1 UMA PROPOSTA DE MINICURSO PARA PROFESSORES E PLANETARISTAS Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço Bruna Raíssa Gomes dos Santos Batista Orientadora: Auta Stella de Medeiros Germano Natal-RN 2017 Lista de Figuras Figura 01: Noções sobre o conceito de Terra identificadas por Nussbaum e Novak (1976).........................................................................................................................22 Figura 02: Ilustração dos desenhos das crianças em resposta às questões de Nussbaum e Novak (1976) sobre a queda de objetos na superfície da Terra .............23 Figura 03: Ilustração dos desenhos das crianças em resposta às questões de Nussbaum e Novak (1976) sobre a queda de objetos no interior da Terra.................24 Figura 04: Representações alternativas para o formato da Terra identificados por Vosniadou e Brewer (1992)........................................................................................25 Figura 05: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo “Terra embaixo, céu em cima”.....................................................................................34 Figura 06: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo em camadas................................................................................................. ....................34 Figura 07: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo plano........................................................................................................................ ...35 Figura 08: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo das “Terras-países”....................................................................................................35 Figura 09: Representação de Universo Contextual identificada por Rodriguez e Sahelides (2005).........................................................................................................36 Figura 10: Representação de Universo Geocêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005).........................................................................................................37 Figura 11: Representação de Universo Heliocêntrico com destaque para o tamanho do Sol identificada por Rodriguez e Sahelides (2005).................................................37 Figura 12: Representação de Universo acêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005).........................................................................................................38 Figura 13: Planetário de Pobre de Caniato (2011) ...................................................41 Figura 14: “MiniTerra” com Esfera Celeste de Vidro...................................................43 Figura 15: Peças móveis representativas dos planetas do Sistema Solar com tamanhos em escala...................................................................................................46 Figura 16: Caixa das constelações representando as estrelas da constelação Cruzeiro do Sul com as distâncias entre elas em escala...........................................................49 Sumário 1 Introdução................................................................................................................3 2 Visão geral da Proposta de Minicurso....................................................................5 2.1 Dimensões da Educação em Astronomia valorizadas no Minicurso....................5 2.2 O Plano de Ensino do Minicurso.........................................................................8 3 Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço”....................................................................................20 3.1 Conversando sobre como nossos alunos e público pensam: representações sobre a forma da Terra...................................................................................... .......20 3.2 Registro coletivo do Horizonte Local .........................................................27 3.3 Orientação de um Globo paralelo à Terra no espaço........................................28 3.4 Análise e discussão das representações sobre a forma da Terra.....................30 4 Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial.....................................................................................................................32 4.1 Conversando sobre como nossos alunos e público pensam: representações sobre o Universo......................................................................................................32 4.2 Sessão “Reconhecimento do Céu”....................................................................39 4.3 Exploração de uma Esfera Celeste de Vidro.....................................................40 4.4 Manuseio de Peças móveis do Sistema Solar...................................................46 4.5 Exploração de Fita com distâncias em escala e de Caixa das constelações, Simulação de um eclipse solar e Discussão de imagens em banners....................48 4.6 Análise e discussão das representações sobre o Universo...............................51 5 Algumas considerações para o(a) colega educador(a).....................................53 Referências............................................................................................................55 APÊNDICE A – Questionário sobre as representações de Universo..................57 Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 3 1 Introdução Prezado(a) colega educador(a), a Proposta de Minicurso aqui apresentada caracteriza-se como produto educacional resultante de uma pesquisa de mestrado profissional realizada pela autora e orientadora no Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática (PPGECNM) ofertado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Na referida pesquisa, foram investigadas representações de crianças do Ensino Fundamental sobre a forma da Terra, a composição do Universo e sua organização espacial, antes e após participarem de um conjunto de atividades pedagógicas desenvolvidas durante uma visita escolar ao Planetário Móvel da UFRN - Barca dos Céus. O desenvolvimento daquele estudo favoreceu um aprofundamento nos fundamentos das atividades desenvolvidas pelo Planetário, bem como algumas alterações relevantes nestas, fornecendo ao mesmo tempo a base para o produto que aqui apresentamos. Com esse Minicurso, buscamos proporcionar subsídios teóricos e metodológicos a educadores em geral, em especial a planetaristas e professores do Ensino Fundamental, para sua atuação na Educação em Astronomia. Visamos, mais especificamente, estimular a observação e a vivência dos fenômenos celestes de uma perspectiva local, e a compreensão da relação entre o que se observa dessa perspectiva, ou seja, de um lugar específico da Terra (perspectiva topocêntrica), com perspectivas que assumem uma representação da Terra e dos demais astros e estruturas do Universo no espaço (geocêntrica, heliocêntrica ou acêntrica). Na escolha por esse direcionamento, temos em mente que muitas vezes, na escola e demais espaços de ensino, explora-se unicamente uma representação dos fenômenos astronômicos externa à Terra, sem conectar o aluno com fenômenos que são possíveis de observar e vivenciar localmente. Consideramos que esse fato contribui de forma significativa para a persistência de concepções e representações alternativas às científicas na explicação de fenômenos astronômicos, e dificulta a superação das dificuldades conceituais que alunos e professores encontram para compreender modelos mais abstratos para esses fenômenos. Procuramos, então, oferecer elementos para o professor vivenciar e entender algumas dessas dificuldades, e ao mesmo tempo encaminhar seus alunos na transição entre os diferentes tipos de perspectivas aqui mencionadas. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 4 Neste sentido, no Minicurso encaminhamos dois movimentos mais amplos. Num primeiro movimento, intitulado “Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço”, trabalha-se a compreensão da localização dos sujeitos na Terra e desta no espaço, estabelecendo- se referências locais para a observação dos astros, identificando nosso próprio local no globo terrestre, e representando-o espacialmente em relação a nós mesmos. Em um segundo movimento, denominado “Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial”, após a transição da percepção local dos astros para uma compreensão desse local numa visualização espacial da Terra como um todo, retoma-se a organização dos demais astros que compõem o Sistema Solar em relação à Terra e ao Sol, partindo-se dali para se diferenciar outras estruturas presentes no Universo. O texto a seguir apresenta aspectos do Minicurso em três pequenos capítulos. No Capítulo 2 damos uma visão geral da proposta, com um texto introdutório esclarecendo a concepção pedagógica que a norteia e apresentando o Plano de Ensino para o Minicurso conforme o desenvolvemos em situação anterior, numa estruturação do mesmo em três encontros de quatro horas, cada. Ali apresentamos os objetivos, e explicitamos de forma sintética, mas detalhada, para cada encontro, os momentos em que os organizamos, com as respectivas temática, atividades e recursos utilizados. No Capítulo 3 detalhamos os fundamentos e as atividades desenvolvidas no primeiro encontro do Minicurso, no qual foi tratado o primeiro movimento a que nos referimos antes: “Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço”. No Capítulo 4 detalhamos o desenvolvimento do segundo movimento, “Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial”, com a fundamentação, os temas, atividades e recursos, abordadas no segundo e terceiro dias do Minicurso. Os textos de fundamentação de cada capítulo podem e devem ser usados no Minicurso, tanto para estudo, pelos professores, o que sugerimos que seja feito após cada encontro, como para oferecer uma base para os slides de apoio que cada equipe formadora venha a elaborar. Vale destacar ainda que apesar de estarmos apresentando uma proposta voltada para professores e planetaristas, a partir da compreensão dos fundamentos aqui abordados podem ocorrer adaptações diversas do Minicurso ou de partes dele para outros momentos ou níveis de ensino. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 5 2 Visão geral da Proposta de Minicurso 2.1 Dimensões da Educação em Astronomia valorizadas no Minicurso Desde a antiguidade a observação do céu é fonte de grande admiração e conhecimento para as civilizações, verificando-se que práticas sociais relacionadas às “coisas do céu” estiveram presentes nas mais diversas culturas. A percepção de regularidades nos ciclos astronômicos, que auxiliou no desenvolvimento de calendários a partir das definições de dias, meses e anos; a observação das posições dos astros no céu possibilitando o uso destes como guias nas atividades agrícolas e nos deslocamentos por terra e mar; as associações intuídas e/ou estabelecidas entre os fenômenos celestes e terrestres; são alguns exemplos da grande influência dos fenômenos e estudos astronômicos nas sociedades, ao longo do tempo. Estudos sobre os astros também tiveram impactos significativos na visão de mundo das pessoas, como ocorreu nos séculos XVI e XVII em que os debates entre defensores dos modelos de Universo Geocêntrico e Heliocêntrico proporcionaram uma revisão profunda de nossa visão sobre o que é o Universo e como ele se organiza, fazendo-nos dimensionar que os mundos com matéria semelhante à nossa iam muito além do planeta Terra ou até mesmo, como se concebeu posteriormente, da galáxia Via Láctea. Não é sem razão, portanto, que no âmbito da Educação em Astronomia, vários autores ressaltam a importância dos fenômenos e estudos astronômicos e da observação celeste em si, nos diferentes níveis de ensino: tais estudos e práticas podem contribuir para a nossa conscientização acerca do nosso lugar no mundo e no espaço, fazendo-nos refletir, muitas vezes, sobre a infinitude do Universo e sobre o papel da humanidade no planeta, e despertando em nós uma maior consciência e maior senso de responsabilidade ambiental e social. Entre esses autores, Jafelice (2010) defende que a relevância do ensino da Astronomia se sobressai não apenas enquanto ela se configura numa área específica das ciências, mas como uma área que pode incentivar e estimular o sentir, o pensar e o agir solidários, cooperativos e éticos, desde que seja trabalhada a partir de uma abordagem antropológica. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 6 Nessa abordagem é essencial estimular que os sujeitos vivenciem, no corpo e na prática, os fenômenos sobre os quais se interessa tratar. As conceitualizações são feitas em um momento posterior às vivências, a partir do que foi intuído e sentido, sendo explorados os conhecimentos e aportes que a realidade local apresenta naturalmente, e buscando, concomitantemente, a recuperação da relação vivencial dos sujeitos com o ambiente e consigo mesmos, considerando-se os conhecimentos adquiridos a partir da cultura local tão importantes quanto os científicos. Como outros autores, consideramos que a Educação em Astronomia pode e deve favorecer, entre outros elementos, uma maior conscientização ambiental, que englobe uma percepção de nosso lugar no planeta e no espaço. Isso ocorrerá na medida em que a Astronomia for trabalhada de modo a contribuir para nos percebermos e localizarmos, em um primeiro momento, na cidade/país/continente em que nos situamos, resgatando, nesse processo, referências importantes de nosso lugar, quando nos pomos a observar o céu; em um segundo momento, contribuindo para nos percebermos numa viagem em comum pelo espaço no planeta em que vivemos, considerando sua dimensão e forma, bem como as interações de que ele participa; e por fim, ao compreendermos nosso planeta como parte de um Universo bem mais amplo, uma visão que intensifica e redimensiona nossos questionamentos sobre quem somos, de onde viemos, para onde vamos. Neste sentido, destacamos as considerações de Lanciano (2014) quando aponta diferentes tipos de espaços a serem articulados, na percepção e descrição dos fenômenos astronômicos. Tais espaços se diferenciam em suas dimensões e pelas relações que temos com eles (se estão perto ou longe, se estamos dentro ou fora deles...). A autora caracteriza, assim, o microespaço – como aquele das figuras e objetos que vemos e vivenciamos de fora deles; o mesoespaço – relacionado ao espaço em que alcançamos totalmente pelo olhar e corpo, como o de uma casa ou praça; o macroespaço – que é aquele onde estamos imersos, envolvendo regiões, continentes, sendo necessário viajarmos para alcançá-lo com o olhar; e o megaespaço – relacionado ao espaço do cosmo, que não é de todo acessível aos olhos ou ao corpo, por movimentos, e onde a Terra se situa como planeta. A compreensão de muitos fenômenos astronômicos assim como as associações que fazemos deles com as mudanças que ocorrem no ambiente a nossa volta, demandam a ampliação de nossa percepção do planeta Terra e do Universo, envolvendo a experimentação desses diferentes espaços citados por Lanciano (2014). Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 7 Reforçamos que muitas vezes, na escola, explora-se unicamente uma representação dos fenômenos externa à Terra, sem conectar fatos que são possíveis de observar localmente com os modelos científicos que assumem perspectivas mais abstratas do espaço. É necessário observar e analisar os fenômenos a partir de nossa percepção local (topocêntrica/mesoespaço) e complementá-la ao mesmo tempo a partir de um referencial fora da Terra relacionado ao megaespaço. Por exemplo, para melhor compreender as estações do ano é interessante estimular que se observe e se sistematize, por diferentes meios, quais mudanças climáticas e ambientais significativas nosso ambiente vivencia em cada época do ano. Deve-se estimular ainda que se verifique a relação entre mudanças na duração do período claro do dia, ao longo do ano, e variações no comportamento do ambiente. No caso do hemisfério Sul, no mês de setembro, por exemplo, os dias vão se alongando e as noites vão ficando mais curtas, caracterizando um período em que usualmente o clima vai ficando mais quente. Através da vivência atenta do ambiente local, é possível abordar a relação entre aquecimento e resfriamento do clima com a duração dos dias e das noites, bem como a relação entre as mudanças no período claro do dia e alterações no local do nascer do Sol. Para compreender o que provoca mudanças na duração dos dias e das noites ao longo do ano é esclarecedor analisar a posição e inclinação da Terra como um todo em relação ao Sol, a partir de uma perspectiva externa à Terra, que é a oferecida pelo megaespaço, e que chamaremos aqui de perspectiva global. A importância de uma visão “dual” simultânea sobre o espaço – a partir de uma perspectiva local/topocêntrica de observação dos fenômenos astronômicos, e de uma perspectiva global, ao mesmo tempo – é enfatizada também em outros estudos importantes da área de educação em Astronomia (CAMINO, 2005; LEITE; HOUSOME, 2009). Contudo, a compreensão dos fenômenos astronômicos por meio da complementariedade dessas perspectivas não é algo fácil de ser alcançado. A concepção dessa perspectiva externa ao planeta Terra, relacionada ao megaespaço, é complexa, uma vez que é inacessível ao corpo do sujeito em movimento, ou ao seu olhar, havendo assim a necessidade de imaginá-la a partir de abstrações em torno daquilo que conseguimos vivenciar de outras perspectivas, ou então, de acessá-la a partir de imagens obtidas com satélites, como afirma Lanciano (2014). Essa última Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 8 opção, por sua vez, não nos garante, sozinha, a elaboração de representações mentais consistentes com o que nos é oferecido pelas imagens. Consideramos que a compreensão dessa complexidade pelo educador é fundamental, particularmente tendo em vista a existência de concepções e/ou representações alternativas relatadas na literatura em Educação em Astronomia, sobre a forma da Terra e do espaço ao redor desta, bem como sobre o Universo, no que diz respeito aos seus componentes e estruturas. Por essa razão, a visualização e investigação dessas representações alternativas, que serão melhor detalhadas nos capítulos 3 e 4 desse texto, constituem parte significativa do Minicurso aqui proposto. Através da alternância entre atividades e reflexões coletivas, procuramos fazer com que o participante do Minicurso experimente, em alguma medida, as dificuldades de transição entre perspectivas local e global, a fim de melhor compreender as dificuldades enfrentadas por seus alunos, bem como o papel que as atividades propostas poderão vir a ter em sua prática em sala de aula, uma vez adaptadas, ou mesmo aprofundadas, quando estas se derem, num primeiro momento, em espaços não formais. 2.2 O Plano de Ensino do Minicurso Considerando os aspectos que vínhamos ressaltando, a presente Proposta de Minicurso, intitulada “Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço”, tem como objetivo geral proporcionar subsídios teóricos e metodológicos para as práticas educativas em Astronomia realizadas pelos participantes; e ao mesmo tempo, favorecer que ocorram trocas de experiências entre os sujeitos, advindas tanto dos espaços formais como dos não formais de Educação. Os principais subsídios que se pretende oferecer se relacionam com a compreensão de dificuldades de aprendizagem associadas às representações alternativas sobre forma da Terra e Universo, e com as propostas de se vivenciar a observação do céu valorizando a perspectiva local dos sujeitos (perspectiva topocêntrica), e de se integrar essa vivência com representações mais abstratas (geocêntrica, heliocêntrica e acêntrica) dos fenômenos astronômicos. Identificamos, assim, como objetivos específicos, propiciar aos participantes: Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 9 ▪ Conhecer e discutir representações alternativas que as crianças apresentam sobre os temas forma da Terra, Sistema Solar e Universo, e refletir sobre como levar em consideração essas representações no ensino da Astronomia; ▪ Compreender a interpretação do céu visto a olho nu, a partir de uma perspectiva local de observação, e integrá-la a perspectivas globais de intepretação, situando a Terra e os outros astros no espaço; ▪ Compreender e discutir conceitos científicos, atividades e referenciais didáticos que favorecem o trânsito entre diferentes perspectivas de descrição dos fenômenos astronômicos; ▪ Sensibilizar-se e conscientizar-se em relação ao ambiente e em particular ao espaço em que nos inserimos, tanto numa perspectiva local como numa perspectiva mais ampla, planetária e cósmica, de que fazemos parte. Na Tabela 01, a seguir, é apresentado nosso Plano de Ensino do Minicurso conforme desenvolvido por nós numa situação específica, em que o mesmo foi estruturado em três encontros presenciais de 4 horas, cada, e 3 horas de atividades à distância, resultando numa carga horária total de 15 horas. Naquela ocasião trabalhamos com 12 participantes, sendo que consideramos viável esse formato para um total de até 16 participantes, fazendo-se ajustes nos tamanhos dos grupos, ou em até 25 participantes, havendo necessidade, nesse último caso, de ajustes também de carga horária. No Plano, especificamos, para cada encontro, os temas abordados e o desenvolvimento de cada tema em diferentes momentos, com suas respectivas atividades, conceitos trabalhados e materiais utilizados. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 10 Tabela 01 – Planejamento detalhado dos temas e estratégias desenvolvidos nos três encontros do Minicurso PRIMEIRO DIA – Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço. (Carga horária: 4 horas) Tema e desenvolvimento dos momentos do Minicurso Materiais necessários 1. Apresentação do minicurso com detalhamento sobre os momentos deste primeiro dia, e apresentação dos participantes em termos de sua formação e atuação. ● Conversa inicial entre ministrante e participantes, com apresentação das pessoas do grupo; 35 Blocos de Notas; ● Entrega de bloco de notas para os participantes anotarem suas reflexões durante o curso; ● Apresentação de slides sobre: a programação geral do curso, com ênfase sobre a síntese do que será Projetor multimídia; tratado, dos objetivos geral e específicos e os momentos em que o primeiro dia estará estruturado; ● Encaminhamento da turma para a realização da primeira atividade no pátio. Notebook (slides). 2. A importância da complementaridade entre as perspectivas local e global na interpretação dos fenômenos astronômicos. No pátio ● Observação e registro coletivo do horizonte local: Observação e destaques coletivos iniciais sobre Papel cartão e canetas para desenho o entorno observado pelo grupo; organização dos participantes em duplas; divisão do horizonte em do horizonte local; trechos específicos, para cada dupla desenhar. ● Apresentação dos conceitos de horizonte e plano do horizonte, e exploração deste como referencial para descrição de observações do céu. Orientação geográfica do local de observação, considerando a observação, hipóteses do grupo sobre o movimento do Sol visto dali, ao longo do dia, e informações fornecidas pela ministrante a esse respeito. Em sala Fita adesiva para anexar os cartões; ● Conexão coletiva dos desenhos feitos em dupla, para montagem do horizonte local; e comentários de Globo terrestre; cada dupla sobre aspectos do horizonte montado. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 11 ● Realização da atividade do Globo Paralelo: localização do nosso lugar no globo (Natal/ RN/Brasil) e Projetor multimídia; orientação do globo paralelamente à Terra no espaço. Relato das dificuldades encontradas. ● Apresentação dialogada de slides com: definição da perspectiva global e discussão sobre a importância da complementaridade entre as perspectivas local (topocêntrica) e global, para a compreensão dos fenômenos astronômicos; interpretação de parte das dificuldades que surgem na Notebook (slides associados à atividade do Globo Paralelo com base nas referências de Camino (2011) e Lanciano (2014), discussão apresentada em 2.1). destacando as vantagens de atividades ao ar livre para acessar os espaços envolvidos nos estudos da Astronomia. 3. Representações e dificuldades de aprendizagem sobre a forma da Terra na literatura e no nosso estudo ● Apresentação dialogada de slides: Projetor multimídia; Questionamentos iniciais: A complementaridade dessas perspectivas é algo de fácil compreensão pelos Notebook (slides associados à alunos dos participantes? Que dificuldades são encontradas ou os participantes imaginam que os alunos discussão apresentada em 2.1 e 3.1); terão, para que ocorra essa compreensão? Considerações sobre as concepções alternativas sobre a forma da Terra, e sobre sua relação com o fato de vivenciarmos os fenômenos astronômicos em uma região aparentemente plana, enquanto temos que integrar essa vivência numa representação esférica do planeta. Apresentação de imagens em escala do tamanho da Terra e suas maiores elevações, bem como de toda a sua atmosfera, baseando-se em Caniato (2007). Apresentação das principais questões de coleta de dados utilizadas pelos pesquisadores que estudamos (NUSSBAUM; NOVAK, 1976; VOSNIADOU; BREWER, 1994) e de alguns de seus resultados em termos de classificação de representações de crianças para a forma da Terra e o espaço ao seu redor. ● Entrega de alguns dos dados coletados em nossa pesquisa para discussão e análise em pequenos Material impresso com dados grupos [3 pessoas]. Os dados nessa fase serão os referentes a questões sobre a forma da Terra de coletados em nossa pesquisa. uma turma do ensino fundamental antes e após a visita ao Planetário (BATISTA, 2017). Exposição das análises no grande grupo com mediação do ministrante apontando nossas conclusões sobre os resultados; ● Proposta de reflexão para ser discutida após o intervalo: Além das fotografias por satélite, que evidências temos para afirmar que a Terra é esférica? Como sabemos disso? Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 12 Intervalo Lanche 4. Evidências sobre a forma da Terra: aspectos históricos e atuais. ● Retomada do questionamento anterior e apresentação dialogada de três argumentos históricos Projetor multimídia; adotados como base para defender a ideia de uma terra “esférica”: a observação de um navio se afastando do porto e desaparecendo por partes, a curvatura na sombra da Terra sobre a Lua durante Notebook (slides com base na um eclipse lunar e o surgimento de novas constelações no céu à medida que se explorava novos discussão apresentada em continentes; MARTINS, 1994 e ÁVILA, 1982.) ● Apresentação dialogada do experimento de Eratóstenes como uma das primeiras tentativas de medida Lápis de Quadro Branco. do raio da Terra, usando o pressuposto de sua esfericidade. 5. Finalização do I Encontro ● Orientação para os participantes responderem e enviarem à ministrante (via email) o questionário de Questionário de levantamento das levantamento das ideias deles sobre o Universo, seus componentes e organização espacial e concepções sobre o Universo aplicarem esse mesmo questionário com outras pessoas de seu convívio. impresso. SEGUNDO DIA – Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial (Parte I). (Carga horária: 4 horas) Tema e desenvolvimento dos momentos do Minicurso Materiais necessários / observações 1. Sessão “Reconhecimento do Céu”: o céu a olho nu e sua interpretação na perspectiva ocidental. Antes da Sessão, fora do Planetário Planetário com projetor óptico montado com mediadores; ● Indicações breves sobre como o encontro do minicurso estará organizado. ● Orientações sobre procedimentos a serem usados ao entrar no planetário. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 13 Durante a sessão, no Planetário Computador com áudio do poema e ● Áudio musicado do poema “Via Láctea” de Olavo Bilac [fase de acomodação visual]; imagens para projeção; ● Continuidade do desenvolvimento da sessão Reconhecimento do Céu, abordando os temas: Uso das constelações e de sua mitologia no mapeamento do céu; sua importância para a orientação (Cruzeiro do Sul e Órion) e acompanhamento do tempo, inclusive na definição da época para diferentes atividades sociais, tais como as agrícolas; observação do movimento das estrelas, ao longo da noite e ao longo dos dias, num mesmo horário, de um mesmo local da Terra (nosso lugar). Diferenças no que se observa a olho nu, sobre as estrelas e os planetas; e diferenças intrínsecas entre esses dois tipos de astros. Slides na cúpula sobre os planetas que serão vistos a olho nu à noite, naquele dia, e em que constelações poderão ser vistos. A mudança na posição das estrelas vistas a partir de uma viagem para o polo Sul. Visualização dos desenhos imaginários com diferentes constelações. ➔ Após a sessão, em outro espaço ● Fala livre dos participantes sobre o que chamou a atenção na sessão e principais questionamentos que tenham sido suscitados para eles; Globo terrestre; ● Organização e retomada da fala dos participantes pela ministrante, remetendo a alguns temas. O primeiro tema a retomar será o uso do céu para nossa orientação e localização, no planeta: Esfera Celeste de vidro e mini Terra c) identificação das direções cardeais partindo-se do Sol ou do Cruzeiro e do movimento aparente no seu interior; do céu ao longo da noite; d) identificação qualitativa da localização do observador no globo (em relação ao equador terrestre), Garrafa com água e anilina; observando-se a altura do polo celeste Sul: Mediação com a “MiniTerra” com esfera celeste de vidro (esfera sem água e com “MiniTerra” em seu Obs: Serão necessários dois espaços interior) para desenvolvimento dessa questão, retomando a questão das evidências da esfericidade da para as interações desse dia, um para Terra (partindo dos comentários e discussões dos participantes frente à esfera); o planetário e outro para as interações do grupo e com objetos didáticos. Mediação com a esfera de vidro (com água, ou seja, com a montagem do Planetário de Pobre, de Caniato) para explorar as visões que se teve do céu, em Natal e no polo Sul, na simulação. Chamar a atenção para o movimento das estrelas visto nessas diferentes latitudes. Intervalo Lanche Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 14 2. O Universo na visão dos participantes e na visão científica Aqui ocorre uma retomada de um segundo bloco de temas que provavelmente serão ressaltados pelos Folhas para o grupo sistematizar as participantes no momento após a sessão: a natureza dos diferentes astros e estruturas que compõem respostas discutidas, antes de o universo e sua organização no megaespaço. apresenta-las ao coletivo. ● Organização dos participantes em grupos a fim de discutirem e sistematizarem uma posição sobre as seguintes problematizações, retomando também suas concepções sobre o Universo expressas no Quadro Branco e Pincel para Quadro questionário do primeiro encontro: 5. O que a gente entende que tem no Universo e que a gente vê no céu (como simulado no planetário, por exemplo), a olho nu? O que a gente entende que tem e a gente não vê? 6. Como todas essas “coisas” estão organizadas espacialmente no Universo? 7. Que dificuldades e alterações vivenciaram nas suas próprias concepções desde que responderam o questionário até aquele momento do curso, que acham importante destacarem? 8. Que pontos não são consensuais para o grupo? ● Apresentação de cada grupo sobre: o consenso a que chegaram nas perguntas propostas e destaques para os pontos que permanecerem problemáticos para o grupo. Proposta de organização coletiva da representação do Sistema Solar a partir de objetos didáticos que Conjunto com peça manipuláveis o representam, e discussão da natureza e do movimento de seus componentes. representando os planetas do Sistema Solar, com diâmetros em ● Mediação da maquete do Sistema Solar com ênfase na visão científica atual sobre a natureza de seus escala na qual o Sol teria 2,20m; astros e sua organização no espaço próximo ao Sol, trazendo o mais possível os próprios participantes Tecido representando o Sol nessa para esta organização. Ressaltar também a ideia que se tem sobre a origem do Sistema Solar, a partir escala; dos dados que temos dos diferentes corpos que o compõem, diferenciando do que se entende por origem do Universo. Fita com marcações representando as ● Exploração da representação dos planetas e do Sol com diâmetros em escala; distâncias dos planetas ao Sol em escala própria; ● Apresentação da Unidade Ano-Luz e exploração da fita com distância dos planetas em relação ao Sol em escala própria; Indagação sobre onde deveria ser colocada a estrela mais próxima da Terra depois do Sol. ● Simulação do Eclipse Solar onde se apresenta Sol, Terra e Lua com diâmetros e distâncias entre eles representados numa mesma (única escala. ● Reflexão sobre a grandiosidade das dimensões em que estamos inseridos no Universo, a partir de Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 15 exploração da caixa das constelações e da sistematização sobre as demais estruturas do Universo no espaço, com uso de imagens em banners e informações sobre as dimensões reais das mesmas. 3. Finalização do II Encontro ● Solicitação para casa: registro das reflexões no bloco de notas sobre alterações nas suas concepções sobre a organização dos astros no Universo e dúvidas que tenham surgido, ou se mantido. Telescópios com monitores ● Encaminhamento para observações de Júpiter, Saturno e da Lua (deve-se consultar em softwares da internet os astros visíveis na noite do Minicurso) ao telescópio. TERCEIRO DIA – Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial (Parte II). (Carga horária: 4 horas) Tema e desenvolvimento dos momentos do Minicurso Materiais necessários / observações 2. Dificuldades de aprendizagem sobre o Universo: reflexões a partir dos dados da literatura, de nosso estudo, e de eventuais levantamentos realizados por eles. ● Apresentação da programação de atividades planejada para o encontro; Projetor multimídia ● Apresentação sintética e breve de slides que apresentem diferentes estruturas do Universo, sua distribuição espacial e dimensões típicas (OLIVEIRA FILHO; SARAIVA, 2000), incluindo, além dos corpos e distâncias envolvidas no Sistema Solar, estruturas como nebulosas, aglomerados estalares, Notebook (slides com revisão das galáxias, e aglomerados de galáxias. informações sobre astros e estruturas do Universo abordadas no dia ● Apresentação dialogada de dados da literatura sobre representações de Universo (BISCH, 1998; anterior e slides baseados na seção RODRIGUEZ; SAHELICES, 2005) e do nosso estudo, com explicitação das metodologias utilizadas e 3.1) resultados obtidos; ● Apresentação de nossas reflexões sobre os dados coletados e destaque para a importância de Questionários com levantamento explorar o espaço e objetos tridimensionais no trabalho com os alunos; feito pelos participantes sobre as Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 16 ● Análise e sistematização dos dados coletados pelos participantes em pequenos grupos levando em ideias das pessoas sobre o consideração as representações discutidas no início do encontro; Universo. ● Apresentação da análise de cada grupo ao conjunto dos participantes. ● Considerações finais da ministrante sobre essa parte do estudo realizado. [Mencionar o uso anterior de banners no planetário para atividade de simulação de viagem pelo Sistema Solar e contribuições de Lanciano (2014), na discussão dos tipos de espaços que utilizamos no ensino da Astronomia]. 2. Características de atividades didáticas e/ou mediações nas sessões de planetário para superação de dificuldades de aprendizagem em Astronomia ● Análise coletiva sobre o papel das atividades realizadas ao longo do minicurso, na perspectiva deles, participantes, e na nossa. Slides com fotografias das atividades Atividades a serem analisadas e discutidas: a atividade do plano de horizonte, o globo paralelo, a esfera desenvolvidas durante o Minicurso. celeste de vidro, a própria sessão do planetário, as peças ilustrativas do Sistema Solar, a caixinha das constelações e a fita das distâncias entre os astros. A cada atividade, ouvir inicialmente os comentários deles e a partir daí apontar nossa perspectiva. Na discussão de nossa perspectiva, devem ser destacadas as contribuições desses objetos ou atividades para a complementaridade da visão topocêntrica com a visão planetária, tomando como referência Nestor Camino (2005) e também os diferentes espaços ressaltados por Lanciano (2014). Intervalo Lanche 3. Possíveis adequações das discussões e das atividades didáticas para a prática dos professores e mediadores. ● Discussão em grupo sobre adequações nas atividades propostas (incluindo a sessão), questionamentos, ou outras atividades que os professores ou mediadores fariam para suas turmas. ● Exposição de suas discussões através de roda de conversa e registro no bloco de notas. Apresentar, caso ainda não tenham surgido no desenvolvimento anterior da Atividade, sugestões nossas de utilização das peças do Sistema Solar para explorar assuntos como: quais constelações e planetas estão visíveis à noite naquele dia? A distribuição utilizada pelo grupo até então, para eles e para a Terra ao redor do Sol, consegue reproduzir esse aspecto? Além de fazê-los refletir sobre a imensidão do Universo a partir das definições de sistemas estelares e galáxias. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 17 4. Avaliação do minicurso ● Entrega de questionário de avaliação do minicurso, para respostas individuais pelos participantes; Questionário de avaliação impresso. ● Fala dos participantes sobre o minicurso em roda de conversa ressaltando no coletivo pontos que acharem pertinentes. 5. Agradecimentos e finalização do Minicurso. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 18 As atividades indicadas no Plano de Ensino (Tabela 01) articulam-se de forma muito específica com as preocupações em torno das percepções das pessoas sobre o entorno e com as representações que trazem sobre a forma da Terra e a localização desta e dos demais astros no espaço, quando interpretam dados do céu obtidos a olho nu, utilizando instrumentos ópticos ou a partir das informações divulgadas nas mídias. Desse modo, ressaltamos na Proposta dois movimentos específicos em termos de (re)construção de representações. No primeiro deles, que denominamos “Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço” e que será detalhado em sua maior parte no capítulo 3 desse texto, buscamos promover uma integração entre a percepção do sujeito sobre as coisas do céu vistas a partir de seu lugar na Terra, com a representação desta no espaço, considerando suas dimensões e forma. Para isso, apontamos como atividades estruturantes dessa primeira etapa: o Registro coletivo do horizonte local e a Orientação de um Globo paralelo à Terra no espaço, realizados no primeiro encontro do Minicurso. A sessão Reconhecimento do Céu e a Exploração de uma Esfera celeste de vidro, tratadas já no capitulo 4, porque realizadas no segundo encontro do Minicurso, se inserem na interface entre o primeiro e o segundo movimento. No segundo movimento, denominado “Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial” e conforme será detalhado no capítulo 4, abordamos principalmente a organização espacial dos demais astros (além da Terra e Sol) que compõem o Sistema Solar. Focalizamos, entre outros aspectos, a diferença entre planetas e estrelas; a ideia de Sistema Solar com as características dos astros que o constituem, tais como a composição, a temperatura, aspectos gerais dos movimentos de rotação e translação, e escalas de tamanhos e de distâncias; e o “afastamento”, do Sistema Solar, de todas as outras estrelas que não o Sol. Ainda como parte desse segundo movimento, introduzimos, em linhas mais gerais, o que caracteriza os demais componentes do Universo e a organização espacial deles, conforme a visão científica atual. Trabalhamos esses aspectos a partir do seguinte conjunto de atividades estruturantes, realizado no segundo encontro do Minicurso: Manuseio de Peças Móveis do Sistema Solar, que constitui a atividade mais central nessa etapa; Exploração de Fita com distâncias em escala e de Caixa das constelações; Simulação de um eclipse solar em escala Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 19 comum para tamanhos e distâncias envolvendo Sol, Terra e Lua; e Discussão de imagens em banners. Todas essas atividades visam promover mudanças nas concepções e/ou representações dos sujeitos sobre a forma da Terra e o Universo. Por essa razão e levando em consideração a necessidade dos educadores conhecerem as dificuldades de aprendizagem envolvidas nessas temáticas, destacamos ainda um conjunto de atividades estruturantes da Proposta de Minicurso, que se fazem presentes nos dois movimentos que ressaltamos; no caso, as atividades referentes a Análise e Discussão de Representações alternativas, sejam estas sobre a forma da Terra ou sobre o Universo. Estas constituem momentos de análise e discussão das representações encontradas em estudos da literatura (inclusive no nosso), e onde se apresentam as metodologias de coleta e de análise dos dados utilizadas em cada estudo para que os participantes possam fazer suas próprias análises sobre os resultados encontrados, bem como refletirem sobre a possibilidade de essas dificuldades também serem apresentadas por seus alunos e/ou público visitante. Além disso, esses momentos tem como objetivo favorecer que os participantes comentem suas experiências entre eles, fazendo conexões entre o que já vivenciaram e os dados encontrados nos estudos. A fim de explicitar um melhor entendimento acerca do papel de cada uma das atividades estruturantes da Proposta de Minicurso, detalhamos, a seguir nos capítulos 3 e 4, aspectos dos seus objetivos e desenvolvimento. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 20 3 Ressignificando nosso lugar no Universo: do horizonte local à representação do planeta Terra no espaço” Ao longo desse capítulo apresentamos detalhadamente os objetivos, os fundamentos e a descrição das atividades estruturantes do primeiro encontro do Minicurso, sendo este encontro voltado para construir representações relacionadas à localização dos sujeitos na Terra e desta no espaço, considerando a forma e dimensão do planeta. Na primeira seção, oferecemos um texto que, em conjunto com a apresentação do Plano de Ensino, constituem o embasamento mais amplo das atividades em questão. Sugerimos fortemente que tal texto seja utilizado como base para o desenvolvimento de materiais audiovisuais para o Minicurso, e principalmente, como material de estudo para os participantes, após o primeiro encontro. 3.1 Conversando sobre como nossos alunos e público pensam: representações sobre a forma da Terra. Grande parte das dificuldades de aprendizagem encontradas no ensino de Astronomia vem sendo relacionadas com concepções e representações que as pessoas apresentam, denominadas por alguns autores de concepções alternativas. Estas, são concepções que não condizem com os modelos científicos vigentes e que pessoas de diversas culturas e em diferentes faixas etárias as apresentam. Em geral, são muito resistentes a mudanças e por isso, muitas vezes constituem-se em obstáculos para a aprendizagem dos modelos científicos, particularmente quando não são levadas em consideração no ensino. Algumas dessas concepções em Astronomia podem estar relacionadas à complexidade da abstração que as teorias astronômicas exigem para serem compreendidas, uma vez que adotam um referencial externo à Terra na explicação dos fenômenos astronômicos – assumindo, usualmente, a perspectiva heliocêntrica – enquanto estes fenômenos são observados pelas pessoas, no seu dia-a-dia, a partir de um local específico na Terra, em uma perspectiva topocêntrica. Além disso, alguns autores como Leite e Hosoume (2009) ressaltam dificuldades associadas ao processo de compreensão dos tamanhos, das formas e das distâncias envolvidas nos objetos astronômicos. As autoras apontam que essas Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 21 dificuldades podem estar relacionadas ao fato de “observarmos” o céu apenas bidimensionalmente, sem atentarmos para os movimentos celestes e as grandes escalas de tamanho e distancia com que nos deparamos no espaço, destacando, assim, a necessidade de se aprender a “ver tridimensionalmente”. Neste sentido, apresentamos aqui alguns estudos com investigações de concepções alternativas sobre a forma da Terra, especificamente, acreditando que a dimensão espacial do planeta Terra seja um aspecto importante a se considerar para a compreensão dos fenômenos astronômicos a partir da complementariedade das perspectivas local e global de representação para os mesmos. É comum ouvirmos palavras como “esférica”, “redonda” ou “achatada nos polos”, quando as pessoas são questionadas acerca do formato da Terra. Contudo, diversas pesquisas indicam que apesar de darem essas respostas, muitas pessoas apenas as repetem como uma informação que já receberam anteriormente de outras, mas não atribuem um significado consistente às mesmas. Em alguns casos, as pessoas não possuem uma representação internalizada da Terra com forma esférica; em outros, pode ainda acontecer de não se conseguir utilizar tal representação para inferir consistentemente as consequências desse formato em diferentes situações vivenciadas ou idealizadas. Uma das primeiras pesquisas realizadas nesta área foi a desenvolvida por Nussbaum e Novak (1976). Investigando sessenta crianças cursando a segunda série da educação básica numa cidade localizada em Nova York (EUA), eles identificaram cinco noções diferentes do conceito de Terra associadas não só à compreensão de seu formato em si, mas também ao espaço que a rodeia, em particular considerando como se espera que um corpo se comporte (ou para onde ele cai) quando deixado cair livremente de diferentes locais da Terra. As noções identificadas naquele estudo estão representadas na Figura 01. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 22 Figura 01: Noções sobre o conceito de Terra identificadas por Nussbaum e Novak (1976) Fonte: NUSSBAUM e NOVAK, 1976. As crianças com a Noção um (Notion one), apesar de responderem que a Terra é redonda como uma bola, não acreditavam que vivemos na superfície de uma esfera, preferindo pensar na Terra como plana. Nas entrevistas, algumas dessas crianças explicavam que a afirmação de que a Terra era redonda, que elas ouviam das pessoas, se referia, por exemplo, a situações de estradas curvas em torno de árvores. Nussbaum e Novak (1976) concluíram ainda que algumas das visões que as crianças construíam sobre a Terra em forma de disco eram consideradas como uma mistura ou justaposição da noção de Terra plana com a informação veiculada pela mídia de que a Terra era esférica. Em sondagens adicionais, os autores perceberam que alguns dos sujeitos acreditavam existir duas Terras: uma plana, em que vivem, e outra redonda situada no céu. Outros, ainda, compreendiam que a Terra em que vivem é plana enquanto o céu a sua volta é que possuía o formato esférico de bola. Já as crianças que possuem a Noção dois (Notion two), afirmam que a Terra é esférica, apontando como evidências para isso a possibilidade de viajar em torno do planeta, ou de vê-lo a partir do espaço, como fazem os astronautas. No entanto, elas consideram que o espaço ao redor da Terra é demarcado por um chão ou oceano na região “abaixo” da Terra e pelo céu na “parte acima” da Terra. Por exemplo, quando questionadas para onde cairia uma pedra solta no Hemisfério Sul, respondem “para baixo”, como se fosse cair da Terra. E quando questionadas sobre o que há nessa Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 23 região que indicam como embaixo, afirmam existir um solo ou um oceano (situação ilustrada na Figura 2 (a)). Além disso, quando solicitadas a desenhar o trajeto de uma bola jogada para o céu em diferentes lugares da Terra, afirmam que a pessoa mais ao sul do planeta não pode jogar a bola para o céu, sendo necessário ir para outros lugares para conseguir realizar tal tarefa (situação ilustrada na Figura 2 (b)). Figura 02: Ilustração dos desenhos das crianças em resposta às questões de Nussbaum e Novak (1976) sobre a queda de objetos na superfície da Terra Fonte: NUSSBAUM e NOVAK, 1976. De acordo com os pesquisadores, esses resultados sugerem que as crianças dessa categoria parecem relacionar mais significado ao termo “Terra”, comparando- lhes com a noção um, mas não a consideram como esférica, uma vez que quando sujeitas a um conflito abandonam o seu modelo esférico e estabelecem um terreno horizontal “abaixo” e o céu “acima” da Terra. A Noção três (Notion three) foi associada àquelas crianças que além de atribuírem uma forma esférica para a Terra, apresentam alguma ideia de espaço ilimitado rodeando o planeta, considerando, assim, o céu em torno de toda a Terra, e não só em uma região, como ocorria na noção anteriormente descrita. Contudo, essa seria a principal diferença entre as noções dois e três, pois neste último caso elas ainda não utilizam a Terra como referência para as direções em cima e embaixo, mantendo no espaço uma direção preferencial para caracterizar o “em cima” e o “embaixo”. Já as crianças que apresentam a Noção quatro (Notion four) demonstram a compreensão de que a Terra na qual vivem é esférica, de que o céu e o espaço se distribui ao redor desta, e ainda, a adotam como referência para identificar as direções em cima e embaixo. Algumas delas, inclusive, chegam a explicar a queda de um Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 24 objeto em direção à Terra como sendo causada pela gravidade. No entanto, foi verificado que não adotam o centro da Terra como o ponto que determina a direção "para baixo" desse movimento. Assim, por exemplo, quando perguntados sobre o movimento de uma pedra, caso fosse solta frente a dois buracos ou túneis cavados na forma representada na Figura 03, elas respondem que o movimento da pedra seguiria o túnel K ou N. Figura 03: Ilustração dos desenhos das crianças em resposta às questões de Nussbaum e Novak (1976) sobre a queda de objetos no interior da Terra Fonte: NUSSBAUM e NOVAK, 1976. E a Noção cinco (Notion five) é aquela na qual as crianças apresentam uma noção estável do conceito da Terra em relação aos três aspectos explorados no estudo: consideram-na como um planeta esférico; que ela é toda rodeada pelo espaço; e que os corpos caem em direção ao seu centro. Em uma pesquisa posterior com sessenta crianças americanas entre seis e nove anos, no estado de Illinois, Vosniadou e Brewer (1992) também investigaram representações sobre a forma da Terra. A partir das respostas a uma série de perguntas que fizeram em entrevistas às crianças, concluíram que havia uma incoerência entre a denominação que estas davam ao formato da Terra e a compreensão que apresentavam sobre o mesmo. A pesquisa permitiu identificar, assim, cinco representações alternativas para o formato da Terra, além do formato esférico: a esfera achatada, a esfera oca, a Terra dual, a Terra disco e a Terra retangular (Figura 04). Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 25 Figura 04: Representações alternativas para o formato da Terra identificados por Vosniadou e Brewer (1992) Fonte: VOSNIADOU e BREWER, 1992. O modelo de Terra esférica (Sphere), que é o modelo da visão científica atual, foi associado às vinte e três crianças que, além de afirmarem ser a forma da Terra “uma esfera”, ou “redonda como uma bola” e que a Terra não possui borda ou fim, desenharam, por exemplo, a Lua, as estrelas e o céu, ao redor de toda a Terra. O modelo de Esfera achatada (Flattened Sphere) é remetido às quatro crianças que parecem não ter problema com a ideia de que as pessoas possam viver em torno da Terra, do lado de fora dela, contudo, tem dificuldade em integrar a ideia de que a Terra possa ser arredondada, como acreditam que é, com o fato de que ela é percebida por nós como achatada, quando olhamos em nosso entorno. Resolvem este conflito pensando na Terra como parcialmente achatada no "topo" e na “base” da esfera, onde as pessoas vivem. O modelo de Esfera oca (Hollow Sphere) apresentou duas variações ou categorias. Numa delas (imagem (a) na Figura 04), as crianças consideravam a Terra Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 26 como uma esfera oca com as pessoas vivendo em seu interior e o Sol, estrelas, Lua, e/ou o céu poderiam estar no topo, ou mesmo ao redor da esfera. Os autores consideraram esse modelo para a Terra análogo à representação de um jerimum/abóbora, aberto na parte superior. Na outra categoria do modelo Esfera oca (imagem (b) na Figura 04), a Terra seria constituída por dois hemisférios ou metades: um inferior, sobre o qual as pessoas vivem, e outro superior, que consiste do próprio céu, e que cobre a Terra como se fosse uma cúpula. Todas as doze crianças desse modelo disseram explicitamente que a Terra é uma esfera, mas que as pessoas vivem em terreno plano dentro dela. Cinco dessas doze crianças desenharam as estrelas, a lua e/ou o céu dentro do círculo, e seis disseram que a terra está "ao nosso redor" ou “em toda parte” quando questionadas para que lado olhamos para ver a terra. O modelo de Terra dual (Dual Earth) foi associado a oito crianças que apresentaram um padrão de respostas consistentes com a visão de que há uma Terra redonda localizada “lá em cima”, “no céu”, e outra que é plana, na qual as pessoas vivem. Todas essas crianças disseram "redondo" ou "círculo" quando questionadas sobre qual a forma da Terra, mas todas elas declararam que você deve olhar "para cima" para ver a terra, além de afirmarem que existe uma borda ou fim para a Terra onde se pode cair. É interessante notar que esses dois últimos modelos (Terra Oca e Terra dual) podem ser interpretados como tentativas de conciliar a visão científica de Terra esférica com a visão de Terra plana, concebida inicialmente pelos sujeitos com base em suas observações cotidianas. Interpretação semelhante ao que acontece com os resultados dos sujeitos da noção 2 de Nussbaum e Novak (1976). O modelo da Terra como disco (Disc Earth) foi associado a uma criança que afirmava ser a Terra como um disco suportado pelo chão, com sujeira ou água abaixo dela e céu diretamente acima. E por fim, o modelo de Terra retangular (Rectangular Earth) se assemelha ao modelo de Terra como um disco, no sentido de que a única criança cujo modelo se insere nesta categoria considerava a existência de um fim ou borda para a Terra, sendo que a representava com um retângulo ou quadrado, em seus desenhos. Nota-se, pelas pesquisas relatadas, que a integração entre perspectivas local e global de representação das coisas que observamos no céu deve levar em consideração essas representações alternativas, para as quais o professor deve estar atento. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 27 Em 2015, realizamos uma investigação acerca das representações sobre a forma da Terra e estruturas do Universo, de dezessete crianças entre dez e treze anos, antes e após visita a um Planetário Móvel (Planetário Barca dos Céus, da UFRN). No Planetário participaram de sessão e atividades interativas, as quais exploravam, entre outras dimensões conceituais, a esfericidade da Terra e implicações desta para a observação do céu em diferentes locais de nosso planeta (SANTOS; GERMANO, 2016). A partir de modificações em exemplos da literatura, sessão em conjunto com atividades haviam sido pensadas numa sequência de interações que deveria favorecer a evidência de representações alternativas sobre esses temas junto ao público, bem como um encaminhamento para a elaboração de representações que levariam a conclusões mais consistente sobre as situações exploradas. O estudo que realizamos fundamentou um aprimoramento nas atividades desenvolvidas pelo Planetário, as quais foram adaptadas para esse Minicurso na forma em que passamos a apresentar. 3.2 Registro coletivo do Horizonte Local A atividade de Registro coletivo do Horizonte Local (LANCIANO, 2014), primeira atividade do Minicurso, é desenvolvida ao ar livre, idealmente em grupo, e possibilita utilizarmos o corpo para percebermos e experimentarmos o ambiente local e, ao mesmo tempo, construirmos o conceito de plano do horizonte. Ela possibilitará ainda, num segundo momento, uma consciência do lugar em que nos encontramos como parte da superfície do planeta. Para desenvolvê-la é interessante que o local escolhido ao ar livre seja o mais aberto possível, distanciado de prédios o suficiente para permitir a visualização do céu a uma altura média do olhar em pelo menos algumas direções. Inicialmente, pede-se que os participantes observem lenta e atentamente tudo que os cerca no ambiente, e que falem sobre como sentem e o que veem no entorno: prédios, plantas específicas, dunas, praças, até mesmo lixo..., aquilo que fizer parte do espaço próximo ao grupo e da paisagem local como um todo. Em seguida, chama-se a atenção para o limite que nossa vista alcança, quando afastamos o olhar ao máximo, até visualizarmos o encontro entre a paisagem mais longínqua que conseguimos enxergar e o céu. Num primeiro momento esse limite de visão entre terra e céu oferecido pela paisagem mais Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 28 longínqua (que pode ser até bem próxima, se o ambiente não for tão aberto), é tratada de forma coloquial como o nosso horizonte local. Feita essa discussão inicial, os participantes (individualmente ou em duplas) são convidados a formar um grande círculo, ao redor de um centro comum. Com todos virados de costas para esse centro, devem combinar com os vizinhos para dividirem o horizonte de modo que cada um possa desenhar uma parte dele e os desenhos possam ser unidos uns aos outros no final da atividade, recompondo toda a visão do horizonte ao redor do círculo, assimilando a percepção de todos os participantes. Finalizados os desenhos, deve-se sistematizar com os participantes da atividade a ideia qualitativa de horizonte e o conceito mais preciso e geométrico de plano de horizonte, que é um plano que tangencia a Terra e é ao mesmo tempo perpendicular aos pés de um observador que se encontre de pé, naquele local. Esse plano pode ser associado ainda de forma imaginária, com o plano que seria formado pela superfície do mar, se naquele local estivéssemos a navegar. A atividade é uma oportunidade especial para discutirmos a importância desse plano como uma referência intuitiva para falarmos sobre os astros e os fenômenos celestes. Ele separa os fenômenos visíveis dos não visíveis no céu, em determinado momento. Em especial quando consideramos aspectos particulares da paisagem, nos permite localizar a posição do nascer e ocaso do Sol, por exemplo, e observar variações na mesma. O mesmo pode ser discutido quanto ao nascer e ocaso da Lua, das estrelas e constelações de modo geral. A caracterização dos pontos cardeais, o movimento diário do Sol, a variação do tamanho de sombras ao longo do dia, são outros assuntos que podem e devem ser desenvolvidos durante a atividade. Sugestões de leitura Para mais informações acerca dos fundamentos dessa atividade, você pode ler, por exemplo: LANCIANO, Nicoletta. A Complexidade e a Dialética de um Ponto de Vista Local e de um Ponto de Vista global em Astronomia. In: LONGHINI, M. D. (Org.) Ensino de Astronomia na Escola: concepções, ideias e práticas. Campinas, SP: Editora Átomo, 2014. 3.3 Orientação de um Globo paralelo à Terra no espaço A atividade do Globo paralelo é inspirada em propostas encontradas na literatura que defendem a necessidade de uma visão “dual” simultânea sobre o Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 29 espaço, numa perspectiva local e planetária ao mesmo tempo, mais especificamente nos trabalhos de Camino (2011) e Lanciano (2014). Inicialmente, ressalta-se o globo terrestre como um objeto de representação do planeta Terra e, após isso, pede-se para que um voluntário localize no globo a cidade ou estado onde nos encontramos no momento. Em seguida, a fim de problematizar eventuais representações e/ou concepções alternativas sobre a forma da Terra e o espaço ao seu redor e tomando como referência o lugar onde nos encontramos, são feitos os seguintes questionamentos para toda a turma: “Para onde apontamos se quisermos indicar o planeta Terra? E o espaço?” Tais questionamentos são baseados nos trabalhos de Nussbaum e Novak (1976) que investigam as noções de crianças sobre a forma da Terra, o espaço ao seu redor e a gravidade. Logo após, pede-se para voltarem o olhar para o globo terrestre segurado pelo voluntário e questiona-se: “Como poderiam posicionar esse globo de forma que ele ficasse paralelo à Terra, tal como ela se encontra neste momento, no espaço, para nós? Considerando que os nossos pés estão sobre a Terra”. Ou ainda, sugere-se: “Imaginem que um drone estaria se afastando de nós para o espaço logo acima de nossas cabeças, como poderiam posicionar o globo terrestre de forma que represente a visualização da Terra por esse drone, quando este já se encontrasse no espaço?”. Feito o posicionamento do Globo paralelo, colocando a cidade onde nos localizamos no “topo” do globo terrestre, solicita-se que concluam a atividade orientando este globo de acordo com as direções Norte-Sul e Leste-Oeste do local. Essas direções já podem ter sido identificadas na atividade anterior do Registro coletivo do horizonte local, ou, então, podem ser identificadas neste instante sabendo- se qual o lado da sala em que o Sol nasce e se põe ao longo do dia. O objetivo da atividade é relacionar o espaço experimentado por meio da visão, a partir de uma perspectiva local e topocêntrica, com o espaço experimentado em um referencial fora da Terra em uma perspectiva planetária mais ampla. A ideia é possibilitar, como defende Lanciano (2014) uma passagem sólida e consistente entre o observado no “aqui e agora”, numa perspectiva local, e uma visão global do sistema Terra-Sol, que, por vezes, se mostra insuficiente nos currículos escolares e livros didáticos, os quais trabalham o espaço a partir de uma visão plana e bidimensional, enquanto que a compreensão dos fenômenos astronômicos exige uma percepção tridimensional. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 30 Em articulação com essa atividade, pode-se ainda sugerir que o globo terrestre seja manuseado de modo a ilustrar como o planeta estaria para nós se estivéssemos em outros países, levantando, em seguida, questionamentos como: “Num mesmo instante mudanças são esperadas no céu visível em outros lugares da Terra? Por quê?” E ainda: “À medida que a Terra gira, que mudanças seriam percebidas no céu visto de um mesmo lugar?” Sugestões de leitura Para mais informações acerca dos fundamentos dessa atividade, você pode ler: LANCIANO, Nicoletta. A Complexidade e a Dialética de um Ponto de Vista Local e de um Ponto de Vista global em Astronomia. In: LONGHINI, M. D. (Org.) Ensino de Astronomia na Escola: concepções, ideias e práticas. Campinas, SP: Editora Átomo, 2014. CAMINO, Nestor. Et al. Ação conjunta de observação do equinócio de março. Disponível em: < http://www.if.ufrgs.br/~fatima/atividade_equinocio/CTS_2009_portugues.pdf > Acesso em: 18 Mai. 2017. Projeto Internacionais Globo Local. Disponível em: < http://www.globolocal.net/por/download/Projeto.pdf > Acesso em: 19 Abr. 2017. 3.4 Análise e discussão das representações sobre a forma da Terra O momento de análise e discussão das representações sobre a forma da Terra surge com o objetivo de proporcionar aos participantes conhecer, discutir e refletir sobre as dificuldades de aprendizagem que envolvem as temáticas trabalhadas nesse primeiro encontro e que podem estar presentes em suas práticas educativas, seja em salas de aula e/ou exposições, não sendo, muitas vezes, percebidas por eles. Especialmente, quando nos propomos a realizar atividades que trabalham a localização do sujeito no planeta Terra e, por conseguinte, do planeta no espaço, como é feito nesse primeiro encontro, aspectos de dimensão, forma e espaço devem ser levados em consideração para se alcançar os objetivos das respectivas atividades. Apontamos assim, como de grande importância, a apresentação, a análise e a discussão de estudos da literatura que investigaram as representações e/ou concepções de estudantes sobre a forma da Terra. Quando implementamos a presente proposta, utilizamos inicialmente a apresentação dialogada de materiais audiovisuais com síntese sobre as representações alternativas encontradas nos estudos relatados na seção 3.1. Em seguida, oferecemos aos participantes copias de questionários da nossa pesquisa sobre representações de estudantes antes e após a Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 31 visita ao Planetário (sem identificação das crianças), a fim de que professores e planetaristas analisassem as respostas à luz da literatura. Verificamos grande maturidade da parte dos participantes do Minicurso nesta atividade, e ainda, que essa análise coletiva de dados foi muito valorizada por eles, se constituindo num exercício que pode também estimulá-los a realizarem pesquisas e, possivelmente, a buscarem pós-graduações. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 32 4 Explorando representações sobre o Universo: os astros e sua organização espacial No presente capítulo, apresentamos a descrição das atividades estruturantes do segundo e terceiro encontros da nossa Proposta de Minicurso, sendo destacados os objetivos e fundamentos das mesmas. Temos em vista: a interpretação do céu noturno visto a olho nu, a partir de perspectivas local (topocêntrica), e global (tanto heliocêntrica como acêntrica), de forma complementar; a organização espacial dos demais astros, além da Terra, que compõem o Sistema Solar, e a identificação de suas características, tais como composição, temperatura e escalas de tamanho e de distância em relação ao Sol; e, de modo mais geral, a exploração de componentes (astros e estruturas) do Universo que vão além do Sistema Solar, e sua organização espacial na visão científica mais atual. O desenvolvimento das atividades aqui detalhadas passa pelo entendimento de como as pessoas costumam compreender e representar o Sistema Solar, e outras estruturas astronômicas que compõem o Universo. Apresentamos, na primeira seção desse capítulo, um texto que aborda alguns resultados de levantamentos de dados da literatura sobre concepções acerca desses temas. Tal texto pode e deve servir de subsídio para a elaboração de materiais audiovisuais do Minicurso, nos momentos que antecedem a análise coletiva de dados, bem como ser utilizado integralmente após os dois últimos encontros do Minicurso, para um aprofundamento inicial das questões discutidas nessa etapa. 4.1 Conversando sobre como nossos alunos e público pensam: representações sobre o Universo. Não é de hoje que o céu nos encanta e inspira, nos despertando emoções e sentimentos que naturalmente nos levam a questionamentos mais existenciais e, ao mesmo tempo, a querer saber mais sobre essa imensidão de pontos luminosos que nos rodeiam, sobre esse “Universo”, enfim, de que fazemos parte, e que também faz parte de nós. Contudo, grande parte das informações acessíveis ao público pela mídia em geral e que passam a realimentar essas curiosidades acerca do Universo não Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 33 dialogam com as percepções e representações que as pessoas podem experimentar a partir da observação e da vivência do céu. Chegam muitas vezes como um conjunto de informações sem nenhuma organização num todo, contribuindo para a formação e propagação de concepções e representações alternativas, que oferecem obstáculos à aprendizagem desses temas, e em particular, à compreensão sobre nosso lugar e o de nosso planeta, na relação com outros astros do Universo. A fim de favorecer uma visão integrada de nosso planeta nesse Universo maior de que fazemos parte, é importante que o educador tenha conhecimento também sobre as representações que os alunos têm acerca desse tema, e ainda, sobre suas próprias representações. Alguns estudos a esse respeito têm sido relatados na literatura. Bisch (1998), por exemplo, investigou a natureza e conteúdo do conhecimento astronômico apresentado por professores e estudantes do Ensino Fundamental. Num levantamento e caracterização das representações de crianças e adolescentes relativas ao Universo, realizou entrevistas com dezoito participantes da cidade de São Paulo, distribuídos uniformemente na faixa etária de 6 a 14 anos. O autor desenvolveu várias análises a partir dessas entrevistas, entre as quais iremos focalizar a referente aos modelos de Universo que identificou nos participantes. Essa dimensão foi investigada a partir da construção de um modelo tridimensional pela criança ou adolescente, que deveria usar, em seu modelo, objetos de isopor e fios de nylon a serem suspensos no teto de uma sala. A partir dos dados obtidos, Bisch (1998) elaborou quatro diferentes categorias de modelos de Universo, as quais são descritas a seguir. A primeira delas é o Universo “Terra embaixo, céu em cima”, no qual existe uma forte diferenciação entre a posição da Terra e a dos demais astros, localizando- se a Terra isolada, na posição mais baixa do modelo, e com todos os demais astros situados mais acima da mesma. Nesta categoria também estão inseridas as representações de Terra dupla, como é observado na Figura 05 (a). Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 34 Figura 05: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo “Terra embaixo, céu em cima”. Em (a): T - o “planeta Terra”, L - Lua, S - Sol, E - estrela e TC - “Terra-chão”. E em (b): T - Terra, L - Lua, S - Sol e E1, E2, E3, E4, E5 - estrelas. (a) (b) Fonte: BISCH, 1998. A segunda categoria é denominada como Universo em camadas, na qual o Universo é constituído por várias camadas que se superpõem, sendo cada camada caracterizada por astros de natureza semelhante ou de alguma forma associados. Por exemplo, as estrelas geralmente se situam em uma camada superior e a Terra, assim como os demais planetas e a Lua, em uma camada inferior. Esta foi a categoria mais encontrada entre os sujeitos investigados na pesquisa de Bisch (1998). Na Figura 06 são ilustrados alguns exemplos dessa categoria. Figura 06: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo em camadas. Sendo: T - Terra, L - Lua, S - Sol e E1, E2 – estrelas Fonte: BISCH, 1998. Na terceira categoria, chamada Universo plano, os astros são dispostos todos praticamente na mesma altura, definindo um plano horizontal onde se situa todo o Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 35 Universo, como é ilustrado na Figura 07. Esta concepção foi pouco encontrada entre os sujeitos em geral. Figura 07: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo plano. Sendo: T - Terra, L - Lua, S - Sol, M - Marte e E - estrela esférica. Fonte: BISCH, 1998. E por fim, a quarta categoria denominada de Universo das “Terras-países”, incluiu a representação de apenas um sujeito da pesquisa, o qual concebe cada país como sendo uma representação de Terra Oca, estando as pessoas localizadas em seu interior, sobre a calota inferior e o céu de cada um deles formando o hemisfério superior. A Figura 08 é uma ilustração dessa representação. Figura 08: Representação da disposição dos objetos para a categoria de Universo das “Terras- países”. Sendo: J - Japão, L - Lua, B - Brasil e S - Sol. Fonte: BISCH, 1998. Outras pesquisas sobre essa temática também podem ser destacadas, em particular, a investigação de Rodriguez e Sahelices (2005) acerca dos modelos cosmológicos de 34 pessoas que incluíam: professores, licenciandos e pessoas com diferentes níveis de ensino (engenheiros, comerciante, química farmacêutica, entre outros). A pesquisa em questão apontou a existência de quatro categorias de Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 36 representações de Universo: Universo contextual, Universo geocêntrico, Universo heliocêntrico e Universo acêntrico. A representação contextual do Universo (Figura 09) caracteriza-se por considerar o Universo como o entorno do homem, sua vida, seus relacionamentos, seu ambiente imediato, considerando a Terra aos seus pés, a Lua e o Sol no espaço ao seu redor como parte deste Universo, destacando-se, conforme os autores, uma conotação de que o Universo “é tudo que nos rodeia”. Na categoria de Universo geocêntrico (Figura 10), destaca-se um pressuposto semelhante ao do modelo histórico de Ptolomeu, em que a Terra é tida como o seu centro, e tudo o mais gira em torno dela. Nesta categoria, os tamanhos dos desenhos feitos pelos alunos são considerados para a evidenciação de alguma hierarquia entre os astros representados. Já na representação de Universo heliocêntrico (Figura 11), define- se o Sol como o centro do Universo, sendo a Terra e os ostros planetas semelhantes, e parte de um único Universo. E o Universo acêntrico (Figura 12) corresponde a teorias cosmológicas modernas a partir das quais o Universo não tem um centro determinado, e assim, a Terra não possui um estatuto privilegiado no mesmo. Figura 09: Representação de Universo Contextual identificada por Rodriguez e Sahelides (2005) Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 37 Figura 10: Representação de Universo Geocêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005). Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005. Figura 11: Representação de Universo Heliocêntrico com destaque para o tamanho do Sol identificada por Rodriguez e Sahelides (2005) Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 38 Figura 12: Representação de Universo acêntrico identificada por Rodriguez e Sahelides (2005) Fonte: RODRIGUEZ e SAHELICES, 2005 Baseando-se nesta última pesquisa, em 2015 realizamos um estudo (SANTOS; GERMANO, 2016) no qual investigamos as representações sobre a forma da Terra e as estruturas do Universo de dezessete crianças cursando o 6º ano do Ensino Fundamental antes e após visita ao Planetário Móvel da UFRN, Barca dos Céus, onde participaram de sessão e atividades complementares. Em nossa pesquisa, identificamos algumas características adicionais que consideramos pertinente considerar, na diferenciação dos modelos dos alunos entre si. Notamos, de modo geral, uma tendência, já relatada na literatura, de descrever o Universo associado ao Sistema Solar, assim como a tendência a dispor os planetas sequencialmente um ao lado do outro, apesar de mostrarem ter conhecimento dos movimentos de rotação e translação desses astros. Além disso, muitos sujeitos de nossa pesquisa colocaram estrelas entre os planetas do Sistema Solar, sendo essa uma característica também constatada com o público em geral nas nossas experiências junto ao Planetário Barca dos Céus da UFRN. Ressaltamos, ainda, que existem dificuldades na caracterização dos componentes do Sistema Solar e sua organização espacial; não se costuma ter claro a diferença entre alguns astros e estruturas, como por exemplo, planetas e estrelas. Apontamos, assim, a necessidade de atividades com objetos e movimentos explorando o espaço tridimensional, e que permitam discussões e representações sobre: a diferenciação entre planetas e estrelas; a especificação do Sistema Solar Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 39 como um exemplo de sistema de corpos ao redor de uma estrela; a identificação dos demais astros e corpos que o compõem; a evidenciação de que a estrela mais próxima da Terra, excluindo-se o Sol, está fora do Sistema Solar; a identificação de outros astros e estruturas que compõem o Universo, a comparação entre suas extensões e a sua organização espacial. Veremos a seguir algumas atividades e mediações que indicamos para o Minicurso, no sentido de promoverem essas diferenciações. Sugestões de leitura Para mais informações acerca da investigação que realizamos, você pode consultar o capítulo quatro da dissertação de Bruna Raíssa G. dos Santos Batista “Do horizonte local às repres entações da Terra e demais astros no espaço: um minicurso para professores e planetaristas”, ano 2017, a ser disponibilizada no site do PPGECNM. 4.2 Sessão “Reconhecimento do Céu” A sessão “Reconhecimento do Céu” desempenha importante papel dentro da nossa proposta de Minicurso. Na proposta, ela é utilizada para estimular uma reaproximação com o entorno e com a cultura local através da sensibilização dos participantes para a observação do céu noturno, muitas vezes comprometida nos dias atuais em razão da poluição luminosa nas grandes cidades, e do ritmo frenético das sociedades modernas. Como parte dessa sensibilização, na sessão é dada ênfase à importância da observação do céu na construção de conhecimentos e práticas sociais: na utilização de constelações para a orientação geográfica (tanto o Cruzeiro do Sul como Órion sendo usados para esse fim); ou para a marcação do tempo, seja observando as mudanças do céu na passagem das horas, ou dos dias, o que possibilita antever períodos de colheita e plantação, bem como a ocorrência de fenômenos sazonais, como chuvas ou enchentes de rios. São explorados conhecimentos regionais sobre o céu, assim como narrativas mitológicas - da cultura grega, em particular - que ilustram valores e ao mesmo tempo, aspectos da dinâmica do céu. Além da observação do céu para orientação e marcação do tempo, é simulada, na sessão, uma viagem para o polo Sul, na qual se observa mudanças nas posições das constelações no céu e em seu movimento aparente, quando se compara ao que se observa de um lugar na latitude de Natal-RN, que é o nosso lugar, o lugar de onde podemos observar o céu a olho nu. Esse momento de viagem, na sessão, com os Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 40 efeitos que se observa na posição das constelações, ajudam a perceber que o céu contribui também para a localização dos sujeitos no globo terrestre. Nota-se, aqui, o grande potencial da sessão para interagir com as representações dos sujeitos sobre forma da Terra. A viagem ao polo Sul demonstra que a posição das constelações em relação ao horizonte em uma mesma noite, mudam conforme os lugares da Terra de onde elas são observadas. Os sujeitos são levados a observar, por exemplo, que a constelação do Cruzeiro do Sul em seu ponto mais alto, numa noite específica, será vista bem mais próxima ao horizonte quando observada de Natal-RN, local próximo à linha do Equador, do que quando observada de locais de elevada latitude, no hemisfério Sul. Ao experimentarem a observação do céu a partir de diferentes latitudes, espera-se que alguns participantes relacionem a mudança observada com a forma da Terra, mas principalmente, que todos sintam-se instigados a refletir sobre as alterações vivenciadas, abrindo espaço para o trabalho que será feito em seguida, de construção da perspectiva geocêntrica para a representação dos fenômenos celestes, a partir da atividade de Exploração de uma Esfera celeste de vidro. 4.3 Exploração de uma Esfera Celeste de Vidro Para aprofundar a discussão propiciada pelas atividades de Registro coletivo do horizonte local e Orientação de um Globo paralelo à Terra no espaço, e em especial, para apoiar a explicação das mudanças observadas no céu visto de diferentes latitudes, simuladas na sessão Reconhecimento do Céu, sugerimos a Exploração de uma Esfera Celeste de Vidro. É importante destacar que o uso de uma esfera celeste representada com um balão de vidro é bastante difundido na Educação em Astronomia pelo professor Rodolpho Caniato (2011), através do recurso didático que ele criou e denominou de “Planetário de Pobre” (Figura 13). Na presente atividade, utilizamos a Esfera celeste de vidro conforme a perspectiva do Planetário de Pobre, de Caniato (2011), mas também a partir de uma adaptação desse objeto, a “MiniTerra com esfera celeste de vidro” (Figura 14), desenvolvida pela equipe do Planetário Barca dos Céus. Nesse texto, antes de orientar o desenvolvimento da Atividade, vamos apresentar cada um desses objetos. No Planetário de Pobre de Caniato (2011), utiliza-se de um balão de vidro de fundo esférico, o qual denominamos de Esfera celeste de vidro, para simular o Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 41 “movimento” da abóboda celeste visto de diferentes locais do planeta a partir da perspectiva topocêntrica. Para tanto, em sua parte esférica devem ser desenhadas as linhas (circulares) do Equador celeste e da eclíptica, podendo-se ainda representar os desenhos de algumas constelações. No eixo central da parte reta do balão de vidro, por onde se pode acessar seu interior (Figura 13), e atravessando todo o balão, imagina-se uma linha ou eixo, que representa o eixo de rotação da Terra. A linha circular do Equador celeste deve ser desenhada de modo a dividir o balão esférico em dois hemisférios iguais, num plano perpendicular a esse eixo imaginário de rotação. Já a eclíptica, deverá ser desenhada num plano que forma ângulo de 23,5 graus com o Equador celeste. Na finalização da preparação do Planetário de Pobre, coloca-se água com anilina no interior do balão de vidro, de modo a preenche-lo até a metade, e, após fechado, suspende-se o balão com água por meio de um tripé. A montagem completa pode ser observada na Figura 13. Figura 13: Planetário de Pobre, objeto didático elaborado por Caniato (2011). Nessa disposição, o plano formado pela superfície da água no interior da Esfera de vidro caracteriza o plano do horizonte de um observador em algum lugar da Terra cuja latitude é definida pela inclinação do eixo de rotação do balão em relação à horizontal da sala, conforme retomaremos adiante. O observador deve ser imaginado como um ponto no centro do plano do horizonte, como se estivesse em alto mar, rodeado de água. Na cúpula de vidro acima da superfície da água tem-se a representação das constelações nas posições em que Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 42 as observaríamos, em determinada hora, se estivéssemos no lugar do observador que possui aquele plano do horizonte. Girando o balão em torno de seu eixo (que representa o eixo de rotação, Norte-Sul, da Terra), simula-se o movimento diário aparente do céu para um observador naquela latitude. Esse movimento deve ser simulado de modo que a estrelas surjam (apareçam acima da água) no lado Leste e se ponham no lado Oeste, após se definir os polos celestes Norte e Sul da esfera de vidro. Pode-se explorar a montagem para notar, por exemplo, que enquanto o céu gira, as estrelas mantêm suas posições umas em relação às outras sendo que, conforme a latitude do observador, algumas irão permanecer mais tempo acima do horizonte considerando-se o intervalo de tempo decorrido desde o seu nascer até o seu ocaso. Além disso, pode-se mudar a latitude desse observador alterando-se a altura dos polos da Esfera celeste de vidro sem movê-la do lugar, ao girarmos o eixo de rotação no mesmo plano vertical em que ele se encontra, num sentido ou no outro, a depender da latitude que se deseja simular. Deve-se notar que o ângulo que o eixo Norte-Sul faz com a horizontal nos informa sobre a latitude do lugar cujo plano do horizonte está sendo reproduzido com a água. Estaremos representando um observador na latitude zero, quando colocamos o eixo Norte-Sul da esfera na horizontal da sala. Um observador mais ao Sul, por sua vez, será representado girando-se o eixo de rotação da esfera, mantendo-o no seu plano vertical, de modo a elevar o polo celeste Sul (abaixando-se automaticamente o polo celeste Norte) em relação ao plano horizontal da sala. Perceba que o plano horizontal da sala é o mesmo plano da superfície da água, logo o mesmo plano de horizonte do observador que se deseja representar ali. Em particular, se girarmos o eixo de rotação da esfera até que o polo celeste Sul aponte para o topo da sala, ele se encontrará a 90 graus acima do plano do horizonte da pessoa, logo estaremos representando (o céu para) alguém na latitude 90 graus Sul do nosso planeta. Desse modo, tem-se como abordar novamente a viagem até o polo Sul, simulada durante a Sessão, e perceber as mudanças nas posições das constelações no céu visto a partir de diferentes latitudes. E ao invés de estarem imersos na situação, como acontece na sessão, agora os participantes da Atividade podem analisar e interpretar essa situação com um olhar externo, de fora, manipulando o objeto. Além dessas discussões, outras orientações e sugestões são dadas por Caniato (2011) para a elaboração e manipulação do Planetário de Pobre, de modo a Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 43 explorar diferentes conceitos de Astronomia e observações possíveis de serem simuladas com ele. Quanto à “MiniTerra” com esfera celeste de vidro, adaptação feita pela equipe do Planetário Barca dos Céus, faz-se uso da mesma Esfera celeste de vidro sendo que, ao invés da água, coloca-se no centro do balão de vidro um globo terrestre minúsculo (Figura 14). Essa adaptação, embora simples, altera toda a perspectiva que se assume na representação dos fenômenos, e permite situar os significados das diferentes partes e movimentos realizados com o Planetário de Pobre numa perspectiva em que a Terra é vista em sua totalidade. O movimento diário aparente do céu e as mudanças nas posições das constelações para diferentes latitudes são explorados e explicados, assim, a partir de uma perspectiva geocêntrica. Ignorando-se as dimensões da Terra em relação às distâncias em que se encontram as estrelas, de nós, o plano do horizonte de um observador que esteja “no topo” da “MiniTerra” (adotamos a vertical da sala como referência, ao falarmos em topo) é visivelmente o mesmo plano definido pela superfície da água no Planetário de Pobre. Figura 14: “MiniTerra” com Esfera Celeste de Vidro. No desenvolvimento da atividade de Exploração de uma Esfera celeste de vidro, utilizamos primeiro o objeto no interior da esfera, a “MiniTerra”. Inicialmente, convidamos os participantes a observarem o objeto e a tentarem interpretar o que reconhecem nele, o que acham que está representado ali. Posteriormente, após esclarecer a ideia de esfera celeste, as constelações, e a ilustração da “MiniTerra” lá Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 44 dentro, devem ser abordados, por meio de perguntas e esclarecimentos, aspectos como os que discutimos na apresentação dos dois objetos: o céu visto por cada observador é o mesmo, num dado instante?; o que significa representar a passagem das horas, com o objeto (esperando-se, como resposta, que eles girem a esfera de vidro mantendo o eixo de rotação parado, fazendo esse giro ocorrer no sentido oposto da rotação da Terra)?; quando se passam as horas, muda o céu visto por cada observador?; observadores numa mesma latitude podem ver as mesmas estrelas, em horas diferentes?; e quanto a observadores numa mesma longitude, mas em diferentes latitudes?; o que significa trazer para o topo um lugar qualquer da “MiniTerra”?; o que acontece com a posição do polo Sul (ou do polo Norte) celeste, quando trazemos para o topo locais de latitude Sul (ou Norte) cada vez mais elevada?; o que representa viajar de uma latitude para outra sobre o mesmo meridiano (esperando-se que concluam que devem trazer para o topo o ponto da superfície da “MiniTerra” que corresponde a um lugar naquela latitude, sem deixar que ocorram alterações nas horas simultaneamente)?. Após explorar bem os significados desses movimentos através do manuseio do objeto e reflexões no grupo, numa segunda etapa, a depender do grupo, pode-se tentar explicar o que discutimos na apresentação do Planetário de Pobre, ou seja, que ao trazermos um lugar para o topo, o ângulo que o eixo de rotação da Terra irá fazer com o plano de horizonte (que é o mesmo plano de horizonte da sala) representa a latitude do lugar. Ou seja, quando o eixo de rotação estiver completamente “deitado’ (fazendo zero grau com a horizontal da sala), o ponto da superfície da “MiniTerra” que fica no topo é um lugar situado no Equador terrestre (latitude zero grau); assim como quando o eixo de rotação estiver completamente “de pé” (fazendo 90 graus com a horizontal da sala), o ponto da superfície da “MiniTerra” que fica no topo é o polo (um lugar situado a 90 graus do equador terrestre). A latitude será Norte ou Sul conforme o polo acima do plano do horizonte seja o polo Norte ou Sul, respectivamente. Como ver isso? Se tivermos o eixo de rotação todo deitado, estaremos “no Equador”. Se além disso, o polo Norte estiver à nossa esquerda, e o Sul à direita, para colocarmos Natal no topo, por exemplo, devemos girar o eixo de rotação 5 graus no sentido anti-horário, de tal maneira que o polo Norte celeste ficará 5 graus abaixo do nosso horizonte, enquanto o polo Sul celeste se elevará 5 graus em relação ao horizonte, também. Essa atividade ajudará a entender que quando giramos o eixo de rotação de modo a elevar o polo Sul em relação ao Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 45 horizonte, estamos trazendo para o topo locais de diferentes latitudes Sul. Para professores que tenham maior facilidade com geometria, podemos trabalhar visualmente a conclusão de que “a altura do polo elevado é a latitude do lugar”. Idealmente, no Minicurso, caso se disponha de duas esferas celestes de vidro, deve-se trabalhar com os dois objetos simultaneamente, ilustrando com o Planetário de Pobre a perspectiva de um observador em latitude específica, do ponto de vista topocêntrico, e com a “MiniTerra” no interior da Esfera celeste de vidro, situar aquele observador no planeta Terra representado no espaço, a partir da perspectiva global geocêntrica. A atividade de Exploração da Esfera Celeste de Vidro visa, assim, favorecer uma integração da vivência cotidiana que temos do ambiente ao nosso redor, e que nos oferece uma visão plana do nosso planeta, com a representação deste último situado no espaço, considerando-se sua esfericidade. Viabiliza, assim, um movimento semelhante (embora com muito mais potencial e complexidade) ao que ocorre com as atividades do primeiro encontro do Minicurso, relacionando-se a perspectiva local/topocêntrica com uma perspectiva global geocêntrica: inicia-se a exploração do Universo a partir do lugar em que nos encontramos - com o Registro coletivo do Horizonte Local, no primeiro encontro, ou com a sessão Reconhecimento do Céu, no segundo encontro - para em seguida, através das atividades do Globo paralelo ou da Exploração da Esfera celeste de vidro, situar esse lugar numa perspectiva mais ampla, considerando-se todo o planeta Terra e sua forma, para reinterpretar o que se observava de cada lugar. A sessão Reconhecimento do Céu realizada no segundo encontro de Minicurso, deve levar a um convite para se reorganizar o Universo percebido no céu noturno representando-o a partir de outras perspectivas globais. A perspectiva geocêntrica com a Exploração da Esfera celeste de vidro constitui um primeiro passo nesse sentido, mas abordada dessa forma, ela leva a ignorar a dimensão da profundidade, como se todos os astros estivessem a uma mesma distância de nós, o que não corresponde à realidade. Após essa atividade com a esfera celeste de vidro, então, a dimensão da profundidade deverá ser abordada com as atividades que serão descritas nos tópicos a seguir, onde serão apresentadas a distribuição dos objetos celestes e as distâncias envolvidas entre eles, nas perspectivas heliocêntrica e acêntrica. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 46 4.4 Manuseio de Peças móveis do Sistema Solar Após a condução para uma representação do lugar dos sujeitos no planeta Terra e, desta no espaço, busca-se com a atividade de Manuseio das Peças Móveis do Sistema Solar, situar espacialmente a Terra em relação aos demais astros e corpos do Sistema Solar, a partir do que poderão ser considerados, também, a localização e a organização de outros astros e estruturas do Universo. Cada peça, como indicado pelo nome da atividade, é móvel, e compreende uma base de apoio com uma haste, sobre a qual é fixada uma esfera, representando assim um dos oito planetas do Sistema Solar (Figura 15). Cada esfera é pintada de modo a expressar características do respectivo planeta que são observáveis por meio de telescópio (cor, manchas ou faixas atmosféricas, fissuras), e principalmente, cada uma tem o diâmetro definido numa mesma escala. Na escala que utilizamos no Minicurso, o Sol seria uma esfera de 2,2 m de diâmetro; assim, o diâmetro de cada esfera representando um planeta é definido de maneira a manter, em relação a 2,2 m, a mesma proporção que o tamanho do planeta real possui em relação ao tamanho real do Sol. Figura 15: Peças móveis representativas dos planetas do Sistema Solar com tamanhos em escala. Fazem parte dos diálogos e da elaboração conceitual desse momento, problematizações sobre: diferenças (observáveis e intrínsecas) entre planeta e estrela, as características dos diversos astros que compõem o Sistema Solar, a Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 47 localização da segunda estrela mais próxima de nós, além do Sol (fora do Sistema Solar), assim como a localização (na nossa galáxia, a Via Láctea) das demais estrelas que são vistas no céu noturno, a olho nu. Inicialmente, faz-se o reconhecimento dos planetas que compõem o Sistema Solar e tenta-se organizá-los quanto a sua proximidade do Sol, reunindo conhecimentos do grupo sobre esse aspecto, e reconduzindo-o em suas hipóteses, quando necessário, oferecendo informações ou elementos para a reflexão deles. À medida que cada planeta é identificado, são discutidas características acerca da sua composição, temperatura, movimentos e satélites naturais. Além dos planetas, devem ser discutidas informações e localização de outros componentes do Sistema Solar, como o Cinturão Principal de Asteroides e alguns planetas-anões, o Cinturão de Kuiper e a Nuvem de Oort, sempre procurando primeiro trazer os conhecimentos já presentes entre os participantes. Após uma organização espacial desses astros, ressalta-se o movimento que os mesmos realizam (de rotação e translação) quando adotamos o Sol como referencial, evidenciando que os planetas não estão alinhados, mas em diferentes posições de suas órbitas, quase circulares, ao redor do Sol. Conforme vem sendo feito nas mediações do Planetário Barca dos Céus, dependendo da consolidação das representações dos participantes, podem ser provocados questionamentos e desafios que promovam novos manuseios das Peças do Sistema Solar, tais como: “em que região de suas órbitas, em relação à posição da Terra, e considerando-se o lado desta que se encontra voltado para o Sol, se espera que estejam os planetas que podem ser vistos à noite, naquele dia?”. A tridimensionalidade e a mobilidade das peças favorecem uma imersão psicológica dos participantes naquela representação de megaespaço (LANCIANO, 2014), possibilitando que eles se envolvam e percebam mais claramente as consequências das suas hipóteses sobre como os planetas estão distribuídos no espaço, para o que se poderia observar da Terra. Avaliando-se que as interações em torno da montagem do Sistema Solar a serem desenvolvidas naquele momento estão finalizadas, passa-se a uma nova etapa, que consiste na compreensão de outras estruturas do Universo, ainda utilizando o Sistema Solar como referência. Questiona-se, assim, onde estariam as outras estrelas, além do Sol, naquela representação do espaço equivalente ao Sistema Solar, e pede-se que algum voluntário possa sugerir um local para se colocar a segunda estrela mais próxima de Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 48 nós, Alfa de Centauro6. Após interações entre os participantes a respeito da localização de Alfa de Centauro, propõe-se, para discutir as concepções do grupo, a simulação de uma viagem até ela, partindo-se do Sol, e à velocidade da luz. Para tanto, define-se a unidade de distância ano-luz, como sendo a distância percorrida pela luz no vácuo durante o período de um ano e informa-se qual seria a velocidade da luz nesse meio. Para que os participantes tenham noção do quão grande é essa velocidade chama-se a atenção para que, na duração de um piscar de olhos, a luz poderia dar aproximadamente sete voltas e meia em torno da Terra. Inicia-se então a viagem informando que a essa velocidade, a luz demorará em torno de 8 min para sair do Sol e alcançar a Terra, 4 horas do Sol até Netuno, último planeta do Sistema Solar, e... (após algumas tentativas do grupo) ... aproximadamente 4,3 anos para chegar até Alfa de Centauro. Com base nessas informações, solicita-se então aos participantes que reavaliem a posição de Alfa de Centauro diante da organização daquelas peças móveis, de modo a perceberem que ela estará fora do Sistema Solar. Seria possível imaginar aquela distância de 4,3 anos-luz em relação ao tamanho do Sistema Solar? É o que procuramos exercitar com a próxima atividade. 4.5 Exploração de Fita com distâncias em escala e de Caixa das constelações, Simulação de um eclipse solar e Discussão de imagens em banners A fim de continuar aprimorando a representação do Sistema Solar, e de ao mesmo tempo iniciar a compreensão de outras estruturas que compõem o Universo, propomos a realização de um conjunto de atividades envolvendo representações em escalas. São elas: a Exploração de uma Fita com representação das distâncias entre os planetas e o Sol em escala, a Exploração da Caixa das constelações, a Simulação de um Eclipse Solar numa mesma escala de tamanho e distância e a Exposição de banners com imagens de galáxias e aglomerados de galáxias. Na primeira dessas atividades, temos como recurso didático uma Fita, com marcação das distâncias dos planetas e do Cinturão Principal de asteroides até o Sol, em escala. Utilizamos uma fita de 10 metros de comprimento com marcações que indicam a posição dos astros citados, sendo uma das pontas a posição do centro do Sol e a outra ponta, a posição de Netuno. Desse modo, nessa escala, a distância 6 A rigor, o que chamamos Alfa de Centauro se trata de um sistema estelar constituído de três estrelas unidas gravitacionalmente, mas que a olho nu são vistas como um ponto único de luz. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 49 Netuno-Sol é de 10 metros. Vale destacar que as distâncias, no caso, não estão representadas na mesma escala dos tamanhos dos planetas nas peças móveis do Sistema Solar, devendo estes e o Sol ser idealizados como pontos, para este modelo. Assim, após as mediações e discussões sobre a composição e organização do Sistema Solar na atividade com as peças móveis, apresenta-se a Fita com as distâncias em escala, e questiona-se os participantes sobre onde estaria Alfa de Centauro, nessa escala. Após as respostas dos participantes, estende-se a fita ao longo da sala e afirma-se que nessa escala de distância, Alfa de Centauro se localizaria a 95 km, correspondente à distância em linha reta entre as cidades de Natal e Santa Cruz, no estado do Rio Grande do Norte. Além disso, também se enfatiza que todas as outras estrelas observadas à noite estariam a distâncias ainda maiores. Neste momento, é apresentada, de forma dialogada, a Caixa das Constelações, usada para ilustrar que as estrelas constituintes de uma constelação estão a diferentes distâncias de nós e não formam nenhum padrão inerente, em seu arranjo no espaço; de modo que os desenhos que imaginamos são fruto do nosso olhar e influências culturais. Deve-se abordar ainda a informação de que uma constelação não constitui um agrupamento físico, propriamente dito, ou seja, diferente do que ocorre num aglomerado estelar, as estrelas que compõem as constelações não estão conectadas gravitacionalmente. Na caixa que montamos, são representadas as estrelas da constelação do Cruzeiro do Sul mantendo-se, em três dimensões, as distâncias em que elas se encontram uma das outras, em escala. Como pode ser visto na Figura 16, vistas “de perfil”, a distribuição daquelas estrelas em nada lembra uma Cruz. Figura 16: Caixa das constelações representando as estrelas da constelação Cruzeiro do Sul com as distâncias entre elas em escala. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 50 Para dar uma ideia simultânea da comparação entre as distâncias e tamanhos dos planetas do Sistema Solar, introduz-se, na sequência, a atividade de Simulação de eclipse solar. Nesta, usamos um tecido pintado com o Sol apresentando 2,20 m de diâmetro, e um alfinete de 5 mm de diâmetro, aproximadamente, fixado num palito de churrasco para representar a Lua. Desse modo, os diâmetros dos dois astros estão na mesma escala dos diâmetros dos planetas nas peças do Sistema Solar. Nessa mesma escala a distância entre Terra e Lua é da mesma ordem que o tamanho de um braço humano. Alguém com o braço esticado pode, então, adotando o próprio olho como a Terra, buscar a distância Terra-Sol nessa escala que irá reproduzir um eclipse solar, ou seja, buscar a distância em que o Sol teria que ficar, em relação à Terra, para que a pequenina Lua do nosso modelo, sustentada pelo braço estendido, conseguisse cobrir completamente o disco solar. Essa distância é muito maior do que o tamanho usual de uma sala de aula, sendo necessário sair ao ar livre a fim de encontrá-la na prática. A depender do tempo e do espaço disponível para a atividade nas proximidades, pode-se apenas levar os participantes a concluir que o Sol é imensamente grande em relação à Lua, e que está tremendamente longe, comparando-se sua distância àquela entre Terra e Lua. Deve- se ainda ressaltar que, uma vez que o modelo apresentado mantém as distâncias envolvidas e os tamanhos dos planetas do Sistema Solar em uma única escala, a distância Terra-Sol nessa simulação é de aproximadamente 36 m. Nesse momento retoma-se as informações sobre os movimentos dos planetas no Sistema Solar para abordar o modelo mais aceito hoje no meio acadêmico para a origem de nosso sistema, ou seja, a ideia de que os planetas, girando e transladando em sua maioria no mesmo sentido da rotação do Sol (à exceção das rotações de Vênus e Urano), são vistos como resultado da própria origem do Sol, que teria ocorrido a partir da contração de uma grande nuvem de gás e poeira, ou nebulosa. A ideia que se tem hoje é de que no próprio processo de formação de uma estrela são formados os planetas, e que por isso é algo bastante esperado (como vem sendo identificado) que outras estrelas, várias delas, também possuam planetas orbitando ao seu redor. Para finalizar a representação e organização dos principais astros que compõem o Universo espacialmente, por meio da ilustração de galáxias e aglomerados de galáxias em dois banners dispostos na sala, busca-se sistematizar ao final dessa dinâmica a visão científica atual de Universo. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 51 Os participantes são convidados a olhar para cada ponto luminoso da foto de uma das galáxias e visualizar uma estrela, tal como nosso Sol, e a idealizarem então os dados que temos atualmente, de cerca de cem a duzentos bilhões de estrelas em cada galáxia, e cerca de centenas de bilhões de galáxias, em nosso Universo, assim como a informação de que nossa própria galáxia tem o diâmetro estimado em (...) cem mil anos-luz... Sugestões de leitura Para mais informações acerca dos conhecimentos específicos que envolvem esse conjunto de atividades, sugerimos a leitura de: OLIVEIRA FILHO, Kepler S. e SARAIVA, Maria F. O. Astronomia e Astrofísica. Porto Alegre: Depto. de Física – Instituto de Física – UFRGS, 2000. Disponível em: < http://astro.if.ufrgs.br/ > Acesso em: 19 Jan. 2017. 4.6 Análise e discussão das representações sobre o Universo Semelhante ao momento de análise e discussão das representações sobre a forma da Terra que ocorre no primeiro encontro do Minicurso, no terceiro encontro são feitas também análises e discussões de representações de estudantes e pessoas em geral sobre o Universo, tendo como objetivo fazer com que os participantes conheçam, discutam e reflitam sobre possíveis dificuldades de aprendizagem que podem estar relacionadas com essas representações. Para o desenvolvimento da atividade, um questionário para levantamento de concepções sobre o Universo (Apêndice A) deve ser entregue em encontro prévio aos participantes, que devem ser orientados a aplicar o instrumento junto a pessoas diversas, preferencialmente alunos da Educação Básica, e a trazer os dados obtidos para a análise e discussão a ser feita no terceiro encontro. Antes da organização dos participantes em pequenos grupos para a análise coletiva dos dados, uma apresentação de resultados da literatura deve ser feita de forma resumida, mas com bastante discussão, para esclarecer o olhar e as classificações que vem sendo feitas pelos estudos da área, e que podem ajudar no exercício a ser realizado. O texto que apresentamos na seção 4.1 pode servir de apoio para a organização de slides que sugerimos fortemente, sejam usados nesse momento. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 52 Após a discussão das metodologias de pesquisa e dos dados da literatura, os participantes são então orientados a formarem pequenos grupos e a compartilharem os dados levantados por eles, sistematizando ao final os principais pontos que identificam nos dados, à luz do que foi apresentado na literatura, e ainda, do que identificarem como relevante para compartilhar. Um último momento da atividade consiste então na apresentação, para o conjunto dos participantes, das reflexões que cada grupo desenvolveu, e na discussão coletiva do entendimento partilhado. Em ocasião anterior em que o presente Minicurso foi realizado (BATISTA, 2017) entre as principais dificuldades destacadas na análise coletiva dos dados, estiveram: a não diferenciação entre planetas e estrelas; a restrição do Universo ao Sistema Solar; a não inclusão em desenhos que ilustrem a organização do Universo, de astros e estruturas identificados pelos sujeitos como parte deste; e a ideia de que outras estrelas, além do Sol, fazem parte do Sistema Solar. Deve-se ressaltar mais uma vez o grande valor atribuído a essa atividade pelos participantes do Minicurso na ocasião em que o mesmo foi realizado. Sugestões de leitura Para mais informações acerca da implementação da Proposta de Minicurso que tratamos no presente material, acesse o capítulo 5 da dissertação de Bruna Raíssa Gomes dos Santos Batista, “Do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço: um minicurso para professores e planetaristas” disponível no site do PPGECNM, ano 2017. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 53 5 Algumas considerações para o(a) colega educador(a) A Proposta de Minicurso aqui apresentada se insere em um contexto específico que valoriza a Educação em Astronomia, não só por considerarmos ser motivadora para o estudo de outras ciências e áreas. Valoriza-a, também, e principalmente, por considerarmos intrinsecamente promissora para compor uma formação humana e solidária voltada para o social e o ambiental, ao poder desencadear emoções e sentimentos relacionados a questionamentos existenciais que participam diretamente da construção de nossa consciência e identidade, como afirmam Jafelice (2010) e Camino (2011). Alguns desafios e obstáculos devem ser superados para a efetivação do ensino da Astronomia nessa perspectiva. Em particular, os conhecimentos sobre forma da Terra e dos demais astros e estruturas que compõem o Universo são essenciais para a aprendizagem de muitos temas abordados nos espaços formais e não-formais de Educação em Astronomia. Não se deve considerar que a compreensão desses conhecimentos possa ser alcançada a partir do simples acesso a informações e/ou imagens, mas deve-se ter em mente que essa compreensão demanda uma reformulação de representações internas, e de como nos percebemos no mundo e no espaço. Como discutimos, é possível que muitas das dificuldades de aprendizagem que os alunos enfrentam resultem da complexidade de abstração que as teorias astronômicas exigem para serem compreendidas, uma vez que adotam um referencial externo à Terra, na explicação dos fenômenos astronômicos – assumindo, usualmente, a perspectiva heliocêntrica – enquanto estes fenômenos, quando são observados pelas pessoas no seu dia-a-dia, o são a partir de um local específico na Terra, numa perspectiva topocêntrica. Ressaltamos assim, através do conjunto de atividades que compõem nossa Proposta, a necessidade de um maior incentivo a um ensino de Astronomia que parta da observação e das vivências “das coisas do céu”, as quais, somente podem ocorrer a partir de uma perspectiva topocêntrica, para posteriormente tais fenômenos serem interpretados a partir de uma perspectiva mais global (geocêntrica, heliocêntrica e/ou acêntrica). Ressaltamos também o papel de atividades que permitam uma transição entre as perspectivas de representação local e global dos fenômenos astronômicos, Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 54 como é o caso do uso do Globo (o “velho” globo), em seu alinhamento com o planeta Terra no espaço. E ainda, para as atividades que assumem já perspectivas globais de representação dos fenômenos astronômicos, a importância de elas manterem um diálogo com os saberes adquiridos pela vivência cotidiana, e que possam, dentro do possível, favorecer uma imersão dos sujeitos não apenas no nível racional, mas também aqui, por meio do corpo. Com o Minicurso aqui proposto, ou seja, as atividades e reflexões que as subsidiam, esperamos incentivar que as representações de alunos e público sejam valorizadas, e trabalhadas pelos educadores de modo a contribuir para uma maior apropriação por parte das pessoas, do lugar em que vivem, da relação deste lugar com o planeta, e da relação que esta estabelece com o Universo maior de que faz/fazemos parte. Por fim, desejamos que adaptações ao contexto vivenciado pelos educadores (em espaços formais e não formais) e novas formas de trabalhar nessa perspectiva sejam viabilizadas e exploradas pelos participantes do Minicurso e que venham a ser compartilhados por meio de publicações da nossa área. Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 55 Referências ÁVILA, Geraldo. A Geometria e as distâncias astronômicas na Grécia Antiga. Revista do professor de matemática, n. 1, p. 9-13, 1982. Disponível em: < http://www.mais.mat.br/recursos/images/c/c4/Medidas_astronomicas.pdf > Acesso em: 21. Abr. 2017. BATISTA, B. R. G. S. Do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço: um minicurso para professores e planetaristas. 2017. Dissertação (Mestrado em Ensino de Ciências) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2017. BISCH, Sérgio Mascarello. ASTRONOMIA NO ENSINO FUNDAMENTAL: Natureza e Conteúdo do Conhecimento de Estudantes e Professores. 301 f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, 1998. Disponível em: < http://www.btdea.ufscar.br/arquivos/td/1998_BISCH_T_USP.pdf >. Acesso em: 30. Jun. 2017. CAMINO, Nestor. Génesis y evolución del concepto de gravedad: construcción de una visión de universo. 2005. 240 f. Tese (Doctorado en Ciencias de la Educación). Facultad de Humanidades y Ciencias de la Educación. Universidad Nacional de La Plata, La Plata, Argentina. __________. La didáctica de la Astronomía como campo de investigación e innovación educativas. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE EDUCAÇÃO EM ASTRONOMIA, 1, 2011, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, 2011, p. 1-13. Disponível em: < http://snea2011.vitis.uspnet.usp.br/sites/default/files/SNEA2011_Palestra_Camino.pd f >. Acesso em: 07 Jul. 2015. CANIATO, Rodolpho. A terra em que vivemos. Campinas, SP: Editora Átomo, 2007. __________. O céu. Campinas, SP: Editora Átomo, 2011. JAFELICE, Luiz Carlos. Abordagem Antropológica: educação ambiental e astronômica desde uma perspectiva intercultural. In: _______. Astronomia, Educação e Cultura: Abordagens transdisciplinares para vários níveis de ensino. Natal, RN: EDUFRN, 2010. p. 213-262. LANCIANO, Nicoletta. A Complexidade e a Dialética de um Ponto de Vista Local e de um Ponto de Vista global em Astronomia. In: LONGHINI, M. D. (Org.) Ensino de Astronomia na Escola: concepções, ideias e práticas. Campinas, SP: Editora Átomo, 2014. 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Nosso lugar no Universo: do horizonte local às representações da Terra e demais astros no espaço 57 APÊNDICE A – Questionário sobre as representações de Universo Universidade Federal do Rio Grande do Norte Centro de Ciências Exatas e da Terra Departamento de Física Teórica e Experimental Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e Matemática Planetário Digital Móvel da UFRN – Barca dos Céus Nome: _______________________________________________________________________________________ Idade: _________________________ Nível de escolaridade:____________________________________ QUESTIONÁRIO SOBRE REPRESENTAÇÕES DO UNIVERSO 5. Quando você escuta a palavra Universo o que inicialmente vem a sua cabeça? 6. Para você, o que compõe o Universo? 7. Desenhe como esses componentes do Universo estão distribuídos e organizados no espaço. Escreva algumas frases explicando o seu desenho. 8. Num futuro não muito distante, uma habitante de Próxima b, um planeta que orbita a estrela Próxima de Centauro, planeja uma visita à Terra. Como os habitantes daquele planeta já deram prova de serem amigos, você se dispõe a colaborar e decide enviar uma mensagem, com um mapa com tudo o que há no Sistema Solar. Desenhe seu mapa a seguir e escreva algumas frases explicando-o.