UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Edneide da Conceição Bezerra A TECITURA DA AÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DA EJA: SABERES NECESSÁRIOS À MEDIAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE EM ALFABETIZAÇÃO Natal – RN 2009 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Edneide da Conceição Bezerra A TECITURA DA AÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DA EJA: SABERES NECESSÁRIOS À MEDIAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE EM ALFABETIZAÇÃO Natal – RN 2009 Edneide da Conceição Bezerra A TECITURA DA AÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DA EJA: SABERES NECESSÁRIOS À MEDIAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE EM ALFABETIZAÇÃO Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do grau de Doutora em Educação. Orientadora: Professora Doutora Maria Estela Costa Holanda Campelo Natal – RN 2009 Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA Divisão de Serviços Técnicos Bezerra, Edneide da Conceição. A tecitura da ação do Coordenador Pedagógico da EJA: saberes necessários à mediação do trabalho docente em alfabetização / Edneide da Conceição Bezerra. - Natal, 2009. 256 fls. Orientadora: Profª. Drª. Maria Estela Costa Holanda Campelo. Tese (Doutorado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais Aplicadas. Programa de Pós-Graduação em Educação. 1. Alfabetização de jovens e adultos - EJA - Tese. 2. Pedagogia - Coordenação - Tese. 3. Docência - Tese. I. Campelo, Maria Estela Costa Holanda. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/BS/CCSA CDU 37.014.22(043.3) Edneide da Conceição Bezerra A TECITURA DA AÇÃO DO COORDENADOR PEDAGÓGICO DA EJA: SABERES NECESSÁRIOS À MEDIAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE EM ALFABETIZAÇÃO Tese apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do grau de Doutora em Educação. Data da Aprovação: 07 de agosto de 2009 BANCA EXAMINADORA __________________________________________________ Profª Drª Maria Estela Costa Holanda Campelo – Orientadora/UFRN __________________________________________________ Profª Drª Tânia Maria de Melo Moura – UFAL __________________________________________________ Profª Drª Maria Antônia Teixeira da Costa – UERN __________________________________________________ Profª Drª Denise Maria de Carvalho Lopes – UFRN __________________________________________________ Profª Drª Rosália de Fátima e Silva – UFRN __________________________________________________ Profª Drª Maria Elizete Guimarães Carvalho – UFPB __________________________________________________ Profª Drª Rosa Aparecida Pinheiro – UFRN DEDICATÓRIA A todas as grandes professoras-coordenadoras que passaram por minha vida e me ajudaram a tornar-me a professora que sou: – Maristela da Silva Souza – Maria de Fátima Felipe – Helena Cunha Dantas – Margarida Maria Oliveira da Silva – Márcia Maria Barbosa Felipe – Maria das Graças Pereira de Brito Lima DEDICATÓRIA ESPECIAL “Clara como a luz do sol, clareia luminosa nessa escuridão; Clara como a luz da lua, passeia sobre o céu na paisagem. Será magia, milagre, miragem, será mistério”. Dedico este trabalho ao grande milagre da minha vida – Maria Clara, minha filha muito amada. AGRADECIMENTOS − A Deus e seus espíritos de luz, por suas presenças em minha vida, me amparando e apontando caminhos, meu louvor especial. − À minha família, em particular à minha mãe e à minha irmã Edna, pelo apoio, força e carinho. − À Professora Doutora Maria Estela Campelo, pela grande orientadora que foi do meu percurso no mestrado e no doutorado, como também pela amizade construída me dando força nos momentos de muita dificuldade, na construção desse trabalho como também na vida pessoal. − A Marcos Bezerra, por dividir comigo as alegrias e dificuldades de educar/cuidar da nossa filha Maria Clara. − À Maricélia Batista, funcionária de minha casa, por me ajudar na administração da casa e no cuidado com meu maior tesouro – Maria Clara. − Às professoras, sujeitos desta pesquisa e colaboradores deste trabalho. − À Escola Municipal Professora Emília Ramos, lugar onde aprendi a aprender. − À Universidade Federal do Rio Grande do Norte e ao Programa de Pós-Graduação em Educação. − Aos Professores do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte: Maria Estela Campelo, Alda Duarte, Betânia Ramalho, Denise Carvalho, Francisco de Assis, Isauro Beltrán, Lúcia Martins, Magna França, Márcia Gurgel, Rosália Silva e Salonilde Ferreira, pelos conhecimentos adquiridos nas disciplinas cursadas e por conseguirem fazer acontecer com sucesso o Programa de Pós-Graduação em Educação, apesar das dificuldades postas. − À Camila Tatianne, Josinalva Carvalho e Milena Paula da Base de pesquisa, que muito me ajudaram na obtenção de informações e formatação de trabalhos. − À Andréa Estela Campelo, pelo carinho e cuidado que dispensou na formatação do meu trabalho. − A Iesu Andrade, meu professor de Francês, um anjo em minha vida. − À Giane Bezerra, colega de curso pela socialização de materiais. − Aos colegas do grupo de estudos da Pós-Graduação, orientados pelas Professoras Maria Estela Campelo e Denise Carvalho, pelo compartilhamento de saberes que vivenciamos naqueles momentos que foram também de muitas alegrias. − À Universidade Vale do Acaraú, na pessoa da Professora Maria do Rosário Cabral, por acreditar em minha capacidade de contribuir com o seu trabalho. − À Secretaria Estadual de Educação do Rio Grande do Norte e Secretaria Municipal de Educação de Natal, que me concederam afastamento para realização deste curso. − Ao Programa de Educação do SESI/RN, pelo investimento em minha formação profissional. − À Adriana Gomes, Helena Cunha, Márcia Felipe, Janira Bezerra pela amizade e por ter sempre um colo para mim nos momentos difíceis. − Aos amigos amados, pela torcida e força desde a realização da seleção do mestrado. − Ao professor João Amado da Universidade de Coimbra/Portugal pelas contribuições ao meu trabalho no seminário doutoral I. − À Banca Examinadora, pelas contribuições, por ocasião do Seminário de Formação Doutoral II e defesa da Tese. Muito obrigada Denise Carvalho, Elizeth Guimarães, Maria Antônia, Rosa Aparecida, Rosália de Fátima e Tânia Moura, pelo cuidado que vocês dispensaram à leitura do meu trabalho. AGRADECIMENTO ESPECIAL À Maria Estela Costa Holanda Campelo, por acreditar tanto em mim. Obrigada, obrigada, obrigada. Tudo que eu fizer ou disser não expressará o imenso carinho, gratidão e admiração que tenho por você. RESUMO Este trabalho tem sua origem na nossa história de vida profissional, onde destacamos o papel mediador da coordenação pedagógica na (re)construção da nossa atuação docente. Nesse contexto de vida profissional, nasce a tese que discute a problemática da alfabetização e o papel da escola e de seus professores, mediados pela ação da coordenação pedagógica, na construção de uma prática alfabetizadora de jovens e adultos. Investigar que saberes da ação pedagógica são requeridos do coordenador pedagógico, na mediação/orientação de professores alfabetizadores de jovens e adultos foi o objetivo deste trabalho. Para tecer a investigação, foi escolhida a abordagem qualitativa de pesquisa; como metodologia, o estudo de caso e como procedimentos de recolha de dados, a observação, o questionário, a entrevista e a análise documental. O corpus da pesquisa, captado pelos instrumentos destacados, foi interpretado e trabalhado através da análise de conteúdo, que atende às expectativas de uma abordagem interpretativa. Apreendemos da pesquisa que, no desenvolvimento de sua prática, o coordenador pedagógico mobiliza Saberes Específicos e Saberes Transversais a sua ação pedagógica. Nos saberes específicos, encontramos: Jovem e Adulto como sujeito do conhecimento e da aprendizagem; Alfabetização do jovem e do adulto: Psicogênese da língua escrita; Ciclo da ação didático-pedagógica. Nos saberes transversais, foram apreendidos: Respeitar e se fazer respeitar por professores e alunos; Priorizar a dimensão pedagógica no cotidiano escolar; Mediar a ação docente nas diversas etapas: planejamento; execução e avaliação. A pesquisa ratifica que o trabalho pedagógico na escola deve ser construído numa parceria entre professores e coordenadores. Como resultados, evidenciamos, também, que os coordenadores pedagógicos encontram-se, ainda, sem uma identidade profissional, imersos em muitos fazeres, sem se darem conta do mais importante: a mediação do trabalho docente. O coordenador pedagógico é um profissional que vai se constituindo nas práticas escolares e sua identidade profissional ainda não está definida quanto ao campo real de atuação. Com base nos estudos feitos, defendemos a tese de que, a prática do coordenador pedagógico na escola demanda saberes e fazeres da ação pedagógica; estes adquirem especificidades no exercício da mediação/orientação da prática pedagógica de professores alfabetizadores de jovens e adultos. Apreendemos como recomendações aos cursos de formação de coordenadores pedagógicos que estes devem proporcionar: Embasamento teórico-metodológico consistente sobre as Ciências da Educação; Estágio Supervisionado duradouro na Coordenação Pedagógica de instituições escolares e não-escolares; Experiência – como professor – em sala de aula, preferencialmente, no nível em que o formando pretende atuar. Foi destacada a importância do lado humano no exercício da ação coordenadora, como forma de estabelecer e alimentar o canal de comunicação com o professor e, desse modo, coordenadores e professores (com)partilharem a apaixonante, mas difícil tarefa de educar. Esperamos que o estudo, que evidencia saberes necessários à prática do coordenador pedagógico, possa contribuir para ampliar a discussão do papel desse profissional na escola, que desejamos pública, democrática e com qualidade social. Palavras-chave: Mediação; Coordenação Pedagógica; Saberes da Ação Pedagógica; Alfabetização de Jovens e Adultos. RESUMEN Este trabajo tiene su origen en nuestra historia profesional, en la que destacamos el rol mediador de coordinación pedagógica en la (re)construcción de nuestra actuación docente. En este contexto de vida profesional, nace la tesis que discute la problemática de la alfabetización y el rol de la escuela y de sus profesores, mediados por la acción de la coordinación pedagógica, en la construcción de una práctica alfabetizadora de jóvenes y adultos. Investigar qué saberes de la acción pedagógica son requeridos del coordinador pedagógico, en la mediación/ orientación de profesores alfabetizadores de jóvenes y adultos fue el objetivo de este trabajo. Para tejer la investigación fue escogido el abordaje caritativo de la encuesta; como metodología, el estudio de caso y como procedimiento el levantamiento de datos, la observación, el cuestionario, la entrevista y el análisis documental. Aprehendimos de la investigación que, en el desarrollo de su práctica, el coordinador pedagógico moviliza Saberes Específicos y Saberes Transversales de su acción pedagógica. En los saberes específicos, encontramos: Joven y Adulto como sujeto del conocimiento y del aprendizaje; Alfabetización del joven y del adulto: Psicogénesis de la lengua escrita; Ciclo de la acción didáctico-pedagógica. En los saberes transversales, fueron aprendidos: Respetar y se hacerse respetar por profesores y alumnos; Priorizar la dimensión pedagógica en el cotidiano escolar; Mediar la acción docente en las distintas etapas: planeamiento; ejecución y evaluación. La investigación ratifica que el trabajo pedagógico en la escuela debe ser construido en una relación entre profesores y coordinadores. Como resultados, evidenciamos, también, que los coordinadores pedagógicos se encuentran, todavía, sin una identidad profesional, inmersos en muchos quehaceres, sin darse cuenta de lo más importante: la mediación del trabajo docente. El coordinador pedagógico es un profesional que se va construyendo en las prácticas escolares y su identidad profesional aún no está definida como en el campo real de actuación. Basado en los estudios hechos, defendemos la tesis de que, la práctica del coordinador pedagógico en la escuela demanda saberes y quehaceres de acción pedagógica; estos adquieren especificidades en ejercicio de la mediación/orientación de la práctica pedagógica de profesores alfabetizadores de jóvenes y adultos. Aprehendemos como recomendación a los cursos de formación de coordinadores pedagógicos que estos deben proporcionar: Embasamiento teórico- metodológico consistente sobre las Ciencias de la Educación; Prácticas Supervisadas de larga duración en la Coordinación Pedagógica de instituciones escolares y no escolares; Experiencia – como profesor – en sala de clase, de manera preferencial, en el nivel en que el que concluye el curso desea actuar. Fue destacada la importancia del lado humano en el ejercicio de la acción coordinadora, como forma de establecer y alimentar la comunicación con el profesor y, de este modo, coordinadores y profesores comparten la apasionante, pero difícil tarea de educar. Esperamos que el estudio, que destaca saberes necesarios para la práctica del coordinador pedagógico, pueda contribuir para ampliar la discusión del rol de este profesional en la escuela que deseamos pública, democrática y con calidad social. Palabras-llave: Mediación; Coordinación Pedagógica; Saberes de l’Acción Pedagógica; Alfabetización de Jóvenes y Adultos. RESUMÉ Ce travail a son origine dans notre histoire de vie professionnelle, où nous mettons en relief le rôle médiateur de la coordination pédagogique dans la (re)construction de notre action pédagogique. Dans ce contexte de vie professionnelle naît la thèse qui aborde la problématique de l’alphabétisation, le rôle de l’école et de ses professeurs, intermédiés par l’action de la coordination pédagogique dans la construction d’une pratique d’alphabétisation pour jeunes et adultes. Rechercher quels savoirs de l’action pédagogique sont demandés de la part du coordinateur pédagogique, dans la médiation/ orientation de professeurs alphabetisateurs de jeunes et adultes a été l’objectif de ce travail. Pour construire l’investigation, un abordage qualitatif de la recherche a été choisi et l’étude de cas éte choisi comme méthodologie; la récolte des données a été faite par l’observation, le questionnaire, l’interview et l’analyse documentaire. Nous avons appris par la recherche, que dans le développement de sa pratique, le coordinateur gère des Savoirs Spécifiques et des Savoirs Transversales pour son action pédagogique. Dans les savoirs spécifiques, se trouvent: Le jeune et l’adulte comme les sujets de la connaissance et de l’apprentissage; l’alphabétisation du jeune et de l’adulte: psychogénèse de la langue écrite; cycle d’action didactique-pédagogique. Les savoirs transversales identifiés ont été: respecter et se faire respecter par professeurs et élèves; prioriser la dimension pédagogique dans le quotidien scolaire; intermédier l’action éducatrice dans ses plusieurs étapes: organisation, exécution et évaluation. Le travail demontre que l’action pédagogique à l’école doit être construite en association entre professeurs et coordinateurs. Comme résultats le travail a montré que les coordinateurs pédagogiques sont encore sans une identité professionnelle, surchargés par de nombreuses activités, sans se rendre compte du plus important: la médiation du travail de l’éducation. Le coordinateur pédagogique est un professionnel qui se construit dans les pratiques scolaires, son identité professionnelle n’est pas encore claire par rapport au vrai terrain d’action. En ayant comme base les études réalisés, nous défendons la thèse que la pratique du coordinateur pédagogique dans l’école demande un savoir et de l’action pédagogique; qui acquérirons des spécificités dans l'exercice de la médiation/orientation de la pratique pédagogique des professeurs d'alphabétisation de jeunes et adultes. Selon les recommandations que nous faisons aux cours de formation de coordinateurs pédagogiques, les cours devraient: fournir une base théorique-méthodologique sur les Sciences de l'Éducation; offrir des stages supervisés durables dans la Coordination Pédagogique des institutions scolaires et non-scolaires; permettre une expérience – comme professeur – en classe, de préférence au niveau où le gradé pense développer son travail. L’importance de l’aspect humain dans l'exercice de l’action coordinatrice a été mise en valeur comme une façon d’établir et de nourrir la chaîne de communication avec le professeur, permettant ainsi aux professeurs et coordinateurs de partager le passionnant, mais difficile, devoir d’enseigner. Nous souhaitons que ce travail, qui a identifié les savoirs nécessaires à la practique de la coordination pédagogique, puisse contribuer à l’élargissement de la discussion du rôle de ce professionnel dans l’école, une école qui devrait être publique, démocratique et de bonne qualité sociale. Mots clés: Médiation ; Coordination pédagogique; Savoirs de l'Action Pédagogique; Alphabétisation de Jeunes et Adultes. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 Taxa de Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais - Brasil, 1940/2000 .. 31 Gráfico 2 Taxa de Analfabetismo, por grupo etário – Brasil, 2001 ............................. 32 Gráfico 3 Taxa de Analfabetismo da população de 15 anos ou mais, por Unidade da Federação ............................................................................................................. 33 LISTA DE FIGURAS Figura 1 Tríade Conceitual ......................................................................................... 72 Figura 2 Processo de Supervisão .............................................................................. 91 Figura 3 Os Níveis de Conceptualização da Escrita de Alfabetizandos na visão de Emília Ferreiro 118 Figura 4 Produções de Alfabetizandos Jovens e Adultos .......................................... 119 Figura 5 Escrita Pré-silábica diferenciada intrafiguralmente ...................................... 120 Figura 6 Escritas Pré-silábicas com diferenciações intra e interfigurais ................... 121 Figura 7 Escritas Pré-silábicas com diferenciações intra e interfigurais ................... 123 Figura 8 Escritas Silábicas ......................................................................................... 124 Figura 9 Escritas Silábicas ......................................................................................... 124 Figura 10 Escritas Silábico-alfabéticas ....................................................................... 125 Figura 11 Escritas Alfabéticas .................................................................................... 126 Figura 12 Escritas Alfabéticas .................................................................................... 126 Figura 13 Contexto de Atuação do Coordenador Pedagógico ................................... 202 LISTA DE QUADROS Quadro 1 Saberes - da Ação - do Coordenador Pedagógico .................................. 131 Quadro 2 Indicadores da Subcategoria 3.1.2.3 - ‘Mediar a ação docente nas suas diversas etapas: planejamento; execução; avaliação’ ............................................... 171 Quadro 3 Recomendações aos Cursos de Formação de Coordenadores Pedagógicos ............................................................................................................... 204 LISTA DE SIGLAS AJA .................... Alfabetização de Jovens e Adultos CONFINTEA ...... Conferência Internacional sobre Educação para Adultos DETRAN ............ Departamento Estadual de Trânsito EJA .................... Educação de Jovens e Adultos GEEMPA ........... Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação IBGE .................. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística INAF .................. Indicador de analfabetismo funcional LDB .................... Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC ................... Ministério da Educação PABAEE ............ Programa de Assistência Americano-Brasileira ao Ensino Elementar PCP ................... Professor Coordenador Pedagógico PNAD ................. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNE ................... Plano Nacional de Educação PPP ................... Projeto Político Pedagógico PROMEDLAC .... Project Mayeur Dans le Domaine de l’ Educacion en América Latine et les Caribe SAEB ................. Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica, SESI .................. Serviço Social da Indústria SINTE ................ Sindicato dos Trabalhadores em Educação UFRN ................. Universidade Federal do Rio Grande do Norte UNESCO ........... Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura SUMÁRIO 1 UMA PROFESSORA, UMA HISTÓRIA, UMA TESE... ....................................... 19 1.1 UM PROBLEMA ................................................................................................ 29 1.2 UMA QUESTÃO DE PESQUISA ...................................................................... 38 1.3 UMA CATEGORIA: A MEDIAÇÃO.......................................................... 43 1.4 UMA TRAMA: CONTANDO OS (DES)CAMINHOS NA TECITURA DA PESQUISA .............................................................................................................. 47 1.4.1 Por que investigação qualitativa? .............................................................. 48 1.4.2 Que caminho metodológico percorremos na busca de comprovar a tese?....................................................................................................................... 50 1.4.3 Por que estudo de caso? ............................................................................ 50 1.4.3.1 Caracterizando o caso escolhido ............................................................ 51 1.4.4 Como fazer? Os instrumentos de apreensão do corpus da pesquisa................................................................................................................ 57 1.4.4.1 A observação participante: o olhar da pesquisadora sobre a escola na busca de elementos para tecedura da tese ................................................... 57 1.4.4.2 O caderno de campo ................................................................................. 60 1.4.4.3 Questionário: desvelando um pouco da vida dos atores da pesquisa ................................................................................................................................. 61 1.4.4.3.1 Caracterização dos atores da pesquisa ............................................... 61 1.4.4.4 Entrevista Semi-Estruturada: um soltar de fios/falas para apreensão do objeto de estudo............................................................................................... 64 1.4.4.5 Documentos: o já dito/escrito como um a mais na pesquisa ............... 66 1.4.5 Caderno de campo, questionário, entrevistas, documentos...: a triangulação/categorização do corpus da pesquisa /análise de conteúdo................................................................................................................ 67 1.5 UM TRABALHO... ............................................................................................. 69 2 A URDIDURA DO ESTUDO: POR ONDE PASSAM OS FIOS DA TESE? ..................................................................................................................... 71 2.1 COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA: HISTÓRIA E DEMANDAS ......................... 72 2.1.1 Coordenador pedagógico, supervisor, suporte pedagógico...: puxando fios históricos dessas nomenclaturas ................................................ 73 2.1.1.1 Puxando fios na legislação ...................................................................... 79 2.1.2 O coordenador pedagógico como um formador de professor na escola ..................................................................................................................... 84 2.1.3 O coordenador pedagógico como um formador de professor na escola da EJA ........................................................................................................ 93 2.1.4 O coordenador pedagógico e a educação de adultos .............................. 98 2.2 SABERES DA AÇÃO PEDAGÓGICA ............................................................... 103 2.3 ALFABETIZAÇÃO ............................................................................................. 110 2.3.1 Letramento .................................................................................................... 113 2.3.2 O caminho percorrido pelos sujeitos na apropriação da escrita: Paradigma psicogenético de alfabetização em realce ...................................... 117 3 SABERES EM FIOS QUE SE TECEM NA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS ............................................................................................................... 129 3.1 SABERES - DA AÇÃO - DO COORDENADOR PEDAGÓGICO ...................... 130 3.1.1 Saberes Específicos da Ação.................................................................. 131 3.1.1.1 Jovem e adulto como sujeito de desenvolvimento e de aprendizagem ........................................................................................................ 132 3.1.1.2 Alfabetização do jovem e do adulto: Psicogênese da língua escrita ..................................................................................................................... 146 3.1.1.3 Ciclo da ação didático-pedagógica ......................................................... 152 3.1.2 Saberes Transversais da Ação............................................................... 160 3.1.2.1 Respeitar e se fazer respeitar por professores e alunos ...................... 161 3.1.2.2 Priorizar a dimensão pedagógica no cotidiano escolar ........................ 164 3.1.2.3 Mediar a ação docente nas diversas etapas: planejamento; execução; avaliação ............................................................................................. 168 4 O ARREMATE DOS FIOS DA TESE .................................................................. 201 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 222 APÊNDICES ........................................................................................................... 238 ANEXOS ................................................................................................................. 254 22 2 UMAPROFESSORA,UMAHISTÓR IA,UMATESE...UMAPROFESSOR A,UMAHISTÓRIA,UMATESE...U MAPROFESSORA,UMAHISTÓRI A,UMATESE...UMAPROFESSORA ,UMAHISTÓRIA,UMATESE...UM APROFESSORA,UMAHISTÓRIA, UMATESE...UMAPROFESSORA,U MAHISTÓRIA,UMATESE...UMAP ROFESSORA,UMAHISTÓRIA,UM ATESE...UMAPROFESSORA,UMA HISTÓRIA,UMATESE...UMAPRO FESSORA,UMAHISTÓRIA,UMAT ESE...UMAPROFESSORA,UMAHI STÓRIA,UMATESE...UMAPROFE SSORA,UMAHISTÓRIA,UMATES E...UMAPROFESSORA,UMAHIST Mas o senhor é homem sobrevindo, sensato, fiel como papel, o senhor me ouve, pensa e repensa, e rediz, então me ajuda. Assim, é como conto. Antes conto as coisas que formaram passado para mim com mais pertença. Vou lhe falar. [...] Ninguém ainda não sabe. Só umas raríssimas pessoas. [...] o que muito lhe agradeço é a sua fineza de atenção (GUIMARÃES ROSA, 2001, p.116). I Capítulo 19 1 UMA PROFESSORA, UMA HISTÓRIA, UMA TESE... A história de vida de cada um medeia a construção dos elementos cognitivos e afetivos que dão suporte às escolhas que são feitas no percurso de vida. Essas escolhas estão sustentadas nas visões de mundo, de sociedade e de homem que são construídas. Ancorada nessa compreensão, apreciamos a idéia de conhecer a história de quem conta uma história. Esse apreço se tornou mais forte com os estudos empreendidos sobre história de vida/método autobiográfico, numa disciplina cursada no Programa de Pós-Graduação em Educação da UFRN. Tais estudos nos deixaram convicta da importância do entendimento acerca das conexões entre vida e escolha profissional. Começamos a indagar sobre o que leva a pessoa a escolher determinados caminhos, o que acontece no percurso de sua vida que lhe faz tomar a decisão de ser professora, por exemplo. Que pessoas são guias nessas escolhas? Essas indagações ressoaram em mim1 Então, cheia de desejo de socializar o caminho/a vida desta tese, entrego-me, neste momento, à escritura de minhas memórias, pois não é possível contar a história da tese sem narrar a trajetória de minha vida, a engrenagem que direcionou a chegada até ela. e, ao iniciar este trabalho, sentimos que deveria começá-lo apresentando os caminhos percorridos até o encontro com a tese que orienta o estudo ora apresentado. Do lugar da narrativa, conto um caminho da minha história de vida: fios de minha trajetória profissional. Sim! Fios. Pois a narrativa não dá conta de todo um processo de vida. Tentarei compor um quadro desse percurso, disponibilizando os arremates principais, de modo a entender o nascimento desta tese – que tem antecedentes, tem uma história. Para isto, resolvi me apoiar em Delory-Monberger (2006, p.363), segundo a qual... 1A professora, que ora se faz pesquisadora, pede licença para, nestas primeiras páginas, falar na primeira pessoa do singular, ensaiando a contação de sua história que é entrelaçada com a história desta tese. 20 o Eu atualizado do discurso é a forma primeira na qual se institui o sujeito: é o Eu que me escreve ao mesmo tempo como sujeito – narrador e como sujeito-ator da história, que eu me conto sobre mim mesmo. Ficção necessária e sempre renovada, o sujeito é essa figura flexível e variável ao qual é dado se compreender como autor de sua história e de si próprio. Escolher a narrativa como lugar de contar é intencional. Os estudos sobre história de vida/método autobiográfico me inspiram e me enchem de desejo de dar história à minha vida e, nesse sentido, dialogo com (Delory-Monberger, 2006, p.396), que explica: É a narrativa que faz de nós o próprio personagem de nossa vida, é ela enfim que dá uma história à nossa vida: nós não fazemos a narrativa de nossa vida porque nós temos uma história; nós temos uma história porque nós fazemos a narrativa de nossa vida. Para iniciar esta narrativa, me questiono sobre o lugar em que estou agora – as primeiras páginas deste trabalho que simbolizam o final de um percurso acadêmico – a tese. Então, indago: como nasceu esta tese? Para responder a essa questão, que ora me faço, coloco-me outro questionamento: como me tornei a professora que sou? Nesse sentido, faço minha a indagação de Nóvoa (1992, p.16): “de que forma a acção pedagógica é influenciada pelas características pessoais e pelo percurso de vida profissional de cada professor?”. A história que ora vou narrar é perpassada por percursos que me trouxeram até o lugar em que me encontro agora. Pensando sobre esse processo – como me tornei/aprendi a ser professora foi que nasceu a tese. Utilizando um elemento metafórico, decido ir para a “janela” e... debruçadas sobre o vivido, nossa matéria e nossa questão, resgatamos as marcas e pistas deixadas em nós pelos meandros trilhados no aprendizado e na elaboração cotidiana do “ser professora”. Refletimos sobre elas, no jogo da participação do/com o outro. Compartilhamos, então, fragmentos de nossas histórias de vida e dentro delas a escolha profissional (FONTANA, 2005, p.78). 21 Da “janela”, olhando o caminho percorrido, começo a realizar uma viagem de volta ao passado. Na minha história, percebo que não é fácil falar na primeira pessoa; exige reflexão, um olhar para dentro do ‘álbum pessoal’, na busca das fotos principais para comporem o mapa que me trouxe até aqui. Vejo-me marcada pela história e essa história tem ‘eu’ e ‘outros’. Os outros tiveram um papel determinante em minha vida. Eles estão em mim. Eles me ajudaram/ajudam a refletir, fazer escolhas, seguir caminhos... e me tornar a professora que sou, uma vez que, “[...] mediados por nossos parceiros sociais – próximos ou distantes, conhecidos ou ignorados – integramo-nos progressivamente nas relações sociais, aprendendo, por meio delas, a nos reconhecer como pessoas” (FONTANA, 2005, p.62). “Cada indivíduo aprende a ser homem”, diz Leontiev (1978, p.267). Parafraseando o pesquisador russo, afirmo, sem qualquer receio: “cada professor aprendeu a ser professor”. E comigo não foi diferente: na relação com os outros e com a cultura foi que aprendi a ser professora, a professora que sou. Nesse sentido, “o homem define-se pelo que consegue fazer com o que os outros fizeram dele”, diz Sartre que me inspira a refletir e a me indagar: o que fiz com o que me apropriei/internalizei desse mundo humano para construir o meu fazer docente de professora alfabetizadora? Meu caminho em direção à profissão docente começa a ser traçado no final do ensino fundamental, onde destaco que a minha vida escolar aconteceu toda na escola pública, o que é motivo de muito orgulho para mim, por ser ‘mais uma’ que deu certo, vindo do ensino público e das classes populares. Minhas experiências profissionais me dão a certeza de que a escola pública pode cumprir sua função social, e que as pessoas, no seu percurso de vida, precisam de oportunidades e de outros que acreditem nelas. Fui orientada por minha mãe a fazer o magistério (ensino médio). Para ela, era um sonho ver a filha vestir a farda da Escola Estadual Presidente Kennedy – localizada no bairro de Lagoa Nova-Natal/RN – e ser professora. Acredito que ela via nessa possibilidade um caminho para eu conseguir ultrapassar as dificuldades vividas por minha família, que tinha uma vida muito pobre, cheia de restrições. Confesso que ser professora não foi uma escolha que alimentei desde a infância. Mas, pelo desejo de minha mãe e por minha irmã já ser professora, fui fazer o magistério. 22 Ao final do magistério em 1988, como requisito para conclusão do curso, tinha que estagiar em sala de aula. Sentindo-me insegura para tal, optei por realizar meu estágio em uma escola de Educação Infantil. Meu estágio aconteceu em uma sala de Jardim I na Escola Estadual Presidente Kennedy. A professora da sala em que estagiei, era professora do jeito que aprendi no magistério: Os alunos aprendiam A, E, I, O, U; 1, 2, 3, 4, 5; círculo, triângulo e quadrado. Ficavam o tempo inteiro sentados; caso infringissem a regra, iriam “para a cadeira do bobo2 Em 1989, consegui ser aprovada em concurso público para professor da Rede Estadual de Ensino do RN. Em 1990, inicio minha carreira docente. Comecei a trabalhar como professora na creche “Kátia Garcia” – localizada no bairro de Lagoa Nova-Natal/RN. Ao decidir sobre que turma assumir, fiz opção pelo Jardim I. Acredito que esta opção se deu em decorrência de ter sido neste nível em que realizei meu estágio no magistério. ”. Eu acreditava que aquela era a maneira certa de ser professora, não tinha o olhar crítico sobre aquela prática e foi nesta etapa do aprendizado que me vi gostando de ensinar e de estar com as crianças. No cursinho preparatório para o vestibular, adorava as aulas de Geografia, pois tratavam de assuntos que muito me instigavam, como Política e Economia. Nesse período, eu estava muito envolvida com o Movimento Estudantil e na eleição direta para Presidente, após anos de Ditadura Militar. Essas aulas me levaram a escolher o curso de Geografia, como opção no vestibular. Fui aprovada e, em 1990, comecei a fazer a graduação em Geografia. Concomitante à entrada na Universidade Federal do RN, iniciei a carreira docente. O início da minha vida como professora foi pautado numa visão mecanicista de ensinar/aprender. Ensinava os alunos a decorarem o “A-E-I-O-U” e a repetirem “1-2-3-4-5”. Refletindo sobre minha postura enquanto professora na época, percebo que reproduzia a professora da sala em que estagiei – foi ela que tive como modelo. Olhando para a formação que tive para o ingresso no magistério, percebo muita fragilidade; sinto-me (e acho que meus colegas também se sentem) “vítimas de um processo de formação que pouco contribuiu para o desenvolvimento, em nós, do verdadeiro sujeito epistêmico” (FONTANA, 2005, p.39). 2 Cadeira do Bobo: lugar em que a criança ficava sentada, destacada dos demais colegas e perto da professora. 23 A década de 1990, com o advento da escola para todos3 Assim como eu, muitos professores que ingressaram na docência naquela década, enfrentaram a angústia do não saber; esperávamos chegar às escolas e seguir a perspectiva tradicional que tínhamos do processo de ensinar/aprender. Não fomos formados para criar/construir uma prática; mas, para seguir modelos introjetados na formação, no curso de magistério. , foi marcada por uma entrada maciça de pessoas na docência. Acredito que não muitos professores foram mobilizados/mediados e, nesse processo, tiveram condições para a construção do ser sujeito epistêmico da sua prática. Em 1991, um novo grupo assume a Escola Kátia Garcia, com uma nova proposta de ensino-aprendizagem. Este grupo tinha uma coordenação que orientava o trabalho desenvolvido. Para o início do trabalho, a coordenação fazia estudos com o grupo de professores, onde destacavam-se as temáticas: psicogênese da língua escrita, construção do conceito de número, construtivismo, tema gerador, relação professor aluno, dentre outros. A princípio, pensei ser tudo muito complicado e decidi que seria melhor continuar com minha metodologia, pois era com ela que me sentia segura. Ao deparar com esses novos conhecimentos... uma pungente sensação de ignorância silenciava: quanto a conhecer! A própria dúvida mal conseguia ser formulada: ‘diante de tanta coisa que eu não conheço, que não faz sentido, eu nem sei o que perguntar, como perguntar, o que dizer...’ (FONTANA, 2005, p.75). A coordenadora pedagógica, Maristela Silva4 3 A escola para todos, compreendida como ‘educação direito de todos’, a partir da Constituição de 1988, amplamente debatido em 1990 com a Conferência Mundial de Educação para Todos, em Jomtien/Tailândia e, conseqüentemente, com a elaboração do Plano Decenal de Educação, que tinha como pressuposto garantir educação para todos. , procurava me ajudar a perceber que precisava rever metodologias e concepções de ensino e aprendizagem, mas eu apresentava muita resistência nesse sentido, pois o não-saber-fazer gerava em mim o não-querer-fazer, pela insegurança e medo de errar. 4 Tenho autorização, por escrito, da Professora Maristela Silva para divulgar o seu nome. 24 Aos poucos, a coordenação conseguiu me seduzir e, quando percebi, já ensinava aos alunos partindo do tema gerador e o texto era o meio para alfabetizar as crianças. Também já começava a me apropriar da psicogênese da língua escrita e passei a fazer diagnósticos com os alunos para avaliar seu nível de escrita e, assim, pensar em formas alternativas de intervenção no seu processo de alfabetização. Nesse processo, percebo o papel mediador da coordenação pedagógica na construção/reconstrução de minha prática. Percebo também que, sem esse apoio, teria sido difícil me desfazer das concepções e metodologias nas quais acreditava, pois as considerava as mais corretas para ensinar. Resistindo aqui, cedendo acolá e... sobretudo, aprendendo a ler criticamente o “antigo” e o “novo” referencial teórico-metodológico, fui me constituindo como sujeito epistêmico5 de minha própria prática. Todavia, o que importa na formação docente, não é a repetição mecânica do gesto, este ou aquele, mas a compreensão do valor dos sentimentos, das emoções, do desejo, da insegurança a ser superada pela segurança, do medo que, ao ser “educado”, vai gerando a coragem (FREIRE, 1996, p.51). Apaixonei-me pela docência e a ela me entreguei. Tive a certeza de que era essa a profissão que queria abraçar pelo resto da vida; tinha prazer no que fazia; sentia-me realizada com o trabalho desenvolvido. Em relação ao curso de graduação, não podia dizer o mesmo. Decepcionei- me bastante, pois encontrei no curso de Geografia conteúdos muito diferentes dos discutidos no cursinho. As disciplinas com as quais eu mais me identificava eram as que tinham relação com o trabalho docente que desenvolvia na escola pública: Psicologia da Educação, Sociologia e Filosofia. Em alguns momentos, pensei em desistir do curso de geografia e fazer vestibular para Pedagogia; porém, as minhas condições materiais de existência falavam mais alto: não podia perder tempo, precisava trabalhar e concluir o mais 5 Epistêmico: O sujeito epistêmico é o sujeito do conhecimento. Quando o professor é sujeito epistêmico de sua prática, ele a constrói a partir de suas ações, reflexões e estudos. Assim, o sujeito epistêmico (o sujeito que conhece) é o resultado de uma construção a partir da ação do próprio sujeito. 25 rápido possível o curso, para conseguir progressão na carreira docente. Desse modo, as condições sociais/econômicas de existência foram determinantes para que eu não refizesse meu caminho em relação ao curso de graduação que me encantava, pelas relações que tinha com a minha prática – Pedagogia. Ainda em 1993, fui aprovada em concurso público para a Rede Municipal de Educação de Natal. Fui trabalhar em uma escola conveniada com a prefeitura, situada no bairro Nordeste-Natal/RN. Nessa Escola, vivi uma experiência bastante significativa na minha formação de professora de Educação Infantil e alfabetizadora. Durante três anos, acompanhei uma mesma turma. Comecei a trabalhar com as crianças no Jardim I e prossegui até a alfabetização. No final desse período, 100% dos alunos estavam alfabetizados. A convivência resultou em laços muito fortes com os alunos e pais, que ficaram para sempre em minha vida. Nessa Escola, desenvolvia um trabalho muito solitário, pois a coordenação pedagógica era bastante ausente. Todavia, as vozes ouvidas no Kátia Garcia ainda soavam muito forte no meu ser, fazendo-me sentir ainda acompanhada. Em 1994, fui trabalhar no SESI/RN, localizado no bairro de Lagoa Nova- Natal/RN. Essa Instituição empresarial, nessa época, tinha uma escola de Educação Infantil que atendia a comunidade. Fui ser professora da Educação Infantil do SESI, através de um convênio da entidade empresarial com a Secretaria Estadual de Educação. Lá vivi experiências muito especiais, como a inserção de alunos portadores de necessidades educativas especiais na minha turma. Tanto no SESI como no Kátia Garcia, os professores tinham momentos para estudar e planejar semanalmente, contando sempre com a mediação da coordenação pedagógica. Vejo que, nesse espaço, houve um investimento intenso na minha formação e nele tive um grande referencial de vida, na pessoa da coordenadora do Programa de Educação do SESI – Maria de Fátima Felipe. Fátima era uma coordenadora que se preocupava muito com a formação continuada dos professores. Ela propunha que essa formação acontecesse na própria escola do SESI, com os estudos no próprio grupo. Também trazia formadores locais e de outros estados para ministrar formações. Ela sempre nos dizia: “Para nós, que viemos das classes populares, ‘saber é poder’, agarrem as oportunidades”. Ela começou no SESI como aluna da EJA, fez parte dos seus 26 estudos ouvindo as aulas pelo rádio e, naquele momento, coordenava o Programa de Educação do SESI, que atendia a crianças, jovens e adultos. Em 1998, precisei transferir o trabalho realizado no município de Natal para o horário da noite. Sentia o desejo de voltar a estudar e também precisava abrir espaço durante o dia para assumir outras atividades. Consegui uma vaga, à noite, na Escola Municipal Professora Emília Ramos, localizada num bairro periférico da cidade de Natal/RN, Cidade Nova – que atende alunos do 1º segmento do Ensino Fundamental, na modalidade EJA. Ali, fui trabalhar com Alfabetização de Jovens e Adultos por ser conveniente, naquele momento, para mim. Ingressei na EJA com muita segurança, pensando que poderia alfabetizar adultos do mesmo jeito que alfabetizava crianças. Tinha muita expectativa com relação ao trabalho da Escola Emília Ramos. Desde 1991, aquela Escola tinha uma presença muito forte em minha vida, pelo fato de a professora Maristela Silva (minha primeira coordenadora) passar, agora, a ser minha colega professora na Escola de Cidade Nova. Além dessa referência, Margarida Oliveira, uma das coordenadoras da Escola do SESI, foi a primeira diretora da Escola Emília Ramos. No trabalho do SESI, a professora Margarida sempre destacava a experiência da Escola Emília Ramos como referência. Em relação ao meu trabalho de alfabetização, desenvolvido com a EJA, ao contrário do que esperava, tive muitas dificuldades no princípio. Nunca havia trabalhado com essa modalidade de ensino e, na minha formação, não houve nenhuma disciplina contemplando a Educação de Jovens e Adultos. A turma que assumi na Escola era exclusivamente de adolescentes, com uma história comum de fracasso escolar. Ressalto que eu trabalhava com eles propondo as mesmas atividades que desenvolvia no SESI, com a educação infantil. Após um ano na Escola, através dos estudos, do apoio da coordenação pedagógica – que orientava os planejamentos, organizava junto com os professores os projetos pedagógicos e trazia sugestões de atividades – e dos demais professores, comecei a construir uma prática pedagógica alfabetizadora direcionada ao público da EJA. Olhando como se deu esse processo, percebo que, sem o apoio da coordenação pedagógica – na pessoa da professora Graça Brito, teria sido muito difícil. Outra grande referência para meu trabalho foi a professora Helena Cunha, 27 colega que também trabalhava com alfabetização. Nos momentos de socialização do planejamento, a professora Helena que tinha uma prática pedagógica já bastante sistematizada, me orientava sobre os referenciais para que eu pudesse construir a minha própria prática. No ano de 2002, ingressei no Curso de Especialização em Formação de Formadores em Educação de Jovens e Adultos (EJA), oferecido pela Universidade de Brasília, em parceria com o SESI e a UNESCO. A especialização motivou-me a continuar a vida acadêmica, mormente pela possibilidade de aprofundamento dos referenciais que norteavam o meu fazer docente. Em 2003, ingressei no mestrado, tendo como orientadora a professora Maria Estela Costa Holanda Campelo que me acompanha também neste trabalho de doutoramento. Considero a experiência no mestrado um grande pilar no meu processo formativo. A vida na academia afirmou/confirmou a importância da teoria e da prática andarem juntas. As questões que instigaram o projeto da monografia e o do mestrado tiveram origem na reflexão sobre o trabalho de formação docente desenvolvido na Escola Emília Ramos. Nos achados da pesquisa, encontramos o coordenador como um articulador da formação docente na escola. É importante ressaltar que a professora Campelo (2001) realizou sua pesquisa de doutoramento também na Escola Emília Ramos. No referido trabalho (CAMPELO, 2001, p.139), todos os professores entrevistados pela autora destacaram as experiências de formação que são realizadas na Escola “como a modalidade mais significativa da sua formação como professor alfabetizador”. Aqui, é importante ressaltar que os mediadores dessa formação eram os coordenadores pedagógicos da referida Escola. Nesse olhar sobre minha história de vida profissional e sobre mim mesma – condição criada pela narrativa de si – enxergo o papel mediador da coordenação pedagógica na construção/reconstrução de uma prática para atuar na atividade docente. Percebo também que, sem esse apoio, teria sido difícil romper, reconstruir as concepções e metodologias que eram, por mim, consideradas as mais corretas no processo de ensinar/aprender e de me tornar a professora alfabetizadora que sou. A jovem-professora que ingressou na docência em 1990, após dezenove anos de docência, continua com a mesma paixão em ser professora. No primeiro dia 28 de aula, seja com crianças, com jovens ou adultos, ainda fico nervosa, com ‘frio na barriga’. Como sujeito histórico, a paixão pela docência, o desejo de aprender, o saber para ensinar foram mediados; as intervenções/mediações vividas na relação professor/coordenador foram um diferencial desse processo; enfim, o que possibilitou um salto qualitativo na profissão. Sinto que ainda não estou terminada, uma vez que o desejo de aprender e o conhecimento não têm fim, não se esgotam; ainda há muito a aprender, inventar e mudar... Nesse sentido, recorro às palavras de Guimarães Rosa (2001, p.39), ao afirmar que [...] o mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas – mas que elas vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. Verdade maior. É o que a vida nos ensinou. Isso me alegra de montão. As coisas da nossa vida não estão dadas; elas são construídas, mediadas pelo mundo humano e gestadas no tempo porque “o tempo também marcou nossas histórias. Não nascemos professoras, nem nos fizemos professoras de repente. O fazer-se professora foi-se configurando em momentos diferentes de nossas vidas” (FONTANA, 2005, p.124). Parafraseando a autora, acredito que também não nascemos pesquisadores, nos tornamos pesquisadores. Ao olhar a realidade que nos circunda, muitas questões vêm e essa inquietação é a mobilizadora da busca. Sentindo-me cheia de inquietações/questões e com potencialidades que emergiram da vida, da história, me arrisquei a ser pesquisadora. Da história, da vida da professora, dos saberes que construí nasce esta tese. Nesse sentido, é importante destacar que [...] vias se abrem não porque o passado foi reconhecido como tal e por si mesmo, mas porque a dinâmica prospectiva induziu uma história de si, que não está fechada sobre si, mas que dá lugar ao que virá, deixando emergir potencialidades projetivas. Na relação de engendramento de temporalidades entre si, não é o passado que dá 29 luz ao futuro, mas a projeção do possível que é grávida de uma história – de uma ficção de mim-mesma (DELORY-MONBERGER, 2006, p.365). Uma tese foi construída ao longo do período de doutoramento. Espero que ela seja um lugar onde os sujeitos que a visitem encontrem ciência, história e vida. 1.1 UM PROBLEMA Todo pesquisador tem um tema que o inquieta e que alimenta a sua busca, a sua pesquisa. A esse tema o pesquisador se dedica não somente por motivações pessoais, mas também pelo seu compromisso com a sociedade. “Os temas, insistamos, enquanto históricos, envolvem orientações valóricas dos homens na experiência existencial dos mesmos” (FREIRE, 2006, p.115). Como expressei anteriormente, tenho a vida profissional marcada pela alfabetização. Foi ela que mobilizou a busca, a paixão pelo conhecer. Pelo que tenho vivido, concordo com Soares (2003b) quando diz que a alfabetização é um fenômeno de natureza complexa e multifacetada, demandando, assim, muitos saberes para ensinar/aprender. É um tema perpassado por questões de ordem lingüística, psicolingüística, sociolingüística, pedagógica, metodológica, social e política. Também nesse processo, descobri que muitas crianças, jovens e adultos têm sua vida marcada pelo fracasso escolar na alfabetização e, sendo a alfabetização “a mais básica de todas as necessidades de aprendizagem” (FERREIRO, 1992, p.9), essas crianças, jovens e adultos têm o seu processo de construção do conhecimento comprometido pela não aquisição desse instrumento de mediação entre os homens. É urgente discutirmos/investigarmos as facetas desta temática, de modo a descobrirmos caminhos para a construção de uma vida escolar marcada pelo sucesso na alfabetização. 30 Hoje, o sucesso escolar não é uma realidade para muitas crianças, jovens e adultos que se encontram nas escolas públicas brasileiras, uma vez que nossas escolas têm sido mediadoras de muitos fracassos, principalmente na alfabetização. Discutindo a questão, Freire (2006, p.18) realça que o analfabetismo [...] não é um problema estritamente lingüístico nem exclusivamente pedagógico, metodológico, mas político, como a alfabetização por meio da qual se pretende superá-lo. Proclamar sua neutralidade, ingênua ou astutamente, não afeta em nada a sua politicidade intrínseca. As avaliações feitas nacionalmente – por órgãos oficiais e do 3º setor – na última década e nesses primeiros anos do novo século, dão conta de que o número de analfabetos em nosso país ainda é bastante significativo. Na população acima de 15 anos, o IBGE/PNAD (2006) aponta um percentual de 8,32% de analfabetos, totalizando 14,3 milhões de analfabetos no Brasil. Esse quadro não é novo, apesar de termos diminuído o número de analfabetos. “Somos um país que vem reincidindo no fracasso escolar”, sobretudo na alfabetização, alerta Magda Soares (2003a, p.14). Para fundamentar essa discussão, apresentamos o gráfico a seguir, onde pode ser visualizada a Taxa de Analfabetismo de brasileiros de 15 anos ou mais, no período de 1940 a 2000. Erro! Vínculo não válido. Gráfico 1 Taxa de Analfabetismo na faixa de 15 anos ou mais - Brasil, 1940/2000 Fonte: IBGE, Censo Demográfico 1940-2000. 33 e de gênero, que se combinam entre si para produzir acentuados desníveis educativos (HADDAD; PIERRO, 1999, p.5). Saber ler e escrever é um bem construído pela humanidade e, a não distribuição desse bem a todos se configura como uma grande injustiça social. “Para a concepção crítica, o analfabetismo nem é uma ‘chaga’, nem uma ‘erva daninha’ a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta” (FREIRE, 2006, p.18). Destacamos com Campelo (2001) que a não alfabetização tem múltiplas determinações e é reconhecidamente um problema social, denunciando Ferreiro (1992, p.10) que “a persistência do analfabetismo na América Latina é, antes de tudo, um problema político”. O Estado do Rio Grande do Norte, especificamente, apresenta uma situação preocupante: temos uma taxa de analfabetismo de 22% na população acima de 15 anos, chegando a 486 mil analfabetos (BRASIL, 2006). Parafraseando Ferreiro (1992, p.11) “não posso deixar de lado a indignação que deve provocar em nós a análise da situação da alfabetização” no Brasil, especialmente no Nordeste e particularmente no Rio Grande do Norte. O IBGE considera em suas pesquisas uma pessoa alfabetizada aquela que consegue ler e escrever um bilhete simples (BRASIL, 2008, p.6). Com o avanço da sociedade, outras demandas surgem. Assim sendo, na atualidade, saber ler e escrever um bilhete simples é insuficiente para participar plenamente da sociedade da informação e como podemos perceber, nem isso tem sido garantido. Afora o problema que temos com o analfabetismo, a realidade econômica e tecnológica configurada com a sociedade da informação, cria um novo problema: o analfabetismo funcional – pessoas que têm alguns anos de escolaridade, mas não conseguem fazer uso pleno da leitura e da escrita. Segundo dados do INAF (2007), na população de 15 a 64 anos, temos 32% de analfabetos funcionais. A avaliação do SAEB (2005) aponta que muitas crianças têm chegado ao 4º ano6 6 Hoje com a ampliação do Ensino Fundamental para nove anos, o 5º ano equivale ao antigo 4º ano. com um desempenho insatisfatório na leitura e na escrita. Em 1992, Ferreiro já nos alertava para a necessidade de termos objetivos mais ambiciosos na alfabetização para as camadas mais pobres. 34 Particularmente em nossos países empobrecidos, e especialmente nos setores mais pobres de nossos países, os objetivos da alfabetização devem ser mais ambiciosos. Se as crianças crescem em comunidades iletradas e a escola não as introduz na linguagem escrita (em toda sua complexidade) talvez cheguem a atingir esses ‘mínimos de alfabetização’ (FERREIRO, 1992, p.53-54). Esse panorama nos coloca diante de um grande/grave problema: em matéria de educação pública, não conseguimos resolver um problema básico: garantir que todos que entrem na escola consigam, no período a que é destinado, aprender a ler e escrever. Dois grandes desafios são colocados para a escola e para a sociedade, como um todo: além de termos que alfabetizar aqueles que foram excluídos da escola, precisamos também deixar de produzir, no ensino fundamental – oferecido a crianças e jovens sem distorção idade/série – o fracasso, a não alfabetização, o analfabetismo funcional e, conseqüentemente, a exclusão. [...] por mais bem-sucedidas que sejam as campanhas de alfabetização de adultos, não há garantias de se alcançar porcentagens de alfabetização altas e duráveis enquanto a escola primária não cumprir eficazmente sua tarefa alfabetizadora. Na medida em que a escola primária continuar expulsando grupos consideráveis de crianças que não consegue alfabetizar, continuará reproduzindo o analfabetismo de adultos (FERREIRO, 1992, p.16). A escola brasileira precisa desenvolver um ensino de qualidade; pelo menos para os alunos que lá se encontram, proporcionar uma escolarização respeitável, ao invés de continuarmos a produzir, ano após ano, uma demanda de alunos que chegam à EJA, após sucessivos fracassos no ensino fundamental. A Educação de Adultos destinada a alunos analfabetos ou pouco escolarizados não pode nem deve continuar a se constituir num segmento perene a ser atendido. Desta forma, no Brasil, onde a educação é um direito de todos, o débito social para com a modalidade da EJA tem sido uma característica da nossa história e, apesar de toda a propaganda em torno do assunto, não temos conseguido tornar real o que rezam os documentos oficiais. 35 As campanhas para alfabetizar jovens e adultos, historicamente, tiveram efeitos pequenos, visto que, compreendendo a alfabetização como um processo complexo, essas campanhas se configuravam como um processo a curto prazo, não mobilizavam esses sujeitos para uma familiaridade com a leitura e a escrita, nas suas variadas facetas e dimensões. Hoje, pelo menos, nas propostas governamentais, é percebido que a orientação para as campanhas de alfabetização se dá numa perspectiva de continuidade, de modo que este aluno, após a sua participação na campanha/programa, seja inserido na modalidade EJA para que dê continuidade aos seus estudos. Um exemplo é o Programa Brasil Alfabetizado que tenta estabelecer uma ponte entre o aluno e a escola da EJA. Para que essa inserção aconteça, é importante que haja uma mobilização entre os responsáveis pelos programas e as escolas que atendem a modalidade EJA. Precisamos trazer para o espaço que lhes é de direito os excluídos da escola, mesmo que aceitemos que “não é viável acabar com o analfabetismo no país, a curto e médio prazo”, como ressalta Beiseguel (2003, p.27). A Educação de Adultos que atende aos analfabetos, ou pouco escolarizados, ainda tem um longo trabalho e um grande compromisso pela frente, e este alerta tem sido compartilhado por muitos autores. Por exemplo, Soares (1999, p.33), sublinha: Ingressaremos no novo século com velhos desafios a serem enfrentados pela EJA. A luta pelo direito à educação não está vencida quando se trata de jovens e adultos que não tiveram acesso à escolarização básica. É preciso reafirmar, constantemente, esse direito, tanto na lei como na elaboração de uma política nacional que articule as ações no país, ou seja, garantir o financiamento de ações que viabilizem o cumprimento desse dever do Estado. Não é uma tarefa impossível, mas o analfabetismo é uma barreira muito difícil de ser transposta. E como ressalta Campelo (2001, p.5), “o analfabetismo é reconhecidamente um problema social, um obstáculo de difícil solução em que as nações do mundo inteiro, através de Acordos, Encontros e Conferências internacionais e nacionais se dizem empenhadas em resolver”. 36 Como destaca Campelo (2001), muitos são os acordos, encontros e conferências que têm como objetivo resolver os graves problemas brasileiros no campo da educação. Ao longo da década de 1990, esses encontros aconteceram de maneira intensa como as reuniões de ministros de educação de toda América Latina e Caribe – PROMEDLAC Reunião do Comitê Regional Intergovernamental do Projeto Principal de Educação na América Latina e Caribe – com o objetivo de propor diretrizes políticas de educação na região e acompanhar a operacionalização das políticas (CASASSUS, 2001). A Conferência de Educação para Todos que aconteceu em Jomtien, na Tailândia, em 1990, foi um marco dessas conferências. Nessa Conferência, foi assinada a ‘Declaração Mundial Sobre Educação Para Todos’, que estabeleceu a Década da Educação, com propósitos bem definidos: • A escolarização de todas as crianças, oferecendo uma educação geral e mínima de 8 a 10 anos; • Erradicação do analfabetismo; • Melhoria da qualidade do ensino; • Investimentos de organismos internacionais nos financiamentos destinados à alfabetização e à educação básica; • Universalização da educação básica; • Formação de professores. Adentramos o século XXI, verificando que tais propósitos não se concretizaram na sua plenitude. Como as estatísticas demonstram, o Brasil – signatário dessa Conferência – ainda não conseguiu cumprir com muitos daqueles compromissos. A Declaração Mundial sobre Educação para Todos (1990), como documento externo, foi referência em nosso país para elaboração do Plano Nacional de Educação – PNE (1999), e a LDB 9.394/96 foi seu fundamento legal. Podemos dizer que oficialmente temos políticas públicas no campo da educação brasileira que têm objetivos claros no sentido de oferecer uma educação de qualidade, mas percebemos que tem faltado vontade política para operacionalização dessas políticas. 37 Ao longo da década de 1990, que foi denominada a década da Educação para todos, não percebemos avanços significativos na qualidade da educação pública brasileira. Como nos mostraram as pesquisas, ainda não conseguimos resolver problemas básicos. A cobertura de atendimento a crianças de 7-14 anos, no país é de quase 97% (BRASIL/PNAD, 2006), mas ainda não democratizamos esse atendimento, uma vez que “[...] a democratização da educação que defendemos não se traduz apenas pela garantia do acesso de todos à escola pública. O ideal é que, além do acesso, todos tenham uma permanência bem sucedida na escola” (CAMPELO, 2001, p.3). Mobilizada/por e comprometida/com toda essa problemática que envolve a área da alfabetização, especialmente quando se trata de jovens e adultos, inúmeras são as questões que nos mobilizam, incomodam e motivam pesquisas e estudos. Todavia, considerando tudo o que já definimos no nosso plano de trabalho, nosso interesse e motivação maior se voltam para a questão de pesquisa, delineada a seguir, no âmbito da discussão que terá continuidade no item que se segue. 1.2 UMA QUESTÃO DE PESQUISA Como podemos perceber, a não alfabetização é um problema que precisa ser enfrentado pela sociedade brasileira, em especial pela escola pública e seus sujeitos: alunos, pais, professores, diretores, coordenadores e funcionários. É na escola pública que, cotidianamente, nós educadores mobilizamos nossa prática pedagógica, no sentido de proporcionar aos alunos a construção dos saberes que cabe à escola ensinar. Se essa mediação tem sido geradora de fracasso, é importante refletirmos sobre os condicionantes desse processo. Sobre o assunto, assim, reflete Charlot (2005, p.18): Evidentemente havia um problema. Não poderia continuar escrevendo: ‘o fracasso escolar é programado’ e, ao mesmo tempo, dizer aos alunos: as suas práticas estão produzindo um fracasso escolar. Tinha um problema. Porém, acho que as duas coisas estavam certas. Por um lado, há projetos políticos de grande alcance que devem ser bem-compreendidos. A globalização, por exemplo, é 38 um fenômeno norteador da política no mundo inteiro. Esse novo mundo, esse macro movimento da realidade deve ser analisado. Porém, não se pode esquecer a eficácia das nossas práticas cotidianas. Acho que se deve fazer as duas análises: a macro e a micro. Entra-se, dessa forma, no cerne das contradições. Nesse sentido, sabemos que muitos são os sujeitos externos à escola envolvidos diretamente nesse processo para resolver o problema posto. Desse modo, cada um tem um papel a desempenhar para que, de fato, consigamos avançar e alfabetizar as crianças, jovens e adultos que procuram a escola pública em busca desse saber. Acreditamos que nós, que estamos na escola, temos muitas possibilidades, apesar das dificuldades, de oferecer uma educação de qualidade à classe popular. Acho que nunca se deve esquecer da eficácia das práticas pedagógicas. Os professores são mais ou menos eficazes, se deve aceitar essa idéia. [...] Isso significa que nossas práticas em sala de aula têm conseqüências importantes na vida dos alunos (CHARLOT, 2005, p.27). Os sujeitos internos da Escola, os responsáveis diretamente pelo ensino junto aos alunos, têm um lugar especial na construção do sucesso escolar. No contexto tão adverso da escola pública brasileira, é possível uma ação docente pautada pelo compromisso com a educação popular7com qualidade social8 ? Sim, é possível; esclarecendo que essa prática social tem limites/possibilidades, Vale (2001, p.18-19) nos explica: 7 Educação popular: educação que surge junto aos movimentos populares que se dá numa perspectiva de reconhecer e valorizar a cultura dos diversos grupos sociais, especialmente aqueles que foram excluídos durante muito tempo, em nossa sociedade. A implementação dessa interculturalidade é um desafio para a escola. 8 Qualidade social: uma escola com qualidade social se configura num espaço de acolhimento à diversidade cultural e social que respeita as diferenças e é permeada pela inclusão e pela democracia. A qualidade social da educação se viabiliza quando o aluno tem acesso à escola, ali permanece e aprende. Para isso, são necessárias, além de outros fatores, políticas públicas comprometidas com esses direitos sociais. 39 [...] não se trata de inventar uma nova escola, negando a que está aí – ao contrário, é necessário resgatá-la não apenas no sentido de democratizá-la, de expandi-la às camadas populares, como também de qualificá-la em função de um saber comprometido com os segmentos minoritários da sociedade. Querendo conhecer mais essa escola que aí está, ali realizamos nossa pesquisa, acreditando que existem escolas públicas onde o sucesso escolar dos alunos é possível, apesar das adversidades. Temos consciência da problemática no âmbito da escola pública (questões políticas, econômicas e sociais), mas, nosso trabalho terá como foco principal o papel dessa escola e de seus professores, mediados pela ação da coordenação pedagógica, na construção de uma prática alfabetizadora junto aos alunos. Iremos colocar o processo pedagógico na discussão de uma prática alfabetizadora bem sucedida e assumir a posição de que muito pode/deve ser feito pela escola e seus sujeitos. Nós, que estamos no chão da escola, precisamos sair do lugar comum onde temos, de certo modo, insistido em ficar: sempre procurando, fora da escola, o culpado pelo insucesso na alfabetização. Nesse sentido, devemos nos perguntar o que temos feito ou o que poderíamos fazer ou deixar de fazer para construirmos a escola que, no fundo, todos nós desejamos: uma escola pública que dê certo. Acreditamos que esse é o nosso grande sonho e que, talvez, as dificuldades, os percalços da vida nos tenham feito esquecer das utopias de outrora. Também temos constatado que, se [...] a contradição entre o proclamado e o realizado é muito grande, esta contradição dará lugar a questões muito concretas junto de todos aqueles que trabalham nessa escola. Ou o processo pedagógico é colocado em questão (Porquê este currículo? Porquê este material? A forma de ensinar é adequada?), ou então é necessário encontrar um outro responsável pela divergência entre o proclamado e o realizado. Nesse caso será o próprio aluno, em tudo e por tudo, inadequado à proposição (intocável) da escola, o responsável pelo seu fracasso. Não sendo suficiente o aluno resta, ainda, a sua família para ser considerada responsável (RANGEL, 1994, p.38). 40 Os documentos elaborados nas esferas federal, estadual e municipal, como também os elaborados nas escolas proclamam em suas propostas um fazer no campo pedagógico, às vezes, muito diferente do que encontramos na realidade. Nesse sentido, muitas vezes ouvimos dos alunos da graduação: “professora, o que a gente vê na escola é muito diferente do que lemos nos textos”. De fato, vivemos uma grande contradição como nos fala Rangel (1994) e, muitas vezes, colocamos no aluno e na sua situação social e econômica a culpa pelo seu fracasso. Acreditamos na força de uma prática pedagógica, pois ela pode muito e pode mais do que possamos imaginar. A luta pela escola pública de qualidade não se faz, apenas, nos sindicatos e no enfretamento com os que estão no poder; essa luta se faz também com práticas pedagógicas com qualidade social, demonstrando confiança de que os alunos das classes populares são também capazes de aprender. E, neste momento, [...] não há como falar em esperança se os braços se cruzam e passivamente se espera. Na verdade, quem espera, na pura espera vive um tempo de espera vã. A espera só tem sentido quando cheios de esperança, lutamos para concretizar o futuro anunciado [...] (FREIRE, 2006, p.71). Acreditamos na revolução através de uma classe que se reconhece, que se apropria do saber lutar. É lamentável, alguns “dizem-se revolucionários mas, ao mesmo tempo, não crêem nas classes oprimidas a quem pretendem conduzir à libertação, como se isto não fosse uma contradição aberrante” (FREIRE, 2006, p.122). “Boas práticas pedagógicas”9 9 Boas práticas pedagógicas, como destaca Moura (2004) recorrendo a Vygotsky. “Através do ‘bom ensino’, o professor desafia o nível em que o sujeito está, não desrespeitando seus conhecimentos e experiências anteriores, mas tendo o olhar para o futuro, para as capacidades que desenvolverá [...]; bom ensino que se dá numa escola constituída como um espaço privilegiado para desencadear o processo de aprendizagem do aluno em que o professor adquire importância, destaque e relevo [...]” (MOURA, 2004, p.168). construídas através de experiências significativas proporcionadas aos alunos têm grandes repercussões, porque ensejam que eles aprendam a ler, a escrever, a dizer a sua palavra e a fazer sua leitura de mundo. 41 Na construção de boas práticas pedagógicas na escola, o coordenador pedagógico também deve ter um papel relevante: mediar a prática do professor e a construção do projeto pedagógico da escola, perspectivando a qualidade social da educação oferecida. Nesse sentido, compete ao coordenador pedagógico, conforme Libâneo (2004, p.266): • Coordenar a formulação, o desenvolvimento e a avaliação do projeto pedagógico-curricluar; • Apresentar idéias e diretrizes relacionadas aos objetivos, às orientações curriculares e aos planos de ensino; • Auxiliar tecnicamente na prática de elaboração do projeto e dos planos de ensino. No âmbito das preocupações aqui colocadas, elegemos a seguinte questão de pesquisa: que saberes da ação pedagógica são requeridos do coordenador pedagógico na mediação/orientação de professores alfabetizadores de jovens e adultos? Desse modo, trazemos para nossa investigação o papel do coordenador pedagógico como mediador da atividade docente do professor alfabetizador de jovens e adultos. Vale salientar, ainda, que, neste estudo, consideramos a docência como o “lugar” onde todos aqueles responsáveis pelo ensino-aprendizagem, na escola, exercem sua profissionalidade: professores, coordenadores e diretores. Entendemos que, no desenvolvimento de cada uma dessas funções, são requeridos saberes específicos, embora a preocupação de todos seja o ensino-aprendizagem; e este é o lugar da docência. Na relação professor-coordenador, não existe o ensino-aprendizagem com a mesma configuração que na relação professor-aluno. Compreendemos que o coordenador é professor e está coordenador. No Governo de São Paulo, em muitos projetos desenvolvidos, o coordenador recebe o nome de professor coordenador pedagógico – PCP (ROMAN, 2001)10 10 Essa função foi instituída em São Paulo através da Resolução nº 28 da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, em 4 de abril de 1996 (ROMAN, 2001). . 42 Nas Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia11 Nesse sentido, o Parecer 5/2005 do Conselho Nacional de Educação, compreende a docência como as atividades de participação na organização e gestão dos sistemas e instituições de ensino, englobando o planejamento, a execução, a coordenação, o acompanhamento e a avaliação própria do setor da Educação. Esse Parecer expõe que “docência compreende atividades pedagógicas inerentes a processos de ensino e de aprendizagens, além daquelas próprias da gestão dos processos educativos em ambientes escolares e não-escolares” (BRASIL, CNE/CP, PARECER 5/2005, p.8). a docência é compreendida como prática educativa institucionalizada e como integradora das atividades educativas. Na Rede Municipal de Educação de Natal, da qual faz parte a escola onde foi realizada a pesquisa, desde a década de 1990, não existe concurso específico para coordenadores pedagógicos; são professores que se tornam coordenadores. Não existe um critério específico para essas escolhas. Desse modo, entendemos que estamos caminhando para o rompimento de uma visão tecnicista do trabalho escolar, vislumbrando a educação escolar como prática coletiva. Com a questão de pesquisa apresentada para nortear o trabalho, o que pretendíamos fazer? Vejamos, pois, o objetivo da investigação: • Investigar que saberes da ação pedagógica são requeridos do coordenador pedagógico, na mediação/orientação de professores alfabetizadores de jovens e adultos. Definido o objetivo deste trabalho, refletimos, no próximo item, sobre uma categoria fundante na elaboração desta tese: a categoria mediação. Para isso, iremos nos apoiar nos estudos de alguns autores. 11 Resolução CNE/CP Nº 1, de 15 de maio de 2006, que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura, onde estabelece o curso de Pedagogia como lugar que se destina à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos. 43 1.3 UMA CATEGORIA: A MEDIAÇÃO Da página 19 a 29 deste trabalho foi explicitado o processo de mediação que vivemos na nossa formação como professora. Conforme o relato nas páginas citadas, foram as reflexões ensejadas sobre o processo de como me tornei a professora que sou que nasceu esta tese. Desse modo, encontramos a pessoa da coordenação pedagógica como a mediadora da professora que me tornei. A mediação vivida por mim em relação aos saberes para ser professora teve o papel da coordenação como o outro social que atuou decisivamente nesse processo. A mediação da coordenação pedagógica aflorou a consciência, difundindo uma reflexão sobre a professora que eu era e dando as bases para a professora em que me tornei. Ao trazer o processo vivido, fica evidenciada a categoria da mediação como o marco de toda discussão que perpassou esse processo. Assim sendo, sentimos que é imprescindível nos posicionarmos quanto à compreensão que temos acerca do conceito de mediação porque, além desta categoria estar muito presente no relato do meu processo formativo, ela também estará presente em todo o trabalho, principalmente na análise do corpus da pesquisa onde discutimos a mediação da coordenação pedagógica junto aos professores. A mediação é uma categoria da abordagem sócio-histórica e a destacamos como fundamental para refletirmos sobre processos de formação. A abordagem sócio-histórica nos apresenta os elementos para compreendermos que as condições para a formação da cognição se dão devido a condicionantes externos da cultura material e intelectual. Leontiev (2004) coloca que os homens não são simplesmente postos no mundo e, por eles mesmos, o compreendem. As relações do indivíduo com o mundo dos objetos humanos sejam midiatizadas pelas suas relações com os homens, que sejam inseridas no processo da comunicação, esta condição é sempre realizada, pois a idéia do indivíduo, da criança a sós com o mundo objetivo, é uma abstração totalmente artificial (LEONTIEV, 2004, p.254). 44 A mediação como categoria chave no processo de compreensão da concepção de aprendizagem da abordagem sócio-histórica deve ser compreendida como elemento intermediador entre o objeto de conhecimento e o sujeito que aprende. Para Vygotsky (2007), não nascemos num mundo natural. Nascemos num mundo humano e desse modo ele evidencia que conhecer é transformar o que é sócio-cultural em individual. Então, a categoria mediação entra nesse jogo, pois para tornar seu o que é da cultura o homem é mediado pelo outro cultural. Leontiev nos diz que “nas circunstâncias normais, as relações do homem com o mundo material que o cerca são sempre mediatizadas pela sua relação com outros homens, com a sociedade” (LEONTIEV, 2004, p.181). Assim sendo, o processo de intervenção de um elemento intermediário numa relação; a relação deixa, então, de ser direta e passa a ser mediada por esse elemento. [...] Vygotsky trabalha, então, com a noção de que a relação do homem com o mundo não é uma relação direta, mas fundamentalmente, uma relação mediada (OLIVEIRA, 1993, p.26-27). A Mediação seria esse terceiro elemento na relação entre sujeito e objeto de conhecimento, que leva à transformação, ao desenvolvimento do pensamento psicológico. A abordagem defendida por Vygotsky (2007) tem como princípio orientador a dimensão sócio-histórica do psiquismo. Para Vygotsky, o conjunto dos fenômenos ou dos processos mentais conscientes ou inconscientes de um indivíduo ou de um grupo de indivíduos vão se constituindo nas suas relações sociais. Para Leontiev (2004), mesmo estando exteriormente sozinho, o homem na sua relação com o mundo é sempre mediado pelo outro. Tornar seu, reconstruindo internamente o que é da cultura, os modos de sentir, perceber e compreender os fenômenos naturais e os fatos sociais é uma atividade eminentemente humana que, sem a mediação, não seria possível. Para Leontiev (2004), o mundo real do homem é um mundo humano criado/recriado por ele. Esse mundo, com seus elementos sociais, não é oferecido ao homem “enquanto tal, apresenta-se a cada indivíduo como um problema a resolver” (LEONTIEV, 2004, p.178). 45 Nesse mundo social, o homem é cercado de instrumentos e signos que medeiam a sua vida social e sua relação com o ambiente. O instrumento entra nesse jogo entre o homem e a natureza, num processo que é gradativo, vai se transformando em relações cada vez mais complexas e o homem vai modificando suas formas de ações no mundo. O instrumento psicológico, mediador da representação mental traz para esse jogo o que está ausente; a linguagem – palavra, desenho, símbolo – o signo, exerce essa função. Vigotsky (2007) considera essa análise importante – o uso de signos na categoria de atividade mediada – pois são esses signos que operam transformações no psiquismo humano. Fundamentado na abordagem sócio-histórica, Pino (2004) nos diz que o processo de conhecimento ultrapassa os muros biológicos. Na ação de produzir, pensando/idealizando essa ação – tarefa eminentemente humana – o homem vai refazendo o caminho construído por outros homens e, mediado por esses mesmos instrumentos, o homem torna seu o que é da cultura. Essa ação é sempre produtiva e mediada por instrumentos. Assim, ressalta Pino (2004, p.19) “isso constitui um dado novo na história da evolução”. A mediação não acontece em um ambiente natural. Ela é historicamente determinada, uma vez que o processo de apropriação efetua-se no decurso do desenvolvimento de relações reais do sujeito com o mundo. Relações que não dependem nem do sujeito nem da sua consciência, mas são determinadas pelas condições históricas concretas, sociais, nas quais ele vive, e pela maneira como a sua vida se forma nestas condições (LEONTIEV, 2004, p.274). Como sugere Cury (1985), o conceito de mediação nos remete a pensar dialeticamente a construção do psiquismo do homem. Ele esclarece que nada está isolado nesse processo. O homem está inserido nesse universo, envolto nas significações sociais onde tudo se relaciona a tudo. Ao nascer, o homem evolui de interpretações simples da realidade para interpretações mais complexas do mundo real e, assim, vai se forjando como ser humano. 46 A explicação da abordagem sócio-histórica acerca do processo de mediação nos faz refletir sobre a relação generosa que deve existir entre os homens, pois “como ser da interação, os seres humanos dependem uns dos outros, pois como seres em processos de desenvolvimento dependem das relações inter e intrapessoais” (FREIRE, 1996, p.59). Na construção de nossa humanidade, portanto, somos todos dependentes – crianças e adultos. Quando adultos não estamos findados, pois continuamos a precisar do outro para nos fazer homens a cada novo momento da vida. Refletindo sobre essa construção, Freire (1996, p.59) declara: Gosto ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de minha presença no mundo, que não se faz no isolamento, isenta da influência das forças sociais, que não se compreende fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo social, cultural e historicamente, tem muito a ver comigo mesmo. Assim, “para mulheres e homens, estar no mundo, necessariamente, significa estar com o mundo e com os outros” (FREIRE, 1996, p.64) e, desse modo, a mediação nos convida a uma atitude fraterna entre todos nós, no sentido da dependência que sempre temos da mediação do outro para construção dos elementos afetivos e cognitivos – suporte ao nosso estar no mundo e com o mundo. Refletindo, pois, sobre o que discutem alguns estudiosos acerca da mediação, reafirmamos o nosso entendimento de que, no âmbito deste trabalho, a mediação é uma categoria fundante que deve perpassar todas as nossas análises e reflexões. Assim pensando, fechamos provisoriamente esta discussão para tratarmos, no próximo item, dos (des)caminhos na tecitura da pesquisa empreendida para a constituição desta tese. 47 1.4 UMA TRAMA: CONTANDO OS (DES)CAMINHOS NA TECITURA DA PESQUISA Traçar um caminho para apreender um dado revelador é muito difícil e desafiador, pois no campo da pesquisa em educação muitos são os percursos indicados para o caminhar, a realidade é complexa, sofre múltiplas determinações e por isso pede olhares diversos para ser desvelada. Martins (1998, p.24), ao discutir noção de complexidade, nos faz refletir sobre a dimensão que esse conceito abarca, mormente no caso específico da educação. Assim, diz o autor: À medida que a noção de complexidade nos remete para a noção de totalidade, de conjunto, etc., podemos dizer que uma das chaves para a sua compreensão está nas relações da parte com o todo, e vise-versa. Assim sendo, compreender uma realidade, tomando-a como complexa, significa entender a interdependência entre todos os fenômenos nela implicados. Acolhemos essa discussão e pensamos que ela está em consonância com o que queremos trazer para esta exposição dos princípios que direcionam o nosso olhar, em busca da compreensão do objeto de estudo. Nesse sentido, nenhuma metodologia pode ser compreendida como uma receita a ser seguida à risca, mas para ser significada/ressignificada numa busca de entrelaçamentos entre o que queremos saber, percorrendo alguns caminhos. Nessa perspectiva, ao elaborar os caminhos para capturar as facetas do objeto de estudo proposto, nos arriscamos a enveredar pelo caminho do artesão intelectual, o pesquisador artesão, onde recriamos caminhos para a imersão no objeto de estudo, pois “[...] o estudioso, como artesão intelectual, tentará juntar o que está fazendo intelectualmente e o que está experimentando como pessoa” (MILLS, 1982, p.213). Compreendemos que mesmo com um trajeto previamente traçado, não teremos garantia absoluta de que iremos conhecer o objeto na sua completude; 48 sempre haverá algo que irá escapar ao nosso olhar, que não será apreendido, haja vista as limitações de pesquisador. Escolher um trajeto e não ser seduzido por outros – e com isto transgredirmos –, é um dos desafios postos para nós pesquisadores. E nesse processo, sempre fazemos a pergunta: por que esta e não aquela outra metodologia? A seguir, justificaremos nossas escolhas – e não outra metodologia. 1.4.1 Por que investigação qualitativa? No tocante à escolha da abordagem qualitativa para nortear esta investigação, entendemos que essa abordagem é utilizada pelos pesquisadores em educação por melhor contribuir para desvelar os conteúdos no campo. Igualmente, a pesquisa qualitativa foi utilizada como referência por ter como pressuposto a compreensão dos fatos e valores, sem separá-los. O pesquisador precisa compreender o significado que os outros atribuem às suas próprias situações, tarefa esta realizada segundo uma compreensão interpretativa da primeira ordem de interpretação das pessoas, expressa em sua linguagem, gestos, etc. Esta abordagem está em consonância com os objetivos deste trabalho que procurou investigar os saberes requeridos do coordenador pedagógico para mediar a atividade docente do professor alfabetizador da EJA, onde, estão envolvidos: sujeitos, fatos e valores. Acreditamos que a inserção e a participação são fundamentais para entender o cotidiano escolar, sua dimensão humana, as interconexões sociais e culturais, e a dialética desse espaço, uma vez que “[...] os investigadores qualitativos assumem que o comportamento humano é significativamente influenciado pelo contexto em que ocorre, deslocando-se sempre que possível ao local de estudo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.48). Ainda de acordo com os autores Ludke e André (1986, p.6) e Bogdan e Biklen (1994, p.47-51 e p.97), os parâmetros da investigação qualitativa em educação apresentam as seguintes características: 49 • O ambiente natural é a fonte direta de apreensão dos dados; • O processo de construção do conhecimento, e não o seu produto, é o foco de interesse; • Os resultados da investigação são tendencialmente descritivos; • O processo de construção caminha do particular para o geral; • Uma importância fundamental é atribuída aos significados construídos pelos sujeitos. No nosso estudo qualitativo, defendemos a tese de que saberes são requeridos do coordenador pedagógico na mediação da atividade docente alfabetizadora da EJA e, partindo dessa defesa, construímos um texto através da descrição da investigação, dando elementos para compreensão da complexa teia que envolve a vida dos sujeitos da escola, em especial o coordenador pedagógico. 1.4.2 Que caminho metodológico percorremos na busca de comprovar a tese? Essa pergunta nos fizemos ao iniciar essa pesquisa e levamos certo tempo até amadurecer e fechar questão sobre quais estratégias utilizar. No nosso Seminário Doutoral I contamos com a presença do estudioso de metodologia da pesquisa, o professor João Amado, da Universidade de Coimbra/Portugal, que muito contribuiu para respondermos a esta pergunta e arrumarmos o nosso percurso metodológico. Então, a partir das reflexões ensejadas nos seminários e outros estudos empreendidos, decidimos usar como metodologia o estudo de caso. 1.4.3 Por que o estudo de caso? Consideramos que esta investigação se evidencia como um estudo de caso, tendo em vista que se abordou o objeto de estudo na realidade particular do ensino noturno da Escola Emilia Ramos que, na sua singularidade, é representativa de uma totalidade (escolas públicas do RN). 50 Em relação ao estudo de caso, Lüdke e André (1986, p.17) destacam: O estudo de caso é o estudo de um caso, seja ele simples e específico, como de uma professora competente de uma escola pública, ou complexo e abstrato, como de classes de alfabetização de adultos (CA) ou do ensino noturno. O caso é sempre bem delimitado, devendo ter seus contornos claramente definidos no desenrolar do estudo. Metodologicamente, o estudo de caso foi escolhido por se tratar de uma análise da realidade particular da Escola Municipal Professora Emília Ramos; em especial, dos saberes da ação pedagógica do coordenador pedagógico na mediação dos professores alfabetizadores da Educação de Jovens e Adultos que lá atuam. Merrian apud Bogdan e Biklen (1994, p.89) elucida: “O estudo de caso consiste na observação detalhada de um contexto, ou indivíduo, de uma única fonte de documento ou de um acontecimento específico”. No mesmo sentido, Lüdke e André (1986) enfatizam que o estudo de caso tem um grande potencial para desvelar a riqueza do cotidiano escolar, compreender o que acontece, dando condições de explicar suas ações. Além disso, o estudo do cotidiano escolar se coloca como fundamental para se compreender como a escola desempenha o seu papel socializador, seja na transmissão dos conteúdos acadêmicos,seja na veiculação das crenças e valores que aparecem nas ações, interações, nas rotinas e nas relações sociais que caracterizam o cotidiano da experiência escolar (ANDRÈ, 1989, p.39). Também buscamos a opinião de Yin (2006, p.191-196), sobre a temática; por sua vez, ele destaca cinco características para que o estudo de caso seja considerado “exemplar”: “ser significativo; ser completo; considerar perspectivas alternativas; apresentar evidências suficientes; ser elaborado de uma maneira atraente”. Consideramos que, de um modo geral, o estudo que empreendemos contempla estas características. 51 Nossa pesquisa se configura como um estudo de caso único – os saberes da ação pedagógica requeridos do coordenador pedagógico da Escola Emília Ramos, como mediador da atividade docente do professor alfabetizador de jovens e adultos. 1.4.3.1 Caracterizando o caso escolhido O campo de investigação é o 1º segmento da EJA da Escola Municipal Professora Emília Ramos, localizada em Cidade Nova, bairro periférico da cidade de Natal/RN. A escolha do campo empírico pautou-se nos seguintes critérios: ser escola pública; oferecer alfabetização de jovens e adultos; permitir o acesso da pesquisadora; aceitar a proposta de trabalho da pesquisadora. Privilegiamos esta Escola pelo seu pioneirismo na vivência de práticas de formação na escola e na profissionalização dos seus professores, desde a sua gênese, tendo a coordenação pedagógica como mediadora dessa prática. Partimos de um pressuposto: as escolas públicas que “dão certo”, que conseguem oferecer um atendimento com qualidade social, têm algo que mobiliza esse fazer, que vai além das lógicas propostas por manuais que “ensinam a ensinar”, portanto, algo que merece investigações. Apesar dos limites impostos pelas condições concretas de vida e de trabalho dos seus alunos e professores, a Escola Emília Ramos é uma escola pública voltada, de fato, para a educação popular. As ações por ela empreendidas – dentro e fora da Escola – nos permitem dizer que, ali, há um forte compromisso político com a inclusão escolar/social de camadas da população, excluídas dos bens materiais e culturais, dentre estes, especialmente o saber sistematizado. Estas e outras razões nos motivaram a eleger o cotidiano da Escola Emília Ramos como o caso a pesquisar e uma das facetas do seu cotidiano – saberes da ação pedagógica requeridos dos seus coordenadores pedagógicos para mediar a ação docente na alfabetização de jovens e adultos – como objeto de estudo, porque a importância do estudo do cotidiano escolar se coloca aí: no dia-a- dia da escola [que] é o momento de concretização de uma série de 52 pressupostos subjacentes à prática pedagógica, ao mesmo tempo que é o momento e o lugar da experiência de socialização que envolve professores e alunos, diretor e professores, diretor e alunos e assim por diante (ANDRÉ, 1989, p.40). A Escola tem um cotidiano muito especial; estar lá nos dá a certeza de que temos muitos caminhos para a construção de uma escola pública preocupada com a garantia do direito social e constitucional – acesso e permanência bem sucedida dos seus alunos. A Escola Emília Ramos foi inaugurada no dia 12 de setembro de 1988, e recebeu o nome ‘da Professora Emília Ramos’, em homenagem a Emília Ramos, uma antiga moradora do bairro – já falecida – que desenvolveu um trabalho voltado para a educação de crianças, jovens e adultos, no bairro de Cidade Nova. Dona Emília era uma mulher engajada nos movimentos da comunidade na luta pela melhoria das condições de vida do bairro. O grupo original de profissionais da Escola era composto por 26 pessoas, entre serventes, merendeiras, professores e coordenação pedagógica e administrativa. A maior parte desse grupo era composta por pessoas do próprio bairro, escolhidas segundo critérios estabelecidos pela coordenação do Projeto Reis Magos12 Em abril de 1988, o grupo que iria compor o quadro da escola começou a refletir, através de estudos sistemáticos, sobre o trabalho pedagógico que seria desenvolvido; enquanto isso, o prédio era construído. Os estudos aconteciam em uma casa do bairro, situada na rua Laranjal, e alugada com a finalidade de se constituir em ponto de encontro para estudos e formação do pessoal que iria trabalhar na Escola. e Conselho Comunitário. O grupo que fez parte da fundação da escola tem relatado que tinha clareza sobre o tipo de escola de que dispunha e que escola queriam construir – no caso, uma escola diferente que estivesse em sintonia com os anseios das classes populares. Então, paralelamente à construção física da escola, os sujeitos que dela já faziam parte, com exceção dos alunos, já construíam os conhecimentos sistemáticos para lá atuarem. Entre estas pessoas, havia algumas que não sabiam 12 Projeto que foi criado em um convênio da Secretaria Municipal de Natal e a Fundação Bernard Van-Leer, da Holanda. Essa Fundação tinha uma linha de trabalho basicamente assistencialista que foi ressignificada pelo grupo local que coordenava o projeto (CAMPELO, 2001, p.117). 53 ler, mas que não ficavam ausentes das discussões e dos estudos das obras de Paulo Freire, Emília Ferreiro, e Madalena Freire, por exemplo. No decorrer dos seus 20 anos, a Escola Emília Ramos – que iniciou só com Educação Infantil, cresceu, expandiu seu atendimento ao Ensino Fundamental – Ciclo de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos 1o Após 20 anos de história, a Escola Emília Ramos mantém sua proposta de construir uma escola diferente, pautada no trabalho coletivo e democrático; onde o fazer pedagógico/andragógico vem sendo desenvolvido numa constante relação teoria/prática, destacando-se que o prazer de estar na Escola é compartilhado por alunos, professores e funcionários. segmento. Originalmente, a Escola Municipal Professora Emília Ramos não foi concebida para atender à Educação de Jovens e Adultos. Na época em que a Escola estava se organizando para dar início ao seu funcionamento, foi realizada uma visita à favela do DETRAN13 Assim aconteceu... No mês de abril de 1989, a Educação de Jovens e Adultos da escola iniciava com um grupo de professores que não tinha nenhuma experiência nessa área. À frente da coordenação, estavam quatro pessoas que desempenhavam as seguintes funções: direção, vice-direção e coordenação pedagógica. Todas elas trabalhavam nos três turnos, mas não tinham experiência nessa modalidade de ensino. , para matricular os alunos da Educação Infantil e, ali, foi detectado um número muito grande de adultos analfabetos, o que também era constatado entre os funcionários da própria Escola. Tais evidências e a reivindicação, de salas de aula para jovens e adultos, motivaram a comunidade escolar, já em 1988, para a necessidade de uma ação educativa para o turno noturno, para atender a essa clientela. Os estudos do grupo, que começava a trabalhar com a EJA, foram inicialmente voltados para a alfabetização e buscavam respaldo na psicogênese da língua escrita, destacando-se as discussões do “como se aprende”, a reflexão da necessidade da escrita espontânea, das escritas sem modelo e sobre a funcionalidade da leitura e da escrita. Essas eram as preocupações iniciais e foram os pilares da formação, segundo entrevista de um dos sujeitos da pesquisa empreendida no mestrado (BEZERRA, 2005). 13 Favela do DETRAN – favela localizada nas proximidades do DETRAN/RN, órgão que está situado entre os bairros de Cidade da Esperança e Cidade Nova, em Natal-RN. 54 Para iniciar o ensino infantil, o grupo do turno diurno passou oito meses estudando. Já o grupo do ensino da EJA fazia estes estudos paralelamente à prática docente, uma vez que havia momentos de parada para estudos, pois a EJA foi pensada quando a Escola já estava funcionando plenamente. No trabalho desenvolvido no mestrado um dos professores entrevistados evidencia: Os estudos para nós era o ponto fundamental do nosso trabalho. A necessidade era tão grande de conhecer, e quem estava à frente do grupo tinha uma posição firme quanto a isso. Nós sentávamos para estudar, e estudar colocando o que a gente vinha encontrando na nossa sala de aula. Eram muitas descobertas para nós professores como também para as pessoas que estavam no apoio pedagógico (Entrevista P1)14 . Nesse processo de formação de professores, o grupo, desde o seu início, teve a preocupação de trazer para a pauta dos estudos o que havia de novo em pesquisa no campo da educação. Assim sendo, em 1989, com apenas quatro anos de edição em língua portuguesa do livro ‘Reflexões sobre Alfabetização’, o grupo já o estudava com muita veemência. Inicialmente, a preocupação dos professores estava centrada nas questões relacionadas à alfabetização – como foi visto nos depoimentos –, mas à medida que essas questões encontravam respostas, muitas outras surgiam. Na EJA, os professores começaram a perceber que precisavam aprofundar as discussões que tivessem como foco a modalidade e os sujeitos desse ensino: a EJA. A gente começava a sentir a necessidade de estudo, de ler, de estudar, coisas que falassem mais de Educação de jovens e Adultos. A gente sentia que tinha alguma coisa relacionada a uma epistemologia mesmo do conhecimento, a gênese do conhecimento nos “jovens e adultos”. Quais as suas características? E que conteúdos eram mais adequados para esse grupo? Como organiza- los de forma melhor? E essas inquietações iam provocando desânimo pelo fato de nos causar desequilíbrio mesmo; mas daqui a pouco a gente se levantava e buscava respostas. As nossas dificuldades eram em termos de formação. As dificuldades eram 14 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados na pesquisa de Bezerra (2005, p. 80). 55 superadas com apoio do grupo, do estudo das discussões (Entrevista P1)15 . O grupo começou a perceber que tudo o que se fazia tinha como parâmetro a Educação Infantil e, com a prática passou a entender que havia diferenças entre as crianças e os jovens/adultos. A partir de 1990, os nossos estudos começaram a ter outro foco, apesar de ainda centrado na questão da psicogênese da língua escrita. Agora começávamos a perceber que existiam especificidades quanto ao jovem e ao adulto que estava sendo alfabetizado. Uma das primeiras questões que começamos a discutir era se a gênese do conhecimento, da escrita do adulto seguia a mesma gênese do que acontecia com as crianças (P-1). Segundo P1, os estudos que tinham a EJA como foco se intensificaram a partir de 1997, e Paulo Freire era a grande referência. A partir desses estudos e reflexões, o grupo compreendeu que alfabetizar jovens e adultos era diferente de alfabetizar crianças; e a partir dessa compreensão, os estudos objetivavam distinguir essas diferenças. Outros autores também foram referência para o trabalho: Ferreiro e Teberosky nas questões relacionadas à escrita, Foucambert e Smith no campo da leitura, Nilton Duarte na matemática, Freinet na organização do trabalho pedagógico com ênfase nas festas de aniversário, o texto livre e reescrita, Sérgio Haddad nas questões específicas da EJA, e começamos também a estudar textos relacionados à Andragogia (Entrevista P1)16 . Infere-se, portanto, que são 19 anos de construção de uma proposta para atender a Jovens e Adultos. Todo esse processo de construção foi pautado por estudos teóricos e troca de experiência com os pares, através dos quais o professor reflete sua ação docente e faz muitas descobertas. Como afirma uma das 15 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados na pesquisa de Bezerra (2005, p. 81). 16 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados na pesquisa de Bezerra (2005, p. 82). 56 professoras: “[...] a gente começou a compreender que as mudanças que iam acontecer na nossa prática, quem proporcionava era justamente a apropriação de novos conteúdos vindos dos estudos que aconteciam” (P-1). À medida que esses estudos foram sendo aprofundados, a Proposta da EJA foi sendo construída pelo grupo, apoiada pela conexão teoria/prática. P117 esclarece: “A gente começou em cima dos nossos referenciais, quebrando muitos referenciais, reconstruindo esses referenciais, mas a gente conseguiu depois ir tomando um rumo diferente, dando uma cara realmente diferente à Educação de Jovens e Adultos”. 1.4.4 Como fazer? Os instrumentos de apreensão do corpus da pesquisa Buscando compreender o trabalho que é desenvolvido pela coordenação pedagógica na escola Emília Ramos, utilizamos vários instrumentos de apreensão do corpus da pesquisa: observação; registros no caderno de campo; questionário; entrevista semi-estruturada; documentos. As opções metodológicas escolhidas nos colocaram riscos, mas, com ponderação, pensamos que esses caminhos para abordagem do objeto foram os mais adequados. A seguir, discutiremos o percurso no campo, através dos instrumentos utilizados. 1.4.4.1 A observação participante: o olhar da pesquisadora sobre a escola na busca de elementos para tecedura da tese A observação participante viabilizou a relação direta com o lócus da pesquisa e o objeto de estudo. Nesta perspectiva Caetano (1997, p.313) reflete: 17 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados na pesquisa de Bezerra (2005, p. 83). 57 Parto do pressuposto de que a compreensão de uma dada realidade é favorecida quando nos inserimos nesta, quando lhe percebemos os fluxos, quando procuramos que as nossas perspectivas entrem em diálogo com as perspectivas dos intervenientes e quando o nosso quadro de referência inclui, o mais possível, elementos do quadro de referência dos contextos em estudo. A propósito da observação, Lüdke e André (1986, p.26) destacam que esta “possibilita um contato pessoal e estreito do pesquisador com o fenômeno pesquisado. A experiência direta é, sem dúvida, o melhor teste de verificação da ocorrência de um determinado fenômeno”. A observação participante cria condições para o investigador participar mais ativamente da vida do ambiente pesquisado. Em relação a essa pesquisa, a observação participante criou situações que oportunizaram adentrar o cotidiano da Escola. Feito isso, pudemos explorar questões dificilmente apreendidas pelos demais instrumentos; compreensão que passamos a ter após a leitura de Yin (2006, p.121), para quem “a observação participante fornece certas oportunidades incomuns para coleta de dados em um estudo de caso”. Para o início do estudo, expusemos o projeto de pesquisa para os professores e coordenação pedagógica, oportunidade em que pedimos a permissão para desenvolvermos a pesquisa. O projeto foi aceito pelo grupo. Enviamos também ao Conselho da Escola o pedido para podermos divulgar o nome da Escola no trabalho. A Escola Emília Ramos é visitada anualmente por uma grande quantidade de pesquisadores das mais diversas Universidades da Cidade, dando contribuições para construções de trabalhos monográficos de graduação e especialização, como também dissertações de mestrado e tese de doutorado. Tínhamos familiaridade com aquela Escola, por ser nosso local de trabalho e, por isso, não podemos deixar de evidenciar que, nesta pesquisa, a pessoa da investigadora esteve implicada, visto que, estudou o seu local de trabalho – inspirador de sua investigação. Mills (1982, p.211) ressalta que “os pensadores mais admiráveis dentro da comunidade intelectual que escolheram não separam seu trabalho de suas vidas” e também Bourdieu (1997, p.697), que complementa nossa compreensão: “A 58 proximidade social e a familiaridade asseguram efetivamente duas das condições principais de uma comunicação ‘não violenta’”. Mas, o que nos ensina Barbier (1985, p.120) acerca da ‘implicação’? A implicação, no campo das ciências humanas, pode ser então definida como o engajamento pessoal e coletivo do pesquisador em e por sua práxis científica, em função de sua história familiar e libidinal, de suas posições passada e atual nas relações de produção e de classe, e de seu projeto sócio-político em ato, de tal modo que o investimento que resulte inevitavelmente de tudo isso seja parte integrante e dinâmica de toda atividade de conhecimento. Essa implicação – que se diferencia da do pesquisador não implicado que vê o objeto numa perspectiva diferenciada – “pode fornecer esclarecimentos surpreendentes e reveladores do objeto estudado” (BARBIER, 1985, p.112). Caetano (1997, p.328) destaca que a implicação é importante no sentido que “quanto mais dentro está, mais do ponto de vista de dentro se aproxima”; nesse sentido, o pesquisador e seus atores e seus pontos de vista diferentes se interpenetram num jogo dialógico de co-autoria (CAETANO, 1997). Apesar de fazer parte do grupo e, de certo modo, conhecer a sua dinâmica, naquele momento – afastada das funções profissionais – ocupávamos o lugar de pesquisadora e, por isso, tivemos o cuidado para que as observações fossem planejadas de maneira cuidadosa, com a preocupação de que não fossem artificializados os comportamentos dos sujeitos da pesquisa. A observação participante aconteceu durante todo o ano de 2006, em vários momentos da vida da Escola. Participamos de encontros em que o grupo da EJA estava presente. Muitos foram esses momentos e, por esta razão, dispomos de uma grande quantidade de material. Acreditamos que conhecer a realidade concreta desses encontros desvenda, de alguma forma, a função de socialização não-manifesta da escola, ao mesmo tempo em que indica as alternativas para que esta função seja concretizada da maneira o mais dialética possível (ANDRÉ, 1989, p.40). 59 E, logo no início da pesquisa percebemos que deveríamos estar atentos a todos os momentos daquele cotidiano, pois como ressaltam Bogdan e Biklen (1994, p.49) “[...] nada é trivial, [...] tudo tem um potencial para construir uma pista que nos permita estabelecer uma compreensão mais esclarecedora do objeto de estudo”. Houve muita cumplicidade e liberdade de ação e de expressão dos docentes do turno noturno para com a pesquisa. O grupo foi um grande parceiro, permitindo que todos os momentos pudessem ser observados: desde questões mais particulares, como conversas de professores no momento em que socializavam seu planejamento, até momentos em que discutiam suas dificuldades em encaminhar determinadas atividades. 1.4.4.2 O caderno de campo Como foi elucidado anteriormente, realizamos durante o ano de 2006 a pesquisa de campo que se configurou como observação participante. O olhar da pesquisa voltou-se para todos os momentos em que a coordenação estava em ação: reuniões de coordenação e direção dos três turnos da escola; reunião de planejamento com professores; reunião de estudo com professores; atendimento a pais; reunião no SINTE18 Nesse sentido, Vianna (2003, p.59) ressalta que “o observador precisa desenvolver um método pessoal para fazer suas anotações, para não ser traído por sua memória e, além disso, deve fazer um registro de natureza narrativa de tudo que foi constatado”. Desse modo, ficamos atentos e tínhamos sempre à mão o caderno de campo onde constava um roteiro para registro que consistia nos seguintes pontos: ; encontros promovidos pela Secretaria Municipal de Educação; conversa com alunos e pais, dentre outros. • Dia da observação 18 Sindicato dos Trabalhadores em Educação. 60 • Local • Duração • Tema do encontro • Mediadores do encontro • Descrição geral da situação observada • Reflexão da situação observada A observação se deu em todos esses momentos anteriormente citados. Quando iniciamos o trabalho, pedimos permissão ao grupo para utilizarmos o caderno de campo onde tentamos registrar por escrito todos esses encontros, pois as discussões que aconteciam eram riquíssimas. 1.4.4.3 Questionário: desvelando um pouco da vida dos atores da pesquisa Com o objetivo de realizar uma descrição/caracterização dos atores da pesquisa – duas coordenadoras pedagógicas do turno noturno e as duas professoras responsáveis pelas turmas do nível I da Modalidade EJA, que corresponde ao início da alfabetização – aplicamos um questionário (ver Apêndices C e D). Concordamos com Richardson et al. (1999, p.188), ao destacarem o questionário como “instrumento que contribui para a análise a ser feita pelo pesquisador” pois, a análise do corpus da pesquisa advindo da aplicação do questionário nos permitiu um olhar em perspectiva sobre o grupo pesquisado. O questionário foi entregue aos atores da pesquisa com prazo para devolução, combinado entre o pesquisador e as colaboradoras da pesquisa, sendo este prazo prontamente atendido. A seguir iremos apresentar a caracterização dos atores da pesquisa. 61 1.4.4.3.1 Caracterização dos atores da pesquisa A referência aos sujeitos da pesquisa será através de codinomes, de modo a preservar as suas identidades. Assim sendo, chamados pelos nomes que se seguem: Ana Beatriz, Ana Catarina, Ana Júlia e Ana Maria19 As professoras e coordenadoras . 20 Todas têm mais de quinze anos de docência, destacando-se que Ana Maria é a que tem mais tempo de serviço como professor: 35 anos. Em relação ao tempo de serviço na EJA, Ana Beatriz e Ana Catarina têm apenas três anos de experiência, e Ana Júlia e Ana Maria têm mais de dez anos de atuação docente nessa modalidade de ensino. investigadas têm idades que variam entre 36 e 58 anos. Em relação à formação acadêmica, um dado importante é o fato de todas terem formação superior em Pedagogia e Especialização na área da Educação, o que, certamente, deve concorrer para a melhoria da qualidade do trabalho pedagógico. Quanto ao vínculo empregatício na Escola, Ana Catarina, Ana Júlia e Ana Maria são do quadro efetivo e, apenas, Ana Beatriz tem contrato provisório. Consideramos esses dados como favoráveis ao desenvolvimento de um bom trabalho docente, pela estabilidade funcional da quase totalidade das professoras que atuam junto ao nível I do 1º segmento da EJA, naquela Escola. A análise das informações nos permite dizer que, com exceção de Ana Maria, todas as professoras pesquisadas possuem outra função extra-escolar; Ana Beatriz e Ana Júlia atuam na docência e Ana Catarina como coordenadora pedagógica. Embora o ideal seja o trabalho docente em regime de dedicação exclusiva numa só escola, observamos que a situação dos nossos sujeitos não é tão desfavorável, uma vez que todos os que desenvolvem atividades fora da Escola que pesquisamos, o fazem também no âmbito da educação, o que pode ser 19 Ver apêndice A, onde apresentamos a caracterização dos sujeitos da pesquisa. 20 Como todos os sujeitos da pesquisa são mulheres, iremos utilizar, sempre que nos referirmos às suas falas, o gênero feminino. 62 enriquecedor para o seu desempenho nos diferentes ambientes escolares em que trabalham. No tocante ao quesito ‘jornada de trabalho diária’, verificamos que Ana Beatriz, Ana Catarina e Ana Júlia trabalham mais de 10 horas por dia e Ana Maria trabalha em torno de 06 horas. Diante do exposto, concluímos que a maioria das professoras tem dupla/tripla jornada de trabalho e, para algumas delas, a EJA é o terceiro expediente. Em muitos momentos da observação, percebíamos um nítido cansaço físico e emocional de Ana Catarina ao chegar à escola para seu terceiro expediente. Podemos inferir a partir dessas observações, que o cansaço da professora trazia implicações para o seu rendimento como professora. De um modo geral, a situação das professoras da Escola pesquisada não é diferente da situação dos professores das escolas públicas brasileiras que precisam trabalhar o dia inteiro em mais de uma escola; muito mais para garantir as condições materiais básicas para a sobrevivência do que em busca de uma vida mais confortável, para eles ou, no caso de alguns, para toda a família. A profissão docente exige que o professor garanta, com o seu salário, não apenas as condições materiais necessárias à sobrevivência, mas também compre livros, faça cursos, tenha acesso à internet, assista a bons programas de tv – dificilmente encontrados em canais abertos –, vá ao teatro, cinema; como mediador da construção de conhecimento que é, o professor também precisa desses instrumentos disponíveis na sociedade para fazer face às exigências impostas a sua profissão. Sabemos que a situação salarial não garante ao professor essas condições, obrigando-o a trabalhar mais de oito horas por dia. Cumpre-nos destacar que o salário será adequado quando o valor pago ao trabalhador suprir suas necessidades; será baixo quando faltar algo à mesa ou a biblioteca do professor; será alto quando permitir que se amplie o poder de consumo definido pela cultura e desenvolvimento histórico da categoria, envolvendo alguns supérfluos, ou, o que é o mesmo, se amplie o patamar das necessidades desta categoria profissional. (ODELIUS; CODO, 1999, p.193). 63 Nesse sentido, reconhecemos a importância da estabilidade financeira do professor, como condição necessária, embora insuficiente, para sua estabilidade emocional que, certamente, repercutirá de forma positiva na qualidade da sua prática pedagógica. Muitas são as atribuições do professor que, além do expediente na escola, precisa planejar suas aulas, estudar conteúdos a serem ministrados, registrar desempenho dos alunos, participar da gestão escolar e ter um tempo para o lazer, descanso e família. Considerando que a atividade docente passa pela ação/reflexão/ação, como essa prática pode ser operacionalizada no contexto atual das condições materiais de vida do professor? Como vimos, as professoras e coordenadoras pesquisadas trabalham efetivamente, em média, oito horas por dia nas escolas. Ana Catarina trabalha mais de dez horas por dia e quando chega à EJA, entra no seu terceiro expediente, o que é bastante desgastante para o ser humano. Vasques-Menezes, Codo e Medeiros (1999, p.258) advertem que os conflitos entre a vida profissional e pessoal, essa falta de tempo para a dedicação que a profissão e a vida em família exigem, levam o professor a um “sofrimento psíquico, à exaustão emocional e à despersonalização”. É oportuno destacar que, além do já exposto, os professores se deparam, diariamente, com escolas sucateadas e alunos que, dada a sua situação de existência, carregam inúmeros problemas afetivos, cognitivos e sociais. A situação dos alunos se agrava quando se trata do ensino fundamental para jovens e adultos, pois estes, geralmente, trazem consigo a desesperança e a marca do fracasso escolar. 1.4.4.4 Entrevista Semi-Estruturada: um soltar de fios/falas para apreensão do objeto de estudo A entrevista, como instrumento da pesquisa qualitativa, é um recurso que possui um grande potencial na investigação em educação. Considerando o objeto de estudo, e o objetivo do trabalho, entendemos que a entrevista proporcionou a coleta 64 de informações orais nas quais atores da pesquisa deram seu testemunho sobre os saberes da ação pedagógica do coordenador na mediação do professor alfabetizador da EJA, uma vez que “[...] a entrevista é utilizada para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma idéia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspectos do mundo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.134). No tocante às entrevistas, Lüdke e André (1986, p.34) destacam que a grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas é que ela permite a captação imediata e corrente da informação desejada, praticamente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos. [...] a entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações que tornam sobremaneira eficaz na obtenção das informações desejadas. Trabalhamos com a entrevista semi-estruturada por compreender que esta capta a informação na sua profundidade. O questionário nos ajudou na caracterização dos atores e na recolha das primeiras informações, e a entrevista nos proporcionou o adentramento na questão da pesquisa. Thiollent (1982) estabelece a diferença entre questionário e entrevista semi-estruturada e explicita o caráter de captação em profundidade da informação que a entrevista semi-estruturada proporciona. Desse modo, Thiollent (1982, p.33) ressalta: A diferença entre o questionário e as entrevistas semi-estruturada e não diretiva reside na extensividade do primeiro (grande número de pessoas e fechamento das perguntas) e na intensidade das segundas (pequeno número de pessoas e grande abertura das perguntas para maior ‘profundidade’). A profundidade é, neste contexto, freqüentemente associada à captação de informação de caráter mais afetivo do que cognitivo. Decidimos trabalhar com a entrevista semi-estruturada, por acreditarmos que esta modalidade cria condições para o investigador captar a forma como os sujeitos interpretam o mundo; no caso da investigação realizada, buscávamos investigar/compreender os saberes da ação pedagógica do coordenador 65 pedagógico, cujo trabalho específico é orientar/mediar a prática pedagógica de professores alfabetizadores de jovens e adultos. Trabalhamos com um roteiro, mas não apenas fazíamos perguntas; existiam momentos em que discutíamos com os entrevistados algumas questões e, quando necessário, acrescentávamos outras perguntas, de modo a esclarecer questões ou aprofundá-las, uma vez que a entrevista semi-estruturada é uma “[...] série de perguntas abertas, feitas verbalmente em uma ordem prevista, na qual o entrevistador pode acrescentar perguntas de esclarecimento” (LAVILLE; DIONE, 1999, p.188). Ficamos muito atentas às novas situações vividas na Escola e sua influência nas narrativas dos atores. Durante todo o ano de 2003 – período da pesquisa empreendida no mestrado – observamos a realidade de um grupo bastante articulado e coeso, que, no momento da pesquisa em 2006, passava por um momento de desconstrução/reconstrução. Era importante considerar aquele momento porque “[...] devemos estar atentos para a própria situação da entrevista e para a situação peculiar do entrevistado que também pode influenciar a natureza das informações prestadas” (HAGUETTE, 2000, p.90). Ficou evidente que as entrevistas repercutiram bastante e desencadearam um processo de reflexão. Vejamos algumas narrativas das colaboradoras, onde explicitam as repercussões das entrevistas: [...] você entra muito em contato com as coisas que você de certa forma tenta ir passando por cima, por acomodação ou por não perceber, mas eu acho que muita coisa a gente percebe e faz de conta que não percebe. A entrevista provocou muita reflexão (Ana Katarina). Foi um momento de mergulho sabe? Dar um mergulho e pensar, analisar, ficar refletindo o que é que eu estou fazendo, que coisas que eu poderia melhorar. Sinto muita angústia, conflito, mas ao mesmo tempo veio aquela determinação [...] foi um momento em que eu fiz uma revisão do que a gente faz, e o que é possível ser feito, o que eu não estou fazendo ainda, porque pelo próprio ativismo do cotidiano escolar não dá para perceber, só percebemos quando paramos para pensar. Então, a entrevista me deu essa possibilidade...vários meandros para ressignificações de saberes, coisa que eu preciso ter apropriação, que eu não sei ainda, para fazer minha caminhada enquanto coordenadora pedagógica (Ana Beatriz). 66 Na busca de apreender o objeto de estudo, utilizamos dois instrumentais para entrevistas que podem ser visualizados nos Apêndices E e F. As entrevistas foram realizadas de acordo com a disponibilidade dos sujeitos. Todas foram feitas na casa dos atores da pesquisa. As entrevistas foram gravadas, transcritas, conferidas por todos os entrevistados, autorizando a sua utilização e, posteriormente, analisadas. 1.4.4.5 Documentos: o já dito/escrito como um a mais na pesquisa Os documentos representam uma rica fonte de informações e oferecem um manancial de informações para a pesquisa qualitativa em educação, em especial as pesquisas realizadas em escolas que tenham a prática de registrar suas intenções por escrito. Sendo assim, a análise documental é uma grande parceira da observação participante, pois temos a oportunidade de contrapor o proposto nos documentos com a prática. Yin (2006) destaca a investigação, tendo como base o trabalho com documentos relevantes para o estudo de caso. Mas, em que se constituem os documentos? Entre as fontes impressas, distinguem-se vários tipos de documentos, desde as publicações de organismos que definem orientações, enunciam políticas, expõem projetos, prestam conta de realizações, até documentos pessoais, diários íntimos, correspondências e outros escritos em que as pessoas contam suas experiências, descrevem suas emoções, expressam a percepção que têm de si mesmas (LAVILLE; DIONE 1999, p.166). A Escola Emília Ramos tem a prática de registrar sua história desde a sua criação. Como fazemos parte da Escola, sabíamos da existência de seu grande acervo documental. Nesse sentido, muitos foram os documentos aos quais tivemos acesso; e foi difícil fazer a seleção dos que iríamos trabalhar, haja vista que, a princípio, todos nos pareciam muito interessantes. 67 Fizemos uma seleção prévia dos documentos que tinham uma relação mais direta com o objeto de estudo. Selecionamos os que registraram a história da Escola: o Regimento Escolar, o Projeto Político Pedagógico, a Proposta da EJA e a Proposta da Coordenação Pedagógica, dentre outros. Os documentos deram uma grande contribuição para referendar as observações empreendidas, uma vez que “os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde podem ser retiradas evidências que fundamentem afirmações e declarações do pesquisador” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p.39). 1.4.5 Caderno de campo, questionário, entrevistas, documentos...: a triangulação/categorização do corpus da pesquisa /análise de conteúdo O caso pesquisado aportou em fontes variadas de informações. Yin (2006, p.33) destaca que o estudo de caso “baseia-se em várias fontes de evidências, com os dados precisando convergir em um formato de triângulo”, a análise foi realizada tendo as três fontes de informações citadas como parâmetro; porque, ainda segundo este autor, “qualquer descoberta ou conclusão em um estudo de caso provavelmente será muito mais convincente e acurada se baseada em várias fontes distintas de informação, obedecendo a um estilo corroborativo de pesquisa” (YIN, 2006, p.126). O questionário e a entrevista foram aplicados e transcritos respeitando-se as falas dos sujeitos, permitindo-nos a organização e constituição do corpus da pesquisa. De modo geral, as entrevistas permearam e disponibilizaram mais elementos para a elaboração do quadro de categorias – apresentado no Capítulo 3. A construção do quadro de categorias foi marcada por um período de muitas discussões, reflexões, tentativas, idas e voltas... Essa construção assemelha-se ou seguiu o processo descrito por Bogdan e Biklen (1994, p.221), quando nos mostra (os passos) ou como chegar à definição ou eleição de categorias. 68 À medida que vai lendo os dados, repetem-se ou destacam-se certas palavras, frases, padrões de comportamento, formas dos sujeitos pensarem e acontecimentos. O desenvolvimento de um sistema de codificação envolve vários passos: percorre os seus dados na procura de regularidades e padrões bem como de tópicos presentes nos dados e, em seguida, escreve palavras e frases que representam estes mesmos tópicos e padrões. Estas palavras ou frases são categorias de codificação. As categorias constituem um meio de classificar os dados descritivos que recolheu. O corpus da pesquisa, captado pelos instrumentos destacados, foi interpretado e trabalhado através da análise de conteúdo, que atende às expectativas de uma abordagem interpretativa, como é o caso da nossa investigação. Para isto, buscamos nos fundamentar em Bardin (1977, p.42) que concebe a análise de conteúdo como [...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. Essa técnica, de que nos fala Bardin (1977), é considerada por Amado (1998/1999) como um processo de arrumação de dados num sistema de categorização, no qual é atribuído sentido ao conteúdo exposto. 1.5 UM TRABALHO... Na elaboração desta tese, organizamos o trabalho em cinco capítulos. No Capítulo 1, “uma professora, uma história e uma tese...”, introduzimos os interlocutores, situando e justificando a tese, a problemática, apresentando a questão de pesquisa, o objetivo do trabalho, o percurso metodológico, as professoras pesquisadas e o lócus da pesquisa. 69 No Capítulo 2, “a urdidura do estudo: por onde passam os fios da tese?”, (re)visitamos o marco teórico, empreendemos uma discussão acerca da coordenação pedagógica, dos saberes e da alfabetização. Compreendemos que o olhar teórico iluminou o estar no campo de pesquisa, como também nos permitiu aportar na categorização do material apreendido. No Capítulo 3, “saberes em fios que se tecem na alfabetização de jovens e adultos”, norteada pelo objetivo do trabalho, apresentamos os saberes requeridos do coordenador pedagógico, como mediador da atividade docente do professor alfabetizador de jovens e adultos, segundo a perspectiva dos nossos sujeitos, que optamos, neste trabalho, chamar de “atores” da pesquisa”. No Capítulo 4, “o arremate dos fios da tese”, apresentamos as conclusões a que nos foi possível chegar. 22 2 AURDIDURADOESTUDO:PORO NDEPASSAMOSFIOSDATESE?A URDIDURADOESTUDO:PORON DEPASSAMOSFIOSDATESE?AUR DIDURADOESTUDO:PORONDEP ASSAMOSFIOSDATESE?AURDID URADOESTUDO:PORONDEPASS AMOSFIOSDATESE?AURDIDUR ADOESTUDO:PORONDEPASSA MOSFIOSDATESE?AURDIDURA DOESTUDO:PORONDEPASSAM OSFIOSDATESE?AURDIDURADO ESTUDO:PORONDEPASSAMOSFI OSDATESE?AURIDURADOESTU DO:PORONDEPASSAMOSFIOSD ATESE?AURDIDURADOESTUDO :PORONDEPASSAMOSFIOSDATE [...] toda prática educativa envolve uma postura teórica por parte do educador. Esta postura, em si mesma, implica – às vezes mais, às vezes menos explicitamente – uma concepção dos seres humanos e do mundo. E não poderia deixar de ser assim. É que o processo de orientação dos seres humanos no mundo envolve não apenas a associação de imagens sensoriais, como entre os animais, mas, sobretudo, pensamento-linguagem; envolve desejo, trabalho- ação transformadora sobre o mundo, de que resulta o conhecimento do mundo transformado. (FREIRE, 2006, p.51). II Capítulo 71 2 A URDIDURA DO ESTUDO: POR ONDE PASSAM OS FIOS DA TESE? Parafraseando Freire (2006), explicitamos: toda pesquisa envolve uma postura teórica por parte do pesquisador. Nela mostramos, através das linguagens expressas na escritura da tese, nas ações no campo de pesquisa e no olhar sobre o corpus da pesquisa apreendida no campo, nossa postura diante da vida, da sociedade; dizemos também para que serve e a quem serve a ciência que fazemos. Em suma: entre as palavras e por trás das palavras, somos convidados a assumir a nossa posição no mundo. A escrita de uma tese é um lugar de encontros e desencontros. Encontro com as idéias, concepções e teorias que defendemos; encontro com os pesquisadores/autores que nos são muito caros por defenderem as idéias com as quais nos filiamos. Momento de incertezas, pois, nem sempre conseguimos abraçar por inteiro determinadas concepções, mas em parte concordamos com elas. É um momento também de desencontros, uma vez que, ao nos filiarmos/assumirmos as idéias/concepções e teorias que defendemos, negamos as que nos são contrárias. Assim, nesse instante, partimos para o encontro com o arcabouço teórico que orientou o nosso olhar no campo. Nesse trabalho, tratamos dos saberes da ação pedagógica do coordenador pedagógico no exercício de sua ação mediadora junto ao professor alfabetizador da EJA. Desse modo, defendemos a Tese de que: a ação do Coordenador Pedagógico, na escola, demanda saberes e fazeres da ação pedagógica; estes adquirem especificidades no exercício da mediação/orientação da prática pedagógica de professores alfabetizadores de jovens e adultos. A discussão que empreenderemos terá uma tríade conceitual que está entrelaçada nesta tese e que representamos no diagrama que se segue: 72 Figura 1 Tríade Conceitual Em relação a cada conceito estudado, outras vias de discussão serão percorridas, na incessante busca de concluir as nossas análises inconclusas. Conseguimos, simplesmente, seguir a nossa lógica na intenção de conceituar a tríade a que nos propomos. Então, a seguir, delimitaremos o aporte teórico que norteou o nosso olhar no campo e na análise do corpus da pesquisa, pois consideramos relevante apresentá-lo. 2.1 COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA: HISTÓRIA E DEMANDAS No contexto nacional e internacional, a partir da segunda metade do século passado, em especial na década de 1990 e nesse início de milênio, assistimos a grandes transformações de ordem política, econômica, tecnológica e social e, conseqüentemente, essas mudanças repercutem no contexto escolar. Segundo Garcia (1999, p.11), três grandes fatores estão a influenciar e a decidir a importância da formação na sociedade atual: “o impacto da sociedade da informação, o impacto do mundo científico e tecnológico e a internacionalização da economia”. Saberes da Ação pedagógica Alfabetização Coordenação Pedagógica 73 Acreditamos que a escola não conseguirá dar conta de acompanhar todo esse progresso, mas também não é esse o seu papel. A escola tem como papel formar pessoas que tenham autonomia, com nos diz Alarcão (2005); pessoas com um pensamento flexível, que sejam criativas; dessa forma, estarão mais preparadas para esse mundo complexo, extremamente incerto, pois o que conseguimos vislumbrar adiante é um aumento das exigências desse contexto que podemos questionar, mas não podemos negar. Pretendemos, nesta temática, construir uma discussão que nos possibilite compreender a trajetória de atuação desse profissional – o coordenador pedagógico da escola – que traz elementos para a construção de um quadro conceitual para o entendimento do seu papel na escola. A nossa reflexão tem início com a história desse profissional que começa a se constituir, de forma tênue, na antiguidade e no período medieval, onde desempenhava uma função de controle, até o momento presente, onde se vislumbra esse profissional como coordenador das atividades pedagógicas na escola. 2.1.1 Coordenador pedagógico, supervisor, suporte pedagógico...: puxando fios históricos dessas nomenclaturas Tudo tem uma história, um porquê, nada é dado, mas construído historicamente. Nesse sentido, iremos puxar fios históricos buscando compreender como foi se configurando o profissional, coordenador pedagógico, ao longo da história de sua atuação, no campo da escola. Coordenador pedagógico, supervisor, apoio pedagógico, especialista, suporte pedagógico, dentre outras nomenclaturas, são utilizadas para designar o profissional que na escola realiza o trabalho de mediação da prática pedagógica. Inferimos que essas nomenclaturas foram se modificando de acordo com as mudanças políticas, econômicas e sociais vividas pela sociedade brasileira, ressaltando que “a função supervisora expressa em termos de coordenação, orientação ou assistência pedagógica aparece na legislação escolar a partir de 1942” (ELIAS apud ROMAN, 2001, p.12). 74 Saviani (2006) apresenta uma perspectiva histórica da supervisão21 Ao discutir o surgimento da escola, o autor destaca a antiguidade e o período medieval e, neste contexto, a escola ainda existindo numa estrutura simples “limitada à relação de um mestre e seus discípulos” (SAVIANI, 2006, p.16), onde o mestre (professor) desenvolvia seu trabalho junto aos discípulos (alunos) por inteiro, sem intermediações. Mas, mesmo nesse período, ele aponta a figura do supervisor como aquele responsável pelo “[...] controle, de conformação, de fiscalização e mesmo de coerção expressa nas punições e castigos físicos” (SAVIANI, 2006, p.16). educacional, faz uma reflexão profunda que nos remete às comunidades primitivas, estabelecendo uma relação do papel dos adultos, ainda que discreta, na proteção e orientação das crianças. Com o processo de constituição da escola de maneira institucionalizada, Saviani (2006, p.19) afirma que foi esse o marco do surgimento da [...] idéia de supervisão educacional, o que vai se evidenciando na organização da instrução pública desde a sua manifestação, ainda religiosa, nos séculos XVI e XVII as propostas de Lutero, Calvino e Melanchthon, com Comenius, os jesuítas e os lassalistas passando, nos séculos XVIII e XIX às propostas de organização de sistemas estatais e nacionais, de orientação laica, até as amplas redes escolares instituídas no século atual. É com a organização do ensino no Brasil, pelos Jesuítas, que a idéia de supervisão é capturada na discussão histórica empreendida por Saviani (2006), com a implantação de um plano geral, em 1570 – o Plano Ratio Studiorum. Esse plano é constituído por um conjunto de regras e dá conta das atividades de todas as pessoas responsáveis pelo ensino. Na lógica organizacional desse plano, existia a figura do reitor, do prefeito de estudos – a idéia de supervisor –, e dos professores. O prefeito – como início do surgimento da idéia do supervisor – era assistente do reitor e os professores e alunos tinham que acatar suas decisões (SAVIANI, 2006). 21 Ainda é muito recorrente, em alguns textos pesquisados, o uso da nomenclatura supervisão pedagógica. Assim, esclarecemos que, ao utilizar citações de autores que ainda recorrem ao termo supervisão, estamos compreendendo que aquilo que é posto por esses autores condiz, de certa forma, com o que apresentamos sobre coordenação pedagógica. 75 Então, Saviani (2006) identifica esse momento como o surgimento da idéia da supervisão. No estudo empreendido por Saviani, são expostos os desdobramentos posteriores que a função supervisora passa a ter, a partir das reformas/mudanças ao longo da história da educação brasileira, aonde, em cada momento, essa função vai sendo ressignificada/instituída quando são requeridos novos papéis. O curso de Pedagogia, criado na década de 1930, instituiu a função de técnico da educação que não tinha função bem definida (SAVIANI, 2006). Com a reformulação dos cursos de Pedagogia (Parecer nº 252/1969), deixava de existir a figura do técnico em educação, dando lugar às habilitações: O curso de pedagogia foi, então, organizado na forma de habilitações, que após um núcleo comum centrado nas disciplinas de fundamentos da educação, ministradas de forma bastante sumária, deveriam garantir uma formação diversificada numa função específica da ação educativa. [...] Foram previstas quatro habilitações centradas nas áreas técnicas, individualizadas por função, a saber: administração, inspeção, supervisão e orientação (SAVIANI, 2006, p.29). Saviani (2006) afirma que é este Parecer que institui a função do supervisor, mas ele infere que tais habilitações se configuravam como divisão de tarefas no campo da educação. Ele explica que a atuação desse profissional se dá em um campo específico que é a educação. Para ele, a administração, a orientação e a supervisão são tarefas educativas e que o profissional apto a desempenhá-las é o educador. Para Nogueira (1989), o surgimento explícito da supervisão escolar se dá na busca dos Estados Unidos por aliados, na época da Guerra Fria. Ele explicita: Assim, sob os argumentos de que a melhoria das condições sociais e econômicas, em qualquer parte do “mundo livre”, redundaria em benefício dos Estados Unidos e de que devemos oferecer, aos países amigos da paz, os benefícios do nosso cabedal de conhecimentos técnicos e ajudá-los a realizar suas aspirações por uma vida melhor, o governo norte-americano iniciou a partir da II Guerra Mundial um extenso programa de assistência técnica aos “países pouco desenvolvidos”, principalmente àqueles situados na América Latina. (NOGUEIRA, 1989, p.36). 76 Nessa perspectiva, Nogueira (1989) destaca que o primeiro Acordo Geral de Cooperação Técnica foi assinado em 1950, entre o MEC, o governo de Minas Gerais e uma organização norte-americana. A autora aponta essa cooperação, firmada entre Brasil e Estados Unidos, como o momento em que surgiria a supervisão pedagógica, pois [...] foi no bojo desses acordos que nasceu a Supervisão Escolar pela criação do Programa de Assistência Brasileira Americana ao Ensino Elementar – PABAEE, instalado em Belo Horizonte-Minas Gerais, em 1957. Em 1958, professores foram enviados a Indiana (Estados Unidos) para se especializarem e posteriormente fundarem em Belo Horizonte os cursos de formação de supervisores que mais tarde seriam espalhados por todo o Brasil, a partir destes professores (NOGUEIRA, 1989, p.37). Como podemos perceber, nessa perspectiva “a supervisão educacional brasileira é também produto da assistência técnica norte-americana prestada aos países da América Latina” (NOGUEIRA, 1989, p.39). Esse momento se configurava num ambiente em que a economia brasileira passava por grandes transformações, e o país vivia um processo de internacionalização/industrialização da economia. A educação como aparelho ideológico do Estado “ingenuamente” tem servido a este em todos os momentos em que acontecem mudanças políticas e econômicas. O supervisor pedagógico e os demais profissionais da escola – mesmo que ingenuamente – contribuíam/contribuem para a reprodução da ideologia das classes dominantes da sociedade. Esse programa destacado por Nogueira (1989, p.37-38) tinha três objetivos básicos definidos para o trabalho da supervisão, naquele momento: 1º - introduzir e demonstrar, para os educadores brasileiros, métodos e técnicas utilizadas na educação primária, promovendo a análise, aplicação e adaptação dos mesmos, a fim de atender às necessidades comunitárias em relação à educação, por meio do estímulo à iniciativa dos professores; 2º - criar e adaptar material didático e equipamento, com base na análise de recursos disponíveis no Brasil e em outros países, no campo da educação primária; 77 3º - selecionar professores, de competência profissional, eficácia no trabalho e conhecimento da língua inglesa, a fim de serem enviados aos Estados Unidos para cursos avançados, no campo da educação primária. É oportuno refletir: a quem servia, nessa perspectiva apontada, o supervisor? E esse Programa – o PABAEE – sendo uma das bases apontadas para o surgimento da supervisão pedagógica, ainda não se faz presente no imaginário de muitos sujeitos da escola, em termos dos objetivos da supervisão, com bases ideológicas e tecnicistas? São questões a serem investigadas/refletidas. Recorremos também – nessa intenção de buscar fios históricos desse profissional – a Rangel (2006), que nos apresenta uma retrospectiva histórica da supervisão pedagógica e, sinteticamente, aponta três momentos distintos: • Décadas de sessenta e setenta: o supervisor tem a função de acompanhar, controlar, avaliar e direcionar o professor, sustentado por uma concepção tecnicista da educação, onde são requeridos dele: inteligência, equilíbrio, liderança e técnica. • Década de oitenta: a função desse profissional vive uma grande crise e sua atuação na escola é questionada, pois esse profissional exerce essa função de modo precário. É percebida a necessidade desse profissional na escola, mas é também percebido que ele não está preparado para isso. • Na década de noventa essa função ressignifica-se e... ao ressignificar e revalorizar a supervisão, reconceitua-se, de modo a compreendê-la na sua ação de natureza educativa e, portanto, sociopedagógica, no campo didático e curricular do seu trabalho, no seu encaminhamento coordenador (RANGEL, 2006, p.75). Como podemos perceber, na década de noventa, a supervisão se configurava com um encaminhamento coordenador. Para Rangel (2006), já não é apenas um nome que intitula essa função até o final da década de noventa; são muitos nomes e eles mudam em relação às legislações de cada estado e em relação às escolas. 78 Na Escola Emília Ramos, onde desenvolvemos esta pesquisa, o coordenador pedagógico, desde a fundação da Escola, exerce um papel coordenador/mediador/formador de professores. Essa performance coordenadora vai se tornando recorrente em algumas escolas e esse lugar do coordenador vai sendo construído nas práticas escolares. Parece-nos é que esse novo perfil desenhado nessas práticas foi instituído pelas novas Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia, publicadas em 2006, onde é adotada essa nomenclatura e apontada essa função. A literatura que trata sobre coordenação pedagógica ainda é muito incipiente. Tivemos que utilizar neste trabalho uma literatura que ainda utiliza a nomenclatura supervisão por uma ausência de uma literatura no campo da coordenação. Fizemos essa opção por considerarmos que o conteúdo estava em consonância com o que apresentamos sobre coordenação pedagógica. Então, podemos concluir que essa prática pedagógica carece de uma teorização urgente que sintetize essas práticas, inclusive nas suas contradições. Os papéis antes separados – supervisão, orientação, onde o orientador educacional tinha um trabalho mais específico com os pais e a família e o supervisor trabalhava com os professores, foram fundidos no papel do coordenador. Será que esse profissional dá conta dessa herança que se configura como orientador de alunos e coordenador da prática pedagógica dos professores? Acreditamos que essas novas nomenclaturas surgem em momentos de reforma de ensino. Para cada momento histórico, uma organização diferente da escola, e seus sujeitos sendo condicionados a desempenharem papéis diferentes. Desse modo, afirma Mate (2003, p.72): Percebi que as reformas, como fenômeno histórico, têm sido utilizadas também como dispositivo de regulação social. Vistas sob esse ângulo, as reformas, ao mesmo tempo que lançam e/ou reformulam programas e métodos de ensino, também alteram modos de organizar o tempo, o espaço e o saber escolar, sugerem modos de pensar/fazer educação, estabelecem outros padrões de comportamento. 79 Nesses fios puxados, compartilhamos com Roman (2001) da idéia de que é difícil fazermos/acompanharmos com clareza uma linha histórica da constituição desse profissional que, neste trabalho, chamamos de coordenador pedagógico. O que podemos inferir, a partir da literatura estudada, é que esta não é clara em relação ao profissional que exerce a função de coordenar as atividades pedagógicas na escola. Então, a tentativa de puxar esses fios históricos, foi a de conferir mais clareza à discussão do trabalho desse profissional, nos dias de hoje. 2.1.1.1 Puxando fios na legislação A Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira – Lei nº 9.394/96 – em seu artigo 64 estabelece: A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional (Grifo nosso). A partir da publicação dessa Lei – que ainda não faz menção à nomenclatura Coordenação, Coordenador(a) – as redes de ensino Municipal, Estadual e Federal começaram a empreender uma discussão sobre uma nova organização do ensino. São doze anos de vigência da Lei e ainda percebemos o Estado brasileiro se organizando para estar em consonância com a sua lei de bases. No âmbito do curso de Pedagogia, após um longo processo de discussões em todo o país, foram aprovadas, em 15 de maio de 2006, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia, licenciatura. Numa leitura de alguns documentos legais que disciplinam a matéria (BRASIL, 1996; BRASIL. CNE, 2005; 2006a; 2006b), consideramos, como muitos educadores que consultamos, que o curso de Pedagogia é o lócus por excelência 80 para a formação do coordenador pedagógico, cuja atuação pode acontecer em contextos escolares e não-escolares. Vejamos a Resolução CNE/CP nº 1/2006; artigo 5º; inciso IV, segundo a qual o egresso do curso de Pedagogia deverá estar apto, dentre outros, a: “IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e modalidades do processo educativo” (BRASIL. CNE, 2006). Ainda no mesmo documento: O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer as funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos22 (BRASIL. CNE, 2006, artigo 4º). Apesar das especificidades e complexidade do trabalho da coordenação pedagógica que também pode ser desenvolvido em quaisquer dos níveis da educação básica, na orientação de práticas pedagógicas que envolvem diversos conteúdos programáticos em diversas séries, não conseguimos vislumbrar outros loci23 Em relação ao trabalho do Pedagogo, percebemos que o curso se torna extremamente generalista, e ficamos a nos questionar se o Pedagogo dará conta de todas as obrigações a ele atribuídas a partir das diretrizes. Assim, em relação à atuação específica da coordenação pedagógica, podemos extrair dessas novas diretrizes, pontos que perpassam o trabalho na escola, nos seus: artigo 3º, parágrafo único; inciso III; e artigo 4º; incisos I; II e XII. para a formação desse profissional. 22 Mesmo de forma tímida, consideramos que, nesse documento legal, a formação do coordenador pedagógico está contemplada no curso de Pedagogia como lugar dessa formação. 23 A Câmara de Educação Superior do CNE, apesar do que está posto em muitos documentos legais, não tem a mesma opinião que acabamos de defender. Frauches; Fagundes (2005, p.100) apresentam uma posição legal diferente daquela: “O Parecer CES/CNE nº 101/2002, em resposta a consulta do secretário municipal de Educação de Pelotas quanto à formação exigida para os profissionais da educação, deixa claro que a qualificação exigida dos profissionais que oferecem suporte pedagógico às atividades de docência não é exclusiva de profissionais egressos de cursos de Pedagogia ou pós-graduação na área de Educação. Esclarece, ainda, que é lícito aos sistemas de ensino, no uso de autonomia, estabelecer outros requisitos para os ocupantes de seus quadros”. 81 Já é forte nas Diretrizes o encaminhamento do termo ‘coordenação’ e, podemos notar no que tange ao trabalho do pedagogo na escola, uma presença muito forte do termo gestão dos processos educativos numa perspectiva democrática, onde podemos abstrair que essa gestão inclui um trabalho coletivo, tendo como propósito o êxito do projeto pedagógico de cada instituição, com participação de todos os segmentos. No Sistema Municipal de Educação de Natal, ao qual se vincula a escola pesquisada, o Plano de Carreira, Remuneração e Estatuto do Magistério, publicado em 2005, trata os profissionais que apóiam as atividades pedagógicas na escola como ‘Suporte Pedagógico’. A esse profissional são designadas muitas atribuições que achamos pertinente destacar, visto que estaremos na pesquisa olhando para a atuação desse profissional na escola. Assim, no artigo 5º, parágrafo 2º do referido Plano, encontram-se as funções do ‘Suporte Pedagógico’: I – assessorar e coordenar a organização e funcionamento das unidades de ensino, zelando pela regularidade das ações pedagógicas, administrativas e financeiras; II – contribuir com o trabalho cotidiano referente às atividades a serem desenvolvidas com a comunidade escolar, buscando a construção e reconstrução do projeto político pedagógico, auxiliando em sua coordenação, articulação e sistematização. III – incentivar o desenvolvimento e a avaliação de projetos da escola; IV – organizar, juntamente com a direção, as reuniões pedagógicas e administrativas; V – assessorar e acompanhar o processo político-pedagógico- administrativo da escola; VI – acompanhar a aprendizagem dos alunos, registrando o processo pedagógico e contribuindo para o avanço do processo ensino- aprendizagem; VII – participar da elaboração do cronograma de trabalho, de acordo com as atividades a serem desenvolvidas pela escola; VIII – participar dos conselhos de escola, sendo eleito pelos seus pares; IX – identificar, com o corpo docente, casos de educandos que apresentem necessidades de atendimentos diferenciados, orientando decisões que proporcionem encaminhamentos adequados; X – ministrar cursos com vistas à qualificação do trabalho do professor que exerce a docência; XI – contribuir com a elaboração e execução de instrumentos e mecanismos de avaliação institucional, profissional e desempenho discente. 82 Percebemos que as atribuições para esse profissional são bastante abrangentes. Ele é convocado a desempenhar suas funções junto a todos os segmentos da escola, desde a avaliação dos alunos, apoio à direção da escola, acompanhamento do Projeto Político Pedagógico e a formação do professor. Resta indagarmos: será que esse profissional está preparado para desempenhar todas essas atribuições de modo a corresponder a esse chamado? E os profissionais que estão na escola, que foram formados nas décadas de 70/80, quando predominava outra caracterização desse trabalho, como podem hoje se apropriar dessa nova diretriz? No capítulo três, onde trazemos a pesquisa empreendida junto a esse profissional, retomaremos esses questionamentos, de modo a refletirmos sobre essa problemática no contexto real da escola. Recentemente, foi publicada uma Lei Complementar N° 087, de 22 de fevereiro de 2008, que dispõe sobre a democratização da gestão escolar no âmbito da Rede Municipal de Ensino de Natal e dá outras providências. Assim, é pertinente trazer os pontos chaves da Lei em relação ao trabalho do coordenador pedagógico: DA EQUIPE GESTORA DA UNIDADE DE ENSINO Art. 7º - Os Coordenadores Pedagógicos serão indicados pela Equipe Gestora e Conselho Escolar, atendendo aos seguintes critérios: I. não estejam em estágio probatório; II. comprovem habilitação em Pedagogia ou Normal Superior; III. apresentem um Plano de Trabalho, com objetivos e metas em consonância com o Projeto Político Pedagógico da escola; IV. tenham obtido pontuação superior a 60% na avaliação do desempenho; V. não tenham sido julgados culpados em processos de sindicância, administrativos e criminais. DA GESTÃO ESCOLAR Art. 3º - A gestão do estabelecimento de ensino será exercida conjuntamente pela Equipe Gestora da Unidade de Ensino e pelo Conselho Escolar: Parágrafo único - A Equipe Gestora é composta do Diretor e do Vice- Diretor, do Inspetor Escolar e do Coordenador ou Coordenadores Pedagógicos, conforme tipologia da escola. DA EQUIPE GESTORA DA UNIDADE DE ENSINO Art. 11 - Compete aos Coordenadores Pedagógicos: I. implementar a operacionalização das Diretrizes Curriculares; II. coordenar, acompanhar e avaliar o Projeto Político Pedagógico da Escola, garantindo a execução das ações; 83 III. elaborar um Plano de Trabalho que contemple os turnos e as modalidades de ensino da escola, tendo por base o Projeto Político Pedagógico e o Plano de Desenvolvimento da Escola, garantindo a unidade pedagógica. IV. elaborar, semestralmente, o relatório das atividades pedagógicas; V. coordenar a adequação do Calendário Escolar e participar da elaboração do Regimento e do Projeto Político Pedagógico da Unidade de Ensino, com base nas diretrizes emanadas da Secretaria Municipal de Educação; VI. participar das discussões e decisões do Conselho de Classe; VII. propiciar um clima de ordem, amizade e cooperação entre os docentes e não docentes, pais e alunos; VIII. articular e mediar, na própria escola, as demandas e tempos de formação continuada dos docentes junto à Secretaria Municipal de Educação; IX. subsidiar, quando necessário, os membros do Conselho Escolar com informações pertinentes à implementação do Projeto Político Pedagógico; X. analisar e divulgar, sistematicamente, com a equipe docente, os dados de desempenho do processo de ensino e de aprendizagem, tendo em vista estabelecer estratégias que garantam a melhoria na aprendizagem do aluno; XI. participar de discussão no Conselho Escolar sobre a evolução dos indicadores educacionais: abandono escolar, aprovação e aprendizagem, providenciando os dados necessários à análise dos resultados do desempenho dos alunos; XII. fazer as intervenções pedagógicas necessárias nas atividades desenvolvidas pelos docentes visando à melhoria da aprendizagem do aluno.; XIII. articular as lideranças estudantis para efetiva participação em suas entidades representativas e nos colegiados existentes na Unidade de Ensino. Essa nova Lei traz pontos já presentes no Plano de Carreira, Remuneração e Estatuto do Magistério, publicado em 2005 e mencionado anteriormente, mas observamos que ela já denomina, de fato, a função coordenação pedagógica e traz claramente as atribuições que lhes são conferidas na escola, bem como os requisitos para ocupar essa função. Apesar de muito abrangente, em relação às atribuições do coordenador pedagógico, essa Lei poderá ser um encaminhamento para a construção da identidade desse profissional na escola? Mas, um outro questionamento nos invade: Para dar conta de todos esses fazeres, muitos são os saberes mobilizados; será que os profissionais que estão na escola, ocupando essa função, darão conta de todas essas atribuições? Será que, com tantas atribuições, seu trabalho ficará pulverizado? 84 É notório que essas novas demandas que chegam às escolas e aos seus profissionais, em particular, em forma de Leis, planos e mesmo a partir de novas teorias, são conseqüência de mudanças estruturais na sociedade. Desse modo, toda mudança na sociedade demanda mudança na escola, pois este é o lugar por excelência para preparar/formar os sujeitos, porque as escolas são lugares onde as novas competências devem ser adquiridas ou reconhecidas e desenvolvidas. Sendo a literacia informática uma das novas competências, de imediato se coloca uma questão: a das diferenças ao acesso à informação e da necessidade de providenciar igualdade de oportunidades sob pena de desenvolvermos mais um factor de exclusão social: a info-exclusão (ALARCÃO, 2005, p.12). A escola também pode ser um lugar de questionamento dessas novas demandas; Para isto, necessário se faz criar, no espaço da escola, uma cultura de reflexão, com a participação de todos os seus segmentos, de modo a garantir a legitimidade de todas as decisões. Observamos nos documentos citados um encaminhamento da ação coordenadora como uma prática formadora na escola. Na escola pesquisada, esse papel vem se delimitando desde a sua fundação (CAMPELO, 2001; BEZERRA, 2005). Por essa razão, discutiremos, a seguir, a perspectiva formadora do coordenador pedagógico na escola. 2.1.2 O coordenador pedagógico como um formador de professor na escola Considerando o objetivo deste trabalho e o cotidiano daquele lócus, a reflexão acerca do papel do coordenador pedagógico na formação do professor, na escola, torna-se relevante. Vivemos num contexto de muitas mudanças, onde são inúmeros os desafios colocados para a escola e seus agentes. Dentre tais desafios, Delors et al. (1999, 85 p.103-104) explicita como necessidade a “educação ao longo de toda vida” [...] como “a chave que abre as portas do século XXI”. Para os autores: Hoje em dia, ninguém pode pensar adquirir, na juventude, uma bagagem inicial de conhecimentos que lhe baste para toda vida, porque a evolução rápida do mundo exige uma atualização contínua, constante [...] bem além de uma adaptação necessária às exigências do mundo do trabalho, é a condição para um domínio mais perfeito dos ritmos e dos tempos da pessoa humana. Como viver nesse cenário complexo? Que sociedade surge a partir desse cenário? A sociedade que se vislumbra nesse novo século, a sociedade da informação, da comunicação, do conhecimento e da aprendizagem (ALARCÃO, 2005) demanda e exige – de todos – a construção de novos saberes. Como construir saberes que façam jus a um mundo que se transforma a todo instante? Talvez não tenhamos respostas a essas indagações que nos vêm quando nos colocamos a olhar esse cenário. Não é possível prever todas as exigências do contexto de trabalho com as quais iremos nos deparar daqui para frente. Por essa razão, a educação continuada, que entendemos como educação permanente e ao longo da vida, deve se dar numa perspectiva de desenvolvimento profissional/pessoal, numa constante desconstrução/construção/reconstrução dos saberes e competências da ação profissional e, com isso, a profissionalização dos trabalhadores estará em constante ressignificação para fazer face a esse momento. Essas são algumas das atribuições sobre as quais a escola precisa refletir. O aprender por toda vida é apontado como projeto de vida a ser construído pela humanidade. No campo da educação, a discussão sobre a formação dos educadores vem sendo apontada por pesquisadores como uma das premissas básicas para não nos perdermos nesse mundo tão complexo; somente uma cognição alimentada pelo conhecimento nos dará os elementos para pensarmos/refletirmos sobre esse mundo e não sermos apenas expectadores e receptores de informação. Nessa perspectiva, é exigido da escola um novo modelo de ‘ser escola’ diante da nova sociedade que se configura. Nesse contexto, coordenadores, professores, diretores são convocados a formar-se para saber ser, nesse mundo incerto, onde 86 somos chamados a tomar decisões continuamente e de maneira urgente, somos convidados a assumir papéis diferenciados de outrora. Para isto, devemos ter um pensamento que estabeleça relações rapidamente, faça sínteses e empreenda ações. A formação docente é uma das premissas para quem, na escola, tem a responsabilidade de formar pessoas – mormente professores e coordenadores. A formação de professores na escola é um imperativo para a construção de ambientes escolares, onde o conhecimento dos pares seja socializado e o aprender com o outro não se restrinja à relação professor/aluno na sala de aula, mas também aconteça nas relações que se estabelecem entre toda a comunidade escolar. Os implicados no processo de ensinar/aprender têm a possibilidade de ampliar seu universo cultural e profissional, numa conexão com as questões e demandas do seu trabalho, favorecendo a criação de uma cultura de cooperação, de saber, num clima apropriado para a melhoria do trabalho pedagógico. Nesses contextos de aprendizagem, os professores vão criando a responsabilidade de intervenção coletiva e individual nos processos de decisão sobre sua formação, tanto na escola como perspectivando uma intervenção na formação que acontece fora dela. A formação de professores na escola é um dos caminhos apontados por pesquisadores para a construção de uma prática pedagógica que atenda às especificidades de cada comunidade escolar. Para tanto, é necessário que haja as condições para a formação e que esta contribua para a ressignificação da prática pedagógica da escola numa perspectiva de ação-reflexão-ação. Hoffman e Edwards (apud GARCIA, 1999, p.29) corroboram com essa questão quando afirmam: “[...] a formação de professores deve ser baseada nas necessidades e interesses dos participantes, deve estar adaptada ao contexto em que estes trabalham, e fomentar a participação e reflexão”. Numa perspectiva semelhante, Rodrigues (2006) fala que a maior falha da formação de professores é quando esta não parte dessas necessidades. Ela reflete sobre isso, tendo a fala dos professores como guia: Devem ter-se em conta as necessidades dos formandos e das escolas, ‘a maior falha da formação é a de não fazer de acordo com 87 as necessidades reais dos formandos’, ‘os formadores desconhecem as necessidades reais dos professores’, a formação não tem dado resposta às necessidades de implementação da reforma’, ‘a formação não serve para nada porque está defasada das necessidades desta escola’ – estes são alguns dos modos de dizer repetidamente ouvidos e lidos (RODRIGUES, 2006, p.94). Conceber a escola como espaço de formação, não só para os alunos, mas também para os professores, é uma opção que, quando adotada de maneira planejada, sistemática e em parceria com os professores, é geradora de uma sinergia entre todos os que participam da comunidade escolar. De comum acordo com esse pensamento, Silva (1997) ressalta a importância e urgência de continuar nas escolas o processo de formação docente. Para ela, a criação nas escolas de um ambiente formativo corrobora para a construção digna da profissão. Estudar no espaço laboral, junto aos pares da profissão, é uma experiência rica que abre um leque de valorosos momentos da formação do professor; nesses momentos, há troca de experiência e confronto da teoria-prática. O clima de formação nas escolas, que optam por esse caminho, gera um fluxo de informações, fazendo com que todo o grupo se beneficie e evolua. As escolas são diferentes entre si e essas diferenças se dão em função dos sujeitos que lá estão: professores e equipe que levam para as escolas seus saberes, bem como os alunos, que também trazem conhecimentos e comportamentos próprios de sua cultura. A especificidade de cada comunidade escolar vai ao encontro da formação na escola24 Garcia (1999) também fala da importância e da potencialidade da formação na escola, mas, esclarece que não podemos negar outras modalidades de formação. , uma vez que os sujeitos que participam dessa formação têm oportunidade de refletir sobre questões imediatas do cotidiano escolar. Perrenoud (2000) destaca esse modelo de formação como interessante porque ela parte de situações que emergem do cotidiano fazendo evoluir o grupo. 24 Compreendemos que a formação na escola faz parte da formação continuada, como destaca Christov (2005). 88 A formação na escola é decisiva para manter vivo o projeto de cada instituição escolar, além de possibilitar uma constante reflexão do trabalho desenvolvido, ensejar a avaliação do que está dando certo e do que necessita ser repensado. A formação na escola contribui para fortalecer o trabalho em equipe – elemento fundamental na qualidade do trabalho escolar – pois articula todos os intervenientes do processo pedagógico, além de professores e coordenadores pedagógicos. A formação na escola não é comandada do exterior; é auto-gerida pela equipe, acionando a capacidade de seus membros – a comunidade pensante – acreditando nas possibilidades de cada um para a construção do projeto de escola. Nesse sentido, Imbernón (2002, p.81) destaca que, nesse tipo de formação, o professor é sujeito, e parte da premissa que “o profissional de educação também possui uma epistemologia prática, possui um conhecimento e um quadro teórico construído a partir de sua prática”. Assim, ele destaca que nessa ambiência, o grupo vai criando uma proposta de formação articulada com seu desejo e sua necessidade, como também cria condições para que se estabeleçam vínculos entre os pares. Ao discutir a escola como espaço onde se produz conhecimento sobre educação, Alarcão (2005, p.38) nomeia essa escola como reflexiva, assim compreendida pela autora: Uma escola reflexiva é uma comunidade de aprendizagem e é um local onde se produz conhecimento sobre educação. Nesta reflexão e no poder que dela retira, toma consciência de que tem o dever de alertar a sociedade e as autoridades para que algumas mudanças a operar sejam absolutamente vitais para a formação do cidadão do século XXI. Dessa forma, no círculo de formação, na sua arena, todas as questões que permeiam a globalidade da escola são colocadas de modo que sejam do conhecimento de todos que a fazem. Essas questões são lidas numa interface teoria/prática e numa constante ação/reflexão/ação. A formação de professores na escola, considerada aqui neste trabalho como formação continuada, é um importante instrumento de sedução dos professores para 89 se tornarem sujeitos de sua formação, para se apaixonarem pelo ato de aprender, para buscarem conhecimento, para se aventurarem pelos caminhos do conhecimento e, assim, entenderem o porquê das coisas. Essa formação contribui para que este professor não seja um mero expectador e se transforme em protagonista de sua própria formação, o que é fundamental. A partir dessas concepções ensejadas sobre a formação de professores na escola, convém questionar: Quem mobiliza essa ação? Nesse contexto, aparece a figura do coordenador pedagógico, como um grande mobilizador dessa prática. Desse modo, a atribuição essencial do coordenador pedagógico está, sem dúvida alguma, associada ao processo de formação em serviço dos professores. Esse processo tem sido denominado de Educação Continuada, tanto nos textos oficiais de secretarias municipais e estaduais de educação, como na literatura recente sobre formação em serviço (CHRISTOV, 2005, p.9). Para operacionalização da formação na escola, necessário se faz que sejam criados espaços na carga horária do professor, de modo que o coordenador pedagógico possa desenvolver seu trabalho junto ao professor, como uma das condições para que a formação, de fato, aconteça. Esses espaços de aprendizagem, criados na escola, têm como objetivo investir no desenvolvimento/aprendizagem dos professores para alavancar o seu processo de desenvolvimento profissional e o coordenador pedagógico aparece como o responsável por estes momentos, numa ação pensada/planejada com os professores e equipe. A formação de professores na escola se apresenta como um caminho alternativo para que os profissionais que estão nas instituições possam coletivamente pensar em maneiras de tornar o ensinar/aprender mais significativo, prazeroso e efetivo. Hoje, na escola, todos são chamados a ser aprendentes: alunos, professores, coordenadores, diretores... A escola é lugar de formação. Os professores estão diretamente ligados à formação dos alunos. Assim como os alunos, os professores também são pessoas em processo de construção de conhecimento. 90 Nessa perspectiva, o coordenador pedagógico aparece como um dos responsáveis pela formação dos professores. O coordenador pedagógico se configura como a pessoa que tem a responsabilidade de ajudar o professor a pensar/refletir sobre sua prática – um formador. Nesse sentido, Alarcão (1996, p.58) aponta duas recomendações aos formadores de professores: A primeira, que constitui dever do formador orientar na concepção e implementação de situações experimentais significativas, capazes de fornecerem material para reflexão. A segunda, que é sua tarefa primordial, criar nos formandos a disposição para reflectirem, criticamente, sobre a forma como ensinam, numa perspectiva de desenvolvimento profissional permanente. A reflexão que deve ocorrer, por consegüinte, antes, depois e durante o acto educativo. [Sic]. O coordenador pedagógico intervém no planejamento da atividade do professor; essa intervenção se dá num processo contínuo de acompanhamento do trabalho do professor na escola, nos momentos de planejamento, na sala de aula, quer executando o que planejou, quer avaliando, bem como nos momentos de formação continuada na escola. Nestes momentos, salientamos que o coordenador pedagógico coloque em ação essas duas recomendações apresentadas acima por Alarcão (1996). Em um outro momento a autora discute as novas demandas da vida desse profissional na escola e, principalmente, o seu papel no desenvolvimento do professor, esclarecendo que a “[...] supervisão é uma actividade cuja finalidade visa o desenvolvimento profissional dos professores, na sua dimensão de conhecimento e de acção” (ALARCÃO, 2005 p.65)25 O coordenador pedagógico, sendo um profissional que orienta o professor a conduzir o processo de ensinar/aprender, se torna um dos agentes de mudanças na escola. A coordenação pedagógica é uma atividade que tem como objetivo o acompanhamento e a mediação da atividade do professor, que busca resultados na . [Sic]. 25 Em Portugal, a nomenclatura utilizada para referir-se ao profissional que chamamos de coordenador pedagógico é supervisor pedagógico; este profissional tem o seu papel focado na formação dos professores iniciantes que estão na escola (ALARCÃO, 2005). 91 aprendizagem dos alunos, com base no projeto político da escola e da sua proposta curricular. Entendemos que o coordenador pedagógico, como elemento que necessita estar mais próximo do professor na escola, é um grande interventor da sua formação. Para Orlonson (2001, p.23), ao provocar a formação de professores na escola, o coordenador assume o papel de formador desses professores, fazendo o professor compreender “que a proposta transformadora faz parte do projeto da escola” e que através da reflexão/problematização de sua prática ele aprende a transformá-la “transformando a própria escola e a si próprio”. Compartilhamos da idéia de que o coordenador pedagógico é um dos agentes de mudanças na escola. Pensamos também que o trabalho do coordenador deva ser desenvolvido em parceria com os professores, direção e demais funcionários da escola. A figura a seguir, apresentada por Amaral; Moreira; Ribeiro (1996, p.93), mesmo utilizando a nomenclatura supervisão – usada para denominar esse profissional em Portugal – dá a dimensão do trabalho desse profissional na escola: Figura 2 Processo de Supervisão Fonte: AMARAL; MOREIRA; RIBEIRO (1996, p.93). Para que o trabalho do coordenador aconteça, necessária se faz uma sistemática de trabalho que envolva várias dimensões, dentre elas, o planejamento. É importante que o coordenador tenha a capacidade de “ler” e compreender o que 92 acontece na escola e, para isto, necessita estabelecer uma comunicação contínua com todos os segmentos da escola, de modo que esse planejamento atenda as especificidades do grupo. Orlonson (2001) explica que é importante ao coordenador compreender que suas ações devem ser regidas pela dimensão ética e política. Quando planeja a sua ação, o coordenador está atribuindo sentido a sua atividade e coloca nesta atividade uma finalidade. “Nesse processo de planejamento, explicita seus valores, organiza seus saberes para realizar suas intenções político-educacionais” (ORLONSON, 2001, p.20). Para que o trabalho do coordenador aconteça, é necessário que este estabeleça uma escuta permanente das necessidades e desejos do professor para que possa exercer o seu papel. Sabemos que lidar com a subjetividade de várias pessoas na escola é uma tarefa difícil e buscar uma linha de trabalho que atenda às intersubjetividades para um fazer pedagógico sincrônico – é uma tarefa quase impossível que requer do coordenador uma contínua reflexão sobre o seu fazer26 Para isto, o coordenador necessita estabelecer um canal permanente de troca com os professores, de modo a estar sempre revendo seu trabalho. Essa parceria com os professores “possibilita ao coordenador rever seu papel, historicamente dado, de supervisionar, de deter informações, ‘para co-visionar’” (ORLONSON, 2001, p.25). . O coordenador é um educador que necessita possuir um diferencial, mas ele ainda não tem definida sua identidade que ainda está em processo de construção “de conquista, de uma territorialidade própria” nas escolas (MATE, 2002, p.18). É uma atividade que tem como núcleo o ser humano: a formação da dimensão humana do professor e do aluno. Sendo assim, é interessante que o trabalho do coordenador aconteça numa perspectiva de rede, onde todos são chamados a participar – professores, direção, demais funcionários da escola, pais e alunos. Desse modo, Vasconcellos (2002, p.88), buscando Gramsci, entende o coordenador “como um intelectual orgânico no grupo; sua práxis, portanto, comporta as dimensões reflexiva, organizativa, conectiva, interventiva e avaliativa”. 26 Pela vivência que temos como professora na Escola, sabemos que essa relação professor e coordenador nem sempre é harmônica, muitas vezes, se configurando num campo tenso. 93 Nesse sentido, percebemos o fazer do coordenador pedagógico num processo de interação com os outros da escola, sendo sua interação mais acentuada com o professor. Nesse processo, o coordenador tem como função acolher esse professor, de modo a perceber suas dificuldades, resistências, desânimos com a vida profissional – muito freqüente nos dias atuais – e, assim, traçar um projeto de trabalho que tenha como pressuposto o desenvolvimento profissional numa vertente reflexiva, que supere a resistência à mudança e que seja instigador da chama da paixão pelo fazer pedagógico. Entendemos que, da mesma forma que há uma fragilidade na formação do professor, há também fragilidade na formação do coordenador para mediar a atividade do professor. Como já mencionamos, a formação do pedagogo é bastante genérica; em decorrência disso, o Parecer 3/2006 ressalta que é importante se pensar em uma proposta de formação desses profissionais em nível de pós- graduação, mas tendo a orientação conceptual do curso de pedagogia. Desse modo, acreditamos que, ao trazer para a discussão o papel da coordenação pedagógica na escola, contribuímos para o debate em torno do reconhecimento da importância desse profissional na instituição escolar, como também a preocupação dos órgãos oficiais com uma formação específica e da definição de uma territoriedade no exercício dessa função. 2.1.3 O coordenador pedagógico como um formador de professor na escola da EJA Discutir a formação de professores em um trabalho que tem como foco a EJA significa que não estamos falando da formação de qualquer professor. Esse professor tem uma especificidade. Ele é professor de jovens e adultos do 1º segmento da EJA. A discussão sobre a formação de professores na escola, para atuarem na EJA/1o segmento, se torna cada vez mais necessária e significativa, visto que o público dessa modalidade de ensino é bastante diferente do público que cursa o ensino fundamental sem distorção idade/série. Esse público já participa dos grupos produtivos da sociedade e, sendo assim, tem uma grande experiência de vida. 94 Os saberes que eles trazem para a escola se diferenciam por suas histórias, vividas em mundos diferentes. O local onde está situada a escola também gera alunos diferentes. Se a escola está localizada na zona rural, urbana, periférica ou central, terá que pensar em uma ação pedagógica específica, pois cada realidade requer ações diferenciadas. Se a EJA requer ações diferenciadas, compreendemos que ela abarca uma diversidade de práticas educativas e, nesse sentido, Soares (2006, p.10) “aponta que é preciso identificar as especificidades que delineariam o perfil do educador de jovens e adultos, a partir das quais possam ser definidas as diretrizes de sua formação, ainda em construção”; além disso, “temos que inventar esse perfil” (ARROYO, 2006, p.18). A partir dessas considerações, achamos que a escola é um desses espaços de ‘invenção’. É conhecendo a realidade em que vai atuar que o professor irá mobilizar-se para construção de uma prática em consonância com o público que vai atender. Para Garcia (1999, p.22), “é através da interformação que os sujeitos – neste caso, os professores – podem encontrar contextos de aprendizagem que favoreçam a procura de metas de aperfeiçoamento pessoal e profissional”. O segmento da EJA aqui estudado – os níveis iniciais que correspondem à alfabetização – requer um trabalho que considere o contexto de vida dos seus alunos, suas necessidades de aprendizagem, seus desejos e expectativas em relação à escola e aos conhecimentos que já adquiriram ao longo da vida. Nas palavras de Garcia (1999), referendamos nossas colocações quando ele recomenda que é importante ao professor conhecer a realidade social, econômica e cultural na qual irá trabalhar, de modo que possa estabelecer uma relação com o currículo a ser desenvolvido. No Brasil, ainda não existe uma política clara para a Educação de Jovens e Adultos que foram alijados do seu direito à educação/alfabetização na idade própria. Esse segmento da educação sempre teve, no nosso país, uma posição marginal. A falta de uma política de Educação de Jovens e Adultos acarreta um grande número de evasão, repetência e professores desestimulados. Ademais, [...] a falta de uma política clara tem provocado a implantação destes serviços de maneira precária e pedagogicamente inconsistente. As 95 práticas pedagógicas não se conformam ao específico da educação de jovens e adultos, reproduzindo, muitas vezes, o ensino regular de maneira inadequada e facilitadora (GADOTTI; ROMÃO, 2000, p.123). Essa constatação é um tanto preocupante, visto que a modalidade EJA nos níveis fundamental e médio possui especificidades que a distinguem do público do ensino fundamental e médio daqueles sem distorção idade/série. A falta de uma visão clara do ensino e de uma preparação específica para o trabalho com esse público terminam por trazer para o ensino da EJA27 os mesmos objetivos, conteúdos e metodologias do ensino fundamental dos que estão na ‘idade própria’28 A infantilização do processo de alfabetização de adultos é evidenciado por Beisiegel já em 1974 (apud MOURA, 2004) que constata que os materiais didáticos elaborados para orientar os trabalhos do ensino supletivo no final da década de 1950 tinham uma verdadeira identidade com o trabalho pedagógico destinado às crianças. , muitas vezes, com uma prática infantilizada, principalmente, quando se atende o nível destinado à alfabetização. Ainda hoje essa constatação é recorrente. Os professores trazem para o ensino de jovens e adultos os conhecimentos de que dispõem da psicogênese/epistemologia/metodologia da criança por falta de conhecimento da psicogênese/epistemologia da pessoa adulta, embora já existam estudos no âmbito dessa temática. Ainda há muito o que ser feito para melhorar a qualidade do ensino fundamental e quando esse ensino recai na EJA/1o segmento, os problemas se agravam, visto que [...] nas últimas décadas, a pesquisa educacional brasileira vem abordando um amplo conjunto de problemas relacionados à formação e ao desempenho dos educadores que atuam no Ensino Fundamental; quando a área de estudos é a educação de jovens e 27 A EJA é compreendida como uma modalidade da educação básica, nas suas etapas fundamental e média, que requer um tratamento e o atendimento às suas particularidades. Na etapa fundamental temos o 1º e o 2º segmento. No 1º segmento temos o I e o II nível e no 2º segmento o III e IV nível. 28 Idade própria, como se refere a LDB 9.394/96, em seu artigo 37; ali, é explicitado que a EJA se destina àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria (Grifo Nosso). 96 adultos, a esses problemas se agrega mais um, que no mais das vezes acaba sendo postulado como uma tradução sintética dos demais: a falta de formação específica dos educadores que atuam nessa modalidade de ensino, resultando numa transposição inadequada do modelo de escola consagrado no ensino fundamental de crianças e adolescentes (RIBEIRO, 1999, p.184-185). As pesquisas têm mostrado que os professores que estão na EJA não tiveram uma formação para trabalhar com esse público. Gadotti e Romão (2000, p.122), por exemplo, fazem a seguinte denúncia: “Os professores que trabalham na EJA, em sua quase totalidade, não estão preparados para o campo específico de sua atuação. Em geral, são professores leigos ou pertencentes ao próprio corpo docente do ensino regular”. Também discutindo esta questão, Piconez (apud BRASIL, 2002, p.29) ressalta que os estudos sobre Educação de Adultos apontam para a necessidade de uma formação específica para os professores que irão trabalhar com esse público e acrescenta que as Faculdades de Educação agora é que começaram a se dar conta desta necessidade. Demonstrando preocupação com a forma como vem sendo feita a formação docente na EJA, Piconez (apud BRASIL, 2002, p.37), denuncia que “os treinamentos esporádicos, os cursos aligeirados e os programas de alfabetização sem continuidade garantida estão avaliados nestas pesquisas como instrumentos de desserviço à EJA”. Para ela, esse formato de tratamento dado a EJA não satisfaz aluno e professor, criando um ambiente sem expectativas positivas para com a modalidade. Gadotti e Romão (2000, p.122-123) alertam que não se terá ensino na EJA que dê respostas satisfatórias a seus demandatários, se não forem feitos investimentos que contemplem as reais necessidades desta modalidade de ensino. Para eles, “são elementos fundamentais tanto a profissionalização quanto a formação adequada dos professores de Jovens e Adultos. Não se obterá ensino de qualidade sem um corpo docente qualitativamente preparado”. Para Soares (2007, p.1), “a precariedade da formação dos profissionais de EJA é relacionada, muitas vezes, à ausência de uma formação específica nos cursos de graduação em Pedagogia, de onde advém a maioria dos profissionais”. 97 Para ele, é necessário compreender a importância de uma formação específica para atuar na EJA, de modo que aconteça uma profissionalização dos seus agentes. Arroyo (2006) nos coloca que não temos uma política fechada para formação de professores da EJA; ele nos convida a construir essas políticas e destaca que um desses lócus é o curso de Pedagogia que precisa “ter muita coragem” para construir nesse curso um perfil desse professor. Apesar de já termos em nosso país um grande acervo teórico sobre a formação de professores de jovens e adultos, em se tratando de formação na escola e desenvolvimento profissional dos professores de jovens e adultos, encontramos pouco material acerca da temática na pesquisa bibliográfica que fizemos. Os autores pesquisados fazem referências eventuais, apesar de todos destacarem a importância desse espaço de formação de professores nas escolas. O coordenador pedagógico tem um importante papel, pois ele, enquanto articulador da prática pedagógica na escola deve estar atento a essas especificidades do público desse segmento, de modo a retomar estas questões nos momentos em que está junto ao professor. Desse modo, “colocá-lo nessa condição de formador é decorrência de sua posição de elemento articulador do processo ensino-aprendizagem na escola” (GEGLIO, 2005, p.116). O coordenador é uma pessoa que dialoga com o que acontece dentro e fora da sala. Geglio (2005) explica que por este motivo, ele tem um ponto de vista mais amplo do trabalho escolar, sublinhando também que o coordenador é um “cúmplice” do professor. A formação na escola compreende a comunidade escolar como uma rede de informação e cria, nos seus pares, a confiança para poder expor suas dificuldades, compartilhar seus avanços e conhecimentos, trocar orientações e, desse modo, construir conhecimentos para exercer uma prática pedagógica satisfatória. Por isso, Garcia (1999) expõe que, ao adotar como premissa a formação, fica patente uma aposta “na profissionalização dos professores, por reconhecer a sua capacidade para tomar decisões próprias da sua área de especificidade, e na autonomia das escolas” (GARCIA, 1999, p.177). Entendemos que essa relação professor/coordenador se dá de maneira nem sempre harmônica na escola. Professores e coordenadores na escola estão numa relação de horizontalidade, são pessoas adultas com os mesmos níveis de escolaridade e, nesse sentido, indagamos: Como coordenar a ação pedagógica 98 junto a pessoas adultas com essa especificidade? No próximo item, refletimos acerca dessa problemática. 2.1.4 O coordenador pedagógico e a educação de adultos No Brasil, considerando a nossa dívida social com milhões de brasileiros que não se alfabetizaram na idade própria, referir-se à Educação de Adultos, faz-nos sempre voltar o olhar para a alfabetização de adultos, quando não para outros níveis da Educação Básica, sobretudo os últimos, quando cursados fora da faixa etária considerada regular. Todavia, [...] no chamado mundo desenvolvido, começado no século XIX, mais precisamente na Inglaterra e na Dinamarca, já existia um enfoque em metodologia, a prática do ensino-aprendizagem com seres humanos adultos e escolarizados. Ela existia sem ser idéia ou atividade especializada. O que é próprio da educação de adultos no mundo de hoje é que ela tende a institucionalizar-se e a estender-se a todas as camadas da população, através de todos os tipos de organizações humanas (PICONEZ, 2007, p.2). Entendemos a formação de professores como campo da Educação de Adultos, pois o professor é um adulto em desenvolvimento; assim sendo, para que essa formação tenha resultados, o conhecimento deste processo precisa estar presente na proposta de formação. A V CONFINTEA29 já nos alertava sobre as perspectivas futuras da Educação de Adultos e dizia que esta: [...] engloba todo o processo de aprendizagem, formal ou informal, onde pessoas consideradas “adultas” pela sociedade desenvolvem suas habilidades, enriquecem seu conhecimento e aperfeiçoam suas qualificações técnicas e profissionais, direcionando-as para a satisfação de suas necessidades e as de sua sociedade. A educação de adultos inclui a educação formal, a educação não- 29 CONFINTEA: Conferência Internacional sobre a Educação de Adultos. 99 formal e o espectro da aprendizagem informal e incidental disponível numa sociedade multicultural, onde os estudos baseados na teoria e na prática devem ser reconhecidos (Declaração de Hamburgo sobre Educação de Adultos, V CONFINTEA, UNESCO, 1997, p.19-20). A Declaração de Hamburgo abarca a preocupação do mundo contemporâneo que compreende a necessidade da educação de adultos como projeto para humanidade. Como uma conferência mobilizada pela UNESCO, traz nas suas preocupações a necessidade da formação desse adulto, principalmente no sentido do mundo do trabalho e da paz mundial. Essa visão da educação de adultos está em consonância com o pragmatismo, onde a educação de adultos estaria ancorada na resolução de problemas (FINGER; ASÚN, 2003). Illich (apud FINGER; ASÚN, 2003, p.127) se posiciona contra essa educação de adulto refém da institucionalização; para ele, a educação de adultos é um instrumento “para compreensão do mundo em que se vive, para que se possa tomar decisões adequadas sobre como viver”. Nesse sentido, destaca a importância dos sujeitos adultos dominarem os instrumentos para significar o mundo; para isto, as pessoas precisam agir no processo dessa aprendizagem, serem responsáveis por seu processo e conteúdo, que precisa estar relacionado com as expectativas e com a vida das pessoas. A escola como espaço aberto à construção de práticas pedagógicas formativas de adultos, em consonância com seus sujeitos, pode dominar as ferramentas da formação rumo à construção de uma educação de adultos liberta das lógicas do mundo do trabalho e comprometida com a comunidade30 Compreendemos que não podemos fugir da formação de adultos, que parta das necessidades de aprendizagem, como nos propõe Illich (idem). Podemos, iluminados pelo que ele nos propõe, construir uma educação de adultos na escola, tendo esses adultos como responsáveis por essa formação. Desse modo, a que está inserida. 30 Para Illich (apud FINGER; ASÚN, 2003, p. 21-22) “quanto mais [uma pessoa] dominar as suas ferramentas, mais confere o seu significado ao mundo; quanto mais for dominado pelas suas ferramentas, mais a sua auto-imagem será determinada pela forma delas. Ferramentas conviviais são aquelas que dão à pessoa que as usa a grande oportunidade de enriquecer o ambiente com o fruto da sua visão. As ferramentas industriais negam esta possibilidade a quem as usa e permitem que, quem as concebeu determine o significado e expectativas dos outros... Como alternativa ao desastre tecnocrata, proponho a visão de uma sociedade convivial. Uma sociedade convivial seria o resultado de disposições sociais capazes de garantir, a cada membro, o mais amplo e livre acesso às ferramentas da comunidade”. 100 formação estaria a serviço dos seus sujeitos, perspectivando a participação ativa de todos. A formação de professores na escola, onde, geralmente, se parte das necessidades reais dos professores que têm problemas a resolver em suas salas de aula, é uma formação que vai ao encontro do respeito ao professor, como um sujeito adulto em processo de aprendizagem, pois quando o adulto encontra-se na condição de aluno, eles “são motivados por material que é prático, aplicável ao seu trabalho ou situação de vida e centrado em problema; trazem consigo o desejo de crescer e aprender” (PICONEZ, 2007, p.1). A pedagogia não tem dado respostas satisfatórias à Educação de Adultos. Alguns autores já pesquisam uma ciência que responda às especificidades dessa modalidade de ensino. Nesse sentido, há a proposta de Knowles (apud GARCIA, 1999, p.55) que traz a ANDRAGOGIA como [...] a ciência da educação dos adultos. [...] Essa teoria fundamenta- se em cinco princípios que podem ser de sumo interesse, pelas suas possibilidades de aplicação na formação de professores. Estes princípios são: 1. O autoconceito do adulto, como pessoa madura, evolui de uma situação de dependência para a autonomia; 2. O adulto acumula uma ampla variedade de experiência que podem ser um recurso muito rico para a aprendizagem; 3. A disposição de um adulto para aprender está intimamente relacionada com a evolução das tarefas que representam o seu papel social; 4. Produz-se uma mudança em função do tempo à medida que os adultos evoluem de aplicações futuras do conhecimento para aplicações imediatas. Assim, um adulto está mais interessado na aprendizagem a partir de problemas do que na aprendizagem de conteúdos; 5. Os adultos são motivados para aprender por factores internos em vez de por factores externos. [Sic]. Consideramos que os princípios apontados por Knowles, pela generalidade com que se apresentam, não são aplicáveis apenas à educação de adultos. Mesmo assim, como uma advertência, tais princípios são importantes, embora insuficientes para o desenvolvimento de uma prática pedagógica voltada, de fato, para o desenvolvimento e a aprendizagem do adulto. Assim sendo, apesar dos princípios de Knowles, a educação de adultos continua carecendo de estudos e propostas que nos orientem a uma prática pedagógica que respeite a sua especificidade. 101 Finger e Asún (2003, p.68) colocam esta posição de Knowles como bastante “artificial e ideológica” e concluem: A andragogia, tal como a psicologia humanista, tão somente presume que indivíduos auto-realizados conduzam automaticamente a uma sociedade melhor, isto é, a um melhor ambiente que, por sua vez, facilita a auto-realização dos indivíduos. Esta ingenuidade sociológica é certamente a maior fragilidade da andragogia (FINGER; ASÚN, 2003, p.79). Refletindo a partir do que Finger e Asún (2003) nos trazem, concluímos que a discussão travada hoje sobre a educação de adultos é fortemente influenciada por uma necessidade do mundo contemporâneo, que nos impõe a educação permanente. Sentimos que a discussão apontada por Knowles não traz subjacente um questionamento desse mundo, uma discussão que aponte para a libertação desse homem; questão que é muito presente na obra de Paulo Freire, que nos orientava que uma plena educação de adultos só acontece quando o homem atinge uma consciência crítica. Porém, ressaltamos que Knowles nos aponta uma discussão em consonância com a educação de adultos e fornece um território próprio a essa educação; esta carece de “[...] crítica radical [...] de modo que a educação de adultos liberte-se [...] da sua condição de ‘refém da forma escolar’”. (CANÁRIO, 1999, p.107). O modelo andragógico de educação – destinado a pessoas adultas –, como podemos perceber em seus princípios, considera o aprendiz como centro do processo educativo, respeitando sua autonomia, suas experiências, seu papel na sociedade, seu interesse e sua motivação para aprender. A educação de adultos, referida como esse campo profissional de formação, dispõe de um acervo teórico-metodológico escasso sobre desenvolvimento e aprendizagem de pessoas adultas, uma vez que a maioria das teorias sobre desenvolvimento e aprendizagem tem como foco a criança e o adolescente. Ribeiro (1999), ao tratar dessa questão, discute que a construção de uma psicologia que tivesse como foco o desenvolvimento do adulto, nos aspectos cognitivos e motivacionais, “seria fundamental para se superar a concepção de que 102 o desenvolvimento é algo que ocorre apenas durante o período do desenvolvimento biológico intenso (infância e adolescência)” (RIBEIRO, 1999, p.194). O amadurecimento de uma psicologia dos adultos torna-se ainda mais urgente no mundo contemporâneo, pois a vida adulta se apresenta como a fase mais longa e, como nos diz Marchand (2005, p.15), “a mais complexa de todas as fases do ciclo de vida” diante das situações já postas acima. Desse modo, urge aprofundarmos as pesquisas nesse campo, dada a necessidade de os espaços de formação terem de buscar elementos para trabalhar com esse grupo. Os cursos destinados a formar adulto, nas mais variadas áreas, precisam pensar essa formação a partir de um referencial teórico sobre ensino-aprendizagem do adulto. Defendemos que essa premissa é fundamental, quando pensamos em uma formação para adultos. Oliveira (2004) reflete que a psicologia tenta chegar a explicações universais em relação ao desenvolvimento humano. É bem mais fácil fazê-lo para as fases de vida anteriores à idade adulta, principalmente a infância. Discutir desenvolvimento e aprendizagem em relação à fase adulta torna-se bastante complexo, pois esses sujeitos já estão inseridos “no mundo do trabalho, das relações familiares complexas e da própria condução do ‘projeto cultural’ de constituição dos membros plenos das diferentes culturas” (OLIVEIRA, 2004, p.217). Assim sendo, eles se tornam bastante diferentes entre si, demandando análises diferenciadas dentro de uma mesma fase – a fase adulta. Talvez, esse possa ser um dos problemas configurados para avançarmos na construção de uma psicologia própria do adulto. O olhar sobre o desenvolvimento e aprendizagem, ancorado no aporte teórico da abordagem histórico-cultural (Vygotsky e colaboradores), oferece explicações para compreender que o desenvolvimento não se encerra com a idade; o homem é um ser histórico e o seu desenvolvimento não finda. Vygotsky (2007) destacou que a aprendizagem não se resume a um processo que acontece individualmente. Evidenciou a origem social da aprendizagem, como uma atividade que se dá na cultura, nas relações do homem com o mundo e do mundo com o homem. Desse modo, o homem, neste caso específico o professor, não pode ser visto apenas como um ser em processo de formação, concebido como um mero expectador de aprendizagens, mas como um ser da interação: 103 homem↔mundo / homem↔homem que, no seu processo de formação, estabelece relações inter e intrapessoais. O desenvolvimento e a aprendizagem encontram-se relacionados de acordo com a abordagem teórica defendida por Vygotsky e colaboradores. A interação com o meio físico e social proporciona o aprendizado construído por meio da percepção, observação, experimentação e imitação. Por isso, o ambiente de formação de professores na escola, propicia a interação dos indivíduos, como também a vivência de um conjunto de experiências, operando sobre a produção cultural da coletividade, porque “ninguém se forma no vazio. Formar-se supõe troca, experiência, interações sociais, aprendizagens, um sem fim de coisas” (MOITA, 1992, p.115). O homem está sempre aprendendo e, sendo adulto, vive esse processo de maneira mais consciente que a criança. Essa compreensão, sustentada pelas pesquisas científicas na área, justifica a defesa da criação de ambientes de formação de professores nas escolas. A coordenação pedagógica, como a mobilizadora da formação na escola, deveria ter uma formação que contemplasse estudos acerca do que é educar pessoas adultas, inclusive pessoas que estão em alguns momentos em um mesmo patamar de aprendizagem que o seu. A formação de professores na escola deve ter, subjacente, uma concepção sobre o adulto, que a embase e o coordenador pedagógico da educação de adultos que trabalha exclusivamente com adultos – aluno adulto, professor adulto –, precisa se apropriar dessas discussões, de modo a construir uma prática que esteja em consonância com os processos de ensinar/aprender desses sujeitos. 2.2 SABERES DA AÇÃO PEDAGÓGICA A segunda temática da tríade, que nos propomos a discutir, traz os saberes para a nossa reflexão. Hoje, na literatura educacional, as pesquisas sobre os saberes docentes estão muito em evidência e o nosso trabalho também tem a pretensão de estudar esta temática, contribuindo para o debate. Defendemos e acreditamos que a ação pedagógica deve ser exercida numa territoriedade própria que demanda saberes específicos para uma plena inserção do 104 coordenador no lugar que deve ocupar no sistema educacional. Mas, o que são saberes? O conhecimento do professor não é meramente acadêmico, racional, feito de factos, noções e teorias, como também não é um conhecimento feito só de experiência. É um saber que consiste em gerir a informação disponível e adequá-la estrategicamente ao contexto da situação formativa em que, em cada instante, se situa sem perder de vista os objectivos traçados. É um saber agir em situação, mas não se fique com uma idéia pragmático-funcionalista do papel do professor na sociedade, porque o professor tem de ser um homem ou uma mulher de cultura, ser pensante e crítico, com responsabilidades sociais no nível da construção e do desenvolvimento da sociedade (ALARCÃO, 1998, p.104). [Sic]. Embora, apresentando diferentes tipologias e conceituações, muitos autores têm dedicado parte de sua atividade acadêmica à pesquisa sobre os saberes da ação pedagógica. Ao nos debruçarmos sobre seus construtos, evidenciamos que seguem perspectivas diferentes, embora com alguns pontos comuns na compreensão desses saberes. Consideramos que o coordenador é um professor; nesse trabalho professoras e coordenadoras tiveram o mesmo lócus de formação: o curso de pedagogia. Entendemos que, ao discutirmos os saberes da ação pedagógica, estamos discutindo os saberes que são inerentes a essa prática e, nesse sentido, colocamos professores e coordenadores no mesmo patamar, mesmo reconhecendo que, em suas ações pedagógicas, existem especificidades mas se chamamos de ‘saberes sociais’ o conjunto de saberes de que dispõe uma sociedade e de ‘educação’ o conjunto dos processos de formação e de aprendizagem elaborados socialmente e destinados a instruir os membros da sociedade com base nesses saberes, então, é evidente que os grupos de educadores, os corpos docentes que realizam efetivamente esses processos educativos no âmbito dos sistemas de formação em vigor são chamados, de uma maneira ou de outra, a definir sua prática em relação aos saberes que possuem e transmitem (TARDIF, 2002, p.31). 105 Recorrendo a essa explicitação de Tardif, André e Vieira (2006, p.13), compreendemos que os saberes estendem-se ao “conjunto de educadores responsáveis pelos processos educativos” com o que corroboramos. Optamos em trazer para a discussão alguns dos autores com quem concordamos e que, hoje, na literatura dos saberes da ação pedagógica, estão em evidência. Achamos pertinente começar nossa discussão, apresentando cada um, com as idéias que defendem. Neste item do trabalho, faremos considerações sobre esses saberes e, no seguinte, retomaremos a discussão dos saberes, onde aprofundaremos a discussão, a partir do corpus da pesquisa e à luz da questão que norteou o trabalho. Iniciamos nossa discussão com Freire (1996) que apresenta três grandes categorias de saberes e, ao expor cada uma delas, nos brinda com uma gama de subcategorias. Quando explicita que não há docência sem discência, ele nos coloca na condição de permanentes aprendizes, destacando que a condição de docente remete também à condição de discente, onde aquele precisa colocar-se no lugar deste. Quando Freire (1996) afirma que Ensinar não é transferir conhecimento, ele ratifica a sua crítica à concepção bancária31 Finalmente, Freire destaca o ensinar como a ação especificamente humana, que distingue o homem de outros animais: ensinar é uma especificidade humana. Esta é, pois, a nossa especificidade: aprender/ensinar! É o que nos torna humanos/humanizados. Nas ‘mãos’ dos educadores está, sobretudo, a responsabilidade pelo ensino sistematizado. de educação que, a princípio, a nomenclatura desse saber nos sugere. Esse saber nos aponta que a teoria ensinada por nós, docentes, na formação de pessoas, não necessita, prioritariamente, ser transmitida, mas inicialmente, ser vivida por quem a prega, pois o “meu discurso sobre a teoria deve ser o exemplo concreto, prático, da teoria. Sua encarnação”, assim diz Freire (1996, p.53). As palavras de Paulo Freire nos remetem a uma reflexão profunda do nosso papel, posto que, para fazê-lo, precisamos estar preparados, termos competência e 31 Freire (1996) apresenta, critica e marca oposição à concepção bancária de educação que tem como pressuposto a narração dos conteúdos, pelo professor, privilegiando a decoreba, a memorização mecânica. Os alunos (depositários) são ‘vasilhas’, ‘depósitos’ a serem cheios pelo educador (depositante). 106 sermos generosos para com os nossos aprendentes, pois ensinar é também um ato de generosidade, de partilha. Freire (1996) se posiciona ideológica e politicamente e assume seu lugar no mundo convidando-nos a tomar ciência desses saberes e a nos apropriarmos destes como necessários a toda “práxis” educativa. Gauthier e Tardif (1996, p.14-15) explicam que “o saber docente é um saber ‘plural’, no sentido de ser composto por uma amálgama de diferentes saberes”. Gauthier et al. (1998, p.20) nos oferecem uma reflexão ímpar acerca da profissionalização do ofício de ensinar: Uma das condições essenciais a toda profissão é a formalização dos saberes necessários à execução das tarefas, que lhes são próprias. Ao contrário de vários outros ofícios que desenvolveram um corpus de saberes, o ensino tarda a refletir sobre si mesmo. Nesse sentido, Ramalho, Nuñez e Gauthier (2003, p.38-39), ao discutirem a profissão docente, ressaltam que o termo profissão é polissêmico, complexo e tem sentidos distintos, dependendo do contexto ou referências teóricas onde se dá essa discussão. Gauthier et al. (1998) chamam a atenção para a necessária explicitação dos saberes docentes, de modo que a profissionalização do ensino não pode ocorrer sem uma definição clara desses saberes, pois eles constituem a “identidade profissional do professor”. E acrescentam que para profissionalizar o ensino é necessário não apenas uma dimensão epistemológica, mas é necessário também uma formação que considere a dimensão política. A profissionalização do ensino tem, desse modo, não somente uma dimensão epistemológica, no que diz respeito à natureza dos saberes envolvidos, mas também uma dimensão política, no que se refere ao êxito de um grupo social em fazer com que a população aceite a exclusividade dos saberes e das práticas que ele detém (GAUTHIER et al., 1998, p.34). Demonstrando a complexidade do ofício docente, Gauthier et al. (1998, p.18) questionam: “O que é ensinar? Quais são os saberes, as habilidades e as atitudes 107 mobilizados na ação pedagógica? O que deveria saber todo aquele que tenciona exercer esse ofício?”. Nesse contexto, a ação pedagógica é um processo interativo, uma ação dialética que requer muitos saberes. Para eles, conhecer o conteúdo é insuficiente para o exercício docente que requer uma gama de saberes: “saberes disciplinares, saberes curriculares, saberes das ciências da educação, saberes da tradição pedagógica, saberes das experiências e saberes da ação pedagógica” (GAUTHIER et al., 1998, p.29). Os saberes disciplinares se configuram como os saberes da matéria, o conhecimento sistematizado nas áreas do conhecimento como: matemática, história... Os saberes sobre o currículo trazem, subjacente, o conhecimento que o professor deve possuir sobre o programa de ensino para cada nível de ensino. Os saberes das ciências da educação se configuram como saberes “profissionais específicos, que não estão diretamente relacionados à ação pedagógica, mas servem de pano de fundo, tanto para ele quanto para outros membros de sua categoria” (GAUTHIER et al., 1998, p.31). Os autores trazem a discussão sobre os saberes da tradição pedagógica fazendo um contraponto com as representações que temos de escola e que se instalou a partir do século XVII. Eles nos dizem que esse saber, trazido por cada professor no início de sua formação, permeia a prática docente e será “adaptado e modificado pelo saber experiencial e, principalmente, validado ou não pelo saber da ação pedagógica” (GAUTHIER et al., 1998, p.32). Esse tipo de representação, na maioria das vezes, é inconsciente, mesmo estando presente no jeito de ser do professor. Os saberes da experiência são colocados pelos autores como saber “pessoal e, acima de tudo, privado (GAUTHIER et al., 1998, p.32). Defendemos que os saberes da experiência são de extrema importância na prática educativa porque “essa experiência torna-se então ‘a regra’ e, ao ser repetida, assume, muitas vezes, a forma de uma atividade de rotina. Isso permite que o espírito se liberte para cuidar de outros tipos de problema” (GAUTHIER et al., 1998, p.33). Acreditamos, como já dissemos anteriormente, que a reflexão crítica sobre a prática liberta a rotina, pois quando o professor reflete, ele não executa aquela tarefa do mesmo jeito. Mesmo nas coisas simples, como na maneira de receber os alunos, 108 de fazer a chamada, de planejar, de avaliar... A reflexão ajuda o professor a reescrever sua prática continuamente. Por último, os autores nos apresentam o saber da ação pedagógica, que eles caracterizam como os conhecimentos do ensino; aqueles conhecimentos que são testados “através de pesquisa realizadas em sala de aula” (GAUTHIER et al., 1998, p.32). Os autores fazem uma ressalva importante: Os saberes da ação pedagógica legitimados pelas pesquisas são atualmente o tipo de saber menos desenvolvido no reservatório de saberes do professor, e também, paradoxalmente, o mais necessário à profissionalização do ensino enquanto esse tipo de saber não for mais explicitado, visto que os saberes da ação pedagógica constituem um dos fundamentos da identidade profissional do professor (1998, p.32). O saber da ação pedagógica está em consonância com as preocupações deste trabalho, pois estaremos olhando para a escola, para a figura do coordenador pedagógico na mediação da prática pedagógica do professor alfabetizador, na busca dos saberes mobilizados nessa ação, no sentido de revelar esses saberes e contribuir para a sua legitimação. Uma outra estudiosa da temática que nos propomos a discutir é Isabel Alarcão, da Universidade de Aveiro/Portugal. A partir de estudos desenvolvidos, ela destaca algumas dimensões do conhecimento profissional do professor. A autora inicia sua discussão apresentando alguns conhecimentos que já foram contemplados na discussão de Gauthier et al. (1998), como o conhecimento científico-pedagógico, o conhecimento do conteúdo disciplinar e o conhecimento do currículo. Alarcão (1998) enriquece essa discussão quando traz o conhecimento dos alunos e de suas características como um conhecimento indispensável à prática educativa. Para a pesquisadora, [...] sendo o aluno o elemento central da acção educativa, é imprescindível que o professor detenha conhecimento acerca do 109 aluno e de suas características, isto é, compreenda seu passado e seu presente, sua história de aprendizagem, seu nível de desenvolvimento e seu contexto sociocultural (ALARCÃO, 1998, p.103). [Sic]. Alarcão foi muito feliz ao focalizar a importância desse conhecimento; seja para trabalhar com crianças, jovens ou adultos, em formação, o processo de ensino precisa sempre respeitar as singularidades dos sujeitos que se formam. Para isto, tornam-se necessárias uma grande sensibilidade do professor e muita sabedoria para lidar com as várias singularidades presentes num grupo de alunos. Nesse sentido, entendemos que as idéias de Alarcão se filiam às de Paulo Freire, que nos alerta: “respeitar os saberes dos educandos é condição primeira à construção do processo de mediação” (FREIRE, 1996, p.33). Também nos filiamos a esse saber, pois acreditamos que o saber relacionado ao aluno com quem vamos trabalhar é um saber indispensável, pois é a partir dele que outros saberes podem ser construídos. A autora torna sua discussão bastante pertinente ao realçar a importância do conhecimento dos contextos para a prática pedagógica. Nessa abordagem, também sentimos o pensamento de Alarcão muito próximo do pensamento de Paulo Freire, quando ele diz que ensinar exige apreensão da realidade. Para Alarcão (1998, p.103), a “[...] atividade docente é uma atividade psicossocial, que se desenvolve em contextos espaciais, temporais, sociais, organizativos com valor educativo e que, em cada circunstância, tem aspectos singulares e únicos”. Alarcão ainda acrescenta dois tipos de conhecimento: conhecimento de si mesmo e o conhecimento de sua filiação profissional. Mais uma vez ela se diferencia e nos leva a refletir sobre mais esses referenciais. O conhecimento de si mesmo nos remete ao ‘conhece-te a ti mesmo’. Como podemos pensar na formação do outro, sem antes refletirmos sobre a nossa própria formação? Nosso ‘eu’ pessoal, afetivo, relacional, nossa esperança, a possibilidade que temos de sonhar, o que nos é importante, nossa estrutura emocional32 32 O professor, como profissional do humano (como insiste em chamar-lhe), tem uma especial responsabilidade sobre sua actuação e, assim, o conhecimento de si mesmo no que é, no que faz, no que pensa e no que diz, ou o autoconhecimento, que abrange a dimensão metacognitiva e metapráxica, é mola impulsionadora de seu desenvolvimento pessoal e profissional (ALARCÃO, 1998, p.104). . 110 E, por último, o conhecimento de sua filiação profissional. Nesse, particular, a autora faz um chamado à importância da comunidade profissional. Para ela, e para nós também, esse pertencimento precisa fazer parte da vida do professor. O conhecimento de que fazemos parte de uma categoria e que, desse modo, precisamos ter uma atuação que precisa ser seguida na coletividade. “É a dimensão do colectivo social que está aqui em jogo, no conhecimento de seu valor, de suas potencialidades e de sua função social, numa dinâmica de construção da profissionalidade docente” (ALARCÃO, 1998, p.104). Compreendemos que os saberes apontados pelos autores são inerentes à ação pedagógica de coordenadores e professores. Ora, se o coordenador pedagógico é o responsável pela coordenação da ação pedagógica na escola, ele deve ter domínio desses saberes, bem como da ação de mediar a construção desses saberes junto aos professores. 2.3 ALFABETIZAÇÃO O conceito de alfabetização tem sofrido mudanças, em decorrência das transformações ocorridas na sociedade. É uma exigência da sociedade, hoje, que todos saibam ler e escrever os mais variados tipos de textos. Mas, nem sempre foi assim. Um exemplo de como essa exigência vai mudando é o Censo33 Na sociedade contemporânea, a linguagem escrita configura-se como indispensável à vida das pessoas no mundo Demográfico realizado pelo IBGE, a cada dez anos. Até a década de quarenta, era considerada alfabetizada, pelo Censo, a pessoa que soubesse assinar o próprio nome; da década de cinqüenta até o Censo de 2000, era considerada alfabetizada a pessoa que sabia ler/escrever um bilhete simples. 34 33 Os conceitos de alfabetização adotados pelo Censo são guiados pelos interesses econômicos da sociedade. . Assim sendo, nas últimas décadas, no campo teórico, tem havido uma produção epistemológica considerável sobre a 34 É importante destacar que essa importância atribuída à alfabetização no mundo contemporâneo tem uma forte relação com a “necessidade de expansão do processo de trabalho” (TFOUNI, 2002, p.17) e bem menos com a realização do homem. 111 alfabetização; acreditamos que essa produção parte de uma necessidade desse mundo ser cada vez mais rodeado pela palavra escrita; desse modo, somos cada vez mais convidados a ler e escrever. Assim, esse conceito vai tornando-se cada vez mais abrangente, precisando de uma discussão epistemológica de modo a entendermos sua dinâmica. No século passado, pensando/pesquisando sobre a linguagem, Luria (1991, p.75) atribui ao trabalho social e ao surgimento da linguagem o estatuto de mediadores da transição da história natural (dos animais) para a história social (do homem). O trabalho é a primeira condição para o surgimento da atividade consciente e a linguagem a segunda condição que mobiliza esse surgimento de maneira mais complexa, pois, [...] com o surgimento da linguagem surge no homem um tipo inteiramente novo de desenvolvimento psíquico desconhecido dos animais, e que a linguagem é realmente o meio mais importante de desenvolvimento da consciência (LURIA, 1991, p.81). Nesse entremeio do eu e do outro, se encontra a linguagem, que sustenta a relação entre os homens. A linguagem é o meio do caminho entre o eu e o tu. É através dela que compreendemos e significamos o mundo e a nós mesmos. Línguagem é ação; é produção de significados e sentidos. O mundo humano, enquanto práticas de linguagens entre homens, é um mundo em que nos expressamos, estabelecendo uma relação de interação com o outro, onde, falando, escrevendo ou ouvindo para/com o outro, estabelecemos uma relação que é mediada por signos e significações (sociais e individuais). Assim, discutir alfabetização é também discutir linguagem. Para isto, recorremos a Geraldi (1996, p.67) que trabalha com o pensamento bakhtiniano. Geraldi concebe linguagem como “a capacidade humana de construir sistemas simbólicos e como uma atividade constitutiva, cujo lócus de realização é a interação verbal”, destacando-se que a linguagem constitui o mundo simbólico dos homens. A língua é historicamente, socialmente e culturalmente construída pelos homens e é continuamente reconstruída numa relação dialética, de modo que a linguagem constitui o homem e é por ele constituída. Sendo a alfabetização a 112 capacidade de nos apropriarmos do sistema que representa a linguagem (escrita) e tendo subjacente a concepção de linguagem exposta, indagamos: O que é alfabetização? Tfouni (2002, p.9) define a alfabetização como “aquisição da escrita enquanto aprendizagem de habilidades para leitura, escrita e as chamadas práticas de linguagem”. A concepção posta por Tfouni em relação à alfabetização está em consonância com a concepção de linguagem que subjaz ao nosso trabalho. Esse conceito abarca não somente a codificação e decodificação da língua escrita, ele traz/agrega também as práticas de linguagem. Essa concepção posta por Tfouni, em 2002, já era apresentada em um outro contexto por Freire, em 1979, quando ele destacava que alfabetização não era somente ler e escrever. Para Freire (1979), a alfabetização é também uma atitude de criar e recriar. Uma atitude que pode também resultar em uma postura de atuação deste homem em seu contexto. Tendo uma preocupação/compromisso com a libertação do homem, Freire vincula seu conceito de alfabetização a uma postura desse homem que, se apropriando da alfabetização, concomitantemente, se apropria de uma postura crítica desse mundo. A leitura do mundo e da palavra cria as condições para esse homem passar de uma consciência ingênua para uma consciência crítica. Para Moura (2004, p.195) “a alfabetização constitui-se numa ação entre sujeitos em estado de permanente busca, criação e intervenção. Para que esta ação aconteça, é preciso a existência de um objeto mediador que no caso é a linguagem escrita”. Com base em autores estudados (SOARES, 1985; TFOUNI, 2002; RIBEIRO, 2003; MOURA, 2004), compreendemos a alfabetização como um processo não apenas de codificação e decodificação, mas, fundamentalmente, como compreensão e expressão de significado. Escrever é dizer a minha palavra, é imprimir significado às coisas do mundo através da escrita. Ler é compreender o dito/não dito pelo outro. Ler e escrever são práticas que nos permitem estabelecer um diálogo, uma interação com o mundo. Nesse sentido, A alfabetização passou a ser considerada como uma ferramenta importante para o uso efetivo e competente da leitura e da escrita, e 113 isso envolve aprendizagens que não se restringem a decodificar as letras, mas implicam usar a leitura e a escrita em diferentes situações. Nessa perspectiva, alfabetização consiste na inserção no mundo da escrita, é o processo pelo qual se adquire o domínio de um código e das habilidades de utilizá-lo para ler e escrever (VÓVIO; RIBEIRO, 2003, p.1). Entendemos que o domínio dessas habilidades defendidas por Vóvio e Ribeiro (2003) é um conceito amplo de alfabetização. Soares (1985, p.20), em consonância com esse pensamento, diz que a alfabetização é “um processo permanente que se estende por toda a vida e que não se esgota na aprendizagem da leitura e da escrita”, pressuposto também defendido por Tfouni (2002) que explicita que, em virtude das mudanças ocorridas na sociedade, esse processo não se completa. Trazendo essa discussão para o campo escolar, defendemos que esse processo inicial da alfabetização: ler, escrever, compreender e atribuir significado precisa ter terminalidade, pois o nível da escola destinado à alfabetização dos alunos precisa ter uma compreensão do estágio de desenvolvimento lingüístico que estes alunos devem alcançar. Concordando com as concepções expostas, acreditamos que o desenvolvimento, nos alunos, da capacidade de ler/escrever a maior variedade textual possível, advindas das práticas sociais de leitura e escrita, é um processo que necessita se estender por toda a vida escolar e seguir adiante, pois sempre teremos um texto novo a nos ser apresentado com uma linguagem diferenciada; às vezes, precisamos nos apropriar de uma nova linguagem para podermos ler/escrever/compreender/significar. Essa discussão nos remete a um novo conceito: o de letramento. 2.3.1 Letramento A sociedade avança e com esse avanço surgem novas demandas. A palavra letramento começa a ser usada no final da década de oitenta e tem uma difusão bastante rápida no campo educacional no final da década de noventa. Um contexto 114 acelerado de desenvolvimento econômico e social da sociedade torna propícia essa discussão. A sociedade da informação demanda de seus sujeitos uma apropriação contínua de práticas sociais de leitura e de escrita. Nesse contexto o letramento (do inglês=literacy) desponta como uma palavra necessária no âmbito da discussão sobre alfabetização. O letramento surge, então, para explicitar uma nova exigência que diz respeito à capacidade de saber usar e conhecer as funções da escrita em diversos contextos, e não, apenas, de codificá-la/decodificá-la. Soares (2001) ajuda-nos a compreender esse processo quando explica: [...] porque só recentemente passamos a enfrentar esta nova realidade social em que não basta apenas saber ler e escrever, é preciso também saber fazer uso do ler e do escrever, saber responder às exigências de leitura e de escrita que a sociedade faz continuamente – daí o recente surgimento do termo letramento (SOARES, 2001, p.20). A palavra letramento surge onde as pesquisas vão nos dando conta de que muitas pessoas se alfabetizam, mas não fazem uso pleno em seu cotidiano das práticas sociais de leitura e escrita. Então, o letramento é uma palavra que indica uma situação onde pessoas não apenas sabem ler e escrever, mas, sobretudo, exercem as práticas sociais que demandam a leitura e a escrita como condição. Do mesmo modo, Soares (2001), nos diz que um adulto pode não ser alfabetizado mas, se imerso em um contexto onde existe uma circulação forte de materiais escritos e este participa destas práticas, mesmo como ouvinte e/ou se dita coisas para outros escreverem, “[...] esse analfabeto é, de certa forma, letrado, porque faz uso da escrita, envolve-se em práticas sociais de leitura e de escrita” (SOARES, 2001, p.24). Para Tfouni (2002, p.20), o letramento tem foco nos “aspectos sócio-históricos da aquisição de um sistema escrito, por uma sociedade”. Os estudos do letramento, para essa autora, surgem para responder a questões essenciais ocorridas, como: mudanças sociais e, consequentemente, discursivas; caracterização dos grupos de pessoas analfabetas imersas em contextos letrados e contextos iletrados; descrição 115 de como grupos não-alfabetizados se apresentam, por seus valores serem influenciados por uma cultura letrada. O letramento é compreendido como prática social, de modo que os sujeitos envolvidos “nessas práticas, constroem relações de identidade e poder” (KLEIMAN, 2003, p.11). Em um mundo cada vez mais permeado pela escrita, continuamente, as pessoas – também os adultos analfabetos que participam ativamente da sociedade – são expostas, colocadas em interação com textos. Essa inserção não se dá de forma harmônica. O letramento, que circula predominantemente na sociedade, é um instrumento do mundo dos letrados e, desse modo, ele se configura como ideológico, pois a relação dos sujeitos com a linguagem é determinada pelo “seu lugar na sociedade e a sua relação com a linguagem” (RATTO, 2003, p.289). Os iletrados participam dessas práticas sociais em condições de subjugados pela cultura do outro. Nesse contexto, é de extrema importância um trabalho de letramento na escola que considere as especificidades dos grupos, que parta da história de leitura desses grupos, dos textos que circulam na comunidade, onde a escola esteja inserida, mas, também aproxime esses alunos dos textos que circulam noutros espaços sociais, no sentido do aluno conhecer outras práticas sociais de modo que detenha os instrumentos para se movimentar na sociedade dominada pela linguagem da classe dominante. No foco desta preocupação, destacamos que os avanços vividos na sociedade, onde são demandadas, cada vez mais, práticas de leitura e de escrita, essa demanda não é acompanhada por parcelas da população, especialmente as já excluídas economicamente. Muitas crianças, jovens e adultos, com anos de escolaridade, não conseguem ler um livro de história e/ou jornal; enquanto isso, outra parcela da população usa a internet para exercer todo tipo de prática social, fazendo uso da leitura e da escrita: escreve cartas, bilhetes, acessa o banco, a biblioteca, a sala de namoro, lê jornais, escreve diários, enfim, está conectada ao mundo moderno. Precisamos nos mobilizar contra a divisão da sociedade em letrados e iletrados. Para Ferreiro (2002, p.63), o verdadeiro desafio é essa crescente desigualdade quando “alguns não chegaram, sequer, aos jornais, aos livros e às 116 bibliotecas, enquanto há quem corra atrás de hipertextos, correio eletrônico e páginas virtuais de livros inexistentes”. Os estudos sobre o letramento “abrem novas perspectivas para reflexão crítica sobre o papel da escola” (RIBEIRO, 2003, p.54), o nível destinado a alfabetizar, deve, não apenas, se preocupar em ensinar a ler e escrever. Defendemos que as crianças, jovens e adultos sejam alfabetizadas em contextos de letramento, onde, desde o princípio, estejam imersos em práticas sociais e reais de leitura e de escrita. Considerando a alfabetização e o letramento como indissociáveis, os conceitos de alfabetização e letramento vão sendo ressignificados em função das demandas sociais e, junto a essa ressignificação, surgem outros conceitos para dar conta da continuidade desse processo, visto que o alfabetizador precisa ter clareza acerca do referido processo que implica competências a serem adquiridas. No campo da alfabetização, o processo de como se aprende a ler e a escrever sofre grande influência a partir dos estudos de Vygotsky e Piaget. Emília Ferreiro, ancorada pela teoria piagetiana, na década de oitenta, publica um estudo que contribui decisivamente para mudança do paradigma sobre como o sujeito aprende a ler e a escrever. Considerando a importância desse paradigma, por ser uma das fontes fundamentais de transformação do conceito atual de alfabetização e, ainda, considerando que a escola pesquisada tem, desde a sua gênese, a teoria de Ferreiro e colaboradores como os fundamentos de sua prática pedagógica alfabetizadora, entendemos que uma discussão sobre alfabetização não pode ser feita sem a psicogênese da língua escrita, de Ferreiro e colaboradores. Para Smolka (1989, p.17), “Ferreiro desenvolveu uma pesquisa inovadora, pois foi reveladora de aspectos até então não considerados”. No caso da nossa prática de professora alfabetizadora e de formadora de professores alfabetizadores, é impossível, hoje, discutirmos alfabetização sem uma referência ao paradigma construído por Emília Ferreiro e colaboradores. 117 2.3.2 O caminho percorrido pelos sujeitos na apropriação da escrita: Paradigma psicogenético de alfabetização em realce A concepção mecanicista começa a ser questionada em meados da década de setenta (BRASIL, 2001a) e a pesquisa desenvolvida por Emília Ferreiro e Ana Teberosky que deu origem ao livro Psicogênese da Língua Escrita – publicado no Brasil em 1985 – foi mobilizadora de uma mudança de paradigma. Essa teoria tem subjacente a concepção psicogenética de Jean Piaget. Após a sistematização desta pesquisa, houve desdobramentos dela em outros países. No Brasil, Telma Weisz tem sido uma das parceiras deste grupo, bem como o grupo do GEEMPA/RS35 Ao olhar o processo de alfabetização, sustentados pela teoria piagetiana, Ferreiro e colaboradores investigam como os sujeitos não alfabetizados constroem esse conhecimento, amparados pelo paradigma da interação do sujeito com o objeto de conhecimento. . Para esse paradigma, a língua escrita é um sistema de representação e, para apropriar-se dela, os aprendizes percorrem um longo processo que vai da distinção entre a representação icônica e não-icônica até a fonetização da escrita. Apesar de um maior número de pesquisas publicadas no âmbito da alfabetização de crianças, Ferreiro (1983), além de outros estudiosos (VALE, 2002; MOURA, 2004; LEAL, 2004), também encontraram evidências do processo psicogenético de construção da escrita em jovens e adultos. Igualmente, no nosso trabalho, como alfabetizadora de jovens e adultos, temos encontrado inúmeras evidências do processo psicogenético por eles vivenciado na sua alfabetização. A investigação realizada por Ferreiro (1983; 1990b; 1995) apontam que os alfabetizandos passam por três períodos no processo de evolução dos aspectos construtivos da escrita. A escrita como representação da linguagem é percebida de maneira construtiva e segue uma linha evolutiva – embora não linearmente – onde podemos perceber que nos três grandes períodos, configuram escritas de níveis 35 GEEMPA – Grupo de Estudos sobre Educação, Metodologia de Pesquisa e Ação. O GEEMPA é uma ONG que desenvolve atividades de planejamento, execução e avaliação de políticas de educação, atualmente com ênfase na alfabetização de jovens e adultos de classes populares, em parceria com instituições públicas e privadas. 118 diferenciados, regidas por diversas hipóteses – sobre o que é a escrita, o que ela representa e como ela representa. Com base na figura abaixo (CAMPELO, 2002), faremos a discussão acerca dos níveis de conceptualização da escrita, segundo Emília Ferreiro. Criação: Profª Mª Estela Campelo UFRN Apoio Técnico: Andréa Campelo - Fo ne tiz aç ão da Es cr ita 3 E S C R I T A S D O N Í V E L 3º SUB-NÍVEL FONÉTICO 2 SUB-NÍVEL FONÉTICO 3 ESCRITA SILÁBICO- ALFABÉTICA ESCRITA ALFABÉTICA HIPÓTESE SILÁBICO- ALFABÉTICA HIPÓTESE: ALFABÉTICA OS NÍVEIS DE CONCEPTUALIZAÇÃO DA ESCRITA DE ALFABETIZANDOS NA VISÃO DE EMILIA FERREIRO - Di fe re nc ia çõ es in te r-f igu ra is H I P Ó T E S E P R É S I L Á B I C A E S C R I T A S D O N Í V E L 2º ESCRITA DIFERENCIADA INTER-FIGURAL Qualitativa Quantitativa 2 - Di st inç ão e nt re a s r ep re se nt aç õe s icô ni ca e n ão -ic ôn ica - Di fe re nc ia çõ es in tra -fi gu ra is 1 E S C R I T A S D O N Í V E L 1º ESCRITA DIFERENCIADA INTRA-FIGURAL Qualitativa Quantitativa ESCRITA INDIFERENCIADA SUB-NÍVEL FONÉTICO 1 HIPÓTESE SILÁBICA ESCRITA SILÁBICA Figura 3 Os Níveis de Conceptualização da Escrita de Alfabetizandos na visão de Emília Ferreiro Criação: Maria Estela Costa Holanda Campelo36 , 2002. 1º Período: Distinção entre as representações icônicas e não-icônicas e construção de formas de diferenciação intrafigurais. A primeira grande construção do alfabetizando é a distinção entre desenhar e escrever ou entre a representação icônica e a representação não-icônica. Nesse primeiro período, temos as escritas do primeiro nível que se subdividem em escritas 36 Figura criada pela professora Maria Estela Costa Holanda Campelo. Natal, UFRN, 2002. 119 indiferenciadas e escritas diferenciadas intrafiguralmente. A seguir, Ferreiro (1995) nos explica quando e como essa construção acontece: Após uma série de explorações ativas, as crianças chegam a seguinte conclusão: não é o tipo de linha que nos permite distinguir entre um desenho e uma coisa escrita. Na verdade, produzimos os dois, através de linhas retas, curvas ou de pontos. Com o mesmo tipo de linhas podemos desenhar ou escrever. A diferença está na organização das linhas. Quando desenhamos, as linhas são organizadas seguindo-se os contornos do objeto. Quando escrevemos, estamos fora do campo icônico. As formas das letra nada têm a ver com a forma do objeto ao qual as letras se referem, e sua organização nada têm a ver com a organização das partes do objeto (FERREIRO, 1995, p.25). O modo de representação icônico e a não distinção entre desenhar e escrever são mais observados em crianças em processo de alfabetização e pouco observados em jovens e adultos alfabetizandos, pois a imersão num mundo letrado respalda a idéia de que escrever é diferente de desenhar. Ao chegar à escola, e serem convidados a escrever, escrevem utilizando letras. Como alfabetizadora de jovens e adultos, durante anos, tivemos apenas um aluno que escrevia, utilizando desenhos. Ele tinha 19 anos, nunca havia ido à escola e tinha deficiência mental. A seguir, reproduzimos um exemplo desse tipo de representação (canto superior esquerdo) encontrada por Maria José Vale, pesquisadora do Instituto Paulo Freire/São Paulo. Figura 4 Produções de Alfabetizandos Jovens e Adultos Fonte: Educação de Jovens e Adultos – Maria José Vale. IPF, p. 21. 120 Além do exemplo da representação através de desenhos, lemos na figura acima exemplos de escrita indiferenciada. Dentre as escritas do 1º nível, ainda encontramos as escritas pré-silábicas com diferenciações intrafigurais. Os critérios intrafigurais se expressam nos eixos quantitativo e qualitativo (FERREIRO, 1990b, p.20). • Quantitativo • : as pesquisas de Ferreiro indicam que a hipótese da quantidade mínima de caracteres estabelecida pelos alfabetizandos está em torno de três, quatro caracteres. Qualitativo : com a exigência da variação interna dos caracteres para que uma série de grafias possa ser legível. Observemos a escrita diferenciada intrafigural na figura que se segue: Figura 5 Escrita Pré-silábica diferenciada intrafiguralmente Fonte: Educação de Jovens e Adultos – Maria José Vale. IPF, p.24. 2º Período: construção de formas de diferenciações inter-figurais. Os alfabetizandos avançam em seu processo e chegam às escritas pré- silábicas com diferenciação inter-figural, onde também analisam seus escritos sob os eixos quantitativos e qualitativos. Nesse 2º período, as escritas são caracterizadas por Ferreiro como escritas do 2º nível. Essas escritas são construídas com o pressuposto de que palavras diferentes não podem ter grafias iguais. Podemos notar esse tipo de escrita no exemplo que se segue: 121 Figura 6 Escritas Pré-silábicas com diferenciações intra e inter-figurais Fonte: Escola EMÍLIA RAMOS. Relatórios da Educação de Jovens e Adultos, 2004. Segundo Ferreiro (1995), a concepção do alfabetizando subjacente à produção de escritas pré-silábicas diferenciadas inter-figuralmente se constituem num avanço. Todavia, [...] como começam a asseverar que duas cadeias idênticas não podem “dizer” nomes diferentes, defrontam-se, consequentemente, com um novo problema: como podem criar diferenciações gráficas que permitam gerar interpretações diferentes? (FERREIRO, 1995, p.28). A diferenciação inter-figural também não acontece aleatoriamente. Assim sendo, os alfabetizandos... [...] exploram critérios que lhes permitem, às vezes, variações sobre o eixo quantitativo (variam a quantidade de letras de uma escrita para obter escritas diferentes), e, às vezes, sobre o eixo qualitativo (variam o repertório de letras que se utiliza, de uma escrita para outra; variam a posição das mesmas letras sem modificar a qualidade (FERREIRO, 1990b, p.24). Ferreiro (1995) destaca que é nesse momento que um dos critérios utilizados pelos alfabetizandos é, assim, definido: • Objetos grandes – mais letras. 122 • Objetos pequenos – menos letras. Esse modo de pensar é caracterizado por Piaget como realismo nominal que também é observado em jovens e adultos, em processo de alfabetização. Como evidência do que afirmamos, pedimos licença ao leitor e trazemos um relato de um desses momentos únicos, demonstrado por Leal (2004, p.81), num trabalho em que discute a apropriação do sistema alfabético, através do relato de uma professora alfabetizadora que, a seguir apresentamos na íntegra: Fomos ao cinema assistir Lisbela e o prisioneiro. No dia seguinte, a aula foi sobre o filme. Então, perguntei: - Qual cena que mais lhe chamou a atenção? Bosco respondeu: - Foi a cena do boi, professora, aquela quando Mané Gostoso pega o boi pelo chifre e derruba no chão. Pedi para que eles escrevessem palavras mais significativas que aparecem no filme. Bosco disse: - Quero escrever a palavra boi. Como se escreve? Eu respondi: - Bo-i Como é Bo? Disse Bosco. Eu lhe respondi: Bo de Bosco e i. Ele escreveu. Ao terminar, levantou a cabeça, me olhou e perguntou: - Já terminou? Ele voltou a olhar a palavra e olhou novamente em minha direção ,dizendo: - Não professora! Boi se escreve só com essas três letrinhas? Afirmei que sim, Boi se escreve só com três letras. Ele diz: - Professora! Estou “bestinha”. Boi só com três letras? Um bicho daquele tamanho! Ó professora, não vou me esquecer nunca mais de escrever essa palavra! Como é possível observar, o realismo nominal emerge também no adulto, em processo de compreensão de como a escrita representa a linguagem. Nos dois primeiros períodos, já discutidos, as escritas produzidas pelos alfabetizandos são pré-silábicas, mesmo sendo escritas de subníveis distintos: indiferenciadas, diferenciadas intrafiguralmente e diferenciadas inter-figuralmente. Quando o alfabetizando começa a fazer uma análise mais complexa, mesmo ainda tendo uma hipótese pré-silábica, mas a caminho de outra hipótese, 123 percebemos algumas relações com a linguagem oral que podemos caracterizar como transitórias, por exemplo: produz escritas pré-silábicas, mas já colocando algumas letras correspondentes aos fonemas da palavra, como nos apresenta a escrita que se segue: Figura 7 Escritas Pré-silábicas com diferenciações intra e inter-figurais Fonte: Escola EMÍLIA RAMOS. Relatórios da Educação de Jovens e Adultos, 2004. 3º Período: fonetização da Escrita. Para Ferreiro (1990b), é nesse período que acontece o grande salto qualitativo do processo de construção da escrita nos alfabetizandos; quando descobre que a escrita representa os sons da fala, o alfabetizando começa a fonetizar a escrita; começa a perceber as relações entre a sua produção escrita e a pauta sonora da linguagem. As escritas desse período são caracterizadas como escritas do 3º nível. Esse período é marcado por três hipóteses de escritas: hipótese silábica; hipótese silábico-alfabética e hipótese alfabética. Na produção da escrita silábica, como nas demais escritas fonetizadas, o alfabetizando direciona sua análise para a pauta sonora da palavra. A especificidade da escrita silábica, porém, diz respeito à escrita de palavras, cuja quantidade de letras corresponde ao número de sílabas dessas palavras, como pode ser observado nas escritas que se seguem: 124 Figura 8 Escritas Silábicas Fonte: Educação de Jovens e Adultos – Maria José Vale. IPF, p.27. Ferreiro (1995, p.30) destaca que, nesse nível, o alfabetizando sente-se mais satisfeito, pois consegue ter um “controle objetivo das variações na quantidade de letras necessárias para escrever qualquer palavra que deseja escrever”. Nesse nível, muitos alfabetizandos, além de refletirem sobre a relação escrita/oralidade, ainda fazem descobertas acerca do valor sonoro das letras no contexto das sílabas da palavra. Na nossa prática, temos observado que, enquanto muitos alfabetizandos apresentam tal desempenho nesse nível do processo, outros adquirem-no no decorrer do mesmo. A seguir, temos exemplos de escritas silábicas de alfabetizandos adultos. Figura 9 Escritas Silábicas Fonte: Educação de Jovens e Adultos – Maria José Vale. IPF, p.27. 125 A hipótese silábica se torna satisfatória por pouco tempo, pois num processo de reflexão sobre o que está escrito, os alfabetizandos se vêem imersos em um grande conflito: sobram letras no momento da leitura do que os outros escrevem (caso essa escrita não seja silábica). Esse conflito mobiliza o surgimento do próximo nível: o silábico-alfabético. O nível silábico-alfabético é caracterizado pela transição entre o silábico e o alfabético e as escritas ali produzidas são regidas, simultaneamente, por duas hipóteses: a silábica e a alfabética. Assim sendo, algumas sílabas são escritas silabicamente e outras são escritas alfabeticamente, ou seja, representando todos os fonemas daquela sílaba. Observemos a escrita silábico-alfabética que se segue: Figura 10 Escritas Silábico-alfabéticas Fonte: Escola EMÍLIA RAMOS. Relatórios da Educação de Jovens e Adultos, 2004. Sobre a hipótese e escrita silábico-alfabética, assim, explica Ferreiro (1995, p.32): “Essa é uma típica solução instável, que chama um novo processo de construção” (1995, p.32). A construção da hipótese alfabética respalda a produção da escrita do mesmo nome e evidencia a culminância do processo de alfabetização pela apropriação do sistema alfabético de escrita. Na apropriação do sistema alfabético, todos os conflitos em relação ao processo de aprender a representação da linguagem estão resolvidos? Não. Nesse momento, um novo processo é desencadeado, com novos problemas a resolver e 126 novas decisões a tomar, com outros conceitos a serem construídos, como aqueles concernentes à escrita ortográfica. Nesse sentido, vejamos as duas escritas que se seguem: Figura 11 Escritas Alfabéticas Fonte: Escola EMÍLIA RAMOS. Relatórios da Educação de Jovens e Adultos, 2004. Figura 12 Escritas Alfabéticas Fonte: Escola EMÍLIA RAMOS. Relatórios da Educação de Jovens e Adultos, 2004. Para que o aluno em processo de construção da escrita tenha um desenvolvimento progressivo na sua aprendizagem, é imprescindível uma mediação pedagógica com qualidade. Na construção dessa prática pedagógica, com repercussões positivas no sucesso escolar dos alunos, estão implicados coordenadores e professores, com seus saberes da ação pedagógica. Nesse sentido, o sistema de categorias – apresentado no capítulo a seguir – traz um quadro do conteúdo recolhido no campo da pesquisa, onde procuramos apreender esses saberes, utilizando também nossa sensibilidade, subjetividade e objetividade necessárias. 127 Com a questão de pesquisa e o arcabouço teórico metodológico apresentado no capítulo I e à luz do referencial teórico exposto, vivenciamos numa escola pública – a Escola Emilia Ramos – o cotidiano da sua ação pedagógica. Ao longo de um ano letivo, estivemos acompanhando o trabalho da coordenação pedagógica, tendo a oportunidade de vivenciar todos os momentos de sua ação, tentando apreender os saberes da ação pedagógica requeridos do coordenador pedagógico no trabalho específico de orientar/mediar a prática pedagógica de professores alfabetizadores de jovens e adultos. 22 2 SABERESEMFIOSQUESETECEMN AALFABETIZAÇÃODEJOVENSE ADULTOS.SABERESEMFIOSQUE SETECEMNAALFABETIZAÇÃOD EJOVENSEADULTOS.SABERESE MFIOSQUESETECEMNAALFABE TIZAÇÃODEJOVENSEADULTOS. SABERESEMFIOSQUESETECEMN AALFABETIZAÇÃODEJOVENSE ADULTOS.SABERESEMFIOSQUE SETECEMNAALFABETIZAÇÃOD EJOVENSEADULTOS.SABERESE MFIOSQUESETECEMNAALFABE TIZAÇÃODEJOVENSEADULTOS. SABERESEMFIOSQUESETECEMN AALFABETIZAÇÃODEJOVENSE ADULTOS.SABERESEMFIOSQUE O que me interessa agora, repito, é alinhar e discutir alguns saberes fundamentais à prática educativo- crítica ou progressista e que, por isso mesmo, devem ser conteúdos obrigatórios à organização programática da formação docente. Conteúdos cuja compreensão, tão clara tão lúcida, quanto possível, deve ser elaborada na prática formadora. É preciso, sobretudo, e aí já vai um destes saberes indispensáveis, que o formando, desde o princípio mesmo de sua experiência formadora, assumindo-se como sujeito também da produção do saber, se convença definitivamente de que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou a sua construção (FREIRE, 1996, p.24-25). III Capítulo 129 3 SABERES EM FIOS QUE SE TECEM NA ALFABETIZAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS As idéias de Freire (1996), referidas na epígrafe de abertura deste capítulo, são de fundamental importância no encaminhamento da prática pedagógica do professor, bem como do coordenador pedagógico, cujo papel de articulador do Projeto Político Pedagógico da escola – no dizer de Vasconcellos (2002) – lhe confere o título de ‘o mediador por excelência’ do processo de ensinar-aprender. Espera-se do professor que ele mobilize uma gama de saberes da ação pedagógica para que o seu ensinar possibilite o aprender dos seus alunos. Sob esse ângulo, é conferida uma maior amplitude ao trabalho do coordenador pedagógico, haja vista que são as suas mediações junto aos professores que alimentarão pedagogicamente as mediações destes junto aos alunos, no sentido de promoverem a ‘continuidade/superação’ dos ‘saberes de experiência feitos’ dos/pelos saberes científicos, sistematizados (FREIRE, 1996). Essa repercussão qualitativa da mediação do coordenador pedagógico sobre a prática docente do professor também é reconhecida por Vale (2002, p.9), quando ressalta: “Nas experiências que temos desenvolvido, observamos um nível maior de competência dos educadores quando eles podem contar com uma coordenação pedagógica permanente que dê continuidade aos cursos iniciais”. Imbuída desse pensamento, defendemos que tanto o trabalho dos professores como o trabalho do coordenador pedagógico têm especificidades que exigem desses profissionais a articulação de inúmeros saberes. No decorrer de todo o ano de 2006 realizamos nossa pesquisa de campo na Escola Municipal Professora Emília Ramos; naquele ano, também participamos de todas as ações, ali, empreendidas pela coordenação pedagógica, no âmbito do seu trabalho. Nesses momentos, nossa atenção esteve focada na busca de respostas para nossas indagações norteadoras e relacionadas com o objetivo deste trabalho, e que serão o fio condutor das nossas análises neste capítulo. Cumpre-nos destacar que, no lócus desta pesquisa, desenvolve-se um trabalho – que tem a coordenação pedagógica bastante atuante – com uma séria e relevante preocupação: alfabetizar todas as crianças, jovens e adultos que são alunos da escola. Tivemos acesso ao referido trabalho e ao seu vasto material que 130 vem compor – com a entrevista, o questionário, a observação e o conteúdo de outros documentos – o corpus das nossas análises. Este capítulo foi elaborado com a participação de duas coordenadoras pedagógicas e duas professoras – sujeitos desta pesquisa – todas com atuação no I nível da EJA, onde deve acontecer a alfabetização dos alunos jovens e adultos. No âmbito das análises, decidimos trabalhar com as perspectivas de professoras e coordenadoras; ressaltamos que nosso objetivo não é comparar perspectivas dessa função, mas investigar/construir um arcabouço de saberes da prática pedagógica requeridos na ação mediadora do coordenador que atua junto as professoras que alfabetizam jovens e adultos naquela escola. De acordo com os esclarecimentos feitos na Introdução, que trata também da nossa metodologia de pesquisa, trabalhamos com a análise de conteúdo; esse procedimento nos possibilitou a apresentação do material apreendido no lócus desta investigação em temas, categorias e subcategorias. Da análise do corpus da pesquisa, emergiu a grande temática ‘Saberes – da Ação – do coordenador pedagógico’, que será discutida a seguir. As categorias que emergiram dessa temática – ‘Saberes Específicos’ e ‘Saberes Transversais’ – são bastante imbricadas, inter-relacionadas, pois tratam de dimensões da vida desse profissional que no campo da ação não estão separadas. Apesar disto, decidimos discuti-las em separado, de modo a termos explicitados saberes pormenorizados da ação do coordenador pedagógico que pretendemos conhecer. Feita a guisa introdutória, procederemos à análise de conteúdo do corpus da pesquisa, norteada principalmente pelos indicadores das subcategorias. 3.1 SABERES - DA AÇÃO - DO COORDENADOR PEDAGÓGICO A temática ‘Saberes – da ação – do Coordenador Pedagógico’ traz uma discussão epistemológica da atividade profissional do coordenador pedagógico. No âmbito desta temática, foram construídas duas categorias de saberes com suas respectivas subcategorias que podem ser visualizadas no Quadro 1 que se segue. 131 Tema Categoria37 Subcategoria 3.1 – Saberes - da Ação - do Coordenador Pedagógico 3.1.1 – Saberes Específicos da Ação 3.1.1.1 – Jovem e adulto como sujeito de desenvolvimento e de aprendizagem 3.1.1.2 – Alfabetização do jovem e do adulto: Psicogênese da língua escrita 3.1.1.3 – Ciclo da ação didático- pedagógica da AJA 3.1.2 – Saberes Transversais da Ação 3.1.2.1 – Respeitar e se fazer respeitar por professores e alunos 3.1.2.2 – Priorizar a dimensão pedagógica no cotidiano escolar 3.1.2.3 – Mediar a ação docente nas diversas etapas: planejamento; execução; avaliação Quadro 1 Saberes - da Ação - do Coordenador Pedagógico 3.1.1 Saberes Específicos da Ação Os Saberes Específicos da Prática do coordenador pedagógico dizem respeito aos “saberes experienciais” (GAUTHIER et al., 1998) construídos pelos sujeitos e codificados em certos saberes, considerados imprescindíveis no exercício de sua mediação junto aos professores, visando especificamente a alfabetização de jovens e adultos. Os saberes aqui apresentados foram apreendidos através dos procedimentos de recolha de dados utilizados, sobretudo a entrevista. A seguir, serão discutidos os saberes específicos da Ação do Coordenador Pedagógico, mediando a ação docente de alfabetizar. • Jovem e adulto como sujeito de desenvolvimento e de aprendizagem • Alfabetização do jovem e do adulto: Psicogênese da língua escrita 37 A construção das categorias deste Quadro foi inspirada em Campelo (2001). 132 • Ciclo da ação didático-pedagógica 3.1.1.1 Jovem e adulto como sujeito de desenvolvimento e de aprendizagem Compreender o Jovem ou adulto como sujeito do conhecimento e da aprendizagem é um saber indispensável aos coordenadores pedagógicos. Na esfera desse saber, estão inter-relacionados outros conceitos/saberes, uma vez que, compreender o jovem e o adulto como sujeito do conhecimento e da aprendizagem requer que saibamos: • Quem são esses jovens e adultos; • Como aprendem; • Como é preciso ensinar; • Desenvolvimento do jovem e do adulto: características; • Relações entre aprendizagem e desenvolvimento; Os atores da pesquisa têm clareza de que, para mediar o processo de ensino- aprendizagem, é necessário sabermos quem são os sujeitos desse processo. Nesse sentido, vejamos o que nos diz Ana Maria: Acho que um desses saberes é a parte de psicologia, a psicologia do professor: compreender melhor quem é esse professor da EJA; outro saber que ele deve ter é o conhecimento de quem é esse aluno que está na EJA; e eu sempre tenho essa dificuldade. Na fala da coordenadora, fica evidente a sua compreensão de que professores são mediados, pelo coordenador, para ensinarem/aprenderem e alunos são mediados, por aqueles professores, para aprenderem. Diante do exposto, perguntamos: quem são esses sujeitos do conhecimento? Como aprendem? A tarefa de ensinar/aprender requer dos mediadores desta ação um conhecimento sobre como tal ação se processa nesses sujeitos do conhecimento. 133 Na especificidade de mediar conhecimento com jovens e adultos – sejam eles os alunos da EJA em processo de alfabetização ou professores da EJA responsáveis por esse ensino-aprendizagem – requer do coordenador pedagógico entender como aprendem esses sujeitos - jovens e adultos. Ainda que de forma inconsciente, todo professor tem idéias de como se processam o ensino e a aprendizagem. Nesse sentido, Zabala (1998, p.27) explicita que “por trás de qualquer proposta metodológica se esconde uma concepção do valor que se atribui ao ensino, assim como certas idéias mais ou menos formalizadas e explicitadas em relação aos processos de ensinar e aprender”. Uma prática pedagógica para alfabetização deve estar ancorada numa concepção de aprendizagem e ter a compreensão de como o sujeito constrói o sistema de representação da escrita e, a partir desses pressupostos, organizar essa prática. Para Zabala (1998), não é possível um ensino que não tenha um pressuposto sobre a maneira como as pessoas aprendem porque, quando se explica de certa maneira, quando se exige um estudo concreto, quando se propõe uma série de exercícios, quando se ordenam as atividades de certa maneira, etc., por trás destas decisões se esconde uma idéia sobre como se produzem as aprendizagens (ZABALA, 1998, p.29). Essas idéias e concepções são reflexos de sua formação e vivências profissionais. Sabe-se que uma concepção/abordagem de ensino não se realiza de forma isolada de outras categorias, tais como: visão de mundo, sociedade, homem, aprendizagem e desenvolvimento. Uma dessas abordagens é a comportamentalista, segundo a qual se interiorizavam as informações/conhecimentos “através dos sentidos, ativados pela ação física e perceptual. O ‘sujeito’ da aprendizagem seria ‘vazio’ na sua origem, sendo “preenchido” pelas experiências que tem com o mundo” (WEISZ, 2000, p.57). Nessa concepção, o homem é passivo e assujeitado - como nos dizia Paulo Freire; a aprendizagem é mecânica e o conhecimento é depositado na cabeça do aluno, ressaltando-se que Freire (1983) denominou essa abordagem de concepção “bancária da educação”: através dos testes, a escola verifica se o conhecimento foi devidamente “depositado” no aluno. 134 Como o sujeito aprende a ler e a escrever nesta perspectiva? A concepção subjacente para responder a questão foi marcada, e ainda o é, pela concepção mecanicista de alfabetização. Para essa concepção, o alfabetizando é uma “tabula rasa” e se comporta como um receptor passivo de informações. Sustentados nessa concepção de aprendizagem, professores alfabetizadores durante muito tempo, e muitos até os dias de hoje, acreditam que o aprendiz é alguém que vai juntando informações. Ele aprende o ba, be, bi, bo, bu, depois o ma, me, mi, mo, um, e supõe-se que em algum momento, ao longo desse processo, tenha uma espécie de “estalo” e comece a perceber o que é o ma, o me, o mi, o mo e o mu têm em comum (WEISZ, 2000, p.57). Aprender a ler e escrever nessa perspectiva é repetir/memorizar famílias silábicas, “a língua é vista como transcrição da fala” (WEISZ, 2000, p.57). Contrárias a essa discussão, duas grandes correntes da psicologia contestam esse paradigma: a psicologia genética de Piaget e a abordagem histórico-social de Vygotsky e colaboradores – são consideradas duas abordagens teóricas divergentes na concepção de aprendizagem e desenvolvimento – embora situem a concepção de ensinar/aprender num lado contrário a que fundamenta a concepção mecanicista de alfabetização. Os dois têm em comum a compreensão de um sujeito, não mais assujeitado, mas ser ativo no processo de conhecer. Para Piaget, o conhecimento é construído na interação do sujeito com o objeto de conhecimento; este é assimilado a partir da ação do sujeito sobre o objeto, transformando-o. Segundo Piaget, são dialéticas as relações entre o sujeito e o objeto de conhecimento. Desse modo, o sujeito transforma o objeto de conhecimento pela assimilação e é transformado por este, pela acomodação que, através do equilíbrio, desencadeia a adaptação. Ao destacar o homem como sujeito ativo no processo de conhecer e como construtor desse processo, Piaget denomina essa posição de construtivista. Para Vygotsky (2007), o processo de conhecer dá-se pela mediação do outro, da cultura, quando o sujeito transforma o que é sócio-cultural em individual. E este processo acontece na relação do sujeito com o meio que é social/cultural. 135 No processo de internalização as atividades acontecem, a princípio, no nível interpessoal e, posteriormente, no nível intrapessoal, destacando-se que “para fazer os seus meios, as suas aptidões, o seu saber-fazer o homem deve entrar em relações com os outros homens e com a realidade humana material” (LEONTIEV, 2004, p.185). Ana Júlia está convicta da importância do domínio, por parte de coordenadores e professores, do ‘saber sobre como aprendem’ e revela isso na sua fala: Professor e coordenador, em termos da responsabilidade que têm, eles trabalham muito juntos. A gente tem que estar estudando essas questões em termos de aprendizagem mesmo, de como a gente aprende, de como a gente pode facilitar essa aprendizagem, de como a gente pode intervir, está fazendo, refletindo, retomando (Ana Júlia). Além de saber como aprendem professores e alunos, o coordenador pedagógico precisa saber se o conteúdo estudado foi compreendido. Ana Maria diz que “é necessário saber como os professores processam as informações que estão recebendo, e como fazer esse conhecimento se tornar real na vida particular de cada um”. Vasconcellos (2002, p.108) ainda acrescenta que “um dos papéis centrais da supervisão é justamente criar condições para que o professor descubra a melhor forma de ajudar o aluno a aprender. Coordenar o ensino-aprendizagem requer dos mediadores uma visão real desses sujeitos. Assim sendo, • Coordenadores devem saber • : quem são os professores com os quais trabalham; como aprendem esses sujeitos que possuem um alto nível de escolaridade; Coordenadores e professores devem saber : quem são os alunos com os quais irão trabalhar; como aprendem os sujeitos com baixo nível de escolaridade. 136 Podemos inferir, a partir do que nos dizem os sujeitos, que o coordenador pedagógico é responsável pela condução da atividade do professor e co- responsável pela aprendizagem do aluno. Assim sendo, a relação supervisão-professor, em termos de processo de interação, é muito similar a professor-aluno. Assim como o aluno – e não o professor –, naquele momento da aula, é o foco das atenções em termos de construção do conhecimento, quem vai ter a prática pedagógica em sala é o professor, e não o supervisor. Seu papel é, pois, mediador (VASCONCELLOS, 2002, p.88). Os atores da pesquisa ressaltam que o processo de pensar quem são esses professores passa pelo trabalho afetivo e efetivo junto ao professor e ao aluno, de modo que se possa estabelecer uma relação mais próxima. Para isto, o coordenador pedagógico deve ter um embasamento teórico-metodológico consistente sobre a ação didático-pedagógica; ter uma sabedoria, uma sensibilidade para ‘ler’ o seu contexto. Mas, adverte-nos Oliveira (1999, p.60) que ‘ainda’ nos falta “uma boa psicologia do adulto” para podermos ter elementos para essa leitura. A andragogia, ressaltada no capítulo anterior, tem como proposta apontar alguns caminhos, mas ainda é pouco difundida, destacando-se que os sujeitos da pesquisa não fizeram menção à Andragogia, em nenhum momento de suas falas. A literatura disponível nos aponta alguns caminhos; dentre eles, a informação de que o “processo de aprender pressupõe uma mobilização cognitiva desencadeada por um interesse, por uma necessidade de saber” (SOLÉ, 1999, p.31). Os sujeitos estão cientes de que, também nesta ação, é necessário ‘saber como é preciso ensinar’, de modo que os alunos e professores aprendam. Saber que cada pessoa aprende de forma diferente, eu acho que o processo é esse: ter o conhecimento da psicologia da aprendizagem, saber que essas pessoas aprendem diferente, e que todo mundo é capaz de aprender, desde que sejam encorajados, desde que sejam solicitados (Ana Maria). 137 A fala de Ana Maria que nos aponta a necessidade de acreditarmos que todos têm capacidade de aprender e que podem aprender está em consonância com o que nos diz Solé (1999, p.51), quando nos fala: “a percepção de que se pode aprender atua como um requisito imprescindível para atribuir sentido a uma tarefa de aprendizagem”. E se todos têm capacidade de aprender, temos que buscar alternativas teóricas, metodológicas para que todos aprendam, como ressalta Ana Júlia: “Como eu acredito que o professor deveria buscar alternativas de mediação da aprendizagem, das pessoas, dos alunos, eu acho que a gente deveria saber mais sobre”. Nesse sentido, temos que pensar como é preciso ensinar para que o outro aprenda. Ana Júlia ressalta que é necessário saber chegar até aos sujeitos da aprendizagem e que esse conhecimento é imprescindível ao professor e ao coordenador. Para professores e coordenadores, essa é uma tarefa muito difícil. O ensino que propicia/possibilita a produção de mudanças conceituais acontece como um processo, onde o professor deve partir do interesse do aluno e este tem um papel ativo na própria aprendizagem. Uma das premissas dessa concepção, ainda segundo Gómez (1998, p.69), é “[...] que o docente deve conhecer o estado atual de desenvolvimento do aluno” frente àquele conhecimento. Zabala (1998) destaca que tudo que fazemos quando estamos ensinando “repercute em menor ou maior grau na formação de nossos alunos” (ZABALA, 1998, p.29). Para ele, no processo de ensinar, nossas atitudes inferem nesse processo desde a maneira de organizar as aulas, nos recursos que usamos até as expectativas que depositamos. Entendemos os sujeitos que aprendem dentro de marcos sociais (FERREIRO, 1995); na relação com o outro da cultura, os sujeitos vão se apropriando de valores culturais, aprendendo significados, ressignificando o que é social, para então tornar seu. Passando do social para o individual. Nesse sentido, na prática pedagógica o papel do outro cultural é exercido pelo professor e pelo coordenador que faz a intermediação entre o objeto de conhecimento e o sujeito da aprendizagem. Na prática pedagógica, essa mediação acontece mediada por elementos simbólicos: a linguagem. 138 A linguagem verbal possibilita as intermediações entre sujeitos, cria as condições para passarmos adiante o arcabouço de saberes acumulados pela sociedade para as próximas gerações. Para Vygotsky, o papel do professor é de “extrema relevância já que ele é o elemento mediador e possibilitador das interações entre os alunos e entre estes e o objeto de conhecimento” (MOURA, 2004, p.168). Nesse sentido, atribuímos essa mesma relevância ao trabalho do coordenador. Na sociedade contemporânea, a escola tem um papel de mediadora dos conteúdos estruturados pela sociedade, ao longo da história da humanidade. Na escola, existe a atividade intencional de intermediação dos conhecimentos ainda não mobilizados nos sujeitos, como também, uma intermediação na sua zona de desenvolvimento proximal que Vygotsky (2007, p.97) explica como sendo [...] a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes. A abordagem de zona de desenvolvimento proximal poderá possibilitar ao professor uma melhor compreensão do desenvolvimento e da aprendizagem do aluno, ensejando mediações mais efetivas a partir do desenvolvimento de funções psicológicas que estão em processo de amadurecimento. No âmbito da alfabetização, é pertinente a realização de um diagnóstico sobre os níveis de conceptualização da escrita, para que o professor conheça os níveis de escrita já construídos e aquele(s) que se encontra(m) em processo de desenvolvimento, sobre o(s) qual(is) a mediação docente deverá ser mais incisiva. Com relação à prática pedagógica a ser desenvolvida no processo de alfabetização de jovens e adultos, esta precisa ser pensada/documentada/- planejada, de modo a incluir tanto os objetivos que se pretende alcançar, como os conteúdos, procedimentos de ensino e avaliação dessa prática, pois, 139 enquanto espaço de ensino é fundamental que se tenha um maior planejamento quanto às situações provocadoras de tais reflexões. Assim, deve-se ter em mente o que compõe o saber e quais objetivos didáticos devem orientar as interações de mediação da construção desse saber (LEAL, 2004, p.89). Nesse processo de ensinar/aprender, é importante que o professor faça suas opções em relação à forma como desenvolverá sua prática: através da Pedagogia de projetos ou de temas geradores? Necessário também se faz a construção de uma rotina de trabalho que privilegie o processo de alfabetização em todos os momentos, destacando-se que a rotina deve ser elaborada com base no conhecimento do grupo de alunos com que vai trabalhar e sob o apoio e orientação da coordenação pedagógica. A partir do planejamento, rotina organizada e tema gerador e/ou projeto de trabalho, o professor deverá organizar a prática pedagógica de alfabetização, cuidando para que as atividades que a constituem sejam significativas. Nesse sentido, as práticas sociais de leitura/escrita nos oferecem uma variedade de textos: panfletos, anúncios, revistas, jornais, boletos, músicas... Desse modo, através desses mediadores – vamos ler na escola o que se lê também fora da escola, vamos escrever na escola também o que se escreve fora da escola, vamos usar na escola também a letra que se usa fora da escola. A escola deve ser um espaço em que aprendemos para viver exclusivamente nele ou é um espaço que aprendemos para viver também fora dele? Para Geraldi (1996), quando temos como eixo do trabalho do ensino da língua o trabalho com o texto estamos atentos à importância do uso da língua; estamos, diz ele, pensando o ensino como lugar de práticas de linguagem – como de fato o é – estamos, enfim, preocupados com o êxito de nossos alunos. É necessário que as atividades de alfabetização, tenham propósitos diversos, porque para se alfabetizar dentro de um contexto de letramento, os alunos precisam: • Trabalhar com a diversidade textual – toda tipologia textual que circula na sociedade. • Ter momentos para pensar “como se escreve?” ”Como se lê?”. E nesse exercício de refletir ‘como se lê’ e ‘como se escreve’ não podemos deixar de trabalhar as letras, os fonemas e as relações entre eles. Soares (2003b, p.13) 140 defende como partes importantes desse trabalho: “a consciência fonológica e fonêmica, identificação das relações fonema-grafema, habilidades de codificação e decodificação da língua escrita, conhecimento e reconhecimento dos processos de tradução da forma sonora da fala para a forma gráfica da escrita” são aspectos constitutivos da especificidade da alfabetização que não pode ser negada. • Saber antecipadamente o que vai perguntar para os alunos – pois são as questões – as grandes mobilizadoras da busca pelas respostas/conflitos que despertam a construção do conhecimento, por exemplo: para um aluno que escreve com base na hipótese pré-silábica perguntar, após sua leitura: por que sobram letras? Para um aluno com escrita silábica e que ainda não escreve com valor sonoro convencional, perguntar após a escrita da palavra fogueira, por exemplo, onde ele escreve sem nenhum valor sonoro, mas, apenas, colocando 03 letras aleatoriamente, perguntar: como é que se escreve FO? • Ouvir diariamente textos lidos pela professora pelo simples prazer de ouvir. • Ter momentos na rotina para reescrita/releitura de textos bem escritos. • Ter oportunidades de estabelecer relações entre o que trabalha na escola e sua própria vida, o que favorece o surgimento de atividades pedagógicas significativas. • Participar de Roda de leitura, visita à biblioteca, saraus. • Vivenciar rodas de conversa para que a linguagem oral também seja desenvolvida, uma vez que esta ajuda na organização do pensamento no momento de ler/escrever. Em todos esses momentos, o outro social – o professor ou o colega – será o mediador desse processo, fazendo boas perguntas que coloquem o aluno para pensar, que gere problemas a serem resolvidos e, quando necessário, responder/complementar essas perguntas/problemas. Weisz (BRASIL, 2001, p.1) discute que uma boa situação de aprendizagem está ancorada em quatro princípios básicos: 141 1. Os alunos precisam pôr em jogo tudo o que sabem e pensam sobre o conteúdo em torno do qual o professor organizou a tarefa. 2. Os alunos têm problemas a resolver e decisões a tomar em função do que se propõem a produzir. 3. O conteúdo trabalhado mantém as suas características de objeto sociocultural real – por isso, no caso da alfabetização, a proposta é o uso de textos e não de sílabas ou palavras soltas. 4. O professor deve pensar como organizar a turma: em grupos, em duplas, onde não existam grandes diferenças em relação ao processo de cada um, de modo que um não dê a resposta ao outro, mas discutir que decisões podem tomar coletivamente, quando o professor é o escriba de uma reescrita, por exemplo. A organização da tarefa garante a máxima circulação de informações possível entre os alunos – por isso, as situações propostas devem prever o intercâmbio, a interação entre eles. Como podemos perceber, uma prática pedagógica para uma alfabetização bem sucedida demanda muitos saberes e fazeres por parte de quem é responsável por essa prática, na escola. Nesse contexto, não é apenas o professor o responsável direto por esse processo; outros sujeitos do processo também compartilham essa responsabilidade, como o coordenador pedagógico da escola. Como é preciso coordenar a ação pedagógica para que o professor Construa seu conhecimento pedagógico? Piconez (2003) nos fala que um adulto é alguém que traz consigo uma gama de saberes e de experiências que aprendeu no percurso de sua vida, nos orientando que esses conhecimentos prévios “devem servir de ponto de partida e enriquecimento para a elaboração de situações de aprendizagem, tanto no que se refere ao conteúdo quanto às técnicas” (PICONEZ, 2003, p.4). Hoje, a pesquisa educacional avança nos ensinando que o sujeito aprende mais e melhor quando o conteúdo é atraente, quando ele estabelece relação com conhecimentos anteriores, quando o conteúdo apresenta uma situação problematizadora. Charlot (2005, p.54) também colabora com essa discussão, quando nos orienta: para que o sujeito construa conhecimento, é necessário que aja cognitivamente. “Mas, para que ele se mobilize, é preciso que a situação de aprendizagem tenha sentido para ele, que possa produzir prazer, responder a um desejo. A segunda condição é que esta mobilização intelectual induza a uma atividade intelectual eficaz. 142 Durante as pesquisas realizadas no mestrado (BEZERRA, 2005), bem como no doutorado, observamos que a formação na escola pesquisada38 parte sempre de questões/inquietações surgidas, ou seja, das necessidades de formação dos professores39 e que essa formação na escola tem sempre a coordenação pedagógica como mediadora. Trazemos, a seguir, o detalhamento de um desses encontros, onde a coordenadora atuava como mediadora. Data: 23/05/06 Tipo do encontro: reunião pedagógica Mediadores: Coordenação pedagógica e professores Temática: Relato das experiências pedagógicas desenvolvidas nesse período. Metodologia – as professoras irão relatar o projeto desenvolvido Diário de campo: A reunião começou com 30 minutos de atraso, e a chuva foi a causa do atraso do grupo. A reunião teve início com a leitura da pauta e da síntese da reunião passada. A coordenação está adotando como estratégia o registro e a leitura da síntese da reunião anterior. Percebemos que a coordenação se angustia para administrar o tempo e fazer as coisas acontecerem, pois às vezes o grupo se dispersa. Ana Beatriz e Ana Catarina iniciam o relato de como estão acontecendo as atividades na sala de aula. Ana Beatriz inicia dizendo que está muito angustiada com a freqüência irregular dos alunos. Ela acha que a chuva e a virose estão interferindo também. O grupo do I nível relata como está fazendo o trabalho de leitura e escrita com a música ‘guerreiro menino’: cantar, reescrever, interpretar. Elas falam das dificuldades. A coordenação questiona, escuta, medeia, sugere, reflete no momento do relato. Ana Catarina fala da inquietação dos alunos e pensa que vai iniciar um trabalho com jogos, com a intenção de trabalhar a concentração dos alunos. A coordenação sugere que o trabalho de leitura diária na sala seja feito pela professora também, pois contribui para reflexão, interpretação e, conseqüentemente, para a concentração. Ao final da reunião, o grupo decide dar continuidade a essa discussão. Finalizando a reunião, são sugeridos textos para estudo e discussão e a coordenação fica encarregada de selecionar e trazer a bibliografia para estudo. Vimos, nesse registro de observação, que o coordenador pedagógico medeia a formação, tendo como proposta metodológica a ‘reflexão/ação’. A partir do relato do professor, suas angústias são temáticas para reflexão e mobilizações para temáticas de estudo do grupo. 38 Partindo das necessidades de formação dos próprios professores, a formação na escola é importante para o seu desenvolvimento profissional, uma vez que parte de algo que tem sentido para o docente. A formação na escola proporciona ao professor esse voltar-se sobre sua ação, o pensar sobre sua ação, refletir sobre ela e sentir que a sua prática pode ser geradora de conhecimento e que, dentro dos seus limites/possibilidades, junto com os pares, ele pode (re)criar sua prática, ser um autodidata do seu métier. 39 Imbernón (2002, p.61) destaca que “o professor é capaz de gerar conhecimento pedagógico em sua prática”. Acreditamos que essa geração de conhecimento é um importante instrumento do desenvolvimento profissional do professor. 143 O desenvolvimento do jovem e do adulto e suas características são reconhecidos pelos sujeitos da pesquisa, como relevante para o trabalho com esse público que tem características específicas, destacando que o professor precisa estar atento na mediação do processo de ensinar/aprender. Os sujeitos pesquisados alertam que, quando os alunos da EJA/1º segmento “não aprendem, ficam quietinhos em seus lugares, só damos conta deles se ficarmos muito atentas e formos atrás” (Ana Júlia). Diferentemente do público do ensino fundamental que funciona durante o dia, “quem não aprende, não se aquieta de jeito nenhum, aí há uma procura maior, o tempo é maior, a gente tem mais tempo, o coordenador tem como chegar mais perto do professor, a coisa acontece diferente na mesma escola” (Ana Júlia). Um sentimento bastante presente nos alunos da EJA é o conformismo com o não-saber. Dentre outros motivos, esse sentimento é conseqüência dos repetidos fracassos/exclusões dos alunos na sua relação com a escola, o que tem repercussões muito fortes no desempenho dos alunos. Para os atores da pesquisa, o conformismo de não saber, a coisa da humildade em excesso, de achar que aquilo é um favor, que as pessoas são muito boas, porque dão aula, porque ensinam... Acho que eles precisam ser mais autônomos, precisam exigir mais da gente, eu acho que eles exigem muito pouco e que deviam exigir mais deles próprios. Acreditar mais no seu potencial e correr atrás, porque se deseja, se quer, tem que buscar, mas não se faz muito (Ana Júlia). Gadotti (2000, p.39), falando sobre esse público, destaca que eles, “Muitas vezes, têm vergonha de falar de si, de sua moradia, de sua experiência frustrada na infância, principalmente em relação à escola”. Ao falar em características específicas da EJA, os professores que estão nesse segmento, do mesmo modo que os alunos, também têm características específicas e as coordenadoras estão cientes disso. Entender a especificidade do público da EJA é uma preocupação que deve nortear o trabalho da coordenadora pedagógica. Na escola pesquisada, notamos que essa é uma preocupação; por exemplo, em um dos dias de estudo da coordenação junto aos professores, a temática estudada foi de um texto que tinha 144 como título ‘Jovens e adultos na escola: aprendizagens diferenciadas’ (PARREIRAS, 2002). A partir do estudo desse texto, foi empreendida uma grande discussão no grupo sobre a subjetividade e a aprendizagem no adulto. Constatamos que aquele grupo de professoras e coordenadoras tem um grande compromisso político-social com os que têm uma vida marcada pela exclusão. Ao refletir sobre a sua prática, o professor demonstra querer torná-la melhor, numa postura de respeito para com o aluno, respeito também pela profissão que escolheu. Para os atores da pesquisa, entender as Relações entre aprendizagem e desenvolvimento é uma preocupação constante no processo de ensinar/aprender a língua escrita a/por jovens e adultos. A forma como se constrói a leitura e a escrita, como esse pensamento se direciona, como é que ele caminha, que percursos ele passa nessa construção da leitura e da escrita, ele precisa saber o que quer com cada uma das propostas que ele vai fazer, ter muita clareza dos objetivos a que ele quer chegar, com cada atividade, com cada proposta de trabalho, e como sair e provocar os desequilíbrios pra que esses avanços aconteçam. O professor não pode ficar à parte, só observando o que acontece não, ele ta ao lado, ele ta propondo desequilíbrios assim, ver onde ele está, diagnosticar e, ao mesmo tempo, impulsionar. Então, assim, ele precisa conhecer o processo de construção da leitura e da escrita (Ana Júlia). Corroboramos com Ana Júlia que discute o quanto o professor precisa saber para fazer mediações significativas. Percebemos em sua fala, que ela tem ciência da importância da mediação, de modo que o aluno possa aprender, ao que Moura acrescenta: Só podemos entender os adultos e os conseqüentes processos de aprendizagem, se entendermos como se dá o desenvolvimento da sua inteligência, como eles se apropriam dos instrumentos produzidos historicamente pela cultura em que estão inseridos e os internalizaram ao longo de suas evoluções biológica e culturais, e que são responsáveis pela consolidação ou não de determinados comportamentos (2004, p.151). 145 Subjacente a esse saber, está uma teoria de aprendizagem que pode nortear o trabalho do coordenador pedagógico e do professor. Como Moura (2004, p.151- 152), entendemos que, em Vygotsky, encontramos as bases para acreditarmos na capacidade de aprender do jovem e do adulto; a perspectiva de cérebro como sistema aberto confere ao jovem e ao adulto, independentemente da idade, a possibilidade de aprender por toda a vida. Moura (2004) entende que, quando buscamos nos apoiar em Vygotsky, ampliamos o modo de compreender o processo de ensinar/aprender a ler/ escrever e compreendemos o papel que a prática pedagógica exerce e o quanto é essencial o professor/mediador no desenvolvimento dos alunos. Ainda com relação a Vygotsky, acrescenta a autora: A partir da sua teoria histórico-cultural, ele construiu a teoria da relação aprendizagem-desenvolvimento, comprovando que, através do processo ensino-aprendizado – que no caso em estudo refere-se à alfabetização - é possível aos adultos em qualquer idade, o desenvolvimento de formas de comportamento que levem os sujeitos a se modificarem e a modificarem a cultura em que estão inseridos (MOURA, 2004, p.152). Olhar as relações entre aprendizagem e desenvolvimento tendo como sustentação a concepção Vygotskyana nos conforta, pois vivemos em um país onde milhões de jovens e adultos não tiveram as oportunidades necessárias para aprender. Essa perspectiva nos enche de esperança e Paulo Freire coloca a esperança entre os saberes necessários à prática pedagógica (FREIRE, 1996, p.80). Para ele, sem esperança não existe busca porque a consciência de ‘estar sendo pode alimentar a vontade de ser mais’. Além disso, os atores da pesquisa nos apontam que, mediar conhecimento e aprendizagem, seja em crianças ou adultos, escolarizados ou não, além do conhecimento sobre esse processo, o professor/coordenador precisa ter muita sabedoria, uma vez que, nas mediações, esses profissionais precisam ter um olhar de acolhimento e afetividade. 146 3.1.1.2 Alfabetização do jovem e do adulto: Psicogênese da língua escrita A Escola pesquisada foi uma das primeiras escolas em Natal a ter como sustentação teórica do seu trabalho pedagógico a Psicogênese da língua escrita de Emília Ferreiro e colaboradores. A escola, como falamos no capítulo 1, em 1988/1989 tinha como temática freqüente de seus momentos de estudo do grupo os livros de Emília Ferreiro e colaboradores. Podemos afirmar, a partir da pesquisa empreendida, que até hoje o conhecimento da psicogênese da língua escrita é considerado – principalmente por professores e equipe pedagógica – como imprescindível ao trabalho de ensinar/aprender na alfabetização, visto que a escola trabalha, especificamente, na formação desta competência, tanto com crianças do 1º ao 3º ano do Ensino Fundamental, como no 1º e 2º nível da EJA. Conhecendo a psicogênese da língua escrita, sabendo como o alfabetizando está pensando a escrita, o professor tem a responsabilidade de desenvolver uma prática pedagógica que possibilite o seu avanço nesse processo; todos têm condições de avançar, a partir do seu lugar, desde que sejam dadas condições para tanto. Apreendemos, da fala dos atores da pesquisa, que muitos professores da Escola, só chegaram a construir esse conhecimento, nos estudos da escola e, hoje, consideram esse conhecimento imprescindível para seu trabalho, como ressalta Ana Beatriz: Antes da psicogênese, a gente pegava o aluno e não tinha essa preocupação em dizer em que nível ele estava, eu nunca tinha feito um relatório inicial do aluno, vê como é que esse aluno chegou, ter esse encaminhamento como é que ele chegou, como é que no meio do ano ele está e como é que ele termina o ano letivo. Então, reconhecer essa alfabetização do aluno, passo a passo, todo o caminhar dele durante o ano, na época que eu alfabetizava tentava repassar o conhecimento da alfabetização para o aluno, mas sem essa preocupação: ‘em que etapa ele está hoje?’. Quando chegamos aqui na escola, estudamos essas etapas de desenvolvimento do aluno, o nível em que ele se encontra, se ele está no nível silábico ou no alfabético. Foi aí que eu percebi que para desenvolver um trabalho na alfabetização, precisamos ter esse conhecimento: o aluno está no nível alfabético, no pré-silábico? Saber se esse aluno está no nível silábico, no nível pré-silábico, no nível alfabético, para daí o professor construir o planejamento, com uma proposta de atividades 147 adequadas para seu nível de desenvolvimento; de acordo com as necessidades que o aluno traz, o planejamento deve partir daí, é a primeira coisa que eu faço é aquela avaliação inicial, nessa avaliação inicial, eu procuro saber que conhecimento ele tem: se ele esta no nível pré-silábico etc., que atividades eu vou desenvolver para esse aluno que está nesse nível. Assim como os atores da pesquisa, Kaufman (apud FERREIRO, 1990, p.40) destaca a psicogênese da língua escrita e acrescenta: [...] o professor não pode trabalhar bem se não sabe quem é o seu interlocutor. Conhecer a psicogênese nos é útil justamente para saber quem é nosso interlocutor, não apenas para saber em que nível está, mas também para saber como pensa, como constrói seu conhecimento, que elementos entram em contradição, que tipo de problemas lhe são propostos pela escrita... [...] acho que a avaliação é indispensável para o professor, para que ele possa saber quem são seus interlocutores e como estabelecer um bom diálogo com eles. Apesar de a escola ter como foco do seu trabalho a alfabetização, as coordenadoras ressaltam que, nem sempre, os professores têm essa preocupação, embora esteja muito claro no Projeto Político Pedagógico da Escola o trabalho específico, visando a construção desse processo. Alguns professores, por já estarem com alunos no 2º nível, acham que o processo de alfabetização já deveria ter sido concluído no 1º nível. Na compreensão desses professores, no 2º nível, as preocupações deveriam ser mais focadas na ortografia; com isso, podem comprometer um processo de aquisição que apenas teve um início formal no 1º nível e que precisava de um investimento maior, para que esse aluno consiga uma autonomia intelectual em relação à leitura e à escrita. Apesar de muito esforço dos vários segmentos, em busca do sucesso escolar, alguns equívocos sérios da prática docente têm levado atores da pesquisa a se posicionarem como Ana Júlia, quando se refere ao trabalho de alfabetização desenvolvido pela escola: Falho, acho que todo mundo ali trabalha especialmente com a alfabetização, agora a gente não tem isso claro, acho que tanto o 1º 148 quanto o 2º nível deveria trabalhar com a alfabetização; a gente sugere, a gente tenta sugerir atividades, tenta trabalhar com um diferenciado, chamando pra grupos, trabalhar com grupos, fazer os pares produtivos, só que nem sempre a gente consegue [...] nos dois grupos a gente tem pessoas que não estão alfabetizadas (Ana Júlia). A proposta da escola pesquisada é muito sólida com relação aos princípios que regem o fazer pedagógico, mas a rotatividade de professores e a conseqüente existência de um quadro temporário de professores dificultam bastante o trabalho, pela necessidade de constantes paradas para estudo da proposta pedagógica, além do tempo – para apropriação do referencial pertinente – de que necessita o professor recém chegado. Discutir a concepção de aprendizagem da leitura e da escrita que dá sustentação à prática dos professores é uma das preocupações das coordenadoras pedagógicas. Em um dos momentos de estudo, em que a coordenação tinha como foco a concepção de aprendizagem, os professores estudaram o texto “Idéias, concepções e teorias que sustentam a prática de qualquer professor mesmo quando ele não tem consciência delas” (WEIZ; SANCHES, 2001). A discussão provocou nos professores muitas reflexões, uma das professoras explica: percebo que na minha prática tenho muito da prática que vivi como aluna, Ana Maria intervém questionando: qual era o modelo de escola que você viveu? A professora responde que de fato tive um modelo de escola bastante tradicional. Ana Maria complementa: hoje a teoria que temos nos faz perceber que precisamos oferecer aos alunos outro modelo de escola, mas para isso precisamos nos livrar de velhas concepções. A discussão teve continuidade com outros relatos e intervenções, bastante pertinentes. Na Proposta da Escola, está bastante claro que o processo de alfabetização será mediado pelo arcabouço teórico da teoria psicogenética da alfabetização de Ferreiro e Teberosky, como o fragmento a seguir explicita: “[...] quanto ao processo de alfabetização, a proposta está baseada nos estudos de Emília Ferreiro e Ana Teberosky sobre a psicogênese da leitura e da escrita” (ESCOLA MUNICIPAL PROFESSORA EMÍLIA RAMOS, 2005, p.10). A pesquisa apreendeu certa fragilidade no conhecimento das professoras sobre esse arcabouço teórico, inclusive com dificuldades na identificação e denominação de algumas escritas. As professoras conseguem detectar o nível de 149 conceptualização dos alunos, mas pelo que percebíamos nos momentos de planejamento, havia dificuldade de sistematizar uma prática pedagógica de intervenção de modo a atender aos diferentes níveis. Contudo, foi verificado que o grupo pesquisado tinha a preocupação de avançar nesse sentido e percebia que esses professores têm que ter uma formação específica pra gente investigar qual é a diferença dos níveis de desenvolvimento da escrita, por exemplo, aqueles pelos quais o adulto passa e os níveis pelos quais a criança passa. A gente diz que o adulto não passa pelo rabisco, pelo pré-silábico, mas a gente acha aqui e acolá (Ana Júlia). A coordenadora busca orientar os professores a fazerem a transposição didática da teoria de Ferreiro para a prática. Sobre essa orientação do coordenador pedagógico, nos fala Ana Catarina: Os níveis de escrita eu vim aprender lá na escola, até já tinha visto o assunto na disciplina processo de alfabetização na universidade. Mas, lá na escola, foi quando eu realmente vim colocar em prática. Meu aluno está no nível de escrita pré-silábico, silábico ou alfabético, então, que atividades farei para ele avançar? É como se eu fosse transportar uma teoria para uma prática e pensar em atividades que contemplassem todos os níveis – e foi o coordenador que me ajudou nesse sentido. A pesquisa registrou, em alguns momentos, as coordenadoras auxiliando as professoras a organizarem atividades de acordo com os níveis de conceptualização da escrita. Ana Maria falou sobre isso quando nos diz que, no momento do planejamento, indaga as professoras: “O que é que podemos propor como atividades? Um bingo, um trabalho com caça palavras, ou com letras móveis? Que portadores de textos? Ou vocês têm outras estratégias?” Essas preocupações devem estar acompanhadas da clareza sobre que atividades propor para um grupo de alunos da EJA. A equipe da EJA sempre teve a preocupação de construir uma proposta que atendesse especificamente a essa clientela, conforme explicitamos anteriormente e, nesse sentido, sempre esteve ‘antenada’ com a publicação de pesquisas sobre a 150 alfabetização de jovens e adultos. Inclusive, grupos de professores que trabalharam na escola, nos primórdios da década de 1990, já estudavam a pesquisa de Ferreiro (1983), realizada com adultos na cidade do México, pesquisa esta que é desconhecida por muitos professores, mesmo aqueles que adotam a psicogênese como referencial da sua prática de alfabetização. Sobre o referido trabalho, salienta Moura (2004, p.88): Particularmente no que se refere à alfabetização de adultos, todos os educadores e pesquisadores compartilham da afirmação da própria Ferreiro de que o seu trabalho de investigação com os trabalhadores em processo de alfabetização constitui-se num primeiro conjunto sistematizado de dados sobre as concepções dos adultos não alfabetizados acerca do sistema de escrita. Com essa observação, queremos destacar o pioneirismo da escola e dos seus professores, em relação à apropriação de conhecimentos que dão apoio à prática pedagógica. Como já sublinhamos, em decorrência da rotatividade de professores, essas questões precisam ser continuamente retomadas com os que chegam e estes necessitam de tempo para assimilar os fundamentos teóricos que embasam o trabalho escolar. Sensível a essa questão, Ana Maria afirma que muitos professores demoram a entender questões essenciais do processo de alfabetização. Como a escola atende a crianças, jovens e adultos em processo de alfabetização, existe a preocupação para construir um atendimento próprio para o alfabetizando, momento do seu processo de desenvolvimento e de alfabetização, inclusive, as professoras se preocupam em fazer a distinção em relação ao processo de aquisição: o que é comum à criança e ao adulto, em relação ao processo de desenvolvimento da leitura e da escrita? O que é diferente? A pesquisa citada acima desenvolvida por Ferreiro e equipe nos aponta que: • Os adultos, como as crianças apresentam o critério de quantidade mínima e de variedade interna das letras; • Como as crianças, os adultos manifestam similar distinção entre “o que está escrito” e “o que se pode ler”; 151 • Suas escritas passam pelos níveis: pré-silábico, silábico, silábico-alfabético e alfabético; • Os adultos, em geral, apresentam resistência a escrever, a partir dos conhecimentos que possuem do sistema de escrita. Desse modo, o coordenador pedagógico precisa ter esse conhecimento e mediar a construção desse conhecimento nos professores. Todavia, Ana Maria nos fala das dificuldades que encontra para fazer com que o professor compreenda a necessidade desse conhecimento e, de posse dele, construa sua prática. Nessa prática, a coordenadora acha que é necessário: Ter atividades diferenciadas, trabalhar com agrupamentos, ter momentos com trabalho de grupos, ter momentos de trabalho coletivo, ter momentos de trabalho individualizado, ter um olhar mais direcionado para determinado aluno... eu percebo que isso é difícil para o professor sistematizar, internalizar, de tal forma que essa prática fizesse parte do dia a dia. O que existe muito é atividade padronizada, como se a turma fosse nivelada, uma atividade igual para todo mundo, acho que pode existir na sala de aula, uma atividade igual para todo mundo, pode existir uma atividade para grupos, de acordo com o ritmo deles; pode existir uma atividade individualizada para você ter um olhar mais direto, um foco mais direto sobre a necessidade deles o que é que ele ta precisando, um atendimento mais individualizado é isso que propomos (Ana Maria). Presenciamos muitos momentos de estudo e/ou planejamento, onde as coordenadoras introduziam essas discussões, de modo a fazer fluírem as dificuldades dos professores, criando condições de aproximações ‘coordenadora- professoras’, cada vez mais freqüentes. Ana Maria explicita que uma de suas grandes preocupações é fazer com que os alunos que “permanecem na escola, permaneçam aprendendo e tornando-se cada vez mais competentes na leitura, na produção da escrita”. Por vários momentos da observação, vimos as coordenadoras ressaltando a importância de um trabalho de intervenção em relação à alfabetização, tendo por base os níveis de conceptualização. Para isto, subsidiavam as professoras com sugestões de atividades, a fim de atender as especificidades de cada nível de escrita e elas 152 ressaltavam: “É necessário saber identificar as dificuldades de leitura e escrita mais prementes, mais importantes, mais significativas pra eles” (Ana Júlia). 3.1.1.3 Ciclo da ação didático-pedagógica O ciclo da ação didático-pedagógica é o cerne da operacionalização da função da escola mais especificamente, através de todos os seus segmentos, especialmente, coordenadores, professores e alunos. A coordenação pedagógica da Escola Emília Ramos, desde o início da escola, foi a grande mobilizadora desse processo e teve um relevante papel, pois já se acreditava que a mediação do ciclo da ação didático-pedagógica tinha como princípio o modelo de escola que queriam construir. Até hoje, isso é muito forte na escola, como ressalta Ana Maria: “O trabalho do coordenador e do professor deve ser norteado pelo projeto da escola; com as diretrizes da escola, esse processo de articulação deve ser prioritário no nosso trabalho de coordenação”, destacando-se que suas palavras não são diferentes das palavras de Vasconcellos (2002, p.87). Assim, vejamos: Poderíamos dizer que a coordenação pedagógica é a articuladora do Projeto Político-pedagógico da instituição no campo pedagógico, organizando a reflexão, a participação e os meios para a concretização do mesmo, de tal forma que a escola possa cumprir sua tarefa de propiciar que todos os alunos aprendam e se desenvolvam como seres humanos plenos, partindo do pressuposto de que todos têm direito e são capazes de aprender (VASCONCELLOS, 2002, p.87). O coordenador pedagógico tem a função de construir no coletivo e acompanhar o trabalho pedagógico a ser realizado, desde a concepção do projeto político pedagógico como da elaboração da proposta curricular, dos projetos de ensino e dos planos de ensino, até a reflexão sobre a ação desenvolvida junto aos alunos enfim, sua função é acompanhar o ciclo da ação didático-pedagógica. Desse modo, “sua atribuição prioritária é prestar assistência pedagógico-didática aos 153 professores [...] no que diz respeito ao trabalho interativo com os alunos” (LIBÂNEO, 2004, p.129-130). A Escola Emília Ramos tem um projeto, uma direção, um norte antes mesmo de sua existência física. A escola pesquisada é pioneira também na elaboração do Projeto Político Pedagógico. Historiamos, anteriormente, o processo de construção da escola, quando destacamos que, desde o início, esse projeto era discutido com o grupo que iria compor a escola – ‘que escola queriam construir’. Então, antes mesmo de ser obrigatória40 Logo abaixo, podemos visualizar as Diretrizes da Proposta Pedagógica da Escola, que datam de 1988 – ano de inauguração da Escola: a construção do Projeto Político Pedagógico – PPP – pelos estabelecimentos de ensino, a Escola Emília Ramos já havia construído o seu PPP. Ético-políticos: a escola, para as classes populares, deve ter caráter pedagógico e não meramente assistencialista e deve assegurar amplo atendimento à demanda. A escola deve ser desenvolvida num ambiente adequado fisicamente, de modo a possibilitar um atendimento não só de quantidade, mas de qualidade. Epistemológicos: o professor deve ser um orientador do aprendizado da criança, encarando o aluno como sujeito do processo de ensino e não como seu objeto. A escola deve estimular a participação, a autonomia e a independência da criança para que se concretize o respeito mútuo, a consciência da disciplina através das ações e o desenvolvimento da inteligência criativa. Didáticos e psico-pedagógicos: As atividades propostas devem ser as mais ricas e variadas possíveis, englobando não só atividades de leitura e escrita, mas brincadeiras, jogos, dramatizações, passeios, festas, entre outras. A escola deve ser entendida como um ambiente alfabetizador e facilitador da escolarização efetiva das crianças das camadas populares. O respeito deve se constituir na premissa maior do trabalho, levando em conta seus conhecimentos, interesses e ritmos de aprendizagem. A escola deve confiar na possibilidade de desenvolvimento e aprendizado de cada criança, promovendo sua auto-estima e confiança em suas potencialidades. Nas palavras de Veiga (2001), é nesse instrumental da escola que devem estar claras as finalidades desta, os caminhos a que se propõe seguir, e como a 40 Lei 9.394/96; artigo 12; inciso I. 154 comunidade escolar deve agir na implementação de suas propostas. Antes, porém, os seus envolvidos precisam refletir sobre o tipo de homem, de escola e de sociedade que desejam construir, com base numa concepção de educação. A Escola, como um espaço de práticas educativas intencionais, sistemáticas, planejadas para curto e longo prazo, exige que sua comunidade, coletivamente, construa o seu Projeto Político-Pedagógico, organizando seu ciclo da ação didático-pedagógica em torno da educação dos alunos. A elaboração de um projeto é uma atividade tipicamente humana, pois exige pensar adiante, fazer projeções e tomar decisões. Para a construção de um Projeto Político-Pedagógico, urge que a comunidade escolar tenha clara a sua visão de mundo, de sociedade e de homem, e defina intenções, prioridades e caminhos para realização da função social da escola. Assim sendo, explicita Gadotti (1998, p.16): Não se constrói um projeto sem uma direção política, um norte, um rumo. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é também político. O projeto pedagógico da escola é assim, sempre um processo inconcluso, uma etapa em direção a uma finalidade que permanece como horizonte da escola. A escola pesquisada também tem um Conselho Escolar bastante atuante, no sentido da gestão da escola e esse Conselho se configura como lugar de participação e decisão41. O Conselho da escola também atua como elemento de sustentação do PPP: ali, são decididos os rumos da escola, partindo do interesse da comunidade escolar42 41 Por diversos momentos da pesquisa, verificamos muitas questões serem levadas ao Conselho da Escola, para tomada de decisão como, por exemplo: a divulgação do nome da escola nesta pesquisa foi autorizada pelos conselheiros. . As reuniões para revisão do PPP acontecem anualmente. Ali, os problemas são analisados, são construídos planos de superação das dificuldades e todos são convidados a implementarem as decisões, destacando-se que, sempre 42 Uma ressalva bastante pertinente é que, como membro da escola e como pesquisadora, ressaltamos que, em nenhum momento, a escola contratou alguém para elaboração/correção do seu PPP; todo ele foi construído pela própria equipe da escola. 155 no início do ano, o PPP é (re)apresentado ao grupo, especialmente aos recém- chegados. Ana Maria deixa claro que tem como diretriz do seu trabalho de mediação do ciclo da ação didático-pedagógica junto ao professor a Proposta da EJA; observemos o que ela nos diz: A primeira coisa que eu tenho que trabalhar junto ao professor é a proposta da EJA, que está pensada aqui na Escola, como é a caracterização desses alunos, que conteúdos foram discutidos, selecionados para se trabalhar, como é a metodologia, a avaliação. Após a apresentação da proposta, trabalhamos juntos com ele, durante todo o ano letivo, dando material, subsidiando para ele compreender e trabalhar bem (Ana Maria). Durante a pesquisa, registramos vários momentos de encontro dos professores da EJA, para estudo da Proposta da EJA da Escola, de modo a decidirem se eram necessários novos ajustes. Nas discussões sobre o modo como os alunos estão agrupados, uma coordenadora questiona: a forma como os alunos estão agrupados – adultos e adolescentes juntos – está dando certo? Uma das professoras diz que, em sua turma, eles não têm conseguido se entender, estabelecer interação. As coordenadoras ressaltam que essas dificuldades têm sido uma constante ao longo dos anos e que precisamos pensar em atividades que proporcionem mais interação, para que eles aprendam a viver juntos, a colaborar... Em relação às idéias que os coordenadores precisam ter para mediar as construções dos planos de ensino dos professores, os atores da pesquisa alegam que muitos professores querem desenvolver a prática com um fim em si mesma, sem uma reflexão crítica sobre essa prática. Vasconcellos (2002) alerta que, apesar do planejamento se colocar no plano da ação, do fazer, parte de concepções construídas anteriormente pelos sujeitos dessa ação: concepções sobre aprendizagem, desenvolvimento, currículo, alfabetização, aluno, professor, dentre outras. É importante que o coordenador esteja junto ao professor nos momentos do planejamento: quer seja relativo aos projetos de ensino, aos planos de aula etc. Nesses momentos, o professor vai definir, sistematizar os momentos de efetivação 156 da sua ação pedagógica junto aos alunos, enfim, como deve acontecer a transposição didática43 , o que vai conferir grande importância a tais momentos que são potencialmente ricos para a mediação do coordenador pedagógico e demais professores. Ana Beatriz ressalta a necessidade que tem da presença do coordenador no momento do planejamento. Vejamos o que ela nos fala: No momento de planejar, acho que o coordenador deve estar ali do lado, perguntando ao professor quais as necessidades dele, o que ele pretende trabalhar, ajudando, dando opinião, concordando, discordando, prestando todo aquele apoio ao professor para o planejamento. A função da coordenação é articular/acompanhar, enfim, compartilhar todo o ciclo da ação pedagógica a ser desenvolvido com o aluno. Como nos alerta Vasconcellos, não é interessante que o coordenador atue como fiscalizador; a equipe de coordenação precisa “funcionar como o coração, onde a riqueza não vem dele próprio, vem do sangue, do pulmão, do fígado; a equipe ‘anima’ e medeia o processo” (VASCONCELLOS, 2006, p.160). Os atores da pesquisa compreendem que o coordenador dentro do projeto da escola precisa também dominar os conhecimentos sobre currículo. Vejamos o que nos diz Ana Maria: O que é o currículo, os princípios dos conteúdos, compreender o que é o conteúdo, quais os princípios que norteiam os conteúdos; você começa a fazer aquele trabalho de interdisciplinaridade. É fundamental a gente compreender o que é um conteúdo, tentar montar, organizar um currículo que estabeleça relação entre os conteúdos trabalhados, que não sejam coisas fragmentadas, isso aí eu tenho muita dificuldade, esse trato das inter-relações. Ter a compreensão dos conceitos, dos princípios básicos de cada disciplina. O que é, realmente, o conteúdo, que situações de aprendizagem podemos propor a partir dos conteúdos, conceitos, princípios. É necessário compreender toda a parte conceitual das 43 A transposição didática é “a passagem do saber científico ao saber ensinado” (YVES CHEVALLARD apud NÓVOA, p.27). “A cadeia da transposição didática explica a passagem dos saberes a currículo formal (objetivos e programas), depois a currículo real (conteúdos de ensino) e, finalmente, a aprendizagens feitas pelos alunos (NÓVOA, 2004, p.27). 157 áreas de conhecimento, porque uma coisa é ligada com a outra (Ana Maria). Ana Maria demonstra essa preocupação em relação a construção do currículo e compreende que é necessário também ao coordenador compreender os conceitos das áreas de conhecimento. Na mediação do ciclo da ação pedagógica para a alfabetização, a coordenação pedagógica não pode perder de vista o enfoque interdisciplinar; como os estudos na área do currículo têm nos apontado, a interdisciplinaridade, como proposta, é o caminho para rompimento do ensino que tem como lógica a justaposição de conteúdos. É interessante que no momento do planejamento – de quaisquer atividades – os professores, mediados por seus coordenadores, percebam as inter-relações e interdependências dos conhecimentos e procurem trabalhar com os alunos, educando-os para a vida numa perspectiva interdisciplinar, uma vez que “A interdisciplinaridade é uma questão de atitude, atitude curiosa diante da diversidade da vida” (BORBA, 2001, p.125). Nesse sentido, Ana Catarina demonstra uma preocupação com o trabalho de alfabetização que também não deve perder de vista a necessidade das inter- relações entre as diversas áreas do conhecimento. Vejamos a sua reflexão sobre isso: As questões referentes à alfabetização, à metodologia, são pertinentes, mas a alfabetização não é só a parte da escrita e leitura. Os alunos precisam ter outros conhecimentos, relacionados às ciências, à história, à geografia; muitas vezes, esses conhecimentos ficam de outro lado. É importante ter esse conhecimento geral e, ao mesmo tempo, articular tudo isso para essa alfabetização (Ana Catarina). Além disso, é importante lembrar que o homem, como ser da práxis, vivendo em mundo cada vez mais complexo, urge ser formado dentro de um projeto de escola que tenha como objetivo o resgate desse homem uno, numa perspectiva de que “tudo está em tudo”, numa visão de totalidade. Freire (2006) nos alerta que a alfabetização de adultos deve proporcionar a esses educandos a problematização de sua realidade e conhecer cientificamente sua realidade. Entendemos que para conhecer uma realidade, precisamos ter várias 158 perspectivas de olhar. Em um dos momentos da observação, quando as professoras estavam juntas as coordenadoras para a construção de planos de aula, as coordenadoras iniciaram o encontro, fazendo alguns questionamentos: • Como os professores estão trabalhando? • Como estão os alunos? Naquele momento, as turmas de alfabetização da EJA estavam desenvolvendo o projeto “trabalho e cidadania”. As professoras relataram que aquele trabalho estava com boa aceitação pelos alunos e que todas as atividades planejadas, eram pensadas a partir desta temática. A coordenação registrou o depoimento das professoras, fez algumas intervenções em relação ao trabalho e se comprometeu a trazer materiais para enriquecer a pesquisa. Ainda nesse fragmento de observação, notamos a preocupação da coordenação com uma importante questão para a qual nos alerta Freire (2006): o conteúdo a ser trabalhado com o educando deve problematizar a realidade vivida por ele. Com o olhar voltado para essa questão, a coordenadora pedagógica orientava as professoras a fazerem um levantamento, no âmbito dos estudos do Projeto “trabalho e cidadania”, dos alunos que trabalhavam ou não com carteira assinada. Posteriormente, foi registrado que a maioria deles era submetida ao trabalho em atividades informais, sem carteira assinada. Quando a coordenadora questiona as professoras sobre como estão os alunos, notamos que existe uma preocupação, um cuidado com o processo de avaliação vinculado ao processo de aprendizagem; desse modo e naquela situação, a avaliação se apresentava com um papel pertinente no ciclo da ação didático- pedagógica. Durante todo o ano em que realizamos a observação, percebemos uma grande preocupação da coordenação em sempre explicitar a avaliação como coadjuvante do ciclo da ação didático-pedagógica. Observamos também um grande cuidado em ressaltar a importância da avaliação inicial, processual e final. Ana Maria ressalta que a avaliação não deve se dá apenas com relação ao aluno, mas a auto-avaliação da equipe pedagógica também deve ocorrer. Ela nos 159 fala a seguir, sobre esse processo de avaliação e da dificuldade que temos de nos avaliar e de sermos avaliados pelo outro: Numa discussão sobre avaliação, avaliar o aluno, você se auto- avaliar... temos que fazer um esforço para não ver a avaliação num sentido de cobrança, eu também estou me avaliando, a gente tem muita dificuldade de se auto-avaliar. Nós podemos e devemos fazer também a nossa sua auto-avaliação, mas quando o outro vai fazer sua avaliação, você se sente ofendido. Na nossa formação, a gente não foi preparada para isso (Ana Maria) Nesse sentido, Luckesi (1998) aponta a perspectiva amorosa da avaliação, onde acolhemos a situação, seja alegre ou triste, como ela é, sem punir. Esse ato amoroso de acolhimento dará as condições de achar a saída e não de se fecharem todas as portas para as possibilidades. Mediar o ciclo da ação didático-pedagógica na alfabetização, numa perspectiva de amorosidade, é um saber por demais relevante no trabalho da coordenação pedagógica que, nessa ação, mobiliza muitas competências. Como ressalta Libâneo (2004), é importante que a coordenação esteja atenta ao cumprimento da construção coletiva – tanto a do Projeto Político Pedagógico quanto da Proposta Curricular. Em várias reuniões em que estávamos presente, existia a preocupação em avaliar o trabalho, percebendo as dificuldades e construindo as possibilidades. Em todos esses momentos, era as coordenadoras que dirigiam as discussões. Podemos dizer que o ciclo da ação didático pedagógica é o eixo da tarefa designada à escola porque é através do ‘planejar, executar, avaliar’ que o Projeto Político Pedagógico e o Projeto Curricular são colocados em ação. Além da tarefa de garantir a operacionalização desses projetos, a coordenação precisa garantir a reflexão sobre a ação desenvolvida porque “[...] não há práxis autêntica fora da unidade dialética ação-reflexão, prática-teoria. Da mesma forma, não há contexto teórico verdadeiro a não ser em unidade dialética com o contexto concreto” (FREIRE, 2006, p.158). A escola pesquisada tem 20 anos de construção do seu PPP; isto posto, dizemos que a (re)construção do PPP não é uma tarefa fácil e demanda tempo para 160 que os membros da escola tenham maturidade e percebam a importância desse projeto. A viabilidade para construção da escola pública com qualidade social para todos que a procuram passa pela construção de um projeto político pedagógico, embora os educadores e educadoras ainda se sintam frágeis no momento de empreender essa construção. A Escola Emília Ramos já tem um longo tempo desse processo de construção e a pesquisa ainda apreendeu muita fragilidade, embora a escola se diferencie das outras, em muitos aspectos. Ao entrevistar uma das pessoas que fez parte da primeira equipe de coordenação da Escola, Bezerra (2005) registrou: O Emília é diferente por isso: porque teve um alicerce, ela teve uma preparação. [...] o vigia do noturno sabia exatamente qual era a proposta pedagógica da Escola, o do matutino também. [...] o nosso sonho era fazer uma escola e mostrar que, a escola para a classe popular daria certo; desde que as pessoas que lá estivessem acreditassem que ela daria certo (Depoimento de D-G)44 As coordenadoras e as professoras pesquisados reconhecem, como observamos e registramos, sua responsabilidade quanto à operacionalização do PPP da escola. Compreendem os sujeitos da pesquisa que a operacionalização do PPP acontece também, e sobretudo, no desenvolvimento do ciclo da ação didático- pedagógica e, sendo o coordenador o grande mobilizador do PPP, precisa acompanhar a caminhada da escola, rumo a sua efetivação. 3.1.2 Saberes Transversais da Ação Os Saberes Transversais da Ação do coordenador pedagógico se constituem em saberes que não Todavia, a compreensão e o exercício – na prática – desses saberes, pelo coordenador, são necessários, embora insuficientes para que ele possa criar um dizem respeito à mediação/orientação específica – junto aos professores – concernentes à alfabetização de jovens e adultos. 44 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados por Bezerra (2005, p.77-78). 161 “clima” favorável para sua atuação pedagógica com repercussões significativas no trabalho docente. Os Saberes Transversais da Ação do coordenador pedagógico são integrados por três subcategorias, a seguir apresentados e discutidos: 3.1.2.1 Respeitar e se fazer respeitar por professores e alunos O respeito mútuo proporciona um clima de harmonia no trabalho do coordenador pedagógico. As relações humanas na escola pesquisada se configuram como uma das principais ferramentas do sucesso do trabalho que lá é desenvolvido (CAMPELO, 2001). Apesar disso, Ana Maria acredita que ainda “precisamos estudar muito sobre as relações interpessoais; acho que essas relações interpessoais são fundamentais, porque acho que o lastro do trabalho do coordenador pedagógico é saber lidar com as pessoas”. Ana Maria tem mais de oito anos como coordenadora da Escola e Ana Júlia têm menos de dois anos. Percebemos uma relação de bastante respeito entre elas e entre elas e as professoras. Ana Maria diz que o trabalho do coordenador precisa ser de ‘conquista do professor’. Para ela, o coordenador precisa ter uma postura de compromisso e de responsabilidade para conquistar o respeito dos professores e dos alunos. E acrescenta: A responsabilidade do coordenador é muito grande porque eu tenho que demonstrar para o professor que temos a mesma responsabilidade, o mesmo compromisso tanto em termos de organização funcional de horários como complementação de faltas; tenho que ser uma referência de responsabilidade. Acho que o coordenador pedagógico tem que demonstrar a situação de respeito com a instituição, mostrar que você tem um trabalho, que você produz também junto com ele, que você é parceiro junto com ele, não está ali pra estar conversando besteira, mas na hora que está conversando com alguém, você está conversando em função do trabalho da escola. Eu acho que é necessário ter essas pessoas na retaguarda para ajudar no trabalho do professor (Ana Maria). 162 Vivenciamos, naquele grupo, um cuidado mútuo entre seus pares. Momentos de doença, quando o grupo se reunia para visitar um colega, momentos de morte, quando o grupo vai ao encontro do colega para acolhê-lo na sua perda e momentos de alegria, quando o grupo se reunia para festejar. Enfim, muitos foram os momentos que reputamos de respeito e solidariedade, haja vista que a solidariedade, para existir de fato, precisa sempre ser solidariedade a partir de baixo, dos últimos e dos que mais sofrem. A solidariedade se manifesta então como com-paixão. Com-paixão quer dizer ter a mesma paixão que o outro, alegrar-se com o outro, sofrer com o outro para que nunca se sinta só em seu sofrimento, construir juntos algo bom para todos (BOFF, 2003, p.12). Trazendo a fala de Boff (2003) para o processo de construção das relações na escola, notamos que este aponta a construção da solidariedade numa horizontalidade. Numa escola, para que haja o respeito entre os pares da atividade laboral é importante que cada um pondere seu comportamento, conheça, aplique e respeite as normas comuns a todo o grupo. A estratégia que a escola pesquisada utiliza para que haja o respeito às normas do grupo é o regimento escolar. Registramos, logo no início da pesquisa, quando foi demonstrada a preocupação de discutir e de revisitar o Regimento da Escola, onde estão expressas as normas de convivência. Em um dos encontros que aconteceu com todos os turnos, a direção apresentou o documento, já conhecido por muitos professores e, para os que chegavam à escola, era momento de conhecê-lo. Entre coordenadores e professores a relação de respeito precisa ser construída e nesse sentido, a confiança torna esse caminho mais fácil. Vejamos o que diz Ana Beatriz nesse sentido. Minha coordenadora me fez acreditar que era possível e que estava ali junto para me ajudar, porque o primeiro momento numa sala de aula da EJA é difícil. Acho que o primeiro dia na sala de aula é igual ao trabalho do ator. Eu digo muito para meus alunos: eu fico nervosa! O primeiro dia numa turma nova me dá aquele medo, aquela 163 ansiedade. Então, o coordenador me fez acreditar que ele iria caminhar junto comigo, que tava ali. Que ali estava um grupo e que as dificuldades surgidas iriam ser compartilhadas (Ana Beatriz). A beleza da relação de confiança que estabeleceu com a coordenação, que nos relata Ana Beatriz nos mostra o quanto é importante a figura do coordenador no compartilhamento da tarefa de ensinar junto ao professor, principalmente quando o professor está ingressando na profissão ou em um novo segmento de ensino. Cumpre também destacar que o homem é uma unidade, quando age, age como um todo e, nessa ação, cognição e afetividade também são envolvidas. Nesse sentido, o trabalho docente não se dá desvinculado do campo da afetividade; essa relação é inevitável, se quisermos tocar-lhe o coração. Assim sendo, “para que o trabalho seja efetivo, ou seja, que atinja seus objetivos, a relação afetiva necessariamente tem que ser estabelecida” (CODO; GAZZOTTI, 1999, p.50). São nessas relações de amorosidade que nasce o respeito. Os professores, de um modo geral, têm dificuldade de dizer que não sabem, que precisam de ajuda. Quando sentem que são respeitados têm mais facilidade de expressar suas dúvidas, pois sabem que serão acolhidas. Na escola, a figura do coordenador aparece como a pessoa junto a quem o professor vai buscar essa ajuda; mas isso só acontecerá se os professores tiverem confiança no coordenador. Ana Júlia nos diz que, para isso, o coordenador precisa: Ter sensibilidade de acolher as angústias do professor, do aluno... eu acho que tem que ser, não seria um conhecimento não, mas seria de acolhedor [...]. É muito de partilha mesmo, então é saber ouvir, e saber mediar, fazer dessas queixas, dessas interrogações, pontos de partida sempre, precisa ter sabedoria pra ta encaminhando, ta sabendo levar o barco (Ana Júlia). Para Ana Maria, o coordenador pedagógico “precisa ser pessoa de confiança do grupo”. Percebemos que o grupo tem nela essa confiança, tanto nas questões profissionais, como nas questões pessoais. Às vezes, ouvimos alguns colegas dizerem que, quando chegamos ao trabalho, devemos deixar nossos problemas lá 164 fora. Impossível! Somos gente e gente não se separa das suas tristezas, das suas alegrias: vamos inteiro/inteira a toda parte. O coordenador pedagógico deve ter sabedoria para administrar as questões que surgem na vida dos professores, pois se eles têm nele a confiança para compartilhar suas angústias, ele precisa estar preparado para acolhê-las e, “muitas vezes, basta ser: colo que acolhe, braço que envolve, palavra que conforta, silêncio que respeita, alegria que contagia, lágrima que corre, olhar que acaricia, desejo que sacia, amor que promove” (CORA CORALINA, 2009). Concluímos que a vida na escola precisa ser construída numa base sólida de respeito e confiança entre os pares, com compromisso com o outro: o aluno, o professor, o funcionário. Entendemos que, agindo assim, estamos construindo uma escola alicerçada em princípios éticos, pois a ética nos “pergunta constantemente sobre como devemos agir, sobre as normas e o conjunto de valores, sem trazer prejuízo a nenhum ser humano e a nenhuma vida necessária para o bem-estar de toda a comunidade” (ALVORI, 1999, p.158). 3.1.2.2 Priorizar a dimensão pedagógica no cotidiano escolar Depois de um ano letivo, acompanhando cotidianamente o trabalho da coordenação pedagógica na Escola, podemos afirmar que essa atividade exige do profissional uma vigilância enorme para não descaracterizar a atividade teórico- prática do coordenador pedagógico, transformando-a em mero ativismo. Cotidianamente, víamos uma proposta que havia sido pensada para um dia de trabalho pedagógico, sendo desmontada por uma dinâmica ativista, composta por diversas tarefas – algumas previstas, outras imprevistas – mas que deviam ser cumpridas, em geral, pela coordenação pedagógica: era o professor que faltava e a coordenação tinha que decidir o que fazer; era o material de trabalho dos professores que a coordenação tinha que distribuir; era o pai, ou a mãe que chegava para uma conversa, enfim, sempre eram muitos os afazeres diários cobrados do coordenador que nos levava a refletir: Qual é mesmo a função do coordenador pedagógico na escola? 165 A professora Ana Beatriz e os demais atores da pesquisa têm clareza de que a função primeira do coordenador pedagógico é a de estar junto ao professor na construção da prática pedagógica. Todavia, a professora também percebe que o campo do fazer coisas, resolver coisas vai tomando o tempo do coordenador. Assim, ela nos fala: Em vez do coordenador está ali durante todo o tempo com o professor, ele tem outras atribuições, outras coisas para resolver, o que, às vezes, acaba atrapalhando. Na escola, na medida do possível, elas tentam priorizar o pedagógico, mas quando é um coordenador que não tem esse conhecimento, que não vê que a função maior dele seria essa, ele tende a se afastar do professor. Quando ele vai se empenhar na parte administrativa, ele deixa de lado o professor então, essa é uma das questões fundamentais que faz com que esse coordenador pedagógico se distancie do professor. Para mim, o objetivo principal do trabalho do coordenador seria o seu caminhar com o professor (Ana Beatriz). Encontramos um grupo de coordenadoras muito angustiado, haja vista que, cotidianamente, seu trabalho não consegue se desenvolver como o planejado, em decorrência de ‘coisas que acontecem’. Percebemos que falta, por parte desses sujeitos, mais firmeza em relação ao que, de fato, é mais importante fazer. No entanto, sentimos falta da colaboração de outros segmentos da comunidade escolar, até dos professores, no cumprimento do papel do coordenador pedagógico. Entendemos que era/é necessária uma divisão de tarefas, o que elas não conseguiam notar como o que observamos a seguir: Data: 23/05/06 Tipo do encontro: reunião pedagógica Mediadores: Coordenação pedagógica e professores Temática: Planejamento Diário de campo: Os professores estão reunidos para planejar, quando as coordenadoras comunicam que precisarão sair para atender a um aluno. Ao comunicar que precisarão sair, perguntam se as professoras iriam precisar delas; as professoras disseram que naquele momento não. Elas, então, vão atender ao aluno, deixando as professoras sozinhas planejando. Quando elas voltaram do atendimento ao aluno, perguntaram apenas do que os professores iriam precisar. 166 Para as coordenadoras, é importante fazer tudo juntas. Compreendemos que é igualmente importante o atendimento ao aluno, mas a direção da escola podia fazer esse atendimento, liberando o coordenador para a sessão de planejamento junto aos professores. Com essa atitude, perde o planejamento, porque as coordenadoras não intervêm de maneira mais efetiva. Almeida (2005), que desenvolveu uma pesquisa com dez coordenadores pedagógicos na Cidade de São Paulo, analisando um dia de trabalho desses profissionais e refletindo sobre as decisões que precisam tomar, quando são solicitados em várias frentes ao mesmo tempo, conclui: Tomar decisões diante de tantas solicitações, tantas emergências, tantos conflitos que representam o cotidiano escolar não é fácil. Usando de uma metáfora, como fizeram os depoentes, o coordenador está sempre diante de um labirinto de escolhas. É preciso ter sagacidade para definir alguns pontos e atacá-los com os recursos adequados, levando em conta a situação concreta da escola, inserida num sistema escolar mais amplo, e os seus próprios limites, profissionais e pessoais (ALMEIDA, 2005, p.45). Assim como nos aponta Almeida (2005), em sua pesquisa sobre o cotidiano dos coordenadores, observações da nossa pesquisa compartilham com essas mesmas situações do que abstraímos que esse profissional tem uma identidade ainda frágil na escola – defendemos que já é momento de definir a territorialidade desse profissional. Assim, como os professores sabem exatamente sua função principal, o coordenador também precisa saber a sua – e a escola precisa respeitar o cumprimento dessa função. Esse não-saber, pensamos, está relacionado originalmente a história do processo de formação que não lhe proporcionou o devido esclarecimento acerca do seu lugar na escola. Ana Maria tem uma preocupação enorme com sua responsabilidade e se esforça bastante para fazer um trabalho com qualidade social; contudo, a pesquisa apreendeu que ela ainda tem dificuldade em adotar uma postura mais firme quanto a sua verdadeira função na escola. Compreendemos que a alfabetização de jovens e adultos precisa de um trabalho bastante articulado e sistematizado do ponto de vista da didática, 167 referencial subjacente à prática do professor alfabetizador. Sentimos, porém, que a ausência das coordenadoras nos momentos do planejamento das professoras pode comprometer o que a escola se propõe a realizar, no seu PPP. Em alguns momentos, observamos professoras do quadro temporário da escola elaborando atividades que não estavam de acordo com a Proposta Pedagógica, do ponto de vista do ensino da língua escrita – por exemplo, atividades com “famílias silábicas”, de cunho mecanicista de alfabetização, evidenciando que aquela professora precisava de um apoio maior da coordenação pedagógica e/ou do grupo. Ana Júlia argumenta que deixa de fazer um atendimento mais sistemático aos professores porque se envolve em outras atividades, como entregar fardas, material, pensar em eventos; “é fazer, fazer e fazer” segundo ela. Para que possamos visualizar essa situação, trazemos a seguir um registro de um dos momentos observados, onde as coordenadoras deixa de atender as professoras para ‘fazer coisas’. Data: 09/05/06 Tipo do encontro: reunião pedagógica Mediadores: Coordenação pedagógica e professores Temática: Planejamento Diário de campo: A coordenadora não está junto do grupo porque está fazendo atendimento aos alunos. As professoras, com muita autonomia, discutem as atividades que estão desenvolvendo na sala e planejam coletivamente a semana. A coordenadora arranja um tempo e chega junto das professoras e as mesmas relatam como estão pensando em realizar um trabalho sistemático de leitura e escrita. A coordenadora lembra que, apesar das professoras estarem pensando nesse trabalho, tenham cuidado para não trabalhar a palavra pela palavra, mas dentro de um campo semântico. Logo, a coordenadora é chamada novamente, e as professoras ficam sozinhas. Ao final, a coordenadora retorna ao grupo, as professoras mostram um “rapy” feito pelos alunos e o grupo discute como fazer a culminância do projeto trabalhado. Esse fragmento da observação ora apresentado, reforça o que dissemos anteriormente, ou seja, as coordenadoras têm dificuldades de ‘conciliar as esferas administrativa e pedagógica do cotidiano escolar, priorizando a pedagógica’; a partir de tudo que vimos e ouvimos, podemos inferir que, na maioria das vezes, a esfera administrativa, e não a pedagógica, foi priorizada, o que pode ter repercussões bastante negativas na qualidade que se almeja para o trabalho do professor. 168 Porém, nos momentos em que a coordenação conseguia priorizar o trabalho pedagógico, percebíamos o quanto era significativo para todos. Um desses momentos foi quando as professoras organizavam um projeto – feira livre. As coordenadoras Ana Maria e Ana Júlia colaboravam, sugerindo atividades que podiam ser desenvolvidas a partir da temática, focalizando a alfabetização. Num outro dia de planejamento, as coordenadoras perguntavam como as professoras estavam atendendo aos alunos com escrita pré-silábica. As professoras relatam o que têm feito e a coordenadora sugere algumas atividades e se encarrega de trazer outras sugestões. Queremos salientar que, apesar de todas as limitações impostas por uma série de fatores, inclusive as condições de funcionamento da escola, as coordenadoras conseguem desenvolver um bom trabalho. Ao final do ano de 2006, período de realização desta pesquisa, elas elaboraram um Relatório45 Ressaltamos que constatamos nos documentos oficiais, citados neste trabalho, nos discursos dos pesquisadores que trouxemos para discussão e em algumas instituições privadas, um espaço muito aberto em relação à atuação do coordenador, quanto à definição de papéis e modos de atuação. , contendo todas as atividades desenvolvidas durante aquele ano e, como estivemos na escola, durante todo aquele período, vimos que, de fato, tudo foi realizado. 3.1.2.3 Mediar a ação docente nas diversas etapas: planejamento; execução; avaliação Como já ressaltamos, o cuidado do coordenador não deve ser, apenas, em planejar, mas também em acompanhar se o planejado está sendo executado. Assim, importa também saber: que aprendizagem os alunos alcançaram e se essa aprendizagem contempla os objetivos propostos. No dizer de Madalena Freire (1997), planejar é sonhar, é idealizar o que se pretende alcançar. Primeiro, ele existe no mundo irreal, no campo das idéias para, depois, chegar ao mundo real. 45 Ver Anexo B. 169 O planejamento parte sempre do que queremos que nosso aluno saiba o que é importante que ele saiba. Mas, para começar um planejamento partimos de uma avaliação: o que sabem nossos alunos? O que querem aprender? Madalena Freire (1997, p.56) aponta os momentos do planejamento: • Avaliação. • Levantamento do processo das hipóteses do planejamento, especificando objetivos gerais e específicos das atividades, envolvendo: materiais, tempo e espaço. • Acompanhamento do desenvolvimento da ação planejada: conferindo sua adequação ou não, suas possíveis mudanças etc. • Avaliação reflexiva do produto conquistado. • Replanejamento. Considerando o exposto, qual o papel do coordenador e do professor nesse processo? Eles têm a mesma função? Madalena Freire (1997) destaca que o cuidado do professor com seus alunos deve ser o mesmo do coordenador com seus professores. Diríamos que, se o coordenador deseja que o professor tenha cuidado no acompanhamento do seu aluno, em todas as etapas do planejamento, precisa ser ele – o coordenador – deve ser o exemplo desse cuidado. Esse acompanhar, na perspectiva democrática, significa: interferir, questionar, problematizar, germinando a mudança. Acompanhar significa também buscar cotidianamente sintonia entre meus objetivos e minha ação. Sintonia entre teoria e prática (FREIRE, 1997, p.58). Mais uma vez, inferimos que é urgente repensar o papel do coordenador na escola. Os professores precisam ter nele esse apoio e encontrar nele uma referência. Os professores também destacam que os coordenadores precisam acompanhar todos os momentos do ciclo da ação pedagógica: o planejamento, a execução e a avaliação. 170 O coordenador precisa planejar junto com o professor porque é daí que vai sair o andamento de todas as aprendizagens dos alunos da EJA, principalmente da alfabetização. A partir do planejamento, os coordenadores vão ver a situação de todo o ensino-aprendizagem, depois o professor vai trazer esse retorno. Então, acho que o primordial é estar junto com o professor na hora do planejamento e acompanhá-lo pra ver se os alunos aprenderam. Estar sempre buscando, ta sempre procurando saber do professor como é que estão os alunos, o que foi feito durante a semana, o que o aluno atingiu naquele planejamento. Daquela proposta ali, o aluno conseguiu alguma coisa? Então, ta sempre procurando saber do professor como é que está o aluno, se os objetivos do planejamento daquela semana foram atingidos, quais os problemas que ocorreram; o coordenador deve estar sempre procurando ter essa ligação com a sala de aula: saber do professor e do aluno (Ana Beatriz). Apesar das dificuldades destacadas, os achados da pesquisa apontam para um trabalho do coordenador numa perspectiva colaborativa, onde professores e coordenadores movimentam suas práticas, num constante pensar/fazer e fazer/pensar sobre os “pensares” e “fazeres” – seus e dos outros, o que é bastante enriquecedor porque, segundo Garcia (1999): [...] O objetivo de qualquer estratégia que pretenda proporcionar a reflexão consiste em desenvolver nos professores competências metacognitivas que lhes permitam conhecer, analisar, avaliar, e questionar a sua própria prática docente (GARCIA, 1999, p.153). Além do planejamento e do acompanhamento, chega o momento final que também é momento de recomeço: a avaliação, onde deve haver preocupações – não só com o produto, mas também com o processo de construção de conhecimento. Como se deu o processo de aquisição? Que dificuldades tiveram que ser superadas? Qual o produto que atingimos? Ao mesmo tempo em que pensamos aonde chegamos, pensamos também no que poderia ter sido feito para ser melhor. Neste movimento, nasce o replanejamento. E “É nesta concepção que o planejamento é um processo ininterrupto, processual, organizador da conquista prazerosa dos nossos desejos onde o esforço, a perseverança, a disciplina, são armas de luta cotidiana para a mudança pedagógica” (FREIRE, 1997, p.58). 171 Pelo exposto, consideramos a subcategoria, ora analisada, como uma das mais relevantes no trabalho do coordenador pedagógico na escola. No âmbito desta subcategoria, ainda conseguimos apreender dez indicadores relativos à mediação da ação docente, pelo coordenador, o que apresentamos no Quadro 2 e discutiremos em seguida.  Organizar horários para atendimento pedagógico sistemático aos professores  Elaborar registros reflexivos sobre os diversos momentos de mediação junto a professores e alunos  Instituir o apoio direto ao trabalho docente na sala de aula  Buscar o conhecimento da ‘pessoa do professor’ e do ‘professor como pessoa’  Promover situações formativas, a partir da análise das necessidades na formação docente  Ensejar a socialização de experiências docentes bem sucedidas  Buscar o conhecimento do aluno real  Buscar alternativas, com o professor, para superação das dificuldades dos alunos  Acompanhar e avaliar a alfabetização dos alunos da EJA, orientando o docente na promoção de avanços dos alfabetizandos  Acompanhar e avaliar a prática pedagógica do professor, ensejando avanços teórico-metodológicos Quadro 2 Indicadores da Subcategoria 3.1.2.3 - ‘Mediar a ação docente nas suas diversas etapas: planejamento; execução; avaliação’ • Organizar horários para atendimento pedagógico sistemático aos professores Urge que a escola se organize e, conseqüentemente, o coordenador para o atendimento sistemático ao professor. Do mesmo modo que a presença do professor é indispensável para alavancar o processo ensino-aprendizagem na sala de aula, a presença do coordenador é imprescindível para promover a organização desse processo na perspectiva de uma construção coletiva. “Eu acho que o papel do 172 coordenador pedagógico é esse mesmo que está se criando, de planejar junto, de estar acompanhando o trabalho do professor” (Ana Júlia). É importante que o trabalho do coordenador se organize no sentido dele estruturar uma rotina de trabalho, estabelecendo um tempo para cada coisa, especialmente para o atendimento pedagógico sistemático aos professores. É importante que essa organização parta de um grande acordo na escola, para evitar que nos horários de atendimento ao professor, o coordenador seja requisitado para outros afazeres. Todos na escola devem entender que uma das principais funções sociais da escola é a aprendizagem dos alunos e que, no momento em que coordenadores e professores estão trabalhando juntos, estão cuidando desse processo, da concretização desse grande objetivo, que pode e deve ser buscado por todos os segmentos da comunidade escolar; e nada pode ser mais importante que isso. No PPP e na Proposta Pedagógica da EJA da Escola pesquisada, evidenciamos que esse atendimento é uma prioridade, como podemos ler no fragmento do texto do PPP da Escola que trazemos a seguir: Que sejam garantidas paradas semanais nos três turnos, de professores com o apoio pedagógico e direção, a fim de que se avaliem as atividades realizadas junto às crianças, jovens e adultos, troca de experiências, informes e sistematização de estudos teóricos, a partir das necessidades surgidas que requeiram um melhor aprofundamento (ESCOLA MUNICIPAL PROFESSORA EMÍLIA RAMOS, 1999, p.7). Apesar de essa ser uma exigência do PPP, expressa em documento, presenciamos, em muitos momentos, as coordenadoras serem solicitadas para outros afazeres como já evidenciado; assim, enquanto atendiam professores, se viam obrigadas a parar uma reflexão iniciada, o que é lamentável. Tiramos do diário de campo as anotações de um desses dias, para expor a seguir: 173 Data: 30/05/06 Tipo do encontro: reunião pedagógica Mediadores: Coordenação pedagógica e professores Temática: Planejamento Diário de campo: o grupo do I nível inicia o planejamento, enquanto isso a coordenação organiza o início do trabalho da noite: distribui material, coloca os alunos para a sala, atende solicitações dos alunos e professores. Às 19h30min, a coordenadora Ana Maria consegue sentar com as professoras. As professoras relatam algumas atividades feitas para a coordenação que escuta atentamente. As professoras estão pensando em fazer um trabalho diferente de leitura com os alunos que apresentam dificuldades e a coordenação dá sugestões de como organizar. As professoras estão preocupadas com a freqüência irregular dos alunos (freqüência de poucos alunos por turma). A coordenadora Ana Júlia interrompe o trabalho para distribuir camisas da farda a alguns alunos que procuram, enquanto Ana Maria precisa sair para passar nas salas, convocando os alunos para realizarem a eleição de representantes de turma para o conselho. Enquanto isso, as professoras ficam realizando o trabalho sozinhas, trocando procedimentos de trabalho, sem uma discussão mais sistemática. É notório que o ativismo da coordenação atrapalha a mediação do trabalho do professor. A coordenação se aproxima do grupo e diz que, no momento, não estão podendo continuar o trabalho juntas por estarem envolvidas na entrega de farda e na eleição dos representantes. Pediram às professoras que anotassem suas necessidades, de modo que pudessem apoiá-las, posteriormente, no que fosse necessário. Do que observamos, por muitas vezes, inferimos que o registro em documentos da Escola, após aprovação pela comunidade escolar, não tem garantido a efetivação de alguns procedimentos importantes, voltados para o sucesso escolar dos alunos. Assim sendo, são imprescindíveis uma avaliação e nova discussão, com renovação do compromisso coletivo, de modo que o ativismo da escola não prejudique uma de suas tarefas mais importantes: a organização sistemática do ensino, objetivando uma melhoria no processo de ensinar-aprender. • Elaborar registros reflexivos sobre os diversos momentos de mediação junto a professores e alunos O registro como memória do grupo é uma prática sistemática na escola pesquisada. A Escola Emília Ramos tem a prática de registrar sua história desde a sua criação. Tudo na escola é registrado; também o trabalho da coordenação pedagógica. Em todos os encontros coletivos, é entregue o registro do encontro 174 anterior46 É o registro que dá condições para depois refletirmos sobre o encontro com professores: “O que foi estudado ou refletido, a que conclusões se chegaram, que decisões foram tomadas, que questões ficaram para serem retomadas, qual a pauta prevista para a próxima reunião etc.” (VASCONCELLOS, 2002, p.129). . Entendemos que o registro nos ajuda a acompanhar o trabalho que está sendo desenvolvido, pois ele é a memória do encontro. A Coordenadora Ana Maria tinha um caderno, onde tudo era registrado: todos os encontros com alunos, com direção, com coordenadores, com professores – estavam registrados. Em vários momentos de encontro junto aos professores, ela dizia “deixa eu procurar que eu anotei o que nós decidimos naquela reunião”. Pensamos que, não só a reunião de estudo, mas também o registro é formador por várias razões. Dentre elas, Vasconcellos destaca que os professores ficam muito gratificados quando se reconhecem naquilo que foi registrado; percebem que suas falas não ficaram como palavras soltas ao ar, mas passam a ser conteúdo da reunião, na medida em que são devolvidas para serem analisadas. Com isto, se dão conta de que estão fazendo teoria e, mais do que isto, história (VASCONCELLOS, 2002, p.129). O registro reflexivo das atividades desenvolvidas respalda o trabalho do Coordenador, junto ao grupo de professores. Como a pesquisa tem sublinhado, muitas vezes, a ação pedagógica do Coordenador se dá num contexto adverso, onde muitas atribuições são, simultaneamente, a ele conferidas. Nesse sentido, o registro de reuniões e de outros momentos do cotidiano escolar pode se tornar uma valiosa ferramenta para retomada ou replanejamento de atividades pendentes ou não concluídas. • Instituir o apoio direto ao trabalho docente na sala de aula O apoio direto ao trabalho docente na sala de aula, apesar de ser uma estratégia bastante delicada e que exige muito respeito ao professor, foi colocada 46 Vê anexo A: síntese de encontro que foi entregue, posteriormente, aos professores, de modo a retomar a reunião passada. 175 por todos os atores da pesquisa – coordenadoras e professoras – como um procedimento de mediação da atividade do coordenador junto ao professor, o que pode ser testemunhado na fala que se segue: Acho que o trabalho do coordenador deveria ser mais enfático, mais prático, ir à minha sala, ficar um pouquinho comigo, ficar e dizer: ‘não, Ana Catarina, isso aqui não está dando muito certo, acho que a gente poderia ir por outro caminho. Falta isso. No geral, tenta-se fazer esse acompanhamento. Está registrado nesses encontros da gente (Ana Catarina). Essa estratégia de trabalho ajuda o coordenador a perceber se o professor está compreendendo a proposta da escola e o conteúdo a ser trabalhado com o aluno. Muitas vezes, se planeja bem, mas na hora da transposição didática, o professor toma outro encaminhamento, por não ter compreendido; nesse momento, a presença do coordenador, com outro olhar, bastante respeitoso – ‘não esqueçamos’ – pode contribuir para a formação do professor. O coordenador observa, registra e, nos momentos de encontro com o professor, esse material se constituir em estratégia de reflexão da prática através de problematização da situação observada, no sentido de ajudar o professor a avançar. Acreditamos que, sem esse olhar direto na sala de aula, fica mais difícil mediar a reflexão. Muitas vezes, o coordenador pergunta ao professor se o planejado deu certo e o professor responde que sim porque acha isso mesmo. Contudo, numa observação e posterior discussão, ambos podem perceber que o professor precisa melhorar. Sem esse apoio direto, o coordenador não consegue perceber por que a turma não avança, uma vez que o professor afirma que está fazendo tudo como o planejado. Todavia, vale salientar que esse apoio direto na sala de aula precisa ser discutido, combinado e planejado com o professor. O coordenador e o professor precisam ter maturidade profissional para empreender essa estratégia. Na escola pesquisada, apesar de todos terem destacado essa estratégia como relevante, ainda não se utiliza esse procedimento. As observações, que ainda não foram instituídas como prática sistemática, acontecem esporadicamente, quando o professor solicita. 176 Na sua simplicidade e sabedoria, Ana Maria nos fala sobre sua experiência com essa estratégia: Você está lá naquele momento, não pra estar substituindo, nem pra estar olhando o que ele está trabalhando, mas pra estar junto com ele fazendo atividades e depois a gente ter esse retorno, os dois, a gente analisar os dois, como foi a atividade, o que precisava melhorar, o que foi bom. É nessa parceria que eu vejo o trabalho do orientador pedagógico, que seriam essa retaguarda, no sentido de está ajudando, apoiando, sendo parceiro, estar junto na hora que o professor precisar; está na sala junto com ele, fazendo um trabalho. A gente não está lá pra estar olhando o que ele está trabalhando, mas pra estar junto com ele fazendo atividades e depois termos o retorno, os dois, analisando como foi a intervenção, o que precisa melhorar, o que foi bom, é nessa parceria que eu vejo o trabalho da coordenação (Ana Maria). Como pode ser evidenciado na fala anterior, Ana Maria percebe a visita do coordenador pedagógico à sala de aula como uma atividade de parceria, onde o olhar do coordenador sobre o fazer do professor, posteriormente, será objeto de reflexão dos dois, de modo, a melhorar a prática pedagógica Libâneo (2004), também sugere a observação das aulas como componente que visa tanto o desenvolvimento profissional do professor quanto a qualidade do ensino. É um procedimento, cujas “[...] finalidades são bem específicas: Ajudar o professor a melhorar seu desempenho profissional, criar situações para ajudá-lo a avaliar seu próprio desempenho e a fazer a auto-observação” (LIBÂNEO, 2004, p.295). Libâneo (2004) também nos alerta quanto ao julgamento de valor, envolvido nessa estratégia. Nesse sentido, por mais que tomemos todos os cuidados, planejemos a situação a ser observada, não deixa de transparecer uma relação de poder. Dois fatores são imprescindíveis: muita delicadeza e sensibilidade para que haja maturidade na discussão da situação observada. Assim, diz o autor: Por mais que coordenadores e professores se esforcem em buscar objetivos comuns [...] sempre haverá riscos de interferência das subjetividades das pessoas. Cada pessoa interpreta a realidade a partir de sua formação, história de vida, dos sentidos que atribuem às coisas (LIBÂNEO, p.299). 177 Desse modo, o que parece normal e certo para o coordenador pode ser interpretado pelo professor como interferência na sua autonomia na sala de aula. Ana Catarina diz que aceitaria essa observação sem problemas e ressalta: “somente pensando juntas, estando na sala juntas, é que iremos encontrar o caminho tão desejado da qualidade social da alfabetização para os alunos da EJA”. Assim, dadas as condições favoráveis, o apoio direto ao trabalho docente na sala de aula é uma recomendação que precisa ser vista por coordenadores e professores como uma atividade científica, na busca de respostas para melhoria do trabalho pedagógico na escola. Nesses momentos, não deve existir a intenção de julgar se o professor está fazendo certo ou errado, visto que sua atividade está implicada com a mediação do coordenador; é importante que o objetivo seja o de partilhar a busca pelo caminho do melhor ensino e da melhor aprendizagem para os alunos. Em se tratando da mediação do professor alfabetizador, Ferreiro (1992) destaca que os processos de formação de professores mais bem sucedidos são aqueles em que o professor pode contar com um acompanhamento contínuo. Ela destaca que esse acompanhamento, quando agrega observações em sala e, posteriormente, reflexões sobre o que foi observado, compartilhamento de dúvidas, construção de convicção do caminho certo a seguir “ajuda mais o professor a pensar do que várias horas de aula convencional” (FERREIRO, 1992, p.49). • Buscar o conhecimento da ‘pessoa do professor’ e do ‘professor como pessoa’ Por mais que se tente empreender, nas relações de trabalho – em qualquer campo – uma relação estritamente profissional, a nossa humanidade nos trai. Somos seres da subjetividade, da afetividade, somos seres da relação amorosa. E nesse sentido, o coordenador pedagógico, como formador de professor, não pode fugir do entendimento de que esse professor é ‘professor por inteiro’ e, assim sendo, vida pessoal e profissional de professor são entrelaçadas. Nesse foco de análise, Nias apud Nóvoa (1995, p.25) destaca: “O professor é a pessoa. E uma parte importante da pessoa é o professor”. A pessoa do professor também precisa estar implicada no processo de formação, visto que não é possível dissociar o eu profissional do eu pessoal. Tardif 178 (2002, p.103) faz uma referência ímpar sobre essa indissociação entre o profissional e pessoal e explicita que um professor “[...] não pensa só com a cabeça, mas pensa com a vida, com o que foi, com o que viveu, com aquilo que acumulou em termos de lastro de certezas”. Nesse sentido, na escola, professores e coordenadores lidam o tempo todo, com relações humanas e, para um desenvolvimento satisfatório dessas e de outras funções, ele precisa estar bem, pessoal e profissionalmente, uma vez que “[...] não é possível separar o eu pessoal do eu profissional, sobretudo numa profissão fortemente impregnada de valores e de idéias e muito exigente do ponto de vista do empenhamento e da relação humana” (NÓVOA, 1992, p.9). Buscar o conhecimento da ‘pessoa do professor’ e do ‘professor como pessoa’ é uma prática que o coordenador precisa desenvolver no sentido do respeito pela história de vida dos professores com os quais trabalha, principalmente, com os que chegam, os que ele ainda não conhece; o respeito ao que ele traz em termos de conhecimento e o entendimento de que, como seres humanos, precisam de um tempo para se apropriarem da história da instituição e do segmento com o qual vão trabalhar. Vejamos a opinião de Ana Maria nesse sentido: Porque pra mim é um processo: do jeito que o aluno precisa aprender a aprender o professor que chega, mesmo com vivência em outros segmentos, outros níveis de ensino, ele precisa também conhecer e (re)construir essa história com o novo segmento – ‘educação de jovens e adultos’ (Ana Maria). Ana Beatriz conta que, ao chegar à escola, a coordenação acolheu a professora como pessoa e a pessoa da professora que chegava. A partir do Projeto Pedagógico da Escola, a coordenadora orientou como ela deveria seguir. A professora destaca que foi uma estratégia de dizer ‘como se deve fazer’, de um modo diferente: ela deveria fazer daquele jeito não porque a coordenadora estava querendo, mas porque existia antes dela um projeto pedagógico, construído democraticamente pela comunidade escolar. Era aquele documento que iria orientar o seu trabalho, a coordenadora era apenas a mediadora. Vejamos o que ela nos fala na íntegra: 179 A Coordenadora tentou avaliar o conhecimento que eu já trazia e deixar claro o que continha o projeto da escola, como caminhava na medida em que eu pudesse me adequar a esse projeto, até mesmo, às normas da escola, ao andamento da escola, ao objetivo da escola. Então tentaram adequar no início, me mostrando, de certa forma, em um processo lento, mesmo reconhecendo, às vezes, minhas dificuldades, foi a primeira vez que eu trabalhei com a EJA e com isso tentando formar um canal em que eu possa trabalhar na escola (Ana Beatriz). Freire (1996, p.66) compreende que precisamos respeitar a autonomia e a dignidade de cada um; “isso não é um favor, isso é um imperativo que deve ser estendido a todos”, destaca Freire. Ana Maria, que tem uma grande sintonia com Freire, nos explica como ela pensa a pessoa do coordenador pedagógico: Uma pessoa que saiba ouvir as pessoas, uma pessoa que a partir dessa escuta saiba encaminhar, saiba também respeitar; do jeito que o aluno tem seu ritmo de aprendizagem, o professor também tem o seu ritmo de compreensão, do aprender também ele tem seu tempo para aprender, respeitar cada pessoa com seu caminhar diferente, ter essa compreensão dessa heterogeneidade de grupo (Ana Maria). Consideramos que se faz necessária uma vigilância atenta do coordenador para não atropelar o tempo de que cada professor necessita para construir sua prática. Nessa construção, considerando o pressuposto do projeto da escola, o professor precisa ter autonomia para escolher o seu caminho e, nesse sentido, também precisa ser respeitado. De acordo com Nóvoa (1992), existem nos espaços institucionais dificuldades para mobilizar e acolher a história de vida – pessoal e profissional – desse professor. Nóvoa, como semeador do entendimento que devemos ter sobre a importância desse acolhimento, nos alerta que é necessário: [...] equacionar a profissão à luz da pessoa (e vice-versa), de aceitar que por detrás de uma -lógica (uma razão) há sempre uma -filia (um sentimento), que o auto e o hetero são dificilmente separáveis, que (repita-se a formulação sartriana) o homem define-se pelo que 180 consegue fazer com o que os outros fizeram dele (NÓVOA, 1992, p.25). Olhando para o trabalho do coordenador, à luz do paradigma das histórias de vida, sentimos que este precisa estar preparado para, na escola, entender que, por trás das idéias, concepções, pressupostos explicitados pelos professores, nas suas ações, existe uma história que precisa ser resgatada, refletida, assumida para então ser reconstruída, pois “ensinamos aquilo que somos e que, naquilo que somos, se encontra muito daquilo que ensinamos” (NÓVOA, 2004, p.20). Buscar o conhecimento da pessoa do professor e do professor como pessoa é uma condição para compreender os caminhos escolhidos pelos professores para encaminhar a sua prática pedagógica, bem como para encontrar alternativas de possíveis intervenções. • Promover situações formativas, a partir da análise das necessidades na formação docente Essa estratégia da mediação do coordenador junto ao professor aparece nas falas dos atores como sendo uma faceta do olhar do coordenador pedagógico que envolve: estar atento aos professores, ter a sensibilidade para perceber nas falas e atitudes a necessidade de formação docente que precisa mobilizar e ensejar para o grupo. O coordenador precisa ser, nas palavras de Ana Maria, um grande articulador, mediador dos conflitos e necessidades docentes, “um pesquisador”. Eu me vejo no trabalho de articulador, uma pessoa que deve articular aquele grupo, fazer essa articulação, ao mesmo tempo administrar as coisas que acontecem; o que são essas coisas, os conflitos que estão acontecendo, saber ouvir cada um e tirar dessa escuta de cada um a especificidade de cada um pra fazer o trabalho andar, eu me vejo nesse sentido: uma pessoa que articula, uma pessoa que precisa escutar, escutar a fala de cada professor, as necessidades, as dificuldades que eles estão sentindo e, dentro disso, ver em que eu, coordenador, posso contribuir para acelerar e melhorar o processo de formação, que venha repercutir lá na sala de aula, me sinto parceira também (Ana Maria). 181 Percebendo a lacuna existente na formação de seus professores, a escola pesquisada utiliza como estratégia as ‘paradas para estudo’, a ‘busca de resposta na teoria’ para suprir as necessidades da prática docente. Nesse sentido, Rodrigues e Esteves (1993), como estudiosas da análise das necessidades na formação de professores, elucidam a relevância dessa prática: A análise de necessidades no âmbito particular das ações de formação pode ser considerada como uma estratégia de planificação, capaz de produzir objectivos válidos e fornecer informação útil para decidir sobre os conteúdos e as actividades de formação (RODRIGUES; ESTEVES, 1993, p.20). [Sic]. A Reflexão sobre a prática, na busca de apreender as necessidades de formação do professor, acontece na escola pesquisada em vários momentos: nos estudos, relatos de experiências e trocas. A reflexão tem sido uma referência para superar as dificuldades e problemas e rever estratégias de ação. Sobre esse professor que caminha para a construção de uma prática reflexiva, Alarcão (1996) destaca que a sua experiência vai se constituir em reservatório para aprender. Assim, o profissional reflexivo vai ser o profissional que, na sua atividade laborial diária, tem a capacidade de pensar sobre suas ações, de pensar sobre o que está fazendo e no que foi feito; de modo que encontre as suas reais necessidades de formação, desenvolvendo, (re)significando suas competências para a ação e, assim, “[...] a capacidade de tomar em mãos a própria gestão da aprendizagem” (ALARCÃO, 1996, p.175). Nesse sentido, há necessidade de formadores com competência teórico-metodológica para intervenções significativas que possam, de fato, mobilizar o processo reflexivo. Assim sendo, acreditamos que a formação do professor que aponte para a mudança – uma necessidade para reconstrução da escola, em particular da escola pública – só se processará a contento quando o professor e o coordenador tiverem vez e voz na tomada de decisões calcada nas reais necessidades de formação docente. Reforçando o que temos dito, é necessário que a formação docente também leve em consideração o espaço físico, social, cultural e econômico, onde a atividade docente é desenvolvida; pois cada espaço tem seu entorno e seu cerne, com 182 especificidades e subjetividades diferenciadas, que criam necessidades de práticas também diferenciadas. Rodrigues (2006) refere que “a identificação de necessidade é um processo que, mais do que anteceder a formação, deveria acompanhar o exercício do trabalho docente, território por excelência da sua emergência (RODRIGUES, 2006, p.97). A formação que acontece na escola, e que parte das necessidades docentes, é um poderoso instrumento de elo entre a formação e a prática, numa perspectiva de desenvolvimento profissional e, nela, o coordenador pedagógico aparece como o mobilizador dessa formação; conseqüentemente, ele é um formador de professores. Apesar de perceber a necessidade do estudo, Ana Júlia reclama pela falta de tempo disponível para estudar. Para ela, o estudo é a alternativa disponível para descobrir, junto ao professor, os melhores caminhos para o processo de ensinar/aprender e esse sempre é escasso na escola. Estamos falando de ‘vida de professor’ e, aqui, sublinhamos que é impossível falar de ‘vida de professor’ e não levantar a questão do tempo. Este permeia vários aspectos da ‘vida de professor’, por diversos ângulos.” (GUIMARÃES et al., 1996, p.98). Promover situações formativas, a partir da análise das necessidades na formação docente, passa por uma boa organização do “pouco tempo” que tem a escola. • Ensejar a socialização de experiências docentes bem sucedidas Desde a fundação da Escola Emília Ramos – de 1988 até o ano de 2004 – as ‘paradas’ para estudos semanais se constituía uma prática regular, em que todo grupo da escola reunia-se, por turno, para estudar/refletir, fazer relato de experiência, estudo de caso, planejamentos e reuniões. Tais momentos destinados aos encontros de professores foram frutos da luta da Escola para conseguir um espaço de compartilhamento de saberes e tinham a coordenação pedagógica como articuladora desse processo (CAMPELO, 2001; BEZERRA, 2005; ANDRADE, 2007). Ana Júlia diz que, como coordenadora, utiliza a socialização de experiências docentes bem sucedidas como uma estratégia para ajudar os professores que chegam à escola, pois foi ouvindo as experiências dos colegas da Escola Emilia Ramos que ela aprendeu a ser professora alfabetizadora. As estratégias destacadas anteriormente pelos sujeitos da pesquisa são colocadas por Barreto e Barreto (2000, p.86) como a alternativa para a formação. 183 Para eles, o diálogo com a prática através de uma ação refletida e o confronto de teorias são estratégias imprescindíveis na formação do educador. Em Bezerra (2005), os professores destacaram o compartilhamento de saberes como fundamental na sua formação para a prática alfabetizadora. Segundo os professores/coordenadores investigados, mesmo havendo momentos de criação solitária, quando pensavam sua prática, eles tinham dificuldade de separar o que era construção deles do que tinha sido aprendido com os colegas – é como se os professores, estivessem, mesmo na solidão de sua prática, acompanhados pelas vozes dos colegas. Notamos isso em uma das falas apreendidas por Bezerra (2005) que, a seguir, destacaremos: A minha formação se deu no grupo de professores, no grupo com os alunos e é assim que vai se dando. Dentro das necessidades que a gente sente, a gente vai procurar estudar e a formação vai acontecendo assim. A sensação que dá é que ela nunca vai acabar. Hoje eu já tenho mais autonomia, mais segurança, mais tranqüilidade pra analisar algumas questões, mas é na prática, na troca, que eu mais aprendo (P-4)47 . Igualmente, Imbernón (2002) evidencia que um dos princípios da formação permanente é aprender colaborativamente e, junto com os colegas de trabalho, construir saberes e competências da profissão. No início do ano 2005, a Secretaria Municipal de Educação de Natal/RN, em reunião com os diretores de escolas do município, proibiu a realização de ‘paradas‘ para estudo e/ou reunião com professores, alegando o comprometimento da carga horária do aluno. Segundo informações da direção da Escola, a Secretaria Municipal de Educação deixou a cargo das escolas a responsabilidade de pensarem em formas para encontros coletivos dos professores, visando ao estudo e planejamento. Dadas as condições de existência dos professores, que têm o dia inteiro preenchido por outras atividades, perguntamos: Como aqueles professores poderão se encontrar para pensar a escola coletivamente? Como ficará a história da formação continuada, desenvolvida na Escola há 19 anos? 47 Fragmentos das falas dos sujeitos entrevistados na pesquisa de BEZERRA (2005, p.126). 184 Como pesquisadora estivemos presente no ano de 2003, acompanhando os momentos de encontros coletivos de professores; ao voltarmos em 2006, sentimos que houve uma quebra prejudicial na prática desses encontros. Percebemos uma grande lacuna, principalmente nos momentos dos estudos que, até 2005, aconteciam na sexta-feira a partir das 20h30min; nesses dias, os alunos saíam mais cedo da escola. No ano de 2006, os encontros coletivos de professores aconteciam no início da aula – das 18h às 19h – uma vez por semana. Nesses encontros, muitos professores chegavam atrasados, pois vinham de outras atividades, não podendo chegar a tempo e, desse modo, não participavam das discussões coletivas. Até 2005, de segunda a sexta-feira, os alunos saíam as 21h30min e os professores se reuniam para fazer relato de experiência, registros, reunião administrativa, dentre outras. A partir de 2006, os professores encontravam-se uma vez por semana; nesses dias, os alunos tinham aulas de arte e literatura - por nível de ensino, e os professores se reuniam exclusivamente para planejar. A pesquisa não apreendeu, em nenhum desses momentos, o uso desse tempo para estudo. Sentimos que as coordenadoras deixavam esses dias a cargo das professoras. Com base nas observações e outras vivências por ocasião da nossa pesquisa, entendemos que a escola ainda está buscando formas de reinventar os encontros de estudo, a partir desse novo contexto. Portanto, nesse momento de reconstrução, não é possível dizer se esse caminho encontrado vai dar certo. Nesse momento, nos resta lamentar a quebra ocorrida no trabalho e dizer que entendemos que, cabe à Secretaria Municipal de Educação - também - pensar e viabilizar formas para os encontros coletivos de professores nas escolas. A Escola, ao longo da sua história, assumiu uma postura de autonomia frente à Secretaria Municipal de Educação e, desse modo, construiu um diferencial nas condições concretas, demonstrando responsabilidade e compromisso com o público atendido. Atualmente, porém, percebemos que a escola está muito presa às decisões do órgão central de gestão. Os atores queixam-se de que esses momentos coletivos eram propícios ao aprender com o outro e que a perda desse espaço desestruturou o grupo nesse sentido. A fala de Ana Catarina ilustra a opinião das demais. 185 Quando eu cheguei aqui, acho que tínhamos mais espaço pra essas trocas. Hoje, penso que a gente perdeu essa questão de ter um dia para planejamento, aquele momento coletivo a gente perdeu. Eu acho que aquele momento coletivo era um momento em que, realmente, a gente podia contar a experiência um do outro, ouvir o outro, as dificuldades... Isso também é uma forma de aprendizagem e a gente perdeu nesses últimos dois anos. Aí, o trabalho fica meio limitado só a sua turma por não se ter aquele momento de estudo. Meus dois primeiros anos considero que foi realmente uma verdadeira escola porque os embates, as dificuldades que a gente tinha, a inquietação de não aceitar daquela forma, no grupo, a gente se tornava mais forte (Ana Catarina). O relato de experiências no grupo, pelos próprios professores, ainda acontece, mesmo com as limitações de horário. Nesses momentos, percebemos que, partindo de vivências bem sucedidas na sala de aula, os professores vão trocando essas vivências com os colegas e, assim, construindo um corpus de saberes. A prática interformativa abre muitas possibilidades para o professor. O grupo é um porto seguro para a busca de estratégias. As professoras pesquisadas destacaram a importância das trocas com os colegas e do apoio da coordenação pedagógica nos momentos de planejamento, relato de experiências e estudo como aporte para superação das dificuldades. Para Imbernón (2002, p.68), “é no cenário profissional, [que acrescentaríamos individual e coletivo], que se aplicam as regras da prática, em que o conhecimento profissional imaginário, intuitivo ou formal se torna real e explícito. Essa realidade é fundamental na geração de conhecimento pedagógico”. • Buscar o conhecimento do aluno real Conhecer o aluno com o qual trabalhamos é uma preocupação importante de coordenadores e professores. O professor deve sempre buscar o aluno real, tanto aqueles que já estão como aqueles que chegam à escola. Ainda é muito presente nas escolas, a pregação do aluno ideal: aquele que gosta de estudar, que está na idade regular de ensino, que está alimentado, que vem ‘limpinho’ pra escola, o disciplinado, o obediente... mas 186 [...] hoje, esse ideal-tipo de aluno desapareceu completamente e temos diante de nós uma diversidade “explosiva”, constituída por alunos de todas as origens; de alunos que querem estar na escola, mas que não têm qualquer intenção de estudar ou de aprender (NÓVOA, 2004, p.20). O público da EJA – adolescentes e adultos que, por muitas vezes, se mostram sem desejo de lá estar e aprender, motivados pelas várias questões já expostas neste texto – torna o processo de ensinar/aprender muito mais complexo e desafiador para professores e coordenadores. Nesse sentido, os atores da pesquisa destacam que têm uma grande preocupação em desmistificar a figura do aluno ideal. Esta é uma preocupação antiga na escola; diríamos que desde o seu nascimento. Assim sendo, é comum coordenadores e/ou diretores e professores fazerem visitas periódicas à casa de alunos. Ana Beatriz fala dessa experiência. Primeiro tenho que saber a realidade desse aluno; quem é esse aluno? Como ele chegou ali? Onde ele vive? Outro ponto que eu achei muito bom na escola foi a visita ao bairro, à casa do aluno para conhecer a realidade que nós professores, junto à coordenação e direção, realizamos. Porque, às vezes, a gente critica uma coisa, por que esse aluno não fez a atividade de casa, mas a gente não sabe da realidade, como é a vida desse aluno, o que esse aluno faz. Esse aluno passa o dia trabalhando? Aonde? Como é esse trabalho? Ele saiu de casa às 5h da manhã? Temos que conhecer a realidade social desse aluno, reconhecer de que intervenções ele precisa para chegar à alfabetização, o que é que ele traz, que conhecimentos ele já tem para que, juntos, estudando a parte metodológica possa contribuir com esse aluno (Ana Beatriz). A maioria dos alunos da EJA/1º segmento faz parte das estatísticas dos excluídos social e economicamente. Com base em Paulo Freire (1996), entendem as coordenadoras e professoras que a realidade econômica e social não é determinante para o sucesso/fracasso escolar, essa realidade é condicionante, pois ela apresenta muitos percalços para os desfavorecidos, social e economicamente. Portanto, os atores compreendem que a realidade de vida dos alunos, muitas vezes, corrobora para o insucesso na vida escolar, pois elas são inter-relacionadas. Como profissionais, elas também têm limitações para pensar continuamente em 187 práticas que imprimam uma dinâmica mais prazerosa às aulas. No depoimento abaixo, percebemos essa angústia: A realidade de vida deles é muito complicada e, assim, tem muita coisa que foge do nosso alcance, a gente não tem como convencer um aluno que trabalhou o dia todinho no sol, a ficar das 7h às 10h assistindo aula, e nem a gente tem competência pra fazer todos os dias uma aula diferenciada, uma aula muito prazerosa, uma aula muito participativa (Ana Júlia). A atividade docente é uma atividade do ‘corpo a corpo’ e trabalhar com jovens e adultos, ainda em processo de alfabetização, que têm uma história de fracasso escolar ou de não-direito a estudar na idade regular, é um desafio diário. Os profissionais intervêm nessa realidade complexa diariamente; sentem “na pele” essa problemática, haja vista que o professor intervém num meio ecológico complexo, num cenário psicossocial vivo e mutável, definido pela interacção simultânea de múltiplos factores e condições. Nesse ecossistema, o professor enfrenta problemas de natureza prioritariamente prática, que, quer se refiram a situações individuais de aprendizagem ou a formas de comportamento de grupos, requerem um tratamento singular, na medida em que se encontram fortemente determinados pelas características situacionais do contexto e pela própria história da turma enquanto grupo social (GOMEZ,1995, p.102). Vivendo a queixa da problemática de vida dos alunos, por estarem nesse ‘corpo a corpo’ diariamente, os professores começam a se apropriar dessas queixas como suas. Como sujeitos do humano, do sensível, os professores sentem-se angustiados e precisam encontrar um espaço de escuta e de acolhimento dessas queixas. E o coordenador aparece como essa pessoa. Os professores necessitam encontrar, de fato, esse acolhimento, pois suas angústias podem se transformar em dor e essa dor vai se transformando em problema de ordem emocional e psíquica, que leva muitos professores a desistirem inconscientemente. Vasques-Menezes e Gazzotti (1999, p.377) explicam que, “as 188 sucessivas frustrações levam-no a questionar sua competência, tornando a identidade profissional fragilizada”. O (re)conhecimento da história de vida do aluno deve acontecer por parte de professores, coordenadores e demais profissionais da escola. Como Paulo Freire (1996), salientamos que nós – professores e coordenadores – devemos olhar com otimismo para a vida dos alunos, vendo “a história como possibilidade e não como determinação” porque “o mundo não é; o mundo está sendo” (FREIRE, 1996, p.85) e nós temos um papel fundamental neste “vir e ser”. • Buscar alternativas, com o professor, para superação das dificuldades dos alunos Trabalhar com alfabetização de jovens e adultos – AJA – é bastante prazeroso e significativo, mas também bastante desafiador. Diariamente, os professores se deparam com um mar de dificuldades que circundam a vida dos alunos. Observamos um grande envolvimento das coordenadoras e professoras no sentido de construir estratégias para superar essas dificuldades. Nesse sentido, um dos maiores problemas apresentados pelo grupo, nos momentos das reuniões e também nas suas falas, é o problema da evasão. A evasão é um fato; perpassa toda a história da AJA e é um problema de difícil solução. Na Escola Emília Ramos, a evasão também acontece, e é significativa. As professoras e as coordenadoras alegam que a evasão é um grande entrave para o trabalho, tanto nos casos de evasões temporárias, ou seja, com regresso do aluno antes do término do semestre ou do ano letivo, como nos casos da volta do aluno evadido, no início do ano letivo; neste caso, também é vivenciada uma grande dificuldade porque a cada volta de um aluno evadido, o trabalho iniciado deve ser retomado com mais afinco, já que o sentimento de fracasso do aluno, que se evade da Escola, é sempre maior do que o dos que estão iniciando o percurso na EJA. 189 A maior dificuldade, em grande parte, é a evasão. Então, como fazer para que esse aluno não desista? Que podemos fazer para que esse aluno permaneça durante todo o ano letivo? Que didática, que metodologia que eu consiga fazer com que esse aluno permaneça na sala de aula durante todo o ano? Então, a maior dificuldade é essa, é: tipos de atividade, tipos de trabalho em sala de aula que possam fazer com que esse aluno, apesar de todas as questões que são motivo da evasão, o meu trabalho com o aluno possa ser maior que todas essas dificuldades; tudo, então, é uma maneira, um meio metodológico, didático que eu faça com que esse aluno permaneça durante todo o ano letivo e eu acho que a gente precisa muito da ajuda da coordenação nesse sentido (Ana Beatriz). Essa fala denota a angústia da professora na busca de alternativas, bem como o seu reconhecimento. E, para Ana Júlia, os resultados da alfabetização – principalmente para os que chegam à escola com escritas no nível pré-silábico – só começam a acontecer no segundo semestre e isso inquieta muito os alunos; eles começam a achar que não vão aprender mesmo e desistem. Para a coordenadora, era necessário que se pensasse em um trabalho que começasse a dar resultados logo no primeiro semestre, mostrando “que eles conseguem aprender; aí, talvez, a gente diminuísse a evasão, porque se eles suportassem as dificuldades, fossem duros; resistentes não, mas firmes” (Ana Júlia). Na busca de um caminho para enfrentar as dificuldades, as professoras e as coordenadoras têm a prática de conversar com o aluno. A coordenação e a direção também são parceiras dos professores nessa intervenção. Além desses procedimentos, também são realizadas visitas às casas dos alunos para conversar, de modo a saber os motivos de sua evasão e convidá-los a voltarem. Vejamos o destaque da Coordenadora Ana Maria: Existe de nossa parte a preocupação de tentar fazer o resgate dos alunos. Ir à casa de cada um. Houve uma época em que íamos mais; hoje, em virtude da violência do bairro, temos sido mais temerosas. Estamos enviando cartas, e procurando conversar com os alunos. Assim, quando eles vêm comunicar: ‘eu vou precisar me ausentar porque eu vou trabalhar tantos dias ou tantos meses, mas eu vou fechar minha matricula’, falamos: ‘quando terminar o seu trabalho, volte para escola’, temos essa abertura. Eu acho assim, que trabalho em EJA tem que ter um currículo flexibilizado para atender esse publico porque essa evasão é muito sazonal: vai depender de 190 organização de calendário, vai depender de organização de currículo pra eles. Vemos nessa atitude, um cuidado permeado pelo amor, não o amor romântico, mas o amor por um projeto de escola, com compromisso com a classe popular, como nos diz Frei Beto (apud VASCONCELLOS 2003, p.62): “um amor que faça do encontro um projeto de vida”. Um amor que transforma relações em relações recorrentes que podem vir-a-ser relações estáveis, como nos fala Maturama (1998, p.66-67) que ainda acrescenta: O amor constitui um espaço de interações recorrentes que se amplia e pode estabilizar-se como tal. É por isto que o amor constitui um espaço de interações recorrentes, no qual se abre um espaço de convivência onde podem dar-se as coordenações consensuais de conduta que constituem a linguagem, que funda o humano. E é por isto que o amor é a emoção fundamental da história da linhagem hominídea a que pertencemos. Nesse sentido, quando coordenadores e professores buscam ajudar os alunos em suas dificuldades vemos configurado nessa ação um ato de amor em consonância com o que nos fala Maturama. O professor também necessita ser cuidadoso na sua afetividade para se fortalecer no cuidado com o aluno, o que é reconhecido por Ana Catarina. Vejamos: O professor precisa sempre de uma Afetividade sempre muito bem alimentada, saber o desejo do aluno, ter uma metodologia muito bem encaminhada, direcionada para a EJA, estar sempre pensando, mostrando para os alunos que eles estão avançando e que podem avançar ainda mais. Sempre estar valorizando muito esses avanços; por menores que sejam, a gente tem que estar sempre mostrando, apresentando para eles e mostrando também a importância da alfabetização para eles porque eles têm um grande desejo, mas ainda não vêem como muito importante na vida deles e essa parte a gente precisa sempre estar trabalhando com eles e mostrar que eles estão conseguindo se alfabetizar e que podem se alfabetizar, apesar de tudo (Ana Catarina). 191 A freqüência irregular é relatada pelas professoras e coordenadoras como um entrave para o sucesso escolar. As professoras alegam que alguns alunos, pela história de vida que têm, não apresentam um cuidado em vir regularmente à Escola. Outros alunos não apresentam assiduidade por questões de trabalho ou família como, por exemplo, as alunas que são mães e que, às vezes, não têm com quem deixar o(s) filho(s) em casa, ficando impedidas de virem à Escola. Salientamos que, na Escola pesquisada, muitas mulheres-alunas quando vão para a aula, levam seus filhos menores e os funcionários disponibilizam jogos e brinquedos para o entretenimento das crianças, enquanto suas mães estudam. As professoras e coordenadoras nos dizem que muitos alunos da EJA apresentam dificuldade de aprendizagem. Inferimos que o fracasso escolar, a baixa auto-estima, a situação de classe social – cheia de privações – vêm contribuir para as dificuldades de aprendizagem apresentadas pelos alunos. Segundo as coordenadoras, é importante fazer o professor compreender que esses alunos são capazes de aprender; para isto, precisamos construir uma prática que quebre essas dificuldades. Para as entrevistadas, é importante que se passe para os alunos um sentimento real e verdadeiro de grande credibilidade neles, pois a baixa auto-estima está presente tanto nos jovens, como nos adultos do 1º segmento da EJA embora, em cada um, as repercussões desse sentimento se apresentam de maneira diferente, visto que: Nos mais velhos, essa baixa auto-estima se traduz em timidez, insegurança, bloqueios. Nos mais jovens, é comum que a baixa auto- estima se expresse pela indisciplina e auto-afirmação negativa (“se não posso ser reconhecido por minhas qualidades, serei reconhecido por meus defeitos”) (BRASIL, 1997, p.43). Para que o aluno sinta-se valorizado, vença a timidez e a insegurança, as professoras e coordenadoras relatam que motivar os alunos é uma prática necessária e deve acontecer diariamente na sala de aula da EJA. Os alunos requerem esse procedimento, devido a carga de baixa auto-estima que eles trazem; desse modo, somente um trabalho contínuo consegue motivá-los. 192 Gadotti (2000), ao discutir a necessidade do professor realizar um trabalho que invista na auto-estima dos alunos da EJA, ressalta que eles se sentem temerosos e ameaçados em relação à Escola48 Os adolescentes e jovens formam um grupo que, pelas características próprias da idade, apresenta muitas resistências ao trabalho pedagógico. A Proposta Curricular da EJA/1º segmento ressalta essa relação conflituosa dos adolescentes com a escola e justifica-a dizendo que os adolescentes . [...] estão normalmente retornando depois de um período recente de sucessivos fracassos na escola regular. Têm, portanto, uma relação mais conflituosa com as rotinas escolares. Com relação a eles, o grande desafio é a reconstrução de um vínculo positivo com a escola e, para tanto, o educador deverá considerar em seu projeto pedagógico: as expectativas, gostos e modos de ser característicos dos jovens (BRASIL, 1997, p.42-43). Essa relação conflituosa entre os adolescentes e a escola também faz parte do cotidiano da escola pesquisada. Para este público específico, continuamente existe muito diálogo, na perspectiva de fortalecer o trabalho do professor. Quando o diálogo não responde positivamente às intervenções do professor, a coordenação é chamada para discutir o caso com professores e pais. Na escola pesquisada, desde a sua fundação, existe um trabalho muito sistemático com as famílias e estas são, continuamente, convidadas a participar. Nos documentos da Escola, a participação da família está bastante explicitada, como vemos no trecho do PPP que versa sobre essa temática. Para tanto, as famílias terão abertura para discutir, inferir e avaliar o processo ensino-aprendizagem, vislumbrando sua melhora e eficácia, participando das decisões acerca das ações da escola, estabelecendo prioridades em função da realidade da comunidade (ESCOLA MUNICIPAL PROFESSORA EMÍLIA RAMOS, PPP, 2005, p.18). 48 [O aluno] precisa ser estimulado, criar auto-estima, pois a sua “ignorância” lhe traz tensão, angústia, complexo de inferioridade. Muitas vezes, têm vergonha de falar de si, de sua moradia, de sua experiência frustrada na infância, principalmente em relação à escola. É preciso que tudo isso seja verbalizado e analisado. (GADOTTI, 2000, p.39). 193 É a coordenação pedagógica que faz os atendimentos aos pais; no âmbito desse atendimento, não existe divisão de tarefas; às vezes, a coordenação pedagógica entra em conflito com relação à clareza que lhe falta se esta é também uma atribuição sua, apesar de reconhecer a importância do trabalho com a família. Ana Júlia nos fala nesse sentido: É muito presente na escola o trabalho com a família, você trabalha muito com a família e por isso, muitas vezes, deixamos de atender o professor - porque está todo dia na escola, para atender o pai que chega. Na época em que eu fiz Pedagogia, era dividida orientação, supervisão, então é muito mais um orientador do que um coordenador. Agora, a gente fica meio sem saber como fazer essa divisão. Mas a escuta da família tem que ter (Ana Júlia). O trabalho com as famílias está explicitado nos documentos da Escola Emília Ramos. Anualmente, a escola organiza o encontro da família, onde professores, funcionários, pais e alunos se encontram. Vivenciamos um desses encontros, onde observamos que, em cada turno, a coordenação pedagógica mobiliza os professores para a organização, distribuindo tarefas, elaborando materiais, organizando palestras, oficina etc. Percebemos no encontro com as famílias um grande momento, visualizamos uma grande confraternização de toda a comunidade e os coordenadores pedagógicos dos três turnos estavam sempre à frente das atividades. Muitas famílias são participantes ativas da vida da Escola Emília Ramos que, desde a sua origem, prima por uma relação bastante estreita e amistosa com os moradores de Cidade Nova, cúmplices efetivos das lutas, conquistas, alegrias, comemorações e decepções de toda a comunidade escolar (CAMPELO, 2001, p.193). Hoje é posto que a gestão participativa da escola deve estabelecer um forte vínculo com as famílias. Na rede Municipal de Ensino de Natal, todos os gestores são eleitos pelo voto e, desse modo, são as famílias que têm um peso muito grande nessas escolhas. As famílias precisam ser convidadas para virem à escola, não 194 apenas nos momentos em que seus filhos precisam de ajuda, mas elas também devem ser chamadas para a construção dessa escola. E nesse foco de análise, o coordenador é um poderoso agente dessa interlocução família-escola. Nesse sentido, o coordenador pedagógico desencadeará um trabalho transformador à medida que realizar uma ação intencional, em conexão com a organização e gestão escolar e um trabalho coletivo, integrado com os atores da comunidade escolar. Os alunos e as respectivas famílias são atores, fazem parte dessa comunidade (ORLONSON, 2005, p.179). O coordenador aparece nesse sentido com mais uma atribuição: o trabalho com a família. Numa gestão democrática, a participação da família é fundamental e a escola que queremos construir não se fará sem essa importante participação. Como vimos, as dificuldades apresentadas pelos alunos da EJA são muitas. Todavia, vimos também que as professoras e coordenadoras, participantes da pesquisa, buscam muitas alternativas para superação dessas dificuldades. • Acompanhar e avaliar a alfabetização dos alunos da EJA, orientando o docente na promoção de avanços dos alfabetizandos Foi bastante destacada por nós no capítulo anterior, a importância do diagnóstico inicial para verificar os níveis de conceptualização da escrita dos alunos, de modo a organizar a prática pedagógica no sentido de atender às especificidades dos níveis em que se encontram. Os atores investigados também destacam essa importância, mas se queixam com relação ao acompanhamento desse aluno. A avaliação é feita, mas ela não tem essa preocupação maior. Eu vejo que ainda não existe isso na escola, mesmo que se fale em avaliação. A gente faz um diagnóstico, porque a gente trabalha com relatórios, mas quais são os avanços que vão acontecendo no decorrer do tempo, como vamos intervir? Aí, no final do semestre, fazemos outra avaliação para fazer o relatório; aí vemos o problema novamente e novamente... (Ana Catarina). 195 O acompanhamento do professor acontece, como a pesquisa revelou, mas, as professoras se queixam que a coordenação deveria ser mais enfática nesse acompanhamento e ser também mais propositiva, no sentido de chegar mais junto das professoras, para que, de fato, aconteça a alfabetização. As nossas observações e as palavras dos sujeitos ouvidos evidenciam muita seriedade do trabalho realizado na Escola: prática pedagógica significativa, professores assíduos, dinâmica muito rica de atividades extraclasse etc.; mesmo assim, os índices de insucesso e evasão escolar ainda são considerados bastante altos. Morais e Albuquerque (2004) consideram que analisar a complexidade do ato de ensinar nos convida a sairmos de uma análise superficial, haja vista que a nossa história é marcada pela exclusão – da população pobre – de “bens e práticas simbólicos” ligados à escrita “que, historicamente, se tornaram propriedade de poucos”. É importante que não sejamos ingênuos e percebamos onde excluímos, ainda que inconscientemente. Talvez, tomando essa consciência, não incorramos no erro de novas exclusões. Os atores da pesquisa têm a perspectiva de um ideal de escola e de sociedade democrática. Sabem aonde querem chegar, sabem aonde podem chegar, mas as condições impostas os têm impedido de ir muito adiante. Essas frustrações, comuns entre professores e coordenadores comprometidos com a qualidade social de sua prática pedagógica, se acentuam na EJA, pelas condições de existência, tanto dos professores e coordenadores como dos alunos. A desigualdade social que desarticula a sociedade cria muitos percalços para o trabalho do professor, principalmente os da educação de jovens e adultos. Os alunos dessa modalidade de ensino possuem – como já dissemos ao longo do trabalho – especificidades que os distinguem dos alunos do ensino fundamental que fazem na “idade própria” e, talvez, os professores ainda não tenham construído a clareza necessária acerca dessa questão, a ponto de poderem assimilar e conseguir – apesar das adversidades que permeiam essa modalidade – não se frustrarem tanto com os resultados obtidos. As professoras nos disseram que a coordenação tem dificuldades de fazer esse acompanhamento no processo; falta uma definição de prioridades, considerando o que é mais importante na escola, que deveria ser a aprendizagem dos alunos. Assim, as dificuldades dos alunos vão sendo deixadas em segundo 196 plano e quando se dão conta, chega o final do ano e, de fato, não aconteceu um trabalho mais incisivo com aqueles alunos que precisavam de um acompanhamento mais direto, um trabalho mais específico, para que eles conseguissem se alfabetizar. Nesse sentido, vejamos o que nos dizem os atores: Se o professor tem dificuldade de avaliar, a gente olha o material, a gente conversa e, até às vezes, a dificuldade é de diagnosticar o nível de leitura e escrita. A gente até analisa o material, aplica atividade com o aluno, agora é muito final, não é processual é muito final e na dificuldade, até pelo fato de a avaliação ser processual que vai se deixando, vai se deixando porque a gente, quando a gente avalia que a turma tem dificuldade pra tal coisa, a gente vai mudar no planejamento, vai planejando de outras formas, mas se a dificuldade é de um só, muitas vezes a gente não consegue atingir muitos alunos porque a dificuldade do professor não é percebida pelo coordenador ou não é trazida pra gente, aí a gente não consegue ajudar muito, ou às vezes, a gente até falha mesmo junto com o coordenador, às vezes ele passa o ano todinho a gente dizendo que fulano tem dificuldade nisso, e a gente não consegue (Ana Júlia). Muitas vezes, na escola, nós educadores nos perdemos com relação ao que é mais importante e isso acontece com muita freqüência na escola pública da periferia, são tantas as questões que nos chegam quando lá estamos – é a violência, de todos os tipos, sofrida por nossos alunos; são problemas de indisciplina, de falta de material, são problemas graves de ordem familiar... – que somos “engolidos” por essa roda viva e, talvez, por isso, nos esqueçamos do papel da escola pública: qualidade social da educação. Precisamos, na escola, não nos deixarmos cair nesse jogo de desesperança e o coordenador precisa acompanhar e avaliar a alfabetização dos alunos da EJA, orientando o professor na promoção de avanços dos alfabetizandos. O educador precisa ver até onde vão as suas possibilidades e enxergar também os limites impostos pelos contextos de vida do aluno e dele próprio. A intervenção docente, em algumas situações, é limitada para modificar esses limites, urge resolver bem essas situações e perceber que muitas coisas não dão certo porque elas estão além das possibilidades de professores e alunos. Se isto não estiver claro, o professor construirá uma atmosfera de muita angústia para o trabalho porque: 197 [...] educar é uma profissão de fé; uma profissão que vislumbra com possibilidade de uma atuação quase divina, pois nela transformam- se/formam-se outros indivíduos à semelhança do profissional educador, os limites são infinitos. Esta plenitude de possibilidades pode conduzir o profissional educador aos céus, mas também pode conduzi-lo a um inferno pessoal (VASQUES-MENEZES; GAZZOTTI, 1999, p.373). Há momentos em que sentimos que tudo foi feito, mas não tivemos o resultado esperado. Os autores acima nos falam que os limites são infinitos - mas eles existem. Existem momentos/situações na escola que precisamos reconhecê- los. Precisamos reconhecer que a prática pedagógica não pode tudo, apesar de poder muito. De certa forma, pensamos que as expectativas/exigências que os docentes se colocam são sadias, pois quem está quieto está conformado com as condições postas. E o que seria da educação brasileira sem a esperança dos professores? • Acompanhar e avaliar a prática pedagógica do professor, ensejando avanços teórico-metodológicos Acompanhar e refletir/avaliar sobre o trabalho pedagógico que acontece na escola junto ao professor, contribui para que o coordenador esteja continuamente pensando/auto-avaliando o seu fazer pedagógico. Nos momentos de estudo, relato de experiências, planejamento, reuniões administrativas, leitura de relatórios de atividades desenvolvidos pelos professores, relatórios de desempenho dos alunos, as coordenadoras têm oportunidade de acompanhar/avaliar a prática pedagógica dos professores e junto com eles ensejar uma reflexão sobre a ação. Nesses momentos, o coordenador, munido de teoria, das falas dos seus pares, promove a auto-avaliação do trabalho, questiona o fazer e tudo isso junto vai se constituindo em saberes da ação pedagógica do coordenador pedagógico. Por exemplo, tendo ciência sobre sua prática, sabendo que ela tem limites e disposta a mudá-la, para que ela atenda aos objetivos a que se propõe, Ana Catarina, com a ajuda da coordenadora pedagógica, vai construindo o seu fazer, em clima de possibilidades. Assim, ciente dos limites, estabelece um diálogo com a coordenação, buscando uma melhoria do seu trabalho, pois 198 [...] quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razões de ser de por que estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênua para o de curiosidade epistemológica. Não é possível assunção que o sujeito faz de si numa certa forma de estar sendo sem a disponibilidade para mudar (FREIRE, 1996, p.44). Essa disponibilidade para mudar, no entendimento dos atores da pesquisa, acontece quando se tem consciência de que a prática não pôde alcançar os objetivos propostos; o olhar crítico sobre a prática é um componentes da ação do coordenador que pode provocar avanços no trabalho docente. A ação do coordenador é mediatizada pela avaliação de professores e alunos e pela teoria. Para Ana Maria, o coordenador precisa, na sua ação, compreender que é na “avaliação do professor, que ele encontra elementos para fazer sua intervenção e, consequentemente, a formação”. A prática do professor é repensada e o encoraja a criar formas e alternativas para melhorar o seu trabalho. Essa busca não será solitária, será junto ao coordenador pedagógico. Para Ana Catarina, sem esse olhar crítico/avaliativo, o professor pode pensar que tudo está bem e não se preocupar em melhorar sua ação. Eu posso só trabalhar na base elementar sempre e achar que estou fazendo meu trabalho, mas quando você consegue visualizar isso, quando o coordenador diz: não Ana Catarina, isso aqui você já fez você pode agora ir mais em frente, ah você trabalhou agrupamento, tudo bem você trabalhou agrupamento, quanto tempo você vai trabalhar com esses agrupamentos? Os alunos já conseguem compreender o que é trabalhar adição em forma de agrupamentos, eles conseguem compor e decompor números? Se já conseguiu isso, então vamos avançar; eu acho que o coordenador pedagógico precisa ter esse olhar avaliativo mesmo do nosso fazer (Ana Catarina). Consideramos fundamental essa auto-avaliação, esse olhar crítico sobre o fazer docente em comunhão. Ratificamos essa afirmativa, com a fala dos atores da pesquisa que nos expôs a dinâmica da prática docente, em que a “reflexão na ação e sobre a ação” permitem que ela seja uma prática viva e tenha significado, tanto 199 para os alunos como para os professores, uma vez que “A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o ‘fazer’ e o ‘pensar sobre o fazer’ (FREIRE, 1996, p.42-43). Com as palavras de Freire, caminhamos para o encerramento do nosso trabalho. A nossa pesquisa ratificou que o coordenador pedagógico na escola precisa ser o parceiro do professor na construção de sua prática. A relação professor/coordenador precisa ser uma relação de partilha, de acolhimento, de escuta, de ajuda, de respeito. Uma relação onde quem ensina aprende e onde quem aprende ensina. É necessário que essa relação aconteça permeada pela “amorosidade, afeto e cuidado com o outro” (FREIRE, 1996). Essa perspectiva ainda não é realidade por inteiro, na escola pesquisada; todavia, podemos dizer que no plano das idéias e da vontade está explícito esse desejo. Para tanto, são requeridos, dos coordenadores pedagógicos, saberes específicos e transversais que procuramos apreendê-los no campo da pesquisa e, na conclusão deste trabalho, acreditamos que, apesar das limitações – nossas e deste trabalho – estamos contribuindo para a construção desse arcabouço sobre os saberes da ação do coordenador pedagógico. A análise de todo o material nos colocou frente a frente de um conjunto de elementos que nos deram condições de compreender a complexidade do que é ser coordenador pedagógico Acreditando na inconclusão dos seres humanos, não podemos afirmar que este trabalho esteja fechando questão a respeito dos saberes necessários à ação do coordenador pedagógico no campo da alfabetização de jovens e adultos. Todavia, temos a certeza de que nos demos por inteira, procurando ultrapassar limites e avançar nas nossas possibilidades de contribuir com muitos fios na tecitura desses saberes. na escola pública – onde são muitos os saberes requeridos para mediar o processo de alfabetizar jovens e adultos. OARREMATEDOSFIOSDATESE.O ARREMATEDOSFIOSDATESE.OA RREMATEDOSFIOSDATESE.OAR REMATEDOSFIOSDATESE.OARR EMATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE MATEDOSFIOSDATESE.OARRE Entre o sono e sonho, Entre mim e o que em mim. É o quem eu me suponho, Corre um rio sem fim. Passou por outras margens, Diversas mais além, Naquelas várias viagens, Que todo o rio tem. Chegou onde hoje habito. A casa que hoje sou. Passa, se eu me medito; Se desperto, passou. E quem me sinto e morre. No que me liga a mim. Dorme onde o rio corre - Esse rio sem fim (FERNANDO PESSOA). IV Capítulo 201 4 O ARREMATE DOS FIOS DA TESE De fato, por mais que queiramos, nunca chegaremos ao fim. Somos esse rio de que nos fala Fernando Pessoa na epígrafe de abertura deste capítulo; nunca estaremos acabados. Uma tese gestada por um humano, também não pode fechar questão. A pesquisa constatou que as coordenadoras pedagógicas encontram-se ainda sem uma identidade profissional, imersos em muitos fazeres sem se darem conta do mais importante: sua mediação junto ao professor. Apesar de não declarada, existe na escola uma relação de poder entre coordenadoras, professoras e diretoras. O coordenador tem sua ação desenvolvida em uma ambiente nem sempre harmônico, onde exerce sua função em meio a uma dinâmica organizacional, em que vive o dilema da autonomia x heteronomia. Ele pode organizar a proposta da escola, mas deve seguir as orientações dos órgãos oficiais; ele deve planejar junto com o professor, mas também o incumbiram de entregar as fardas dos alunos. Como construir uma ação pedagógica diante das demandas cotidianas do contexto escolar? Como construir uma prática dentro de uma lógica ditada pelos órgãos oficiais? Como ele vai criar/construir uma prática numa escola, onde ele é solicitado, o tempo todo, para fazer muitas coisas ao mesmo tempo, dentro das ações pragmáticas do cotidiano? Ao analisar esse cotidiano tenso da ação pedagógica do coordenador, vislumbramos um quadro de relações estabelecidas que representamos na figura que se segue: 203 saber para desenvolver, de forma coerente como o aporte teórico, o seu trabalho na escola. Inferimos que o coordenador pedagógico precisa ter uma posição firme em relação a essa rede de relações em que está imerso. Sua firmeza também exige dele assumir, de fato, qual o seu campo de atuação, quais as suas opções epistemológicas, porque “ser professor, hoje, é recusar as modas, a novidade pela novidade e construir um caminho pedagógico com os colegas, um caminho que busca a sensatez e a coerência” (NÓVOA, 2004, p.28). As professoras ouvidas demonstraram ter algumas dificuldades para acompanhar esse ritmo e dizem que não se sentem com competência para, de fato, mediar uma prática pedagógica que contemple essa fluidez de novas propostas que chegam continuamente à escola. Enfatizam sempre a necessidade do acompanhamento das coordenadoras pedagógicas, no sentido de ajudá-las na organização de sua prática. Desse modo, como o coordenador vai responder a esse chamado diante de uma formação que não o formou para esse contexto diverso e adverso? Os atores da pesquisa fizeram muitas críticas à formação recebida, considerando-a insuficiente como preparação para atuarem na coordenação pedagógica. Nesse sentido, assim, se expressa Ana Júlia: Eu avalio que não houve essa formação; não houve em termos de universidade, não houve em termos de leitura. Eu sou professora, a minha formação é de professora e eu estou na coordenação, tentando ser, continuando a ser professora é como se eu pudesse estar em todas as salas ajudando em todas as salas, mas não existe uma formação específica para Coordenador Pedagógico (Ana Júlia). Para as coordenadoras, a formação inicial no curso de Pedagogia não foi suficiente para a construção de uma compreensão da prática pedagógica da escola, como um todo, bem como da coordenação pedagógica. Assim, é momento de pensar sobre a formação desses profissionais que, na escola, coordenam a ação pedagógica. No eco de suas falas, recuperamos, em meio às suas críticas, o que apontam como Recomendações – relevantes, salientemos – para os cursos que 204 formam profissionais, considerados habilitados para atuarem na coordenação pedagógica. Tais Recomendações podem ser visualizadas no Quadro 3 a seguir.  Embasamento teórico-metodológico consistente sobre as Ciências da Educação.  Estágio Supervisionado duradouro na Coordenação Pedagógica de instituições escolares e não-escolares.  Experiência – como professor - em sala de aula, preferencialmente, no nível em que o formando pretende atuar. Quadro 3 Recomendações aos Cursos de Formação de Coordenadores Pedagógicos  Embasamento teórico-metodológico consistente sobre as Ciências da Educação50 Encontramos nas falas dos sujeitos da pesquisa uma preocupação com a apropriação desses saberes para mediação da prática pedagógica. Para eles, um Embasamento teórico-metodológico consistente sobre as Ciências da Educação é fundamental no exercício da profissão. Na fala, a seguir, observamos como a coordenadora percebe essa necessidade: O coordenador está fora de sala procurando meios para subsidiar as necessidades do trabalho docente. Nesse sentido, eu me sinto uma pesquisadora: fico procurando referências, algumas situações de aprendizagem pra mostrar pro professor que, dessa forma, poderá dar certo pra gente fazer com o aluno. Eu procuro amparo nas teorias da educação para justificar o que estou dizendo, fazendo... (Ana Maria). As professoras evidenciam que o curso de Pedagogia não deu esse embasamento teórico-metodológico consistente. Ana Beatriz mostra, nas suas palavras, tal lacuna na sua formação: 50 Buscamos em Amado e Boavida (2008, p.7) como devem ser compreendidas as Ciências da Educação: “patrimônio de conhecimentos estritamente associados aos diferentes planos em que a própria Educação pode ser perspectivada: filosófico, científico, e praxeológico. 205 Eu acho que o curso de Pedagogia abrange vários setores e não se dedica realmente a uma função específica – nem na teoria, nem na prática. Às vezes, abre muito o leque da formação (na teoria) e não determina realmente (na prática) aquela função, que função é essa, o que vai ajudar realmente o professor, como é que ele pode dar esse apoio. Talvez, o curso deixe muito a desejar (Ana Beatriz). As instituições formadoras precisam refletir sobre a formação que está sendo ministrada, pois os resultados que têm chegado à escola evidenciam a fragilidade dessa formação. Contudo, não desconhecemos os inúmeros desafios colocados para as agências formadoras, uma vez que essas devem continuamente buscar um equilíbrio/conexão entre: • Os dispositivos legais que disciplinam a formação; • O que é produzido pelas ciências da educação; • A prática cotidiana do professor; • A realidade das escolas. As pesquisas realizadas, que têm como objeto de estudo a formação de professores, apontam muitos equívocos nessa formação e vêm mostrando que nem a formação inicial nem a continuada têm dado o embasamento teórico-metodológico consistente, de que se ressentem nossas coordenadoras e professoras. Nessa direção, Ramalho e Nuñez (2002, p.1) destacam: Existe um grande reconhecimento a respeito do fato dos cursos de formação de professores não terem contribuído para formar um/a docente profissionalizado e mais competente que possa dar as respostas aos atuais desafios que requer uma sociedade em constante mudança. Há um movimento globalizado que estuda o que vem acontecendo com a preparação de um novo docente ou com a formação continuada dos já experientes no métier. Fala-se de uma necessária renovação didática-pedagógica e da importância de se explicitar uma base de conhecimentos para o ensino (o que nós chamamos aqui de um saber da ação pedagógica). Neste trabalho, defendemos que, na escola, diretores, coordenadores e professores, todos são educadores. Então, discutir a formação de educadores é 206 discutir a formação desses sujeitos. Mas, defendemos que além de outras atribuições, o coordenador pedagógico na escola também é um formador de professores. Ademais, as agências responsáveis pela formação e o formador desse professor devem estar implicados nesse processo de formação, o que não é tão simples. Formar alguém não é o mesmo que informar. É importante que a formação aconteça numa perspectiva de verticalização de saberes. O sujeito em um contexto de formação/aprendizagem vive um processo de desenvolvimento que irá demandar mudanças endógenas. Esta também é a perspectiva de Garcia (1999, p.19) que, assim, se pronuncia: “A formação pode também ser entendida como um processo de desenvolvimento e de estruturação da pessoa que se realiza com um duplo efeito de uma maturação interna e de possibilidades de aprendizagem, de experiência dos sujeitos”. O momento da formação docente é um momento em que o professor também vive um processo de aprendizagem e sabemos o quão complicado é esse processo, que supõe mudança(s), sucessão de estados, onde a relação entre professor e conhecimento pode ser uma relação difícil, como explicita Tardif (2002, p.41): [...] a relação que os professores estabelecem com os saberes da formação profissional se manifesta como uma relação de exterioridade: as universidades e os formadores universitários assumem as tarefas de produção e legitimação dos saberes científicos e pedagógicos, ao passo que aos professores compete apropriar-se desses saberes, no decorrer de sua formação, como normas e elementos de sua competência profissional, competência essa sancionada pela universidade e pelo Estado. Formar profissionais que deverão, em sua atividade diária, mediar outros processos de formação de pessoas – não é uma tarefa fácil. O professor lida diariamente com a diferença e a individualidade na sala de aula e, na escola como um todo, ele lida com professores/alunos-pessoas que possuem subjetividades. Nessa perspectiva, os cursos de formação precisam pensar propostas formadoras que tenham a reflexão como uma de suas premissas. Esta deve se dar num processo de pensar sobre a prática profissional através de situações-problema 207 variadas. Nossas reflexões encontram apoio em Schön (2000, p.25) que também faz as suas recomendações: [...] as escolas profissionais devem repensar tanto a epistemologia da prática quanto os pressupostos pedagógicos sobre os quais seus currículos estão baseados e devem adaptar suas instituições para acomodar o ensino prático reflexivo como um elemento chave na educação profissional. A mudança tem várias interconexões, e a mediação na formação docente é um desses elementos; pensar sobre ela é também um imperativo para uma formação docente que provoque mudanças nodais na escola. Entender o professor como sujeito que está em processo de construção de conhecimento, e que sua formação de outrora não atende mais às expectativas atuais – da sociedade e dos sujeitos que hoje estão na escola –, deve ser um pressuposto para as instituições que trabalham com formação de professores. As concepções que norteiam o Programa Formativo devem ser coerentes com o trabalho pedagógico dos formadores. Por exemplo, se pretendemos que nossos professores/coordenadores tenham uma concepção construtivista de aprendizagem, sua formação também deve ter essa concepção como sustentação teórico-metodológica, visto que, no momento da formação, o professor/coordenador passa à situação de aprendente, na relação de ensinar/aprender; e o modelo de formador/formação, que o professor irá vivenciar, se refletirá em suas ações em sala de aula e também na escola. Mas, o que se pretende, atualmente, com a formação dos professores? Actualmente [sic], pretende-se que a formação dos professores seja profissional e pessoal permanente, integrativa, construtivista, centrada na análise, que seja auto-formação e ao mesmo tempo co- formação. É este tipo de formação que pode desenvolver as competências profissionais necessárias aos professores, para que estes possam desempenhar os seus novos papéis baseados na atenção, na observação, no diálogo, na disponibilidade, na flexibilidade, na adaptabilidade e na auto-regulação (ALTET, 2000, p.180). 208 Observamos, em alguns momentos da pesquisa, a ausência de uma consistência teórico-metodológica das coordenadoras para desencadearem a reflexão bem como para ajudarem as professoras a fazerem a transposição didática que requer uma sólida inter-relação entre teoria e prática. As coordenadoras pesquisadas reconhecem isso, como nos falam Ana Maria e Ana Júlia, a seguir: A parte dos princípios metodológicos e os procedimentos de ensino – precisamos compreender os princípios de cada disciplina para fazer o casamento, o encaminhamento da proposta de metodologia. O curso de Pedagogia que eu fiz nos anos 70 não deu esse direcionamento e por isso ainda tenho dificuldade para mediar os professores nesse processo. Procuro ler sobre isso, mas ainda sinto dificuldade (Ana Maria). O próprio conhecimento das disciplinas, de metodologias de como trabalhar melhor, matemática, por exemplo, eu acho que se eu tivesse um maior embasamento sobre isso seria mais fácil trabalhar com a Ana Catarina, quando vem assim... já vem com as coisas tão fechadas que a gente não detém esse saber para intervir nesse planejamento; e como é que a gente vai mediar? (Ana Júlia). Ancorada nas palavras dos sujeitos desta pesquisa, recomendamos: uma atuação bem sucedida na coordenação pedagógica está atrelada a uma formação teórico-metodológica bem fundamentada, mormente no âmbito das ciências da educação. O professor que está coordenador e, dessa forma, se configura como professor/coordenador pedagógico, como formador de pessoas adultas carece de uma base sólida de conhecimento no campo da educação de adultos. Todavia, é pertinente destacar que o conhecimento é bastante dinâmico e a pesquisa científica, mesmo na área da educação, tem avançado velozmente. Assim sendo, nenhum curso de formação inicial, por mais consistente e atualizado que possa ser, só o será até um determinado momento, o que evidencia a exigência da formação continuada de qualquer profissional; e, na nossa área, não é diferente. Estudiosos da formação docente de diversos países (NÓVOA, 1992; FREIRE, 1996; GARCIA, 1999; ALTET, 2000; FERREIRA, 2001; TARDIF, 2002; RAMALHO; NUÑEZ, 2002) têm atentado repetidas vezes para a importância da formação continuada do professor, que é imprescindível, embora insuficiente para o desenvolvimento de uma prática pedagógica de boa qualidade. 209 Nesse sentido, o próprio Relatório Delors – “Professores e ensino num mundo em mudança”, com seu título e conteúdo, tem advertido, com veemência, sobre a necessidade e importância da formação continuada dos professores, de quem muito se espera, haja vista que eles “[...] têm um papel central a desempenhar na preparação das novas gerações de modo a que estas possam concretizar as nossas esperanças de um mundo socialmente mais justo, mais tolerante e mais pacífico no próximo século” (MAYOR, 1998, p.5). Além disso, os sistemas de ensino também têm responsabilidades pela atualização dos seus quadros, no mínimo, promovendo incentivos para que os seus professores, incluindo nesse contexto, coordenadores e diretores, sintam-se motivados a retornarem às agências formadoras. Tomando como exemplo os estudos na área da alfabetização, aqueles que concluíram seus cursos de graduação, ou mesmo de pós-graduação, até o início da década de 1980, talvez, não tenham tido a oportunidade de estudar na Universidade a Psicogênese da Língua Escrita – construída por Emilia Ferreiro, Ana Teberosky e colaboradores, haja vista que, só em 1985, é que foi publicado, pela primeira vez no Brasil, o seu livro que trata do assunto, com pormenores. É inegável que as universidades têm a responsabilidade de formar profissionais da educação que, na instituição educativa, possam se desincumbir com competência das funções atribuídas ao coordenador pedagógico. Dentre tais funções, é exigido dele que também assuma o papel de formador de professores, cujas especificidades da formação vão depender do nível e área de ensino em que atuam os professores, por ele coordenados – o que não é fácil – no contexto de tantas exigências que se faz aos formadores de professores – e com o coordenador pedagógico não deve ser diferente.  Estágio Supervisionado duradouro na Coordenação Pedagógica de instituições escolares e não-escolares No corpus da nossa pesquisa, evidenciamos uma forte crítica à formação do docente desvinculada da prática. Para Ana Beatriz, por exemplo, o estágio supervisionado deveria ter uma maior duração e acontecer na coordenação pedagógica de uma instituição escolar. 210 Observamos que as palavras da professora, construídas nas suas vivências, encontram eco em Gómez (1995, p.108) para quem, “o fracasso reside do abismo que divide teoria e prática; esta é o ‘cenário’ próprio de atuação da teoria, por isso elas precisam estar sempre inter-relacionadas”. Tardif (2002, p.241), por sua vez, reforça esse pensamento quando aponta como um paradigma futuro na formação docente, o reconhecimento do conhecimento prático. Nesse sentido, diz o autor, que os currículos da formação docente terão que dar maior importância a esse conhecimento e, para isto, os práticos terão um espaço maior. Concordamos com a importância das vivências prévias da relação teoria/prática para a formação profissional. Para isto, uma das providências bastante interessante é a realização do estágio supervisionado também em coordenações pedagógicas, como nos apontaram os sujeitos da pesquisa. Em oportunidades dessa natureza, o aluno de Pedagogia poderá sentir e refletir sobre as demandas do “lugar” do Coordenador – os problemas que enfrenta; o que se exige dele; o papel de formador que deverá assumir; os saberes requeridos pela ação, dentre outras. O iniciante na profissão precisa viver a experiência de ser coordenador com aqueles mais experientes na profissão, antes de sê-lo. Vivenciar as dificuldades vividas diariamente pelos coordenadores pedagógicos, de quem é exigido em um único dia de trabalho, atender pais, alunos, professores, saber agir na urgência, resolvendo problemas inesperados do cotidiano, quebrando, muitas vezes, num minuto, todo um planejamento que levou dias para ser construído. Isso tudo porque “[...] o dia de um coordenador pedagógico é repleto de acontecimentos variados, superpostos e imprescindíveis. A cada nova situação, a cada novo fato, ele é chamado a acionar um ou mais de seus saberes e a construir novos” (ANDRÉ; VIEIRA, 2006, p.17). As experiências que vivemos em nossas vidas desde o ambiente familiar, a escola, a vizinhança, enfim, nosso ambiente sociocultural vão contribuindo para o nosso vir-a-ser na profissão escolhida. Freire (apud FERNANDES, 1998, p.140) sublinha: “o que eu sei, sei com meu corpo inteiro”. Desse modo, ao entrar no mundo do trabalho, como neófitos na profissão, necessitamos do conhecimento prático que, mediado pelo conhecimento teórico e por nossas histórias de vida, nos ajudarão a criar melhores condições de nos tornarmos professores e/ou coordenadores pedagógicos. 211 Para Goodson (1992, p.71-72), as manifestações vividas no nosso meio – cultural, social, profissional – são determinantes para a pessoa que nos tornamos e, conseqüentemente, para a nossa prática pedagógica. Para ele, os investimentos que fazemos no nosso ‘eu’ repercutem nos nossos campos de atuação. Porquanto, um curso de Pedagogia que estabeleça relações entre teoria e prática, oportunizando a inserção do aluno em ambientes profissionais – escolares e não-escolares – onde poderá atuar futuramente, cria situações propícias para reflexão desse futuro profissional sobre as demandas da profissão, no caso específico, a coordenação pedagógica. Nesse sentido, é interessante que, na volta desses alunos dos estágios, sejam propiciados momentos para relatos das experiências vividas, onde eles possam trocar suas experiências exitosas ou não. Para Dominicé (apud MOITA, 1992, p.117) “a pesquisa em matéria de educação, concretamente quando se inscreve no terreno da educação de adultos não pode dispensar o saber do interlocutor”. Outra estratégia que se coaduna com o estágio são momentos que podem ser proporcionados pelas universidades, onde convidem coordenadores pedagógicos para compartilharem suas experiências junto aos alunos, que aprenderão também com a experiência do outro. “A palavra dos professores, o seu depoimento não são exemplo ou ilustração de uma idéia, mas a sua concretização. Se a linguagem é polissêmica, polifônica, e as muitas vozes (nossas e deles) revelam que a autoria é sempre social e coletiva” (KRAMER; JOBIM e SOUZA, 1996, p.40). Essa sugestão descrita acima parte dos resultados da pesquisa que desenvolvemos no Mestrado (BEZERRA, 2005), onde evidenciamos que os professores destacam a importância que os colegas mais experientes tiveram na sua formação de professor da EJA. Nesse mesmo sentido, Goodson (1992, p.72) enfatiza: Uma característica comum do ambiente sociocultural colhida das narrativas dos professores é o aparecimento de um professor preferido que influenciasse, de modo significativo, a pessoa enquanto jovem aluno. Relatam, muitas vezes, que: ‘Foi esta a pessoa que, pela primeira vez, me fez aderir ao ensino’. [...] Em conclusão, tais pessoas fornecem um modelo funcional e, para além disso, 212 influenciaram provavelmente a visão subseqüente da pedagogia desejável. Tardif (2002), igualmente, destaca a importância do relacionamento dos professores experientes com os professores iniciantes e diz que, nessas situações, os saberes da experiência são evidenciados. Então, o estágio supervisionado duradouro na coordenação pedagógica de uma instituição, recomendado aos cursos de formação desses profissionais, se apresenta, a partir das reflexões empreendidas e à luz da teoria, como experiência fundamental para a formação do coordenador. No âmbito dessa discussão, encontramos a notícia de que, atualmente, existe um Projeto de Lei de autoria do senador Marco Maciel que propõe a criação da residência pedagógica para oferecer aos professores iniciantes uma proximidade com a realidade escolar, logo ao final do curso de Pedagogia ou das demais licenciaturas, o que poderia ser ampliado para a direção e coordenação pedagógica, instâncias em que o Pedagogo também poderá ter inserção profissional. Vejamos o que nos informa Didonê (2007, p.26): Um importante projeto de melhoria da formação docente está tramitando no Senado. Se aprovado, vai criar a chamada residência pedagógica – um programa de capacitação inicial fortemente baseado em atividades práticas e inspirado no que já ocorre com a carreira médica. Os habilitados em Pedagogia, sob a supervisão de profissionais mais experientes, passarão por uma especialização obrigatória na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. E os licenciados terão a opção de fazer ou não a residência (DIDONÊ, 2007, p.26). Pensamos que essa proposta pode vir a ser um caminho para que se estabeleçam, de fato, conexões entre teoria e prática, relações de trocas entre iniciantes e experientes na profissão, a partir do “chão” da escola real, seja como professor, coordenador ou diretor. Apesar de nos parecer importante essa proposta, defendemos que ela seja construída, discutida no âmbito do curso de Pedagogia. O contorno de uma residência no campo da educação não pode ser pensada dentro de 213 uma lógica do campo médico, por exemplo. Também compreendemos que não é a residência, por si só, que irá garantir a qualidade da formação.  Experiência - como professor - em sala de aula, preferencialmente, no nível em que o formando pretende atuar Uma terceira recomendação dos sujeitos da pesquisa é a ‘experiência como professor em sala de aula, preferencialmente, no nível em que pretende atuar’; consideramos essa experiência de fundamental importância para a formação docente, uma vez que se torna bastante difícil falar de algo, orientar sobre algo – que nunca vivemos plenamente. As coordenadoras pesquisadas têm experiência docente anterior em sala de aula com EJA e destacam que essa experiência tem sido muito significativa para seu trabalho de coordenação. Para Ana Júlia –, que fez severas críticas à sua formação, alegando que esta não deu conta das competências de um coordenador pedagógico –, é a sua experiência anterior de sala de aula o que ela tem de mais valioso para respaldar o seu trabalho junto aos professores. Eu acho que a única coisa que eu tenho é a experiência docente que facilita na hora em que eu vou trabalhar com os professores. Quando eu vou sugerir alguma coisa, vou com maior embasamento e aí quando há uma recusa, quando há uma resistência, eu consigo desarmar mais fácil, porque eu já fiz, e eu não estou sugerindo em cima do nada, eu tô sugerindo em cima de uma realidade vivida. Também o conhecimento dos alunos daquele grupo; aí permanece por muito mais tempo; então, aluno tal, eu sei como funciona, funciona desse jeito, aluno tal, então isso ajuda muito (Ana Júlia). Concordamos com as professoras sobre a importância da prática como dimensão significativa da formação. Estar na sala de aula é muito desafiador, complexo, o que não significa dizer que toda vivência como professor é generalizável. Os alunos que estão na escola, hoje, são muito diferentes dos alunos que fomos e, por mais que nos preparemos, só iremos sentir o quanto é difícil ser professor numa escola da periferia urbana, quando estivermos lá – com alunos que 214 já estão no mundo do crime, já vivenciaram sucessivos fracassos na sua experiência escolar ou que não puderam estudar no momento adequado, com problemas familiares e muitos deles não dispõem das míninas condições de existência. Nos bancos universitários, vemos isso teoricamente, até fazemos uma boa leitura do que ou condiciona essas condições e teorizamos sobre uma prática a ser desenvolvida com um aluno imaginário. Mas, quando nos defrontamos com esse aluno real, o que faremos para que ele, apesar de suas condições de vida, sinta-se motivado para aprender e tenha sucesso escolar? Isso ainda não aprendemos!... Os teóricos, cientistas e pesquisadores da educação que alimentam os “reservatórios de saberes” para serem ensinados aos professores, muitas vezes, nunca entraram numa sala de aula ou vivenciaram a dinâmica de uma escola, adverte Tardif (2002, p.241). Temos a convicção de que, sem essa vivência, esse conhecimento é morno e não consegue encantar os que dele fazem uso: professores e coordenadores. As teorias devem vir encarnadas de prática; só assim, adquirem propriedade na sua propagação. O autor que temos trazido para esta discussão, por concordarmos com muitas das suas proposições, alude que, [...] na formação de professores, ensinam-se teorias sociológicas, docimológicas, psicológicas, didáticas, filosóficas, históricas, pedagógicas, etc., que foram concebidas, a maioria das vezes, sem nenhum tipo de relação com o ensino nem com as realidades cotidianas do ofício de professor. Além do mais, essas teorias são, muitas vezes, pregadas por professores que nunca colocaram os pés numa escola ou, o que é pior, que não demonstraram interesse pelas realidades escolares e pedagógicas, as quais consideram demasiado triviais ou demasiado técnicas. Assim, é normal que as teorias e aqueles que as professam não tenham, para os futuros professores e para os professores de profissão, nenhuma eficácia nem valor simbólico e prático (TARDIF, 2002, p.241). Como professora que somos, sabemos que os contextos de trabalho se diferenciam em relação aos sujeitos que lá estão: professores, alunos, funcionários. Igualmente, a cultura da comunidade onde a escola está situada precisa ser considerada: se é periférica, rural ou urbana, pois estes elementos mobilizam ações específicas para as quais os cursos de formação precisam estar atentos. 215 Outra característica da EJA é a questão de ser uma população-alvo bastante diferente dos alunos que cursam o ensino fundamental, ou médio, sem apresentar distorção idade/série: sua inserção no mundo do trabalho e modo de atuação na sociedade conferem aos jovens e adultos uma gama de experiências e conhecimentos. Dados esses fatores, os interesses desse público são outros, que não os interesses dos referidos alunos do ensino fundamental. Por esta e outras razões, a experiência de sala de aula, e preferencialmente no nível em que o licenciando pretende atuar como coordenador pedagógico – o que é muito difícil prever – se faz bastante pertinente para um desempenho satisfatório da profissão. A educação ainda é uma das atividades humanas que requer um forte componente artesanal e, na ação, reconhecemos os preceitos necessários a essa arte. Desse modo, a vivência pessoal torna-se um componente essencial para compor o artesanato. É a vivência pessoal que vai burilando a estética necessária e exige do sujeito, responsável pela ação, respeito pelo outro, além de um grande investimento na sua capacidade criadora, “cuidando para que a decência e a boniteza estejam sempre de mãos dadas” (FREIRE, 1996, p.36). Uma fala bastante recorrente dos atores é que o coordenador pedagógico para atuar no nível I, que corresponde mais especificamente à alfabetização, precisa ter experiência docente, em sala de aula, naquele nível onde vai atuar. Ana Júlia faz uma declaração ímpar a esse respeito quando nos conta que “foi no trabalho diário em sala de aula, nas discussões, nos grupos, no contato com os alunos, que percebi as necessidades deste segmento de ensino e realizei minhas maiores aprendizagens”. Ana Maria diz que a experiência de sala de aula dá consistência a sua fala junto ao professor, pois ela fala a partir de uma realidade vivida. A sua fala tem sustância porque “as coisas que eu proponho têm base no chão da sala de aula, pois já convivi com os mesmos problemas, medos, com os desafios vividos pelo professor alfabetizador” (Ana Maria). Após a apresentação dessas recomendações caminhamos para o final do nosso trabalho. Aqui, queremos ressaltar que na construção desta Tese, tivemos uma tarefa por demais complexa: investigar os saberes da ação requeridos do coordenador pedagógico na mediação/orientação da prática pedagógica de 216 professores alfabetizadores de jovens e adultos, tarefa esta que nos mobilizou a percorrer vários caminhos para a sua consecução. Mergulhamos no mundo da vida profissional do coordenador pedagógico, no mundo real do seu fazer na escola. Assim, temos a sensação do dever cumprido. Ressaltamos que a metodologia utilizada – estudo de caso – nos aportou para a imersão no objeto de estudo, de modo a apreender valiosas respostas à nossa questão de pesquisa. A análise de conteúdo nos proporcionou a apreensão de um arcabouço de saberes, e nos fez inferir recomendações – aos cursos destinados a formar coordenadores pedagógicos. O olhar da pesquisa aponta que, além dessas características específicas da profissão, é muito importante o aperfeiçoamento do lado humano desse profissional que precisa ter muita sabedoria, sensibilidade e afetividade na sua atividade, a fim de estabelecer e alimentar o canal de comunicação com o professor para (com)partilhar a agradável, mas difícil tarefa de educar. Concluímos que o coordenador pedagógico é um profissional que vai se constituindo nas práticas escolares; sua identidade profissional ainda não está definida quanto ao seu campo real de atuação. O campo teórico que dialoga com o fazer desse profissional ainda carece de uma constituição. Neste trabalho, fizemos a opção de utilizar uma abordagem multirreferencial, mesmo porque o trabalho desse profissional, como vimos, é um trabalho que não pode se enquadrar dentro de uma mesma perspectiva epistemológica. A dinâmica organizacional demanda uma série de saberes que não permite que este se enquadre dentro de um só quadro teórico. Tem momentos que ele precisa ser pragmático na resolução de problemas, dialógico quando reflete, discute, estuda com o professor; em outros momentos, é humanista na perspectiva do respeito, da colaboração e, outras vezes, deve ter uma postura crítica, questionadora da realidade vivida pela escola. Compreendemos que esse olhar num horizonte multirreferencial nos ajuda a “uma aproximação da opacidade e da complexidade próprias dos fenômenos sociais – mais especificamente, os educativos, características estas que, no âmbito do paradigma cartesiano, são desconsideradas” (MARTINS, 1998, p.31). Nesse momento, colocamos o nosso trabalho de tese no mundo, um mundo humano, onde precisamos do outro para nos completar, para contribuir, para nos 217 retocar, aperfeiçoar. Ela já não nos pertence mais, pois, que possa servir, de alguma maneira, a todos que a visitarem. Esta pesquisa, tão cuidadosamente tecida por nós, não terá sentido se não contribuir para uma reflexão acerca do papel do coordenador pedagógico na escola. Assim sendo, uma reflexão nos vem, ao tentar fechar, mesmo que provisoriamente, essa discussão: Para quem pesquisamos? Para quem escrevemos? Acreditamos que precisamos, cada vez mais, como pesquisadores no campo da educação, nos aproximar da escola, pois é pensando nessa escola que pesquisamos no campo da educação. Para Garcia (2003, p.21), precisamos refletir se “Pesquisamos para a academia e para as agências de fomento ou para as escolas, onde a complexidade da realidade desafia a cada competência docente? Quem, afinal, se beneficia com nossas pesquisas?”. Desde a nossa primeira pesquisa, tínhamos a clareza de que, como professora da escola pública, o trabalho teria que ter como foco esta escola; deveria ser gestado no chão dessa escola, no sentido de proporcionar aos leitores um encontro com algumas das dificuldades e possibilidades para a construção da escola pública com qualidade social para todos os seus usuários. Ao mesmo tempo, sentíamos que o nosso compromisso com a escola pública se tornava maior, na medida em que estávamos nos doutorando numa Universidade Pública. Com toda esta responsabilidade, queríamos imprimir na nossa pesquisa o compromisso social de contribuir para a melhoria da escola pública porque comprometidas com a luta em defesa da escola pública e, porque comprometida nesta luta, conscientes de que nossa luta passa pela construção coletiva de uma escola pública de qualidade, construção que exige um diálogo permanente, generoso, profícuo e corajoso entre a universidade e a escola (GARCIA, 2003, p. 20). Fazemos parte do grupo que olha para esse mundo com olhares de esperança, entusiasmo e paixão. Esse olhar se dá com a crítica, a ética e a coerência sendo parceiras desse olhar. Assim sendo, acreditamos sim, que um dos caminhos para a construção da escola pública que desejamos – é a pesquisa acadêmica. Esta pode ser um profícuo caminho para nos ajudar a construir um olhar crítico, embasado na real situação da escola. 218 Durante a realização desta pesquisa, vivemos um grande desafio: ser professora da Escola Emília Ramos, apesar de afastada das nossas atividades docentes. Ao término da pesquisa, concluímos que a familiaridade com o espaço físico e social da Escola nos ajudou bastante na abordagem do objeto. Assim, a experiência naquele espaço pôde nos apontar alguns caminhos possíveis para a construção da profissionalidade do coordenador pedagógico na escola pública. Pensamos que parcelas de conhecimentos, vivências e sentimentos com o objeto de estudo podem contribuir para o sucesso da pesquisa. “Bebemos” das sábias orientações de Paulo Freire e, dessa forma, acreditamos que [...] é impossível conhecer rigorosamente com desprezo à intuição, aos sentimentos, aos sonhos, aos desejos. É o meu corpo inteiro que, socialmente, conhece. Não posso, em nome da exatidão e do rigor, negar meu corpo, minhas emoções, meus sentimentos. Sei bem que conhecer não é adivinhar, mas conhecer passa também por adivinhar. O que não tenho direito a fazer, se sou rigoroso, sério, é ficar satisfeito com minha intuição. Devo submeter o objeto dela ao crivo rigoroso que merece, mas jamais desprezá-la. Para mim, a intuição faz parte da natureza do processo do fazer e do pensar criticamente o que faz [...] entender a realidade que inclui não somente o momento de reflexão, mas o momento empático de compreensão e de sentimento com o resto das pessoas que você está tentando compreender (FREIRE apud FERNANDES, 1998, p.140). Nesse sentido, não abrimos mão neste trabalho das nossas crenças, dos nossos sentimentos e dos nossos sonhos. Temos um sonho. A inclusão social/escolar de toda a classe popular que procura a escola. Vamos contribuindo com esse sonho, aqui do nosso lugar – seja pesquisando ou sendo professora. Enquanto esse sonho não se realiza, a atitude de impotência não deve ser entendida como saída; como Paulo Freire, pensamos que há condicionantes e não determinantes sociais; todavia, pensamos também que, na luta contra os condicionantes, podemos mais do que achamos que podemos. Entendemos que agir dentro da escola é também agir na sociedade. Assim, podemos construir uma prática pedagógica com sucesso, apesar das adversidades, pois “a esperança reside, agora como sempre, em nossa inteligência e em nossa vontade coletiva” (FERREIRA, 2001, p.101). 219 A escola pesquisada – Emília Ramos – já está nos trilhos dessa construção, apesar de ainda ter um longo caminho a percorrer. Um diferencial dessa construção é a formação de seus professores na Escola e o coordenador pedagógico é o mobilizador dessa ação. Todo o conhecimento que sistematizamos sobre os saberes e fazeres do coordenador pedagógico foi apreendido da prática real que acontece naquela escola, reafirmando a Tese de que: a ação do Coordenador Pedagógico, na escola, demanda saberes e fazeres da ação pedagógica; estes adquirem especificidades no exercício da mediação/orientação da prática pedagógica de professores alfabetizadores de jovens e adultos. Uma das preocupações que tivemos, durante todo o trabalho, foi fazer uma leitura crítica do papel desempenhado pelo coordenador pedagógico na escola e, assim, contribuir para uma reflexão sobre a importância desse profissional na mediação da prática alfabetizadora de jovens e adultos. Desejamos, ainda, compreender, cada vez mais, que essa mediação é uma alternativa possível para ressignificação dos conhecimentos, dos conflitos sócio-afetivos bem como no redimensionamento das estratégias metodológicas da prática docente. Nesse sentido, Romão (2000, p.65), destaca que: “[...] as grandes transformações não se dão apenas como resultantes dos grandes gestos, mas de iniciativas cotidianas, simples e persistentes”. Sabemos que este trabalho tem contribuições a oferecer, mas sabemos também que as suas limitações existem, embora o esforço para superá-las tenha sido muito grande. Mesmo assim, esperamos que o nosso estudo – que traz alguns dos saberes transversais e específicos da ação do coordenador pedagógico – possa contribuir para ampliar a discussão em torno do papel desse profissional na escola – que desejamos pública, democrática e com qualidade social. Tivemos um cuidado enorme com a cientificidade do nosso trabalho, mas também tivemos muito cuidado para que, esta cientificidade não tornasse o trabalho “pesado”, impedido de “tocar” as pessoas, sobretudo coordenadores e professores porque 220 [...] nada do que vivemos tem sentido, se não tocarmos o coração das pessoas. E isso não é coisa de outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja nem curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira, pura enquanto durar. Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina. (CORA CORALINA). 22 2 REFERÊNCIASREFERÊNCIASREF ERÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊ NCIASREFERÊNCIASREFERÊNCI ASREFERÊNCIASREFERÊNCIASR EFERÊNCIASREFERÊNCIASREFE RÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊ NCIASREFERÊNCIASREFERÊNCI ASREFERÊNCIASREFERÊNCIASR EFERÊNCIASREFERÊNCIASREFE RÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊ NCIASREFERÊNCIASREFERÊNCI ASREFERÊNCIASREFERÊNCIASR EFERÊNCIASREFERÊNCIASREFE RÊNCIASREFERÊNCIASREFERÊ NCIASREFERÊNCIASREFERÊNCI ASREFERÊNCIASREFERÊNCIASR EFERÊNCIASREFERÊNCIASREFE Se uma pessoa pode colocar em prática cinco coisas em qualquer parte do mundo, ela é um ser humano. “posso saber que coisas são essas?” – perguntou Zizhang. E Confúcio respondeu: “Respeito, generosidade, sinceridade, perseverança e bondade. Se uma pessoa age com respeito, ela não será insultada. Se é generosa, conquistará o povo, se é sincera, ela merecerá confiança das pessoas. Se é perseverante realizará grandes dias. Se é bondosa, será capaz de influenciar os outros (CONFÚCIO apud FERREIRA, 2001, p.100-101). 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Nome (opcional): 2. Naturalidade: 3. Sexo M ( ) F ( ) 4. Faixa Etária: ( ) 29 a 38 anos ( ) 39 a 48 anos ( ) 49 a 58 anos 5. Escolaridade Ensino Médio: ( ) Magistério ( ) Sim ( )Não ( ) Outro(s) Qual(is)? Ensino Superior: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? Especialização: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? Mestrado e Doutorado: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? 6. Tempo de serviço como professor: 7. Tempo de serviço na EJA: 8. Nível em que atua: ( ) 1º Nível ( ) 2º Nível 9. Vínculo empregatício de trabalho em outro horário: ( ) Estado ( ) Outro 10. Vínculo empregatício na Escola Emília Ramos: ( ) Efetivo ( ) Serviço Prestado 12. Jornada de trabalho, por escola em que trabalha: 13. Função que exerce no vínculo extra Emília Ramos: ( ) Professor(a) ( ) Coordenador(a) pedagógico(a) ( ) Administrativo 14. Função que exerce no vínculo extra Emília Ramos: 15. Quantidade de horas semanais dispensadas nas diferentes atividades da Escola Emília Ramos: • Planejamento: ____ • Sala de aula: ____ • Reuniões pedagógicas: ____ • Tarefas burocráticas: ____ • Estudos: ____ • Outros: ____ Especifique: 240 16. Quantidade de horas semanais dispensadas nas diferentes atividades fora da Escola Emília Ramos: • Planejamento: ____ • Tarefas burocráticas: ____ • Estudos: ____ • Outros: ____ Especifique: 18. Das formações abaixo relacionadas a qual você atribui maior importância no seu desempenho como coordenador pedagógico na EJA (enumere por ordem de importância): ( ) Formação inicial (magistério, outros) ( ) Formação em nível superior ( ) Outros (Quais)? Explique porque 241 APÊNDICE D Questionário de caracterização dos atores da pesquisa – Coordenador – 1. Nome (opcional): 2. Naturalidade: 3. Sexo M ( ) F ( ) 4. Faixa Etária: ( ) 29 a 38 anos ( ) 39 a 48 anos ( ) 49 a 58 anos 5. Escolaridade Ensino Médio: ( ) Magistério ( ) Sim ( )Não ( ) Outro(s) Qual(is)? Ensino Superior: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? Especialização: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? Mestrado e Doutorado: ( ) Sim ( )Não Se Sim, qual? 6. Tempo de serviço como professor: 7. Tempo de serviço como coordenador: 8. Tempo de serviço na EJA: 9. Tempo de serviço como coordenador da EJA: 10. Nível em que atua: ( ) 1º Nível ( ) 2º Nível 11. Vínculo empregatício de trabalho em outro horário: ( ) Estado ( ) Outro 12. Vínculo empregatício na Escola Emília Ramos: ( ) Efetivo ( ) Serviço Prestado 13. Jornada de trabalho, por escola em que trabalha: 14. Função que exerce no vínculo extra Emília Ramos: ( ) Professor(a) ( ) Coordenador(a) pedagógico(a) ( ) Administrativo 15. Função que exerce no vínculo extra Emília Ramos: 16. Quantidade de horas semanais dispensadas nas diferentes atividades da Escola Emília Ramos: • Planejamento: ____ • Coordenação: ____ • Reuniões pedagógicas: ____ • Tarefas burocráticas: ____ • Estudos: ____ • Outros: ____ Especifique: 242 17. Atividades de formação continuada (Cursos/Seminários/Congressos/Jornada) de que participou nos últimos 02 anos. Citar temas trabalhados: 18. Que atividade de formação continuada foi mais relevante para sua ação de coordenador pedagógico da EJA? 19. Das formações abaixo relacionadas a qual você atribui maior importância no seu desempenho como coordenador pedagógico na EJA (enumere por ordem de importância): ( ) Formação inicial (magistério, outros) ( ) Formação em nível superior ( ) Outros (Quais)? Explique porque 243 APÊNDICE E Entrevista – Professor 1. O profissional da coordenação pedagógica na visão dos professores 1.1 Como você descreveria um bom coordenador? 1.2 Esse perfil elencado é possível? Como? 1.3 Você conhece coordenador pedagógico com esse perfil? 1.4 Você acha que os coordenadores estão preparados para uma atuação bem sucedida junto ao professor? 1.5 Que recomendações você daria aos cursos direcionados a formar coordenadores pedagógicos? 1.6 Como você analisa o envolvimento do coordenador com questões pedagógicas/administrativas/burocráticas? 2. O coordenador pedagógico da EJA: um olhar do professor do Emília Ramos 2.1 Como você vê a função do coordenador pedagógico da Escola Emília Ramos? 2.2 Como você analisa o trabalho do coordenador da EJA na Escola Emília Ramos? 2.3 Na sua opinião, na Escola Emília Ramos os coordenadores desempenham as funções que você considera importante na atividade do coordenador pedagógica da EJA? Se SIM/NÃO explique por quê. 2.4 Você se sente apoiado pelo coordenador pedagógico em relação ao ser professor da EJA na Escola Emília Ramos 2.5 Como foi sua chegada na EJA? 2.6 Como a coordenação lidou com sua história de vida/experiência que você trouxe, de modo que você seguisse os princípios do projeto da Escola? 2.7 Como o coordenador deve mediar as dificuldades do professor em relação a: • Planejamento • Avaliação • Didática da alfabetização 2.8 Como mediar os conflitos aluno/professor? 2.9 O que você considera prioritário no trabalho de coordenador pedagógico da EJA? 2.10 Quais as pessoas marcantes na sua formação de professora da EJA? 2.11 Porque elas foram marcantes? 2.12 Qual o papel que a Escola Emília Ramos teve na sua formação de professor da EJA e na sua formação de alfabetizador de jovens e adultos? 244 2.13 Como você contribui para o sucesso do trabalho pedagógico na Escola? 2.14 Como é trabalhada a afetividade junto ao grupo na Escola? Você acha que esse trabalho contribui para bons resultados junto ao grupo? 2.15 Quais os saberes que o professor precisa ter para um melhor desempenho como professor da EJA? 3. O coordenador pedagógico e sua importância na formação do professor alfabetizador da EJA 3.1 Para você, qual o papel do coordenador pedagógico no bom desempenho do professor alfabetizador da EJA? 3.2 Que saberes/competências o coordenador pedagógico da EJA deve ter para mediar a ação docente do professor alfabetizador? 3.3 Na Escola Emília Ramos, os coordenadores da EJA possuem esses saberes? 3.4 Quais as maiores dificuldades na sua ação docente na alfabetização de jovens e adultos? 3.5 Como o coordenador pode contribuir para a superação dessas dificuldades? 3.6 Como você analisa suas concepções/saberes sobre a EJA antes e depois desta Escola? 3.7 Qual o papel da coordenação nesse processo? 3.8 Como é o acompanhamento da prática pedagógica dos professores que trabalham especificamente com alfabetização? 3.9 Na sua opinião, o que dificulta o trabalho do coordenador para acompanhar a prática docente do professor alfabetizador da EJA? 3.10 Como deve acontecer o acompanhamento da aprendizagem da alfabetização dos alunos, pelo coordenador? Para fechar • Que expectativas você tinha dessa entrevista? • Que comentários você faria sobre os saberes/fazeres do coordenador pedagógico que trabalham com alfabetização de jovens e adultos? 245 APÊNDICE F Entrevista – Coordenador 1. Ser coordenador pedagógico 1.1 Como você se vê nessa função? 1.2 Qual o seu papel? Você acha que cumpre? 1.3 O que você considera prazeroso/significativo nessa função? 1.4 Que características deve apresentar um bom coordenador? 1.5 Você se enquadra nesse perfil? 1.6 Que sugestões em termos de conteúdo e procedimentos metodológicos você daria para cursos direcionados a formar coordenadores pedagógicos? 1.7 Como você lida com as questões administrativas? Horário de professor, sistemática do trabalho? 1.8 O que você sabe 1.9 O que você ... que a ajuda no seu trabalho de coordenadora pedagógica? não sabe 1.10 Como você avalia o seu processo de formação em relação ao trabalho que desempenha - coordenador pedagógico? ...que lhe faz voltar no seu trabalho de coordenação pedagógica? 1.11 Como você analisa o seu trabalho em relação à mediação da atividade docente? 2. Ser coordenador pedagógico na Escola Emília Ramos 2.1 Como você se tornou coordenadora pedagógica da Escola Emília Ramos? O que foi fundamental/essencial? 2.2 Qual o papel que a Escola Emília Ramos teve na sua formação de coordenador pedagógico? 2.3 Como você analisa o trabalho do coordenador pedagógico nesta Escola? 2.4 Quais as grandes preocupações da coordenação pedagógica da Escola Emília Ramos? 2.5 Especificamente – com relação ao professor quais as preocupações do coordenador pedagógico da Escola? 2.6 E com relação ao aluno? O que lhe preocupa, como coordenador pedagógico? 3. Coordenar o trabalho pedagógico na EJA 3.1 Existem pessoas que foram marcantes na sua formação de coordenadora pedagógica da EJA? Se sim ... Por que elas foram marcantes? 246 3.2 Alguma coisa interfere no seu trabalho de coordenador pedagógico? Se sim ... o que e como interfere? 3.3 Que autores/leituras têm sido importantes na sua formação de coordenador pedagógico da EJA? 3.4 Quais as suas maiores dificuldades na função de coordenador pedagógico da EJA? 3.5 Que estratégias você tem utilizado para superar as suas dificuldades? 3.6 Em relação a sua experiência em sala de aula (caso tenha) que importância você atribui a essa experiência para o seu desempenho, como coordenador da EJA? Explique por quê. 3.7 Como você lida com a evasão na EJA? 3.8 Como é o acompanhamento do trabalho desenvolvido pelos professores que trabalham especificamente com alfabetização? 3.9 Você sente alguma dificuldade para acompanhar esse trabalho? Se sim, quais? Você utiliza alguma estratégia para superar essas dificuldades? Se sim, quais? Essas estratégias são eficazes? 3.10 O que você considera prioritário no trabalho de coordenador pedagógico da EJA? 3.11 Você focaliza essas prioridades? 3.12 O que você sabe 3.13 O que você – que facilita o seu trabalho de coordenador pedagógico da EJA? não sabe – que dificulta o seu trabalho de coordenador pedagógico da EJA? 4. Ser coordenador pedagógico e mediar saberes/fazeres do professor e do aluno 4.1 Para você, qual o seu papel no bom desempenho do professor alfabetizador da EJA na Escola? 4.2 De acordo com a sua experiência, o coordenador pedagógico que trabalha com os professores alfabetizadores de jovens e adultos precisa de uma formação específica para trabalhar com esses professores? 4.3 Que saberes/competências o coordenador pedagógico da EJA deve ter para mediar a ação docente do professor alfabetizador? 4.4 E quais os saberes que o professor precisa ter para um melhor desempenho como professor da EJA? 4.5 Que avaliação você faz da prática pedagógica dos professores que trabalham com alfabetização de jovens e adultos? 247 4.6 Como você lida na formação do professor alfabetizador novo com a história de vida/experiência que ele traz de modo que ele trabalhe seguindo os princípios do projeto da Escola? 4.7 Como intervir nas concepções dos docentes que não estão em consonância com a proposta da Escola? 4.8 Como acontece o acompanhamento da aprendizagem dos alunos? 4.9 Como mediar as dificuldades do professor em relação a: • Planejamento • Avaliação • Didática da alfabetização 4.10 Como é trabalhada a queixa do professor - que encaminhamentos são dados? 4.11 Como mediar os conflitos aluno/professor Para fechar... • Que avaliação você faz do papel do coordenador pedagógico, atualmente, nas escolas do município de Natal? • E na Escola Emília Ramos, qual a especificidade desse papel? • Como você analisa a importância do papel do coordenador pedagógico para uma prática pedagógica bem sucedida em termos de alfabetização de jovens e adultos? • Que comentários você faria sobre os saberes/fazeres do coordenador pedagógico que trabalha com os professores alfabetizadores de jovens e adultos? 248 APÊNDICE G TERMO DE AUTORIZAÇÃO52 Autorizo a realização da pesquisa intitulada A tecitura da ação do Coordenador Pedagógico da EJA: saberes necessários a mediação do trabalho docente em alfabetização realizada na Escola Municipal Professora Emília Ramos. Esta pesquisa constitui uma tese de doutorado ligada ao Programa de Pós- graduação em Educação da UFRN, cujo objetivo será Investigar os saberes docentes requeridos do coordenador pedagógico, como mediador da atividade docente do professor alfabetizador de jovens e adultos. Esta será realizada pela doutoranda Edneide da Conceição Bezerra e orientado pela profa. Dra. Maria Estela Costa Holanda Campelo. A construção dos dados será realizada na própria escola, que consistirá de aplicação de questionários, entrevistas e observações sistemáticas no decorrer de todo o ano de 2006 nos momentos de exercício profissional dos coordenadores pedagógicos da EJA na Escola. Autorizo também a divulgação do nome da escola no estudo. Vale salientar que será garantido o anonimato dos professores participantes. Este estudo não trará riscos físicos nem moral aos participantes. Pretendemos que os dados finais da pesquisa tragam uma contribuição à prática pedagógica do coordenador pedagógico no sentido da reflexão acerca dos saberes requeridos na mediação do professor alfabetizador de jovens e adultos. Natal, 4 de maio de 2009 ____________________________________ Responsável pela Escola 52 Utilizamos para autorização no início da pesquisa em 2006 um termo construído pela Escola Municipal professora Emília Ramos – lócus da pesquisa. Para o momento de Defesa da Tese, para formalizar a publicação, fizemos uso do mesmo termo utilizado por MENEZES (2008), fazendo algumas alterações. 249 APÊNDICE H TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO53 Prezado Participante, Obrigado por autorizar sua participação como voluntária da nossa pesquisa. O objetivo da mesma é investigar que saberes da ação pedagógica são requeridos do coordenador pedagógico na mediação/orientação de professores alfabetizadores de jovens e adultos. a) Riscos possíveis e benefícios esperados: Pretendemos que os dados finais da pesquisa tragam uma contribuição à prática pedagógica do coordenador pedagógico no sentido da reflexão acerca dos saberes requeridos na mediação do professor alfabetizador de jovens e adultos bem como, seus resultados sirvam para a investigação científica. Esta pesquisa não oferece nenhum risco para os participantes. b) Procedimentos: Os participantes da pesquisa responderão a questionários e participarão de entrevistas (individuais). Estas serão gravadas para posterior transcrição. Durante todo o período de 2006 nos momentos de exercício profissional dos coordenadores pedagógicos na Escola estaremos realizando observações sistemáticas. c) Acesso às informações A pesquisa será realizada na Escola Municipal Professora Emília Ramos. As pesquisadoras terão acesso aos dados coletados das participantes sem, contudo, violar a confidencialidade necessária. Autorizo também a utilização dos dados obtidos para a realização de trabalhos e apresentação em encontros científicos. Concedo ainda o direito de retenção e uso para quaisquer fins de ensino e divulgação em jornais e/ou revistas científicas do país e do estrangeiro, desde que mantido o sigilo sobre a minha identidade, podendo usar pseudônimos. Estou ciente que nada tenho a exigir a título de ressarcimento ou indenização pela participação nas ações propostas. 53 Utilizamos para autorização no início da pesquisa em 2006 um termo construído pela Escola Municipal professora Emília Ramos – lócus da pesquisa. Para o momento de Defesa da Tese, para formalizar a publicação, fizemos uso do mesmo termo utilizado por MENEZES (2008), fazendo algumas alterações. 250 Caso tiver novas perguntas sobre este estudo, posso chamar Edneide da Conceição Bezerra, no telefone 99672080 para qualquer pergunta sobre os meus direitos como participante deste estudo ou se penso que fui prejudicado pela minha participação, posso entrar em contato com profa. Dra. Maria Estela Costa Holanda Campelo (orientadora da pesquisa) no telefone 3215-3521. As participantes têm liberdade de se recusar a participar da pesquisa e retirar seu consentimento em qualquer momento da pesquisa sem que haja penalização alguma. Todas as participantes receberão uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE. A assinatura desse formulário de consentimento formaliza sua autorização para o desenvolvimento de todos os passos anteriormente apresentados, como também a outras informações que poderão ajudar. Declaro que após ter lido e compreendido as informações contidas neste formulário, concordo em participar desse estudo. E, através deste instrumento, autorizo as pesquisadoras Maria Estela Costa Holanda Campelo e Edneide da Conceição Bezerra a utilizarem as informações obtidas por meio dos questionários, das entrevistas e observações, com a finalidade de desenvolver trabalho de cunho científico na área da Educação. Autorizo também a publicação do referido trabalho, de forma escrita podendo utilizar os resultados da análise. Concedo também o direito de retenção e uso para quaisquer fins de ensino e divulgação em jornais e/ou revistas científicas do país e do estrangeiro, desde que mantido o sigilo sobre a minha identidade, estando ciente de que nada tenho a exigir a título de ressarcimento ou indenização pela minha participação na pesquisa. Eu, _________________________________________, RG__________, declaro para fins de participação na pesquisa, na condição de sujeito objeto da ação, que fui devidamente esclarecido (a) das condições acima citadas e consinto voluntariamente em participar das atividades propostas. 251 APÊNDICE I TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO54 Eu, _________________________________________, RG__________, autorizo o uso do meu nome na pesquisa intitulada A tecitura da ação do Coordenador Pedagógico da EJA: saberes necessários a mediação do trabalho docente em alfabetização. Declaro que fui devidamente esclarecida a respeito do conteúdo em que meu nome será relacionado no texto do trabalho. Natal, 06 de maio de 2009 ____________________________________ Responsável pela Pesquisa ____________________________________ Assinatura do Declarante 54 Este termo foi utilizado para que pessoas que tiveram seus nomes colocados por mim na pesquisa autorizassem a publicação. 22 2 ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN EXOSANEXOSANEXOSANEXOS ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN EXOSANEXOSANEXOSANEXOS ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN EXOSANEXOSANEXOSANEXOS ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN EXOSANEXOSANEXOSANEXOS ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN EXOSANEXOSANEXOSANEXOS ANEXOSANEXOSANEXOSANEX OSANEXOSANEXOSANEXOSAN Anexos 253 ANEXO A 254 ANEXO B 255