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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E
MATEMÁTICA
ANNA KARLA SILVA DO NASCIMENTO
GEOMETRIAS NÃO-EUCLIDIANAS COMO ANOMALIAS:
Implicações para o ensino de geometria e medidas
NATAL-RN
2013
2
ANNA KARLA SILVA DO NASCIMENTO
GEOMETRIAS NÃO-EUCLIDIANAS COMO ANOMALIAS: implicações para o ensino
de geometria e medidas
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática da Universidade Federal do Rio Grande
do Norte como pré-requisito para obtenção do título
de mestre.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Giselle Costa de Sousa
NATAL-RN
2013
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Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / SISBI / Biblioteca Setorial
Centro de Ciências Exatas e da Terra – CCET.
ANNA KARLA SILVA DO NASCIMENTO
Nascimento, Anna Karla Silva do.
Geometrias não-euclidianas como anomalias: implicações para o ensino de
geometria e medidas / Anna Karla Silva do Nascimento. - Natal, 2013.
114 f. : il.
Orientadora: Profa. Dra. Giselle Costa de Sousa.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro
de Ciências Exatas e da Terra. Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática.
1. História da matemática – Dissertação. 2. Geometria não-euclidiana –
Dissertação. 3. Ensino de geometria – Dissertação. 4. Anomalia – Dissertação. 5.
Investigação matemática – Dissertação. I. Sousa, Giselle Costa de. II. Título.
RN/UF/BSE-CCET CDU: 51(091)
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ANNA KARLA SILVA DO NASCIMENTO
GEOMETRIAS NÃO-EUCLIDIANAS COMO ANOMALIAS: implicações para o ensino
de geometria e medidas
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte como pré-requisito para
obtenção do título de mestre.
Orientadora: Profa Dra Giselle Costa de
Sousa
Aprovada em: ____ de ____________ de _____.
BANCA EXAMINADORA
Prof.ª Dr.ª Giselle Costa de Sousa (Orientadora)
Departamento de Matemática – UFRN
Prof.º Dr.º Iran Abreu Mendes
UFRN (Examinador interno)
Prof.º Dr.º Josildo José Barbosa da Silva
UERN (Examinador externo)
5
À minha família!
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AGRADECIMENTOS
Ao Deus Todo Poderoso pelo cuidado, pelo carinho, pelo amor que me é dado.
Aos meus pais (Carlos e Celia) que me apoiam em tudo, pela educação que me
concederam, pela oportunidade que me deram para eu estudar, pelo amor, carinho, cuidado
etc. Meu infinito agradecimento!
Aos meus irmãos, Huguinho e Kaline, por me amarem. Eu também os amo!
À minha orientadora pela paciência que tem comigo, por ter me escolhido como
orientanda, sou orgulhosa por tê-la comigo. Sempre disponível e disposta a ajudar, querendo
que eu aproveitasse cada segundo dentro do mestrado para absorver algum tipo de
conhecimento.
A meus amigos do mestrado, pelos momentos divididos juntos, especialmente a Ana e
Damião que se tornaram verdadeiros amigos e quase irmãos (Amo vocês!). Obrigada por
compartilharem comigo as angústias, dúvidas e alegrias, por ouvirem minhas bobagens. Foi
bom poder contar com vocês!
Aos meus amigos queridos − Giselle, Patrícia, Bel, Simone, Elvis, Mariana, Hérica,
Lilly, Nary, Amanda, Thaíse − por me compreenderem nas minhas ausências, tenho ciência
que estive muito distante durante o período de mestrado, mas prometo dar mais atenção a
todos vocês a partir de agora.
Aos funcionários do CCET.
Agradeço, também, a CAPES pelo apoio financeiro.
Finalmente, agradeço a Universidade Federal do Rio Grande do Norte por ter aberto
suas portas e me concedeu este sonho de escrever uma dissertação de mestrado.
Muito obrigada a todos!
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RESUMO
A presente pesquisa tem como objetivo mostrar ao leitor a Geometria não-euclidiana
enquanto anomalia indicando as implicações pedagógicas e em seguida propor uma sequência
de atividades distribuídas em três blocos, as quais mostram a relação da geometria euclidiana
com a não-euclidiana, tomando a euclidiana com referência para análise da anomalia na não-
euclidiana. Está vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Norte na linha de pesquisa de
História, Filosofia e Sociologia da Ciência no Ensino de Ciências Naturais e da Matemática.
Aborda aspectos relativos a Euclides de Alexandria, bem como sobre a sua obra mais famosa
Os Elementos e, além disso, enfatiza o Quinto Postulado de Euclides, sobretudo às
dificuldades (que perduraram vários séculos) que os matemáticos tinham em compreendê-lo.
Até que, no século XVIII, três matemáticos: Lobachevsky (1793 – 1856), Bolyai (1775 –
1856) e Gauss (1777-1855) foram convencidos que tal axioma era correto e que existia uma
outra geometria (anômala) tão consistente quanto a de Euclides, mas que não se enquadrava
em seus parâmetros. É atribuída a esses três o advento da geometria não-euclidiana. Para o
percurso metodológico são pontuadas algumas definições de caráter bibliográfico sobre as
anomalias, depois elas são caracterizadas, para que a definição seja melhor compreendida
pelo leitor e, em seguida,são destacadas as geometrias não-euclidianas (Geometria
Hiperbólica, Geometria Esférica e a Geometria do Motorista de Táxi) confrontando-as com a
euclidiana para que sejam analisadas as anomalias existentes nas geometrias não-euclidianas e
observemos sua importância ao ensino. Após tal caracterização segue-se a parte empírica da
proposta que consistiu na aplicação de três blocos de atividades em busca de implicações
pedagógicas de anomalia. O primeiro sobre as retas paralelas, o segundo sobre o estudo dos
triângulos e o terceiro sobre a menor distância entre dois pontos. Esses blocos oferecem um
trabalho com elementos básicos da geometria a partir de um estudo histórico e investigativo
das geometrias não-euclidianas enquanto anomalia de modo que o conceito seja
compreendido juntamente com suas propriedades sem necessariamente estar vinculada a
imagem dos elementos geométricos e, consequentemente, ampliando ou adaptando para
outros referenciais. Por exemplo, o bloco aplicado no segundo dia de atividades proporciona
que se amplie o resultado de soma dos ângulos internos de um triângulo qualquer, passando a
constatar que não é sempre 180° (somente quando Euclides é referência que esta conclusão
pode ser tirada).
Palavras-chave: Anomalia. Geometria. Geometria não-euclidiana. História da Matemática.
Investigação Matemática.
8
ABSTRACT
This present research the aim to show to the reader the Geometry non-Euclidean while
anomaly indicating the pedagogical implications and then propose a sequence of activities,
divided into three blocks which show the relationship of Euclidean geometry with non-
Euclidean, taking the Euclidean with respect to analysis of the anomaly in non-Euclidean.
PPGECNM is tied to the line of research of History, Philosophy and Sociology of Science in
the Teaching of Natural Sciences and Mathematics. Treat so on Euclid of Alexandria, his
most famous work The Elements and moreover, emphasize the Fifth Postulate of Euclid,
particularly the difficulties (which lasted several centuries) that mathematicians have to
understand him. Until the eighteenth century, three mathematicians: Lobachevsky (1793 -
1856), Bolyai (1775 - 1856) and Gauss (1777-1855) was convinced that this axiom was
correct and that there was another geometry (anomalous) as consistent as the Euclid, but that
did not adapt into their parameters. It is attributed to the emergence of these three non-
Euclidean geometry. For the course methodology we started with some bibliographical
definitions about anomalies, after we’ve featured so that our definition are better understood
by the readers and then only deal geometries non-Euclidean (Hyperbolic Geometry, Spherical
Geometry and Taxicab Geometry) confronting them with the Euclidean to analyze the
anomalies existing in non-Euclidean geometries and observe its importance to the teaching.
After this characterization follows the empirical part of the proposal which consisted the
application of three blocks of activities in search of pedagogical implications of anomaly. The
first on parallel lines, the second on study of triangles and the third on the shortest distance
between two points. These blocks offer a work with basic elements of geometry from a
historical and investigative study of geometries non-Euclidean while anomaly so the concept
is understood along with it’s properties without necessarily be linked to the image of the
geometric elements and thus expanding or adapting to other references. For example, the
block applied on the second day of activities that provides extend the result of the sum of the
internal angles of any triangle, to realize that is not always 180° (only when Euclid is a
reference that this conclusion can be drawn).
Keywords: Anomaly. Geometry non-Euclidean Geometry. History of Mathematics.
Mathematics Research.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1- Albert Einstein ....................................................................................................... 24
Figura 2- Imagem Ilustrativa da Teoria da Relatividade 1 .................................................... 24
Figura 3- Imagem Ilustrativa da Teoria da Relatividade 2 .................................................... 24
Figura 4- Antonie Lavoisier ................................................................................................... 25
Figura 5- Georg Cantor .......................................................................................................... 27
Figura 6- Hotel Hilbert .......................................................................................................... 29
Figura 7- Quadrado de lado 1 ................................................................................................ 30
Figura 8- Nicolai Lobachevsky ............................................................................................. 32
Figura 9- Janos Bolyai ........................................................................................................... 32
Figura 10- Triângulo Euclidiano ............................................................................................ 32
Figura 11- Triângulo Esférico ................................................................................................ 32
Figura 12- Triângulo Hiperbólico .......................................................................................... 32
Figura 13- Euclides de Alexandria ........................................................................................ 36
Figura 14- Cidade de Alexandria no Egito ............................................................................ 37
Figura 15- Localização da Biblioteca de Alexandria ............................................................. 37
Figura 16- Folha de rosto da primeira versão inglesa de Os Elementos................................ 39
Figura 17- Axioma hiperbólico ............................................................................................. 49
Figura 18- Plano hiperbólico 1 ............................................................................................. 50
Figura 19- Esfera 1 ................................................................................................................ 51
Figura 20- Esfera 2 ................................................................................................................ 51
Figura 21- Esfera 3 ................................................................................................................ 51
Figura 22- Noção de distância ............................................................................................... 52
Figura 23- Kit entregue aos alunos ........................................................................................ 58
Figura 24- Sela de Biscuit ..................................................................................................... 59
Figura 25- Esfera de Isopor ................................................................................................... 59
Figura 26- Transferidor ......................................................................................................... 59
Figura 27- Compasso ............................................................................................................. 60
Figura 28- Régua ................................................................................................................... 60
Figura 29- Verificando os ângulos ......................................................................................... 65
Figura 30- Sela 1 ................................................................................................................... 68
Figura 31- Sela 2 ................................................................................................................... 68
10
Figura 32- Turma do turno matutino ..................................................................................... 69
Figura 33- Turma do turno vespertino ................................................................................... 70
Figura 34- Tentativa de construção de retas paralelas na sela ............................................... 72
Figura 35- Tentativa de construção de retas paralelas na esfera ............................................ 72
Figura 36- Triângulo da Sela ................................................................................................. 74
Figura 37- Triângulo da Esfera .............................................................................................. 74
Figura 38- Tabela da soma dos ângulos internos dos triângulos ........................................... 74
Figura 39- Conclusão do aluno A .......................................................................................... 75
Figura 40- Conclusão do aluno B .......................................................................................... 75
Figura 41- Atividade 1 ........................................................................................................... 77
Figura 42- Passeando em Brasília ......................................................................................... 78
11
LISTA DE QUADROS
Quadro 1- Categorização das anomalias ............................................................................... 33
Quadro 2- Atividades dos blocos ........................................................................................... 61
Quadro 3- Momentos na realização de uma investigação ..................................................... 63
12
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14
2 SOBRE ANOMALIAS .............................................................................................. 18
2.1 DISCUSSÃO SOBRE O CONCEITO ......................................................................... 18
2.2 EXEMPLOS NA MATEMÁTICA E OUTRAS CIÊNCIAS ....................................... 22
2.2.1 Teoria da Relatividade ............................................................................................... 23
2.2.2 A descoberta do oxigênio ........................................................................................... 25
2.2.3 Infinitos de cantor ...................................................................................................... 26
2.2.4 A incomensurabilidade .............................................................................................. 29
2.2.5 A geometria não-euclidiana ....................................................................................... 31
2.3 CATEGORIZAÇÃO DAS ANOMALIAS .................................................................. 33
3 RECORTE HISTÓRICO DA GEOMETRIA NÃO-EUCLIDIANA
ENQUANTO ANOMALIA ....................................................................................... 35
3.1 UM POUCO SOBRE EUCLIDES E OS ELEMENTOS ............................................ 35
3.2 SOBRE A GEOMETRIA EUCLIDIANA E OS CINCO POSTULADOS .................. 41
3.3 UM RECORTE HISTÓRICO SOBRE A GEOMETRIA NÃO- EUCLIDIANA ........ 44
3.3.1 As principais geometrias não-euclidianas sob enfoque histórico e anômalo ........ 48
3.3.1.1 A geometria hiperbólica ............................................................................................. 48
3.3.1.2 A geometria elíptica e a geometria esférica ............................................................... 50
3.3.1.3 A geometria do motorista de táxi ............................................................................... 52
3.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE A GEOMETRIA NÃO-EUCLIDIANA
COMO ANOMALIA ................................................................................................... 53
4 AS IMPLICAÇÕES PEDAGÓGICAS DA GEOMETRIA
NÃO-EUCLIDIANA ENQUANTO ANOMALIA E UMA PROPOSTA
DE ATIVIDADES HISTÓRICAS E INVESTIGATIVAS PARA A GEOMETRIA
E MEDIDAS .............................................................................................................. 55
4.1 SOBRE AS ATIVIDADES .......................................................................................... 57
4.1.1 Público-alvo e carga horária ..................................................................................... 57
4.1.2 Material ....................................................................................................................... 58
4.1.3 As atividades ............................................................................................................... 60
4.2 SOBRE A APLICAÇÃO DAS ATIVIDADES ............................................................ 67
4.2.1 Sobre a aplicação do piloto ........................................................................................ 67
13
4.2.2 Sobre a aplicação do experimento ............................................................................ 69
4.2.2.1 Sobre o questionário .................................................................................................. 70
4.2.2.2 Sobre o primeiro bloco de atividades ........................................................................ 71
4.2.2.3 Sobre o segundo bloco de atividades ......................................................................... 73
4.2.2.4 Sobre o terceiro bloco de atividades .......................................................................... 76
4.3 IMPLICAÇÕES ........................................................................................................... 79
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 81
REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 82
APÊNDICES ........................................................................................................................ 87
APÊNDICE A- QUESTIONÁRIO ........................................................................................ 88
APÊNDICE B- BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE AS RETAS PARALELAS ................ 92
APÊNDICE C- BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE TRIÂNGULOS ................................. 99
APÊNDICE D- BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE A DISTÂNCIA ENTRE
DOIS PONTOS ..................................................................................................................... 106
14
1 INTRODUÇÃO
Esta dissertação traz considerações acerca de algumas questões em aberto que
surgiram através de indagações não respondidas ao longo da história e que por sua vez são
geradoras de certos conflitos cognitivos. A essas questões em aberto é dado o nome de
anomalias. Aqui também serão apresentadas a importância e as implicações no ensino-
aprendizagem de Matemática dessas anomalias, particularmente, no campo da geometria não-
euclidiana. Para isso, partiremos da geometria euclidiana como referência para o
desenvolvimento desta pesquisa, considerando a geometria não-euclidiana como anômala
neste referencial.
É pertinente destacar que a inquietação em investigar a anomalia na Matemática
começou com as observações sobre o tema anomalia em Matemática, oriundas de um artigo
de Barnett (2000), em que discute a existência das anomalias na Matemática, das quais a
autora cita três exemplos e esclarece em seu trabalho: os infinitos de Cantor, a
incomensurabilidade e a geometria não-euclidiana, no entanto, o referido estudo não
apresentava uma definição, mas sinalizava para possibilidades de exploração do potencial
pedagógico do tema.
Diante dos esclarecimentos proposto no estudo de Barnett, creditou-se a relevância
uma apreciação do que seja anomalia juntamente com algumas discussões e caracterização,
em especial, as geometrias não-euclidianas em relação ao processo de ensino-aprendizagem
de matemática.
Para isso, partiu-se um recorte histórico sobre Euclides (por volta do século IV a.C.) e
a sistematização de sua geometria com a publicação de Os elementos, enfatizando os cinco
postulados. Dos cinco, evidenciou-se o quinto (equivalente ao axioma das paralelas) que foi
motivação para discussões entre matemáticos de diversos séculos por não possuir o mesmo
grau de evidência que os outros axiomas.
Em seguida, serão apresentadas a geometria não-euclidiana expondo o motivo pelo
qual a transforma em uma anomalia (uma questão que permaneceu em aberto por mais de 20
séculos provocando inquietações) quando é tomada a geometria euclidiana como referência.
Posteriormente, serão mostradas algumas geometrias não-euclidianas e as
especificações que as tornam anômalas em paralelo a apreciação histórica com o intuito da
apropriação dessas discussões para propor sequências de atividades que explorem seu
potencial pedagógico que, por sua vez, ampliam conceitos de geometria.
Isso se deu porque, em um levantamento inicial, feito através de um questionário
15
(conferir APÊNDICE A), com o qual se identificou a limitação dos alunos quando são
solicitados para definir e perceber a relevância do tema. Diante disso, surge a indagação:
quais seriam implicações pedagógicas voltadas ao estudo da geometria não-euclidiana como
anomalia?
Com essa preocupação foi proposta uma sequência de atividades distribuídas em três
blocos: o primeiro trata sobre o paralelismo de retas, o segundo destaca a soma dos ângulos
internos de triângulos e o terceiro enfatiza a menor distância entre dois pontos, todos sendo
analisados em espaços (geometrias) distintos de modo a aproveitar o conflito cognitivo gerado
pelo confronto com o padrão euclidiano e com base na investigação matemática
1
como recurso.
Assim, o intuito deste estudo é exibir a geometria não-euclidiana como anomalia a fim
de indicar as suas implicações pedagógicas e elaborar uma sequência de atividades, para
explicitar as diferentes características da geometria euclidiana e da não-euclidiana, de modo a
suscitar uma visão mais ampla de conceitos geométricos e de medida. Com esse objetivo,
apresenta-se um parâmetro de definição de anomalia e, a partir dele, propõem-se exemplos
que se refiram a essa definição, comparando-os e caracterizando-os de modo a estabelecer
relações entre os diferentes casos, expondo suas particularidades, o que elas têm em comum e
mostrando as características semelhantes das anomalias.
Para tal abordagem, exibe-se a geometria não-euclidiana como anomalia, seguindo seu
desenvolvimento histórico desde os questionamentos sobre a veracidade do Postulado das
Paralelas com Euclides, passando por Lambert (1728 - 1777), Saccheri (1667 - 1733), dentre
outros, até os formuladores dessa geometria, ou seja, Bolyai (1802 - 1860), Lobachevsky
(1792 - 1856) e Gauss (1777 - 1855) para que o leitor tenha contato com a história dessa
geometria que provocou questionamentos durante gerações.
Com base no problema proposto e objetivos externados, a pesquisa foi desenvolvida,
inicialmente, através de uma busca bibliográfica de caráter investigativo em dicionários,
enciclopédias, livros, artigos e outras mídias para melhor esclarecer a definição de anomalia e
seus exemplos, assim como apresentar um caráter histórico.
Através desse aporte, comparou-se e caracterizaram-se exemplos de anomalias
existentes na Ciência e na Matemática diante de um confronto das diferentes apreciações
históricas para que se realizasse um levantamento histórico do conhecimento produzido nesse
1 Investigação matemática significa para os matemáticos uma maneira de “descobrir relações entre objetos
matemáticos conhecidos ou desconhecidos, procurando identificar as respectivas propriedades”, conforme Ponte;
Brocardo e Oliveira (2009, p.13).
16
ramo a fim de verificar suas contribuições para o desenvolvimento da Matemática. Desse
levantamento inicial, a pesquisa seguiu o caráter qualitativo e exploratório particularizando a
matemática com foco nas geometrias não-euclidianas – geometria hiperbólica, geometria
esférica e geometria do motorista de táxi – de modo a capturar algumas características das
anomalias quando comparadas com a geometria axiomatizada por Euclides em sua obra
Os Elementos.
Em seguida, elaborou-se uma sequência de atividades utilizando a história da
geometria não-euclidiana e investigação matemática a partir da averiguação dos resultados
suscitados através da aplicação em estudo piloto composto de um minicurso voltado para
geometrias. Segue a parte empírica com o aperfeiçoamento deste estudo em um segundo
experimento que consistiu da aplicação das atividades referidas em duas turmas da disciplina
de Didática da Matemática do curso de Licenciatura em Matemática da UFRN, nos turnos
matutino e vespertino, com vinte e três alunos, seis do turno matutino e dezessete do turno
vespertino.
Em paralelo a aplicação das atividades, coletaram-se os dados e fez-se depois uma
análise para observação e verificação do resultado da pesquisa que será exposto no último
capítulo desta dissertação. Os dados coletados sinalizam para as implicações pedagógicas da
proposta que, de modo geral, apontam para identificação que as retas paralelas existem para
geometria euclidiana, pois quando há troca da geometria para uma não-euclidiana, essa
construção pode ou não resultar em retas paralelas, tomando as principais características de
paralelismo que considera que retas paralelas são aquelas que nunca se cruzam quando elas
tendem ao infinito. Também é constatado que a soma dos ângulos internos de um triângulo
será 180° apenas na geometria euclidiana, e, verificou-se que a menor distância entre dois
pontos nem sempre é um segmento de reta, esta conclusão depende do meio em que a situação
está inserida, como pode ser observado no Apêndice 4.
Frente ao prólogo exposto, a presente dissertação é composta, além desta introdução,
que consideramos o primeiro, por mais três capítulos.
No capítulo dois, é discutido um parâmetro para definição de anomalia, através de
pesquisa bibliográfica sobre o conceito para que se obtenha uma base que será usada durante
todo o trabalho. Assim, tal capítulo é chamado de Sobre Anomalias e traz alguns exemplos de
anomalias na Matemática e nas Ciências Naturais.
O capítulo três recebe o título de Recorte histórico da geometria não-euclidiana
Enquanto Anomalia e contempla um recorte histórico da geometria não-euclidiana enquanto
17
anomalia. Para isso, mostramos alguns conflitos existentes durante um longo período, desde a
Grécia Antiga até o século XIX, tratando sobre Euclides e sua obra Os Elementos e,
posteriormente, apresentando-lhe a geometria não-euclidiana como anomalia, revelando seus
precursores e suas inquietações sobre o Quinto Postulado de Euclides, trazendo três destas
geometrias: a geometria hiperbólica, a geometria elíptica, particularizada neste trabalho pela
geometria esférica e, por fim, a geometria do motorista de táxi.
No capítulo quatro, intitulado por As implicações pedagógicas da geometria não-
euclidiana enquanto anomalia e uma proposta de atividades históricas e investigativas para a
geometria, é onde se trata das implicações pedagógicas da proposta. Nesse sentido são
apresentados os dados do experimento e produto em paralelo a sua análise. A saber, temos
que o produto educacional possui uma sequência de atividades dividida em três blocos sobre
geometrias, o primeiro bloco discute o paralelismo de retas em espaços distintos, o segundo
bloco trata sobre o triângulo no espaço euclidiano, hiperbólico e esférico para que sejam
capazes de definir triângulos e caracterizá-los, somando seus ângulos internos concluindo,
assim, essas somas e consigam diferenciar a imagem do triângulo em espaços distintos. Por
fim, o último bloco questiona a geometria do motorista de táxi, onde concentraremos as
atividades na distância entre dois pontos.
Ao fim desta parte, são colocadas, em suma, as implicações pedagógicas são para o
paralelismo entre duas retas apenas na geometria euclidiana, respeitando o quinto postulado
de Euclides, pois na geometria hiperbólica e na esférica há uma deformação, fazendo com que
não respeite fidedignamente tal axioma; para a soma dos ângulos internos conseguimos
separar a imagem das características quando apresentamos a figura o triângulo em geometrias
distintas e com a soma dos ângulos internos diferente de 180° quando não está no espaço
euclidiano; e, finalmente, pudemos esclarecer aos alunos (provavelmente, futuros professores
de matemática) que a menor distância entre dois pontos é uma reta quando estamos em
situações ideais para cálculos nos projetos específicos sem impedimentos, para uma área
plana e sem resistências.
Este trabalho constitui-se uma leitura e experiências sobre as anomalias em geometria,
um olhar primeiro e que sirva também como fonte para outros estudos.
18
2 SOBRE ANOMALIAS
Este capítulo traz ao leitor discussões sobre anomalias na Matemática e nas Ciências
Naturais, mediante pesquisa bibliográfica com intuito de aproximá-lo do tema, expressando os
motivos para o início dos questionamentos do objeto de estudo, que são as geometrias não-
euclidianas enquanto anomalias quando é tomada a euclidiana como referência e suas
implicações pedagógicas. Caracterizaremos essas anomalias para que o leitor se aproprie das
similaridades que transformam a geometria não-euclidiana em anomalia.
2.1 DISCUSSÃO SOBRE O CONCEITO
Neste trabalho, a anomalia é relacionada com ampliação de conceitos através dos
conflitos cognitivos provocados pelos questionamentos e crises geradas que perduraram por
diversos séculos. Assim, propomos um parâmetro de definição para anomalias como sendo:
um paradigma
2
que surge para ser quebrado, questionando – para certos referenciais – as
definições antes tidas como verdades absolutas, mostrando irregularidades, não negando, mas
ampliando e fazendo com que se observe o desvio acentuado do que até o momento tínhamos
como padrão normal
3
, uma vez que, eram questões em abertos que ao serem solucionadas,
estendem o conceito já existente, mediante conflito cognitivo interno ao indivíduo.
Vale ressaltar que tal opção de definição respalda-se nas discussões que seguem neste
capítulo. A fim de melhor esclarecer a definição citada vejamos algumas definições gerais de
anomalias. Segundo o Houaiss (2001, p. 226, grifo nosso), anomalia é “1. estado ou qualidade
do que é anômalo; anormalidade
4
; irregularidade”. Já a ENCICLOPÉDIA... (1994, p.142,
grifo nosso) define anomalia como “s.f. (gr. anomalia). 1. Desvio acentuado de um padrão
normal; anormalidade, desigualdade, irregularidade, monstruosidade... 3. aberração, exceção
à regra”. O Dicionário de Filosofia traz que anomalia é “o termo empregado para designar o
que se afasta de um tipo considerado normal. Não é uma derrogação das leis naturais, pois
as mesmas leis, que presidem ao desenvolvimento normal, são as que determinam as
anomalias.” (SANTOS, 1963, p. 113, grifo nosso).
2
Algo que segue um padrão ou um modelo.
3
Não contraria regra, age de acordo com a norma.
4
Os destaques no meio dos capítulos durante quase todo corpo deste trabalho foram feitos pela pesquisadora e
estão em negrito.
19
Nessas definições podem ser examinadas certas similaridades que compõem e
esclarecem o que tomamos como sendo anomalia numa perspectiva de algo que está fora do
padrão normal.
Para Kuhn (2009, p.78, grifo nosso), anomalia “é o reconhecimento de que, de alguma
maneira, a natureza violou as expectativas paradigmáticas que governam a ciência
normal
5.” Contribuindo com essa conceituação, de acordo com Mehrtens (2010, p.9), “as
anomalias são fenômenos que não atendem as expectativas da matriz disciplinar aceita”.
Assim, a anomalia é tida como uma quebra de paradigmas
6
pelo fato de ser algo que é
fora do padrão. Logo, tem-se que uma nova ideia surge conflitando com o conhecimento
anterior. Vale salientar que a identificação de uma anomalia provoca um choque e, por esse
motivo, muitas vezes demora bastante para ser aceita pela comunidade científica em virtude
do desvio do padrão normal, não por trazer uma ideia que inicialmente é considerada como
nova, mas porque traz um pensamento que se opõe com o anterior provocando um
desequilíbrio, ou seja, uma perturbação dentro da própria comunidade, incluída como uma
crise de pensamento.
O intuito de estudar sobre algumas anomalias se dá pelo fato de tê-las muito próximas
da ciência em geral e de que trazem muitas curiosidades e paradoxos que necessitam ser
compreendidos pela comunidade científica. A princípio, anomalia não é algo estudado pela
ciência normal, porque ela se contrapõe ao que era cientificamente comprovado. Então, a
comunidade científica “não a vê com bons olhos” porque quando a anomalia aparece,
geralmente, movimenta temas que até então estavam despercebidos pela comunidade, como
questões em aberto que perduram por anos e até séculos. Desse modo, seu estudo pode causar
indisposição por parte dos cientistas em aceitá-la porque a existência ou surgimento da
anomalia, ao menos inicialmente, gera dúvida sobre sua veracidade, até que sejam plenamente
comprovadas por esta comunidade.
De acordo com Kuhn (2009, p.78), “[...] depois que elas se incorporam à ciência, o
empreendimento científico nunca mais é o mesmo [...]”, pois as anomalias provocam uma
crise dentro de uma comunidade específica gerada pela quebra de padrões, causando assim a
revolução científica ao por em choque algo antes inquestionável para esta comunidade,
gerando muitas vezes resultados sólidos e importantíssimos para o progresso científico de
5
Ciência normal, segundo Kuhn (2009, p. 29) é “a pesquisa firmemente baseada em uma ou mais realizações
científicas passadas. Essas realizações são reconhecidas durante algum tempo por alguma comunidade científica
específica como proporcionando os fundamentos para sua prática posterior”.
6.
Consideramos quebra de paradigmas como sendo violação do que era tido como verdade absoluta.
20
qualquer comunidade científica. Na matemática, não é diferente. As anomalias revolucionam
o conhecimento matemático, provando que em meio há tantos questionamentos e tentativas de
refutações são propostas novas questões que ficam em aberto gerando conflitos cognitivos em
membros da comunidade científica que ao serem reconhecidos (conflitos), contribuem
substancialmente para o desenvolvimento da matemática, à medida que, trabalhos parados,
que teoricamente não tinham solução, começam a ter outro ponto de vista e/ou uma nova
ramificação, a exemplo do surgimento da geometria não-euclidiana (ver capítulo seguinte) e
passam a ser questões resolvidas, codificadas noutra ótica, anômala a anterior (respeita, mas
não limita, amplia).
De outro modo disposto, a citação abaixo declara que é no advento de novidades
dentro da ciência normal que surge o novo paradigma, conforme segue:
É no interior das atividades ali [ciência normal] desenvolvidas que é gestado o devir
de uma nova ordem científica, de um novo paradigma. Assim, quando um
paradigma falha nos seus objetivos, ou mais especificamente, quando um cientista
ou um grupo de cientistas se defronta com uma situação para a qual o paradigma não
preparara com uma situação que não podia ser formulada como questão no marco do
paradigma compartilhado, aí emerge com poder de inquietação, o que Kuhn (1982)
denomina anomalia de um paradigma (MARTINS, 2005, p.78, grifo do autor).
Destarte, o objetivo da ciência normal não é trazer novidade, mas mostrar o resultado
esperado, visto que se trata de uma questão resolvida. Mendes (2013) alega em seu ciclo de
problematização, construído através de um fluxograma, que essas questões resolvidas que
compõem a ciência normal são o conhecimento construído de forma gradativa e sem crise,
porém esses problemas resolvidos contribuem para solucionar as questões em aberto que, no
caso em questão, denominam-se anomalias.
Essa crise, afirma Kuhn (2009, p.107), “são uma pré-condição necessária para a
emergência de novas teorias”. Para Martins (2005), a ciência normal não faz desabrochar
novidades, porém é a partir dela que, na maioria das vezes, surge uma nova ordem científica,
daí brota um paradigma (que é suscitado pelas anomalias).
Quando falamos em ciência normal, geralmente, relaciona-se com paradigma, pois faz
a verificação da existência de uma ciência sem cortes, sem questionamentos, muito bela,
porém, sem muitas inovações, um quebra-cabeças a ser montado, que se desenvolvia
gradualmente com êxito, porém sem um entusiasmo, já que não provoca discussões ou
dúvidas, todos sabem de onde partiu e onde tem que chegar. Diferentemente das discussões
sobre anomalias, pois são problemas propostos que não tiveram solução, consideradas, a
21
princípio, questões em aberto, já que não dispõem de solução até que seja resolvida e iniciam-
se quando faltam peças para montar o quebra-cabeça, provocando crises e questionamentos
que não são respondidos rapidamente, tais interrogações podem ser perpassadas de séculos em
séculos, como foi o caso da geometria não-euclidiana que será apresentado no
capítulo seguinte.
O estudo das anomalias está em constante desenvolvimento devido ao progresso da
própria ciência. Cada passo à frente que a ciência dá abre segmentos que podem ser
indagações já resolvidas ou não. Quando esses questionamentos ainda não foram
solucionados (questões em aberto), provocam um incômodo na comunidade gerando conflitos
que antes de solucionados são anômalos. Esse crescimento da anomalia incita à identificação
e implicação que passa por desenrolar histórico do próprio conceito ou sua origem aos
questionamentos dos padrões, porque é necessário conhecer o motivo do questionamento que
está, quase sempre, no centro de sua história. Desse modo, é interessante a análise das
anomalias, não só como um agente colaborador ao desenvolvimento da Matemática, mas
como algo que contribui para o avanço de toda a ciência com um enfoque histórico devido ao
contexto que conduziu a descoberta da anomalia.
Os exemplos históricos das anomalias explicitam exatamente que sua presença na
Matemática pareceu estimular o crescimento e o desenvolvimento da própria Matemática e
não suprimi-lo. Esse crescimento foi muitas vezes acompanhado pelo aumento dos níveis de
abstração e mudanças nos padrões aceitos de rigor. Para essa abordagem será reservado o
subitem 2.2 deste estudo.
A ideia da anomalia provoca, de certa forma, uma confusão na mente de quem
pretende estudá-la. Por causa deste desajuste − mesmo que momentâneo − o seu estudo
torna-se eficaz aos alunos devido às ações instrumentais do desenvolvimento da cognição do
ser humano que são similares ao processo de assimilação e acomodação que, segundo Piaget
(1969), são os agentes de equilibração, gerando desequilíbrios e conduzindo ao esforço de
estabelecer novo equilíbrio tornando-se o autorregulador do desenvolvimento. Nesse sentido,
as anomalias causam um conflito cognitivo nos estudantes análogo aos entraves enfrentados
pelos que se depararam com a anomalia historicamente, donde o crédito para o ensino pode
ser obtido com as características de sua superação.
Barnett (2000), em seu trabalho intitulado Anomalies and Development of
Mathematical understanding, no qual discorre sobre o processo de aceitação do indivíduo
para novas intuições, afirmando que esse processo pode ser demorado, contudo ressalta ainda
22
que usando a história como recurso pedagógico, ele pode se transformar em um agente
motivador e se tornar um grande auxiliador para o sucesso da aprendizagem do assunto. Para
a autora, uma anomalia surge quando há conflitos de intuições pré-estabelecidas, e assim
serve ao ensino à medida que o conflito cognitivo é gerado e a anomalia surge como um
elemento motivador para provocar do conhecimento do aluno.
Conforme Barnett (2000), a intuição é baseada na experiência e não na lógica. Para
chegar a esta conclusão, cita Cantor (1845 - 1918) como exemplo, afirmando que ele não
definiu os números transfinitos do nada, mas ele foi levado a crer e verificar que existia essa
classe de números, e ela credita tudo isso a experiência adquirida através de pesquisas
anteriores cujo conteúdo será visto na seção seguinte.
Ainda de acordo com Barnett (2000), o uso das anomalias na sala de aula pode definir
questões relevantes do estudo, mas, para isso, a história possui um papel importante para
que obtenha sucesso durante o processo de aprendizagem utilizando a anomalia. Assim, a
história deve ser utilizada como um guia, já que o processo de preparação do indivíduo para
aceitar novas intuições é demorado, e o seu uso pode tornar-se um facilitador desse
processo intuitivo.
A autora, em sua experiência, também demonstrou preocupação em relação ao
manuseio errôneo da anomalia na sala de aula, pois a forma equivocada conduz a confusão ao
invés de esclarecer os fatos, e essa confusão provoca o insucesso. Nesse sentido, o que era
para ser utilizado como fonte motivadora na sala de aula acaba sendo fonte de perturbação,
colaborando para que o aluno continue sem estímulo e sem interesse de participar das aulas de
Matemática.
A fim de esclarecer o conceito de anomalia e seu uso para o ensino, seguem alguns
exemplos de anomalias na Matemática e em algumas Ciências Naturais.
2.2 EXEMPLOS NA MATEMÁTICA E OUTRAS CIÊNCIAS
Inspirados nas considerações supracitadas, e a fim de clarificar a definição de
anomalia, apresentaremos, sumariamente, dois exemplos de anomalias ligados as Ciências
Naturais e utilizados por Kuhn (2009) em A Estrutura das Revoluções Científicas. Além
disso, este estudo traz três referentes à Matemática, seguindo a ordem que Barnett (2000) fez
em seu trabalho. Logo, optou-se como exemplos de anomalias na Ciência, a Teoria da
Relatividade e a Descoberta do Oxigênio. Para a Matemática, foram escolhidos os infinitos,
23
os incomensuráveis e a geometria não-euclidiana, a qual será o foco principal de nossa
pesquisa. Outra referência aqui mencionada trata-se da tese de doutorado do professor João
Carlos Gilli Martins (2005) que traz, de maneira detalhada, alguns temas e revoluções
existentes na própria matemática mostrando que, segundo ele, são anomalias. Salientamos
que, para a apreciação de tais exemplos e clarificação dos mesmos enquanto anomalias
trataremos da abordagem histórica como orienta a própria Barnett (2000).
Conforme posto, com o intuito de esclarecer sua definição e ressaltar que em todos os
casos houve um avanço, sobretudo, conceitual no desenvolvimento científico discorremos
então acerca dos exemplos de anomalia supracitados inspirados na análise das considerações
da seção 2.1 à luz da apreciação dos três exemplos foi destacado o caso da geometria não-
euclidiana analisando o que proporcionou ser chamada de anomalia, o que provocou a
descoberta desta anomalia, como foi identificada anomalia, o que aconteceu depois que foi
descoberta e quais as implicações pedagógicas de tais considerações.
A seguir algumas demonstrações de anomalias além da Matemática.
2.2.1 Teoria da Relatividade
Um assunto bem conhecido e já estudado nas escolas do nível básico é a Teoria da
Relatividade, do físico alemão Albert Einstein (1879-1955). O objetivo desta teoria,
anunciada em 1905, não era negar a Mecânica Clássica − publicada em 1687, desenvolvida
por Isaac Newton (1643-1727), que afirmava que a massa, o comprimento e o tempo eram
grandezas com valores absolutos – mas, sim resolver problemas de fronteiras como Einstein
considerava, esses problemas ficavam na fronteira entre a eletrodinâmica e a mecânica. Neste
sentido, Einstein mostrou que essas três grandezas têm valores relativos para velocidades
muito elevadas, ou seja, não desprezíveis se comparadas com a velocidade da luz no vácuo,
que é aproximadamente 3,0 x10
8
m/s.
24
Figura 1 − Albert Einstein
Fonte: Mélo (1979, p. 21 )
A Teoria da Relatividade foi uma revolução para o século XX, pois provocou
inúmeras transformações em conceitos básicos como também proporcionou que fatos
importantes, ainda não explicáveis, pudessem ser explicados. Por esse motivo, é tida como
anomalia na Física.
Esclarecendo, a teoria da relatividade é composta de duas outras teorias: Teoria da
Relatividade Restrita, que estuda os fenômenos em relação a referenciais inerciais, e a Teoria
da Relatividade Geral, que aborda fenômenos do ponto de vista não-inercial. Apesar de
formar uma só teoria, elas foram propostas em tempos diferentes. No entanto, ambas
trouxeram o conhecimento de que os movimentos do universo não são absolutos, mas
relativos.
Embora a Teoria da Relatividade não faça parte de nosso cotidiano, ela é
imprescindível para a tecnologia, para o estudo avançado da Física, quando colocados com
velocidades próximas a da luz. Contribui diretamente para o avanço da gravitação, da
cosmologia e até para aplicações da geometria não-euclidiana, na matemática.
Figura 2 − Imagem Ilustrativa da Teoria da
Relatividade 1
Figura 3 − Imagem Ilustrativa da Teoria da
Relatividade 2
Fonte: O UNIVERSO... (2013a)
7
Fonte: O UNIVERSO... (2013b)
8
7 Disponível em: . Acesso em: 21 fev. 2013.
25
A Teoria da Relatividade, formulada por Einstein, é tida ainda como anomalia, pois
quando Newton desenvolveu a Mecânica Clássica provou que a massa, o tempo e o
comprimento são grandezas absolutas para qualquer valor estudado, e a Teoria da
Relatividade, de Einstein, mostrou que, para valores onde a velocidade é próxima à
velocidade da luz, isto não seria verdadeiro. Dessa forma, contradiz o que Newton havia
exposto, não negando toda a sua teoria, mas contradizendo uma parte muito importante
dela, em favor da ampliação de horizontes na área que tem contribuído diretamente para o
desenvolvimento tecnológico.
2.2.2 A descoberta do oxigênio
Lavoisier (1743-1794) que elaborou a Lei da Conservação das Massas no século
XVIII foi o primeiro a observar que o oxigênio, em contato com uma substância inflamável,
produz a combustão. Também foi considerado o precursor da Química moderna.
Figura 4 − Antonie Lavoisier
Fonte: Neves (2008, p.54)
Antes desse enunciado de Lavoisier, os estudiosos acreditavam que as substâncias, ao
queimarem, formavam cinzas e por isso não tinham peso nenhum, eram chamadas de
substâncias flogísticas. Os idealizadores desta ideia foram Priestley (1733-1804) e Scheele
(1742-1786).
Lavoisier comportou-se como um grande detetive. Tendo percebido muitas anomalias
na Química, conseguiu profetizar a sua ação revolucionária, registrando-a, antecipadamente,
junto à Academia de Ciências Francesa. A proposta lavoiseriana de uma nova teoria da
8 Disponível em: . Acesso em: 21 fev. 2013.
26
combustão abriu caminho para um novo paradigma que incorporou profundas mudanças
conceituais na Química (OKI, 2004). À medida que a proposta de Lavoisier levou a um
deslocamento de conceitos que eram utilizados pelos cientistas para interpretar os fenômenos
e o mundo.
Dessa forma, é considerada uma anomalia porque veio alterar a situação que havia
anteriormente, a de que os flogistas não previam em seus resultados, e a teoria da combustão
favoreceu o desenvolvimento da área.
Depois desses exemplos de anomalia na Física e na Química, e com o objetivo de
aprofundar nossa pesquisa, observemos alguns exemplos de anomalias existentes na
Matemática para que o leitor compreenda e verifique que realmente existem revoluções em
Matemática, como destacam Martins (2005), Barnett (2000) e que essas revoluções quebram
paradigmas dando outro norte para o tema estudado.
Observemos, a seguir, alguns questionamentos em aberto ou anomalias na
Matemática.
2.2.3 Infinitos de Cantor
Georg Ferdinand Ludwig Philipp Cantor (1845-1918), um matemático nascido na
Rússia e criado na Alemanha, desde cedo mostrava grandes habilidades com a Matemática até
que decidiu seguir carreira como matemático. Estudou em Zurique e em Berlim formando-se
em Matemática, Filosofia e Física. Foi aluno de grandes matemáticos da época como Karl
Weierstrass (1815-1897) e Leopold Kronecker (1823-1891) e em 1867 recebeu o título de
doutor pela Universidade de Berlim. Em 1872 foi nomeado, pela Universidade de Halle,
professor assistente de Matemática. Cantor foi um profissional brilhante, embora tenha tido
vários problemas de saúde, sendo internado em clínicas para tratamentos mentais.
De fato, Cantor foi um dos Matemáticos mais importantes da História da Matemática.
Seus estudos iniciais com funções de séries trigonométricas o levou a observar as
descontinuidades destas funções e perceber que se não progredisse com o desenvolvimento da
Matemática Pura, seu trabalho talvez não fosse respeitado.
27
Figura 5 − Georg Cantor
Fonte: Dauben (1990)
Para que este estudo de séries trigonométricas tivesse crescimento teórico, observou
que o conjunto dos números reais é fundamentalmente diferente do que o conjunto dos
números racionais, a começar denso
9
, contínuo
10
e completo
11
, enquanto o último é denso
(anomalia). Essas diferenças sugerem a Cantor que há um sentido em que o conjunto dos
números reais é maior que o conjunto dos números racionais, porém, no desenrolar dos seus
estudos, Cantor verificou que não existe um conjunto maior que o outro, mas que existe uma
bijeção entre os dois conjuntos os quais Cantor definiu como cardinalidade – conforme é
abordado na citação a seguir:
Cantor viu que os conjuntos infinitos não são todos iguais. No caso finito, dizemos
que conjuntos de elementos têm o mesmo número (cardinal) se podem ser postos
em correspondência biunívoca. De modo um tanto semelhante, Cantor se dispôs a
construir uma hierarquia de conjuntos infinitos conforme a Mächtigkeit ou
‘potência’ do conjunto. O conjunto dos quadrados perfeitos ou o conjunto dos
números triangulares tem a mesma potência que o conjunto de todos os inteiros
positivos, pois eles podem ser postos em correspondência biunívoca. Esses
conjuntos parecem muito menores que o conjunto de todas as frações racionais, no
entanto Cantor mostrou que também esse último conjunto é contável ou enumerável
−isto é, também esse pode ser posto em correspondência biunívoca com os inteiros
positivos, portanto tema mesma potência (BOYER, 1974, p.414, grifo do autor).
É conveniente esclarecer que Cantor sempre partiu de problemas matemáticos
concretos até conseguir generalizar sua teoria, mas precisou recorrer à filosofia para
fundamentar sua tese. Desde sua época de estudante ele sempre se familiarizou com a rigorosa
interpretação dos fundamentos da Análise Matemática. Wussing (1998) afirma que, em 1873,
Cantor sabia que podia fazer uma relação biunívoca entre o conjunto dos números naturais e o
9
Denso: “Diz-se que um conjunto A é denso num conjunto B se todo ponto de B que não pertencer a A é ponto
de acumulação de A.” (ÁVILA, 2005, p. 141, grifo do autor).
10
Contínuo: É aquele que não pode ser dividido em dois conjuntos fechados.
11
Completo: “Todo o subconjunto não vazio e majorado de R tem supremo” (NEVES, 2008, p.126).
28
conjunto dos números racionais e que o conjunto dos números reais é enumerável
12
, existindo
assim diferentes ordens de magnitude nos conjuntos transfinitos. Esta formulação foi
conhecida em 1874 em um trabalho cujo título é Sobre a propriedade do conjunto de todos os
números algébricos. Com a publicação deste trabalho, Cantor dá início a Teoria
dos Conjuntos.
Depois de tal publicação, Cantor não parou mais de estudar e pesquisar sobre os
infinitos da Matemática e anunciando assim vários artigos sobre o assunto. Nessa pesquisa
incessante, definiu conjunto denso, conjunto fechado
13
, números transfinitos
14
, dentre outras
definições, sendo de fundamental importância o desenvolvimento da análise matemática e
contribuindo para o seu progresso, bem como evolução da Teoria dos Conjuntos e também
grande parte da aritmética transfinita.
Depois de toda essa pesquisa, Cantor encontrou dificuldades em justificar sua teoria já
que Kronecker (1823 - 1891), que foi seu professor em Berlim, se opunha a sua pesquisa, pois
ele baseava a sua abordagem à Matemática na premissa de que um objeto matemático não
existe a menos que seja passível de construção com um número finito de passos. De acordo
com Boyer (1974, p.416), Kronecker “rejeitava categoricamente a construção dos números
reais de seu tempo pelo fato de não poder ser efetuada só com processos finitos”, contrariando
a ideia de Cantor, que defendia a infinitude.
A anomalia observada no estudo dos infinitos de Cantor está no momento em que foi
verificado que os conjuntos racionais eram densos, mas o conjunto dos números reais
podia ser visto como maior que o conjunto dos números racionais e, porém Cantor provou
que não é e que há uma cardinalidade entre os mesmos.
A história do Hotel de Hilbert explicita bem a ideia dos infinitos de Cantor:
O Hotel de Hilbert é um ‘paradoxo’ originalmente criado pelo matemático alemão
David Hilbert. Suponha que você está de viagem em um lugar muito estranho na
Alemanha, já está tarde e você precisa de um quarto de hotel. Depois de algum
tempo procurando, você descobre que todos os hotéis estão lotados. Um senhor
muito respeitável lhe recomenda que passe no hotel de um velhinho chamado
Hilbert e te dá o endereço.
Chegando lá, o velho Hilbert diz a você que seu hotel também está com todos os
quartos ocupados. Mas antes de você lhe agradecer e virar-lhe as costas, Hibert
exclama: ‘Mas meu hotel tem infinitos quartos! Posso arranjar um quarto para você’.
Supondo que você não questione a sanidade do velho e acredite no que ele disse,
o que o fato de ter infinitos quartos muda se todos estão ocupados? Bem, muda tudo.
12 Enumerável: “Chama-se conjunto enumerável todo conjunto equivalente a |N.” (ÁVILA, 2005, p.33).
13
Conjunto fechado é quando ele coincide com seu fecho (C = = C ∪ ). (ÁVILA, 2005).
14
Números transfinitos são os tipos de ordem de conjuntos infinitos e bem ordenados. (SANTOS; LOPES;
CUNHA, 2001).
29
Quase toda a lógica intuitiva que temos para conjuntos finitos simplesmente não se
aplica a conjuntos infinitos. E então, como você acha que Hilbert resolveu este
problema sem despejar ninguém que já estava hospedado? A solução não é tão
difícil. De fato, se transferíssemos o cliente do primeiro quarto para o segundo, o
cliente do segundo para o terceiro, etc. sempre transferindo um cliente para o
próximo quarto adjacente, ninguém ficaria sem quarto, afinal
existem infinitos deles. Além disso, conseguimos liberar o quarto 1.Viajando um
pouco mais, e se você trouxesse sua família infinita com você? Precisaria de
infinitos quartos. É ‘possível’ liberar infinitos quartos; você sabe como? Se
alocarmos o cliente do quarto 1 para o quarto 2, o do quarto 2 para o quarto 4, o do
quarto 3 para o quarto 6, etc. o do quarto n para o quarto 2n, ficaríamos com todos
os quartos ímpares vagos. Mas quantos números ímpares existem? Infinitos!
Portanto resolvemos nosso problema (LE GAUSS, 2011)15.
A figura a seguir mostra uma ilustração de como seria o Hotel Hilbert:
Figura 6 – Hotel Hilbert
Fonte: Gaglione (2013)
A seguir será enfatizado outro exemplo de anomalias – a incomensurabilidade – que
trata da relação de grandezas que não podem ser representadas por números inteiros ou
fracionários.
2.2.4 A incomensurabilidade
Na Grécia Antiga, os pitagóricos afirmavam que os números naturais, ou a razão entre
eles, poderiam justificar tudo o que existe no mundo. No entanto não se sabe ao certo em que
período da história nem quem observou que existia um conjunto de números que não podiam
ser mensurado.
Esses números, que não podiam ser mensurados, foram denominados de números
incomensuráveis e uma das versões que explicam a origem desses números é a demonstração
de que a razão entre o lado e a diagonal do quadrado nem sempre pode ser dada por um
15 Disponível em: < http://legauss.blogspot.com/2009/04/o-hotel-de-hilbert.htm>. Acesso em: 01 dez. 2011.
30
número inteiro, ou seja, a afirmação de que não se podiam medir a diagonal de um quadrado
qualquer que não se chegasse a um número incomensurável que seria um múltiplo da . Eles
usavam a matemática para melhor entender a natureza.
Segundo Boyer (1974) foi Hipasus de Metapontun (~470-400 a.C.), no século V a. C.,
o pitagórico responsável por tal verificação. Vale ressaltar que os pitagóricos relutaram e
refutaram por várias vezes este número, não o aceitavam de maneira alguma, pois isto
lançaria por terra toda sua filosofia de querer justificar o mundo através dos números.
As circunstâncias que rodearam a primeira percepção da incomensurabilidade são
tão incertas quanto à época da descoberta. Comumente se supõe que a percepção
veio em conexão com a aplicação do Teorema de Pitágoras ao triângulo retângulo
isósceles, Aristóteles se refere a uma prova da incomensurabilidade da diagonal de
um quadrado com seu lado, indicando que se baseava na distinção entre pares e
ímpares (BOYER, 1974, p.54).
A seguir, a figura mostra que a diagonal do quadrado de lado 1 é um valor que está em
função da raiz de dois.
Figura 7 − Quadrado de lado 1
Fonte: Sandoval (2009)
A anomalia existente na formulação dos incomensuráveis é baseada no fato de que os
gregos afirmavam que todas as razões resultariam em um número inteiro, mas quando se
calculou a razão entre o lado e a diagonal de alguns quadrados (como o da figura anterior, por
exemplo) verificou-se que nem sempre essa afirmação estava correta. A crise que ocorreu na
escola pitagórica perdurou por um bom tempo até que não tinham mais argumentos para
refutar tal anomalia e aceitar que a diagonal de um quadrado qualquer é verdadeiramente um
múltiplo de e que realmente existiam números que não podiam ser medidos e esses
números seriam os números incomensuráveis.
31
2.2.5 A geometria não-euclidiana
Euclides de Alexandria, que tem sua existência contestada por muitos autores, foi um
filósofo e matemático que viveu em 300 a.C. na Grécia e publicou uma coleção com treze
volumes que tem por título Os Elementos. Esta coleção sistematizou toda a geometria grega
da época, axiomatizando algumas propriedades e contribuindo para o progresso e
disseminação da geometria, sendo, pois, de fundamental importância para que a geometria se
desenvolvesse através dos séculos. Dentre a verificação de algumas propriedades geométricas,
enfatizaram-se bastante cinco postulados dentre os quais os quatro primeiros eram claros e
objetivos, nos moldes euclidianos, contudo, o quinto gerava questionamentos em meio à
comunidade científica que passaram séculos e séculos para serem esclarecidas.
O quinto Postulado de Euclides, mais conhecido como O Postulado das Paralelas,
afirma que:
Se uma reta cortando duas retas faz os ângulos interiores de um mesmo lado
menores que dois ângulos retos, as duas retas, se prolongadas indefinidamente, se
encontram desse lado em que os ângulos são menores são menores que dois
ângulos retos (BOYER, 1974, p.77).
Como posto, esse postulado foi, durante o decorrer da história da geometria, bastante
questionado pelos matemáticos, pois queriam mostrar que não se tratava de um axioma
16
, mas
um teorema
17
, e as tentativas de demonstrá-lo foram incessantes. Segundo Barnett (2000), no
século I a.C. Posidônio (cerca de 50 a. C.) já dava importância a esse postulado afirmando que
podia ser demonstrado.
Tempos depois, no período moderno, veio Gerolamo Saccheri (1667 – 1733), Lambert
(1728 - 1777) e Legendre (1752 - 1853) que também duvidaram do axioma e tentaram
demonstrá-lo, porém, suas tentativas de demonstração foram através da redução ao absurdo,
mas também não obtiveram sucesso em sua tentativa. Após várias tentativas frustrantes, no
decorrer do tempo, Lobachevsky (1793 – 1856) e Bolyai (1775 – 1856) começaram as suas
investigações, assumindo que uma geometria não-euclidiana era possível e passaram a
acompanhar esta hipótese as suas conclusões lógicas e analíticas.
16
Algo que é tomado como verdade.
17
Necessita de uma demonstração.
32
Figura 8 − Nicolai Lobachevsky Figura 9 − Janos Bolyai
Fonte: Eves (2011, p.543) Fonte: Gaussianos (2013)18
De outro modo disposto, as figuras postas a seguir mostram os triângulos em espaços
diferentes, a primeira é um triângulo usado na geometria plana − é sabido que a soma de seus
ângulos internos mede 180°. Ao seu lado, tem-se um triângulo esférico – no qual se observa
que os ângulos internos dos triângulos formados na geometria esférica têm valor maior que
180°. Já a terceira imagem é conhecida como sela (ver figura 12) entre os matemáticos, onde
é perceptível (na geometria hiperbólica) que no triângulo aí posto, a soma dos ângulos
internos tem valor menor que 180°.
Figura 10 – Triângulo euclidiano Figura 11– Triângulo esférico
Fonte: (O autor) Fonte: FATOS... (2013)19
Figura 12 – Triângulo hiperbólico
Fonte: TRIÂNGULO... (2013)
18 Disponível em: < http://gaussianos.com/el-verdadero-rostro-de-janos-bolyai/>. Acesso em: 10 jan. 2013.
19 Disponível em: < http://fatosmatematicos.blogspot.com.br/2011/10/lei-dos-senos-da-trigonometria-
esferica.html>. Acesso em: 10 jan. 2013.
33
A fim de fechar as exposições sobre a definição de anomalia, apresentamos a seguir
uma sistematização das considerações postas até o momento mediante a categorização
das anomalias.
2.3 CATEGORIZAÇÃO DAS ANOMALIAS
Tomando como base a definição de anomalia usada por Kuhn (2009), bem como as
considerações nas seções preliminares deste trabalho, propõe-se uma categorização das
anomalias para proporcionar ao leitor um melhor entendimento sobre o motivo pelo qual cada
descoberta foi considerada anomalia. Por isso, elaborou-se um quadro classificando o tema
pesquisado e a anomalia.
É salutar mencionar que se optou em deixar de fora a geometria não-euclidiana porque
esta será melhor detalhada no capítulo subsequente.
Quadro 1 - Categorização das anomalias
Tema pesquisado Anomalia
Teoria da relatividade
Não negou, mas questionou a Mecânica Clássica, para o referencial
absoluto;
Quando formulada, revolucionou a Física, quebrando paradigmas.
O surgimento do oxigênio
Incorporou mudanças conceituais na Química;
Mostrou que o flogismo20 estava equivocado.
Infinitos de Cantor
O questionamento foi sobre a crença de que não conseguiria provar
a existência do infinito;
Construir uma relação biunívoca entre conjuntos com densidades
diferentes;
Os conjuntos possuírem a mesma cardinalidade provocou conflitos.
A incomensurabilidade
A diagonal do quadrado de lado 1 é um número incomensurável pôs
em dúvida o pensamento pitagórico, mostrando que era limitado;
Existir um conjunto de números que até então não era conhecido
pela comunidade pitagórica.
Fonte: (O autor)
A finalidade das anomalias para o ensino de matemática é simples, pois seria
interessante que o aluno, que cursa os anos finais do ensino fundamental, tenha familiaridade
com o assunto. Conforme já mencionado nesse estudo, o contato com as anomalias gera
20
Em química: “no passado, denominação atribuída ao oxigênio; fluido que, acreditava-se, associado a uma
substância e, através de calor e luz, se manifestava nos corpos e produzia combustão; relativo a esse fluido; em
medicina, mais conhecido como inflamatório” (HOUAISS, 2001, p.1357).
34
conflito cognitivo. Em contrapartida, essa familiarização com esses conceitos desde cedo com
os jovens estudantes proporciona um entendimento, que por sua vez provoca um
conhecimento significativo, atentando para o surgimento dessa anomalia, para que serve,
quais as contribuições para o desenvolvimento da Matemática e até para outras ciências.
35
3 RECORTE HISTÓRICO DA GEOMETRIA NÃO-EUCLIDIANA ENQUANTO
ANOMALIA
Este capítulo discorre sobre Euclides, apresentando sua história, sua principal
publicação os Elementos, o quinto postulado (que se encontra no Livro 1 desta obra), os
questionamentos que sobrevieram por mais de 20 séculos sobre esse postulado e,
posteriormente, tratará acerca a geometria não-euclidiana, demonstrando o que faz dela
anômala ao referencial euclidiano, e como foi enunciada pelos grandes matemáticos do
século XIX.
3.1 UM POUCO SOBRE EUCLIDES E OS ELEMENTOS
É curioso mencionar que não se sabe bem ao certo a origem de Euclides, alguns
estudos até questionam sua existência. Diversos pesquisadores, como Tomei (2006), por
exemplo, defendem a tese que esse nome está relacionado a uma entidade que existiu na
antiguidade. Já Eves (2004) afirma veementemente que Euclides de Alexandria foi professor
da Biblioteca e Museu de Alexandria construída e fundada durante o governo de
Ptolomeu II (309 - 246 a.C.). Essa biblioteca tornou-se o maior centro de matemática, ciência
e filosofia da época, sendo local de trabalho e de estudo dos principais sábios e estudiosos do
período e sendo considerada o primeiro instituto estatal de pesquisas do mundo, como afirma
Mlodinow (2004).
Considerando a existência desse pensador, Euclides formou-se, possivelmente, pela
Escola Platônica de Atenas. Contudo, mesmo com todas essas dúvidas, é considerado um dos
principais nomes da História da Matemática de todos os tempos.
Uma das traduções de Os Elementos
21
faz um breve relato sobre a Grécia Antiga, os
filósofos e matemáticos da época e traz, também, considerações sobre a falta de informações
acerca da vida de Euclides. Do que consta na referida obra tem-se que “para testemunhos de
como se constituiu e como se desenvolveu a geometria grega, ficamos extremamente
dependentes da escassez de notícias espalhadas em escritores antigos.” (EUCLIDES, 2009, p.
57, grifo do autor).
21
Obra publicada originalmente por Euclides, por volta do século IV, importante para o estudo da geometria
euclidiana e que foi traduzida por diversos séculos e discorreremos sobre suas versões e seu conteúdo,
sucintamente, neste capítulo.
36
Por sua vez, Eves (2011, p.167) relata que “é desapontador, mas muito pouco se sabe
sobre a vida e a personalidade de Euclides”. Esses comentários comprovam o quanto é
frustrante ter poucas informações sobre um dos grandes nomes da matemática desde a
Antiguidade aos dias atuais.
Compartilhando da ideia de sua existência, autores como Ávila (2001) afirmam que
Euclides de Alexandria viveu por volta de 300 a.C. sendo, possivelmente, grego uma vez que
viveu boa parte da sua vida em Alexandria no Egito, ensinando e pesquisando
sobre Geometria.
Figura 13 – Euclides de Alexandria
Fonte: Wikipédia (2013)
22
Reiterando o mencionado no início desta seção, devido à questão de insuficiência de
documentos sobre a carreira de Euclides, não se pode precisar ao certo em que ano nasceu. No
entanto, através de deduções feitas por Proclus – primeiro comentador crítico sobre Euclides
− (cerca de 300 d.C.), este pesquisador, do mesmo modo sustenta que Euclides era da escola
platônica e que mantinha um forte relacionamento com sua filosofia, menciona que Euclides
seria oriundo de tal escola se dá por causa da construção das figuras platônicas, ou seja,
poliedros regulares,em sua obra Os Elementos (EUCLIDES, 2009).
Para ilustrar, a seguir estão duas imagens (as figuras 14 e 15) da cidade de Alexandria
− uma das nomeadas por Alexandre, onde, provavelmente, Euclides tenha vivido e
contribuído substancialmente para a geometria grega − e a outra mostra o mapa atual da
cidade com a localização da Biblioteca em que, possivelmente, Euclides trabalhou ativamente
funcionando como um organizador de toda geometria grega vista até então em uma obra com
treze volumes que comentaremos posteriormente neste capítulo.
22 Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Euklid-von-Alexandria_1.jpg> . Acesso em: 20 fev.
2013.
37
Figura 14 ‒ Cidade de Alexandria no Egito
Fonte: Ferreira (2010, p.102)
Nos dias de hoje, utilizando-se de recursos tecnológicos, eis a localização aérea
biblioteca de Alexandria.
Figura 15 – Localização da Biblioteca de Alexandria
Fonte: BIBLIOTECA... (2013)
23
23 Disponível em: . Acesso em: 16 jun. 2013.
38
Foi nesse período, segundo a história, o Período Helenístico (século IV a.C.), onde
Alexandre Magno, conhecido também como Alexandre O Grande, foi Imperador por parte
dessa época, e seu exército invadiu a Ásia Menor, a Fenícia, o Egito e derrotou os Persas. De
fato, Alexandre constituiu um império muito grande conhecido como o Império de Alexandre.
De acordo com Ferreira (2010), Alexandre, quando criança, fora aluno de Aristóteles, nesse
período helenístico houve uma aproximação do Ocidente com o Oriente, contribuindo para
um avanço cultural, crescimento tecnológico e descobertas científicas dos povos orientais.
O imperador iniciou a construção da cidade de Alexandria, no Egito, uma cidade com
estrutura para tornar-se “centro cultural, comercial e governamental”, como afirma Mlodinow
(2004, p.49), anos depois, Alexandre faleceu e a cidade foi fundada por Ptolomeu I (cerca de
305 a. C.).
Euclides, como professor da Biblioteca e pesquisador, foi o autor do texto matemático
mais bem-sucedido de toda geração que continua sendo estudado até os dias de hoje, chamado
de Os Elementos, esta coleção é considerada, atualmente, como uma obra especialmente de
valor histórico já que foi escrita durante a Antiguidade em um período muito rico para o
progresso da cultura grega e antiga em geral. Em Euclides (2009, p.16) tem-se que “a história
de Os Elementos confunde-se, em larga escala, com a história da matemática grega”. De fato,
a ênfase dada a esta obra foi muito grande uma vez que continha todo o arcabouço grego
da época.
Não há registros que sejam capazes de datar a verdadeira época que Os Elementos
foram escritos, porém creditamos a sua escrita no século IV a.C. pois foi o presumível período
vivido por Euclides, o responsável por sua publicação. Esta obra foi publicada em várias
versões e a mais antiga a ser noticiada teria sido publicada por Théon de Alexandria − um
estudioso do século IV que traduziu a obra e editou a proposição XXXIII do livro VI. Todas
as traduções anteriores as de 1814 eram baseadas pela tradução de Théon, afirma Euclides
(2009). Porém, no século XIX, segundo Eves (2004), quando Napoleão Bonaparte ordenou
que fossem tomadas as bibliotecas italianas e enviadas à Paris os manuscritos de valor,
encontraram uma edição anterior àquela obra publicada por Théon.
Segundo Eves (2004), nenhuma obra, exceto a Bíblia, foi tão estudada quanto esta
publicada por Euclides. A imagem seguinte revela a folha de rosto da primeira versão inglesa
de Os Elementos.
39
Figura 16 − Folha de rosto da primeira
versão inglesa de Os elementos.
Fonte: Ávila (2001)
Antes da publicação de Os Elementos, existiram outras publicações parecidas com a
obra de Euclides, mas não tiveram tanto êxito quanto o célebre Os Elementos. Segundo Eves
(2004), a primeira obra escrita com o mesmo objetivo da de Euclides foi publicada por
Hipócrates de Quio
24
. Conforme o mesmo autor, Lêon também escreveu uma obra similar a
de Hipócrates só que era considerada mais completa, uma vez que possuía mais proposições a
serem analisadas. Teúdio também escreveu suas proposições e alguns autores consideram-no
como o precursor de Os Elementos de Euclides.
Além de Os Elementos também foi atribuída a Euclides a publicação de outras obras
com conteúdo matemático, como Os dados, Divisão de figuras, Pseudaria, Porísmas,
Cônicas além da escrita de livros sobre matemática aplicada como Os Fenômenos e a Óptica,
dentre outros trabalhos.
Embora muitos pensem que nesta coleção, Os Elementos, a produção seja apenas
24
O matemático e astrônomo Hipócrates, originário da ilha de Quios, floresceu na segunda metade do século -
V; especula-se que tenha vivido entre -470 e -410. Segundo a tradição, ele foi enganado em Bizâncio, perdeu sua
fortuna (Ps.-Arist. EE. 1247a) e teve que ganhar a vida em Atenas, ensinando Geometria, possivelmente entre -
450e -430) (GRÉCIA ANTIGA, 2012).
40
Geometria, estão enganados, pois os 13 volumes, contemplam também Álgebra e Aritmética,
contudo, dentre eles, a geometria contida é maioria e foi capaz de ajustar todo o estudo
matemático para aquela época. Esclarecendo, esta coleção é composta por 465 proposições e
treze volumes divididos da seguinte forma:
os volumes I, III, IV, VI, XI, XII e XIII tratam sobre a geometria plana e espacial;
o volume II traz algumas transformações de áreas e também a álgebra geométrica da
escola pitagórica
25
;
o volume V, segundo Eves (2004, p.173) “é uma exposição magistral da teoria das
proporções de Eudoxo” e essa teoria das proporções cooperou com a descoberta dos
números irracionais pelos pitagóricos;
os volumes VII e VIII têm uma abordagem focada na Teoria dos Números, traz o
conhecido algoritmo euclidiano, progressões geométricas e o importante Teorema
Fundamental da Aritmética;
no volume IX, Euclides provou, elegantemente, a infinitude dos números primos por
meio da redução ao absurdo e
o volume X trata dos irracionais com os créditos dados a Teteeto, mas com uma
considerável colaboração de Euclides.
Como pode ser observada nessa síntese, a obra de Euclides de Alexandria era muito
mais que geometria em si, já que, conforme posto, aborda vários assuntos voltados à
Matemática, como a álgebra e a aritmética. Tal produção fez com que Euclides se
transformasse em uma das pessoas mais influentes da história, pois axiomatizou a geometria e
formulou os famosos cinco postulados que serão citados na seção seguinte.
Desse modo, Euclides deu a base para o desenvolvimento da geometria que temos
hoje, e, nesse sentido, sua obra perdurou e/ou perdura como referência ao longo dos tempos
como espécie de Bíblia que, inclusive, dita o conhecimento geométrico escolar, uma vez que
os livros didáticos remetem-se, exclusivamente, a geometria euclidiana.
Euclides e seus predecessores reconheceram o que, nos dias de hoje, todo estudante
de Filosofia sabe: que não se pode provar tudo. Na construção de uma estrutura
lógica, uma ou mais proposições devem sempre ser admitidas como axiomas a partir
dos quais todas as outras são deduzidas (CASTRO, 2011, p. 302).
25
Escola pitagórica: escola de filosofia, política, esoterismo e matemática, originada em Crotona e liderada por
Pitágoras (EVES, 2004).
41
Alguns autores como Eves (2004) enfatizam a formalidade com que Os elementos
foram elaborados e credita-os como protótipo da formalidade da Matemática Moderna.
3.2 SOBRE A GEOMETRIA EUCLIDIANA E OS CINCO POSTULADOS
Como ressaltado, a geometria teve maior espaço no mundo quando Euclides de
Alexandria publicou sua coleção chamada Os Elementos, que possui treze volumes dos quais
seis são dedicados à geometria plana. Tais volumes enfatizam a axiomatização da geometria,
dedução de sequências lógicas e a formulação de deduções precisas garantindo uma
compreensão de reciprocidade entre palavras e símbolos. De fato, nesta obra, Euclides
esquematiza a geometria com uma estrutura lógica e um rigor muito bem elaborados, sendo
tal estruturação considerada muito importante para a Matemática.
Vale destacar que as demonstrações matemáticas deste período grego não eram
aritmetizadas como temos atualmente, eram totalmente geométricas. Por exemplo, a
demonstração do Teorema de Pitágoras, antes da álgebra era toda geometrizada, como
podemos conferir a seguir.
Observam-se duas demonstrações do Teorema de Pitágoras, a primeira é clássica de
acordo com Euclides (2009) e a segunda, por Oliveira (2008) tem mais ilustrações e pode se
aproximar do que os professores ensinam na sala de aula, embora a maioria dos livros
didáticos não disponibilize para apreciação dos alunos.
Em Os Elementos, a proposição 47 de diz que “nos triângulos retângulos, o quadrado
sobre o lado que se estende sob o ângulo reto é igual aos quadrados sobre os lados que contêm
o ângulo reto”.
A seguir, a prova através da figura que trata de uma análise em demonstração
matemática.
42
Seja o triângulo retângulo ABC, tendo o ângulo sob BAC reto; digo que o quadrado
sobre a BC é igual aos quadrados sobre as BA, AC. Fiquem, pois, descritos, por um
lado, o quadrado BDEC sobre a BC, e, por outro lado, os GB, HC sobre as BA, AC,
e, pelo A, fique traçada a AL paralela a qualquer uma das BD, CE; e fiquem ligadas
as AD, FC. E, como cada um dos ângulos sob BAC, BAG é reto, então, as duas retas
AC, AG, não postas do mesmo lado, fazem relativamente a alguma reta, a BA, e no
ponto A sobre ela, os ângulos adjacentes iguais a dois reto; portanto, a CA está sobre
uma reta com a AG. Pelas mesmas coisas, então, também a BA está sobre uma reta
com a igual a AH. E, como o ângulo sob DBC é igual ao sob FBC; pois, cada um é
reto; fique adicionado o sob ABC comum; portanto, o sob DBA todo é igual ao sob
FBC todo. E como, por um lado, a DB é igual à BC, e, por outro lado, a FB, à BA,
então, as duas DB, BA são iguais às duas FB, BC, cada uma a cada uma; e o ângulo
sob DBA é igual ao ângulo sob FBC; portanto, a base AD [é] igual à base FC, e o
triângulo ABD é igual ao triângulo FBC; e, por um lado, o paralelogramo BL [é] o
dobro do triângulo ABD; pois, tanto têm a mesma base BD quanto estão nas mesmas
paralelas BD, AL; e, por outro lado, o quadrado GB é o dobro do triângulo FBC;
pois, de novo, tanto tem a mesma base FB quanto estão nas mesmas paralelas FB,
GC. [Mas os dobros das coisas iguais são iguais entre si;] portanto, também o
paralelogramo BL é igual ao quadrado GB. Do mesmo modo, então, sendo ligadas
as AE, BK, será provado também o paralelogramo CL igual ao quadrado HC;
portanto, o quadrado BDEC todo é igual aos quadrados GB, HC. E, por um lado, o
quadrado BDEC foi descrito sobre a BC, e, por outro lado, os GB, HC, sobre as BA,
AC. Portanto, o quadrado sobre o lado BC é igual aos quadrados sobre os lados BA,
AC. Portanto, nos triângulos retângulos, o quadrado sobre o lado que se estende
sobre o ângulo reto é igual aos quadrados sobre os lados que contêm o [ângulo] reto;
o que era preciso provar (EUCLIDES, 2009, p. 132).
Agora a demonstração geométrica, porém com o uso da álgebra do mesmo teorema:
Considere um quadrado ABCD de lado b + c. Sobre os lados desse quadrado marque
pontos M, N, P, Q, como na figura a seguir, de modo que:
43
Pelo caso de congruência LAL os triângulos retângulos QAM, MBN, NCP e PDQ
são congruentes ao triângulo retângulo da hipótese. Daí segue que MN = NP = PQ
= QM =a. Isso implica que o quadrilátero MNPQ é um losango. Vamos mostrar que,
de fato, ele é um quadrado. Suponhamos que os ângulos agudos do triângulo de
hipótese sejam: α e β.
Pela congruência dos triângulos QAM, MBN, NCP e PDQ descritos acima, os
ângulos agudos destes triângulos retângulos medem α e β, de acordo com a figura
acima. Como α + β = 90º segue que cada ângulo interno do quadrilátero MNPQ deve
ser reto. Isso demonstra que MNPQ é um quadrado de lado a. Daí a área do
quadrado de lado b +c é igual à soma da área do quadrado de lado a com a área de
quatro triângulos retângulos de catetos b e c. Isto é:
, como queríamos demonstrar. (OLIVEIRA,
2008, p.7)
Diante da demonstração original do Teorema de Pitágoras e de uma demonstração
geométrica com colaboração algébrica, observa-se a diferença de termos usados em ambos os
casos. Na primeira, a formalização grega é riquíssima com sua preocupação em expor a figura
geométrica e a prova do rigor matemático, porém o que se torna mais interessante é a clareza
dos dados muito bem escritos para uma geometria grega bastante antiga, mas com uma
preocupação forte na linguagem geométrica da época. Já a atual é mais detalhada com a
separação das figuras e o uso da álgebra que contribui com um melhor para a linguagem
contemporânea da matemática.
Assim, diante da força euclidiana, toda essa geometrização perdurou no ocidente por
mais de um milênio após o declínio da civilização helenística.
Dentro dessa estruturação lógica, Euclides escreveu cinco postulados, e
diferentemente de Aristóteles que tinha definições distintas para axiomas e postulados, não via
variação e tratando-os como se fossem a mesma coisa. Desses cinco axiomas, quatro eram
44
diretos e claros, tanto é que não eram questionados e nem questionáveis dentro da
comunidade científica da época, entretanto o quinto postulado foi motivo de muitas
inquietações e dúvidas que perduraram por diversos séculos da história porque não era claro e
nem simples de ser verificado. Mlodinow (2004, p.46) diz que o postulado “não era
suficientemente simples para um postulado, e deveria ser demonstrável como um teorema”,
essa falta de simplicidade incomodou estudiosos por diversos séculos, e falaremos sobre isto
mais a frente.
A seguir, estão descritos o os cinco postulados de Euclides (2009, p. 98):
1. Fique postulado traçar uma reta a partir de todo ponto até todo ponto.
2. Também prolongar uma reta limitada, continuamente, sobre uma reta.
3. E, com todo centro e distância, descrever um círculo.
4. E serem iguais entre si todos os ângulos retos.
5. E, caso uma reta, caindo sobre duas retas, faça os ângulos interiores e do mesmo lado
menores do que dois retos, sendo prolongadas as duas retas, ilimitadamente, encontrarem-se
no lado no qual estão os menores do que dois retos.
Os matemáticos e filósofos não aceitavam que o postulado das paralelas não fosse
passível de prova, eles queriam e tentavam, de qualquer forma, mostrar que se tratava de um
teorema e não um postulado
26
, como afirmara Euclides em sua obra. Neste sentido, queriam
mostrar que havia um equívoco em um dos volumes de Os Elementos. Um exemplo deste
questionamento foi feito por Saccheri (1667- 1733), onde discutiremos posteriormente e que
culminaram no surgimento de uma nova geometria.
Na seção seguinte, aponta-se a discussão sobre esse quinto postulado, alvo de tantos
estudos, questionamentos e o “pontapé” inicial para uma geometria que até então não era
conhecida, o que atesta uma das características de anomalia, isto é, avanço para o ramo
diante do padrão.
3.3 UM RECORTE HISTÓRICO SOBRE A GEOMETRIA NÃO-EUCLIDIANA
Nesta seção discorrerá sobre as forma mais abrangente da geometria não-euclidiana,
destacando desde os primeiros questionamentos ocorridos na Grécia Antiga até os que
provocaram o descobrimento desta geometria tão influente para os dias atuais.
26
De acordo com o Dicionário: Postulado ˗ “S.m. (1813)1 o que se considera como fato reconhecido e ponto de
partida, implícito ou explícito, de uma argumentação; premissa; 2 afirmação ou fato admitido sem necessidade
de demonstração” (HOUAISS, 2001, p. 1532). Teorema ˗ “S.m. (1685) proposição que procede ser demonstrada
por meio de um processo lógico [...]” (HOUAISS, 2001, p. 1829).
45
Desde a Antiguidade, quando Euclides apresentou seus postulados, o quinto sempre
foi analisado de forma cautelosa por seus contemporâneos por que não é tão evidente e direto
quanto os quatro anteriores. Muitos intelectuais davam por certo que se tratava de uma
proposição
27
ao invés de um axioma, porém não obtendo êxito em suas pesquisas. Mas foi a
partir desses questionamentos sobre a demonstrabilidade desse axioma que surgiu uma
nova geometria, a geometria não-euclidiana.
O surgimento da geometria não-euclidiana foi visto como um desenvolvimento
revolucionário e notável ocorrido durante a primeira metade do século XIX, autoconsistente
e diferente da usual geometria euclidiana.
Os filósofos tentavam demonstrar o postulado das paralelas desde a antiguidade,
porém não obtendo êxito, como Ptolomeu, século II, que tentou demonstrá-lo baseados nos
outros axiomas da própria obra de Euclides. Esses questionamentos duraram vários séculos,
alguns pesquisadores tentaram provar tal postulado, mas, de acordo com Eves (2011, p. 540),
“a primeira investigação realmente científica do postulado das paralelas só foi publicada em
1773 e seu autor é o jesuíta italiano Girolamo Saccheri (1667-1733).”.
Girolamo Saccheri foi um professor da universidade de Pavia que nasceu no século
XVII, e teve a oportunidade de ler Os Elementos, de Euclides. A partir dessa leitura ele se
interessou pelo método da redução ao absurdo e, com isso, começou a escrever sobre lógica.
Saccheri escrevia textos matemáticos voltados para o método de redução ao absurdo até que,
em um determinado período de sua carreira acadêmica, decidiu aplicar este método ao 5º
Postulado, sendo mais um a querer demonstrá-lo, porém não obtendo o sucesso esperado.
Mas, de acordo com Eves (2004, p. 540), sua hipótese era válida e consistente para provar a
existência da geometria não-euclidiana, contudo, por algum motivo não conseguiu verificar
tal feito.
O suíço Joahnn Heinrich Lambert (1729-1777) também usou o método da redução ao
absurdo e escreveu algo parecido com o que seu antecessor Saccheri. De acordo com Eves
(2004) sua investigação foi intitulada Die Theorie Parallellinien que só veio a ser publicada
após sua morte. Lambert não obteve êxito, pois suas conclusões foram imprecisas e
insatisfatórias.
Legendre (1752-1833) foi outro que tentou demonstrar, também sem sucesso, na sua
pesquisa. Dados históricos contidos em Eves (2004) afirmam que este francês foi o último a
tentar demonstrar o 5º postulado crendo que poderia conseguir provar que se tratava de uma
27
Proposição: Sinônimo de teorema.
46
proposição, pois no mesmo século nasceram os matemáticos, os quais aceitaram em suas
hipóteses concordaram com a veracidade do axioma e chegaram a um resultado
revolucionário e de extrema valia ao descobrimento e desenvolvimento desta nova geometria,
a geometria não-euclidiana.
Os créditos para o seu surgimento foram dados a três respeitados pesquisadores, são
eles: Bolyai (1802-1860), Lobachevsky (1793-1856) e Gauss (1777-1855). A seguir, serão
detalhadas as contribuições desses pensadores sobre só terem questionado o 5º postulado, mas
a partir de tal questionamento terem visto que existia uma nova geometria.
Janos Bolyai foi um oficial do exército húngaro, filho do matemático Farkas Bolyai
(professor universitário e contemporâneo de Gauss). Conta-se que Farkas, passou tanto tempo
tentando demonstrar esse postulado, que ao ver o seu filho trabalhar sobre a mesma coisa,
decidiu escrever-lhe uma carta (em 1820) pedindo-lhe que não continuasse a trabalhar sobre
esse assunto e fosse pesquisar outros temas. Um trecho da carta é citado por Struik (1989,
p.270).
Devias detestar tanto isso como as coisas perversas, que te podem privar de todo
lazer, da tua saúde, do teu descanso e de toda a alegria da tua vida. Esta escuridão
insondável podia talvez destruir um milhar de poderosos Newtons, sem nunca haver
luz na Terra [...].
Eves (2004, p.542), afirma que Janos entendeu a coerência que havia no axioma e
ficou entusiasmado comentando, em 1829, ao pai que havia criado um “universo novo e
estranho”. Após isso, Farkas insistiu para que seu trabalho fosse publicado como um apêndice
de sua obra, enfim, no ano de 1832 o trabalho foi publicado com sucesso. Esse foi o único
trabalho notório de Janos, embora tivesse escrito diversos manuscritos que caracterizavam a
GNE (geometria não-euclidiana).
Outro matemático que, por sinal, era contemporâneo de Janos, foi Nicolai
Lobachevski, um professor universitário russo que se tornou reitor da Universidade de Kazan.
Lobachevsky publicou seu primeiro artigo sobre GNE em 1829, antes de Bolyai, que só
conseguiu três anos depois. Segundo Eves (2004), seu trabalho não teve a atenção que lhe era
merecida, talvez por causa do idioma em que fora escrito, o russo. Onze anos mais tarde, após
sua primeira publicação sobre as GNE, Lobachevski publicou um livro, esta feita escrito em
alemão, cujo título traduzido para o português é Investigações Geométricas Sobre a Teoria
das Paralelas. Depois, em 1855, antes do seu falecimento, escreveu outro em francês,
chamado de Pangeometria.
47
As informações existentes naquele século sobre as GNE eram poucas e seu
conhecimento se espalhava lentamente, por isso, Lobachevsky não conseguiu usufruir dos
méritos de suas descobertas, cujo reconhecimento veio depois de sua morte.
O terceiro matemático a quem foi atribuída a descoberta das GNE foi Carl Friederich
Gauss, um alemão, considerado o príncipe da Matemática. Desde criança era tido como
criança-prodígio, Eves (2004), devido seus feitos, professor Universitário, escreveu aos mais
diversos ramos da Matemática como a geometria, a álgebra e aritmética. Quando Bolyai
descobriu que tinha criado uma nova geometria, seu pai, Farkas que era amigo de Gauss,
enviou-lhe uma carta falando sobre o grande feito de seu filho, mas Gauss lhe respondera
informando que já tinha pesquisado sobre o assunto, porém não havia publicado por causa do
pensamento de Kant que ia de encontro com a ideia da geometria não-euclidiana para
sua época.
Vale ressaltar que, qualquer geometria que não satisfaça o axioma das paralelas é
considerada geometria não-euclidiana, por isso alguns não a chamam de geometria não-
euclidiana e sim as geometrias não-euclidianas.
A descoberta das geometrias não euclidianas é um capítulo fascinante da história da
Matemática, que se inicia no próprio momento em que Euclides trouxe a público os
Elementos, em que apresentava a Geometria Euclidiana numa forma axiomática. As
tentativas de provar o quinto postulado a partir dos outros, ao longo dos outros, ao
longo de tantos séculos, transformaram-se, ao final, no estudo da Geometria e
permitiram o entendimento de que havia de fato da uma família de proposições
equivalentes ao quinto postulado (CASTRO, 2011, p. 2).
Com a publicação dessa nova geometria de Lobachevsky, em 1829, e Bolyai, em
1831, ficou provado que o postulado das paralelas era verdadeiro em outro referencial e que,
além disso, existia uma geometria diferente da que era conhecida, a geometria não-euclidiana
que quebrava alguns padrões da euclidiana, mas a respeitava.
Com o surgimento das geometrias não-euclidianas foi solucionada a interminável
dúvida que se alastrou durante séculos sobre o postulado das paralelas, mostrou sua
independência em relação aos quatro axiomas anteriores, solucionou o questionamento
que havia se o mesmo se tratava de um axioma ou de uma proposição, extinguiu a ideia de
que existia apenas a geometria plana, libertando-a para que surgissem outras tão
relevantes quanto à inicialmente conhecida e perfeitamente axiomatizada por Euclides.
Eves (2004, p. 544) cita que:
Com a possibilidade de inventar geometrias puramente “artificiais”, tornou-se
evidente que o espaço físico devia ser visto como um conceito empírico derivado de
48
nossas experiências exteriores e que os postulados da geometria, formulados para
descrever o espaço físico, são simplesmente expressões dessas experiências, com
leis de uma ciência física.
A descoberta das geometrias não-euclidianas deixou clara e bem estabelecida a
abstração existente na matemática, em todas as suas linhas de pesquisa, uma vez que o
pensamento filosófico da época era o de Kant (1724-1804) e regava que o espaço era algo que
fazia parte do espírito humano e sem os postulados de Euclides não haveria a possibilidade de
um raciocínio consistente sobre o espaço.
Na verdade, de modo geral, os conceitos na nova geometria são mantidos como o de
circunferência e triângulo, mas o referencial é outro e as formas mudam (deformação).
Ao observar a história, nota-se que houve uma quebra de paradigmas e a partir daí começou
a notar que a geometria desenvolvida por Euclides não era única. Nesta perspectiva o
surgimento da geometria não-euclidiana é anomalia, pois não veio para negar a já existente,
mas trouxe uma visão mais ampla (que de certo modo deforma as concepções
euclidianas
28
) e contribuiu para o surgimento das novas geometrias.
3.3.1 As principais geometrias não-euclidianas sob enfoque histórico e anômalo
Depois que a Geometria não-euclidiana foi descoberta, as portas foram abertas para os
mais diversificados ramos da matemática, fazendo com que essa geometria tivesse
ramificações e ficasse conhecida no mundo matemático. Logo, surgiram algumas geometrias
não-euclidianas, dentre elas, destacaremos algumas que tem mais ênfase atualmente.
3.3.1.1 A geometria hiperbólica
Quando falamos sobre a origem da geometria não-euclidiana também nos referimos à
origem da Geometria Hiperbólica, pelo fato que Lobachevsky e Bolyai ao publicarem sobre a
geometria não-euclidiana estavam se referindo justamente a geometria hiperbólica.
A primeira publicação sobre a Geometria Hiperbólica é atribuída a Nicolai
Lobachevsky, no ano de 1929, um dos matemáticos mais importantes da Rússia. Boyer (1974,
p.396) afirma que Lobachevsky foi “o homem que revolucionou o assunto [geometria
euclidiana] pela criação de todo um ramo novo [o da geometria não-euclidiana]”.
Janos Bolyai, também publicou sobre a geometria hiperbólica três anos mais tarde de
28
Essa questão de deformar as concepções euclidianas é baseada nas características dos postulados de Euclides.
49
Lobachevsky, aceitando a hipótese da veracidade do 5º postulado e, também, negando sua
unicidade.
Começou a aceitar o postulado de Euclides como um axioma independente e
descobriu que era possível construir uma geometria, baseada noutro axioma, na
qual, através de um ponto do plano, se pudesse traçar uma infinidade de rectas
que não intersectam uma linha nesse plano [...] (STRUIK, 1989, p.270, grifo
nosso).
Na geometria hiperbólica assumem-se todos os axiomas da geometria euclidiana, mas
substitui o postulado das paralelas pelo axioma hiperbólico que é a negação de sua unicidade.
Observe como é definido o axioma hiperbólico, segundo Greenberg (2003, p. 187), “In the
hyperbolic geometry there exist a line / and a point P not on / such that at least two distinct
lines parallel to / pass through P.”29
Figura 17‒ Axioma hiperbólico
Fonte: (O autor)
Assim, esclarecendo, vejamos algumas características da geometria hiperbólica,
tomando como base as características dadas por Rocha (2012):
Num triângulo hiperbólico, temos que a soma das amplitudes dos ângulos internos de
um triângulo qualquer é menor que 180
0
;
Representada por uma superfície com curvatura negativa;
Por um ponto P podem passar infinitas retas paralelas a outra reta.
A próxima imagem é de triângulo hiperbólico cuja soma de seus ângulos internos é
menor que 180°.
29“Na geometria hiperbólica existe uma reta r e um ponto P fora da reta, tal que, pelo menos duas retas paralelas
a r distintas passam por P” (GREENBERG, 2003, p. 187, tradução nossa).
50
Figura 18‒ Plano hiperbólico1
Fonte: Queiroz; Santos e Augustini (2006, p.1)
A anomalia gerada no descobrimento da geometria hiperbólica foi quando houve a
negação do quinto postulado, mostrando assim que entre dois pontos pode passar mais
de uma reta paralela, claro que isto agora no espaço não-euclidiano, fato que não era aceito
e nem se havia descoberto antes de Lobachevsky e Bolyai.
3.3.1.2 A geometria elíptica e a geometria esférica
Conhecida como geometria riemmaniana, a geometria elíptica na qual a reta não é
infinita e substitui-se o postulado das paralelas pelo de Riemann, diz que quaisquer duas retas
em um plano têm um ponto de encontro. Portanto, na geometria elíptica considera-se como
modelo a esfera, ou melhor, a superfície esférica, onde retas seriam os círculos máximos ou
geodésicas
30
dessa superfície.
A geometria elíptica foi divulgada pela primeira vez em uma aula inaugural ministrada
em 1851 por Riemann para sua admissão como professor-adjunto na Universidade de
Göttingen. Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826 - 1866) foi um matemático alemão que
deu grande contribuição à geometria e também à análise matemática.
Thomaz e Franco (2007, p. 5) define geometria elíptica como “uma geometria tal que,
dada uma reta L e um ponto P não pertencente a L, não existe reta paralela a L passando por
P.” Logo, afirma nessa definição que na geometria elíptica não há retas paralelas entre si,
dados dois pontos. Alguns modelos da geometria elíptica são a Geometria Projetiva
31
, a
geometria estereográfica
32
e a geometria hiperesférica
33
.
30
Remete-se a geodésia ou mensuração da terra.
31
O princípio de dualidade e o princípio de continuidade estudado por Poncelet (EVES, 2004).
32
Uma “aplicação pela qual se representam os pontos de uma esfera, exceto um dos polos, por suas projeções, a
partir desse polo, sobre o plano equador” (EVES, 2004, p.221).
51
Vejamos algumas características da geometria elíptica:
A soma dos ângulos internos de um triângulo é maior do que dois retos;
O plano é uma superfície esférica, e a reta uma geodésica, ou circunferência do círculo
máximo;
Duas retas distintas perpendiculares a uma terceira se interceptam;
Uma reta não é dividida em duas por um ponto;
A área de um triângulo é proporcional ao excesso da soma dos seus ângulos;
Dois triângulos com ângulos correspondentes iguais são congruentes.
As figuras que seguem trazem um pouco da geometria esférica, a figura 19 traz a
imagem de um triângulo na esfera, onde mostra claramente que a soma de seus ângulos
internos é maior que 180°.
Figura 19 - Esfera1 Figura 20 ‒ Esfera 2
Fonte: ESFERA... (2012) Fonte: ESFERA... (2012)
Figura 21 ‒Esfera 3
Fonte: ESFERA... (2012)
Com a descoberta desta outra geometria ficou evidente que o postulado das Paralelas
não podia ser generalizado e usado para todos os referenciais possíveis, uma vez que, para a
33“Os pontos do espaço elíptico n-dimensional são os versores pertencentes a . Acesso em: 16 jun. 2013.
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87
APÊNDICES
88
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA TERRA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENSINO DE CIÊNCIAS NATURAIS E
MATEMÁTICA
PESQUISA: COMPREENSÃO DE ELEMENTOS GEOMÉTRICOS À LUZ DE
UMA ABORDAGEM HISTÓRICA DAS GEOMETRIAS NÃO-EUCLIDIANAS
ENQUANTO ANOMALIA
QUESTIONÁRIO
Caros Participantes,
O seguinte questionário tem como objetivo levantar informações referentes aos estudos das
não-euclidianas e apresentá-la como anomalia. Para futuros encaminhamentos, solicitamos a
gentileza de responder este questionário e devolvê-lo em seguida. Não precisa se identificar.
Agradecemos-lhe por responder.
Dados pessoais:
NOME:__________________________________________________-
IDADE: _____
NÍVEL DE FORMAÇÃO:
( ) ENSINO MÉDIO
COMPLETO
( ) ENSINO SUPERIOR
INCOMPLETO
( ) ENSINO SUPERIOR
COMPLETO
( ) ESPECIALIZAÇÃO
( ) MESTRADO
INCOMPLETO
( ) MESTRADO
COMPLETO
( ) DOUTORADO
INCOMPLETO
( ) DOUTORADO
COMPLETO
89
TIPO DE FORMAÇÃO
( ) Licenciado ( ) Bacharel
( ) Técnico
Em que curso?_____________________________________________
Caso seja professor,
( ) nível fundamental ( ) nível médio ( ) nível superior
Instituição:
( ) Pública ( ) Privada
INFORMAÇÕES DE CONTEÚDO:
1. O que você sabe de geometria?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
2. Você conhece a geometria euclidiana?
( ) SIM ( )NÃO ( ) Em parte
3. Considera que no ensino básico você estudou todo assunto proposto para geometria?
( )SIM ( )NÃO ( ) Em parte.
4. De 0 a 100%, qual a porcentagem que considera que estudou até o ensino médio?
______________
5. Já fez algum curso sobre geometria?
( )SIM ( )NÃO . Caso sim, quando e onde? ________________________
6. Em sua opinião, é importante estudar geometria na rede básica de ensino? Por que e
em qual nível?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
90
7. Para você, existe ou já existiu algum questionamento sobre a geometria de Euclides?
( )SIM ( ) NÃO. Caso sim, qual (is)?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
8. Quais os elementos que considera básicos da geometria euclidiana?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
9. O que você entende sobre ponto?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
10. O que você entende sobre reta?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
11. O que é necessário para que duas retas sejam paralelas?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
12. O que você entende sobre triângulo?
________________________________________________________________________
________________________________________________________________________
13. A soma dos ângulos internos de um triângulo é sempre de 180°?
( ) SIM ( ) NÃO
14. Você já ouviu falar em anomalia
( ) SIM ( )NÃO
91
15. O que você entende por anomalia?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
16. Já ouviu falar em anomalia na matemática?
( ) SIM ( ) NÃO
17. Já ouviu falar nas geometrias não-euclidianas?
( ) SIM ( ) NÃO. Caso sim, qual (is)?
18. Conhece sua história?
( ) SIM ( ) NÃO
19. Já fez algum curso de formação sobre as geometrias não-euclidianas?
________________________________________________________________
20. Existe algum paralelo entre a geometria euclidiana e a não-euclidiana? Pode citar
algum?
________________________________________________________________
21. Conhece alguma aplicação da geometria não-euclidiana? Caso sim, qual?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
92
APÊNDICE B – BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE AS RETAS PARALELAS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
ALUNO: ______________________________________________________________
CURSO: ______________________ TURNO: _______________________________
DATA: ___/___/______
BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE AS RETAS PARALELAS
Foi durante o período áureo da matemática grega que a geometria euclidiana teve mais
destaque no mundo e um dos que contribuíram para isto foi Euclides de Alexandria que,
segundo Eves (2004), viveu por volta de 300 a.C. , publicou a obra Os Elementos, na qual
estão várias proposições, demonstrações e axiomas da geometria que usamos até os dias de
hoje. De fato, nesta obra, Euclides esquematiza a geometria com uma estrutura lógica e um
rigor muito bem elaborada sendo tal estruturação considerada muito importante para a
matemática.
Vale destacar que, as demonstrações matemáticas deste período grego não eram
aritmetizadas como temos atualmente, elas eram geométricas. Dentre os axiomas que estão na
obra (coleção de treze livros), existe um em especial, o livro I, que foi responsável pela
perturbação de vários matemáticos, pois foi muito questionado por causa da sua falta de
clareza. Parecia mais um teorema que um postulado e, por isso, inúmeros matemáticos de
diversas épocas queriam demonstrá-lo para que pudessem contradizer aquilo que Euclides
afirmava. O responsável por toda esta discussão e que levou em torno de dois milênios para
ser esclarecido foi o 5º Postulado de Euclides, também conhecido como o Postulado das
Paralelas. Adiante, na atividade 1, exporemos tal postulado.
É com base neste postulado que elaboramos as atividades sobre retas paralelas deste
bloco, fazendo com que o aluno possa realizar sua investigação e verificar sua veracidade para
referenciais distintos.
Linhas paralelas são linhas num único plano que não convergem nem divergem, mas
têm todas as perpendicularidades, desenhadas dos pontos de uma para os da outra,
iguais” (Próclus, séc V, 176.5-176.11). Isto é, duas rectas são paralelas se forem
equidistantes, ou seja, se a distância medida numa qualquer perpendicular de uma
delas, for sempre igual, independentemente da perpendicular escolhida (CUORE,
2011).
93
Segundo a geometria euclidiana, as paralelas são retas que possuem uma mesma
distância entre si e, com isto, nunca se cruzam. Ou seja, nesta geometria as retas paralelas
nunca se encontram, são equidistantes. Mas será que esta afirmação serve para qualquer
geometria?
Baseando-se neste questionamento construiremos retas paralelas em espaços diferentes
para ver se este axioma se encaixa em todos os espaços e a partir daí analisar se existe ou não
uma anomalia.
Objetivo deste bloco de atividades: Levar o participante a perceber se há contradição no 5°
postulado ao afirmar que duas retas são paralelas quando são equidistantes entre si à luz da
geometria euclidiana e as não-euclidianas.
Material: folhas de papel sulfite, lápis grafite, régua, compasso, esfera de isopor e setor
hiperbólico de biscuit.
ATIVIDADE 1 – Retas na geometria euclidiana
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear régua e compasso.
Recorte histórico / Definição: Os Elementos foram publicados por Euclides em cerca de 300
a.C.. Nele estão alguns axiomas, os famosos Postulados de Euclides, onde se encontra o
Postulado das Paralelas que afirma o seguinte:
E, no caso de uma reta, caindo sobre duas retas, faça os ângulos interiores e do
mesmo lado menores do que dois retos, sendo prolongadas as duas retas,
ilimitadamente, encontraram-se no lado no qual estão os menores do que dois retos
(EUCLIDES, 2009, p.98).
Com isto, vamos construir tais retas paralelas e verificar a veracidade para a geometria
euclidiana.
94
Objetivo da atividade: Construir retas paralelas no plano euclidiano.
Procedimentos:
Sobre uma superfície plana representada por uma folha de papel sulfite, execute os
seguintes passos:
a) Dados dois pontos quaisquer, trace uma reta que passe pelos dois e chame-a de reta r;
b) Marque um ponto P fora da reta;
c) Construa com um arco de centro P, que intersecte a reta r;
d) Determine o ponto A nessa interseção;
e) Em seguida, construa outro arco, de mesmo raio, com centro em A, determinando o
ponto B a interseção do arco com a reta r;
f) Após isto, construa um arco de centro em B, de mesmo raio e que intersecte em algum
ponto do arco de centro P. Chame o ponto da interseção de Q.
g) Trace uma reta que passe pelos pontos PQ e chame-a de reta s.
h) A reta s é paralela a reta r, tomando como referência a geometria euclidiana de acordo
com a definição do recorte histórico?
( ) Sim ( ) Não
Justifique.
___________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________
ATIVIDADE 2 – Existe paralelismo na geometria esférica?
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear régua e compasso.
Recorte histórico / Definição: Quaisquer duas retas em um plano têm um ponto de encontro.
Portanto, na geometria elíptica considera-se como modelo a esfera, ou melhor, na superfície
esférica, onde retas seriam os círculos máximos ou geodésicas41 dessa superfície.
41
Remete-se a geodésia ou mensuração da terra.
95
Nesta Geometria, as retas são consideradas como os círculos máximos, chamados de
geodésicas, que dividem a esfera em duas partes iguais, assim como a linha do
equador ou as linhas de longitude da Terra. Esses círculos são chamados de
máximos, pois são os maiores círculos que podem ser traçados na esfera e desta
forma são os caminhos com menor curvatura. Sendo assim, tem-se uma analogia
com as retas no plano euclidiano, pois o caminho mais curto formado por dois
pontos da esfera é um arco do círculo máximo que passa por estes pontos. Dois
grandes círculos se cruzam, de modo que não existem retas paralelas nesta geometria
(CAMARGO, 2012, p.57).
Objetivo da atividade: Verificar se podem ser construídas retas paralelas no plano esférico ou
elíptico.
Procedimentos:
Sobre uma superfície esférica que é representada por uma esfera de isopor, execute os passos:
a) Dados dois pontos quaisquer, trace uma reta que passe pelos dois e chame-a de reta t;
b) Marque um ponto P fora da reta;
c) Construa com um arco de centro P, que intersecte a reta t;
d) Determine o ponto A nessa interseção;
e) Em seguida, construa outro arco, de mesmo raio, com centro em A, determinando o
ponto B à interseção do arco com a reta t;
f) Após isto, construa um arco de centro em B, de mesmo raio e que intersecte em algum
ponto do arco de centro P. Chame o ponto da interseção de Q.
g) Trace uma reta que passe pelos pontos P e Q e chame-a de reta u.
h) A reta que passa por u é paralela à reta t, tomando como referência a geometria
euclidiana?
( ) Sim ( ) Não
Justifique.
___________________________________________________________________________
______________________________________________________________________
ATIVIDADE 3 – Paralelismo na geometria hiperbólica
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear régua e compasso.
96
Recorte histórico / Definição: Para Lobachevsky (1792 – 1856), a ideia das retas paralelas no
plano hiperbólico não era a mesma estruturada por Euclides em sua obra Os Elementos, pois
chegou à conclusão que se o espaço muda a imagem e a definição também mudará. Foi assim,
quando desenvolveu seu axioma, o qual substitui o 5º postulado de Euclides, para sua
geometria hiperbólica. Seu postulado afirma o seguinte “existe uma reta r e um ponto P que não
pertence a r tal que por P passa ao menos duas retas paralelas à reta r” (FRANCO, [2008] apud
CAMARGO, 2012, p.49), entendendo reta como geodésica do espaço hiperbólico.
Procedimentos:
Sobre uma superfície hiperbólica, representado por uma sela de biscuit, execute os passos:
a) Dados dois pontos quaisquer, trace uma reta que passe pelos dois e chame-a de
reta m;
b) Marque um ponto P fora da reta;
c) Construa com um arco de centro P, que intersecte a reta m;
d) Determine o ponto A nessa interseção;
e) Em seguida, construa outro arco, de mesmo raio, com centro em A, determinando
o ponto B a interseção do arco com a reta m;
f) Após isto, construa um arco de centro em B, de mesmo raio e que intersecte em
algum ponto do arco de centro P. Chame o ponto da interseção de Q.
g) Trace uma reta que passe pelos pontos P e Q e chame-a de reta n.
h) A reta que passa por n é paralela a reta m, tomando como referência a geometria
euclidiana?
( ) Sim ( ) Não
Justifique.
___________________________________________________________________________
______________________________________________________________________
ATIVIDADE 4 – Identificando as anomalias?
Tipo de Atividade: Atividade individual
Objetivo da atividade: Analisar e perceber as similaridades e divergências que há na
construção de uma reta paralela à outra quando o espaço é mudado para diferentes
geometrias, observando se há a anomalia (deformação).
97
Procedimentos:
a) Mesmo sendo construídas em espaços distintos, as retas perderam sua principal
característica?
______________________________________________________________
b) As retas continuam sendo retas em todos os espaços?
( ) Sim ( ) Não
Justifique.
_____________________________________________________________________
__________________________________________________________
c) Possuem a mesma aparência física?
( ) Sim ( ) Não
Justifique.
_________________________________________________________
d) Quais as similaridades encontradas nas três retas construídas?
_____________________________________________________________________
_________________________________________________________
e) Quais as características divergentes das três retas?
__________________________________________________________
f) Houve alguma deformação em relação à definição de reta paralela do Quinto
Postulado de Euclides? Qual?
________________________________________________________________
g) Que conclusão sobre paralelismo pode ser tirada a partir destas construções?
__________________________________________________________
h) Podemos continuar afirmando que este tipo de construção, usada nas três atividades,
sempre chegará a duas retas paralelas? Por quê?
__________________________________________________________
__________________________________________________________
i) Diante dessas construções feitas, como você seria capaz de afirmar existem retas
paralelas em qualquer espaço?
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
98
REFERÊNCIAS
CAMARGO, Keilla Cristina Arsie. A Expressão Gráfica e o Ensino das Geometrias Não
Euclidianas. 2012. 144f. Dissertação (Mestrado em Ciências e em Matemática) –
Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2012. Disponível em: <
http://www.ppgecm.ufpr.br/Disserta%C3%A7%C3%B5es/005_KeilaCristinaArsieCamargo.p
df>. Acesso em: 21 nov. 2012.
CUORE, Raul Enrique. A Demonstração do Quinto Postulado de Euclides : Postulado das
Paralelas. 2011. Disponível em: . Acesso em: 21 nov. 2012.
EUCLIDES. Os Elementos. São Paulo: UNESP, 2009.
EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Tradução: Hygino H. Domingues.
Campinas: Editora da UNICAMP, 2004.
99
APÊNDICE C − BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE TRIÂNGULOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
ALUNO: ______________________________________________________________
CURSO: ______________________ TURNO: _______________________________
DATA: ___/___/______
BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE TRIÂNGULOS
Os triângulos são figuras geométricas que contêm três lados e, consequentemente, três
ângulos. É o polígono convexo com o menor número de lados. Há três tipos de triângulos, o
escaleno, cujos três lados são distintos; o triângulo isóscele, que possui dois lados congruentes
e o triângulo equilátero que possui os três lados iguais.
Durante vários séculos, mais precisamente, desde quando o conjunto de livros
organizado por Euclides de Alexandria (cerca de 300 a.C) chamado de Os Elementos − não se
tinha conhecimento de outro espaço, além do euclidiano e, por consequência, da existência
das entidades geométricas concebidas por Euclides em outro referencial, mas no século
XVIII, depois de várias tentativas de demonstrações do 5º postulados de Euclides, três
matemáticos, Bolyai (1802-1860), Lobachevsky (1793-1856) e Gauss (1777-1855) foram
responsáveis por uma revolução ocorrida na matemática a partir do descobrimento das
geometrias não-euclidianas.
O surgimento da Geometria não-euclidiana foi visto como um desenvolvimento
revolucionário e notável ocorrido durante a primeira metade do século XIX, auto-consistente
e diferente da usual geometria euclidiana.
Dentre este desenvolvimento revolucionário, foram mudadas algumas propriedades −
como a da soma dos ângulos internos de um triângulo que não pode ser considerada a mesma
para qualquer espaço − ou até mesmo obtidas generalizações das entidades geométricas.
Acompanharemos o processo anômalo, que notadamente implica em deformações nas figuras
euclidianas, mas que conserva sua definição com adaptações das propriedades. É, pois, o caso
do triângulo. Isto posto, propomos generalizar a definição de triângulo para diferentes espaços
e desprender tal definição da imagem. Além disso, dispomos por verificar se a soma dos seus
ângulos internos é sempre 180º mesmo que mude o espaço a ser estudado, a partir disto
verificaremos a quebra de paradigmas das definições de somas de triângulos do espaço
100
euclidiano. Pois é sabido que os livros do ensino básico e superior como, Giovanni Júnior
(2009), Iezzi (2009), dentre outros, generalizam a definição desta soma não revelando para
que referencial isto serve, por algum motivo a generalizam.
Vamos iniciar as atividades com uma abordagem investigativa para que o aluno
observe as semelhanças e divergências das construções feitas nos espaços distintos.
Objetivo deste bloco de atividades: Conduzir o participante a definição geral de triângulo
independente da geometria e, consequentemente, a ampliação do conceito e das propriedades
do triângulo desprendida, necessariamente, da imagem. Através das figuras geométricas
construídas em espaços distintos, eles verificarão as diferentes características das geometrias.
Material: Folhas de papel sulfite, lápis grafite, régua, esfera de isopor, setor hiperbólico de
biscuit e transferidor.
ATIVIDADE 1 – Construção do triângulo na geometria euclidiana
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear o compasso.
Recorte histórico: Quando nos referimos aos triângulos vem em nossa mente aquela figura
convexa com três lados não colineares, Euclides, no livro I de sua obra, Os Elementos, chama
figuras com três lados de triláteras e as define da seguinte forma: “E das figuras triláteras, por
um lado, triângulo equilátero é o que tem os três lados iguais, e, por outro lado, isósceles, o
que tem só dois lados iguais, enquanto escaleno, o que tem os três lados desiguais”.
(EUCLIDES, 2009, p.98). Apoiado nesta definição histórica os livros didáticos trazem:
Definição de triângulo: “Dados três pontos A, B e C não colineares, chama-se ABC a reunião
dos segmentos ·, e ”. (IEZZI, 2009, p.99)
Estudamos no ensino básico que a soma das medidas dos ângulos internos de um
triângulo qualquer mede 180°, como afirmam os livros do Iezzi (2009) e do Giovanni Júnior
(2009). Tomando esta afirmação como parâmetro, vamos construir figuras com base nestes
passos alguns espaços diferentes e verificar se a imagem é nítida ou se há deformação.
101
Objetivo da atividade: Induzir o participante a construir um triângulo no plano euclidiano que
está incluído nos parâmetros curriculares brasileiros. (BRASIL, 1997, p.38)
Procedimentos:
a) Marque três pontos não colineares em uma folha de papel.
b) Ligue estes pontos.
c) Que figura formou?
________________________________________________________________
ATIVIDADE 2 – Construção do triângulo na geometria esférica
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear o compasso.
Recorte histórico: Conhecida como geometria riemmaniana a geometria elíptica consiste
naquela em que reta não é infinita e onde se substitui o postulado das paralelas pelo de
Riemann, o qual afirma que quaisquer duas retas em um plano têm um ponto de encontro.
Portanto, na geometria elíptica considera-se como modelo a esfera, ou melhor, na superfície
esférica, onde retas seriam os círculos máximos ou geodésicas
42
dessa superfície.
Objetivo da atividade: Fazer com que o participante identifique no traçado na geometria
elíptica e construa um triângulo neste espaço.
Procedimentos
a) Pegue uma esfera de isopor e marque três pontos não colineares sobre sua superfície.
b) Ligue estes pontos.
c) Que figura formou?
_____________________________________________________________
42
Remete-se a geodesia ou mensuração da terra a partir do pólo norte ao pólo sul.
102
ATIVIDADE 3 – Construção do triângulo na geometria hiperbólica
Tipo de atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear o compasso.
Recorte histórico: O matemático francês Henri Poincaré (1854 - 1912) criou um mapa que
auxilia na visualização do plano hiperbólico. Esse mapa é um desenho gráfico que se propõe a
representar, sobre uma superfície plana, o que existe na realidade em uma região acidentada.
O site Seara da Ciência43 afirma que, mapa de Poincaré é do tipo que os matemáticos
chamam de mapa conforme. Nesse tipo de mapa, os ângulos são mantidos invariantes pela
transformação. Isto é, se duas retas do espaço hiperbólico se cruzam e formam um ângulo
qualquer, as representações dessas duas retas no mapa também se cruzam formando o mesmo
ângulo.
Definição: Um triângulo consiste numa figura escrita sobre um plano hiperbólico com três
lados e três ângulos.
Objetivo: Fazer com que o participante identifique no traçado na geometria elíptica e construa
um triângulo neste espaço.
Procedimentos:
a) Com o uso dessa sela conhecida como setor hiperbólico, um sólido feito de biscuit,
marque três pontos não colineares sobre sua superfície.
b) Ligue estes pontos.
c) Que figura formou?
ATIVIDADE 4 – Fazendo algumas verificações nas figuras (Soma dos ângulos internos
das figuras)
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber manusear o transferidor e somar ângulos.
43 Disponível em: < http://www.seara.ufc.br/>. Acesso em: 20 nov. 2011.
103
Recorte histórico: Estudamos no ensino básico que a soma das medidas dos ângulos internos
de um triângulo qualquer mede 180°, como afirmam os livros do Iezzi (2009) e do Giovanni
Júnior (2009). Tomando esta afirmação como parâmetro, vamos verificar se esta propriedade
da soma dos ângulos internos serve para qualquer espaço.
Objetivo da atividade: Conduzir o participante a verificação das somas dos ângulos internos
das figuras construídas.
Procedimentos:
Com o auxílio de um transferidor, meça as medidas formadas pelos ângulos obtidos
pelas figuras, depois as some, completando a tabela.
a) A tabela abaixo será completada com a soma dos ângulos internos das figuras que
você construiu nas três atividades anteriores. Logo, a figura da Atividade 1, a
tabela aparecerá como Figura 1, na da Atividade 2, aparecerá Figura 2 e na
Atividade 3, Figura 3.
Figura 1
Figura 2
Figura 3
Medida do ângulo 1
Medida do ângulo 2
Medida do ângulo 3
Soma das medidas destes ângulos
b) O que pode concluir sobre a soma dos ângulos internos das figuras em seus
respectivos espaços? É sempre180º?
__________________________________________________________________
____________________________________________________________
104
c) Essa característica de triângulo pode ser generalizada para todos os espaços?
( ) Sim ( )Não
d) Como você escreveria?
__________________________________________________________________
_____________________________________________________________
ATIVIDADE 5 – E as anomalias
Tipo de Atividade: Atividade individual
Objetivo da atividade: Analisar e perceber as similaridades e divergências que há na
construção de um triângulo quando o espaço é mudado, observando a anomalia existente
quando o referencial é o espaço euclidiano e fazendo com que obtenha um conceito geral
independente do espaço, e desligando-o, necessariamente, da imagem.
Procedimentos:
a) Mesmo sendo construídas em espaços distintos, as figuras perderam sua principal
característica?
____________________________________________________________________
b) As figuras possuem a mesma aparência física?
____________________________________________________________________
c) A soma dos ângulos internos dos três triângulos é igual?
___________________________________________________________________
d) Que conclusão pode ser tirada a partir destas construções?
____________________________________________________________________
e) Houve alguma deformação em relação ao triângulo de Euclides? Qual?
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________
f) Podemos continuar afirmando que a soma dos ângulos internos de qualquer triângulo
mede 180°? Por quê?
g) Quais as similaridades encontradas nas três figuras construídas?
____________________________________________________________________
h) Quais as características divergentes das três figuras?
105
REFERÊNCIAS
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais :
matemática /Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.
EUCLIDES. Os Elementos. São Paulo: UNESP, 2009.
EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Campinas, SP: Editora da
UNICAMP, 2011.
GIOVANNI JÚNIOR, José Ruy. A Conquista da Matemática. São Paulo: FTD, 2009.
IEZZI, Gelson. Matemática e Realidade. São Paulo: Atual, 2009.
106
APÊNDICE D – BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE A DISTÂNCIA ENTRE DOIS
PONTOS
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
ALUNO: ______________________________________________________________
CURSO: ______________________ TURNO: _______________________________
DATA: ___/___/______
BLOCO DE ATIVIDADES SOBRE A DISTÂNCIA ENTRE DOIS PONTOS
A necessidade de se encontrar a menor distância entre dois pontos existe desde a
antiguidade, uma vez que, obviamente, é procurado o menor percurso a ser feito quando se
desloca de um lugar para outro.
Indícios nos levam a acreditar que os primeiros cálculos feitos para que se calculasse
essa menor distância fosse através do Teorema de Pitágoras, onde em um triângulo retângulo
é mostrado que o quadrado da hipotenusa é igual a soma dos quadrados de seus catetos, ou
seja, tomando um triângulo de lados abc, onde a é a hipotenusa, b e c os catetos, o cálculo é
feito pela seguinte fórmula: a
2
= b
2
+ c
2
.
A partir daí a fórmula da distância entre dois pontos (desenvolvida na Geometria
Analítica) surgiu séculos mais tarde, quando Descartes desenvolveu o estudo sobre o plano
cartesiano e Leibniz
44
(1646 - 1716) e, segundo Eves (2011), nomeou o eixo das coordenadas,
sendo o eixo horizontal é a abscissa e o eixo vertical é a ordenada, em 1692.
Segundo o site Taxicab geometri45no final do século XIX, Herman Minkowski (1864-
1909) desenvolveu uma métrica considerada uma geometria não-euclidiana, e conhecida
como a geometria do motorista de táxi. Nela, a menor distância entre pontos é calculada de
forma diferente a que Euclides demonstrou em sua obra Os Elementos.
Na geometria do táxi, considera-se como referência a zona urbana de uma cidade com
suas ruas bem definidas e fazendo o percurso nos sentidos horizontais e verticais (quadras).
Se considerarmos cidades com ruas bem definidas, a exemplo de Brasília e
analisarmos matematicamente, este menor caminho será a menor distância entre dois pontos
44
Gottfried Wilhelm Leibniz foi um matemático alemão que nasceu no século XVII e foi bastante influente para
matemática da época, sendo considerado o grande gênio universal do século XVII, como afirma (EVES, 2011).
45 Disponível em: < http://www.taxicabgeometry.net/index.html>. Acesso em: 23 nov. 2013.
107
que estudamos na geometria euclidiana? Para moradores de cidades diferentes é preciso fazer
um deslocamento de um local para o outro e o mais comum é procurarmos realizar o menor
caminho para se chegar ao local desejado.
Nas atividades que seguem desejamos mostrar ao aluno que nem sempre a menor
distância entre dois pontos é uma reta como afirma Euclides. Com isso, provaremos a
existência das anomalias também na distância entre dois pontos a medida que veremos a
quebra do paradigma euclidiano neste aspecto quando mostramos que a menor distância entre
dois pontos nem sempre é uma reta e que o referencial a ser visto tem que ser pré-
estabelecido, a exemplo das distâncias na métrica do taxi e na esférica.
Objetivo deste bloco de atividades: Mostrar ao leitor a geometria do taxi juntamente com sua
métrica (anômala ao referencial euclidiano) onde serão observadas as diferenças dos cálculos
das distâncias e nas próprias medições com régua nas geometrias não-euclidianas e
euclidianas.
Material: Folhas de papel sulfite, esfera de isopor, lápis grafite e régua.
ATIVIDADE 1 – A entrega da pizza
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber marcar pontos no plano euclidiano e calcular distância entre
dois pontos na geometria euclidiana.
Recorte histórico: Quando se marca três pontos não colineares sobre o plano cartesiano, pode-
se formar um triângulo retângulo, onde a hipotenusa é a reta que liga dois destes pontos.
Desta forma, a menor distância entre dois pontos calculadas no plano cartesiano é
encontrada da seguinte maneira:
Observe o triângulo retângulo a seguir e com base nele, será feita a demonstração da
fórmula da distância entre dois pontos.
108
Dados dois pontos distintos A e B marcados no plano cartesiano, é traçada uma reta
que ligue estes dois pontos. O segmento AB é a hipotenusa do triângulo retângulo ABC, o
segmento AC é um cateto e o segmento BC é o outro cateto, logo:
[d(A, B)]
2
= [d(A,C)]
2
+ [d(B,C)]
2
,
como:
[d(A,C)]
2
= (x1 – x2)
2
e [d(B,C)]
2
= (y1 – y2)
2
temos,
[d(A, B)]
2
= (x1 – x2)
2
+ (y1 – y2)
2
então:
d(A, B) =
Com o tempo, foi-se observando que o cálculo dessas distâncias não poderia ser usado
para todos os tipos de referenciais, com isto surgiu a necessidade de observar se havia um
outro tipo de métrica que fosse capaz de calcular distâncias em outros espaços e foi assim que
surgiu a geometria do táxi.
Objetivo: Mostrar ao leitor a geometria do táxi juntamente com sua métrica (anômala ao
referencial euclidiano) onde será observada a diferenças dos cálculos das distâncias nas
geometrias não-euclidianas e euclidianas.
Figura 1 - Triângulo retângulo
Fonte: (O autor)
109
Problemática
Uma pizzaria de Natal recebe duas ligações de clientes encomendando duas pizzas,
concomitantemente. A primeira entrega será no ponto A(-3; 4) e a segunda será no ponto
B(2; -3). Sabendo que a pizzaria se encontra no ponto C(3; 3).
Procedimentos:
a) Utilizando a malha abaixo, marque os pontos A, B e C.
Figura 2 – Trajeto da pizzaria as residências
Fonte: (O autor)
b) Usando a fórmula da distância da geometria analítica, calcule a menor distância d(C,
A) e d(C, B).
d(C, A)=
d(C, B)=
110
c) Usando a métrica do táxi, calcule a menor distância ente os pontos d(C, A) e d(C, B).
d(C, A)=
d(C, B)=
d) As distâncias medidas nas duas métricas são iguais?
( ) Sim ( ) Não
e) Na prática, qual seria um dos caminhos percorridos do ponto C ao ponto A? E do
ponto C ao ponto B?
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
f) E na teoria?
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
g) É viável proceder com o cálculo da geometria analítica nesta situação? Por quê?
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________
h) Diante desta situação, você pode generalizar a afirmação que a distância entre dois
pontos sempre será uma reta?
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
i) Quais as similaridades encontradas nos cálculos dessas distâncias?
_____________________________________________________________
j) Quais as características divergentes dos cálculos dessas distâncias?
_____________________________________________________________________
________________________________________________________________
111
ATIVIDADE 2 – Problema do urso
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Saber os pontos cardeais.
Recorte histórico: Como explicado no bloco de atividades sobre triângulos, a geometria
esférica foi descoberta pelo famoso matemático Riemann (1826-1866) que viveu pouco, mas
deixou uma enorme contribuição à matemática. Vejamos a citação seguinte, na qual relata de
forma sucinta seu pensamento sobre a geometria não-euclidiana:
Em 1854, Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826 - 1866) mostrou que,
descartando-se a infinitude da reta, e admitindo-se simplesmente que a reta seja
ilimitada, então, com alguns outros ajustamentos pequenos nos demais postulados,
pode-se desenvolver uma outra geometria não-euclidiana consistente a partir da
hipótese do ângulo obtuso (EVES, 2011, p. 544).
Problemática:
“Um urso saiu de sua casa, caminhou 100 km ao sul. Depois virou ao oeste e caminhou por
100 km. Então virou novamente e caminhou 100 km ao Norte. Qual não foi a sua surpresa
quando percebeu que voltara novamente para a sua casa. Responda, qual é a cor do urso?”
Figura 3 – O Urso
Fonte: O URSO... (2013)
Objetivo da atividade: Argumentar sobre o cálculo de distâncias na geometria elíptica e
verificar a diferença desse cálculo relacionando-o com o da geometria euclidiana.
112
Procedimentos:
a) Desenhe em uma folha de papel, com uma determinada escala, o caminho percorrido
pelo urso.
b) De acordo com a situação acima é possível que o urso volte ao ponto de partida?
( ) Sim ( )Não
c) Desenhe sobre uma esfera o caminho percorrido pelo urso.
d) Analisando o percurso desenhado sobre a superfície esférica, é possível para o urso
voltar ao mesmo ponto de partida?
( ) Sim ( ) Não
e) A mudança do plano para a esfera modificou o trajeto? Explique.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________
f) O que houve para que essa conclusão seja tomada?
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
g) Houve alguma deformação em relação à geometria euclidiana? Qual?
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________
ATIVIDADE 3 – Passeando em Brasília
Tipo de Atividade: Atividade individual
Conhecimentos prévios: Lápis grafite e régua.
Recorte histórico: Brasília foi construída para se tornar a capital do país. Foi propositalmente
planejada com suas ruas bem desenhadas e com o objetivo de ser o berço dos três poderes do
Brasil.
A cidade de Brasília que hoje tem dois milhões e meio de habitantes, é conhecida
mundialmente por ter aplicado os princípios estabelecidos pela carta de Atenas de
1933 e ter concretizado o pensamento urbanístico dos anos 50. Sua construção
começou em 1956, sendo Lucio costa seu urbanista e Oscar Niemeyer o principal
113
arquiteto. Três anos e dez meses mais tarde, em 21 de abril de 1960, se transformou
oficialmente na capital brasileira.
Brasília foi declarada Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco em
1987, sendo a única cidade construída no século XX que recebeu esta honra.
(BRASILIA 50..., 2013)
Como as ruas de Brasília foram planejadas para se tornar uma cidade moderna e bem
localizada, tomamos uma parte do mapa da cidade para fazer nosso experimento e calcular
uma distância entre dois pontos a partir de geometrias distintas.
Objetivo: Mostrar ao leitor a geometria do t áxi juntamente com sua métrica (anômala ao
referencial euclidiano) onde será observada a diferenças dos cálculos das distâncias nas
geometrias não-euclidianas e euclidianas.
Problemática: Um grupo de turistas do Rio Grande do Norte estava passeando na cidade de
Brasília e em um determinado dia resolveram conhecer a Praça dos Três Poderes. Chegando à
Safs Quadra 1, olharam o mapa e calcularam um possível deslocamento a ser feito para
chegar o mais rápido à Praça.
Observem o mapa que liga a Safs Quadra 1 até a Praça dos Três Poderes.
Figura 4 – Praça dos Três Poderes
Fonte: BRASILIA... (2013)
Procedimentos:
a) Com o uso de uma régua e usando a escala da imagem, encontre a distância a ser
percorrida, pelo grupo a partir do ponto A ao ponto B contidos na figura, que está
tracejado de vermelho.
114
b) Quantos centímetros? _________________________________________________
c) Esse caminho pode ser perfeitamente percorrido pelo grupo? Por quê?
_____________________________________________________________________
_______________________________________________________________
d) Agora com esta mesma régua, meça o caminho traçado de azul, que sai do Safs
Quadra 1 à Praça dos Três Poderes.
e) Quantos centímetros?
________________________________________________________________
f) Qual trajeto é mais curto para se chegar ao ponto B, o primeiro ou o segundo?
________________________________________________________________
g) Qual trajeto é mais viável, o primeiro ou o segundo? Justifique.
___________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
h) Diante desta situação, podemos concluir que a menor distância entre dois pontos, neste
caso, percursos, sempre será uma linha reta, independente do obstáculo que venha ser
encontrado? Justifique.
___________________________________________________________________________
___________________________________________________________________________
____________________________________________________________________
i) Quais as similaridades encontradas nos cálculos dessas distâncias?
_____________________________________________________________
j) Quais as características divergentes dos cálculos dessas distâncias?
__________________________________________________________
115
REFERÊNCIAS
BRASÍLIA no Google Maps. Disponível em: . Acesso em: 10 jan. 2013.
BRASILIA 50 anos: meio século da capital do Brasil. 2013. Disponível em:
. Acesso em: 10 jan. 2013.
EVES, Howard. Introdução à História da Matemática. Campinas, SP: Editora da
UNICAMP, 2011.
O URSO. 2013. Disponível em: < http://khaostopia.blogspot.com.br/2010/01/geometria-
com-ursos-geometria-nao.html> . Acesso em: 10 jan. 2013.
TAXICAB Geometry. Disponível em: .
Acesso em: 23 nov. 2012.