figere oppositorum.
Nam etsi sciamus ita fieri debere, tamen, quando ad discursum rationis revertimur,
labimur frequenter et visionis certissimae nitimur rationes reddere, quae est supra
omnem rationem, et ideo tunc cadimus de divinis ad humana et instabiles atque
exiles rationes adducimus. Para a identificação dos Hi omnes no texto acima
ver nota da edição crítica (p. 35, nota 32, 1) que identifica como sendo:
Plato, Aristoteles, Isaac Israeli, Avicena, Alberto Magnus. A edição crítica cita
a Epistula ad abbatem Tegernseensem, de 14 de setembro de 1453, na qual
Nicolau de Cusa repreenderia também a Dionísio que, na maior parte
dos seus textos, teria transmitido uma teologia sob a forma de disjunção 378
(in plerisque locis theologiam per disiunctionem), ou seja, que alcançaríamos
a Deus ou afirmativamente ou negativamente. Porém, no De theologia
mystica, ele passaria dessa consideração disjuntiva para a copulação e para
a coincidência, ou seja, para a união simplíssima na qual a negação coincide
com a afirmação e a afirmação com a negação (saltat supra disiunctionem
usque in copulacionem et coincidenciam, seu unionem simplicissimam que est non
lateralis sed directe supra omnem ablacionem et posicionem, ubi ablacio coincidit
cum posicione, et negativo cum affirmacione). Esta seria uma teologia secreta
que nenhum filósofo alcançou nem pode alcançar, caso se mantenha
ligado ao princípio comum de todas as filosofias, segundo o qual dois
contraditórios não podem coincidir (et illa est secretíssima teologia, ad quam
nullus phylosophorum accessit, neque accedere potest stante principio communi
tocius phylosophie, scilicet quod duo contradictoria non coincidant). Para os
textos em latim da Epistula ad abbatem Tegernseensem: VANSTEENBERGHE,
Edmond. Autour de la docte ignorance – une controverse sur la théologie
mystique au XVe siècle. Münster, 1915 (principalmente as páginas 114-115).
467 De beryllo. h. XI1, n. 3, p. 5-6 linhas 1-5: Beryllus lapis est lucidus, albus
et transparens. Cui datur forma concava pariter et convexa, et per ipsum videns
attingit prius invisibile. Intellectualibus oculis si intellectualis beryllus, qui formam
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habeat maximam pariter et minimam, adaptatur, per eius medium attingitur
indivisibile omnium principium.
468 Ibid., h. XI1, n. 7, p. 9-10 linhas 8-13: Unde mensurat suum intellectum per
potentiam operum suorum et ex hoc mensurat divinum intellectum, sicut veritas
mensuratur per imaginem. Et haec est aenigmatica scientia. Habet autem visum
subtilissimum, per quem videt aenigma esse veritatis aenigma, ut sciat hanc esse
veritatem, quae non est figurabilis in aliquo aenigmate.
469 Ibid., h. XI1, n. 7, p. 9 linhas 1-8: Quarto adverte Hermetem Trismegistum
dicere hominem esse secundum deum. Nam sicut deus est creator entium realium
et naturalium formarum, ita homo rationalium entium et formarum artificialium,
quae non sunt nisi sui intellectus similitudines sicut creaturae dei divini intellectus
similitudines. Ideo homo habet intellectum, qui est similitudo divini intellectus
in creando. Hinc creat similitudines similitudinum divini intellectus, sicut sunt
extrinsecae artificiales figurae similitudines intrinsecae naturalis formae.
470 Cf. De coniecturis. h. III, Pars prima, cap. I, n. 5, p. 7, linhas 3-8:
Coniecturas a mente nostra, uti realis mundus a divina infinita ratione, prodire
oportet. Dum enim humana mens, alta dei similitudo, fecunditatem creatricis
naturae, ut potest, participat, ex se ipsa, ut imagine omnipotentis formae, in
realium entium similitudine rationalia exserit. Coniecturalis itaque mundi humana
mens forma exstitit uti realis divina. Anteriormente já citamos esse texto para
mostrar que quanto mais a mente humana se contempla no mundo por ela
explicado mais ela se torna fecunda e se aproxima da razão infinita que é 379
seu fim e seu repouso. Cf. também: Idiota. De mente. h. V, cap. III, n. 72,
p. 108-109 linhas 1-9: Idiota: Scis, quomodo simplicitas divina omnium rerum
est complicativa. Mens est huius complicantis simplicitatis imago. Unde si hanc
divinam simplicitatem infinitam mentem vocitaveris, erit ipsa nostrae mentis
exemplar. Si mentem divinam universitatem veritatis rerum dixeris, nostram dices
universitatem assimilationis rerum, ut sit notionum universitas. Conceptio divinae
mentis est rerum productio; conceptio nostrae mentis est rerum notio. Si mens
divina est absoluta entitas, tunc eius conceptio est entium creatio, et nostrae mentis
conceptio est entium assimilatio.
471 De beryllo. h. XI1, n. 6, p. 8: Tertio notabis dictum Protagorae hominem esse
rerum mensuram. Nam cum sensu mensurat sensibilia, cum intellectu intelligibilia,
et quae sunt supra intelligibilia in excessu attingit. Et hoc facit ex praemissis.
Nam dum scit animam cognoscitivam esse finem cognoscibilium, scit ex potentia
sensitiva sensibilia sic esse debere, sicut sentiri possunt; ita de intelligibilibus, ut
intelligi possunt, excedentia autem ita, ut excedant. Unde in se homo reperit quasi
in ratione mensurante omnia creata. Cf. Idiota. De mente. h. V, cap. IX, n. 116-
125, p. 171-178.
472 De beryllo. h. XI1, n. 5, p. 7 linhas 1-5: Secundo scias, quomodo id, quod non
est verum neque verisimile, non est. Omne autem quod est aliter est in alio quam in
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se. Est enim in se ut in suo vero esse, in alio autem ut in suo esse verisimili, ut calidum
in se est ut in suo vero esse et in calefacto est per similitudinem suae caliditatis.”
473 Cf. De aequalitate. h. X, Opuscula II, Fasciculus I, n. 3, p. 6, linhas 1-
4: “Legisti in Beryllo nostro, quomodo intellectus vult cognosci. Dico nunc hoc
verum a se et aliis; et hoc non est aliud nisi quod se et alia vult cognoscere, cum in
cognoscendo sit vita eius et laetitia.
474 De beryllo. h. XI1, n. 4, p. 6-7: Oportet te primum attendere unum esse
primum principium, et id nominatur secundum Anaxagoram intellectus, a quo
omnia in esse prodeunt, ut se ipsum manifestet. Intellectus enim lucem suae
intelligentiae delectatur ostendere et communicare. Conditor igitur intellectus,
quia se finem facit suorum operum, ut scilicet gloria sua manifestetur, creat
cognoscitivas substantias, quae veritatem ipsius videre possint, et illis se praebet
ipse conditor modo quo capere possunt visibilem. Hoc scire est primum, in quo
complicite omnia dicenda continentur.
475 Cf. Ibid., h. XI1, n. 48-50, p. 54-57: A questão do quid erat esse é posta a
partir da Metafísica de Aristóteles. Aristóteles teria discutido profundamente
sobre ela, mas sem conseguir resolvê-la totalmente: Aristoteles scribit hanc
quaestionem antiquam. Omnes indagatores veritatis semper quaesierunt huius
dubii solutionem et adhuc quaerunt, ut ait. Ipse autem resolvit a solutione illius
dubii omnem scientiam dependere. Scire enim ‘quid erat esse’, hoc est rem ideo
hoc esse, puta domum, quia ‘quod erat esse domui’ hoc est, est attigisse altissimum
scibile. (n. 48, p. 54-55, linhas 4-9). 380
476 Ibid., h. XI1, n. 51, p. 58, linhas 8-19: Et ita dico cum sapiente ‘quod omnium
operum dei’ nulla est ratio, scilicet cur caelum caelum et terra terra et homo homo,
nulla est ratio nisi quia sic voluit qui fecit. Ulterius investigare est fatuum, ut in
simili dicit Aristoteles velle inquirere primi principii ‘quodlibet est vel non est’
demonstrationem. Sed dum attente consideratur omnem creaturam nullam habere
essendi rationem aliunde nisi quia sic creata est, quodque voluntas creatoris sit
ultima essendi ratio sitque ipse deus creator simplex intellectus, qui per se creat, ita
quod voluntas non sit nisi intellectus seu ratio, immo fons rationum, tunc clare videt
quomodo id, quod voluntate factum est, ex fonte prodiit rationis, sicut lex imperialis
non est nisi ratio imperantis, quae nobis voluntas apparet.
477 Ibid., h. XI1, n. 68, p. 78-79, linhas 1-15: Sed hoc evenit eis ex malo
praesupposito, quoniam necessitatem primae causae imposuerunt. Unde si ipsi
in omni inquisitione ad veram causam conditionis universi, quam praemisimus,
respexissent, unam omnium dubiorum veram repperissent solutionem. Puta quid
sibi vult conditor, quando de spina tam pulchram et odoriferam motu caeli et
instrumento naturae educit sensibilem rosam? Quid aliud responderi potest nisi
quod admirandus ille intellectus in hoc verbo suo intendit se manifestare, quantae
est sapientiae et rationis et quae sunt ‘divitiae gloriae suae’, quando tam faciliter
tantam pulchritudinem ita ornate proportionatam ponit medio sensibilis parvae rei
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in sensu cognoscitivo cum motu laetitiae et dulcissima harmonia omnem naturam
hominis exhilarescente? Et adhuc clariori modo se ostendit in vita vegetabili ipsa, a
qua rosa progreditur. Adhuc clariori resplendentia in vita intellectiva, quae omnia
sensibilia lustrat, [...].
478 Ibid., h. XI1, n. 8, p. 10-11, linhas 4-17: Volumus autem ipsum ut principium
indivisibile videre. Applicemus beryllum mentalibus oculis et videamus per
maximum, quo nihil maius esse potest, pariter et minimum, quo nihil minus esse
potest, et videmus principium ante omne magnum et parvum, penitus simplex et
indivisibile omni modo divisionis, quo quaecumque magna et parva sunt divisibilia.
Ac si per beryllum intueamur inaequalitatem, erit aequalitas indivisibilis
obiectum, et per absolutam similitudinem videbimus principium indivisibile omni
modo divisionis, quo similitudo est divisibilis seu variabilis, scilicet veritatem.
Nam nullum est aliud obiectum illius visionis nisi veritas, quae videtur per omnem
similitudinem maximam pariter et minimam absolutum primum principium
omnis suae similitudinis. Sic si per beryllum videmus divisionem, erit obiectum
conexio indivisibilis;
479 Ibid., h. XI1, n. 33, p. 36-37, linhas 1-7: Dubitas fortassis quomodo videtur
principium unitrinum. Respondeo: Omne principium est indivisibile omni divisione
suorum effectuum seu principiatorum. Primum igitur principium est ipsa
simplicissima atque perfectissima indivisibilitas. In essentia autem perfectissimae
indivisibilitatis video unitatem, quae est fons indivisibilitatis, video aequalitatem,
quae est indivisibilitas unitatis, et video nexum, qui est indivisibilitas unitatis et
aequalitatis. A partir do enigma dos ângulos Nicolau conclui: Dum igitur 381
intueor in c unitrinum principium, video ipsum esse fontem, unde primo emanat
unitas seu necessitas omnia uniens et constringens. Deinde video ipsum principium,
unde emanat aequalitas omnia quantumcumque varia formans seu adaequans,
quocumque motu hoc fieri oporteat. Sic video ipsum c principium, unde emanat
nexus et conservatio omnium constrictorum et formatorum. Video igitur ipsum
principium simplicissimum unitrinum, ut sua indivisibilitas sit perfectissima et sit
omnium causa, quae in sua indivisibili essentia sive terna indivisibilitate subsistere
nequeunt. (Ibid., h. XI1, n. 34, p. 37-38).
480 Ibid., h. XI1, n. 35, p. 38-40, linhas 1-7: Tetigerunt philosophi hanc trinitatem,
quam viderunt in principio esse, a causato ad causam ascendendo. Anaxagoras et
ante eum Emortinus Clasomenus, ut vult Aristoteles, fuit primus, qui intellectuale
vidit principium. Quem Plato extulit eius libros saepissime legens, quia visum sibi
fuit quod ‘magistrum invenisset’. Et quae Plato de eo dicit, illa et Aristoteles. Ipse
enim Anaxagoras tam Platoni quam Aristoteli oculos aperuit.
481 Ibid., h. XI1, n. 37, p. 41-42, linhas 1-9; 12-22: Plato autem considerans
multitudinem intelligentiarum vidit intellectum, cuius participatione omnes
intelligentiae sunt intelligentiae. Et quia vidit primum deum absolutum,
simplicissimum, imparticipabile et incommunicabile principium, ideo
communicabilem intellectum in deis multis seu intelligentiis varie participatum
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
et communicatum arbitrabatur primam creaturam. Ita etiam animam mundi,
quae in omnibus animabus communicabiliter participatur, ante omnes animas,
quasi in qua prioriter omnes complicantur ut in suo principio, esse credidit. [...].
Solum autem notes non esse necessarium universalem esse creatum intellectum
aut universalem mundi animam propter participationem, quae Platonem movit. Se
ad omnem essendi modum sufficit habunde primum principium unitrinum, licet
sit absolutum et superexaltatum, cum non sit principium contractum ut natura,
quae ex necessitate operatur, sed sit principium ipsius aturae et ita supernaturale,
liberum, quod voluntate creat omnia. Illa vero, quae voluntate fiunt, in tantum sunt,
in quantum voluntati conformantur, et ita eorum forma est intentio imperantis.
Intentio autem est similitudo intendentis, quae est communicabilis et receptibilis in
alio. Omnis igitur creatura est intentio voluntatis omnipotentis.
482 Ibid., h. XI1, n. 38, p. 43-44: Istud ignorabant tam Plato quam Aristoteles. Aperte
enim uterque credidit conditorem intellectum ex necessitate naturae omnia facere,
et ex hoc omnis eorum error secutus est. Nam licet non operetur ‘per accidens sicut
ignis per calorem’, ut bene dicit Avicenna, nullum enim accidens cadere potest in
eius ‘simplicitatem’, et per hoc videatur agere ‘per essentiam’, non tamen propterea
agit quasi natura seu instrumentum necessitatum per superioris imperium, sed per
liberam voluntatem, quae est et essentia eius. Bene vidit Aristoteles in Metaphysica,
quomodo omnia in principio primo sunt ipsum, sed non attendit voluntatem eius
non esse aliud a ratione eius et essentia.
483 Ibid., h. XI1, n. 39, p. 44-45, linhas 1-12: Quomodo autem Plato habuerit de
unitrino principio conceptum et quam propinque admodum nostrae christianae 382
theologiae, Eusebius Pamphili in libro Praeparatoriorum evangelii ex libris
Numenii, qui secreta Platonis conscripsit, et Plotini atque aliorum collegit.
Aristoteles etiam in sua Metaphysica, quam ipse theologiam appellat, multa
conformia veritati ratione ostendit, scilicet principium esse intellectum penitus in
actu, qui se ipsum intelligit, ex quo delectatio summa. Hoc quidem et theologi nostri
dicunt intellectum illum divinum se intelligendo de se et sua essentia et natura
generare intelligibilem sui ipsius similitudinem adaequatissimam. Intellectus
enim generat verbum, in quo est substantialiter, et ex hoc procedit delectatio, in
qua est generantis et geniti consubstantialitas.
484 Ibid., h. XI1, n. 39, p. 45-46, linhas 12-22: Verum si de hoc principio tu vis
habere omnem possibilem scientiam, considera in omni principiato quo est, quid est
et nexum, et per beryllum maximi pariter et minimi principiati respice in omnium
principiatorum principium. In ipso principio perfectissime modo divino reperies
trinitatem principium simplicissimum omnis creaturae unitrinae. Et attende me in
simplici conceptu principiati trinitatem unitatis essentiae exprimere per ‘quo est’ et
‘quid est’ et ‘nexum’, quae in sensibili substantia communiter nominantur forma,
materia et compositum ut in homine anima, corpus et utriusque nexus.
485 Cf. GANDILLAC (1941, p. 229-244): sobre a função do espírito na dialética
ternária de Nicolau de Cusa.
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NOTAS
486 Ibid., h. XI1, n. 40, p. 46: Aristoteles concordando omnes philosophos dicebat
principia, quae substantiae insunt, contraria. Et tria nominavit principia, materiam,
formam et privationem. Arbitror ipsum, quamvis super omnes diligentissimus atque
acutissimus habeatur discursor, atque omnes in uno maxime defecisse. Nam cum
principia sint contraria, tertium principium utique necessarium non attigerunt et
hoc ideo, quia contraria simul in ipso coincidere non putabant possibile, cum se
expellant. Unde ex primo principio, quod negat contradictoria posse simul esse vera,
ipse philosophus ostendit similiter contraria simul esse non posse.
487 Ibid., h. XI1, n. 41, p. 47, linhas 1-3; 11-12: Beryllus noster acutius videre facit,
ut videamus opposita in principio conexivo ante dualitatem, scilicet antequam sint
duo contradictoria, sicut si minima contrariorum videremus coincidere, [...], ita est
de principio conexionis, in quo simpliciter coincidunt minima contrariorum.
488 Segundo Gandillac (1941, p. 233) “A l’école d’Aristote, ils ont négligé
en effet la fonction véritable de l’intelligence, la découverte du nexus qui
rend seul compte et des liaisons mutuelles des choses et de leur rapport
avec le tout. Trompés par une logique de la non-contradiction, au lieu de
concevoir, par la considération ponctuelle des minima et des limites, dans
l’unité dialectique des opposés, le dynamisme du ‘troisième terme’, ils ont
cru atteindre à la structure métaphysique du concret en jouant avec les
cadres vides de la forme et de la matière. Soupçonnant pourtant la necessité
d’une synthèse et ne la trouvant aucunement dans le concept purement
négatif de la privatio, ils ont été réduits à placer dans la matière elle-même
et sans tenir compte de sa première définition, une certaine inchoatio 383
formarum, maladroit pressentiment du spiritus cusain, lié nécessairement à
une conception ternaire de l’intelligence”.
489 Ibid., h. XI1, n. 42, p. 48-49: Quod si Aristoteles principium, quod nominat
privationem, sic intellexisset, ut scilicet privatio sit principium ponens coincidentiam
contrariorum et ideo privatum contrarietate utriusque tamquam dualitatem,
quae in contrariis est necessaria, praecedens, tunc bene vidisset. Timor autem,
ne contraria simul eidem inesse fateretur, abstulit sibi veritatem illius principii.
Et quia vidit tertium principium necessarium et esse debere privationem, fecit
privationem sine positione principium. Post hoc non valens bene evadere quandam
videtur incohationem formarum in materia ponere, quae si acute inspicitur, est
in re nexus, de quo loquor. Sed sic non intelligit nec nominat. Et ob hoc omnes
philosophi ad spiritum, qui est principium conexionis et est tertia persona in divinis
secundum nostram perfectam theologiam, non attigerunt, licet de patre et filio
plerique eleganter dixerint, maxime Platonici, in quorum libris sanctus Augustinus
evangelium Iohannis theologi nostri ‘in principio erat verbum’ usque ad nomen
Iohannis Baptistae et incarnationem se repperisse fatetur. In quo quidem evangelio
de spiritu sancto nulla fit mentio.
490 Ibid., h. XI1, n. 12, p. 14-15: Iam tibi ex aenigmate constat, quomodo id
intelligere queas primum esse omnium mensuram; omnia enim complicite est quae
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NOTAS
esse possunt. Nam angulus maximus pariter et minimus est actus omnis formabilis
anguli, nec maior nec minor, ante omnem quantitatem. Nemo enim adeo parvi sensus
est, quin bene videat angulum simplicissimum maximum pariter et minimum in se
omnes formabiles sive magnos sive parvos complicare nec maiorem nec minorem
quocumque dabili. Cui non plus nomen unius quam omnium angulorum atque
nullius convenit. Quare nec acutus nec rectus nec obtusus angulus nominari potest,
cum non sit aliquis talis, sed simplicissima omnium causa. Recte igitur, ut Proclus
recitat in commentariis Parmenidis, Plato omnia de ipso principio negat. Sic et
Dionysius noster negativam praefert theologiam affirmativae.
491 Ibid., h. XI1, n. 13, p. 16-17: Videtur autem ipsi deo magis convenire ipsum unum
quam aliud nomen. Ita vocat eum Parmenides, similiter et Anaxagoras, qui aiebat
‘melius unum quam omnia simul’. Non intelligas de uno numerali, quod monas seu
singulare dicitur, sed de uno scilicet indivisibili omni modo divisionis, quod sine omni
dualitate intelligitur. Post quod omnia sine dualitate nec esse nec concipi possunt, ut
sit primo unum absolutum iam dictum, deinde unum cum addito, scilicet unum ens,
una substantia, et ita de omnibus, ita quod nihil dici aut concipi possit ita simplex,
quin sit unum cum addito, solum uno superexaltato excepto. Unde quomodo debeat
omnium nominibus et nullo omnium nominum nominari, ut Hermes Mercurius de eo
dicebat, et quaeque circa hoc, vides clare in aenigmate figurari.
492 Recordamos aqui alguns estudos importantes para a compreensão da
problemática dos nomes divinos em Nicolau de Cusa: ANDRÉ, João Maria.
Nicolás de Cusa y los nombres divinos: de una hermenéutica de la finitud
a una metafísica de lo posible. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO, Claudia 384
(Editores). Nicolás de Cusa: identidad y alteridad. Pensamiento y diálogo.
Buenos Aires: Biblos, 2010, p. 15-41; ANDRÉ (1997, p. 113-296); BAUCHWITZ,
O. F. La Metafísica de la alteridad como fundamento de la hermenéutica
en los nombres divinos en el Cusano. In: MACHETTA, Jorge M.; D’AMICO,
Claudia (Editores). Nicolás de Cusa: identidad y alteridad. Pensamiento
y diálogo. Buenos Aires: Biblos, 2010, p. 61-74; BAUCHWITZ, O. F. Nicolás
de Cusa y los nombres de lo divino: uma metafísica de la alteridad. In:
Universalität der Vernunft und Pluralität der Erkenntnis bei Nicolaus
Cusanus. Regensburg: Roderer Verlag, 2008, p. 115-134; BAUCHWITZ, O. F.
O inominado dos nomes como o sem-nome vindouro: Eriúgena e Nicolau de
Cusa. Scintilla: Revista de Filosofia e Mística Medieval. Curitiba: Faculdade
de Filosofia São Boaventura, Sociedade Brasileira de Filosofia Medieval.
Vol. 3 – n.2 – jul./dez. 2006/Semestral (p. 25–55). Disponível em: . Acesso em: 16 jan.
2008; D’AMICO, Claudia. El Deus absconditus o acerca del nombre de Dios
en Nicolás de Cusa. In: Patristica et Mediaevalia. Volumen XVII, Buenos
Aires, 1996, p. 38-48; GONZÁLEZ RÍOS (2010, p. 142-259); MARTÍNEZ GÓMEZ,
Luis S. J. From the Names of God to the Name of God: Nicholas of Cusa. In:
International Philosophical Quarterly,Vol.V(1965), p. 80-102.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
493 Segundo André, o poder e o dinamismo inerente ao próprio Máximo já se
manifesta quando Nicolau de Cusa “define” o Máximo “como realização de
toda a pontencialidade, como pura, plena e total atualidade”. Ainda segundo
ele, “esse dinamismo não esteve nunca ausente tanto no aprofundamento
do conceito de ‘Idem’, como no aprofundamento do conceito de ‘Não-outro’.
A articulação entre identidade e diferença ascendia, todavia, ao primeiro
plano e dificultava uma adequada percepção daquela dimensão. Daí que a
insatisfação permanente com os nomes divinos, característica do percurso
do autor, o leve a questionar mais uma vez os resultados atingidos e a tentar
penetrar na modalidade de ser do princípio fundante, como modalidade de
todas as modalidades, como possibilidade de todas as possibilidades, como
abertura para todos os possíveis. Irrompe, com isso, o poder com todo o
dinamismo, querendo dizer-se em múltiplas formas no discurso cusano”
(1997, p. 254). Além disso, André também afirma que, “como definição da
modalidade divina de ser, o ‘Possest’ havia sido anunciado já no De docta
ignorantia, com a ‘definição’ de Máximo (‘omne id quod esse potest’)” (p.
260). Mais ainda, sustenta que “o conceito de ‘Possest’ constitui o primeiro
momento da ‘metafísica do poder’ de Nicolau de Cusa” (p. 272). Por fim, o
autor opina que “o Cardeal alemão inicia a sua ‘metafísica do poder’ dentro
de um quadro que é estranho a essa mesma metafísica, na medida em que ela
é marcada, desde o De docta ignorantia, por um pressuposto que não precisa
ser afirmado nem demonstrado: a existência de Deus é um dado adquirido, é
o pressuposto de todos os pressupostos como conceito absoluto de todos os
conceitos, como o Idiota. De mente revela, quando pergunta pela possibilidade 385
de questionar Deus e sublinha a natureza específica dessa questão. O que as
reflexões de Nicolau de Cusa posteriores ao De possest o levaram a concluir
foi que é uma redundância afirmar do poder, como princípio fundante, o
seu ser. Como redundância, tal afirmação pode ser dispensada para que
a atenção se concentre apenas nas características que esse princípio,
como princípio fundante, ostenta; ora, a principal característica é a sua
produtividade e é essa produtividade que, no mais radical aprofundamento
do conceito de ‘creatio ex nihilo’, é afirmada do ‘Poder-ele-próprio’, ou seja,
por meio do ‘Posse ipsum’.” (p. 287-289).
494 De aequalitate. h. X, Opuscula II, Fasciculus 1, n. 23, p. 31, linhas 12-
21: Et quamvis nullum nomen nominabile possit convenire primo principio, cum
ipsum omnem alteritatem antecedat – nomina vero omnia ad discretionem unius
ab alio sunt imposita –, ideo discretio et nomen non perveniunt ad principium
alteritatem antecedens. Tamen, si aequalitas capitur pro absoluto inalterabili,
omnem alteritatem praecedens in esse et posse ita quod nec est nec potest esse aliud
aut recipere mutationem quamcumque sive in plus sive in minus sive aliter, cum
illa omnia, quae dici aut nominari aut concipi possunt, sint post ipsam, tunc est
aequalius nomen primi aeterni principii.
495 Ibid., h. X, Opuscula II, Fasciculus 1, n. 24, p. 31-32, linhas 1-6: Addamus igitur
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NOTAS
ob nostram infirmitatem quod sit intellectualis aequalitas, licet plus sit in infinitum
quam intellectualis, et dicamus ipsum perfectissimum principium, quod aequalitas,
utique se intelligere et ea quae operatur. Hoc enim ad omnem factorem rationalem nemo
dubitat spectare. Domificator enim se intelligit esse talem et scit quid operatur.
496 Ibid., h. X, Opuscula II, Fasciculus 1, n. 24, p. 32-33, linhas 6-22; 26-
28: Si igitur aequalitas absoluta est idem quod creator caeli et terrae, tunc se
scit esse aequalitatem et scit omnia quae facit. Necesse erit utique quod verbum
cognoscentiae suae, in quo se cognoscit, sit suiipsius aequalitas. Non enim potest
aequalitas verbum seu conceptum suiipsius alium formare quam aequalitatis.
Ratio igitur aequalitatis, per quam se cognoscit, quam nos nitimur exprimere
per inalterabile, non est nisi diffinitio seu ‘figura substantiae eius’. Quare eius
aequalitas sic est aequalitatis aequalitas. Sequitur igitur quod una est aequalitas,
quae est aequalitas et aequalitatis aequalitas; est igitur aequalitas de se generans
verbum, quod est eius aequalitas; a quibus procedit nexus, qui est aequalitas. Quem
nexum spiritum caritatis dicimus, quoniam ex aequalitate generante et aequalitate
genita non potest procedere nisi aequalitas, qui nexus seu amor dicitur. [...]. Non
possunt autem esse tres aequalitates, quoniam, si una esset una et alia alia, utique
alia ante alteritatem non foret, ubi solum aequalitas esse potest.
497 Ibid., h. X, Opuscula II, Fasciculus 1, n. 25, p. 33, linhas 1-19: Unde
impossibile est plura esse omnino aequalia, cum plura esse non possint, nisi sint alia
et alia et distincta in essentiis. Non erunt igitur plures aequalitates, sed ante omnem
pluralitatem erit aequalitas generans verbum, aequalitas genita et aequalitas ab
utroque procedens. Et quamvis generans non sit genita nec procedens, non tamen est 386
aequalitas generans alia aequalitas quam aequalitas genita et aequalitas procedens.
Numerus igitur, quo nos numeramus aequalitatem generantem, aequalitatem
genitam et aequalitatem procedentem, cum sit ante alteritatem, non est numerus
per nos intelligibilis, cum non videamus numerum sine alteritate in numeratis, nisi
respexerimus ad numerum in se ante alia numerabilia, ubi tria sunt ante tria. Tria
enim dicimus, quae per tria numeramus et numerum dicimus tria, per quem tria
numeramus. Numerus non dependet a numeratis. Unde numerus in se quoad nos non
est nisi anima, ut superius dictum est; numerus in aequalitate absoluta non est nisi
aequalitas generans, genita et procedens; in aequalitate sunt numerus qui aequalitas
et non tria numero aequalia, sed tres aequalitatis subsistentiae vel hypostases.
498 De principio. h. X, Opuscula II, Fasciculus 2b, n, 26, p. 38-39, linhas 9-20:
Sermo autem circa unum non est, quia indeterminabile; quare Plato simul mentiri
dicebat affirmationes et negationes in uno. Est ergo unum omni sensui, omni rationi,
opinioni et scientiae et omnibus nominibus incomprehensibile. Deo tamen, qui est
omnium causa, unum et bonum propius convenire dicimus, quia unum et bonum
est ab omnibus desiderabile, sicut ab omnibus fugabile nihil et malum. Deum autem
dicimus unum, quo melius cogitari nequit, et non intrat in nostram cogitationem
aliquid melius esse eo, quod ab omnibus nobis desideratur. Hinc unum et bonum
ipsum deum dicimus; nec illa sunt in ipso diversa, sed sunt ipsum unum, quod
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NOTAS
autounum Proclus nominat.
499 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 12, p. 15: Ex his patet verbum, quod
loquebatur Iudaeis, ut in themate, esse principium de principio et non recepisse
nomen principii a mundo creato, sed antequam mundus fieret, in aeternitate id
ipsum fuisse principium et post mundi constitutionem in tempore locutum fuisse.
500 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 16, p. 19-20, linhas 1-8: Unde si
advertis haec verba evangelii, ubi ait Iesus: ‘principium qui et loquor vobis’, sunt
ipsa lux intelligentiae; loquitur enim verbum caro factum, hoc scilicet verbum,
quod et deus, qui principium, loquitur sensibiliter. Et non est difficile hoc capere,
scilicet quod aeterna essendi ratio in his, quae ipsum sunt sensibiliter, loquatur
sensibiliter. Loqui est revelare seu manifestare. Omne igitur subsistens, cum sit,
ab eo est, quod per se subsistit, quod est ratio substantiae eius, et locutio est sui
ipsius revelatio sive manifestatio.
501 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 21, p. 21, linhas 16-20: [...], sed
in Christo supra omnem gradum, in quo logon non loquebatur ut in alio, sed ut in
puritate principii, sicut si ignis non in alio calefacto se revelaret, sed in purissima
flamma, quae in ipso igne indissolubili unione subsisteret.’
502 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 18, p. 22-24: Adhuc forte cogitas,
an authypostaton conveniat verbo; et videtur quod sic; sequitur enim in evangelio:
‘tunc scietis quia ego sum’. Solum per se subsistens veraciter dicere potest: ego sum.
Dico quod humanae locutiones non sunt praecisae in divinis, sed sicut Christus
de divinis humaniter locutus est, quoniam non nisi humaniter capi possunt per 387
homines, ita oportet nos praesupponere has evangelicas locutiones humano modo
omnibus praecisiores; nam verbum dei de se loquitur. Principium enim, cum non sit
ab alio, per se subsistere dicimus, cum nihil esse concipere valeamus, si ipsum non
conciperemus esse; primum enim, quod se offert conceptui, est ens, deinde ens tale;
et licet principium entis nihil entium sit, cum principium nihil sit principiati, tamen,
nisi concipiamus principium esse, nullum de ipso formare possumus conceptum.
503 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 19, p. 24-26, linhas 1-10: Plato
vero, qui vidit unum ens, unam essendi potentiam, unum caelum, unam terram
quasi unum in his omnibus passum et contractum et alteratum videns, separans et
tollens omnia ab uno vidit unum in se et absolutum. Et ut sic videtur, nec est ens nec
non ens nec est nec subsistit nec est subsistens nec per se subsistens nec principium,
immo nec unum. Immo non esset apta locutio ‘unum est unum’, cum copula illa
est non possit uni convenire, nec sine copula dicendo sic ‘unum unum’ esset apta
locutio, cum omnis locutio, quae sine alteritate aut dualitate non est proferibilis,
non conveniat uni.
504 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 19, p. 26-27, linhas 10-16: Unde si
attendis, tunc principium omnium nominabilium, cum nihil possit principiatorum
esse, est innominabile, et ideo etiam non nominari principium, sed esse principii
nominabilis innominabile principium omne qualitercumque nominabile antecedens
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NOTAS
sicut melius. Tunc vides contradictoria negari ab ipso, ut neque sit neque non sit
neque sit et non sit neque sit vel non sit; sed omnes istae locutiones ipsum non
attingunt, qui omnia dicibilia antecedit.
505 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 20, p. 27-28, linhas 1-5: Et licet hoc
sic sit et per se subsistere sibi non conveniat, cum per se subsistere sine dualitate et
divisione non intelligatur et unum sit ante omnem alteritatem, tamen nulli verius
convenit per se subsistere quam ei, quod est omnium subsistentium causa, cum
nullum causatorum eius respectu per se subsistat aut sit, quidquid sit.
506 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 26, p. 37, linhas 1-4: Dixi autem
superius per se subsistenti nullum nomen convenire, quoniam innominabile,
indicibile et ineffabile est; etiam sibi li unum proprie non convenit. Nos autem,
quoniam non possunt esse multa per se subsistentia, facimus de eo conceptum ut
de uno, et unum est, quo ipsum nominamus secundum conceptum nostrum, [...].
507 Ibid., h. X. Opuscula II. Fasciculus 2b. n. 27, p. 39-40, linhas 1-4: Neque
ipsum deum unum ut cognitum nominamus, sed quia ante omnem cognitionem
unum est desiderabile. Non est igitur dei comprehensio quasi cognoscibilium,
quibus cognitis nomina imponuntur, sed intellectus incognitum desiderans et
comprehendere non potens ponit denominationem unius divinando aliqualiter
hypostasim eius ex indeficienti omnium unius desiderio. Quod autem deus non
accedatur intellectualiter Proclus aiebat ideo, quia tunc solum intellectualis natura
ferretur ad ipsum; nam non intellectuales ipsum non appeterent; sed cum ipse sit,
cuius gratia omnia id sunt, quod sunt, ab omnibus naturaliter desiderari debet, 388
uti est ipsum unum et bonum, quod omnia appetunt et omnia entia penetrat. Cf.
Bauchwitz (2006, p. 42) afirma: “A imagem da caça é apropriada à filosofia
do Cusano, na medida em que o homem deve se valer de todo o seu engenho
para apreender o inapreensível, ver o invisível. Com mais ou menos glória,
essa caçada não é algo do qual possa furtar-se o próprio homem, senão que
ir em busca dessa sabedoria que não se alcança senão ignorando significa
que a realização mesma do homem vem-lhe imposta por aquela. Desertar
da caça é prescindir da propriedade de seu próprio ser. A metafísica cusana
descobre que a liberdade humana encontra-se condicionada e envolvida
ontologicamente por esse anelo do infinito”.
508 Citaremos o texto latino a partir da seguinte edição: NICOLÁS DE CUSA.
De li non aliud/Acerca de lo no-otro o de la definición que todo define.
Nuevo texto crítico original (edición bilingüe). Introducción de Jorge M.
Machetta y Klaus Reinhardt. Traducción de Jorge M. Machetta. Buenos
Aires: Biblos, 2008 (sigla ba). Cf. De li non aliud. ba. Cap. I, n. 4, p. 30-32:
NICOLAUS: Pauca, quae dixi, facile rimantur, in quibus reperies non-aliud; quodsi toto
nisu mentis aciem ad li non-aliud convertis, mecum ipsum definitionem se et omnia
definientem videbis. / FERDINANDUS: Instrue nos, quonam modo id fiat; nam magnum
est quod affirmas et nondum credibile. / NICOLAUS: Responde igitur mihi: quid est
non-aliud? Estne aliud quam non aliud? / FERDINANDUS: Nequaquam aliud. / NICOLAUS:
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Igitur non aliud. / FERDINANDUS: Hoc certum est. Nicolaus. Definias igitur non-aliud!
/ FERDINANDUS: Video equidem bene, quomodo non-aliud est non aliud quam non
aliud. Et hoc negabit nemo. / NICOLAUS: Verum dicis. Nonne nunc certissime vides
non-aliud se ipsum definire, cum per aliud definiri non possit? / FERDINANDUS: Video
certe, sed nondum constat ipsum omnia definire. Cf. De principio. h. X, Opuscula
II, Fasciculus 2b, n. 9, p. 10-11, linhas 4-7: Et logon est consubstantiale verbum
seu ratio diffiniti patris se diffinientis, in se omne diffinibile complicans, cum nihil
sine ratione unius necessarii diffiniri possit. O De non-aliud é, segundo Duclow, a
mais ousada conjectura cusana sobre a imanência e a transcendência e deve
ser visto a partir da dialética da alteridade e da sua negação. O non-aliud,
por um lado, enquanto definição que define a si mesma e a todas as coisas,
deve ser visto como um símbolo do pressuposto absoluto do pensamento
e da linguagem e, por outro lado, ele também é o símbolo do princípio
transcendente que limita a própria linguagem e o pensamento. Pois, levando
em consideração que a linguagem e a razão se movem no reino da alteridade,
na sua negatividade o non-aliud negaria o modo próprio de operar da
linguagem e do pensamento, ou seja, o aliud. Portanto, o non-aliud permanece
incondicionalmente além e aquém da alteridade e, por isso mesmo, de todo
nome e de toda definição, mantendo-se como a unidade e a totalidade prévia
à alteridade da razão e da linguagem. Pensado a partir das relações entre as
quatro unidades do De coniecturis, o non-aliud não pode ser outra coisa senão
a primeira unidade mental, ou seja, a ideia de Deus (1974, p. 65-69).
509 Cf. nota 132. 389
510 De li non aliud. ba. cap. I, n. 1, p. 26-28: ABBAS: Gauderemus audire, an ne ad
illa, quae per iam dictos tractantur, compendiosior tibi clariorque occurrat modus.
/ NICOLAUS: Undique circa profunda mysteria occupamur, neque, ut credo, brevius
quisquam faciliusque illa diceret, quam hii, quos lectitamus, licet mihi aliquando
visum sit illud per nos negligi, quod propinquius nos duceret ad quaesitum.
511 Ibid., ba. Cap. I, n. 3, p. 30: NICOLAUS: Bene sane! Si igitur omnia definit definitio,
et se ipsam igitur definit? / FERDINANDUS: Utique, cum nihil excludat. / NICOLAUS:
Vides igitur definitionem omnia definientem esse non aliud quam definitum? /
FERDINANDUS: Video, cum suiipsius sit definitio. Sed quaenam sit illa, non video. /
NICOLAUS: Clarissime tibi ipsam expressi. Et hoc est id, quod dixi nos negligere in
venationis cursu quaesitum praetereuntes. / FERDINANDUS: Quando expressisti? /
NICOLAUS: Iam statim, quando dixi definitionem omnia definientem esse non aliud
quam definitum. / FERDINANDUS. Nondum te capio.
512 Ibid., ba. cap. I, n. 5, p. 32: NICOLAUS: Cum igitur nihil maneat dubii, quin
hic definiendi modus, quo non-aliud se et omnia definit, praecisissimus sit atque
verissimus, non restat nisi circa ipsum attente immorari et quae humanitus sciri
possunt reperire.
513 Ibid., ba. cap. II, n. 6, p. 34-36: FERDINANDUS: Cum cuncti primum principium
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Deum appellent, videris tu quidem ipsum per li non-aliud velle significari. Primum
enim ipsum fateri oportet, quod et se ipsum et omnia definit; nam cum primo non sit
prius, sitque ab omnibus posterioribus absolutum, utique non nisi per semetipsum
definitur. Principiatum vero cum a se nihil, sed, quidquid est, habeat a principio,
profecto principium est ratio essendi eius seu definitio. / NICOLAUS: Bene me capis,
Ferdinande. Nam etsi primo principio multa attribuantur nomina, quorum nullum ei
adaequatum esse potest, cum sit etiam nominum omnium sicut et rerum principium,
et nihil principiati omnia antecedat, per unum tamen significandi modum mentis
acie praecisius videtur, quam per alium. Neque hactenus equidem comperi
quodcumque significatum humanum visum rectius in primum dirigere. Nam omne
significatum, quod in aliquid aliud sive in aliud ipsum terminatur, quemadmodum
alia omnia sunt ab ipso non-aliud, utique non dirigunt in principium.
514 Ibid., ba. cap. II, n. 7, p. 36: NICOLAUS: Optime! Cum nos autem alter alteri
suam non possumus revelare visionem nisi per vocabulorum significatum,
praecisius utique li non-aliud non occurrit, licet non sit nomen Dei, quod est ante
omne nomen in caelo et terra nominabile, sicut via peregrinantem ad civitatem
dirigens non est nomen civitatis.
515 Ibid., ba. cap. II, n. 7, p. 38: NICOLAUS: Ex his igitur nunc plane vides de li non-
aliud significatum non solum ut viam nobis servire ad principium, sed innominabile
nomen Dei propinquius figurare, ut in ipso tamquam in pretiosiori aenigmate
relucescat inquirentibus. Ibid., ba. ap.V, n. 17, p. 58-60: NICOLAUS: Recte in Deum
aciem iecisti per non-aliud significatum, ut in principio, causa seu ratione, quae
non est alia nec diversa, cuncta humaniter visibilia conspiceres, quantum tibi 390
nunc quidem conceditur. Tantum autem conceditur, quantum ipsum non-aliud,
scilicet rerum ratio, tuae se rationi seu menti revelat sive visibilem exhibet; sed
hoc nunc medio per non-aliud, quia sese definit, revelavit clarius quam antea. Nam
quo pacto mihi se visibilem praestiterit, in libellis pluribus legere potuisti: nunc
autem in hoc aenigmate significati ipsius ‘non aliud’ per rationem potissimum
illam, quia se definit, fecundius et clarius, adeo ut sperare queam ipsum Deum sese
nobis aliquando sine aenigmate revelaturum. Cf. Ibid., ba. cap. XXII, n. 99, p.
206: IOANNES ANDREAS ABBAS: Audivi te, pater, et antea saepe et nunc maxime mentis
tuae visionem nobis referentem, quodque illam in ipsum primum, quod quidem
omnia in omnibus est, dirigis, quo prius quidquam concipi non potest, quod non-
aliud nominas; et tamen ipsum asseris primum videri ante omne nominabile: quae
mihi profecto videntur esse contraria. / NICOLAUS. Pater abba, bene tenes audita;
sed ipsum non-aliud non dico equidem illius nomen, cuius est super omne nomen
nuncupatio. Sed de ipso primo conceptus mei nomen per ipsum ‘non aliud’ tibi
patefacio; neque mihi praecisius occurrit conceptum meum exprimens nomen de
innominabili, quod quidem a nullo aliud est.
516 Ibid., ba. cap. IX, n. 33, p. 90: NICOLAUS: Forma dat esse et cognosci; ideo quod
non est formatum, quia praecedit aut sequitur, non comprehenditur, sicut Deus et
hyle et nihil et talia.
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
517 Cf. Trialogus de possest. h. XI2, n. 2, p. 4 linhas 4-8: CARDINALIS: Conspiciuntur
invisibiliter, sicut intellectus invisibilem veritatem, quae latet sub littera, quando
intelligit quae legit invisibiliter videt. Dico invisibiliter hoc est mentaliter, cum
aliter invisibilis veritas, quae est obiectum intellectus, videri nequeat. Cf. ainda:
De li non aliud. ba. cap. XXII, n. 103, p. 210: NICOLAUS: Idipsum sane aio, ipsum
scilicet omni visionis modo invisibilem. Nam etsi quis assereret se ipsum vidisse,
is utique nequiret exprimere, quid vidisset. Nam qui est ante visibile et invisibile,
quo pacto est visibilis, nisi quia excellit omne visibile, quod sine ipso nihil cernitur?
Unde quando ipsum nec caelum, nec a caelo aliud esse video et universaliter nec esse
aliud, nec ab alio aliud esse, non video ipsum quasi sciens, quid videam. Videre enim
illud, quod equidem ad Deum refero, non est videre visibile, sed est videre in visibili
invisibile. Sicut cum hoc esse verum video, quod nemo scilicet Deum vidit, tunc
sane Deum video super omne visibile ‘non aliud’ ab omni visibili; actualem autem
illam infinitatem omnem excedentem visionem, omnium quidditatum quidditatem,
nequaquam visibilem video, cum visibile quidem seu obiectum aliud sit a potentia,
Deus autem, qui ab aliquo aliud esse non potest, omne obiectum excedat.
518 Ibid., ba. cap. IX, n. 33, p. 90: NICOLAUS: Quando illa visu mentis attingimus,
supra vel citra comprehensionem attingimus; sed sine verbo visionem communicare
non valentes sine li esse, quod non est, explicare non possumus, quia aliter audientes
non comprehenderent. Unde hae mentis visiones, sicut sunt supra comprehensionem,
sic etiam supra expressionem. Et locutiones de ipsis sunt impropriae, praecisione
carentes, sicut cum dicimus materiam esse materiam, hyle esse hyle, nihil esse nihil
et huiusmodi. Oportet igitur speculantem facere; uti facit videns per vitrum rubeum 391
nivem, qui nivem videt et apparentiam rubedinis non nivi, sed vitro attribuit, ita
facit mens per formam videns informatum.
519 Cf. 2.2 especulaçãO e cOnjectura do presente texto.
520 Cf. NICOLAI DE CUSA. De apice theoriae. Opera omnia. Iussu et
auctoritate Academiae Litterarum Heidelbergensis ad codicum fidem edita.
Vol. XII. Hamburg: Felix Meiner, 1982, p. 115-136: CARDINALIS: “Si apostolus
Paulus in tertium caelum raptus nondum comprehendit incomprehensibilem, nemo
umquam ipsum qui maior est omni comprehensioni satiabitur quin semper instet,
ut melius comprehendat (n. 2, p. 118, linhas 5-8). Cf. NIKOLAUS VON KUES.
De apice theoriae/Die höchste Stufe der Betrachtung. In: Philosophisch-
Theologische Werke. Lateinisch–deutsch. Band IV. Felix Meiner Verlag:
Hamburg, 2002. p. 1-43.
521 De li non aliud. ba. cap. II, n. 4, p. 32: NICOLAUS: Responde igitur mihi: quid
est non-aliud? Estne aliud quam non aliud? / FERDINANDUS: Nequaquam aliud. /
NICOLAUS: Igitur non aliud. / FERDINANDUS: Hoc certum est. / NICOLAUS: Definias igitur
non-aliud! / FERDINANDUS: Video equidem bene, quomodo non-aliud est non-aliud
quam non-aliud. Et hoc negabit nemo.
522 Ibid., ba. cap. V, n. 18, p. 60: FERDINANDUS: In primis quaerit scientiae avidus,
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NOTAS
ubi sumi debeat ratio, quod Deus trinus et unus est per li non-aliud significatus,
cum non-aliud numerum omnem antecedat.
523 Ibid., ba. cap. V, n. 18, p. 62: NICOLAUS: Ex hiis, quae dicta sunt, unica ratione
omnia videntur, quam tu quidem vidisti esse, quia principium per non-aliud
significatum se ipsum definit. In explicatam igitur eius definitionem intueamur,
quod videlicet non-aliud est non aliud quam non-aliud; idem triniter repetitum si
est primi definitio, ut vides, ipsum profecto est unitrinum et non alia ratione, quam
quia se ipsum definit; non enim foret primum, si se ipsum minime definiret; se autem
quando definit, trinum ostendit. Ex perfectione igitur vides resultare trinitatem,
quam tamen, quoniam ante aliud vides, nec numerare potes nec numerum esse
affirmare, cum haec trinitas non sit aliud quam unitas, et unitas non sit aliud quam
trinitas, quia tam trinitas quam unitas non sunt aliud quam simplex principium per
non-aliud significatum.
524 Ibid., ba. cap. V, n. 19, p. 64-66: NICOLAUS: Sed qui Patrem et Filium et
Spiritum sanctum Trinitatem nominant, minus praecise quidem appropinquant,
congrue tamen nominibus illis utuntur propter scripturarum convenientiam. Qui
vero unitatem, aequalitatem et nexum Trinitatem nuncupant propius accederent,
si termini illi sacris in litteris reperirentur inserti; sunt enim hii, in quibus non-
aliud clare relucescit; nam in unitate, quae indistinctionem a se dicit et ab alio
distinctionem, profecto non-aliud cernitur. Ita et in aequalitate sese manifestat
et nexu consideranti. Adhuc simplicius hii termini: hoc, id et idem lucidius
praecisiusque non-aliud imitantur, sed minus sunt in usu. Sic itaque patet in
non aliud et non aliud atque non aliud, licet minime usitatum sit, unitrinum 392
principium clarissime revelari supra omnem tamen nostram apprehensionem atque
capacitatem. Quando enim primum principium ipsum se definit per non-aliud
significatum, in eo definitivo motu de non alio non aliud oritur atque de non alio
et non alio exorto in non alio concluditur definitio, quae contemplans clarius, quam
dici possit, intuebitur.
525 De apice theoriae. h. XII, n. 26, p. 135, linhas 1-4: X. In operatione seu
factione certissime mens videt posse ipsum apparere in posse facere facientis et
in posse fieri factibilis et in posse conexionis utriusque. Nec sunt tria posse, sed
idem posse est facientis, factibilis et conexionis”. Cf. Para pensar a irrupção do
“poder” como termo que indica o dinamismo do princípio simples, podemos
tomar como indicação as sugestões de André (1997, p. 254): “No entanto,
o Máximo, antes de tudo, havia sido ‘definido’ como realização de toda a
potencialidade, como pura, plena e total atualidade: nessa definição, era
não só a infinidade que se explicitava, mas, sobretudo, o dinamismo, o poder
inerente ao próprio Máximo. Esse dinamismo não esteve nunca ausente
tanto no aprofundamento do conceito de ‘Idem’, como no aprofundamento
do conceito de ‘Não-outro’. A articulação entre identidade e diferença
ascendia, todavia, ao primeiro plano e dificultava uma adequada percepção
daquela dimensão. Daí que a insatisfação permanente com os nomes divinos,
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
característica do percurso do autor, o leve a questionar mais uma vez os
resultados atingidos e a tentar penetrar na modalidade de ser do princípio
fundante, como modalidade de todas as modalidades, como possibilidade
de todas as possibilidades, como abertura para todos os possíveis. Irrompe,
com isso, o poder com todo o dinamismo, querendo dizer-se em múltiplas
formas no discurso cusano”.
526 O verbo “encerrar” não indica aqui que esquecemos o ulterior
desdobramento da busca cusana por um termo menos inadequado para
significar o nosso conceito do princípio e que culmina com o posse ipsum.
Como sabemos cronologicamente, o De possest é anterior ao De li non
aliud. Assim, podemos fazer uma leitura respeitando a ordem cronológica
das obras cusanas, mas descobrindo nela o que conduz o pensamento de
uma obra para outra ou, no caso dos nomes enigmáticos divinos, o que é
pensado e valorizado em um enigma e que conduz o pensamento ao outro
enigma. Por exemplo, Bauchwitz considera que o caminho que se abre no De
possest e que “conduzirá ao nome de deus como o non aliud” é a valorização
da “emergência de deus” ou do “acontecimento divino que não é outro
respeito a sua obra” (2006, p. 50). Por outro lado, André e González Ríos
rompem a ordem cronológica das últimas obras cusanas e justificam as suas
escolhas como se segue: o primeiro analisa o De possest após o De li non aliud
e justifica a sua escolha ao afirmar que o enigma do possest, enquanto nome
divino, “deve ser compreendido na sua correlação com o conceito de “Posse
ipsum”, que o complementa e o radicaliza e que corresponde ao período 393
final das reflexões do autor [Nicolau de Cusa]” (1997, p. 160). Já o segundo
analisa o De li non aliud após o De apice theoriae, ou seja, após a última obra
e após o último nome proposto por Cusano. González Ríos justifica a sua
proposta ao considerar que, embora o nome enigmático non-aliud preceda
o posse ipsum “[…] con todo, posee una fuerza significativa en virtud del
juego lingüístico en el que funciona que nos lleva a ponerlo en último lugar
para con él cerrar esta investigación sobre el problema del lenguaje en el
pensamiento cusano” (2010, p. 149). Em nossa pesquisa, rompemos também
a ordem cronológica ao apresentarmos resumidamente o enigma non-aliud
antes do enigma “possest”. Em nosso caso, esta escolha poderia ser justificada
tendo em vista que a ideia do nome como enigma aparece de modo mais
claro no De li non aliud, quando Nicolau postula a ideia de que o caminho
que conduz a cidade não é o nome da cidade. Assim, o nome enigmático
conduz, enquanto caminho a ser percorrido, aquele que especula a visão
do princípio. Além disso, se o De li non aliud guarda uma reflexão sobre a
trindade do princípio, como também acontece em outros tantos textos, por
sua vez, no De possest o nome enigmático possest aponta em si mesmo o nexus,
a relacionalidade, o movimento e a dinamicidade do princípio pensado
como unitrino. Assim, a concepção cusana de nexus e do princípio trino
pode ser claramente iluminada por esse termo que em si mesmo também já
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NOTAS
indica o caminho de aprofundamento nas obras posteriores ao De li non aliud
como acima indicava João Maria André. Cf. também: VERD, Gabriel María.
Ser y nombre de Dios en Nicolás de Cusa. In: Miscelanea Comillas: Revista
de Theología y Ciencias Humanas, Vol. 27, nº 52 (1969), 29-59. Universidad
Pontificia Comillas – Madrid. Aqui o autor expõe primeiramente o non aliud,
em seguida o possest e, por último, o posse ipsum. Ele justifica esta tendo em
vista a unidade temática que existiria entre o De possest e o De apice theoriae
que estariam unidos pelo De venatione sapientiae (p. 47).
527 Cf. ANDRÉ (1997, p. 272): “O conceito de ‘Possest’ constitui o primeiro
momento da ‘metafísica do poder’ de Nicolau de Cusa”. O segundo seria o
conceito do “poder fazer” que se articula com a ideia do “poder ser feito”
presentes no De venatione sapientiae (p. 278-279). O terceiro seria o posse ipsum
que é insinuado no Compendium e tematizado no De apice theoriae (p. 287-289).
Cf. CASARELLA, Peter J. Nicholas of Cusa and the Power of the Possible. In:
American Catholic Philosophical Quarterly, Volume LXIV (Winter 1990),
n. 1, p. 7-34; GIACON, Carlo. Il ‘possest’ del Cusano e le dottrine aristotelico-
tomistiche dell’atto e potenza e dell’essenza ed esistenza. In. Nicolò Cusano
agli inizi del mondo moderno. Atti del Congresso internazionale in
occasione del V centenario della morte di Nicolò Cusano. Bressanone, 6-10
settembre 1964, Firenze: Sasoni Editori. p. 375-384.
528 De apice theoriae. h. XII, n. 4, p. 119, linhas 1-13: CARDINALIS: Cum
igitur iam annis multis viderim ipsam ultra omnem potentiam cognitivam ante
omnem varietatem et oppositionem quaeri oportere, non attendi quiditatem in se 394
subsistentem esse omnium substantiarum invariabilem subsistentiam; ideo nec
multiplicabilem nec plurificabilem, et hinc non aliam et aliam aliorum entium
quiditatem, sed eandem omnium hypostasim. Deinde vidi necessario fateri ipsam
rerum hypostasim seu subsistentiam posse esse. Et quia potest esse, utique sine
posse ipso non potest esse. Quomodo enim sine posse posset? Ideo posse ipsum, sine
quo nihil quicquam potest, est quo nihil subsistentius esse potest. Quare est ipsum
quid quaesitum seu quiditas ipsa, sine qua non potest esse quicquam. Et circa hanc
theoriam in his festivitatibus versatus sum cum ingenti delectatione.
529 Ibid., h. XII, n. 4, p. 119-120, linhas 14-18: PETRUS: Quia sine posse nihil
quicquam potest, uti ais – et verum te dicere video –, et sine quiditate utique non est
quicquam, bene video posse ipsum quiditatem dici posse. Sed miror, cum iam ante
de possest multa dixisses et in trialogo explanasses, cur illa non sufficiunt?
530 Ibid., h. XII, n. 5, p. 120, linhas 1-6: CARDINALIS: Videbis infra posse ipsum, quo
nihil potentius nec prius nec melius esse potest, longe aptius nominare illud, sine
quo nihil quicquam potest nec esse nec vivere nec intelligere, quam possest aut aliud
quodcumque vocabulum. Si enim nominari potest, utique posse ipsum, quo nihil
perfectius esse potest, melius ipsum nominabit. Nec aliud clarius, verius aut facilius
nomen dabile credo. Cf. BOND, Lawrence H. The Changing Face of Posse. Another
Look at Nicolaus Cusanus’ De apice theoriae (1464). In: YAMAKI, Kazuhiko.
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Nicholas of Cusa. A Medieval Thinker for the Modern Age. Richmond: Curzon
Press, 2002, p. 35-46. Cf. ainda: CASARELLA (1990, p. 26-30).
531 De venatione sapientiae. h. XII, cap. XIII, n. 34, p. 34, linha 2: venatur
cibum sufficientissimum; n. 35, p. 35, linha 1: Non est igitur deus quaerendus in
alio campo quam possest; n. 36, p. 36, linha 1: Sunt in hoc campo delectabilissimae
venationes; n. 38, p. 37, linha 2: de delectabilissimis venationibus non degustarunt.
5325 Cf. ANDRÉ, 1997, p. 275: “O autor não pergunta aqui sobre o poder ser
das coisas, mas sim sobre o seu poder ser feito. Nesta diferença se traduz
o início da viragem relativamente aos escritos anteriores. É a produção
das coisas na sua produção que é interrogada. É a posição dos entes que é
questionada. E é questionada precisamente a partir daquilo que constitui
a condição dessa posição. Tal condição é encontrada na sua possibilidade:
só se põe algo que seja possível ser posto. A isto chama Nicolau de Cusa
‘posse fieri’. Com tal designação, não é o princípio que é nomeado, mas sim
o modo como no princípio se encontra o principiado. O ‘posse fieri’ não é,
pois, um nome divino entre os outros nomes divinos cusanos, dado que,
mais do que o princípio fundante, designa as coisas no momento ou no ato
da sua fundação”.
533 De venatione sapientiae. h. XII, cap. XIII, n. 34, p. 34-35: Intellectus intrans
in campum possest, hoc est, ubi posse est actu, venatur cibum sufficientissimum.
Deus enim, quem Thales Milesius antiquissimum recte affirmabat, quia non factus
seu genitus, antiquior est omni nominabili; nam ante aliquid et nihil, effabile et 395
ineffabile, atque posse fieri et factum. Non igitur potest fieri, quod aeternum non sit
actu. Licet enim humanitas sit id quod humanitas requirit, non tamen est actu id
quod fieri potest; est enim post fieri posse sub omnipotenti potestate creatoris ipsius
posse fieri. Nihil igitur omnium, quae sequuntur posse fieri, umquam a posse fieri
aliud, quam est, absolvitur. Solus deus est possest, quia est actu quod esse potest.
5345 Ibid., h. XII, cap. XIII, n. 35, p. 35-36, linhas 3-10; 13-17: Non est deus parvus,
quia parvum potest esse maius, neque magnus, quia magnum potest esse minus, sed
ante omnia, quae aliter fieri possunt, et ante omnia, quae differunt. Est enim ante
differentiam omnem: ante differentiam actus et potentiae, ante differentiam posse
fieri et posse facere, ante differentiam lucis et tenebrae, immo ante differentiam esse
et non esse, aliquid et nihil, atque ante differentiam indifferentiae et differentiae,
aequalitatis et inaequalitatis, et ita de cunctis. [...]. Ipse autem deus est ante
omnem differentiam differentiae et concordantiae, quia possest. Et cum sit ante
differentiam unius et alterius, non est plus unum quam aliud, et ante differentiam
parvi et magni, non maior uni et minor alteri nec aequalior uni et alteri inaequalior.
535 Ibid., h .XII, cap. XIII, n. 38, p. 38, linhas 1-10: Patet quomodo philosophi, qui
hunc campum non intraverunt, de delectabilissimis venationibus non degustarunt.
Id autem quod eos terruit, ne hunc campum intrarent, fuit, quia praesupposuerunt
etiam deum, sicut alia quae posse fieri sequuntur, citra differentiam oppositorum
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
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NOTAS
quaerendum. Nam ante differentiam contradictorie oppositorum non putabant
deum reperiri. Volentes igitur venationem eius includi infra ambitum principii
illius ‘quodlibet est vel non est’, ipsum, qui etiam illi principio antiquior et qui
ambitum illius principii excellit, non quaesiverunt in campo possest, ubi posse esse
et actu esse non differunt.
536 Cf. STEIGER, Renata. Prefatio editoris. In: NICOLAI DE CUSA. Trialogus
de possest. Opera omnia. Iussu et auctoritate Academiae Litterarum
Heidelbergensis ad codicum fidem edita. Vol. XI2. Hamburg: Felix Meiner,
1973, VIII-XIV: Interlocutores sunt Cardinalis ipse et duo amici, Iohannes Adreas
Vigevius, eo tempore familiaris Nicolai, abbas monasterii S. Iustinae, postero
tempore episcopus Aleriensis, et Bernardus Kraiburgensis, decretorum doctor,
tunc cancellarius archiepiscopi Salisburgensis. In Tetralogo de li non aliud abbam
Iohannem iterum interlocutorem videmus (p. IX).
537 Cf. Rom., 1,20. O contexto no qual o versículo se encontra diz respeito à
revelação de Deus por meio da criação aos gentios. Portanto, os gentios não
seriam desculpados por não terem honrado o Deus verdadeiro. Para André
(1997, p. 262), esse ponto de partida situa o escrito “no modelo expressionista
característico do pensamento cusano e o caminho aberto é um caminho
ascensivo, regressivo, ou, [...], redutivo-transcendental: trata-se de chegar
a um conceito de Deus, partindo da sua expressão diferenciada no conjunto
dos entes finitos, e de situar desde logo esses conceitos nos processos
discursivos da mente humana, como espaço de captação de sentido”. Cf.
também: ELPERT, Jan Bernd. XIV. Trialogus de Possest. Das creative Spiel mit 396
der Sprache. In: ______. Loqui est revelare – verbum ostensio mentis:
Die sprachphilosophischen Jagdzüge des Nikolaus Cusanus. Frankfurt am Main:
Peter Lang, 2002, p. 307-338: o autor interpreta o ex creatura mundi não
somente como se referindo às criaturas do mundo, mas no De posset existe
um alargamento para a consideração da linguagem: “Blicken wir auf die in
‘De possest’ erörterten und von uns rekonstruierten sprachphilosophischen
Fragestellung, dann fällt auf, dass die Frage (quomodo ex creatura mundi
intellecta conspiciuntur invisibilia dei) sich nicht auf die rein geschöpfliche
Aussenwelt erstreckte, sondern dass die aufgeworfene Frage auf subtile,
spekulative und spielerische Weise angegangen wurde. Der Weg führte über
die dem menschlichen Geist entsprungenen Beobachtungen und Spiele auf
der Ebene der menschlichen Sprache. Das ‘ex creatura mundi’ wird im
wesentlichen ausgedehnt und die Sprach- und Sprechebene des Menschen
selbst erweitert. Die Wortschöpfung possest’, die Sprach- bzw. Wortspiele
mit den Buchstaben ‘IN’ und ‘E’ geben davon ein aufschlussreiches Zeugnis.
Die Vermittlung und Rückführung zum Absoluten geschieht also nicht rein
durch die geschöpfliche Aussenwelt, sondern direkt im intellektuellen frei
schaffenden Tun des Menschen, wobei der Sprache und dem elementaren
Rückfragen nach den kleinsten signifikanten Spracheinheiten eine
bedeutende und wesentliche Rolle zukommen. Dabei wird die menschliche
NEXUS: DA RELACIONALIDADE DO PRINCÍPIO À “METAFÍSICA DO
INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
Sprache zum einen in ihrer Aussagekräftigkeit streng begrenzt, auf der
anderen Seite aber um eine ihr unterliegende signifikante Kraft erweitert,
die ohne das göttliche Geheimnis zu lüften, es dennoch annähernd
spekulativ zu berühren sucht in der Haltung und Gewissheit der ‘docta
ignorantia’, die sich bei allem streng bewusst bleibt, dass die absolute
Wahrheit unaussprechlich bleiben wird und nicht erreicht werden kann“
(2002, p. 338). Cf. ainda: THERUVATHU (2010, p. 260): “Based on the epistle
to the Romans, the dialogue De possest enters into dichotomies like creator
and creation, invisible and visible, seeing-visibly and seeing-invisibly,
created things and eternal forms, actually-existing [being] and not-existing
[non-being] and, finally, able-to-exist and not-able-to-exist. The last two
dichotomies are the turning points in the dialogue. The first positive parts
of these two dichotomies, actually existing and able to axist, dominate the
rest of the dialogue”.
538 Trialogus de possest. h. XI2, n. 2, p. 3-4, linhas 1-6: IOHANNES: Incidi in studium
epistulae Pauli apostoli ad Romanos et legi, quomodo deus manifestat hominibus ea,
quae eis de ipso nota sunt. Ait autem hoc fieri hoc modo: ‘Invisibilia enim ipsius a
creatura mundi per ea quae facta sunt intellecta conspiciuntur, sempiterna quoque
eius virtus et divinitas.’ Istius modi elucidationem a te audire exposcimus.
539 Ibid., h. XI2, n. 2, p. 4, linhas 12-13: BERNARDUS: Miramur abbas et ego quod
invisibilia conspiciuntur; n. 3, p. 4, linhas 1-2: BERNARDUS: Quomodo autem a
visibili creatura mundi elicitur haec visio? 397
540 Cf. 2 Cor. 4, 18: “Não olhamos para as coisas que se veem, mas para as que
não se veem; pois o que se vê é transitório, mas o que não se vê é eterno”.
541 Trialogus de possest. h. XI2, n. 2, p. 4, linhas 7-11: CARDINALIS: Quis melius
sensum Pauli quam Paulus exprimeret? Invisibilia alibi ait aeterna esse. Temporalia
imagines sunt aeternorum. Ideo si ea quae facta sunt intelliguntur, invisibilia dei
conspiciuntur, uti sunt sempiternitas, virtus eius et divinitas. Ita a creatura mundi
fit dei manifestatio.
542 Trialogus de possest. h. XI2, n. 2, p. 4, linhas 14-18: CARDINALIS: Conspiciuntur
invisibiliter, sicut intellectus invisibilem veritatem, quae latet sub littera, quando
intelligit quae legit invisibiliter videt. Dico invisibiliter hoc est mentaliter, cum
aliter invisibilis veritas, quae est obiectum intellectus, videri nequeat.
543 Ibid., h. XI2, n. 3, p. 4-5, linhas 1-12: CARDINALIS: Id, quod video sensibiliter,
scio ex se non esse. Sicut enim sensus nihil a se discernit, sed habet discretionem a
superiori virtute, sic et sensibile a se non est, sed est ab altiore virtute. Ideo apostolus
dicebat ‘a creatura mundi’, ut a visibili mundo tamquam creatura ad creatorem
elevemur. Quando igitur videndo sensibile intelligo ipsum a quadam altiori virtute
esse, cum sit finitum, quod a se esse nequit – quomodo enim finitum sibi ipsi
terminum posuisset? –, tunc virtutem, a qua est, non possum nisi invisibilem et
aeternam conspicere. Virtus enim creativa non potest intelligi nisi aeterna.
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NOTAS
544 Ibid., h. XI2, n. 4, p. 5, linhas 3-8: CARDINALIS: Immo non pauca sed maxima.
Dixit enim: ‘Invisibilia’ ipsius dei ‘a creatura mundi intellecta conspiciuntur’, non
quod invisibilia dei sint quid aliud quam deus invisibilis, sed quia plura in creatura
mundi sunt visibilia, quorum quodlibet sua adaequata ratione id est quod est, ideo
de qualibet visibili creatura docet ad cuiuslibet invisibile principium ascendendum.
545 Ibid., h. XI2, n. 5, p. 6: CARDINALIS: Arbitror quod multa valde etiam altissima
et mihi abscondita. Sed quae nunc conicio haec sunt: Docere nos voluit apostolus,
quomodo in deo illa invisibiliter apprehendere poterimus, quae in creatura videmus.
Omnis enim creatura actu exsistens utique esse potest. Quod enim esse non potest,
non est. Unde non-esse non est creatura. Si enim est creatura, utique est. Creare
etiam cum sit ex non-esse ad esse producere, utique clare ostendit ipsum non-esse
nequaquam creaturam. Neque hoc parvum est apprehendisse. No De venatione
sapientiae esse é também o ponto de apoio com o qual a razão vai a caça da
sabedoria. Cf. De venatione sapientiae. h. XII, cap. III, n. 7, p. 9-10, linhas
1-15: Cum impossibile fieri non fiat, nihil factum est aut fiet, quin potuit aut possit
fieri. Quod autem est et non est factum nec creatum, non potuit neque potest fieri
neque creari. Praecedit enim posse fieri et est aeternum, cum non sit nec factum nec
creatum nec possit fieri aliud. Omne autem quod est factum aut fiet, cum sine posse
fieri nec sit factum nec fiet, habet principium unum absolutum, quod est principium
et causa ipsius posse fieri. Et id est illud aeternum, quod posse fieri antecedit; et est
absolutum principium et incontrahibile, quia est omne quod esse potest; et ipsum
quod fit, de posse fieri producitur, quia ipsum posse fieri fit actu omne quod fit.
Omne autem quod factum est ex posse fieri, aut est id, quod fieri potest, aut est post 398
illud; et numquam est id quod fieri potest, sed sequitur et imitatur ipsum.
546 Trialogus de possest. h. XI2, n. 6, p. 6-7: CARDINALIS: Dico autem consequenter:
Cum omne exsistens possit esse id quod est actu, hinc actualitatem conspicimus
absolutam, per quam quae actu sunt id sunt quod sunt. Sicut cum alba videmus
visibili oculo, albedinem intellectualiter intuemur, sine qua album non est album.
Cum igitur actualitas sit actu, utique et ipsa potest esse, cum impossibile esse
non sit. Nec potest ipsa absoluta possibilitas aliud esse a posse, sicut nec absoluta
actualitas aliud ab actu. Nec potest ipsa iam dicta possibilitas prior esse actualitate
quemadmodum dicimus aliquam potentiam praecedere actum. Nam quomodo
prodisset in actum nisi per actualitatem? Posse enim fieri si se ipsum ad actum
produceret, esset actu antequam actu esset. Possibilitas ergo absoluta, de qua
loquimur, per quam ea quae actu sunt actu esse possunt, non praecedit actualitatem
neque etiam sequitur. Quomodo enim actualitas esse posset possibilitate non
exsistente? Coaeterna ergo sunt absoluta potentia et actus et utriusque nexus.
Neque plura sunt aeterna, sed sic sunt aeterna quod ipsa aeternitas. Videnturne
vobis haec sic aut aliter se habere?
547 Ibid., h. XI2, n. 47, p. 57-58, linhas 1-13: IOHANNES: Intelligo nos consideratione
creaturarum habita creatorem unitrinum affirmare, qui – ut praedictum est – in se
manet omni modo dicendi ineffabilis. / CARDINALIS: Recte ais. Nam sine potentia et
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actu atque utriusque nexu non est nec esse potest quicquam. Si enim aliquid horum
deficeret, non esset. Quomodo enim esset si esse non posset? Et quomodo esset si actu
non esset, cum esse sit actus? Et si posset esse et non esset, quomodo esset? Oportet
igitur utriusque nexum esse. Et posse esse et actu esse et nexus non sunt alia et alia.
Sunt enim eiusdem essentiae, cum non faciant nisi unum et idem. Rosa in potentia
et rosa in actu et rosa in potentia et actu est eadem et non alia et diversa, licet posse
et actus et nexus non verificentur de se invicem sicut de rosa.
548 Ibid., h. XI2, n. 47, p. 58, linhas 18-20; n. 48, p. 58-59, linhas 1-7: BERNARDUS:
Negato enim utriusque nexu non esset actu, cum nihil sit actu nisi possit esse
et sit; ab his enim procedit actualis exsistentia. / Sic video unitrinam rosam ab
unitrino principio. Hoc autem principium in omnibus relucere video, cum nullum
sit principiatum non unitrinum. Sed omnia principiata video nihil esse principii,
licet omnia sint in ipso ut in causa et ratione. Deus igitur non est ut rosa unitrina.
Nihil enim habet aeternum principium a principiato, sed est unitrinitas absoluta, a
qua omnia unitrina id sunt quod sunt.
549 Ibid., h. XI2, n. 48, p. 59, linhas 8-17: IOHANNES: Mihi similiter ut tibi, Bernarde,
videtur. Nec alius est deus a quo est rosa in potentia, alius a quo in esse et alius a
quo in nexu utriusque, cum non sit alia rosa quae est in posse et alia quae in esse
et alia quae in nexu, sed unitrina. Sed cum Christiani dicant aliam esse personam
ipsius absoluti posse, quam nominamus patrem omnipotentem, et aliam ipsius esse,
quam quia est ipsius posse nominamus filium patris, et aliam utriusque nexum,
quam spiritum vocamus, cum naturalis amor sit nexus spiritalis patris et filii: has
personales differentias quomodo in aenigmate videre debeam, non capio. 399
550 Ibid., h. XI2, n. 49, p. 59-60, linhas 1-15 e 25-28: CARDINALIS: Bene dicis, abba,
aliam esse personam patris, aliam filii, aliam spiritus sancti in divinis propter
infinitae perfectionis trinitatem. Non tamen est alia persona patris per aliquam
alteritatem, cum omnem alteritatem supergrediatur benedicta trinitas, quae
non est ab alio, sed per se est id quod est. Ideo pater non est aliud a filio propter
identitatem essentiae et naturae, sed non est filius. Non per non-esse pater non
est filius, cum ante omne non-esse sit deus unitrinus, sed quia esse praesupponit
posse, cum nihil sit nisi possit a quo est, posse vero nihil praesupponit, cum posse sit
aeternitas. Ideo cum videam deum qui non praesupponat sui principium et videam
deum praesupponentem sui principium et videam deum procedentem ab utroque et
non videam tres deos sed unitatem deitatis in trinitate, id quod sic video distincte
in indistincta deitate verius et perfectius esse non dubito quam ego videam. [...]
Sed quia subtilius sancti hoc viderunt quam nos, satis sit nos ad hoc devenisse
quod sicut perfectio principii deposcit quod sit unum, ita deposcit veraciter quod
sit trinum. Cf. também: Ibid., h. XI2, n. 53, p. 64, linhas 5-15: BERNARDUS: [...]
dimisso motu qui sciri potest convertit se mens ad videndum motum qui sciri
nequit et non quaerit ipsum nec per nomen nec conceptum nec scientiam, immo
per omnium quae de motu sciuntur ignorantiam. Scit enim se nequaquam illum
motum videre, quamdiu aliquid horum manet. Tunc ad non-esse motus pertingens
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propius ad quaesitum ascendit, id enim quod se tunc supra esse et non-esse ipsius
motus offert taliter quod quid sit penitus ignorat, quia est supra omne nomen. Ibi
ignorantia est perfecta scientia, ubi non-esse est essendi necessitas, ubi ineffabile
est nomen omnium nominabilium.
551 Ibid., h. XI2, n. 46, p. 56-57, linhas 7-10: BERNARDUS: Utique trinitas in principio
est principium et non est a numero, qui non potest esse ante principium. ‘Omnis’
enim ‘multitudinis unitas est principium’. Si igitur trinitas in divinis esset numerus,
et principiata a se ipsa esset.
552 Ibid., h. XI2, n. 50, p. 60-61: CARDINALIS: Non esset enim unitas naturalis et
perfectissima, nisi in se haberet omnia quae ad perfectissimum principium sunt
necessaria, quae per trinitatem exprimuntur. Neque trinitas esset perfecta, nisi
esset una quae unitas. Non enim unitas quae de deo dicitur est mathematica, sed
est vera et viva omnia complicans. Nec trinitas est mathematica, sed vivaciter
correlativa. Unitrina enim vita est, sine qua non est laetitia sempiterna et perfectio
suprema. Unde de essentia perfectissimae vitae est, quod sit perfectissime unitrina,
ut posse vivere sit adeo omnipotens, quod de se sui ipsius generet vitam. A quibus
procedit spiritus amoris et laetitia sempiterna.
553 Ibid., h. XI2, n. 7, p. 8, linhas 2-8: CARDINALIS: Nominabo autem hanc quam
sic videmus aeternitatem deum gloriosum. Et dico nunc nobis constare deum ante
actualitatem, quae distinguitur a potentia, et ante possibilitatem, quae distinguitur ab
actu, esse ipsum simplex mundi principium. Omnia autem quae post ipsum sunt cum
distinctione potentiae et actus, ita ut solus deus id sit quod esse potest, nequaquam 400
autem quaecumque creatura, cum potentia et actus non sint idem nisi in principio.
554 Ibid., h. XI2, n. 8, p. 9, linhas 6-10: CARDINALIS: Nihil enim esse potest, quod deus
actu non sit. Hoc facile videt quisque attendens absolutam potentiam coincidere
cum actu. Secus de sole. Nam licet sol sit actu id quod est, non tamen id quod esse
potest. Aliter enim esse potest quam actu sit.
555 Ibid., h. XI2, n. 8, p. 9, linhas 11-13: BERNARDUS: Prosequere, pater. Nam certum
est nullam creaturam esse actu omne id quod esse potest, cum dei potentia creativa
non sit evacuata in ipsius creatione, [...].
556 De docta ignorantia. w. L. I, cap. IV, n. 11, p. 16, linhas 13-18: Quare
maximum absolute cum sit omne id, quod esse potest, est penitus in actu; et sicut
non potest esse maius, eadem ratione nec minus, cum sit omne id, quod esse
potest. Minimum autem est, quo minus esse non potest. Et quoniam maximum est
huiusmodi, manifestum est minimum maximo coincidere. (A douta ignorância.
L. I, cap. IV, n. 11, p. 9).
557 Ibid., w. L.II, cap. I, n. 97, p. 12, linhas 1-8; 13-22: Solum igitur absolute
maximum est negative infinitum; quare solum illud est id, quod esse potest omni
potentia. Universum vero cum omnia complectatur, quae Deus non sunt, non potest
esse negative infinitum, licet sit sine termino et ita privative infinitum; et hac
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consideratione nec finitum nec infinitum est. Non enim potest esse maius quam est;
hoc quidem ex defectu evenit; possibilitas enim sive materia ultra se non extendit.
[...]. Quare, licet in respectu infinitae Dei potentiae, quae est interminabilis,
universum posset esse maius: tamen resistente possibilitate essendi aut materia,
quae in infinitum non est actu extendibilis, universum maius esse nequit; et ita
interminatum, cum actu maius eo dabile non sit, ad quod terminetur; et sic privative
infinitum. Ipsum autem non est actu nisi contracte, ut sit meliori quidem modo, quo
suae naturae patitur conditio. Est enim creatura, quae necessario est ab esse divino
simpliciter absoluto, [...]. (Ibid., L. II, cap. I, n. 97, p. 69-70).
558 Trialogus de possest. h. XI2, n. 8, p. 9, linhas 17-22: CARDINALIS: Recte dicis.
Cum igitur haec sic se habeant, quod deus sit absoluta potentia et actus atque
utriusque nexus et ideo sit actu omne possibile esse, patet ipsum complicite esse
omnia. Omnia enim, quae quocumque modo sunt aut esse possunt, in ipso principio
complicantur, et quaecumque creata sunt aut creabuntur, explicantur ab ipso, in
quo complicite sunt.
559 Ibid., h. XI2, n. 9, p. 10-11, linhas 8-25: IOHANNES: Igitur deus est magnus.
/ CARDINALIS: Utique est magnus; sed sic magnus quod magnitudo quae est omne
id quod esse potest. Nam non est magnus magnitudine quae maior esse potest aut
magnitudine quae dividi et minui potest quemadmodum creata quantitas, quae non
est id quod esse potest. / BERNARDUS: Si ergo deus est magnus magnitudine quae id
est quod esse potest et – ut dicis – quae maior esse non potest et quae minor esse non
potest, tunc deus est magnitudo maxima pariter et minima. / CARDINALIS: Utique
non errat dicens deum magnitudinem absolute maximam pariter et minimam; quod 401
non est aliud dicere quam infinitam et impartibilem, quae est omnis magnitudinis
finitae veritas et mensura. Quomodo enim foret maior alicui quae sic est maxima
quod et minima? Seu quomodo minor alicui quae sic est minima quod maxima? Aut
quomodo non est omnis magnitudinis essendi aequalitas quae omne id est actu quod
esse potest? Utique essendi aequalitas esse potest. André considera que a função
do ‘Possest’ é a de exprimir a modalidade interna do ser do princípio fundante
que se mostra como uma natureza coincidencial ou supra-coincidencial. O
possest, portanto, mostraria o princípio na “sua plena identidade, anterior
a qualquer diferença e fonte de toda a diferença, mas pensada agora
aqui no plano mais radical da sua produtividade e fecundidade” (1997,
p. 264). Assim, no possest pode-se ver a “coincidência de potência e ato”;
a “coincidência de movimento absoluto e absoluto repouso”; pode-se ver
que a “eternidade coincide com qualquer modalidade temporal”. Além
disso, no “Possest” coincide ser e não-ser, pois o ‘Possest’ é o não ser das
criaturas subjacentes ao seu processo de mudança; o ‘Possest’ reúne em
si o ser de cada ente com o respectivo não ser; a coincidência entre ser e
não ser, para que se possa intuir, na sua eternidade, o ‘antes’ dessa mesma
distinção entre ser e não ser; no ‘Possest’ junta-se o poder fazer com o poder
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ser feito, e, nessa medida, ele é inclusivamente coincidência de potência
ativa e de potência passiva, ou melhor, é anterior a qualquer disjunção entre
uma e outra, a qual só tem sentido numa linguagem que se circunscreve
no âmbito das criaturas; no ‘Possest’ coincide a Forma formante e forma
formável (p. 264-268). Por fim, ele conclui que “Tanto na noção de forma
de toda a forma formável como na articulação inerente ao ‘Possest’ entre o
poder fazer e o poder ser feito, vislumbra-se já a dimensão trinitária deste
princípio, expressa na unidade vocabular que o traduz. ‘Possest’ é a união
do ‘posse’ com o ‘esse’ no acto (‘est’) dessa mesma união. Daí que o nome de
‘Possest’ seja sumamente adequado para exprimir o caráter unitrinitário
do princípio fundante, que, no absoluto, tem uma dimensão perfeitíssima
que se aplica a qualquer um dos elementos dessa Trindade” (p. 268). No
De possest, segundo Elpert, a lógica convencional fundada no princípio da
não-contradição seria substituída por uma lógica coincidencial expressa no
enigma do “IN”: “Das ‘IN’ ist aber nicht das Absolute selbst, sondern nur ein
geeigneter Spiegel, so meint Bredow. Das ‘IN’, so zeigt unsere Untersuchung
hier, ist aber weit mehr als nur ein geeigneter Spiegel. Es spiegelt nicht nur
etwas wider, sonder es ist ein geeignetes Instrument, um in Gott und in alles
einzutreten und Betrachtungen über das Göttliche anzustelle. Wenngleiche
das Wort ‘IN’ sicherlich nicht Gott selbst ist, so steht es doch in ganz engem
Zusammenhang mit der Unendlichkeit Gottes, wie die Randbemerkungen
zum „Prokloskommentar“ von Cusanus deutlich zeigen. Insofern erlaubt
das Wort ‘IN’ als ein ins Bild gewandeltes Wort, annäherungsweise etwas
vom Göttlichen zu erblicken. Sprache bzw. eine kleinste Spracheinheit 402
lässt sich in ein Bild umwandeln, um so die menschlicher Logik folgenden
Aussagen zu transformieren und in eine ‘koinzidenzielle’ Aussageweise,
die jenseits der herkömmlichen Logik liegt, überzuführen. Dabei bleibt das
Rätselwort bzw. das Bildwort ‘IN’ unerschöpflich. In seiner die Endlichkeit
sprengenden Kraft bleibt es selbst unaussprechlich und kann nur von Gott,
dem ‘possest’, erfüllend entfaltet werden in vernehmbares Reden. Das
‘possest’ ist das göttliche ‘verbum’, ‘quod est elocutio omnium dicibilium’
(2002, p. 331). Por sua vez, Bauchwitz considera que “o nome possest,
[...] deve ser elucidado e inferido necessariamente a partir da metafísica
cusana” (2006, p. 45). Pois, poderíamos acrescentar com o autor, “Nicolau
não abandona o começo de sua metafísica, trata de nomear a deus nas
condições já estabelecidas, levando ao máximo possível o disposto pelo
princípio da coincidência dos opostos” (2006, p. 47). Por outro lado, ao
buscar pensar os nomes divinos a partir da perspectiva aberta pelo De
coniecturis, González Ríos enfatiza que o “possest”, como uma manuductio,
conduz o que especula para a visão mística, que supera os sentidos, a razão e
o intelecto. Portanto, ele considera que o Deus escondido é também anterior
à região do entendimento, na qual os opostos coincidem, e, assim, ele pode
concluir: “[…] el nombre divino “possest” posee una fuerza expresiva tal que
conduce al que especula más allá de la potencia sensible, en la que no hay
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discreción, más allá de la potencia racional, en la que hay discreción pero con
oposición, esto es, de modo disyuntivo [disiunctive], pero también más allá
de la potencia intelectual, en la que hay también discreción con coincidencia,
esto es, de modo copulativo [copulative]. Por lo cual, el “possest” en tanto
nombre que expresa el concepto humano de lo divino guía hacia el principio
mismo de la coincidencia de los opuestos, esto es, el principio simple de todas
las cosas”. Em segundo lugar, enfatiza que “[…] también el “possest” es
un nombre divino que recoge la propuesta cusana de pensar más allá de la
coincidencia de los opuestos, tal como fue presentada en De coniecturis. De aquí
que por medio del neologismo “possest” se ponga de manifiesto no sólo la
naturaleza coincidencial de la unidad simple de lo absoluto sino también
su carácter supra coincidencial, pues si en lo sensible y visible el principio
se manifiesta de modo confuso en cuanto a la actualidad y la posibilidad, en
la razón como opuestos y en el entendimiento de modo coincidencial, en lo
absoluto, tal como es en sí mismo, se expresa su anterioridad respecto de la
coincidencia de acto y potencia. (2010, p. 219).
560 Trialogus de possest. h. XI2, n. 10, p. 12, linhas 1-9: BERNARDUS: Grata
sunt haec. Sed sicut video, nec nomen nec res nec quicquam omnium, quae creatae
magnitudini conveniunt, convenienter de deo dicuntur, cum differant per infinitum.
Et fortassis non solum in magnitudine hoc verum, sed in omnibus quae de creaturis
verificantur. / CARDINALIS: Recte concipis, Bernarde. Et hoc ipsum apostolus
insinuat, cum faceret inter illa quae in creaturis attinguntur et in deo differentiam
uti est inter visibilia et invisibilia, quae utique in infinitum distare affirmamus. Cf. 403
De docta ignorantia. w. L. I, cap. III, n. 9, p. 12-14, linhas 4-8: Quoniam ex se
manifestum est infiniti ad finitum proportionem non esse, est et ex hoc clarissimum,
quod, ubi est reperire excedens et excessum, non deveniri ad maximum simpliciter,
cum excedentia et excessa finita sint. Maximum vero tale necessario est infinitum.
(A douta ignorância. L. I, cap. III, n. 9, p. 7).
561 Trialogus de possest. h. XI2, n. 10, p. 12-13, linhas 10-11: IOHANNES:
Quantum capio, in his paucis multa valde continentur. Nam si dico ex pulchritudine
creaturarum deum pulchrum et scio quod deus est ita pulcher quod pulchritudo
quae est omne id quod esse potest, scio nihil pulchri totius mundi deficere deo
ac quod omnis quae potest creari pulchritudo non est nisi quaedam similitudo
improportionalis ad illam quae actu est omnis essendi possibilitas pulchritudinis,
quae non potest esse aliter quam est, cum sit id quod esse potest. Ita de bono, de
vita et aliis, sic et de motu. Nullus enim motus est in fine seu id quod esse potest nisi
qui deo convenit, qui est motus maximus pariter et minimus seu quietissimus. Et
ita mihi videris dicere. Sed haesito, an in simili convenienter dici possit deum esse
solem aut caelum sive hominem aut aliud tale.
562 Ibid., h. XI2, n. 11, p. 13-14, linhas 1-4 ; 9-11: CARDINALIS: Non est vocabulis
insistendum. Nam si dicitur deum esse solem, utique si intelligitur hoc sane de
sole qui est omne id actu quod esse potest, tunc clare videtur istum solem non
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esse aliquid simile ad illum. [...]. Sic quidem de omnibus creaturis pariformiter.
Non refert igitur quomodo deum nomines, dummodo terminos sic ad posse esse
intellectualiter transferas.
563 Ibid., h. XI2, n. 14, p. 17, linha 1: CARDINALIS: Cepisti, abba, propositi radicem [...].
5645 Ibid., h. XI2, n. 13, p. 16-17, linha 9-16: IOHANNES: Optime nos instruis, pater.
Videtur mihi ex uno te omnia elicere. Deus ergo est omnia, ut non possit esse aliud.
Ita est undique, ut non possit esse alibi. Ita est omnium adaequatissima mensura,
ut non possit esse aequalior. Sic de forma et specie et cunctis. Nec est hac via
difficile videre deum esse absolutum ab omni oppositione et quomodo ea, quae nobis
videntur opposita, in ipso sunt idem et quomodo affirmationi in ipso non opponitur
negatio et quaeque talia.
565 Como já referimos acima, o posse ipsum será o último nome divino
proposto pelo Cusano. No entanto, a consciência da simplicidade do posse
ipsum como nome divino virá somente depois das reflexões sobre o posse
fieri no De venatione sapientiae e aparecerá, inicialmente, no Compendium, mas
será tematizado com toda a força no De apice theoriae.
566 Trialogus de possest. h. XI2, n. 14, p. 17, linhas 1-10: CARDINALIS: Cepisti, abba,
propositi radicem et vides hanc contemplationem per multos sermones inexplicabilem
brevissimo verbo complicari. Esto enim quod aliqua dictio significet simplicissimo
significato quantum hoc complexum ‘posse est’, scilicet quod ipsum posse sit. Et quia
quod est actu est, ideo posse esse est tantum quantum posse esse actu. Puta vocetur
possest. Omnia in illo utique complicantur, et est dei satis propinquum nomen 404
secundum humanum de eo conceptum. Est enim nomen omnium et singulorum
nominum atque nullius pariter. Nesse mesmo parágrafo, Nicolau encontra o
fundamento do possest também na revelação divina: Ideo dum deus sui vellet
notitiam primo revelare, dicebat: ‘Ego’ sum ‘deus omnipotens’, id est sum actus omnis
potentiae. Et alibi: ‘Ego sum qui sum.’ Nam ipse est qui est. Quae enim nondum sunt
id quod esse aut intelligi possunt, de illis absolutum esse non verificatur. Habet autem
Graecus: Ego sum entitas, ubi nos: ‘Ego sum qui sum.’ Est enim forma essendi seu
forma omnis formabilis formae. Creatura autem, quae non est quod esse potest, non
est simpliciter. Solus deus perfecte et complete est (linhas 10-18).
567 Cf. ANDRÉ (1997, p. 263).
568 Trialogus de possest. h. XI2, n. 15, p. 19-20, linhas 1-10: CARDINALIS: Ducit
ergo hoc nomen speculantem super omnem sensum, rationem et intellectum in
mysticam visionem, ubi est finis ascensus omnis cognitivae virtutis et revelationis
incogniti dei initium. Quando enim supra se ipsum omnibus relictis ascenderit
veritatis inquisitor et reperit se amplius non habere accessum ad invisibilem deum,
qui sibi manet invisibilis, cum nulla luce rationis suae videatur, tunc exspectat
devotissimo desiderio solem illum omnipotentem et per sui ipsius ortum pulsa
caligine illuminari, ut invisibilem tantum videat quantum se ipsum manifestaverit.
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INOMINÁVEL” EM NICOLAU DE CUSA
NOTAS
569 Ibid., h. XI2, n. 16, p. 20, linha 4: IOHANNES: Quomodo intelligis in possest
omnia complicari?
570 Ibid., h. XI2, n. 17, p. 21, linha 1-2: IOHANNES: Sed quomodo intelligis
ascendentem supra se ipsum constitui oportere?
571 Ibid., h. XI2, n. 18, p. 23, linha 1-6: BERNARDUS: Quamvis constet mihi omnibus
diebus meis contemplationis cibum posse ex praemissis elicere et sermones
multiplicare et semper proficere, optamus tamen aliquo sensibili phantasmate
manuduci, maxime quomodo aeternum est omnia simul et in nunc aeternitatis tota,
ut ipso phantasmate relicto salientes supra omnia sensibilia elevemur.
572 Para o enigma do jogo do pião cf.: Ibid., h. XI2, n. 18-23, p. 23-29.
573 Ibid., h. XI2, n. 24, p. 30, linhas 7-21: CARDINALIS: Nam si quis se ad lineam
convertit et applicat ipsum possest, ut videat possest lineale, hoc est ut videat
lineam illud esse actu quod esse potest et omne id esse quod lineam fieri posse
intelligit, utique ex sola illa ratione quia est possest ipsam videt lineam maximam
pariter et minimam. Nam cum sit id quod esse potest, non potest esse maior: sic
videtur maxima, nec minor: sic videtur minima. Et quia est id quod linea fieri potest,
ipsa est terminus omnium superficierum. Sic et terminus figurae triangularis,
quadrangularis et omnium polygoniarum et omnium circulorum et figurarum
omnium, quae fieri possunt ex linea sive recta sive curva, et omnium figurarum
exemplar simplex, verissimum et adaequatissimum et aequalitas in se omnes
habens et per se omnia figurans. Et ita unica figura omnium figurabilium linealiter
et ratio una atque causa omnium quantumcumque variarum figurarum. 405
574 Ibid., h. XI2, n. 25, p. 30-32: CARDINALIS: In hoc aenigmate vides quomodo si
possest applicatur ad aliquod nominatum, [quomodo] fit aenigma ad ascendendum
ad innominabile, sicut de linea per possest pervenisti ad indivisibilem lineam
supra opposita exsistentem, quae est omnia et nihil omnium lineabilium. Et non est
tunc linea, quae per nos linea nominatur, sed est supra omne nomen lineabilium.
Quia possest absolute consideratum sine applicatione ad aliquod nominatum te
aliqualiter ducit aenigmatice ad omnipotentem, ut ibi videas omne quod esse ac fieri
posse intelligis supra omne nomen, quo id quod potest esse est nominabile, immo
supra ipsum esse et non-esse omni modo, quo illa intelligi possunt. Nam non-esse
cum possit esse per omnipotentem, utique est actu, quia absolutum posse est actu in
omnipotente. Si enim ex non-esse potest aliquid fieri quacumque potentia, utique in
infinita potentia complicatur. Non esse ergo ibi est omnia esse. Ideo omnis creatura,
quae potest de non-esse in esse perduci, ibi est ubi posse est esse et est ipsum possest.
575 Ibid., h. XI2, n. 26, p. 32: CARDINALIS: Ex quo te elevare poteris, ut supra esse et
non-esse omnia ineffabiliter, aenigmatice tamen, videas, quae de non-esse per actu
esse omnia in esse veniunt. Et ubi hoc vides, verissime et discretissime nullum nomen
nominabile per nos invenis. Illi enim principio non convenit nec nomen unitatis seu
singularitatis nec pluralitatis aut multitudinis nec aliud quodcumque nomen per
nos nominabile seu intelligibile, cum esse et non-esse ibi sibi non contradicant nec
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NOTAS
alia quaecumque opposita aut discretionem affirmantia vel negantia. Eius enim
nomen est nomen nominum et non plus singulare singulorum quam universale
simul omnium et nullius.
576 Ibid., h. XI2, n. 27, p. 32-33, linhas 1-10: BERNARDUS: Intelligo te dicere quomodo
hoc nomen compositum possest de posse et esse unitum habet simplex significatum
iuxta tuum humanum conceptum ducentem aenigmatice inquisitorem ad aliqualem
de deo positivam assertionem. Et capis posse absolutum prout complicat omne
posse supra actionem et passionem, supra posse facere et posse fieri. Et concipis
ipsum posse actu esse. Hoc autem esse quod actu est omne posse esse dicis, id est
absolutum. Et ita vis dicere quod ubi omne posse actu est, ibi pervenitur ad primum
omnipotens principium.
577 Ibid., h. XI2, n. 27, p. 33, linhas 13-17; 20-21: CARDINALIS: Optime. Principium
igitur suam vim omnipotentem in nullo quod esse potest evacuat. Ideo nulla creatura
est possest. Quare omnis creatura potest esse quod non est. Solum principium quia
est ipsum possest, non potest esse quod non est. [...] / IOHANNES: Est igitur absoluta
necessitas, cum non possit non esse.
578 Ibid., h. XI2, n. 28, p. 34, linhas 6-10: IOHANNES: Nam increata possibilitas
est ipsum possest. Unde quod mundus ab aeterno potuit creari, est quia possest
est aeternitas. Non est igitur verum aliud requiri ad hoc quod possibilitas essendi
mundum sit aeterna nisi quia possest est possest, quae est unica ratio omnium
modorum essendi.
579 Ibid., h. XI2, n. 30, p. 35, linhas 1-8: IOHANNES: Maxima sunt quae aperis,
406
pater. Nam omnia in possest sunt et videntur ut in sua causa et ratione, licet nullus
intellectus capere possit ipsum nisi qui est ipsum. / CARDINALIS: Intellectus noster quia
non est ipsum possest – non enim est actu quod esse potest; maior igitur et perfectior
semper esse potest –, ideo ipsum possest licet a remotis videat, non capit. Solum
ipsum possest se intelligit et in se omnia, quoniam in possest omnia complicantur.
580 Ibid., h. XI2, n. 30, p. 35-36, linhas 9-16: IOHANNES: Bene considero quomodo
omnia de possest negantur, quando nullum omnium quae nominari possunt sit
ipsum, cum possit esse id quod non est. Ideo quantitas non est. Quantitas enim cum
possit esse id quod non est, non est possest. Puta potest esse maior quam est aut
aliud quam est; sed non sic possest, cui nec maioritas quae esse potest aut quicquam
quod esse potest deest. Ipsum enim posse est actu perfectissimum.
581 Ibid., h. XI2, n. 31, p. 36: IOHANNES: Sed nunc subiunge quaeso, postquam ille
superadmirabilis deus noster nullo quamvis etiam altissimo ascensu naturaliter
videri possit aliter quam in aenigmate, ubi potius posse videri quam visio attingitur
et in caliginem umbrosam pervenit inquisitor: quomodo ergo demum ille qui manet
semper invisibilis videatur? CARDINALIS: Nisi posse videri deducatur in actum per
ipsum qui est actualitas omnis potentiae per sui ipsius ostensionem, non videbitur.
Est enim deus occultus et absconditus ab oculis omnium sapientum, sed revelat se
parvulis seu humilibus, quibus dat gratiam. Est unus ostensor, magister scilicet
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NOTAS
Iesus Christus. Ille in se ostendit patrem, ut qui eum meruerit videre qui est filius,
videat et patrem. Duas temáticas que estão ligadas entre si serão apresentadas
nos parágrafos seguintes. Por um lado, o papel fundamental da cristologia
cusana no contexto do De possest, pois é por meio de Cristo, enquanto
possuímos seu espírito, que podemos conhecer a Deus; e, por outro lado,
a reflexão sobre o desejo de ver Deus como o impulso que nos impulsiona
na busca. Aquele que deseja ver Deus deve desejar de um modo tal que o
seu poder desejar seja atualizado, ou seja, que possa desejar tanto quanto
possa desejar. Liga-se a esta temática o problema da felicidade humana que
é ver intelectualmente o próprio onipotente, ou seja, é a realização daquele
desejo por meio do qual todos desejamos conhecer (para esses temas cf.
Ibid., h. XI2, n. 32-39, p. 37-47).
582 Ibid., h. XI2, n. 51, p. 62-63, linhas 1-12: IOHANNES: Quaeso parum audiri, si
forte aliquid de his altispercepi. Et ad possest me converto. Cum omne quod est non
sit nisi id quod potest esse, possest formam verissimam et adaequatissimam. Sed in
omni re video video omnium formabilium formam verissimam et adaequatissimam.
Sed in omni re video posse, esse et utriusque nexum, sine quibus impossibile est
ipsam esse, et illa video in qualibet re sic esse quod perfectius esse possunt. Ideo
ubi haec sunt adeo perfecta quod perfectius esse nequeunt, ut in possest, ibi video
omnium exsistentium unitrinum principium. In perfectione igitur primi principii
necesse est omnium principiabilium esse perfectionem. Quae si maior concipi
posset, utique non esset perfectio principii sed principiati.
583 Sobre a anterioridade do possest em relação ao ser e ao não-ser e como a 407
negação mostra essa anterioridade: cf. Ibid., h. XI2, n. 67, p. 79, linhas 1-15:
CARDINALIS: Negatio igitur quae cadit super esse negat esse illud sic nominatum esse
praesuppositum, quod non est aliud dicere nisi quod esse post non-esse nequaquam
est esse aeternum et ineffabile. / IOHANNES: Negare ista nequeo. CARDINALIS: Sic verius
video deum quam mundum. Nam non video mundum nisi cum non-esse et negative,
ac si dicerem: Mundum video non esse deum. Deum autem video ante non-esse; ideo
nullum esse de ipso negatur. Esse igitur ipsius est omne esse omnium quae sunt
aut esse quoquomodo possunt. Hoc nulla alia via absque phantasmate simplicius
et verius videri potest. Per negativam enim praesuppositum ipsum, quod non-esse
antecedit, entitatem omnis esse in aeternitate simplici intuitu vides, a quo omne
quod non-esse sequitur negas.
584 Ibid., h. XI2, n. 52-53, p. 63-64, linhas 1-12: BERNARDUS: Audi quaeso me, si
huius tui dicti habeo intellectum. Et converto me ad motum. In essentia enim illius
video primo posse et ab illo generari actum atque ab utroque procedere movere,
qui est nexus ipsius posse et actus. Omnis autem - motus qui concipi potest non est
sicut esse potest motus, quia potest esse tardior et velocior motus, et ideo in posse
ipsius non est actus et nexus utriusque, quando non movetur actus sicut potest
moveri. Sed si motus esset id quod esse potest, tunc in posse foret actus et nexus
aequaliter. Quantum posset tantum in posse esset actu. Et talis esset utriusque
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NOTAS
nexus. Ita de esse et nexu. Sed hic motus non intelligeretur. Nam cum esset id quod
esse potest motus, utique neque maior neque minor esse posset et ita foret maximus
pariter et minimus, velocissimus pariter et tardissimus seu quietissimus. Et quia
foret motus cui quies non opponitur, ideo sublata oppositione nomen motus sibi
non competeret, immo non plus foret motus quam non-motus, licet foret exemplar,
forma, mensura et veritas omnis motus. Motus autem qui intelligitur, cui quies
opponitur, ille intelligitur, quia terminatur quiete ei opposita, et concipitur per
finitum conceptum. Quando igitur intelligitur hunc conceptum de motu non esse
conceptum motus qui id est quod esse potest, licet qualis ille sit intelligi nequeat,
dimisso motu qui sciri potest convertit se mens ad videndum motum qui sciri
nequit et non quaerit ipsum nec per nomen nec conceptum nec scientiam, immo
per omnium quae de motu sciuntur ignorantiam. Scit enim se nequaquam illum
motum videre, quamdiu aliquid horum manet. Tunc ad non-esse motus pertingens
propius ad quaesitum ascendit, id enim quod se tunc supra esse et non-esse ipsius
motus offert taliter quod quid sit penitus ignorat, quia est supra omne nomen. Ibi
ignorantia est perfecta scientia, ubi non-esse est essendi necessitas, ubi ineffabile
est nomen omnium nominabilium. Haec sic ex tuis dictis – nescio si bene – collegi.
585 Ibid., h. XI2, n. 51, p. 63, linhas 13-22: CARDINALIS: Ita oportet quod humanus
intellectus, qui primum principium sibi absconditum uti est capere nequit, ex
principiatis intellectis – ut Paulus nos instruit – videat. Oportet ergo, si posse debet
esse perfectissimum, quod in ipso sit esse et utriusque nexus. Sic si esse debet esse
perfectissimum, oportet quod in ipso sit posse et utriusque nexus. Et si nexus debet
esse perfectissimus, oportet in ipso esse posse et actum seu esse. Haec ergo videmus 408
necessario in perfectissimo unitrino principio, licet quomodo haec se habeant,
omnem intellectum exsuperet.
586 Sobre a força significativa do IN: “Ein sagbares Wort kommt dem
menschlichen Intellekt zu Hilfe, um dem unsagbaren, ewig absoluten Wort
näher zu kommen. Es wird zum Spiegel einer bzw. der göttlichen erhabenen
Theologie, wie sie Cusanus durch sein Koinzidenzprinzip entwickelt hat, die
sich weder einer rein affirmativen noch einer rein negativen Aussagewiese
verschreiben möchte, sondern die sich im sinne der ‘docta ignorantia’ dem
Grundsatz der ‘coincidentia oppositorum’ verpflichtet weiss. Das Wort ‘IN’
spiegelt so einen grundlegenden cusanischen Gedanken wieder, der heisst:
Gott in allem alles, in Nichts ist er nichts. Dieser Gedanke findet sich seit ‘De
docta ignorantia’ bis hin zun ‘De venatione sapientiae’ immer wieder. Ihm
kommt gleichsam eine Schlüsselstellung im gesamten cusanischen Werk
zu“ (ELPERT, 2002: 330).
587 Trialogus de possest. h. XI2, n. 54, p. 65-66, linhas 3-9; 10-14; 18-26:
IOHANNES: Nam licet aenigmata multa nos ducant, sine quibus ad incognitum deum
non habemus accedendi modum – oportet enim ad aliquod cognitum respicere
incognitum quaerentem –, tamen in minimis principia maxime relucent. Capio
igitur abbreviatum verbum concisum valde puta IN. [...]. Primo ad figuram eius
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NOTAS
adverto quomodo est ex tribus aequalibus lineis quasi unitrinum et quomodo I
et N per spiritum conexionis nectuntur. In ipso enim IN est primo I, deinde N et
utriusque nexus, ut sit una simplex dictio IN I et N et utriusque nexu consistens.
[...]. In N enim est I explicatum. Unde si I additur ad N, non plus vocis habetur.
Iam enim erat in N eius virtus. N enim non consonat ipsi E quasi N sit EN, sed ipsi
I ut sit IN, ut sciunt illi, qui Graecarum litterarum peritiam habent. Nexus igitur
utriusque naturalissimus est. Figura igitur unitrini principii conveniens ipsius IN
videtur. Deinde adverto quomodo est primo I, scilicet principium. Ex quo N, ubi se I
primo manifestat. N enim est notitia, nomen seu relatio potentiae ipsius I principii.
588 Ibid., h. XI2, n. 55, p. 66-67, linhas 7-16: Deinde considero quomodo per IN
intratur in deum et omnia. Nam omnia quae nominari possunt nihil nisi IN in se
continent. Si enim IN non esset, nihil in se omnia continerent et vacua penitus
forent. Dum enim intueor in substantiam, video ipsum IN substantiatum, si in
caelum caelestiatum, si in locum locatum, si in quantum quantificatum, si in quale
qualificatum, et ita de omnibus quae dici possunt. Quare in termino est terminatum,
in fine finitum, in altero alteratum. Si vero video ipsum IN ante omne nomen, utique
nec terminatum nec finitum nec aliquod esse video omnium quae nominari possunt.
Quaecumque vero video in IN, video ineffabilitatem intrasse. Nam si video finem
aut terminum in IN, non possum amplius ipsum nominare aut finem aut terminum.
Transivit enim in IN, quod nec est finis nec terminus. Unde secundum hoc videretur
mu|tasse nomen in oppositum, ut nominetur terminus in IN interminus seu non-
terminus. Et quia IN, quod omnia implet et sine quo omnia sunt vacua, inest et
immanet, integrat et informat, ideo est perfectio omnis rei, omnis termini et omnis 409
finis et omnium. Patet IN plus esse quam finis aut terminus, ut finis in IN non
desinat esse finis, sed sit valde finis et finis in fine seu finis finium, ut non vocetur
finis, quia non finitur omni fine, sed excedit. Sic enim omnia quando in absoluto
videntur fiunt ineffabilia. IN igitur in suo simplicissimo significato complicat simul
affirmationem et negationem, quasi I sit ita et N sit non, quae in IN conectantur.
IN enim dum adicitur aliis dictionibus, aut est affirmatio aut negatio, in se vero
utriusque complicatio.
589 Ibid., h. XI2, n. 57, p. 69, linhas 7-16: BERNARDUS: Quoniam abbas per verbum
breve et concisum se intrasse in profunda ostendit, ne ego nil dicendo videar in
vacuum tot alta audisse, dicam quoddam aenigma non reiciendum in ipso possest:
Video E simplicem vocalem unitrinam. Nam est vocalis ipsius possE, ipsius Esse et
nExus utriusque. Vocalitas eius utique simplicissima est trina. Et ut refertur ad posse
non refertur ad esse et ut refertur ad Esse non refertur ad posse et ita ut refertur
ad nExum utriusque non refertur nec ad posse nec ad esse sed nExum. Has igitur
relationes in ipso E inconfusas et quamlibet per se veram et perfectam video non esse
tres vocales seu vocalitates sed unam simplicissimam et indivisibilem vocalitatem.
Cum igitur haec sic mente contemplor, magnum mihi praebet haec aenigmatica
visio fidei orthodoxae argumentum, ut deum unitrinum simplicissimum credam
principium esse in mundo aliquali similitudine licet remotissima ut vocalitas
ipsius E in possest, a quo mundus habet quod potest esse et quod est et conexionem
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NOTAS
utriusque. Sicut enim probatur vocalitatem E dare omnia ipsi possest, quoniam E
sublato penitus desinit esse dictio significativa, sic deo sublato mundus penitus
desineret. Nec opus video ut de hac aenigmatis assimilativa proprietate plura
dicam, cum vos ipsi melius me applicare possitis.
590 Cf. GONZÁLES RÍOS (2010, p. 209-210): “Del esquema de Haubst deseamos
destacar, en primer lugar, la fecunda multiplicidad de enigmas que presenta
el Cusano en esta obra, algunos de los cuales, como el de la línea y el círculo
infinitos, ya fueron utilizados por él en textos precedentes. Todo lo cual nos
permite afirmar que se trata de una obra profundamente simbólica, en la que
una vez más se pone de manifiesto el carácter simbólico de su pensamiento,
tal como lo expresara ya en el Capítulo 11 del Libro Primero de De docta
ignorancia: “Todos nuestros más sabios y santos doctores están de acuerdo en que
las cosas visibles auténticamente son imágenes de las invisibles y que el creador
puede, de tal manera, ser visto cognosciblemente por las creaturas como si se le
viera en un espejo y en un enigma”.
591 Trialogus de possest. h. XI2, n. 56, p. 67-68, linhas 7-16: CARDINALIS: Subtiliter
considerasti, pater abba, et satis est fecundum aenigma tuum, quoniam in spiritum
ducit. Nam quae in deo sunt nemo scit nisi spiritus dei sicut quae in homine spiritus
hominis. Ipsum igitur IN est aenigma spiritus omnia scrutantis. Sed qui per ipsum
IN maiestatem dei intrare nititur, ut perscrutator opprimitur a gloria. Non enim
IN ipsum quod notatur et intelligitur est lumen illuminans incomprehensibilitatis
ipsius deitatis in se ipsa absolutae ostensionem, sed IN et omnia nomina, quae
infinitatem deo attribuunt, eius incomprehensibilitatem nituntur ostendere per 410
supereminentiam. No termo per supereminentiam, Hopkins vê o método do
conhecimento de Deus per eminentiam. De fato, ele assim traduz a parte final
do texto acima: “rather, both “in” and all the other names which ascribe
infinity to God attempt to show by the method of supereminence His
inapprehensibility” (n. 57, p. 131) e em nota justifica: “The way of super-
eminence is illustrated by Nicholas’s example of in: “Clearly, in is more than
a limit or a boundary. Thus, in in a limit does not cease to be a limit; rather,
it is all the more a limit. It is a limit within a limit (or a limit of limits), so
that it is not called a limit, since it is not limited by any limit but rather
surpasses [every limit]” (nota 80, p. 177-178).
592 Cf. ELPERT (2002, p. 331): o autor questiona o que poderíamos alcançar
por meio do enigma IN e, poderíamos acrescentar, por meio de qualquer
enigma? O enigma permanece um enigma e nada mais: “Was aber kann diese
spekulative Entfaltung eines simplen Wortes wie ‘IN’ tatsächlich erreichen?
Es ist und bleibt ein Rätselbild, nicht mehr aber auch nicht weniger. ein
Rätselbild, das der schöpferische spielerische Geist des Menschen selbst
erdacht hat, um menschlichen Geist, der ‘omnia scrutantis’ in bleibender
Unruhe Nahrung für sich sucht. Dabei darf das Rätselbild nicht falsch
verstanden werden, als ob man damit in Gott selbst eindzudringen vermag,
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NOTAS
es erlaubt auf keinen Fall, die Unbegreiflichkeit Gotts selbst zu erhellen
oder zu begreifen. Seine Aufgabe und Stärke liegt allein darin, (per
supereminentiam) Gottes Unfassbarkeit deutlich zu machen. Seine Stärke
ist darin zu suchen, dass bereits im sinnlichen (ähnlich den mathematischen
Bildern, die von Cusanus verwendet werden) die koinzidenzielle Struktur
des Unendlichen und Göttlichen deutlich gemacht werden kann. Dies wird
deutlicher in dem einem Wort ‘IN’, in dem Ja und Nein zusammenfallen, als
in langen, die Logik sprengenden paradoxalen Satzgebilden’”.
593 Trialogus de possest. h. XI2, n. 58, p. 69, linhas 1-6: CARDINALIS: Laudo
aenigma tuum, Bernarde, utique aptum proposito. Sed aenigmatum nullus est finis,
cum nullum sit adeo propinquum quin semper possit esse propinquius. Solus dei
filius est ‘figura substantiae’ patris, quia est quicquid esse potest. Forma dei patris
non potest esse aut verior aut perfectior, cum sit possest.
411
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Este livro foi projetado pela
equipe da Editora da Universidade
Federal do Rio Grande do Norte.